BRUNO GODOI , texto VINÍCIUS C. ASSIS , arte
Copyright© By Editora Coerência 2016 MISTER ABACAXI © BRUNO GODOI / VINÍCIUS C. ASSIS 1º Edição — Editora Coerência — Brasil Todos os direitos reservados pela Editora Coerência Produção Editorial Diretora Editorial Editorial Revisão Ilustração Capa Diagramação
Lilian Vaccaro Bruno Godoi Evelyn Santana Vinícius C. Assis Décio Gomes/Vinícius C. Assis Bruno Lira
Dados Internacionais De Catalogação Da Publicação (cip) Godoi, Bruno; Assis, Vinícius C. Mister Abacaxi 1. Ed. — São Paulo — Editora Coerência 2016 ISBN: 978-85-92572-16-7 1. Literatura Brasileira. 2. Infantil I. Título
CDD. 869.3
Editora Coerência Avenida Itamaraty, 2303 — apt 12 Santo André — SP — Cep . 09271-410 Site: www.editoracoerencia.com.br E-mail: lilian@editoracoerencia.com.br Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), em vigor desde 1º de Janeiro de 2009.
Para Gabriel Godoi e Luíz Otávio Caetano de Assis, nossos verdadeiros heróis.
Com certeza você gosta de histórias de super-heróis e de aventuras juvenis. Mas, e de Matemática, Geografia e Ciências? Bruno Godoi mistura o universo da escola com a ideia por trás da ação que envolve o personagem-título do livro para mostrar o quanto esse ambiente pode ser divertido. Ah, e ainda faz de tudo para lutar contra o bullying e outros obstáculo que temos de enfrentar no meio do caminho desse período de nossa vida. Com arte e imagens bem bacanas de Vinicius César, que ilustram bem o que o texto explica, Mister Abacaxi te segura desde a primeira página e só te larga na última linha, deixando-o preparado para enfrentar a realidade que lhe espera com seus prós, contras e lições a serem aprendidas do dia-a-dia. Leitura perfeita para meninos e meninas de qualquer idade. Dhiancarlo Miranda, blog Outros Sons Professor de Língua Portuguesa e Língua Inglesa, pós em Linguística, Orientador de Sala de Leitura. www.dhiancarlomiranda.wordpress.com
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CAPÍTULO 1 A minha vida é uma confusão danada. Espera ! Tirando o bullying na escola, a confusão acaba. Sem falar que a aventura me acompanha desde que eu era um bebê. Sério. Quando eu tinha um ano, mamãe amarrava o meu berço na maçaneta da cozinha pra eu parar de sacudir até derrubar a mamadeira. Com dois aninhos, eu descia a escada da sala pendurado num lençol. Com quatro, eu e minha irmã jogávamos massa de bolo no espelho do banheiro. Quando fiquei maiorzinho, comecei a projetar coisas pra se fazer dentro de casa quando a rua estava vazia. E agora, aos doze anos, eu virei o Mister Abacaxi, o super-herói do Bairro Vicentino. Essa mudança me ajudou em duas coisas. Uma: escoltar a minha mãe até a Prefeitura. Outra: fazer o Teste pra Super Gênios e, de brinde, ganhar um beijo da Rosemeire. É uma história longa, e só eu posso contá-la, porque só eu sou o Mister Abacaxi. (Eu e ninguém mais!) Foi só o herói ficar comentado pelo bairro que apareceu um monte de garoto postando no Facebook que era o Mister e tal. Tem até gente tirando foto de abacaxi no fusca 13
do Verdureiro Maluco e colocando no perfil do Instagram. (Como tem gente invejosa, hein?) Enfim, eu só tenho uma coisa pra falar sobre a inveja: — Aftas de abacaxi ! Eu não posso me revelar. Segundo o Manual Pra Super-Herói, a identidade secreta é a coisa mais importante na carreira do vigilante.
Vigilante é só um dos nomes pra super-herói. Por exemplo, no meio militar, eles chamam de soldado, guerreiro ou combatente. No Nordeste, dizem cabra, égua ou bicho. Em Minas Gerais: moço, mocinho ou belezura. Cada lugar tem uma forma pra nomear o herói, contudo, a ideia é sempre a mesma: a pessoa só deve fazer o bem. Pronto.
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Então, se o meu nome de herói é Mister Abacaxi e se o real é segredo, falta só o apelido de escola. Apelido é aquela coisa chata que os valentões do colégio inventam pra fazer os ataques verbais contra os mais fracos. E na época em que eu era fraco (e feio) eles me apelidaram de Bile. (Bile é sinônimo de bílis.) Bílis é o líquido amargo que vai pra boca quando a gente pensa em vomitar. É uma coisa meio verde, ácida e azeda, que sobe pela garganta rapidamente. E foi num ato rápido de enjoo que a minha turma na época do primeiro ano me batizou de Bile. Tem muito tempo, éramos novinhos. Foi quando eu conheci a Rosemeire da Silva. No primeiro dia de aula, Rose sentou-se na carteira da minha frente. Ela olhava de lado fazendo cara de menina educada e falava “Oi” com todo mundo da sala, numa simpatia de boneca em
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vitrine de loja. Ela nem sabia pentear o cabelo, ficava fazendo voltinhas com os dedos e dando risadinhas. O uniforme dela cheirava a tutti frutti. Não aguentei, larguei os lápis de colorir e comecei a puxar o cabelo dela (usando todos os dedos). Eu tinha assistido a um programa na TV em que mostrava chipanzés em uma gaiola que puxavam o pelo um do outro (usando todos os dedos). O apresentador, sorrindo, explicava: “Isso sim são gestos de carinho usando todos os dedos”. (Rose não curtiu.) Quando ela se virou pra me xingar, ela soltou uma cara tão assustadora que meu cérebro teve que escolher entre duas opções. Primeira: morrer de medo. Segunda: morrer de amor. (Escolhi a segunda.) Naquele momento eu entendi o que minhas primas comentavam quando assistiam à novela das seis: — Ai, gente, a paixão faz a bílis subir pela garganta e dá aquele enjoo na barriga, nossa! Eu sempre me perguntava: “Será que a bílis sobe pra encontrar a paixão?” Descobri, graças à Rosemeire, que: “Sim, a bílis vai amargar a sua garganta quando você amar.” Se eu soubesse que gostar dava esse azedume na língua, nunca teria puxado o cabelo da menina. Depois de ela me xingar e berrar “Larga o meu cabelo, menino horroroso!”, Rose cravou as unhas (usando todos os dedos) no musculozinho do meu bíceps. Ela foi ágil, já se virou gritando e beliscando. A unha furou a manga do uniforme e chegou ao braço. O beliscão girou o pedaço de carne igual a um parafuso e eu fiquei tonto de dor e paixão. Meu enjoo foi tanto que eu enrolei a língua 16
pra parar de amargar e comecei a emitir uns sons estranhos (tipo um cachorro bebendo água numa tigela funda). No momento em que eu estava apertando os lábios de vergonha, a professora chegou, desesperada, sacudindo a minha cabeça: — Menino, reaja! O que você tem na língua? — Professora de primeiro ano é bem sentimental. Abri um pouco a boca e, buscando dignidade, murmurei: — Nham nham — soltei esse som ridículo sem querer. — É bílis, professora. Tô enjoado. Nham nham… Minha visão tá escurecendo e a boca amargando. Nham nham… Rose me olhou e, sem pena de mim, rosnou: — Nham nham? Menino horroroso! Que coisa esquisita! A turma gargalhou: — O horroroso soltou um “nham nham”? Pronto. Meus colegas começaram a agressão moral repetitiva, usando apelidos pejorativos. — Hah ! Hah ! Hah ! Ele é retardado demais ! Gritaram: — Bile feio! Nham nham! Bile feio! Nham nham! — O horroroso gosta da Rose! Gosta da Rose! Gosta da Rose! Eles iniciaram um coral. — A Rose te odeia! A Rose te odeia! A Rose te odeia! Começaram (e nunca mais pararam) a me zoar. Até na internet saiu. Os valentões usaram todos os recursos tecnológicos com a intenção de me humilhar. No meio virtual não há os muros da escola para confinar os ataques, por isso a coisa complica demais. 17
“Rosemeire da Silva odeia o Bile Jones Júnior”, eles postaram. (Jones é o meu sobrenome por parte de mãe.) Com essa cena lastimável de enjoo, “Nham nham” e “Rose te odeia”, sem mencionar a carreta de apelidos secundários, o tempo passou e o Bile foi junto, até hoje, no quarto ano. Doze anos é a idade teórica pra menino de sétimo ano. E, se eu sou um garoto do quarto com idade pro sétimo, é por um detalhe constrangedor: eu tomei três bombas. (Mais bullying.) Meus colegas adotaram o “burro” como parte de mim. — Bile Burro ! Nham nham ! Bile Burro ! Nham nham ! Aguento isso sem poder reagir desde a primeira bomba porque ninguém sabe que as minhas notas ruins (na verdade são péssimas e horrorosas) foram parte do meu sacrifício pra salvar alguns meninos da escola. Sim! Eu parei no quarto ano pra proteger os mais fracos; eu precisava, de alguma forma, mostrar o meu valor para superar os meus traumas. Tipo que eu amadureci mais cedo pra me fazer ser respeitado pelos agressores que não me davam sossego. (É um pensamento muito burro, eu sei.) E essa foi a semente pra nascer o herói escolar em mim. — Juninho — mamãe já me perguntou nos últimos três Natais —, o seu problema é aquele acontecimento da ânsia de vômito? Você sabe o que o Papai Noel pensa de menino que não passa de ano? Até hoje a minha mãe usa o Papai Noel como entrada quando ela quer me falar (repreender) algo sério. Minha sorte é o povo em casa e na rua não me encher muito sobre as bombas (tirando os colegas da escola). E o caso do “Nham nham” virou um fato tão 18
dramático que quase ninguém no bairro tem coragem de me zoar (tirando os colegas da escola). Na verdade, algumas pessoas me tratam com mais atenção (tirando os colegas da escola). Essas pessoas que me dão atenção conversam bem devagar quando interagem comigo e fingem não perceber as palavras erradas que eu falo (na verdade, elas pensam que eu sou retardado). Eu tento não me importar com isso, mas é pior ser rotulado de retardado a ser apelidado de Burro. Meu pai acredita na minha superação e aposta que um dia eu recuperarei o tempo perdido. Ele fala que tem muito cientista famoso que ia mal com as notas. — Mas isso não é desculpa pra você tomar bomba direto! — Papai, às vezes, perde a paciência. — Então trate de estudar antes que eu tome o seu videogame. E acabe com esse tempo perdido logo, certo, mano? — Pai, como eu vou recuperar o tempo perdido? — Participando do Teste pra Super Gênios da Prefeitura. — Aftas de abacaxi. A bílis sobe (e não é de amor) só em pensar nesse Teste pra Super Gênios da Prefeitura. — Se você fizer a prova — papai insiste — e passar, será considerado um gênio e terá regalias na escola, o que inclui recuperar o tempo perdido. Mas tem que estudar! (Papai, às vezes, perde a esportiva.) Ninguém sabe que as minhas bombas têm relação com a construção do herói escolar.
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Meu destino sempre foi ser um herói. Há muito tempo, sem eu nem imaginar que existia o Manual Pra Super-Herói, eu já tinha descoberto a minha motivação. Nem passava pela minha cabeça a Regra Motivadora e, mesmo assim, eu já tinha uma crise existencial. Foi difícil de aceitar, eu sabia que teria (mais) inúmeros problemas. Tudo começou na primeira vez em que eu fiz o quarto ano; eu estudava com a mesma turma desde o primeiro. É a turma dos meus maiores amigos e, claro, da Rose. Ramsés Cabral, meu arqui-inimigo, entrou pra escola naquele ano e se juntou com a turma dos valentões. Pronto. Ramsés começou a acompanhar os meninos que faziam maldades com os meninos do Terceiro Ano B. Maldades: apelido, ameaça, difamação, quebrar a tampinha da caneta, sacudir o refrigerante pra espirrar na hora de abrir e outras coisinhas. 20
Nossa turma era o Quarto Ano A e nossa sala era do lado do Terceiro B. Tínhamos nove anos e era eu quem protegia os pequenos de oito. (Esse Terceiro B foi a turma mais fraca que já passou pela escola.) Sempre que a turma do Ramsés ia mexer com os meninos, eu chegava gritando socorro e chamando pela professora. Foi desse jeito o ano todo, e quando eu vi que Ramsés Cabral iria tomar bomba, eu tomei primeiro. Assim, eu ficaria no quarto ano e seria prático proteger (gritar por socorro) os meninos do terceiro que entrariam na próxima turma, além de receber a nova galera do quarto que até então eram os meninos do Terceiro B. A escola nunca muda as turmas de sala, aí eu pensei: “A sala aqui do lado sempre será o Terceiro Ano B e sempre terá aluno fraco, e se o Ramsés tomar bomba, ele vai ficar no Quarto Ano A pra mexer com os meninos.” Por isso eu estou há três anos (quase quatro) no quarto, estudando na mesma sala e me sentando no mesmo lugar. Ramsés Cabral está sempre perto de mim. Não sei o que ele quer comigo, porque eu mal converso com ele. Na verdade, eu faço de tudo pra ignorá-lo, principalmente quando ele tenta puxar conversa. Enquanto o Ramsés não passar de ano, ou se mudar de escola, ou ficar legal, ou a diretora parar de permitir menino fraco ser zoado na aula, eu não posso deixar o posto de protetor do Terceiro Ano. Enquanto isso, eu espero, com toda minha fé, que o Ramsés passe logo de ano, porque eu não aguento mais repetir as matérias. Quero ver coisas novas e fazer Educação Física com quem chuta a bola com o bico do tênis. 21
Já pensei em mandar uma carta para os pais do Ramsés (mas achei melhor não envolver familiares). Mosca-man Cabral é o pai do Ramsés. (O Mosca tem uma fantasia de gafanhoto misturada com mosca da laranja pendurada na parede da sala de jantar.) Mosca explica que ele ganhou a roupa quando fez a primeira comunhão. (Às vezes, quando estou sem nada pra pensar, fico imaginando que tipo de pais daria uma fantasia de gafanhoto com mosca pro filho que terminou a primeira comunhão.) Mosca-man Cabral atormenta a nossa paz sempre que pulamos a cerca da Matinha (a floresta no final da nossa rua) pra fazer bagunça. É só pularmos e entrarmos na área de preservação ambiental que chega o Mosca-Man numa viatura barulhenta que solta fumaça escura. Ele ergue os braços, todo sério: — Nada de danificar as plantas. Vão embora. Chispa, chispa! Chispa, chispa! Vovô Zumba Jones fala que o Mosca é o melhor policial da cidade, porque ele faz tudo direitinho. (Eu discordo: o Mosca não deixa a gente fazer bagunça. Então tem alguma coisa errada aí.) Mosca-man é o sargento mais bravo da Polícia Ambiental. Vovô gosta de lembrar: — O posto policial da Matinha é o melhor da região, sempre sai nos jornais. Devo assumir que preciso da família Cabral, pois todo herói tem vilões. Contudo, agora que estou me tornando super, preciso encontrar super-vilões. 22
Antes eu era apenas herói escolar, a pessoa que faz salvamentos dentro da escola em dia de aula (fora do horário, a pessoa deixa de atuar). Super-herói, por outro lado, é a pessoa que atua em tempo integral, dentro e fora da escola.
Meu nome de herói escolar era Bile Jones Júnior; não tinha nada de mais em minha vida, era apenas a vontade de brincar. Vivendo na pele de Bile Jones eu não tinha pretensões de seguir a carreira de vigilante, até descobrir uma motivação. Minha mãe é arquiteta e trabalha fora, e, ultimamente, ela tem pegado uns projetos grandes pra fazer. E projetos grandes são construídos bem longe do Bairro Vicentino, sem falar que mamãe tem que ir à Prefeitura toda semana aprovar os projetos que ela faz. E eu tinha uma situação pra resolver justamente nessa mesma Prefeitura. (Eu não sabia que a cidade só tinha uma prefeitura. Onde já se viu isso?) 23
Fiquei pensando em como resolver os dois problemas de uma vez. Passei dias buscando a semente pra minha evolução, até que me veio o Manual Pra Super-Herói. Não sei se abacaxi se planta com semente, Vovó Marimba fala que basta enterrar um inteiro pra nascer um pé novo. E um abacaxi velho não é, nem de longe, uma semente. E foi aí que tudo começou. — Agora eu sou o super-herói do Bairro Vicentino, meu apelido é Bile, e, sim, eu sou o Mister Abacaxi.
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CAPÍTULO 2 O Bairro Vicentino é longe do centro da cidade e fica perto da montanha que rodeia a região. Toda a nossa infância foi no Vicentino, meus pais estão aqui desde que o meu irmão mais velho nasceu. Moramos numa mansão antiga que parece filme de terror. Meu avô ajudou os meus pais a comprarem a casa há muito tempo, quando a rua tinha poucos moradores. — Naquela época — papai lembra —, eu e a mamãe tínhamos acabado de nos casar, aí o vovô insistiu pra ficarmos aqui, mas eu não queria de jeito nenhum, a casa caía aos pedaços, credo! Pelas fotos do casamento, vejo que o casarão fazia parte de uma fazenda muito grande. — Pai… — Meu irmãozinho olha assustado. — A casa parou de cair? — Oh, meu filho, relaxe. Mamãe arrumou tudo. Quando está sem nada pra fazer, mamãe projeta algumas coisas pra reformar a nossa casa e o meu pai ajuda a martelar as coisas (ele trabalha numa empresa de montar carros e sabe usar bem as ferramentas da caixa de ferramenta). Meu irmão mais velho fala que a casa era o açougue de um 26
coveiro aposentado. Minha irmã fala que era um convento medieval de um grupo de freiras cantoras. Meu irmãozinho resmunga que o lugar dá medo, que a madeira estrala, o vento entra pelas frestas do sótão e que mora um gnomo cego debaixo da escada. Aprendi a não dar atenção ao que meus irmãos falam, principalmente o mais velho (mas o caso do açougue é muito interessante). Papai fala que o lugar é só um casarão que dá despesa e é pra gente economizar. Minha mãe fala, simplesmente: — Esqueçam o coveiro, as freiras, o gnomo e as despesas. É a nossa casa e pronto. (Eu fico com minha mãe, ela é a mais sensata do grupo.) O Bairro Vicentino é uma região residencial com ruas largas, árvores imensas, casas antigas e jardins pra todo lado. No nosso quarteirão tem um supermercado de esquina, com terreno na frente onde usam pra estacionamento. Na outra esquina fica a banca do João Jornal e, ao lado, o pipoqueiro Zé Doce. Aos domingos, Zé Doce empresta o ponto ao Verdureiro Maluco, o fazendeiro que vende coisas estranhas dentro de um fusca amarelo. Quando eu estou à toa, tento decifrar os produtos do Verdureiro. — Maluco, o que é isso? — Eu aponto, espantado. — Cará — ele responde, tentando me tirar de perto do fusca. — E isso? — Rabanete. — E aquilo? — Manjericão. — Lá na ponta? — Pepino. E não, não pode pôr a mão, tá? 27
No meio do nosso quarteirão tem uma padaria e uma farmácia. A rua termina na Matinha, uma mata gigantesca. — A Matinha é de preservação ambiental — Mosca-man defende. — Eu cuido dos bichos e das plantas, e se vocês fizerem algo aqui, eu vou xingar. (Mosca-man, às vezes, é bem radical.) A Matinha é da época anterior às fazendas, quando tudo era uma floresta. Tem fotos em jornais mostrando o passo a passo da colonização e o surgimento das casas. Não entendo como tinha gente morando em fazenda sem usar internet. Outra coisa que eu não entendo são os adultos, porque tem gente fazendo um monte de coisa errada na rua que eles nada falam, mas, se eu pisar, por exemplo, no jardim da vizinha, aparece um tanto de gente pra me xingar. Papai comenta: — É importantíssimo defender os animais, as plantas e o jardim. Principalmente a grama verde, imagina o que seria do futebol sem ela. Estou cansado de ouvir adulto me alertando: — Cuidado na rua, Jones Júnior! — Jones Júnior, olhe bem por onde anda, tá? — A rua, Jones Júnior, é perigosa demais. Eu replico: — Mas, gente, se a rua é isso tudo, por que ninguém faz nada? Até a minha mãe, que detesta dirigir, vai trabalhar de carro porque as ruas estão perigosas. 28
— Tem vez que eu volto tarde — ela lamenta —, aí complica pra eu pegar o ônibus. (Nessas horas que eu percebo a necessidade em se ter um super-herói no bairro.) Eu amo morar no Bairro Vicentino, principalmente por causa da Matinha; a janela do meu quarto abre bem em cima dela. Dizem que na mata tem lobos e corujas. Adoro isso. Quando o Xixi Jones, meu irmãozinho, vem pro meu quarto, eu o coloco na janela, aponto pras árvores e falo, com a voz de locutor de rádio: — Xixi Jones, Xixi Jones. A Matinha é um ambiente místico a ser explorado. Lá tem cipós e mato seco. E bem lá dentro, ouvi dizer, tem uma cabana de bambu. Na cabana, ouvi dizer, mora um mutante meio homem meio tamanduá. É o lendário Tamanduá Mamute. Ele enterra coisas mortas na beira do riacho. Xixi me olha, desconfiado: — Tem gnomo cego? Todo mundo na rua conta uma lenda sobre a mata, principalmente o Vovô Zumba, que adora falar do Tamanduá Mamute. Eu já fico na dúvida se devo temer ou admirar esse Mamute. Tio Lúcio Jones, o irmão mais velho da minha mãe, fala pra admirarmos as pessoas que fazem coisas legais e evitarmos as que fazem coisas erradas. Por isso eu comento com o Xixi: — Até hoje eu não vi o Mamute fazendo nada errado nem nada bom. Na verdade, nunca vi o Mamute. — Bile…? Fiz xixi. — É só colocar o menino na janela que ele molha a cueca. 29
Uma coisa que eu tenho vontade de fazer é alterar o nome do bairro pra Vicente. Vicentino é muito infantil. O pessoal dos outros bairros vivem me zoando. (Até o nome do bairro vira piada.) Por isso gosto do nome Vicente, passa mais autoridade. Mas meus colegas que vêm jogar videogame aos finais de semana nunca acertam o endereço quando rabisco as placas do bairro. Os pais deles passam direto e ficam subindo e descendo as ruas. Minha mãe me xinga e me obriga a consertar tudo. (Melhor continuar morando no Vicentino.) A Matinha é sur-pre-en-den-te! É um ambiente totalmente selvagem. Meu avô passa medo na gente: — Fiquem longe da mata, entendido? As pessoas que moram lá são macaco sapiens. E tem o Mamute também. Ele vai pegar vocês. Repetindo: a Matinha é sur-pre-en-den-te! Mais surpreendente é o nosso quintal novo. Papai foi promovido na empresa e ganhou uma bolada. Ele nos contou isso mês passado, no jantar. — Pessoas! Ganhei uma bolada do chefe. — ele revelou de boca cheia, cuspindo carne desfiada em cima do Xixi. — Vai sobrar um dinheirão. Vou comprar a casa do vizinho do fundo, construir uma oficina e montar os meus próprios carros. E você, Juninho, vai ter mais um quintal pra brincar com o seu irmãozinho. E a mamãe vai poder montar um escritório pra ela também. (Eu sempre ganho bolada no futebol e nunca fiquei rico.) Mamãe sugeriu: — Poderemos sair do cheque especial e reformar a casa. 30
Meu pai ganha uma bolada e vira motivo de alegria. Uma bolada! E minha mãe fica contente porque vai sair do cheque especial e reformar a casa. Foi assim que compramos o terreno do vizinho. Nosso quintal, agora, pega uma fatia completa do quarteirão, igual cortar um bolo de ponta a ponta. O lote ficou imenso. Lembro-me de que ano passado eu dei uma ideia pra ajudar meus dois melhores amigos, que estavam no sexto ano, a terminarem um trabalho de Literatura. A ideia era invadir o terreno do vizinho atrás de um bicho mitológico, uma raça nunca vista em livros de Biologia. — É um besouro gigante de três metros de largura, Bile — Danado explicou. — Ele voa de cabeça pra baixo sem ficar tonto e sem nham nham. Ignorei a parte do nham nham e questionei: — Vocês devem ler um livro que se chama O Escaravelho do Diabo? Doidera, hein? Eu quero ler também. Paçoquita negou: — Mas você é burro e toma bomba. Não pode ler livro de gente estudada. Danado Danadinho e Paçoquita Pamonha, esses são os meus melhores amigos. Estudamos juntos desde que nós entramos pra escola, mas na quarta série eu fiquei e eles prosseguiram. Eles moram no Vicentino também. Têm muitas casas coladas umas às outras aqui, criando becos e passagens secretas pra usar como atalhos e ir de um lado a outro. Tem uma passagem bem do lado do muro do nosso quintal que leva até o portão da casa do Danado Danadinho, e, atravessando a rua, já é a casa do Paçoquita Pamonha. 31
Como eu não podia ler o livro, tive uma ideia. — O trabalho é pra amanhã, certo? Vocês não leram e nem vão ler esse Diabo do Velho e… Danado me corrigiu: — É Escaravelho do Diabo, burro. — Que seja. Eu sou burro e vocês são preguiçosos. Ninguém vai ler nada. Essa é a verdade e… Paçoquita me corrigiu também: — Na verdade, Bile, são duas verdades. Você é burro, e outra, a gente não vai ler mesmo. Respirei fundo, controlando a raiva, e finalizei: — Olha! Entramos no quintal do seu Pirica e capturamos um escaravelho. Vocês levam o bicho pra escola e eu fico conhecendo a criatura. Querem brincar? Sim ou não? Largamos tudo e corremos pra casa do seu Pirica, um velhinho com olhos biônicos. Na hora em que o Pirica me viu pendurado no muro, ele correu pra cima de mim com uma vara de pitanga de mentira. — Só vou fingir que vou te bater pra servir de exemplo — Pirica resmungou. (Na hora funcionou. Eu morri de medo do fingimento.) Por fim, os meninos tiraram zero no trabalho e eu não vi o escaravelho. E agora o quintal é nosso! O casarão do Pirica é o mais antigo daqui. Mamãe falou que o velho foi um dos fundadores do bairro.
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— Pirica Pizzarica é italiano. Ele veio pro Brasil na época da guerra e começou a plantar café aqui, quando tudo era uma fazenda. Dizem que ele foi um herói da guerra, por isso vou reformar o casarão dele e transformar em museu. Existem muitas passagens secretas espalhadas pelo quintal do Pirica. Pelas histórias, o quintal era a sede da fazenda, ou seja: o centro de tudo. Assim, eu posso usar as passagens e me deslocar pra qualquer parte do bairro sem ser visto.
No quintal tem, ainda, um pomar infinito, com frutas que ninguém nunca viu. Nem o Clorovaldo Paixão, o professor de Ciências, conhece o que nasce lá. — Não sei, Juninho. — Clorovaldo se irrita quando eu levo fruta podre pra sala dos professores. — E não quero mais disso aqui, ou você quer ficar de castigo com o Mão Grossa? (Melhor não levar mais fruta podre.) 33
Mão Grossa é um ogro que mora na horta da escola. Os professores falam dele quando a gente faz bagunça. — Ele tem a mão que arranha igual arame — Clorovaldo “gosta de ameaçar.” Xixi fala que o Mão Grossa é o pai do gnomo cego. — É sim — Xixi explica. — Eu já vi a mão do gnomo, e é igual à do Mão Grossa. Eu finjo dar atenção às coisas do Xixi: — E como é a mão deles? — Grossa. Mês passado eu ganhei uma fotografia grande da nossa casa. Um motorista do Google me deu. Sem essa foto, meus planos ficariam no papel.
Minha professora ensina a fazer esboços de nossos projetos. — Tudo começa no planejamento — ela aconselha.
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Com a foto em mãos, comecei a brincar de vigilante e andar pelo quintal novo, procurando sinais de abrigo antibomba e monitorando a resistência do muro, porque, isso é fato, um muro da época da guerra não é em nada confiável.
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CAPÍTULO 3 Os carros do Google têm uma câmera em cima e rodam por aí fotografando tudo. Quando um desses passou perto da minha casa, Xixi começou a correr feito doido na porta do meu quarto: — Juninho — ele berrou —, o carro do Google tá na rua! Eu estava sentado na janela, monitorando a Matinha e comendo um Big Mac. Então tive uma ideia. Espremi ketchup na camisa e corri pra rua. Quando o carro dobrou a esquina, eu rolei na calçada e dei um grito. O motorista desesperou-se. — Meu Deus, garoto! Que hemorragia é essa? — Moço — murmurei, cuspindo ketchup —, me ajude… O moço arregalou os olhos: — Ajudo, mas levante e prometa não morrer até que se esgote a vida. — Prometo. — E prometa não quebrar nada da sua ossada. — Prometo. Levantei e mostrei a minha casa: — Então… Tira uma foto completa da casa pra mim? Pegando o quintal novo também. Uma foto bem nítida, sem tremer. 37
— Tá. Clique. Clique. Clique. — Toma. Não sei como, mas depois dos cliques, ele me entregou uma foto linda. — Nossa! — Fiquei maravilhado. — Parece um mapa do exército. Até onde tem radar de trânsito em volta do quarteirão mostra. Sorri pra ele: — Moço, este foi o melhor presente que eu já ganhei de você. Ele fez cara de confuso, entrou no carro e foi embora. Eu tinha guardado a foto debaixo do meu colchão, e, agora, estudando o Manual Pra Super-Herói, preguei-a na parede da Abacaxi Caverna. Passo horas admirando a imagem, dando zoom com uma lupa no quintal do Pirica.
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No lote do seu Pirica tem um bosque com riachos, cavernas e construções isoladas. O lado oeste do terreno vai até o Lago da Sorte, o maior lago da região. A Abacaxi Caverna fica na margem do lago, em um galpão que era usado pra guardar aviões e barcos, numa mistura de píer com hangar. Quando papai falou que nós já podíamos brincar no quintal, eu corri na frente e escolhi qual seria a minha construção particular. Xixi veio em seguida e escolheu um cercado onde guardavam animais ferozes, parecendo zoológico, com uma grade ao redor e uma vala circulando. (Xixi falou que tem lobisomens lá.) Minha irmã ficou com uma torre de observação meteorológica. (Xixi fala que o Pirica usava a torre pra se comunicar com seres evoluídos.) — São alienígenas, Juninho. Eles são chamados de Eminentes. Meu irmão mais velho escolheu o último galpão do lado oeste, bem distante de tudo, onde era uma usina de cana. — Fico com aquele lá longe! — ele declarou. — Vou levar os meus equipamentos pra lá e a minha banda vai ensaiar em paz, sem incomodar os vizinhos. O galpão dele é muito legal, é cheio de máquinas enferrujadas e esteiras mecânicas. Tem até um forno comprido, de tijolo vermelho, onde um grupo de falcão faz ninhos. (Fiquei enciumado, o forno vermelho é maravilhoso.) Contudo, a vantagem do meu galpão é ter um abrigo subterrâneo pra ser usado em caso de ataque aéreo, sem falar que eu fico com todo o lago só pra mim. Olhando pela foto, o quintal do Pirica parece um aeroporto no meio do deserto, com marcas de disco voador pra todo lado. Tem até réplica das pirâmides do Egito. (Xixi tem certeza de que o 39
Pirica é um padre medieval com o poder de viajar no tempo e que se transforma em guerreiro da época de Tutancâmon.) Morar ao lado de um padre parceiro de Tutancâmon é legal, sem falar na possibilidade de encontrar os Eminentes. (Tem momentos em que eu torço muito pra serem verdades as coisas que o Xixi me fala.) Na escola não tem como eu ser super-herói, pois eu precisaria de um local pra vestir o uniforme. O único local seria no banheiro, e eu nunca vou sozinho ao banheiro. Tem menino demais estudando! A todo instante tem gente com piriri ou bexiga solta. Por isso eu me contive em ser apenas o herói do Terceiro B (e olha que sequer eu tinha uniforme de herói). Meus fãs do primeiro ano me chamam de “O herói dos magrelos”. Fico feliz em ter meus serviços reconhecidos. E mais feliz em saber que ninguém gosta do Ramsés. (Ramsés namora com a Rosemeire da Silva.) Meus planos estavam indo a mil por hora quando a mamãe começou uma negociação com o pessoal da Prefeitura pra trabalhar na reforma de uns prédios. Minha mãe teria, então, que ir à Prefeitura toda semana. Isso estava me preocupando, porque o lugar é longe, fica na outra margem do Lago da Sorte. (Se fosse pra atravessar nadando, gastaria seis meses.) Por isso o super-herói começou a entrar de fato na minha vida. Tem um mês que eu conheci o meu mestre, Senhor Sentado, o mendigo que apareceu na esquina. Tomei três bombas no quarto ano e estou no quarto agora. Logo, são três anos inteiros mais o restinho de ano que estamos. Isso dá o total de quatro anos. Resu40
mo: minha carreira de herói escolar tem quatro anos. E há um mês eu virei super-herói em tempo integral, começando a minha vigilância pelo quintal do Pirica e me aventurando pelo bairro, usando a foto do Google. Nesses últimos trinta dias, alcancei tanta fama que virei uma celebridade. Fiz resgates de gatinhos nas árvores, atravessei velhos pelas ruas, espantei urubus que comem frango do lixo do supermercado, verifiquei os pneus do carro dos meus avós e testei os freios da bicicleta da minha irmã. Rapidamente eu alcancei o Top 1 Super-Herói do Bairro Vicentino. Todos amam o “Herói lindo que anda de máscara”. “Herói lindo que anda de máscara” é o nome que Zizi Língua me deu depois que eu a ajudei a tirar um espinho da bola de vôlei dela. Zizi é jogadora profissional de rua. Depois que eu a ajudei, ela virou minha fã e fofocou sobre o herói do bairro pelos salões de beleza da rua. Herói lindo que anda de máscara ficou sendo o meu nome. Dúvida: se eu estava mascarado, como a Zizi soube que eu sou lindo? Passei dias conversando e discutindo sobre o manual com o Senhor Sentado e quebrando a cabeça tentando descobrir o porquê de ter tantas páginas em branco. Meu tempo com o Senhor Sentado foi crucial, pois não é qualquer um que pode acrescentar o prefixo super ao herói, pra isso, a pessoa precisa encontrar um mentor.
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O meu primeiro encontro com o Senhor Sentado se deu quando eu fui comprar rosca para o meu pai. Na hora que eu saí da padaria, o Senhor Sentado viu a sacola na minha mão e eu vi o Manual Pra Super-Herói na dele. — Nossa! Um manual pra herói? Senhor Sentado folheou e comentou sem importância: — Ei, garotinho. Na paz? Acredita que achei este manual no lixo? Só que tem muita coisa em branco. E também é da época da guerra, deve ter apagado, né? Pensei: “Preciso completar o Manual Pra Super-Herói.” — Moço, quer trocar? — perguntei, eufórico. — O que você tem aí? — ele se interessou. — Rosca. — Mostrei a sacola. Meu pai perdeu uma rosca com cobertura de mel com açúcar e eu ganhei o Manual Pra Super-Herói com a doutrina do Herói Destemido. 42
Com o manual em mãos, o Mister Abacaxi começou a dar sinal de vida. E ontem, tudo mudou: eu resolvi ler até decorar o manual. Passei a tarde trancado no quarto, estudando sem parar. Repeti a leitura várias vezes. Chegou à noite e continuei lendo, até que uma coincidência aconteceu. A luz da rua acabou e o meu irmão chegou até o meu quarto com uma lanterna de luz negra. — Cabeçudo — ele sussurrou —, tá tremendo aí, né, medroso? — Ele veio me chamar de Cabeçudo e falar que eu estava com medo. (Nem no escuro o bullying para.) — Quem esta tremendo é você, Milho — reclamei. Milho é o mais velho dos irmãos e o maior de nós, porque nasceu antes e viveu mais e, assim, comeu mais. Por ter mais tempo comendo, Milho cresceu bem. E a cabeça dele tem vários centímetros a mais que a minha. Certa vez, acordei de madruga e fui ao quarto dele. Levei uma fita de arquiteto e conferi a largura da testa dele. Depois medi a minha. Anotei os dados e mostrei pra minha mãe, e ela me ensinou a passar de milímetros pra centímetros. Agora eu tenho a prova matemática, em centímetros, que a cabeça do Milho é do tamanho de uma bola de basquete, enquanto a minha é menor do que uma de futebol de salão. Mesmo assim, ele me chama de Cabeçudo. Xixi fala que existe uma lei social que permite aos mais velhos mexer com os mais novos. (Eu só me pergunto: desde quando o Xixi entende de legislação? E outra: é tipo um bullying doméstico?) Mas estava tudo dando certo pra mim, porque foi com o feixe de luz negra da lanterna do Milho Jones que as folhas em 43
branco do Manual Pra Super-Herói se revelaram. Tem um tipo de tinta que só aparece quando se usa esse tipo de luz. Onde é folha em branco no Manual, na verdade esconde um ensinamento secreto, são as Regras pra Super-Herói. E tem regra pra tudo! Despistei o Milho e o fiz voltar pra cama dele. Depois, sem ele ver, peguei a lanterna e voltei ao meu quarto. Passei a noite debaixo do cobertor lendo os segredos. Nem na Rosemeire eu pensei mais. — Este manual é muito doido… Mais doido que o Xixi.
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