MANUAL DE COMO MORRER NO DOMINGO
E-zine Edição 1 | 2018
Tenha um sonho (quase lĂşcido) sobre festejos e incensos acendidos de frente com uma ĂĄrvore.Â
Tire tarô. Faça um jogo de 3 cartas: passado, presente e futuro. Descubra que a carta do futuro é o arcano 13, A Morte.
Passe horas dialogando no WhatsApp com uma amiga que venho falar com você por pura sincronia. Em algum momento, pergunte - às vezes você tem a sensação de morrer muito? Faça a mesma pergunta para outra pessoa, sensível ou bruta. Tanto faz.
Ă€s 15h e pouco, grave um monĂłlogo de 5 minutos sobre a morte:
Leia o texto abaixo durante o pĂ´r do sol: Ainda sobre o domingo. Ainda sobre a morte que passou por aqui para alertar que ĂŠ tempo de se transformar - de novo. Ainda sobre o diĂĄlogo de cinco minutos, qual gravei no celular. O dia morre comigo.
Os meus medos sĂŁo absurdos ou personagens de um grande drama. Hoje poesia e morte, amanhĂŁ rigidez e vida? As contas devem chegar nesta semana, acho importante frisar. Por vez, a poesia tem me salvado de tudo: do medo, das contas, dos conflitos. A poesia me faz atravessar e encontrar o olho do furacĂŁo. Hoje tudo ĂŠ morte.
O esqueleto ceifador, o arcano sem nome, o domingo. Ela veio me buscar e eu vou feliz segurando a sua mĂŁo. AmanhĂŁ eu volto pra morrer de novo outra vez.
Vá até a cozinha e prepare pipoca doce. Observe. // Em seguida sua mãe entrará nesse cenário e comunicará que a cachorra, isso mesmo a sua cachorra, morreu dormindo. Termine a pipoca, caso seu ascendente for no signo de capricórnio. Não chore, se você tiver um stellium no signo de ar. //
Lembre-se, horas depois, ainda sem chorar, que no dia 09 de janeiro de 2016 entraram 3 libélulas no corredor do teu quarto. Foi o dia em que você fez poesia sobre delicadezas, o sol e a morte. No dia seguinte, 10 de janeiro, elas amanheceram mortas no chão. Você as guardou em um pote e acessou a internet, descobriu, depois de uns cliques, que o David Bowie também tinha morrido. 10 de janeiro de 2016 foi domingo. A libélula é o símbolo da transformação.
Repita esse manual daqui 2 anos, em um domingo. Ou antes, se alguma libélula entrar na sua casa ou você tiver sonhos (quase lúcidos) sobre festejos, incensos e árvores.
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Camila Fontenele é artista visual brasileira, 28 anos, nascida na cidade de São Paulo, atualmente reside em Sorocaba. Fontenele tem bacharelado em publicidade e marketing e pós-graduação em cinema. Criadora do projeto Todos Podem Ser Frida, integrante da YVY Mulheres da Imagem, tem trabalhos na coleção do Museu de Arte Contemporânea de Sorocaba e na Roberg Galeria.
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