Matéria Vagão Exclusivo para mulheres

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brasil

de 17 a 23 de julho de 2014

Vagão para mulheres, solução ou mais problemas? Fora do Eixo

FEMINISMO Projetos que criam espaço exclusivo para mulheres no transporte coletivo aparecem pelo Brasil e causam polêmica; é assim que vamos vencer o machismo? Bruno Pavan de São Paulo (SP) NO COMEÇO do ano, após uma série de ataques de “encoxadores” nos vagões dos trens e metrô em São Paulo, foi criada nas redes sociais a campanha “Não mereço ser encoxada”. O alerta era para chamar atenção sobre a violência em que as mulheres sofrem diariamente no transporte público. Homens aproveitam o horário de pico e a superlotação para assediar as usuárias. A iniciativa imediatamente ganhou adeptas e chamou a atenção da sociedade. Somente em São Paulo, nos quatro primeiros meses do ano, 33 homens foram presos por conta de assédio em vagões no horário de pico. Descobriu-se, inclusive, que grupos trocavam informações pela internet dos melhores horários para atacar. Os casos de violência trouxeram à tona o que está sendo chamado de “Vagão Rosa”, composição exclusiva para as mulheres no horário de pico e que já existe no Rio de Janeiro e no Distrito Federal. O Projeto de Lei (PL nº 175/2013), de autoria do deputado Jorge Caruso (PMDB), foi aprovado na Assembleia Legislativa de São Paulo no último dia 4 de julho e depende agora da sanção do governador Geraldo Alckmin para entrar em vigor. Críticas O projeto, porém, sofre inúmeras críticas de entidades feministas. Questiona-se se a segregação de homens e mulheres é a melhor saída para acabar com a violência no transporte público, e se isso não pode reforçar ainda mais a lógica do machismo. Uma das queixas dos movimentos feministas é que o projeto não foi debatido o suficiente com a sociedade paulista. O relator do PL, Jorge Caruso, afirmou que se “baseou na repercussão de matérias jornalísticas sobre o tema nos últimos meses” para elaborá-lo e que “não recebeu críticas das entidades interessadas”. Sônia Coelho, da Sempreviva Organização Feminista e militante da Marcha Mundial das Mulheres, reforçou que entidades já haviam apresentado medidas alternativas ao vagão e que a aprovação do projeto pegou todas de surpresa. Segundo ela, essa medida foi aprovada na calada da noite pela Assembleia Legislativa. “Estávamos monitorando esse PL, já havíamos participado de diversas audiências públicas, mostrado o nosso ponto de vista, só que a aprovação se deu em um colegiado de líderes, não foi a plenário. É um projeto eleitoreiro e oportunista que vai ser usado para confundir as eleitoras, passando a imagem de que ele será bom pra nós”, criticou. A primeira crítica do projeto é no âmbito prático. De acordo com informações do Metrô, 58% das usuárias do sistema são mulheres. Logo, não seria possível disponibilizar vagões exclusivos o suficiente para todas, já que são a maioria. “Considerando apenas os aspectos práticos, eu como usuária do metrô diariamente, acho impraticável tal medida. As mulheres são notadamente a maioria, não é possível destinar vagões ‘apenas’ para nós, como destinam para idosos e deficientes físicos. A proposta de lei foi criada por pessoas que claramente não usam o sistema de transporte público”, explicou a jornalista e ativista do coletivo Nós, Mulheres da periferia, Livia Lima.

Manifestação contra “encoxadas” na estação República do metrô de São Paulo

Segregação reforça a lógica da culpabilização da vítima Fora do Eixo

Procura- se responsabilizar a mulher pela violência que sofre usando argumentos como o horário e o lugar onde ela está andando e a roupa que usa de São Paulo (SP) Um dos principais problemas do debate sobre a questão do assédio e do estupro é a chamada culpabilização da vítima. Nela, procura-se responsabilizar a mulher pela violência que sofre usando argumentos como o horário, o lugar onde ela está andando e a roupa que usa. Em abril, o Instituto de Pesquisas Econômicas Avançadas (IPEA) publicou a pesquisa Tolerância Social à Violência Contra a Mulher que levantou, entre outros assuntos, que 54% dos entrevistados acham que a mulher casada tem que satisfazer o marido na cama mesmo sem vontade e que 61,9% concordam com a afirmação de que “é da natureza do homem ser violento”. Coordenadoras do Blogueiras Negras, Charô Nunes e Alexandra Ravelli reforçam essa crítica e acreditam que a medida pode, inclusive, agravar o problema. Para elas, a ideia é essencialmente machista. “O combate à violência contra a mulher precisa ter como premissa o respeito e a não violência, não a culpabilização da vítima. A segregação jamais criará um espaço seguro. Apenas servirá para o agravamento do problema pois poderá, entre outras coisas, contribuir com a ideia de que todas aquelas que não estão

Manifestação contra o vagão rosa: segregação valida a ideia de que a mulher é o problema central

“O combate à violência contra a mulher precisa ter como premissa o respeito e a não violência, não a culpabilização da vítima. A segregação jamais criará um espaço seguro” no vagão rosa estariam consentindo com a violência que lhe é dirigida, que em todos os outros vagões o machismo é aceitável”, critica Charô Nunes. Para Alexandra Ravelli, essa segregação valida a ideia de que o ser mulher é o problema central, e assim o machismo continuará se perpetuando abraçado pela sociedade.

A solução é na conscientização masculina e no investimento no transporte público As mulheres vivem uma rotina de medo com o assédio no transporte público nas principais cidades do país de São Paulo (SP) Por mais que se questione a sugestão do vagão exclusivo para as pessoas do sexo feminino, a realidade é que muitas mulheres vive uma rotina de medo com o assédio no transporte público nas principais cidades brasileiras. Eleuteria Amora, da Casa da Mulher Trabalhadora, do Rio de Janeiro, aponta

que o transporte público precarizado no Brasil é que deve ser o debate na questão da violência contra a mulher.

“Temos que dizer que não aceitamos ser encoxadas, assediadas pelo fato de não termos uma política decente de transporte público” “Milhares de mulheres passam por situações vexatórias no transporte público diariamente, por isso a ideia desses espaços pode passar a impressão da ajudá-las nessa questão, mas o caminho não é esse.

Temos que dizer que não aceitamos ser encoxadas, assediadas pelo fato de não termos uma política decente de transporte público”, explicou. Para Sônia Coelho, a solução passaria por investir em campanhas que eduquem o homem a não agredir e a mulher a não aceitar o assédio, facilitação de denuncia, além de punição ao assediador. “Ao invés dessa segregação, nós propomos educar os usuários. Campanhas para orientar as mulheres que ser assediada não é normal, mesmo com o vagão lotado. Medidas que facilitem a denúncia da mulher, como telefones exclusivos, delegacias no Metrô para esses casos. Investir em formação dos funcionários, em câmeras para a identificação desses molestadores. Acreditamos que é assim que se combate o machismo no transporte público”, afirmou. (BP)

“Que tal uma mudança? Que tal um vagão vermelho destinado aos homens que ‘não conseguem se controlar’ diante de uma mulher, algo do tipo: ‘Se você não consegue controlar seus impulsos sexuais em proximidade com o outro, esse vagão é pra você.’ Qual a pior ideia, a minha ou o vagão rosa? Tanto faz, não vejo futuro em nenhuma das duas”, analisa. A reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa do Metrô que declarou que o projeto está em estudo pelo governo do Estado e a companhia não irá se pronunciar até que saia uma resposta oficial do governador. Já o Sindicato dos metroviários de São Paulo afirmou que está realizando uma pesquisa com as usuárias sobre a questão, mas já manifestou perante Carta Aberta que defende a adoção dos vagões exclusivos para as mulheres, mas que “só isso não basta para solucionar o problema”. (BP)

Como fica a questão das transexuais Travestis também terão que ter o direito de usar o vagão? de São Paulo (SP)

Em uma sociedade cada dia mais plural, outra questão importante tem que ser levantada quando se discute algo que envolve identidade de gênero: o direito das transexuais. Qual seria o lugar delas dentro dessa política de vagões segregados? Para Beto de Jesus, diretor de relações Internacionais da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, as mulheres trans têm de ter o direito de usar o vagão exclusivo, pois sofrem do mesmo tipo de assédio. “Obviamente as travestis têm que ter o direito de usar o vagão. Elas são mulheres, elas se sentem mulheres e são assediadas diariamente também por conta disso”, explicou. (BP)


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