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Rosana Barbosa, professora universitária em Halifax, Canadá, conta a sua história.
Wave - Passados mais de trinta anos, o que mudou na comunidade brasileira desde a sua chegada?
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Rosana - Mudou muita coisa, principalmente por causa da grande presença de brasileiros em todo o Canadá, não só nos grandes centros como Toronto, Montreal e Vancouver. Eu já encontrei brasileiros em Winnipeg, Saint John’s (NL), Moncton, Calgary, Waterloo, Georgetown, St. John (NB), Quebec City, Ottawa etc. Em Halifax, onde eu moro, a presença brasileira é cada vez mais aparente, inclusive nas praias que ficam a volta da cidade. Aliás, “quais são as melhores praias de Nova Scotia” é sempre um assunto de suma importância na comunidade brasileira.
É importante ressaltar que essa presença é não só de residentes, como também de visitantes e estudantes. O Canadá é hoje em dia uma destinação turística e uma das opções mais populares para estudantes que queiram aprimorar o seu inglês/francês ou complementar os seus estudos em universidades e colleges.
Com essa maior presença de brasileiros, o isolamento dos finais dos anos 80 não existe, pelo menos não como era antigamente. Em geral, você tem mais acesso a aspectos da sua vida no Brasil – seja comida, programas de televisão, jornais etc. Lembro muito bem que para conseguir qualquer notícia do Brasil eu tinha que ir à Metro Reference Library, em Toronto, para ter acesso a revista Veja uma vez por mês. A saudade dos familiares também era um problema sério, porque chamadas telefônicas eram caríssimas e cartas levavam no mínimo duas semanas para chegar. A internet hoje em dia revolucionou o mundo e fez a vida do imigrante muito mais fácil.
Outra grande mudança é que no final dos anos 80, o Canadá era visto muitas vezes como uma maneira de acesso aos Estados Unidos, ou uma segunda opção – por não conseguir residência naquele país. Hoje em dia, o Canadá é a primeira opção da maioria que está aqui. O país se tornou atrativo pela segurança de suas cidades, pelos seus serviços sociais de saúde e educação pública de boa qualidade. Além do respeito ao estrangeiro e ao imigrante, que ainda é predominante por aqui.
Wave - Você tem vários trabalhos que abordam a imigração brasileira no Canadá. Quais são os principais resultados de seus últimos estudos?
Rosana - Na verdade, a imigração brasileira para o Canadá nunca predominou muito no meu trabalho. Fiz um pouco de pesquisa na virada do século, por ver que este era um assunto ainda invisível nos dados brasileiros e canadenses. A imigração sempre esteve presente no meu trabalho, mas mais em relação ao Brasil no século XIX. Um dos meus mais recentes trabalhos lida com as ligações históricas entre Brasil e Canadá – mostrando que os dois países estiveram conectados historicamente de maneiras variadas: com o comércio do bacalhau, com o estabelecimento da companhia Light em São Paulo e Rio de Janeiro, como também pela imigração – incluindo dois casos de emigração canadense para o Brasil: em 1876 para Benevides, no Pará, e em 1896, para as fazendas de café de São Paulo.
Wave - Na sua opinião, qual é a imagem do Brasil e dos brasileiros para o cidadão canadense?
Rosana - Acho que o brasileiro é bem visto pelos canadenses. A nossa simpatia e bom humor sempre ajudam, mas também o fato de a imigração brasileira ser composta em sua maioria de pessoas com uma alguma formação educacional e de áreas urbanas, facilita a aceitação no Canadá – não por esses merecerem mais que outros, mas porque as diferenças culturais e sociais são mais amenas junto a população canadense. Quanto ao Brasil, acredito que há muita curiosidade, mas também pouca informação. Os canadenses sempre relacionam o Brasil com calor, carnaval e futebol, mas a maioria não sabe muito sobre o nosso país.
Wave - Para estudar ou migrar, o Canadá tem sido um dos países mais procurados pelos brasileiros. Qual a sua mensagem para estes patrícios?
Rosana - Acho fundamental a perseverança e também a definição de um objetivo – mesmo que para isso você tenha que optar viver mais modestamente para investir na educação ou em qualquer outro investimento pessoal ou de negócio. Dificuldades sempre existem, mas se você tem certeza (ou quase certeza) do que quer atingir, vale a pena lutar. Duvidei de mim mesma muitas vezes, mas continuei em frente, mesmo tento um inglês bastante básico quando vim para o Canadá. Sou a primeira pessoa em minha família a ter um PhD – minhas duas avós eram praticamente analfabetas, mas persisti e conquistei algo gratificante. O ponto que eu quero mostrar é de que mesmo quando as condições não parecem favoráveis, o seu objetivo pode ser atingido – seja ele qual for – mesmo que seja somente paz, segurança e melhores oportunidades para os nossos filhos. Nesse mundo tão polarizado, onde a depressão é tão comum, devemos priorizar o nosso bem-estar. Com paz e sossego tudo acaba seguindo o rumo certo, não é mesmo?