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brasil

de 12 a 18 de junho de 2014 Vagner Campos/Governo SP

José Luís da Conceição-Governo SP

Risco de apagão Para o professor Ildo Sauer Para Ildo Sauer, a gestão energética do governo federal é basicamente a mesma da época do Fernando Henrique Cardoso de São Paulo (SP)

Vai ter água? MEIO AMBIENTE Problemas referentes à água são cada vez mais frequentes nos quatro cantos do Brasil. Desde a escassez em São Paulo até a queda nos reservatórios das usinas hidrelétricas

Malu Ribeiro, coordenadora da Rede das águas da ONG SOS Mata Atlântica

se preocupar com seus acionistas.” O desperdício é outro grande problema. De acordo com a Agência Reguladora de Saneamento e Energia de São Paulo (Arsesp), cerca de 30% do volume produzido pela empresa é desperdiçado. Isso daria para abastecer uma cidade do tamanho de Campinas. Para o professor Júlio, isso é reflexo da terceirização de parte dos serviços da companhia. “Não dá pra comparar o trabalho de um funcionário da Sabesp com o de uma terceirizada. Quem é terceirizado não recebe a mesma formação e a rotatividade dessas empresas é muito

A Sabesp coleciona, desde 2005, uma média de 11% de lucro ano após ano, mas seus investimentos em obras no estado diminuíram 8% entre 2010 e 2013 Sabesp, lucros recordes Não é por falta de dinheiro que as obras necessárias não são feitas. A Sabesp coleciona, desde 2005, uma média de 11% de lucro ano após ano, mas seus investimentos em obras no estado diminuíram 8% entre 2010 e 2013. Um dos grandes problemas é o repasse de lucros para os seus acionistas. Pensado para aliviar o sistema Cantareira, as obras do sistema produtor de água São Lourenço, planejado para estar em funcionamento em 2019 ao custo de R$ 2,21 bilhões, começaram no último dia 10 de abril. Com os lucros da companhia entre 2005 e 2013, daria pra se fazer seis obras do mesmo porte. O professor aposentado da Escola Politécnica da USP Julio Cerqueira Cesar disse em entrevista ao site Viomundo que desde quando entrou para a Bolsa de Nova Iorque no ano 2000, “a Sabesp entrou na lógica do lucro, deixou de se preocupar com água e saneamento básico, para

Rio de janeiro e as autoridades cariocas se mostraram reticentes à ideia. O então governador Sérgio Cabral (PMDB) se pronunciou dizendo que “nada que prejudique o abastecimento das residências e das empresas do estado do RJ será autorizado”. A Secretaria Estadual do Ambiente do Rio acrescentou que a dependência dos habitantes fluminenses ao Paraíba do Sul é expressiva e que a proposta de captação poderia causar prejuízos ao estado.

“A Sabesp entrou na lógica do lucro, deixou de se preocupar com água e saneamento básico, para se preocupar com seus acionistas”

Bruno Pavan de São Paulo (SP) “SÓ DEIXO o meu Cariri, no último pau de arara”, assim cantou Raimundo Fagner, em 1973, contando a história de um cearense que teimava em não deixar a cidade natal que era vítima de uma grande seca. Mais de 40 anos depois, no entanto, é São Paulo que sofre com a falta de chuvas, trazendo à tona o perigo iminente de um racionamento de água. De acordo com a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) a água do Sistema Cantareira já tem data pra acabar: 27 de outubro. Dezenas de ambientalistas alertam para a falta de investimento dos governos do PSDB – há 20 anos governando o estado – em obras de estrutura e discordam da culpabilização da natureza. Desde 1985 não foi construído nenhum novo manancial na Região Metropolitana de São Paulo. “Um dos principais problemas é que a sociedade não prioriza a questão do saneamento. Temos uma falsa ideia de abundância. O debate só esquenta mesmo quando há falta ou enchentes. Por conta dessa falta de pressão, os governos acabam não fazendo da gestão da água uma prioridade”, analisa Malu Ribeiro, coordenadora da Rede das águas da ONG SOS Mata Atlântica.

Para a Sabesp, a água do Sistema Cantareira acaba em 27 de outubro

Governo SP

grande. Por isso, não é raro que logo depois de se instalar uma rede, ela esteja vazando”, criticou. A crise política O perigo da falta de água nas torneiras paulistas já extrapolou a divisa do estado. O governador Geraldo Alckmin (PSDB) chegou a anunciar uma obra no valor de R$ 500 milhões que bombearia água do rio Paraíba do Sul quando o sistema Cantareira atingisse menos de 35% de capacidade. Acontece que o rio é vital para o abastecimento da região metropolitana no

Malu Ribeiro, no entanto, analisa que São Paulo poderia fazer a captação do rio em épocas de cheias sem que houvesse nenhum prejuízo ao abastecimento carioca e critica a falta de integração entre as bacias brasileiras. “Esses sistemas não são interligados e infelizmente a água foi colocada na discussão eleitoral. Mas São Paulo poderia perfeitamente captar água do Paraíba do Sul sem qualquer prejuízo para o abastecimento do Rio de Janeiro . Se a Agência Nacional das Águas (ANA) fizesse o trabalho dela, que é fazer a regulação, os sistemas funcionariam muito melhor”, criticou.

Para a CPT, grandes empresas e política do governo são responsáveis por conflitos De acordo com relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), aconteceram 104 conflitos pela água no Brasil em 2013 de São Paulo (SP) A falta de água nas torneiras e o risco de racionamento não é o único problema hídrico que o Brasil sofre. Por todo o país, nunca ocorreram tantos conflitos pela água como em 2013, de acordo com a Comissão pastoral da Terra (CPT). A informação consta no reletório “Conflitos do Campo Brasil - 2013”, que considera conflito pela água “ações de resistência para garantir o uso e a preservação das águas e da luta contra a construção de barragnes e açudes, contra a apropriação particular dos recursos hídricos e contra a cobrança do uso da água no campo, quando envolvem ribeirinhos, atingidos por barragens, pescadores etc”. A principal causa desses conflitos, para a Secretária Executiva da Comissão Pastoral dos Pescadores, Maria José Honorato Pacheco, é o fato de a água ter se tornado mercadoria aos olhos do grande capital.

“A água está ameaçada como bem comum. O aprisionamento de água para uso privado, para sua mercantilização direta ou na forma de minérios, energia, insumo na produção agrícola e industrial é o que a torna escassa e motivo de disputa”, analisou.

“O país deveria desenvolver seus recursos energéticos sem que as populações e os ecossistemas sejam muito agredidos. O debate sobre as usinas de Belo Monte e do Rio Madeira é o da falta de planejamento do governo que não pensou em nada disso” As obras ligadas a construção de usinas hidrelétricas e mineradoras são responsáveis por 80,5% dos conflitos por todo o país. Essa informação, para a coordenadora da Comissão Isolete Wichinieski, mostra que a política de desenvolvimento do governo federal aliada aos grandes empresários deixa de la-

do os direitos humanos e a preocupação com o meio ambiente. “Muitos desses empresários têm facilidades com o governo, quando este não participa diretamente da obra, como nos consórcios das hidroelétricas. É uma preocupação com o crescimento que deixa de lado a importância de se investir em fontes renováveis de energia e a preservação do meio ambiente”, avalia Isolete. Segundo a coordenadora da CPT, são vários os aspectos que impactam na redução do volume da água no Brasil e as obras de mananciais não estão sendo feitas. “Os aquíferos do país estão sob sérios riscos, o Código Florestal que é um grande retrocesso. Então acredito que os próximos anos serão mais complicados em relação a esses conflitos”, explicou. Para o professor titular da Universidade de São Paulo (USP) Ildo Sauer, o principal problema é que a oferta de energia tem de andar junto com o respeito aos ecossistemas e aos povos que vivem às margens dos rios e que isso não vem acontecendo. “O país deveria desenvolver seus recursos energéticos sem que as populações e os ecossistemas sejam muito agredidos. O debate sobre as usinas de Belo Monte e do Rio Madeira é o da falta de planejamento do governo que não pensou em nada disso. A oferta de energia para o crescimento do país tem de andar junto com essas questões que são muito sensíveis”, criticou. (BP)

A matriz energética brasileira sempre esteve umbilicalmente ligada as Usinas Hidrelétricas. Cerca de 80% da energia consumida no país vem dessa fonte. A escassez de chuva no chamado “período molhado” influenciou no nível dos reservatórios das principais usinas brasileiras, fazendo com que muitos lembrassem do período do “apagão” que ocorreu durante o governo Fernando Henrique Cardoso, em 2001. O professor da Universidade de São Paulo (USP) Ildo Sauer considera real a ameaça de apagão a parti de 2015 e critica o modo eleitoreiro como o debate das gestão energética é levado no Brasil; “O risco do apagão é maior que o aceitável. Aqui na USP, nossos levantamentos levam a crer que se em fevereiro chover menos de 50% do esperado, e esse ano choveu 45%, os reservatórios poderão chegar ao final de 2015 completamente vazios. Há uma discussão de que se o governo do PT não sofrer com o racionamento, ele será melhor que o do PSDB. Porém, a gestão energética do governo federal é basicamente a mesma dos tempos do FHC”, criticou. Itaipu Apesar da seca, a Usina Binacional de Itaipu, a maior do país, está com o reservatório cheio. Desde o dia 7, por conta de uma forte chuva que atingiu a região, o vertedouro do reservatório está aberto. “A última atualização da segunda-feira (9/6), indicava que um volume de 9.196 metros cúbicos de água por segundo passava pelas calhas do vertedouro da Itaipu”, informou Flavio Miranda, do setor de comunicação da Usina. O professor Ildo Sauer, porém, analisa que os governos não podem ficar dependentes dos fenômenos naturais sem que haja uma alternativa viável para os tempos de maior seca. “A natureza as vezes se comporta dessa forma imprevisível. A alternativa às hidrelétricas são sempre as usinas térmicas, que custam muito mais no fim das contas. Com os R$ 40 bilhões que o governo vai gastar com as térmicas em 2013 e 2014, daria pra fazer 10.000 megawatts de energia eólica, uma energia limpa e de fácil instalação. Se esse investimento tivesse sido feito, não correríamos nenhum risco de racionamento”, explicou. (BP)

Para Ubiratã, Alckmin entrega para a iniciativa privada o que é de sua responsabilidade

Crise da água é tucana! PROTESTO Mais de mil pessoas saíram às ruas de São Paulo no dia 5 de junho para denunciar a responsabilidade dos governos estaduais do PSDB em relação à crise da água de São Paulo (SP) Na mesma semana que o Sistema Cantareira começa a operar no negativo, utilizando parte do “volume morto” do reservatório, mais de mil pessoas ligadas a movimentos sindicais, sociais e estu-

“Não temos dúvida que isso está ocorrendo graças à política neoliberal imposta pelos tucanos à Sabesp, que prioriza as remessas de lucros aos acionistas privados em detrimento dos serviços à população”

dantis se reuniram no dia 5 de junho, em São Paulo, para denunciar a responsabilidade dos governos tucanos em relação à crise da água no estado. Com concentração na Praça Victor Civita, no bairro de Pinheiros, o protesto seguiu por volta do meio dia à sede da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), onde diversos relatos apresentaram os problemas reais que cercam a estatal, como falta de investimentos, desperdícios e privatizações. Falta de investimento Desde o ano de 1985, a companhia não investe em novos mananciais. Entretanto, esta falta de investimento não se justifica nos balanços econômicos. Entre 2005 e 2013, os lucros da Sabesp ultrapassaram a casa do R$ 13 bilhões. Uma das explicações pode ser retirada dos valores destinados aos dividendos distribuídos. Em 2013, com lucro líquido de R$ 1,923 bilhão de reais, a Sabesp destinou R$ 534,5 milhões aos acionistas privados, que detêm 49% do capital da empresa. Para o coordenador do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Ubiratã de Souza, esta situação está intimamente ligada ao processo de privatização ao qual a Sabesp foi submetida. “Não temos dúvida que isso está ocorrendo graças à política neoliberal imposta pelos tucanos à Sabesp, que prioriza as remessas de lucros aos acionistas privados em detrimento dos serviços à população”.

Atualmente, diversos bairros da capital e outras cidades do interior paulista já sofrem com o racionamento de água, que segundo a própria Sabesp pode se agravar com o esvaziamento completo da Cantareira, previsto para outubro.

“Em vez de investir em tecnologia e nos seus próprios funcionários, o governador Alckmin prefere entregar para a iniciativa privada aquilo que é de sua responsabilidade”

O presidente da CUT em São Paulo, Adi dos Santos Lima, também afirmou que o problema está no modelo de gestão do governo tucano. “Em vez de investir em tecnologia e nos seus próprios funcionários, o governador Alckmin prefere entregar para a iniciativa privada aquilo que é de sua responsabilidade”. Durante o ato, o governo estadual se recusou a receber o documento elaborado pelos movimentos que cobram medidas do secretário estadual de Recursos Hídricos, Mauro Arce. A única sinalização de diálogo foi o agendamento de uma reunião para o próximo dia 2 julho. (Página do MAB, com informações da CUT)

MOBILIZAÇÃO

Governo atende propostas de movimento por moradia em SP MST

SEM TETO Três reivindicações foram atendidas, entre elas, a construção de moradias na ocupação Copa do Povo, em Itaquera (SP); considerada uma ‘grande vitória’, MTST não fará mais protestos contra a Copa

“As conquistas alcançadas não trarão benefício somente para as milhares de famílias organizadas pelo MTST, mas também para as milhões que sofrem com o problema da moradia no Brasil”

da Redação PROTAGONISTA dos últimos protestos que mobilizaram milhares de pessoas em São Paulo, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) saiu vitorioso nas negociações com o governo federal. Das seis reivindicações propostas pelo movimento, três foram atendidas. Entre elas, está o projeto para a construção de cerca de 2 mil moradias no terreno da ocupação Copa do Povo, localizado em Itaquera, Zona Leste da capital, próximo a Arena Corinthians, onde ocorre a abertura da Copa do Mundo, dia 12 de junho. Além disso, o programa federal Minha Casa Minha Vida será modificado. Hoje as entidades de movimentos por moradia podem construir mil unidades de

Semana passada, o representante do MTST, Guilherme Boulos, chegou a afirmar que, caso não houvesse avanço nas negociações, o movimento iria “radicalizar” os protestos durante o Mundial. Como a metade das propostas foi aceita, o movimento não fará mais protestos contra a Copa, mas permanecerá nas ruas para pressionar a votação do Plano Diretor.

“Copa do povo”, ocupação do MTST em Itaquera (SP)

forma simultânea. Com a mudança, poderão ser construídas 4 mil unidades simultaneamente. Dessa forma, das 800 mil unidades do programa previstas, as entidades poderão construir 80 mil. O anúncio foi feito nesta segunda-feira (9/6) em coletiva realizada no centro da capital paulista.

Sobre o Plano Diretor da cidade de São Paulo, outra reivindicação do movimento, a presidência da Câmara Municipal ficou de realizar, na tentativa de acelerar a segunda votação. Líderes dos movimentos de moradia vão se reunir com vereadores para pressionar por uma data final do plano.

O governo federal se comprometeu em anunciar por meio de declaração pública os compromissos firmados com o MTST. Em nota, o movimento considerou o resultado “uma grande vitória”. “As conquistas alcançadas não trarão benefício somente para as milhares de famílias organizadas pelo MTST, mas também para as milhões que sofrem com o problema da moradia no Brasil”.


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