XLIV CONGRESSO DA SOBER “Questões Agrárias, Educação no Campo e Desenvolvimento”
CENÁRIOS DE LONGO PRAZO PARA A CAFEICULTURA BRASILEIRA: 20062015 GLAUCO RODRIGUES CARVALHO; ARYEVERTON FORTES DE OLIVEIRA; CLESIANE OLIVEIRA; EMBRAPA MONITORAMENTO POR SATÉLITE CAMPINAS - SP - BRASIL glauco@cnpm.embrapa.br APRESENTAÇÃO SEM PRESENÇA DE DEBATEDOR ADMINISTRAÇÃO RURAL E GESTÃO DO AGRONEGÓCIO
Cenários de longo prazo para a cafeicultura brasileira: 2006-2015 Café no Brasil: projeção 2006-2015
Grupo de Pesquisa: 2 - Administração Rural e Gestão do Agronegócio
RESUMO O Brasil é o maior produtor mundial de café, seguido pelo Vietnã e pela Colômbia, nessa ordem. Ao contrário de outros países produtores, que pela própria extensão têm menor área cultivada, no Brasil também existem diferentes espécies e cultivares que possibilitam a fabricação de variados blends. A dinâmica dos preços internacionais está atrelada aos movimentos de oferta nestes grandes produtores. A formulação de políticas cafeeiras no Brasil podem afetar os ciclos de produção e de preços internacionais carecendo assim, de ações bem coordenadas em prol da cadeia agroindustrial do café. O café é um dos mais tradicionais produtos da agricultura brasileira teve grande influência no processo de industrialização. Também contribui para a geração de receitas cambiais, transferência de renda a outros setores da economia, formação de capital do setor agrícola e emprego de mão-de-obra, este principalmente em regiões inaptas a mecanização da lavoura.lavoura. Nas últimas três safras a produção de mundial de café ficou aquém do consumo, o que traduziu em redução dos estoques mundiais e patamar médio de preços mais elevado. O consumo de café que tem crescido mais fortemente nos últimos anos. e Oo Brasil precisa 1 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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pensar nesta expansão e desenvolver estratégias de aumento de participação no mercado mundial. . O objetivo deste trabalho foi elaborar projeções de longo prazo para a cafeicultura brasileira e mundial. Foram feitas hipóteses de crescimento e distribuição de renda e estudos de elasticidade-renda para a estimativa de demanda interna de café. Para as exportações de café, foram adotadas algumas premissas considerados cenários de participação do Brasil no mercado mundial. Por fim, foram elaborados cenários de produção e área plantada com café no Brasil. Espera-se, dessa forma, contribuir para o planejamento de longo prazo da política cafeeira. Estes resultados também podem ser úteis para a cadeia de fornecedores, auxiliando na identificação de demanda de insumos para o médio e longo prazo. . Palavras-chave: café, elasticidade-renda, projeções, consumo, exportação
2 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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1. INTRODUÇÃO Este trabalho procura elaborar trata da questão de projeçõesão de valores para a área plantadao plantio, a a produção, a exportação o comércio e o consumo de café no Brasil e para produção, exportação e consumo no mundialo. O horizonte de tempo considerado foi de dez anos (2006 a 2015). Estimativas auxiliares foram realizadas para ganhos de produtividade médios, elasticidade-renda do consumo de café leite e derivados e variáveis macroeconômicas como inflação, crescimento do PIB e do rendimento das famílias. A definição de tais valores constitui um importante subsídio para o estabelecimento de políticas públicas e estratégias privadas. Espera-se contribuir para o planejamento da política cafeeira no Brasil e a gestão do uso e cobertura das terras, indicando inclusive qual deverá ser a modificação na área plantada de café nos próximos anos. A cafeicultura contribui significativamente para a geração e a distribuição de renda na economia brasileira, justificando os esforços na obtenção dessas estimativas. O setor auxilia na geração de receitas cambiais, na transferência de renda a outros setores da economia, na formação de capital do setor agrícola e no emprego de mão-de-obra. O Brasil é o maior produtor mundial de café, seguido pelo Vietnã e pela Colômbia, nessa ordem. Mesmo entre esses países o Brasil é estrategicamente bem situado no contexto da cafeicultura mundial, conseguindo interferir nos resultados do mercado global ao produzir, em larga escala, as duas principais espécies de café: arábica e robusta. Ao contrário de outros países produtores, que pela própria extensão têm menor área cultivada, no Brasil também existem diferentes espécies e cultivares que possibilitam a fabricação de variados blends, uma alternativa para a diferenciação dos produtos e agregação de valor. A dinâmica dos preços internacionais está intimamente atrelada aos movimentos de oferta nos três maiores produtores mundiais. A formulação de políticas cafeeiras das safras desses no Brasil países, e se bem formuladas, as políticas para a cafeicultura brasileira podem afetarpode afetar os ciclos de produção e de preços internacionais, carecendo assim, de ações bem coordenadas em prol do desenvolvimento da cadeia agroindustrial do café. produção nacional. Ao contrário de outros países produtores, que pela própria extensão têm menor área cultivada, no Brasil também existem diferentes espécies e cultivares que possibilitam a fabricação de variados blends, uma alternativa para a diversificação dos produtos e agregação de valor. Nas últimas três safras a produção de mundial de café ficou aquém do consumo, o que traduziu em redução dos estoques mundiais e patamar médio de preços mais elevado. O consumo de café tem crescido mais fortemente nos últimos anos, com destaque para o Oriente Médio, Japão e Europa Oriental. Torna-se necessário, portanto, um incremento da produção mundial compatível com a expansão do consumo. O Brasil, como líder na oferta internacional de café e com uma visão de gestão territorial, precisa pensar nesta expansão e elaborar estratégias para aumentar sua participação no comércio mundialquantificar a necessidade de novas áreas para plantio. Além da introdução, este trabalho conta ainda com outras quatro partes: uma breve revisão da literatura sobre estudos de projeção, de elasticidade e do mercado de café; descrição dos aspectos metodológicos com as devidas hipóteses e modelos utilizados para o mercado brasileiro e mundial; discussão dos resultados e por fim, a conclusão. 2. REVISÃO DA LITERATURA
3 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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Projeções de oferta e da procura de alimentos são fundamentais para se compreender os rumos do setor agropecuário nacional, no aprimoramento do desempenho de sua função de fornecedor de alimentos, matérias-primas, fibras e reservas cambiais. Sugai et al (1998) procurou determinar a elasticidade-renda da demanda de cinco importantes grãos produzidos no Brasil: arroz, feijão, milho, soja e trigo. Com estas estimativas, mais a taxa de crescimento anual da população do país, foram projetadas as quantidades necessárias destes grãos até 2005. Na mesma direção, Contini et al (2005) projetou a expansão de vários produtos do agronegócio mundial e brasileiro. Foram utilizados relatórios de instituições de pesquisa internacionais, como United States Depatment of Agriculture (USDA) e Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD), com projeções de comercio mundial e demanda de alimentos. Os mercados analisados foram: arroz, algodão, açúcar, café, etanol, feijão, mandioca, soja, trigo e carnes. Para o caso do café, foi projetado apenas as exportações brasileiras, que segundo o estudo deverá atingirchegar a 29 milhões de sacas em 2014/2015. Para o consumo mundial, as projeções do Neumanm, Gruppe Gmbh (2005) in Contini (2005), indicam que o consumo mundial de café continuará a crescer em 1,9 % a.a., de 118,9 milhões de sacas em 2005 para 144,6 milhões de sacas em 2014. Moricochi (2004) elaborou cenários de consumo mundial de café até 2010, que variaram de 124,7 milhões de sacas de 60 kg a 130,8 milhões de sacas. Não houve, entretanto, projeção para o mercado brasileiro, uma lacuna que este trabalho tenta preencher. Para tanto, foram também obtidas estimativas da elasticidade-renda da demanda, conforme metodologia descrita na próxima seção. A contribuição de trabalhos como o de Hoffmann (2000a, b) e Bertasso (2000) tem sido relevante para a compreensão dos padrões de consumo de alimentos pelas famílias brasileiras, bem como para a tentativa de gerar estimativas atualizadas de elasticidadesrenda de demanda para esses produtos. Especificamente para o caso do café, estudo da Organização Internacional do Café (OIC, 2004) sobre o consumo nos países tradicionalmente importadores concluiu que o consumo de café apresenta baixa elasticidade-preço da demanda, ou seja, a queda dos preços do café não resulta num aumento do consumo. A melhoria da qualidade do café, com critérios que incluem o teor de cafeína, o sabor e o aroma, porém, serve de catalisador do consumo mundial. , criando produtos substitutos cuja elasticidade-preço é mais significativa na demanda. Complementar a essa constatação, verificou-se no mercado brasileiro que o consumo de café reage a variações na qualidade e é pouco sensível a preço, segundo a Associação Brasileira da Indústria do Café (ABIC, 2003). Normalmente, a variável preço é mais relevante em países sem tradição de consumo de café, como os países do Leste Europeu e China. Em mercados mais maduros, como o do Brasil, o fator preço perde importância. Por outro lado, o consumo de café responde mais intensamente a variações na renda. Um bom exemplo é o crescimento das vendas após o Plano Real, que ocorreu mesmo tendo havido um significativo aumento dos preços do café no varejo a partir de 1994. A elevação dos preços da matéria-prima, em função da restrição da oferta, não reverteu o processo de recuperação do consumo nacional. Entre 1990 e 1994, o consumo de café no Brasil cresceu 3,2% ao ano, bem abaixo do crescimento de 7,0% ao ano de 1994 a 1998, de acordo com dados da ABIC. A produção mundial de café em 2005/2006 deve ficar próxima de 108,0 milhões de sacas de 60 kg, 6,0% menor que as 114,9 milhões de sacas produzidas em 2004/2005 (OIC, 4 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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2006). O Brasil é o maior produtor mundial, com 30,0% desse volume produzido. Em termos de produção exportável de café verde existe uma expressiva participação do Brasil, que entre 2000 e 2006 oscilou entre 22% e 40% do total do mundo, segundo dados do FAS/USDA, apresentado na tabela 1. Tabela 1 - Produção exportável em países e regiões específicas (mil sacas de 60 kg) Região e País América do Norte América do Sul Brasil ColombiaColômbia África Ásia e Oceania Vietnam
2000/01 15983 33635 21000 8970 15027 27365 14916
2001/02 13568 35109 21400 10360 12047 23096 12333
2002/03 13326 53915 40100 10452 11077 21258 10667
2003/04 13989 30662 17600 9798 10110 24732 14467
2004/05 12662 40718 27100 10240 12374 24501 13500
2005/06 13713 34044 20500 10340 12100 22617 11417
Total geral
92010
83820
99576
79493
90255
82474
Fonte: FAS/USDA (2005). Além disso, o Brasil produz café de forma mais competitiva do que seus principais concorrentes, inclusive o Vietnã. A figura 1 apresenta o custo de produção para os diferentes países exportadores de café. Figura 1 - Custo de produção do café em países selecionados (2002) - (U$/kg) 140 120 100 80 60 40
Costa Rica
El Salvador
Venezuela
Colômbia
Guatemala
México
Equador
Etiópia
Kenya
Honduras
Nicaragua
Peru
Pápua NG
Índia
Tanzânia
Brasil
20
Fonte: TechnoServe (2003); Brasil, Conab (2004). Figura 1 - Custo de produção do café em países selecionados (2002) - (U$/kg) Na última década houve grande evolução da oferta de café, sobretudo oriunda do Vietnã e do Brasil. No período de 10 anos (safra 1992/93 a safra 2002/03), a produção mundial de café robusta cresceu cerca de 4,5% ao ano, enquanto a produção de arábica aumentou 2,3% ao ano. Para o primeiro tipo, destaca-se a presença do Vietnã, com incremento anual médio de 15,9%, e do Brasil com elevação de 9,6%. Para o café arábica, a oferta anual brasileira aumentou 7,5%, enquanto no resto do mundo houve recuo de 0,8% ao ano (Figura 2). Pode-se constatar, portanto, que o Brasil ocupou uma posição de destaque na expansão da produção mundial de café arábica e de café robusta. Figura 2 - Produção mundial de café arábica e robusta
5 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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Café Arábica (milhões sacas 60 kg)
Café Robusta (milhões sacas 60 kg) Cresc. anual
Brasil Resto do mundo
65
82
39
2,3%
Vietnã Brasil Resto do m undo
43
4,5%
10
+ 15,9%
2 5
12
+ 9,6%
21
21
+ 0,3%
1992-93
2002-03
28
+ 7,5%
19
46
44
1992-93
2002-03
Cresc. anual
- 0,8%
Fonte: USDA (2005) Figura 2 - Produção mundial de café arábica e robusta (milhões de sacas 60 kg) A distribuição espacial da área plantada com café sofreu algumas modificações (Figura 03). No período de 1990 a 2003 houve crescimento do plantio, principalmente em Rondônia, Espírito Santo, Oeste da Bahia e Norte de Minas Gerais. Por outro lado, em São Paulo e no Paraná, a área destinada a cultura do café perdeu espaço para outras lavouras como cana-de-açúcar, laranja e soja. No geral, a área plantada com café no paísBrasil recuou cerca de 18% entre 1990 e 2003. A produção, por sua vez, apresentou aumento de 36% devido a ganhos de produtividade. Figura 01 - Distribuição espacial da área plantada de café no Brasil por microrregião (ha)
Fonte: IBGE (2006). Elaboração Embrapa Monitoramento por Satélite.
Figura 03 - Distribuição espacial da área plantada de café no Brasil por microrregião (em ha)
6 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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3. METODOLOGIA 3.1. Hipóteses para as perspectivas econômicas1 No horizonte de análise do presente trabalho, a questão que se coloca é se o Brasil continuará crescendo nos próximos anos. O grande desafio para os condutores da economia brasileira está em assegurar fundamentos econômicos para manutenção da estabilidade dos preços e concentrar seus esforços nos condicionantes do crescimento e desenvolvimento do país. Ou seja, além da gestão macroeconômica de curto prazo, o governo precisa implementar uma estratégia de médio e longo prazo que permita superar algumas restrições estruturais da economia brasileira, que têm impedido uma trajetória de crescimento sustentado. Essa estratégia teria que concentrar-se, basicamente, em três áreas: setor externo; finanças públicas e reforma do Estado. No setor externo, é imprescindível que o país continue a diminuir sua dependência da entrada de capitais externos, via investimento estrangeiro direto e financiamento, para fechar seu balanço de pagamentos. A história recente mostra que, cada vez que a situação financeira internacional se deteriora, impõe-se a restrição externa ao crescimento. Esse relativamente elevado endividamento externo, diante da capacidade de geração de divisas, também faz com que o patamar da taxa de juros no país tenha que ser mais elevado, pela necessidade de atrair capitais para garantir o financiamento do balanço de pagamentos. Como o estoque de passivo externo é um dado, assim como suas obrigações, a única maneira de superar esse desajuste é o país ampliar sua capacidade de geração de divisas, ou seja, aumentar sua competitividade frente ao exterior. Inequivocamente, o Brasil melhorou muito nesse quesito, no período recente, com o setor privado, de fato, introjetando o mercado externo nas suas estratégias de crescimento. Os efeitos de nossas vendas externas como fator indutor do crescimento do PIB e do investimento, são crescentes. Entretanto, aumentar a competitividade da economia brasileira frente aos seus principais parceiros internacionais passa necessariamente pelo aumento da taxa de investimentos, sejam eles diretamente no desenvolvimento de produtos e processos, sejam eles em infra-estrutura. Para isso, supõe que se desenvolvam mecanismos de financiamento de médio e longo prazo no mercado interno e uma taxa de juros de longo prazo em patamar mais razoável e atrativa do ponto de vista dos investimentos. Além disso, os investimentos, principalmente na área de infra-estrutura, não acontecerão se não houver um marco regulatório adequado, bem fundamentado juridicamente e com regras estáveis. Contribuem também para aumentar a competitividade dos produtos brasileiros a melhoriaa competitividade dos produtos brasileiros à melhoria no sistema educacional do país, a maior ou menor capacidade governamental em promover e estimular a capacitação tecnológica e avanços nas mudanças tributárias que desonerem mais a produção, diminuindo ou até eliminando os impostos em cascata. Todas as medidas apontadas são conhecidas, embora não de implementação fácil, principalmente se o governo não possuir um plano mais global formatado e consensual . Como os resultados são necessariamente lentos, qualquer governo que assuma e queira efetivamente ampliar a competitividade da economia brasileira para superar a restrição externa ao crescimento, terá que começar a trabalhar nessa direção, de maneira articulada e persistente, nas várias áreas de governo envolvidas. No campo das a área das finanças públicas, o governo tem que intensificar uma lista importante de tarefas. Já se caminhou no ajuste nas contas primárias do governo federal e, 1
Baseado em relatórios da Consultoria MB Associados. 7 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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por meio da aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, impôs-se e institucionalizou-se essa disciplina em todas as esferas de governo. Para a frente, será preciso tornar este ajuste menos frágil. Isto porque baseou-sese baseou essencialmente em aumento de receita e corte de gastos com investimentos, acompanhado de um incremento importante da carga tributária, que desestimula a produção. A contenção dos gastos públicos foi feita através de menores volumes de investimentos, dada a enorme dificuldade em cortar gastos correntes e, especialmente, gastos com pessoal e encargos sociais. É necessário que o governo avance no reordenamento das finanças públicas para que o ajuste das contas primárias seja não só sustentável no tempo, mas também compatível com uma estrutura de gastos em favor do desenvolvimento. Do lado das receitas, isso significaria uma reforma tributária que redirecionasse a estrutura da arrecadação em prol do aumento da competitividade da economia brasileira, diminuindo a carga tributária sobre a produção, ampliando a base arrecadadora e combatendo a sonegação. Do lado das despesas, é necessário partir para uma efetiva reforma da estrutura de gastos. Alterar isso é um processo de longa duração, que não se esgota no mandato de um governo. A implantação de uma gestão fiscal com essa preocupação, associada à superação da vulnerabilidade externa, seria a condição fundamental para diminuir o patamar da taxa de juros no Brasil para “níveis civilizados”, pois reduziria riscos estruturais do país e melhoraria a situação fiscal do governo, abrindo espaço para um ritmo de crescimento econômico mais intenso e sólido. Nos últimos anos, o Brasil avançou no sentido de desenvolver mecanismos de controles financeiro-administrativos e dar maior transparência à gestão pública. Lei de Responsabilidade Fiscal, Agências Reguladoras e outros aconteceram mas, mas de modo heterogêneo e diferenciado em termos de áreas e regiões. Para a trajetória desejada de crescimento sustentado, onde o Estado tem um papel a desempenhar, é necessário que o esforço de racionalização da estrutura pública continue, mas também associado a uma melhora na cobertura e qualidade dos serviços públicos. O país necessita de Estado reestruturado, oferecendo melhores serviços públicos, apesar de recursos limitados, e com melhor capacidade operacional. Assim, além da adequada gestão macroeconômica de curto prazo, que mantenha a inflação sob controle, retomar uma trajetória de crescimento no Brasil supõe capacidade de avançar nas três áreas acima citadas. Obviamente, alguns obstáculos comprometem mais que outros. Os cenários apresentados neste trabalho se diferenciam exatamente pelo seu maior ou menor êxito no encaminhamento dessa agenda. Por fim, espera-se um cenário internacional dentro da normalidade. A hipótese básica é a de que a economia norte-americana continuará comandando a economia mundial, enquanto a China será um coadjuvante fundamental para o crescimento do mundo como um todo. 3.2. Projeções de café A demanda de café para os próximos 10 anos foi estimada, separadamente, em dois conjuntos: consumo doméstico de café e exportações. Para o consumo internacional foi realizada uma projeção linear dos valores observados a partir de 1994. Para projetar a demanda interna de café, considerou-se os três componentes básicos da demanda: (i) crescimento populacional; (ii) crescimento e distribuição da renda; e (iii) elasticidade-renda da demanda. 8 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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Crescimento Populacional É possível descrever o comportamento demográfico de uma Região com base em três variáveis: (i) taxa de fecundidade, que resulta na entrada de pessoas por meio dos nascimentos; (ii) taxa de mortalidade, que contabiliza a saída de indivíduos por morte, sendo a expectativa de vida da população o número que sintetiza a tabua de mortalidade da população; e (iii) migração, que pode atuar nos dois sentidos, aumentando ou diminuindo a população de um determinado país, caso predomine a imigração ou emigração. A tabela 2 sintetiza os números utilizados no trabalho. Tabela 2. Premissas utilizadas nas projeções demográficas Ano Taxa de Fecundidade Expectativa de Vida Migração (filhos por mulher) (anos) (nº pessoas) 1998 2,43 69,6 0 2003 2,33 71,3 0 2010 2,20 73,4 0 2015 2,12 74,8 0 Fonte: IBGE (2004) Com base nas informações descritas acima, o IBGE estimou o crescimento populacional do Brasil. O resultado da projeção foi aumento médio da população de cerca de 1,3% ao ano entre 2003 e 2015 (tabela Tabela 3). Tabela 3. Projeção da população brasileira Ano População Ano População Ano População (em (em (em milhões) milhões) milhões) 1998 2004 181,5 2010 166,3 196,8 1999 2005 184,1 2011 168,7 199,3 2000 2006 186,7 2012 171,2 201,6 2001 2007 189,3 2013 173,8 204,0 2002 2008 191,8 2014 176,3 206,2 2003 2009 194,3 2015 178,9 208,5 Fonte: IBGE (2004) Quanto ao número de domicílios, considerou-se que a quantidade total aumentará na mesma taxa do crescimento populacional, partindo-se do número obtido na Pesquisa Nacional de Amostras Domiciliares (PNAD - IBGE) de 2004 e Pesquisa de Orçamento Familiar (POF-IBGE) de 2002-2003. Crescimento e Distribuição da Renda Entre as variáveis consideradas neste trabalho para fazer projeções de demanda interna de café, a distribuição de renda é o item cuja variação produz o maior impacto no consumo. Isso ocorre porque o Brasil possui renda muito concentrada, com uma parcela muito grande da população carente de alimentos. Portanto, existe enorme potencial de crescimento do consumo de alimentos, principalmente se ocorrer aumento da renda domiciliar nas classes com renda mensal inferior a 3três salários mínimos. Em 1997, estes domicílios representavam 39% do total, mas eram responsáveis por apenas 22% do dispêndio total com alimentos, em valor. Em 2003 esses domicílios passaram a representar 51% dos domicílios e a consumir 34% do total de alimentos. 9 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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Duas conclusões podem ser tiradas aqui. Uma é factual: entre 1997 e 2003 aumentou em 12 pontos percentuais o número de domicílios na base da pirâmide de renda (Figura 4). A outra é que, caso volte a diminuir o número de domicílios nesta faixa (a exemplo do pós-plano Real), o consumo de alimentos crescerá. Ou seja, os primeiros anos do Plano Real permitiram uma migração de domicílios recebendo até 3três salários mínimos para classes superiores que se perdeu entre 1997 e 2003, quando uma grande massa de famílias voltou ou passou a incorporar o contingente que recebe até 3três salários mínimos. Figura 4. Domicílios por classe de renda (em Salários Mínimos) 25 1993
1995
1997
2003
20
(em %)
15
10
5
0 Até 1
Mais de 1a2
Mais de 2a3
Mais de 3a5
Mais de 5 a 10
Mais de 10 a 20
Mais de 20
Fonte: PNAD - IBGE Figura 4. Domicílios por classe de renda (em Salários Mínimos) As projeções de longo prazo se basearam em três cenários, que contemplam séries distintas de crescimento econômico e de renda familiar, conforme mostrado na tabela 4XX. É importante frisar que mesmo no cenário mais pessimista, o PIB crescerá mais do que a média entre 1997 e 2003. Isso porque estes cenários não prevêem crises estruturais mais sérias do que a crise de racionamento de 2001 e a crise eleitoral de 2002. Considerou-se que, até 2015, a renda média das famílias aumentará na razão do crescimento do PIB com o crescimento do número de famílias e que ocorrerá uma migração dos domicílios das faixas de renda mais baixas para as mais elevadas em cerca de 5% a cada ano, melhorando a distribuição de renda do país. Tabela x4x - Resumo das projeções macroeconômicas (%) 2006 Cenário 1 PIB 3,00% Renda média familiar 1,57% Cenário 2 PIB 3,31% Renda média familiar 1,88% Cenário 3 PIB 4,00% Renda média familiar 2,56% Fonte: Projeção dos autores
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2,50% 2,00% 2,00% 2,00% 2,00% 2,00% 2,00% 2,00% 2,00% 1,11% 0,65% 0,69% 0,72% 0,76% 0,80% 0,84% 0,87% 0,91% 3,82% 3,60% 3,60% 3,60% 3,60% 3,60% 3,60% 3,60% 3,60% 2,42% 2,23% 2,27% 2,30% 2,34% 2,38% 2,42% 2,45% 2,49% 4,50% 5,00% 5,00% 5,00% 5,00% 5,00% 5,00% 5,00% 5,00% 3,08% 3,61% 3,65% 3,69% 3,72% 3,77% 3,80% 3,84% 3,87%
10 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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Dados o crescimento do PIB e a distribuição dos domicílios por faixa de renda, foi possível determinar a renda média por faixa de renda para os anos de 2003 a 2015. A base de dados utilizada para calcular a melhoria da distribuição de renda foi a POF 2002-2003. Os números desta pesquisa, para participação dos domicílios por faixa de renda, divergem bastante do levantamento da PNAD, inclusive porque as faixas de renda consideradas são distintas. Comparando o perfil da distribuição de domicílios de 2003 a 2015, nota-se uma migração para as classes com renda superior a cinco5 salários mínimos. Isso caracteriza uma sensível melhora no perfil da população e pode refletir consideravelmente no potencial de consumo, embora longe de um padrão de país desenvolvido (gráfico Figura 5). Gráfico Figura 54. Domicílios por Classe classe de Rendarenda: 2003 a 2015 (em Salários Mínimos) 25
2003
2015
20
(em %)
15
10
5
0 Até 2
Mais de 2a3
Mais de 3a5
Mais de 5a6
Mais de 6a8
Mais de 8 a 10
Mais de 10 a 15
Mais de 15 a 20
Mais de 20
Fonte: POF – IBGE. Projeçãoões dos autores Figura 5. Domicílios por classe de renda: 2003 a 2015 (em Salários Mínimos) Elasticidade-renda A elasticidade-renda é um indicador que apresenta, em geral, comportamento estável ao longo dos anos, sendo, dessa forma, uma informação importante para fazer projeções de demanda por alimentos. Bertasso (2000) estimou a função consumo de grupos de alimentos pelo procedimento de Heckman, com o objetivo de analisar padrões de gastos das famílias brasileiras com esses produtos. Utilizou, para tanto, os microdados da POF de 1995-/1996. Também ajustou um modelo poligonal às médias de dez estratos de renda. Os dados da POF de 2002/-2003 serviram de base para as estimativas de elasticidades. As informações sobre o rendimento médio familiar, o número e o tamanho médio das famílias por classe de recebimento, o valor do dispêndio com os itens de alimentação foram extraídas da pesquisa. Hoffmann (2000a, b) estimou as elasticidades-renda das despesas com alimentos para as grandes regiões urbanas levantadas pela POFesquisa de Orçamento Familiar de 1995-1996, por meio da estimativa por mínimos quadrados ponderados de um modelo poligonal, ajustando os logaritmos das despesas familiares per capita a várias categorias de alimentos contra os logaritmos dos recebimentos familiares per capita. Como Pindick e Rubinfeld 11 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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(1981)Pindyck e Rubinfeld (1981) ressaltam, uma característica essencial do modelo poligonal consiste na mudança da inclinação das retas ajustadas sem quebra de continuidade. A soma dos coeficientes associados com os logaritmos dos recebimentos geram medidas de elasticidades para os diferentes estratos de renda, como feito por Hoffmann (2000a, b). A equação do modelo poligonal empregada neste trabalho para obtenção das estimativas de elasticidades para os diferentes estratos de renda consiste em: 2
ln Yi = α + β ln X i + ∑ δ h Z hi ( ln X i − ln θ h ) + ui h =1
onde X i representa o recebimento per capita no i-ésimo estrato i = 1, 2,K , 10 ; Yi é a
correspondente despesa per capita com determinado tipo de alimento; θ h é o nível de recebimento familiar per capita correspondente ao h-ésimo vértice da poligonal (com θ1 < θ 2 ) e Z hi é uma variável binária tal que Z hi = 0 para X i ≤ θ h e Z hi = 1 para X i > θ h ; ui são erros independentes com média zero e variância inversamente proporcional ao número de famílias na classe. O cálculo da elasticidade foi feito considerando três diferentes estratos de renda, que englobam as dez classes de recebimento declaradas na POF. Adotou-se essa metodologia, pois, para a maioria dos alimentos, a elasticidade-renda da demanda é inversamente proporcional a renda, sendo que, em alguns casos, torna-se negativa, ou seja, aumento da renda implica redução na quantidade demandada2. Para fazer os cálculos da demanda de café, adotou-se o seguinte procedimento: 1)Com base na POFNAD de 2002-2003, coletou-se o número de domicílios por faixa de renda, sua e sua renda média e . 2)1) Apurou-se, com dados da POF de 2003, a porcentagem da renda que as famílias, em média, desembolsam para comprar café, obtendo dessa forma, o valor total do gasto com o produto. 3)2) Calculou-se a elasticidade-renda da demanda por café. 4)3) Utilizou-se a hipótese de que a renda média dos domicílios aumentará na razão do crescimento do PIB com o crescimento do número de famílias de renda domiciliar mantendo a mesma proporção no PIB e que até 2015 os domicílios das faixas de renda mais baixas migrariam para as mais elevadas na metade da proporção (5%) que ocorreu entre 1993 e 1995, período que leva em consideração todo o efeito do Plano Real. 5)4) Quanto ao número de domicílios, foi considerado que a quantidade total irá aumentar na mesma taxa que o crescimento populacional. 6)5) Com o número total de domicílios, sua distribuição por faixa de renda e o crescimento da renda total, calculou-se a renda domiciliar média, por faixa de renda, até 2015. 7)6) Foi considerado Considerou-se que os domicílios irão gastar a mesma quantia, em termos reais, que gastavam no ano base, acrescida do efeito do aumento da renda média sobre o consumo de café (esse efeito irá variar de acordo com a elasticidade-renda da demanda de cada estrato de renda). 8)7) O resultado foi o aumento do consumo de café até 20153.
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2 Esses produtos são classificados na literatura econômica como bens inferiores (Pindyck e Rubinfeld, 2002). 3 Ao fazer esse exercício, algumas hipóteses simplificadoras foram adotadas: (i) não ocorrerão mudanças significativas nos hábitos alimentares da população, em relação ao observado na POF de 2003; (ii) número de pessoas e o perfil etário por domicílio não se irão alterar; e (iii) como todo o cálculo foi feito em valor, 12 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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9)Para o consumo em quilos, utilizou-se procedimento semelhante ao anterior, sendo o consumo de café para o ano base de 2005 retirado da ABIC. A elasticidade-renda nesse caso foi definida como o impacto percentual na demanda em quilos de um aumento percentual da renda do indivíduo.
Exportação de café Para as No caso das exportações de café,, foram feitas análises qualitativas baseadas em estudos e projeções de demanda e volume de comércio mundial. Assim, pProjetou-se então, o volume de exportações mundiais com baseado em na série temporal e na sua proporção em relação a produção mundial. o volume de exportações mundiais. Dada a posição de liderança do Brasil neste mercado e sua elevada competitividade ante outros países exportadores, foram i consideradaos premissas ou-se cenários alternativos ou-se cenários alternativas de participação do país Brasil nas exportações mundiais. Para o Cenário 1 a participação brasileira foi mantida nos atuais 30%atual do Brasil nas exportações mundiais, atualmente em 30%, foi mantida. Para No Cenário 2, utilizou a hipótese de a hipótese é de que a participação brasileira no mercado mundial aumentearia gradativamente dos atuais 30% até chegar a para 35% em 2015. Por fim, o Cenário 3 considera um aumento mais significativo da presença brasileira, atingindo 40% das exportações mundiais (Tabela 5). Tabela 5 – Premissas de participação do Brasil nas exportações mundiais de café (%)
Ano-safra Cenário 1 2005/2006 30% 2008/2009 30% 2010/2011 30% 2012/2013 30% 2015/2016 30% Fonte: Projeção dos autores
Cenário 2 30% 32% 33% 34% 35%
Cenário 3 30% 34% 36% 38% 40%
Produção e área plantada de café Com base nas informações de consumo interno de café e exportações chegou-se ao volume de café produzido no Brasil. Utilizou-se um modelo de tendência para a previsão de produtividade média e por fim, estimou-se a área plantada necessária para suportar a mudança na produção. A produção mundial foi projetada a partir de um modelo de regressão linear com variáveis de tendência e dummies para refletir o ciclo bianual do café e para descontar valores de eventos pontuais como fortes geadas e secas.
4. Resultados e discussão 4.1. Panorama mundial
considera-se que os preços dos produtos alimentares manter-se-ão constantes, em termos reais, nos próximos 10 anos.
13 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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Para o consumo mundial, uma projeção linear de crescimento no tempo mostrou-se consistente com o comportamento da série de valores ao longo dos anos de 1971 a 2005. Para a produção mundial de café, alguns fatos transparecem noa gráfico figura 6XXX.. O primeiro é que existe uma tendência sólida de crescimento ao longo do tempo. Em segundo lugar, a produção se comporta alternando elevações e quedas ao longo dos anos, devido principalmente às oscilações da safra brasileira que apresenta um ciclo bianual. No entanto, verifica-severificam-se elevações ou quedas mais acentuadas quando precedidas por períodos de desempenho inferior ou superior da produção em relação ao consumo. Isso porque em períodos de produção acima do consumo ocorre recuperação dos preços e melhoria de tratos nas lavouras, que reflete em melhor produção no período seguinte. Dado que nos últimos três anos a produção mundial permaneceu abaixo do consumo, espera-se uma recuperação da mesma em 2006, que a torne superior ao consumo mundial projetado. O consumo mundial deverá apresentar um crescimento médio de 1,7% ao ano entre 2005 e 2015, atingindo cerca de 137,2 milhões de sacas de 60 kg no final do período (Figura 6gráfico XX7). A produção deverá apresentar um comportamento parecido, porém com um taxa média anual ligeiramente superior, de 2,1% ao ano. Para 2015, a produção de café foi projetada em 132,3 milhões de sacas após atingir 138,5 milhões de sacas no ano anterior, conforme o comportamento bianual. O crescimento médio anual da produção Esse equilíbrio entre produção e consumo, caso confirmado, deverá garantir certa sustentação aos preços do café ao longo dos próximos anos. A projeção das exportações é diretamente relacionada com as projeções para a produção mundial, devido a dois fatores. O primeiro fator, os valores acumulados entre 1971 e 2005 revelam que 77% do volume total produzido destinou-sedestinaram-se às exportações. O segundo fator, transparecido na figura 76o gráfico XXX, é a evolução conjunta dos valores de produção e exportações ao longo dos anos. Assim, em anos de excedente de produção geralmente ocorre recomposição dos estoques nos países importadores para uma posterior utilização nos anos de produção mais baixa. Para 2015, projeta-se uma exportação mundial de 103,8 milhões de sacas e um crescimento médio anual de 1,85% entre 2005 e 2015. Figura 7Gráfico xx – Produção, consumo e exportação mundial de café: 1971 a 2015 (milhões de sacas de 60 kg)
(milhões de sacas 60 kg)
160 Exportação
140
Produção
Consumo
120 100 80 60 40 20 2013
2010
2007
2004
2001
1998
1995
1992
1989
1986
1983
1980
1977
1974
1971
0
Fonte: Projeção dos autores, a partir de dados da OIC Figura 6 – Produção, consumo e exportação mundial de café: 1971 a 2015 (milhões de sacas de 60 kg) 14 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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4.2. Panorama Nacional Consumo No que tange ao consumo interno de café, alguns resultados interessantes podem ser observados. O principal deles é que o crescimento econômico com melhoria na distribuição de renda é uma condição necessária mas, mas não suficiente para um salto mais significativo do consumo interno de café nos domicílios. Isto pode ser atribuído ao fato deste produto apresentar uma elasticidade renda muito baixa, principalmente nas camadas da população com renda mais elevada (Tabela 6). Tabela 6 – Elasticidade-renda da demanda de café, por estrato de renda Tipo de despesa R2 Elasticidade no estrato I II III CafeCafé 0,9003 0,10 -0,06 0,01 moidomoído Fonte: Elaboração dos autores Analisando separadamente o efeito do crescimento econômico e o da melhoria da distribuição de renda sobre o consumo de café, verifica-se que o segundo apresentou impacto maior, ainda que pouco expressivo no horizonte de tempo analisado. Ou seja, considerando um cenário de crescimento econômico nulo e comparando com o Cenário 3 (crescimento de 5,0% ao ano), verificou-se que neste último o consumo de café foi superior em apenas 350 mil sacas. Resultado semelhante é observado na comparação dos três cenários de crescimento da economia com hipótese de distribuição de renda. , ou seja,O o consumo interno de café para o cenário mais otimista supera em apenas 240 mil sacas de 60 kg o consumo do pior cenário (Tabelas 7 e 8). Por outro lado, a incorporação ou não da melhoria na distribuição de renda no modelo (com o crescimento da economia fixo) gerou um diferencial no consumo superior a 760 mil de sacas conforme apresentado na tabela 7. A tabela X5X mostra o consumo interno de café com e sem distribuição de renda. Podese verificar que há aumento do consumo quando se incorpora ao modelo uma melhoria na distribuição de renda das famílias. Todavia, esse diferencial é muito pequeno. Tabela 75XX – Consumo interno de café em 2015/2016 com e sem hipótese de melhoria na distribuição de de renda (sacas de 60 kg) Com distribuição Sem distribuição Cenários de renda de renda (a)/(b) (a) (b) Cenário 1 18,45 17,67 4,4% Cenário 2 18,58 17,81 4,3% Cenário 3 18,69 17,93 4,2% Fonte: Elaboração dos Aautores
Resultado semelhante é observado na comparação avaliação dos três cenários de crescimento da economia com hipótese de distribuição de renda, ou seja, o consumo interno de café para o cenário mais otimista supera em apenas 240 mil sacas de 60 kg o consumo do pior cenário. 15 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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Portanto, para um crescimento mais robusto do consumo de café será necessário adotar outras estratégias. A adoção de programas para promoção do consumo de café, difusão de novas redes de cafeterias e oferta de cafés de melhor qualidade pode ser um caminho cujos resultados serão avaliados a posteriori. Vale destacar que os resultados apresentados não incorporaincorporam estas estratégias, sendo portanto, conservadores. O modelo também não incorporou algumas mudanças de hábito como o de consumir café fora do lar. Portanto, o incremento das cafeterias poderá ser um indutor do consumo de café não captado pelas pesquisas domiciliares. Inclusive a evolução recente do consumo de café mostra que em alguns anos ele está evoluindo acima do captado pela análise de elasticidade-renda.
Exportações No âmbito das exportações, a competitividade brasileira deverá resultar em aumento do volume exportado e possivelmente aumento de participação no mercado mundial. No cenário mais pessimista (Cenário 1), que considera constante a participação brasileira nas exportações mundiais, o país poderá embarcar em 2015/2016 cerca de 31 milhões de sacas ante aproximadamente 25,96 milhões de sacas no ano-safra 2005/2006 (Tabela 8). No Cenário 2, em que a participação brasileira nas exportações mundiais cresce gradativamente até 35% no final do período analisado, o volume embarcado chegaria a 36,3 milhões de sacas. Por fim, no Cenário 3 (mais otimista) as exportações brasileiras chegariam a 41,5 milhões de sacas em 2015/2016 ou , respondendo por 40% das exportações mundiais (Tabela 6). O avanço mais significativo das exportações irá depender da melhoria de qualidade do café produzido internamente, de estratégias de agregação de valor e exportações de cafés diferenciados, da abertura de novos mercados e de programas para promover o produto brasileiro no exterior. Os cenários de participação de mercado apresentados neste trabalho se diferenciam exatamente pelo seu maior ou menor êxito no encaminhamento dessas questões. Tabela 6 – Premissas de participação do Brasil nas exportações mundiais de café (%)
Ano-safra 2005/2006 2008/2009 2010/2011 2012/2013 2015/2016 Fonte: Autores
Cenário 1 30% 30% 30% 30% 30%
Cenário 2 30% 32% 33% 34% 35%
Cenário 3 30% 34% 36% 38% 40%
Produção e área plantada 16 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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Dados os cenários de exportaçãoões e consumo de café no Brasil, pode-se então chegar nprojetar a produção doméstica de café necessária para atender estes dois mercados, conforme descrito na tabela XX87. Tabela 87XX – Produção, consumo interno e exportação de café no Brasil: 2005/2006 a 2015/2016 (milhões de sacas 60 kg) Cenário 1 Produção Consumo Exportação Produção 2005/2006 32,94 15,54 25,94 32,94 2008/2009 46,00 16,33 29,67 48,00 2010/2011 47,52 16,97 30,55 50,63 2012/2013 49,23 17,53 31,71 53,54 2015/2016 49,61 18,45 31,16 54,93 Fonte: Projeção dos autores Ano safra Cenário 1 Produção Consumo Exportação Produção 2005/2006 32,94 15,54 25,94 32,94 2008/2009 46,00 16,33 29,67 48,00 2010/2011 47,52 16,97 30,55 50,63 2012/2013 49,23 17,53 31,71 53,54 2015/2016 49,61 18,45 31,16 54,93 Fonte: Projeção dos autores
Cenário 2 Cenário 3 Consumo Exportação Produção Consumo Exportação 15,54 25,94 32,94 15,54 25,94 16,36 31,65 50,01 16,38 33,62 17,03 33,60 53,73 17,08 36,66 17,61 35,93 57,84 17,68 40,16 18,58 36,35 60,23 18,69 41,54 Cenário 2 Cenário 3 Consumo Exportação Produção Consumo Exportação 15,54 25,94 32,94 15,54 25,94 16,36 31,65 50,01 16,38 33,62 17,03 33,60 53,73 17,08 36,66 17,61 35,93 57,84 17,68 40,16 18,58 36,35 60,23 18,69 41,54
Seguindo a tendência temporal a produtividade média da cafeicultura brasileira deverá chegar próxima de 25 sacas por hectare no final do período analisado, conforme o figura 78gráfico XX. A evolução histórica da produtividade da cafeicultura brasileira foi surpreendente. Pegando Utilizando a média de dois anos consecutivos de a produtividade (para suprimir o efeito da bianualidade) e comparando no tempo verifica-se um importante crescimento. Emédia de dois anos pode-se verificar um aumento de 81% entre 1992/19931993/1994 e 2004/2005-2005/2006 houve incremento de 81% na produtividade média, devido a inúmeros fatores que incluem melhoria de tratos culturais, cultivares mais produtivas, aumento do número de plantas por hectare, entre outros. Até 2015/2016 esperase um novo aumento, de 49%. Existe uma grande disparidade tecnológica entre os sistemas de produção no Brasil, variando entre produtores e entre regiões. Na safra 2004/2005, por exemplo, enquanto a produtividade média em São Paulo foi de 28,7 sacas de 60 kg/ha, em Minas Gerais foi de 18,7, no Espírito Santo foi de 13,4 e em Rondônia de 9,4 sacas/haá, de acordo com informações dasegundo dados da Conab. Portanto, a incorporação gradativa de novas tecnologias, como já vem ocorrendo, pode incrementar a produtividade média para o patamar previsto ou até superar a previsão.
Gráfico Figura 8XX – Evolução da produtividade do café no Brasil (60 kg/ha)
17 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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25
(60 kg/ha)
20 15 10 5
19 92 /9 3 19 94 /9 5 19 96 /9 7 19 98 /9 9 20 00 /0 1 20 02 /0 3 20 04 /0 5 20 06 /0 7 20 08 /0 9 20 10 /1 1 20 12 /1 3 20 14 /1 5
0
Fonte: Projeção dos autores Figura 7 – Evolução da produtividade do café no Brasil (60 kg/ha) Finalmente, pode-se então estimar a necessidade de área plantada com café no Brasil para os três cenários abordados. Para o Cenário 1, não haveria necessidade de expansão de área e o ganho de produtividade seria suficiente para atender ao crescimento da demanda no período analisado. No cenário 2, haveria necessidade de uma expansão de 8% na área plantada em relação a da safra 2006/2007. Já no Cenário 3 a expansão da área plantada deveria ser de 18,4% do ano safra 2006/2007 para o aaté no safra 2015/2016. O A figura 8gráfico XX mostra a evolução da área plantada nos três cenários. Gráfico XX – Evolução da área plantada com café no Brasil (milhões de ha) 2,70 2006/2007
2008/2009
2010/2011
2012/2013
2015/2016
2,55
2,50 2,40
(milhões de hectares)
2,30 2,30
2,42
2,46
2,32 2,28 2,28
2,20 2,15 2,10
2,15
2,14
2,15
2,09 2,10
1,90
1,70
1,50 Cenário 1
Cenário 2
Cenário 3
Fonte: Projeção dos Aautores Figura 8 – Evolução da área plantada com café no Brasil (milhões de ha)
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Conclusão O Brasil é o único país no mundo que possui uma produção, em larga escala, das duas principais espécies de café: arábica e robusta. Além disso, o país é líder mundial na produção e exportação e possui custo de produção abaixo do custo de seus principais concorrentes. O consumo mundial de café vem crescendo próximo a 2,0% ao ano e nas últimas três safras mundiais a produção ficou aquém do consumo, refletindo em redução dos estoques e aumento de preços. Para os próximos anos, o crescimento do consumo mundial deverá ocorrer em linha com o avanço da produção deixando a relação entre oferta e demanda bastante ajustada. As exportações mundiais tendem a continuar evoluindo a uma taxa média de 1,8% ao ano e o Brasil, respaldado por uma alta competitividade, poderá elevar sua participação no mercado mundial dos atuais 30% para até 40%, dependendo de como encaminhar questões relativas a melhoria de qualidade, agregação de valor e promoção do produto no exterior. No mercado interno, o crescimento econômico e melhoria na distribuição de renda são condições necessárias para a expansão do consumo de café, mas não suficientes. Considerando três cenários de crescimento do PIB e renda das famílias, verificou-se que o reflexo no consumo de café foi pequeno. A baixa elasticidade-renda, sobretudo nas famílias com rendimento mais elevado, impõe a necessidade de programas de incentivo ao consumo para um salto mais significativo da demanda doméstica. A expansão das redes de cafeterias e com elas o hábito de tomar café fora do lar, aliado a difusão de cafés de melhor qualidade podem fazer com que o consumo interno aumente mais do que o previsto pela análise das elasticidades. Portanto, os cenários apresentados para o consumo interno devem ser considerados conservadores. O Brasil deverá produzir em 2015 entre 49,6 milhões de sacas de 60 kg e 60,2 milhões de sacas para os cenários mais pessimista e mais otimista, respectivamente. Este resultado leva em conta o crescimento projetado na demanda interna mais as exportações. Apenas no Cenário 1 não haverá necessidade de abertura de novas áreas para o café, já que o avanço da produtividade tende a atender o incremento da demanda. Para os demais cenários será necessário aumento de área plantada, em relação aà safra 2006/2007, de 8% e de 18%. No âmbito do planejamento de longo prazo do setor cafeeiro, é fundamental a consideração dos resultados aqui destacados. Faz-se necessária uma avaliação mais detalhada dos programas de promoção do café e seus possíveis e efetivos impactos na demanda, dentro e fora dos domicílios. Somente com estes resultados pode-se analisar mais criteriosamente a dinâmica da demanda por café no Brasil e as respostas dos modelos de elasticidade-renda. a possibilidade de alteração na elasticidade-renda da demanda por café no Brasil.
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20 Fortaleza, 23 a 27 de Julho de 2006 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural