A representação arquitetônica do Inferno de Dante: recursos espaciais, funcionais e técnicos.
Carolina Mignon de Oliveira 11/0009932 Orientador: Pedro Paulo Palazzo
Brasília, 2017
Deixai toda esperanรงa รณ vรณs que entrais Inferno 3:9
Universidade de Brasília Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Departamento de Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo Ensaio de Teoria e História de Arquitetura e Urbanismo
E
ste documento apresenta o Trabalho Final da disciplina Ensaio de Teoria e História de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, em cumprimento com os parâmetros estabelecidos para o mesmo pelo Plano de Curso da disciplina, sendo requisito parcial para a obtenção do título de Arquiteta e Urbanista.
Carolina Mignon de Oliveira 11/0009932
Orientador: Prof. Dr. Pedro Paulo Palazzo
Banca examinadora: Prof.ª Dra. Ana Elisabete de Almeida Medeiros Prof. Dr. João da Costa Pantoja
LISTA DE FIGURAS Figura 1- Diagrama explicativo da terza rima. Ilustração de D. Hofstadter encontrada em seu livro Le ton beau de marot (ROCHA, 1999). Retirada da tradução da Divina Comédia de Helder da Rocha e redesenhado pela autora. ..........................................................................................10 Figura 2- Mapa do Inferno - Sandro Botticelli. Fonte: http://www.templarinfernobookreview.com/dan_brown_inferno_illustrations.htm ...................12 Figura 3- Canto I - William Blake. Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Blake_Dante_Inferno_I.jpg......................................13 Figura 4 - Paolo e Francesca de Rimini, 1855 – Dante Gabriel Rossetti. Fonte: http://www.tate.org.uk/art/artworks/rossetti-paolo-and-francesca-da-rimini-n03056 .................13 Figura 5- Canto I - Gustave Doré. Fonte: https://www.gutenberg.org/files/8789/8789-h/8789h.htm ..........................................................................................................................................14 Figura 6 - Sem nome - Salvador Dali. Fonte: http://revistatrip.uol.com.br/trip/a-divina-comediade-dali ........................................................................................................................................14 Figura 7 - Inferno, 1976 - Larry Niven e Jerry Pournelle. Fonte: http://www.isfdb.org/cgibin/title.cgi?1719........................................................................................................................15 Figura 8 - A Divina Comédia em quadrinhos - Piero Bagnariol. Fonte: https://issuu.com/editorapeiropolis/docs/divina_comedia ..........................................................15 Figura 9- Porta do Inferno - Auguste Rodin. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Porta_do_Inferno ..........................................................................16 Figura 10- Porta do Inferno - Auguste Rodin. Fonte: http://www.conexaoparis.com.br/2015/12/09/museu-rodin-e-seu-jardim/ .................................16 Figura 11 – Palácio Barolo. Fonte: https://theculturetrip.com/southamerica/argentina/articles/the-palacio-barolo-architecture-inspired-by-dante-s-divine-comedy/ ...................................................................................................................................................17 Figura 12 - Danteum - Giuseppe Terragni. Fonte: http://archeyes.com/danteum-giuseppeterragni/ ......................................................................................................................................17 Figura 13 - Dante's Inferno - Visceral games. Fonte: http://www2.ea.com/pt/dantes-inferno ....18 Figura 14 – Devil May Cry – 2001. Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Devil_May_Cry_(video_game) ...................................................18 Figura 15 – Tchaikovsky Piano concerto No.1. Fonte: http://www.allmusic.com/album/tchaikovsky-piano-concerto-no-1-francesca-da-riminimw0001382550..........................................................................................................................19
Figura 16 – Capa do álbum Dante XXI da banda Sepultura. Fonte: http://homoliteratus.com/literatura-e-heavy-metal-como-se-entrelacam/ ...................................19 Figura 17 – Cartaz do filme Amor além da vida. Fonte: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-17994/ ....................................................................20 Figura 18 – Cartaz do filme Dante’s Inferno. Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Dante%27s_Inferno_(1924_film) ................................................20 Figura 19 - Palavra e Imagem: As Cidades Invisíveis Ilustradas, 2017 - Arielle Cristina Martins. Fonte: https://issuu.com/ariellemartiins/docs/palavra_e_imagem_as_cidades_invis__ ..............21 Figura 20 - http://www.archdaily.com.br/br/781197/ilustracoes-das-cidades-invisiveis-de-italocalvino ........................................................................................................................................22 Figura 21 - Diagrama do Inferno. Fonte: autoria própria. ...........................................................25 Figura 22- A Itália de Dante. O mapa mostra as regiões citadas pelo autor em sua obra. Fonte: Adaptado de ALIGHIERI, 1999................................................................................................26 Figura 23- Retrato de Dante Alighieri, 1860 - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................28 Figura 24 - A Terra segundo a geografia de Dante, sem data – Held: ALIGHIERI, 1999. .........29 Figura 25 - Cosmologia da Divina comédia. Fonte: autoria própria. ..........................................30 Figura 26 - Mapa do inferno superior, sem data - Helder da Rocha. Fonte: ALIGHIERI, 1999. 32 Figura 27 - Porta do inferno, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................33 Figura 28 - Caronte e o rio Aqueronte, sem data - Gustave Doré Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................34 Figura 29 - Tecelagem medieval, sem data - Giovanni Boccaccio. Fonte:http://nemed.he.com.br/projetopandora/2015/10/29/as-mulheres/....................................35 Figura 30 - Dante e os poetas no Limbo, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................36 Figura 31 - Planta do mosteiro de O Nome da Rosa. Fonte: http://adelmomedeiros.com/semioticanomedarosa.htm ..............................................................37 Figura 32 - Dante e Virgílio no limbo, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................38 Figura 33 - Os luxuriosos, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustavedore ............................................................................................................................................39 Figura 34 - Minós, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ..40
Figura 35 - Paolo e Francesca, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................40 Figura 36 - Os Glutões - Ciacco, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................41 Figura 37 - Os ávaros e pródigos, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................43 Figura 38 - Pluto e Virgílio, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................44 Figura 39 - O Estige - Flégias, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................45 Figura 40 - O Estige - Philippo Argenti, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................46 Figura 41 – A Cidade de Dite, sem data – Gustave Doré. Fonte: //www.wikiart.org/pt/gustavedore ............................................................................................................................................46 Figura 42 - O anjo, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore .47 Figura 43 - Túmulos flamejantes - Os hereges, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................48 Figura 44 - Farinata, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ...................................................................................................................................................49 Figura 45- Krak des Chevaliers, 1229. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Krak_des_Chevaliers ...................................................................................................................................................49 Figura 46 - Gueto judaico de Praga. Fonte: http://www.praguecityline.com/wpcontent/gallery/zidovska-praha-stare/zidovske-mesto-na-pocatku-19-stoleti-podle-langweilovamodelu.jpg .................................................................................................................................50 Figura 47 - O túmulo de Anastácio, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................51 Figura 48 - Círculo da Violência, sem data - Helder da Rocha. Fonte: ALIGHIERI, 1999. .......52 Figura 49 - Os centauros - Nesso, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................53 Figura 50 - Minotauro, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustavedore ............................................................................................................................................53 Figura 51 - Floresta das Hárpias, sem data - Gustave Doré. Fonte: //www.wikiart.org/pt/gustave-dore .............................................................................................55
Figura 52 - Dante e Virgílio na floresta das Hárpias, sem nome - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................56 Figura 53 - Exemplo de ninho de Harpia. Fonte: http://www.avesderapinabrasil.com/harpia_harpyja.htm ............................................................56 Figura 54 - Os Blasfemos – Capâncio, sem data – Gustave doré. Fonte: ...................................57 Figura 55 - A Descida do monstro, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................59 Figura 56 - Malebolge, sem data - Helder da Rocha. Fonte: ALIGHIERI, 1999. .......................61 Figura 57 - Ponte de D. Goimil, 1258. Localizada em Santiago de Custóias. Fonte: http://fotoscustoias.blogs.sapo.pt/304.html ................................................................................62 Figura 58 - Demônios e sedutores, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................63 Figura 59 - Aduladores, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustavedore ............................................................................................................................................64 Figura 60 - Os Simoníacos, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................65 Figura 61 - Adivinhos, 1587 - Giovanni Stradano. Fonte: http://www.wikiwand.com/it/Inferno__Canto_ventesimo ......................................................................................................................67 Figura 62 - Inferno canto XXII, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................68 Figura 63 - Hipócritas, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustavedore ............................................................................................................................................70 Figura 64 - Os Hipócritas - Fariseu crucificado, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................70 Figura 65 - Corte mostrando a quinta e sexta valas do Malebolge e a rampa formada pelas ruínas da ponte destruída, sem data - Helder da Rocha. Retirado da tradução em prosa da Divina Comédia feita por Rocha. ...........................................................................................................71 Figura 66 - Ladrões, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ...................................................................................................................................................72 Figura 67 - Maus conselheiros, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................73 Figura 68 - Cismáticos, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustavedore ............................................................................................................................................74
Figura 69 - Falsários, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ...................................................................................................................................................75 Figura 70 - Lago Cócito, sem data - Helder da Rocha. Fonte: ALIGHIERI, 1999. ....................77 Figura 71- Anteu - Descida para o último círculo, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore ....................................................................................78 Figura 72 - Inferno canto 32, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustavedore ............................................................................................................................................78 Figura 73 - Inferno canto 34, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustavedore ............................................................................................................................................79 Figura 74 - O inferno de Dante, sem data - Helder da Rocha. Fonte: ALIGHIERI, 1999. .........81
LISTA DE TABELAS E QUADROS Quadro 1- Esquema do inferno (MAURO, 1998) ......................................................................24
SUMÁRIO INTRODUÇÃO .........................................................................................................................10 A composição da Divina Comédia: processo e organização do texto. ....................................10 Problema ................................................................................................................................11 Justificativa ............................................................................................................................12 Objetivo..................................................................................................................................23 Metodologia ...........................................................................................................................23 OBJETO.....................................................................................................................................24 CONTEXTO ..............................................................................................................................26 Dante Alighieri no contexto de Florença medieval ................................................................26 Cosmologia ............................................................................................................................29 DIRETRIZES DO PROJETO ....................................................................................................31 Vestíbulo – Canto III ..............................................................................................................33 1º círculo (Limbo) – Canto IV ................................................................................................36 2º círculo (Luxúria) – Canto V ...............................................................................................39 3º círculo (Gula) – Canto VI...................................................................................................41 4º círculo (Avareza) – Canto VII ............................................................................................43 5º círculo (Ira) – Canto VII e Canto VIII ................................................................................45 6º círculo – Cidade de dite (Heresia) – Cantos IX e X ...........................................................48 7º círculo (Violência) .............................................................................................................52 1º giro - Contra o próximo – Canto XII ..............................................................................53 2º giro - Contra si – Canto XIII ..........................................................................................55 3º giro - Contra Deus – Cantos XV a XVII ........................................................................57 8º círculo (Fraude) ..................................................................................................................61 1ª vala – Sedutores – Canto XVIII .....................................................................................63 2ª vala – Aduladores – Canto XVIII ...................................................................................64 4ª vala – Adivinhos – Canto XX ........................................................................................67 5ª vala – Corruptos – Cantos XXI e XXII ..........................................................................68 6ª vala – Hipócritas – Canto XXIII.....................................................................................70 7ª vala – Ladrões – Cantos XXIV e XXV ..........................................................................72 8ª vala - Maus conselheiros – Cantos XXVI e XXVII........................................................73 9ª vala – Cismáticos – Canto XXVIII .................................................................................74
9º círculo (Traição) .................................................................................................................77 Caína – Canto XXXII .........................................................................................................78 Antenora – Cantos XXXII e XXXIII ..................................................................................79 Ptolomeia – Canto XXXIII .................................................................................................79 Judeca – Canto XXXIV ......................................................................................................79
CONCLUSÃO ...........................................................................................................................81 Escopo do projeto ...................................................................................................................82 BIBLIOGRAFIA .......................................................................................................................83
INTRODUÇÃO A composição da Divina Comédia: processo e organização do texto. bra prima de Dante Alighieri (Florença, 1265 – Ravenna 1321), a Divina Comédia é um poema que narra um périplo pelo Inferno, Purgatório e Paraíso, descrevendo cada etapa desta jornada com detalhes visuais (ROCHA, 1999). O poema começou a ser escrito por volta de 1307 e foi concluído pouco antes da morte do autor, em 1321. Inicialmente a obra era chamada somente Commedia, posteriormente foi adicionado o termo La Divina ao título (MAURO, 1998). Dante é o personagem principal e narrador do poema, ele é guiado pelo Inferno e Purgatório pelo poeta romano Virgílio, autor da Eneida, e Beatriz, seu amor platônico de infância, guia Dante pelo Paraíso. O trabalho em questão terá como objeto o inferno de Dante como espaço arquitetônico, tendo como base o texto original e os textos de referência para o próprio Dante, como a Eneida de Virgílio e a Odisseia de Homero, ambos modelos de viagens fantásticas.
O
A Divina Comédia possui rigorosa simetria matemática em torno do número três. A obra é composta por três livros, cada um deles com 33 cantos. O Inferno possui um canto a mais que serve de introdução ao poema, totalizando 100 cantos. Os lugares descritos em cada livro são divididos em 9 círculos cada, totalizando 27 níveis (3x3x3). Todos os livros rimam entre si, pois terminam com a mesma palavra stelle (estrelas em italiano). O poema foi escrito originalmente em italiano utilizando uma técnica criada por Dante (MAURO, 1998) conhecida como terza rima. Nesta técnica utilizam-se estrofes de três linhas com 10 sílabas cada, que rimam da forma ABA, BCB, CDC, EDE, FEF e assim por diante. A linha central de cada terceto controla as duas linhas marginais do terceto seguinte (ROCHA, 1999), garantindo movimento ao texto. O diagrama abaixo possibilita uma visão mais clara da dinamicidade do poema. As letras representam o som das últimas sílabas de cada verso dos tercetos (ROCHA, 1999).
Figura 1- Diagrama explicativo da terza rima. Ilustração de D. Hofstadter encontrada em seu livro Le ton beau de marot (ROCHA, 1999). Retirada da tradução da Divina Comédia de Helder da Rocha e redesenhado pela autora.
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Mais um exemplo de utilização da terza rima (primeiras estrofes do Inferno):
Problema
A
Divina Comédia já foi amplamente abordada das mais diversas maneiras possíveis (farei um apanhado de algumas abordagens na próxima seção do trabalho). Em se tratando das representações arquitetônicas existentes da obra de Dante, por se tratarem de edifícios construíveis, acabam por não retratar o arcabouço descrito pelo poeta, deixando espaço livre para a imaginação do leitor. Como seriam as plantas do Inferno? E os cortes? Como seria feita a contenção de terra? Como se dá a canalização dos rios? Essas e outras muitas perguntas são as que vêm à mente quando fazemos a leitura da Divina Comédia, e sendo uma amante da arquitetura, sucumbo então à sede de tentar respondê-las. Este trabalho tem como aspecto central a análise do espaço subterrâneo de Dante, visando à criação de diretrizes de projeto que guiem o desenho da estrutura descrita pelo autor.
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Justificativa
O
Inferno de Dante tornou-se o principal arquétipo literário e artístico dos infernos na cultura ocidental e influenciou grandes poetas, desenhistas, escultores e estudiosos. Farei a seguir uma exposição de obras dos mais variados tipos que interpretaram a Divina Comédia de alguma forma.
Pintura e desenho:
Sandro Botticelli (Mapa do Inferno – 1497). Nesta representação podemos visualizar o formato cônico idealizado por Dante, cada círculo e seus pecadores, culminando no centro da terra, representado pelo círculo em azul (Dante descreve o centro da terra como um local gelado, indo de encontro ao conhecimento que temos hoje).
Figura 2- Mapa do Inferno - Sandro Botticelli. Fonte: http://www.templarinfernobookreview.com/dan_brown_inferno_illustrations.htm
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William Blake (Canto I – 1827). Blake produziu mais de trezentas ilustrações sobre a Divina Comédia. Nesta ilustração estão representados Dante amedrontado pelas três feras e Beatriz em toda sua glória, salvando Dante das bestas.
Figura 3- Canto I - William Blake. Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Blake_Dante_Inferno_I.jpg
Dante Gabriel Rossetti (Paolo e Francesca de Rimini – 1855). Nesta pintura temos a representação de Paolo e Francesca de Rimini, personagens do segundo círculo do Inferno de Dante.
Figura 4 - Paolo e Francesca de Rimini, 1855 – Dante Gabriel Rossetti. Fonte: http://www.tate.org.uk/art/artworks/rossetti-paolo-and-francesca-da-rimini-n03056
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Gustave Doré (Canto I do Inferno – 1861). Doré ilustrou toda a Divina Comédia. A representação abaixo mostra Dante perdido pela floresta descrita no Canto 1 do Inferno.
Figura 5- Canto I - Gustave Doré. Fonte: https://www.gutenberg.org/files/8789/8789-h/8789-h.htm
Salvador Dali (Sem nome – 1965). Dali recebeu uma encomenda do governo italiano de 100 desenhos sobre a Divina comédia, em comemoração do aniversário de 700 anos do nascimento de Dante.
Figura 6 - Sem nome - Salvador Dali. Fonte: http://revistatrip.uol.com.br/trip/a-divina-comedia-de-dali
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Literatura:
Larry Niven e Jerry Pournelle (Inferno – 1976). Obra baseada no Inferno de Dante, porém com o contexto mais recente, no qual o protagonista Allen Carpentier é um escritor de ficção científica agnóstico que morreu ao tentar entreter seus fãs em uma convenção.
Figura 7 - Inferno, 1976 - Larry Niven e Jerry Pournelle. Fonte: http://www.isfdb.org/cgi-bin/title.cgi?1719
Piero Bagnariol (A Divina Comédia em quadrinhos – 2012). Transposição da linguagem do poema épico medieval para a linguagem da história em quadrinhos, a representação da obra é feita a partir de aquarelas inspiradas nas abordagens anteriormente mencionadas.
Figura 8 - A Divina Comédia em quadrinhos - Piero Bagnariol. Fonte: https://issuu.com/editorapeiropolis/docs/divina_comedia
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Escultura:
Auguste Rodin (Porta do Inferno – 1917). Desta obra foram retiradas as esculturas mais famosas de Rodin, como O Pensador (o próprio Dante) e O Beijo (Paolo e Francesca, personagens do inferno).
Figura 9- Porta do Inferno - Auguste Rodin. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Porta_do_Inferno
Figura 10- Porta do Inferno - Auguste Rodin. Fonte: http://www.conexaoparis.com.br/2015/12/09/museu-rodin-eseu-jardim/
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Arquitetura:
Mario Palanti (Palácio Barolo – 1890) Ponto turístico construído a pedido de Luis Barolo, com a intenção de ser o mausoléu de Dante Alighieri, pois Barolo acreditava que a guerra da Europa viria a destruir os restos mortais localizados em Ravenna. O palácio está localizado em Buenos Aires, Argentina, e é inspirado na Divina Comédia.
Figura 11 – Palácio Barolo. Fonte: https://theculturetrip.com/south-america/argentina/articles/the-palacio-baroloarchitecture-inspired-by-dante-s-divine-comedy/
Giuseppe Terragni (Danteum – 1938). Monumento modernista não construído, aprovado pelo governo fascista de Benito Mussolini. A estrutura teria o intuito de exaltar Dante Alighieri, e deveria ficar localizada na Via dell’Impero, perto do Coliseu.
Figura 12 - Danteum - Giuseppe Terragni. Fonte: http://archeyes.com/danteum-giuseppe-terragni/
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Vídeo games:
Visceral Games (Dante's Inferno – 2010). Um jogo de ação e aventura no qual Dante é o personagem principal, que deve enfrentar os demônios do inferno com a ajuda de duas armas fornecidas por Beatriz.
Figura 13 - Dante's Inferno - Visceral games. Fonte: http://www2.ea.com/pt/dantes-inferno
Capcom (Devil May Cry – 2001). Jogo vagamente baseado na Divina Comédia no qual Dante é um caçador de demônios que conhece uma mulher chamada Trish (Beatriz) e sai em uma jornada para derrotar o demônio Mundus.
Figura 14 – Devil May Cry – 2001. Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Devil_May_Cry_(video_game)
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Música:
Tchaikovsky (Francesca da Rimini – 1876). Peça que conta a história de Francesca de Rimini, personagem do segundo círculo do Inferno de Dante.
Figura 15 – Tchaikovsky Piano concerto No.1. Fonte: http://www.allmusic.com/album/tchaikovsky-piano-concertono-1-francesca-da-rimini-mw0001382550
Sepultura (Dante XXI – 2006). É o décimo álbum da banda Sepultura, lançado em 2006. É completamente baseado na obra A Divina Comédia.
Figura 16 – Capa do álbum Dante XXI da banda Sepultura. Fonte: http://homoliteratus.com/literatura-e-heavymetal-como-se-entrelacam/
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Cinema:
Richard Matheson (Amor além da Vida – 1998). O filme gira em torno de uma típica família feliz de classe média americana, mas infelizmente os filhos e o marido de Annie morrem de forma trágica e Annie então comete suicídio. Sabendo que isso aconteceu, seu marido, que está no paraíso, começa a jornada para busca-la no inferno, que é retratado com referência à Divina Comédia.
Figura 17 – Cartaz do filme Amor além da vida. Fonte: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-17994/
Fox Film Corporation (Dante's Inferno -1924). Filme mudo que faz uma adaptação do Inferno de Dante.
Figura 18 – Cartaz do filme Dante’s Inferno. Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Dante%27s_Inferno_(1924_film)
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Artigos e teses:
Marcia Schmitt Veronezi Cappellari (As representações visuais do mal na comunicação: imaginário moderno e pós-moderno em imagens de A Divina Comédia e do filme Constantine – 2007). A presente tese dispôs-se a investigar as representações visuais do mal, definindo como focos de análise as ilustrações de Gustave Doré para A Divina Comédia de Dante Alighieri e as imagens do filme Constantine, de Francis Lawrence (CAPELLARI, 2007).
Gizelle Kaminski Corso (A Divina Commedia em jogo – 2012). Tese de doutorado pela Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão. Este trabalho tem como objetivo analisar e discutir adaptações da Divina Commedia para jovens leitores, para os quadrinhos, para o videogame e para o cinema (CORSO, 2012).
Vistas as mais diversas abordagens anteriormente citadas, é correto dizer que não há hierarquia entre releituras literárias, artísticas ou arquitetônicas e pesquisas científicas sobre Dante, são interpretações igualmente válidas com objetivos diversos. A Divina Comédia não é a única obra literária que incita releituras a seu respeito. Outro exemplo de literatura amplamente abordada nesse sentido é a obra As cidades invisíveis, de Ítalo Calvino. A seguir mostrarei algumas abordagens em relação a esta obra:
Arielle Cristina Martins (Palavra e Imagem: As Cidades Invisíveis Ilustradas – 2017). Ensaio teórico feito no ano de 2017 para a disciplina de Ensaio Teórico da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, no qual a autora traça um paralelo entre cidades existentes e as cidades descritas por Calvino em sua obra, ao mesmo tempo em que produz ilustrações sobre as cidades analisadas.
Figura 19 - Palavra e Imagem: As Cidades Invisíveis Ilustradas, 2017 - Arielle Cristina Martins. Fonte: https://issuu.com/ariellemartiins/docs/palavra_e_imagem_as_cidades_invis__
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Karina Puente (As Cidades e a Memória, Anastasia – 2016).
Figura 20 - http://www.archdaily.com.br/br/781197/ilustracoes-das-cidades-invisiveis-de-italo-calvino
A Divina Comédia se baseia em modelos anteriores (Eneida e Odisseia) de viagem fantástica, mas diferentemente de seus modelos, não trabalha com a geografia do mundo real e, mais ainda, não entra nos detalhes técnicos e funcionais desse mundo imaginário. A falta de informações a respeito disso explica a diversidade de releituras existentes, reforçando o fato de que a pesquisa em questão configura um tema original, não sendo apenas um resumo do poema épico. A análise arquitetonicamente enviesada sobre Dante se faz importante devido a sua originalidade enquanto produto utópico de arquitetura como representação da obra literária em questão.
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Objetivo
Geral
1. Produzir diretrizes para a elaboração do projeto do Inferno de Dante, que será o projeto de diplomação da autora.
Específicos
1. Realizar uma revisão bibliográfica buscando maior conhecimento acerca do assunto; 2. Descrever os recursos espaciais, funcionais e técnicos; 3. Estabelecer exemplos que garantam maior concretude às diretrizes elaboradas.
Metodologia
E
ste ensaio será feito com base no texto original escrito por Dante Alighieri, adaptado em verso para a língua portuguesa por Ítalo Eugênio Mauro, versão ganhadora do prêmio Jabuti de Tradução em 2000 pelo uso da terza rima. Será também utilizada a tradução em prosa do texto original por Helder da Rocha, devido às ilustrações e mapas de fluxos produzidos pelo autor para o devido embasamento a respeito de informações não explícitas no texto original. Será produzido um termo de referência para o projeto do Inferno de Dante, e nesse termo será apresentado o objeto de trabalho (o inferno), o contexto em que ele se encontra, situando Dante na Florença medieval, seguido pelas diretrizes de projeto e sugestão de programa de necessidades para cada círculo.
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OBJETO
O
Inferno é o primeiro livro da Comédia. É caracterizado, segundo os cristãos, por ser o local para onde se dirigem as almas dos pecadores que não se arrependeram em vida. O Inferno é governado por Lúcifer, anjo caído após trair a confiança de Deus. Dante, na Divina Comédia, trata Lúcifer por Dite. O espaço físico do Inferno se dá em um grande cone escalonado com a extremidade menor localizada no centro da Terra. O Inferno de Dante organiza-se de acordo com o pecado e seus pecadores, cada categoria separada em seu respectivo círculo (nível). Quanto mais profundo o nível, pior o pecado e sua punição e mais próximo de Dite, que reside no último círculo. A tabela a seguir mostra essa organização: Tabela: Quadro 1- Esquema do inferno. Fonte: adaptado de MAURO, 1998
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Para uma melhor visualização espacial do Inferno de Dante, construí o diagrama a seguir. Nele observamos a divisão dos nove círculos (níveis) imaginados por Dante, categorizados em ordem crescente de gravidade do pecado segundo o autor.
Figura 21 - Diagrama do Inferno. Fonte: autoria própria.
Dante separa os pecados em dois grandes grupos: culposos e dolosos. O pecado culposo consiste naquele em que não houve a intenção de ser cometido, mas que por incontinência foi cometido mesmo assim. Já o pecado doloso é aquele que foi premeditado e cometido intencionalmente. Essas duas grandes categorias são separadas pela muralha que circunda o sexto círculo, chamado de cidade de dite, que faz o papel de transição. O sétimo e o oitavo círculo possuem subdivisões denominadas giros (MAURO, 1998) e valas respectivamente. As subdivisões do nono círculo possuem nomes próprios indicados no diagrama. Dante utiliza as subdivisões como forma de especificar contra quem ou de qual forma o pecado foi cometido.
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CONTEXTO Dante Alighieri no contexto de Florença medieval
D
ante Alighieri nasceu em 1265 em uma família importante da cidade de Florença. Nessa época era comum que casamentos entre membros de famílias importantes fossem tratados como alianças políticas, e com Dante não foi diferente. Aos doze anos foi prometido em casamento à Gemma Donati, com quem se casou aos vinte anos de idade, pouco após a morte do pai. Com ela teve três filhos: Pietro, Jácopo e Antonia, que se recolheu ao convento sob o nome de Beatrice (MAURO, 1998). Grande parte das informações a respeito da vida de Dante são meras suposições. Especulações sobre a vida do autor acabaram influenciando os primeiros biógrafos, o que dificulta a separação ente fato e ficção, mas é possível encontrar bastantes informações sobre sua vida em suas próprias obras, como na Vida Nova (La Vita Nuova) e na Divina Comédia (ROCHA, 1999). É sabido que Dante, apesar de casado com Gemma, nutria um amor platônico por Beatriz, a quem conheceu aos nove anos de idade (MAURO, 1998). Beatriz faleceu em 1290, e o autor, inconsolável, dedicou-se à arte poética e ao estudo da filosofia aristotélica (ROCHA, 1999). A Itália na época de Dante estava dividida entre o poder do papa e o poder do Sagrado Império Romano, sendo o norte alinhado com o imperador e o centro com o papa (ROCHA, 1999). Veja o mapa:
Figura 22- A Itália de Dante. O mapa mostra as regiões citadas pelo autor em sua obra. Fonte: Adaptado de ALIGHIERI, 1999.
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A Itália medieval não era um império unificado. A região era composta por várias cidades-Estado autônomas, com suas próprias leis e costumes, e Florença era uma das cidades mais importantes de toda a Europa. Neste momento a política era um reflexo dos interesses de famílias importantes, como a de Dante, que pertencia a um partido político denominado os guelfos (guelfi) – representados pela baixa nobreza e pelo clero – que faziam oposição aos gibelinos (ghibellini) – partido representado pela alta nobreza e pelo poder imperial (ROCHA, 1999). A divisão dos dois partidos ocorreu quando um rapaz da família Buondelmonti não cumpriu uma promessa de casamento com uma moça da família Amadei e foi assassinado (ROCHA, 1999). Famílias da cidade simpatizaram por um lado ou pelo outro e Florença se dividiu. Quando Dante nasceu, Florença era governada pelos gibelinos, e o governo da cidade era composto por representantes eleitos de corporações de operários, artesãos e profissionais em geral denominados guildas (ROCHA, 1999). Dante fazia parte da guilda dos médicos e farmacêuticos e participou ativamente da política, tendo sido eleito em 1300 para o posto de um dos seis piores desse conselho (MAURO, 1998). Grande parte do governo da cidade de Florença estava na mão dos guelfos (opositores ao poder imperial) e esse partido dividiu-se em duas facções. Novamente, a causa da divisão teria sido uma rixa familiar, desta vez, da família Cancellieri de Pistóia. Os membros dessa grande família eram descendentes de um mesmo pai que em sua vida teve duas esposas. A divisão ocorreu quando um membro da família assassinou o próprio tio e cortou uma das mãos de seu primo. Revoltados, os descendentes da primeira esposa apelidaram-se de Bianchi, em homenagem à primeira esposa cujo nome era Bianca. Os descendentes da segunda esposa, que apoiavam o assassino denominaram-se Neri, em caráter opositivo (ROCHA, 1999). A divisão se alastrou até Florença e as famílias guelfas começaram a escolher lados, dividindo os guelfos em negros e brancos. Após sua criação, esses partidos assumiram posicionamentos políticos. Os brancos respeitavam o papado, mas defendiam a separação entre a Igreja e o Estado, e os negros defendiam o apoio do papa contra o imperador, que era apoiado pelos gibelinos (ROCHA, 1999). Os priores de Florença (entre eles Dante) estavam em constante conflito com a igreja de Roma, que sob o governo do papa Bonifácio VIII, pretendia colocar toda a Itália sob uma ditadura da Igreja (ROCHA, 1999). Em um desses conflitos o papa ameaçou excomungar os priores. Durante o mandato de Dante como presidente da Guilda dos médicos e farmacêuticos a briga entre os Bianchi e os Neri tomou proporções maiores, forçando Dante a exilar líderes de ambos partidos, incluindo um de seus melhores amigos (Guido Cavalcanti) e um parente de sua esposa (da família Donati) (ROCHA, 1999). Em meio à confusão entre os guelfos de Florença, o Papa Bonifácio enviou Carlos Valois (irmão de Felipe da França) como pacificador para cessar a briga a briga entre as facções, entretanto a ajuda nada mais era do que um golpe dos Neri para tomar o poder (ROCHA, 1999). Os Neri então enviaram inúmeros Bianchi ao exílio e à morte. Dante foi banido por dois anos e condenado a pagar uma multa, a que se recusou (MAURO, 1998). Dante passou por diversas cidades durante seu exílio, mas acabou se fixando em Ravenna. O poeta nutria esperanças de voltar à Florença, já que o sucessor de Bonifácio VIII teria chamado Henrique VII à Itália, com o objetivo de reunir a Itália em um império governado por Henrique, mas as esperanças acabaram devido à traição do papa, uma vitória dos Neri e a morte de Henrique três anos depois (ROCHA, 1999).
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Em sua obra La Vita Nuova, iniciada pouco após a morte de Beatriz, Dante narra seu amor por ela em forma de sonetos e canções com comentários em prosa (ROCHA, 1999). Durante o exílio o autor escreveu duas obras importantes em latim: De Vulgaris Eloquentia, onde defende a língua italiana e Convivio, incompleta, na qual pretendia reunir todo o conhecimento da época em quinze livros, mas apenas quatro foram finalizados (ROCHA, 1999). Dante terminou a Commédia pouco antes de sua morte em 1321 na cidade de Ravenna, onde foi sepultado com honras (ROCHA, 1999).
Figura 23- Retrato de Dante Alighieri, 1860 - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
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Cosmologia
A
cosmologia dos tempos de Dante foi herdada de Aristóteles e Ptolomeu e adaptada pela escolástica às Escrituras (MAURO, 1998). A Terra permanecia imóvel no espaço e em volta dela, em órbitas individuais, crescentes e equidistantes a Lua, Mercúrio, Vênus, o Sol, Marte, Júpiter e Saturno, designados com estrelas móveis. Acima das estrelas móveis fica o céu das estrelas fixas (MAURO, 1998). O globo terrestre era dividido em dois hemisférios, o setentrional e o austral. O hemisfério setentrional era o único habitado e tinha uma superfície predominantemente sólida, e se estendia da foz do rio Ganges, na Índia (oriente) até o rio Ebro, na Espanha (ocidente) (MAURO, 1998). Os únicos continentes conhecidos na época eram a África, a Ásia e a Europa. O hemisfério austral era predominantemente marinho, a única parte sólida era uma grande montanha em seu centro chamada de Montanha do Purgatório, localizada no exato oposto da cidade de Jerusalém, local onde estaria a porta do Inferno (MAURO, 1998).
Figura 24 - A Terra segundo a geografia de Dante, sem data – Held: ALIGHIERI, 1999.
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Figura 25 - Cosmologia da Divina comĂŠdia. Fonte: autoria prĂłpria.
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DIRETRIZES DO PROJETO
O
projeto para o Inferno de Dante deverá ser o mais fiel possível ao discurso do autor, levando em consideração os aspectos funcionais e tecnológicos necessários para o funcionamento do espaço.
Vale lembrar que a narrativa da Divina Comédia é medieval e de caráter extremamente religioso, ainda que o papel de crítica à política italiana da época tenha maior importância, e que a autora não compartilha do pensamento apresentado no texto. Sendo o objetivo do trabalho traçar um paralelo entre a literatura e a arquitetura de modo a representar a imagem descrita por Dante, a autora optou por não modificar a narrativa de modo a atenuar ou modificar quaisquer características que não condizem com o senso comum contemporâneo. Características pontuais poderão ser modificadas ou excluídas da narrativa somente se não alterarem a configuração do espaço descrito por Dante. Devido ao caráter utópico da proposta, não há um terreno especificado para a implantação. Dante afirma que a porta do inferno se localiza em Jerusalém, portanto padrões bioclimáticos e métodos construtivos (pedra, arenito) deverão ser adequados aos existentes nessa região por volta do ano de 1300. A sugestão de um local para a implantação ficará a critério da autora. O dimensionamento do espaço tem como referência o Canto XXX, que narra sobre a vala dos falsários, décima vala do oitavo círculo, onde Mestre Adamo, falsificador de moedas, afirma:
Se eu estivesse ainda tão ligeiro para, em cem anos, só uma polegada andar, já estaria posto no carreiro,
a os procurar entre a desfigurada gente, por onze milhas trajetória, que meia tem de largo, da valada.
Inferno 30:82-87
Em outras palavras, Mestre Adamo nos dá o perímetro e a largura da décima vala do oitavo círculo: onze milhas de perímetro e meia milha de largura. A medida do perímetro deve servir de base para o dimensionamento dos outros círculos a partir do cálculo do raio da circunferência. A largura deve ser mantida para todas as valas do oitavo círculo, mas poderá ser alterada em outros círculos caso julgue necessário. É importante salientar que o Inferno de Dante tem caráter punitivo, e não serão levados em consideração quaisquer requisitos básicos de direitos humanos, tampouco normas técnicas de desenho na confecção do projeto.
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Figura 26 - Mapa do inferno superior, sem data - Helder da Rocha. Fonte: ALIGHIERI, 1999.
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Vestíbulo – Canto III
Figura 27 - Porta do inferno, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
VAI-SE POR MIM À CIDADE DOLENTE, VAI-SE POR MIM À SEMPITERNA DOR, VAI-SE POR MIM ENTRE A PERDIDA GENTE.
MOVEU JUSTIÇA O MEU ALTO FEITOR, FEZ-ME A DIVINA POTESTADE, MAIS O SUPREMO SABER E O PRIMO AMOR.
ANTES DE MIM NÃO FOI CRIADO MAIS NADA SENÃO ETERNO, E ETERNO EU DURO DEIXAI TODA ESPERANÇA, Ó VÓS QUE ENTRAIS.
Inferno 3:1-9
O
acesso ao Inferno é feito por um portal sem qualquer obstáculo, que apresenta a citação acima escrita em tom escuro. O aviso adverte que uma vez dentro deve-se abandonar toda a esperança, pois de lá não se pode sair.
Também chamado de anti-inferno, o vestíbulo é o local para onde se destinam as almas que não são aceitas nem no paraíso e nem no inferno, já que para ser aceito nesses lugares é preciso que se tenha feito uma escolha em vida, e dependendo da escolha feita esta seria recompensada de maneira positiva ou negativa (ROCHA, 1999). Quem reside no vestíbulo é, 33
portanto, culpado pela indecisão e pela covardia. Estas almas não fizeram o mal, mas foram relaxadas na escolha do bem (MAURO, 1998). A punição para a indecisão é permanecer correndo atrás de uma bandeira eternamente enquanto se é picado por enxames de vespas e tem os pés comidos por vermes. É no anti-inferno que está localizado o rio Aqueronte, primeiro dos rios do inferno, que também aparece na Eneida de Virgílio e na Odisseia de Homero. No Aqueronte navega o barqueiro dos mortos Caronte, que faz a travessia das almas para o outro lado do rio. Caronte foi retirado da mitologia clássica e nela navegava no rio Estige, que aparecerá mais adiante com outro barqueiro (ROCHA, 1999). A proposta para o vestíbulo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Reconhecer que o vestíbulo ainda não é caracterizado como inferno e, portanto, não tem forma circular; 2. Reconhecer que, pelo mesmo motivo, nesta área ainda se pode ver o céu; 3. Devem ser resguardados cinquenta metros entre o vestíbulo e a orla do rio Aqueronte, a fim de acomodar as almas que aguardam o transporte para a outra margem. Sugestão de programa de necessidades: 1. Espaço para punição; 2. Criadouro de vespas; 3. Criadouro de vermes; 4. Píer de espera para a travessia; 5. Local para a ancoragem do barco de Caronte em ambas as margens do rio; 6. Armazenamento e confecção das bandeiras.
Figura 28 - Caronte e o rio Aqueronte, sem data - Gustave Doré Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
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Figura 29 - Tecelagem medieval, sem data - Giovanni Boccaccio. Fonte:http://nemed.he.com.br/projetopandora/2015/10/29/as-mulheres/
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1º círculo (Limbo) – Canto IV
Figura 30 - Dante e os poetas no Limbo, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
O
Limbo é o local destinado às almas que não cometeram pecado algum, mas não são aceitas no paraíso por não terem sido batizadas. Aqui residem as crianças que faleceram antes do batismo e os que nasceram antes de cristo, como Virgílio. No Limbo não há punição, mas também não há esperança. Virgílio conta que quando ainda era novo neste lugar, Jesus desceu ao inferno e resgatou algumas almas, como Adão, Noé, Moisés e outros que escolheu, e esses foram os únicos a terem saído do limbo até hoje. Dante encontra nesse círculo figuras como Homero, Horácio, Ovídio e Lucano, sendo rapidamente aceito como o sexto do grupo. O Limbo abriga também outras personalidades como Enéas, Júlio César, Aristóteles, Platão e muitos outros. Dante descreve a existência de um nobre e alto castelo cercado por sete muros e um belo riacho. Deste castelo emana a luz que ilumina todo o Limbo. Dante passa pelo riacho “como se fosse terra dura” (ROCHA, 1999), depois pelos sete portões até adentrarem em um verde prado, onde as almas conversavam. A proposta para o 1º círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir:
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1. Assegurar que o local seja agradável e bonito, uma vez que as almas do limbo não são pecadoras. 2. Propor solução para o riacho pisoteável; 3. Propor solução para o castelo que emana luz; 4. Devem ser resguardados cinquenta metros entre o limbo e a orla do rio Aqueronte, a fim de acomodar as almas que chegam da outra margem. 5. Resguardar a circulação das almas a caminho da triagem no segundo círculo; 6. Sugere-se que o castelo seja pensado com base no mosteiro presente no romance O Nome da Rosa, de Humberto Eco.
Figura 31 - Planta do mosteiro de O Nome da Rosa. Fonte: http://adelmomedeiros.com/semioticanomedarosa.htm
Sugestão de programa de necessidades: 1. Castelo com sete muralhas; 2. Riacho cercando as muralhas; 3. Verde prado com espaços para conversas e brincadeiras para as crianças; 4. Berçário
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Figura 32 - Dante e VirgĂlio no limbo, sem data - Gustave DorĂŠ. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
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2º círculo (Luxúria) – Canto V
Figura 33 - Os luxuriosos, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
O
segundo círculo é o primeiro dos círculos destinados aos pecados cometidos por incontinência, e nele estão as almas luxuriosas. Dante considera a luxúria como o pecado mais leve, visto que o colocou no círculo mais distante de Lúcifer. A punição por ser luxurioso é ser levado por uma constante ventania, fazendo uma analogia com a paixão que sentiam em vida, que os levava como o vento (ROCHA, 1999). No momento em que Dante e Virgílio adentram o segundo círculo encontram Minos, rei lendário da ilha de Creta cuja esposa é mãe do Minotauro segundo a mitologia grega. Após seu falecimento, Minos tornou-se um dos juízes dos mortos. No inferno de Dante, Minos ouve as confissões das almas e as designa o círculo e o subcírculo adequado enrolando sua calda em torno de si mesmo, com o número de voltas correspondendo ao local de destino da alma. A única descrição que Dante faz com relação ao local é de que é escuro e soa como o assobio do mar em uma grande tormenta (ROCHA, 1999), e este som se misturava com o som do lamento das almas. Neste círculo encontramos personalidades como Semíramis (rainha da Babilônia por 102 anos), Cleópatra VII (69 a 30 a.C.), Helena de Troia, Páris e Aquiles (mitologia grega). Porém os personagens mais importantes do segundo círculo são Paolo e Francesca de Rimini, figuras famosas na época de Dante (MAURO, 1998). Os dois eram cunhados adúlteros que foram surpreendidos e mortos pelo marido de Francesca. A proposta para o segundo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Assegurar que o local seja escuro; 2. Propor mecanismo para gerar o redemoinho. Pode-se fazer uma analogia com túneis de vento e simuladores de queda-livre; 39
3. Propor separação entre o espaço para aqueles que estão sendo punidos e o espaço para a triagem das almas, para que esta não seja afetada pelo vento. Sugestão de programa de necessidades: 1. Espaço de espera para a triagem; 2. Triagem (guarita de Minos); 3. Área punitiva; 4. Casa de máquinas.
Figura 34 - Minós, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
Figura 35 - Paolo e Francesca, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
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3º círculo (Gula) – Canto VI
Figura 36 - Os Glutões - Ciacco, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
O
terceiro círculo é aquele destinado às almas que praticaram o pecado da gula. A punição por ser guloso, segundo Dante, é estar em meio a uma chuva gélida com neve e granizo, ao mesmo tempo em que se está imerso em uma lama fétida, na tentativa vã de abrigarse da chuva incessante e das mordidas de Cérbero. Cérbero é o cão de três cabeças que na mitologia grega guarda a entrada do mundo subterrâneo. Dante o descreve como um cão de três goelas, com uma barba negra e seis olhos vermelhos, ventre largo e garras aguçadas com as quais rasga os pecadores (ROCHA, 1999). O personagem mais importante do terceiro círculo é Ciacco, nobre florentino conhecido por sua gula na época de Dante (ROCHA, 1999). Ciacco, quando abordado por Dante, faz uma previsão a respeito da política florentina, que diz respeito à luta entre os guelfos Bianchi e os guelfos Neri, que obrigou Dante a exilar os líderes da revolta (ROCHA, 1999). Ciacco diz que o Papa Bonifácio apoiará os Neri e estes tomarão o poder, banindo os Bianchi de Florença (ROCHA, 1999). A proposta para o terceiro círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Propor mecanismo para o funcionamento da chuva eterna; 2. Assegurar o escoamento e o bombeamento da água utilizada para que esta possa sempre ser reutilizada; 41
Sugestão de programa de necessidades: 1. Área punitiva; 2. Armazenamento de água; 3. Filtragem e bomba d’água.
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4º círculo (Avareza) – Canto VII
Figura 37 - Os ávaros e pródigos, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
O
quarto círculo é aquele destinado às almas condenadas pela avareza e pela prodigalidade. Os condenados, divididos em dois grupos correspondentes ao pecado que cometeram, rolam grandes pesos em sentidos contrários até colidirem uns com os outros. No momento da colisão gritam “Por que poupas? ” “Por que gastas? ”. Depois do choque seguem em sentido contrário até se encontrarem novamente no outro lado do círculo (ROCHA, 1999).
“Pape Satan, Pape Satan aleppe”. Inferno 7:1
Dante e Virgílio adentram o quarto círculo ao som das palavras acima ditas por Pluto. Pluto é o Deus dos mortos na mitologia romana e é considerado o rei infernal da riqueza, sendo corretamente colocado no quarto círculo (ROCHA, 1999). As palavras ditas por Pluto não tem significado conhecido. Segundo Mauro, a frase estaria em hebraico e teria significado semelhante a “Aqui Satã, aqui Satã governa”. Rorém Rocha afirma em seus comentários sobre a obra que a frase seria inspirada na frase em francês “Paix, Paix, Stan, Allez, paix’ (Silêncio! Silêncio, Satan! Vá e nos deixe em paz).
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Figura 38 - Pluto e Virgílio, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
Neste círculo, Dante e Virgílio não reconhecem alma alguma, pois estas estão imundas após uma vida sem conhecimento. Virgílio identifica vários padres, devido ao corte de cabelo em cercilha, papas e cardeais. A avareza e a prodigalidade são caracterizadas como pecados da fortuna (ROCHA, 1999), representada pela roda da fortuna, que distribuiria os bens da Terra rotativamente por não poderem pertencer a todos de uma só vez (ROCHA, 1999). A proposta para o quarto círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Dante não faz menção a aspectos visuais deste círculo. Logo a única diretriz é assegurar que a área punitiva permita que os pecadores colidam em dois pontos opostos do círculo. Sugestão de programa de necessidades: 1. Área punitiva com pista de rolamento dos pesos.
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5º círculo (Ira) – Canto VII e Canto VIII
Figura 39 - O Estige - Flégias, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
N
o quinto círculo estão localizadas as almas condenadas pela ira e pelo rancor. Essas almas são condenadas a ficarem imersas no rio Estige, que Dante descreve como pantanoso, de água preta, fétida e fervente. A nascente do Estige se dá em uma vereda pela qual Dante e Virgílio descem ao quinto círculo. As almas imersas no Estige brigam de maneira ferrenha por toda a eternidade (irados), e as bolhas que emergem pela lama escura são formadas pelos suspiros das almas submersas (rancorosos). Dante e Virgílio caminham margeando o Estige até que chegam ao pé de uma alta torre com duas chamas no topo, que trocava sinais com o barqueiro Flégias, antigo reino dos Lapitas que incendiou o templo de Apolo em Delfos como vingança pelo Deus ter violado sua filha (ROCHA, 1999), e que é responsável pela travessia no Estige no inferno de Dante. Antes que chegassem aos pés da grande torre, os poetas entram na pequena embarcação e logo são abordados por uma alma imersa no rio. A alma responde pelo nome de Filippo Argenti, que teria sido um guelfo Neri muito rico e de pavio curto (ROCHA, 1999), com quem Dante muito provavelmente teve algum desentendimento. Terminada a discussão com Argenti, Flégias anuncia a chegada à entrada da Cidade de Dite, onde estão localizados do sexto ao nono círculo.
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Figura 40 - O Estige - Philippo Argenti, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
Ao deixarem a embarcação, os poetas são recepcionados por um grupo de demônios que impede a passagem de Virgílio para o próximo círculo. Enquanto aguardavam ajuda divina para que a missão seja completa, Virgílio avista três fúrias (erínias), divindades do inferno segundo a mitologia grega (ROCHA, 1999), que chamavam pela górgona Medusa para que transformasse Dante em pedra. Virgílio alerta o poeta sobre a consequência de olhar nos olhos de Medusa e cobre os olhos de Dante até que a criatura vá embora. Neste momento, andando pelo Estige, vem um anjo do paraíso abrir a passagem para o sexto círculo, e logo os poetas conseguem seguir viagem.
Figura 41 – A Cidade de Dite, sem data – Gustave Doré. Fonte: //www.wikiart.org/pt/gustave-dore
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Figura 42 - O anjo, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
A proposta para o quinto círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Assegurar que a vereda onde se encontra na nascente do rio Estige tenha inclinação suficiente para a descida ao quinto círculo; 2. O rio Estige caracteriza-se por ser pantanoso, e essa característica deverá ser respeitada; 3. Assegurar que o barco de Flégias seja capaz de comunicar-se com as torres da muralha que cerca a Cidade de Dite; 4. Assegurar que o Estige tenha profundidade suficiente para permitir que as duas punições não sofram interferência uma da outra; 5. Resguardar 20 m entre a circunferência que conforma o quinto nível e a margem do Estige. Sugestão de programa de necessidades: 1. Vereda com nascente; 2. Píer para o barco de flégias em ambas as margens; 3. Rio Estige.
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6º círculo – Cidade de dite (Heresia) – Cantos IX e X
Figura 43 - Túmulos flamejantes - Os hereges, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustavedore
O
sexto círculo é aquele destinado às almas que cometeram o pecado da Heresia, ou seja, os seguidores de Epicuro, que não acreditavam na sobrevivência da alma após a morte corporal (ROCHA, 1999). Também chamado de cidade de Dite ou cidade dos mortos, o sexto círculo faz a transição entre os pecados culposos e os pecados dolosos na hierarquia criada por Dante. O sexto círculo nada mais é do que um grande cemitério com inúmeros túmulos coletivos, que correspondiam à vertente epicurista nas quais as almas sepultadas nesses túmulos acreditavam em vida. A punição por não acreditar na vida após a morte é justamente estar sepultado pela eternidade em um túmulo flamejante. O círculo dos hereges é uma cidade murada. É por uma das torres da cidade que Flégias se orienta pelo Estige. Dante e Virgílio acessam o círculo pelos portões da muralha mencionados no círculo anterior, mas logo passam para um caminho secreto entre a muralha e as sepulturas. O personagem mais importante do sexto círculo é Farinata Degli Uberti, um dos mais importantes líderes dos Guibelinos de Florença (ROCHA, 1999), logo, pertencente ao partido que fazia oposição ao de Dante. Farinata, assim como Ciacco no terceiro círculo, fez uma previsão sobre o futuro de Dante, mais precisamente sobre o seu exílio, que aconteceria em menos de quatro anos (1304) (ROCHA, 1999).
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Figura 44 - Farinata, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
A caminho do próximo círculo, os poetas viram à esquerda e caminham em direção ao meio, onde começava uma vereda, e chegam à beira de um precipício onde havia um deslizamento cujas pedras permitiriam a descida para o sétimo círculo. O abismo emanava odor desagradável, e fez com que Dante e Virgílio se abrigassem atrás de uma tumba, que viria a ser do Papa Anastácio II, que foi acusado de heresia (MAURO, 1998). A proposta para o sexto círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Assegurar que o círculo seja cercado por uma muralha com torres, e que uma dessas torres seja capaz de enviar sinais para o barqueiro Flégias no quinto círculo; 2. Sugere-se que a muralha seja feita com base no Krak dos Cavaleiros, localizado em Alepo na Síria. A organização interna da cidade de Dite poderá ser feita tal qual o gueto medieval da cidade de Praga, uma vez que um gueto se caracteriza por ser uma cidade murada dentro de outra cidade murada;
Figura 45- Krak des Chevaliers, 1229. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Krak_des_Chevaliers
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Figura 46 - Gueto judaico de Praga. Fonte: http://www.praguecityline.com/wp-content/gallery/zidovska-prahastare/zidovske-mesto-na-pocatku-19-stoleti-podle-langweilova-modelu.jpg
3. Cada túmulo abriga almas que acreditavam em uma corrente religiosa diferente. Deve-se estimar a quantidade de túmulos com base na quantidade de seitas/religiões registradas; 4. Os túmulos possuem fundo infinito, uma vez que não se pode estimar a quantidade de almas por religião; 5. Propor solução para os túmulos. 6. Propor exaustão para a fumaça gerada pelo fogo dentro dos túmulos; 7. O deslizamento de terra deve ser íngreme, com inclinação maior do que 20%.
Sugestão de programa de necessidades: 1. Muralha com torres e porta de folha dupla; 2. Caminho secreto entre a muralha e o cemitério; 3. Cemitério; 4. Vereda; 5. Deslizamento de terra; 6. Túmulo do Papa Anastácio II. 50
Figura 47 - O túmulo de Anastácio, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
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7º círculo (Violência)
O
sétimo nível é o destino das almas que cometeram pecados referente à violência. É o primeiro no inferno de Dante a sofrer subdivisões, chamadas nesse círculo de giros. O círculo dos violentos se divide em três giros, o primeiro sendo caracterizado pela violência contra o próximo; o segundo pela violência contra si e o terceiro pela violência contra Deus. O sétimo círculo é o primeiro destinado aos pecados dolosos, aqueles que foram cometidos com a intenção de pecar, e, sendo a violência uma característica bestial do ser humano, os personagens deste nível são majoritariamente metade humanos e metade animais.
Figura 48 - Círculo da Violência, sem data - Helder da Rocha. Fonte: ALIGHIERI, 1999.
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1º giro - Contra o próximo – Canto XII
Figura 49 - Os centauros - Nesso, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
O
primeiro giro do sétimo círculo é aquele destinado as almas que cometeram violência contra o próximo ou contra os bens do próximo. Aqui estão, portanto, os tiranos, os assaltantes e os assassinos.
Dante e Virgílio descem para o sétimo círculo pelo deslizamento de terra no círculo anterior, e chegando à beira do barranco encontram Minotauro, monstro mitológico com corpo de homem e cabeça de touro. Ao avistar os dois poetas, Minotauro morde as próprias mãos, e logo Virgílio consegue espantar a besta, que se distrai em sua própria fúria. Virgílio então explica que o deslizamento de terra aconteceu quando Jesus desceu ao inferno para resgatar algumas almas no limbo, pois quando esteve aqui esse barranco ainda não existia. Virgílio afirma também que esse não foi o único ponto destruído nessa ocasião. Tais pontos serão abordados no próximo círculo.
Figura 50 - Minotauro, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
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O primeiro giro do sétimo círculo nada mais é do que o rio Flegetonte, que na Divina Comédia é um rio de sangue fervente (na mitologia grega o Flegetonte é um rio de fogo), que ferve as almas dos violentos contra seus semelhantes. O rio é guardado por centauros, criaturas mitológicas que são metade humanos e metade cavalos. Os centauros são considerados criaturas extremamente violentas, e por isso são corretamente colocados no primeiro giro. O único centauro pacífico é Quíron, que é também o mais sábio. Os três tipos de violência contra o próximo, presentes neste giro, são abordados de forma distinta quanto à sua punição. Quanto mais grave o pecado segundo Dante, mais imersa no rio a alma estará. Os assaltantes estão imersos até o peito, pois só atentaram contra os bens do próximo. Os assassinos até o pescoço por terem atentado conta a vida do próximo e os tiranos até as sobrancelhas, por terem atentado contra os bens e contra a vida do próximo. Dante e Virgílio pedem a Quíron para que os leve a um local onde o rio é mais raso para que possam atravessar a pé, já que Dante não flutua. A profundidade do rio é diretamente proporcional à gravidade do pecado, portanto a parte mais rasa seria próxima ao trecho no qual estão imersos os assaltantes. Quíron ordena que o centauro Nesso leve os poetas até a outra margem. A proposta para o primeiro giro do sétimo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Deve-se assegurar que o rio Flegetonte tenha profundidades correspondentes aos pecados abordados neste giro e que possua um trecho raso onde o sangue fervente cubra somente os pés; 2. Propor mecanismo que mantenha o Flegetonte em ponto de fervura; 3.
Resguardar uma distância de 30 m entre a borda externa do círculo e a margem do Flegetonte. Sugestão de programa de necessidades:
1. Rio Flegetonte.
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2º giro - Contra si – Canto XIII
Figura 51 - Floresta das Hárpias, sem data - Gustave Doré. Fonte: //www.wikiart.org/pt/gustave-dore
O
segundo giro do sétimo círculo é aquele destinado às almas que cometeram violência contra si ou contra os próprios bens. Estão, portanto, neste giro os suicidas e os pródigos. Os pródigos deste giro se diferem dos pródigos do quarto círculo porque no segundo giro do sétimo círculo a prodigalidade punida é aquela em que a pessoa sabia que aquilo o deixaria na miséria, enquanto no quarto círculo a prodigalidade é cometida por incontinência. A punição por cometer violência contra si é ser transformado em uma árvore de folhagem escassa e fosca, sem frutos, sem ramos e de tronco coberto por espinhos (ROCHA, 1999). As almas deste giro não mantêm a aparência humana, pois recusaram o corpo que tinham em vida (ROCHA, 1999). Nos galhos das árvores ficam os ninhos das harpias, seres da mitologia grega com corpo de ave de rapina e cabeça de mulher, que se alimentam dos galhos das árvores, causando-lhes dor.
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Figura 52 - Dante e Virgílio na floresta das Hárpias, sem nome - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
Além das harpias, o bosque dos suicidas também é repleto de cadelas famintas. Segundo Rocha, as cadelas seriam a representação da pobreza e do desespero ainda perseguindo suas vítimas após a morte. A proposta para o segundo giro do sétimo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Assegurar que a floresta passe a sensação de aridez, mantendo certo espaçamento entre as árvores; 2. Garantir que o diâmetro do fuste e dos galhos das árvores tenham capacidade de sustentar os ninhos das Hárpias. Sugestão de programa de necessidades: 1. Floresta; 2. Ninhos em algumas árvores;
Figura 53 - Exemplo de ninho de Harpia. Fonte: http://www.avesderapinabrasil.com/harpia_harpyja.htm
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3º giro - Contra Deus – Cantos XV a XVII
Figura 54 - Os Blasfemos – Capâncio, sem data – Gustave doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
O
terceiro giro do sétimo círculo é aquele destinado às almas que pecaram por violência contra Deus, contra a natureza ou contra a arte, e consiste em grande deserto de areia quente, sobre o qual cai uma constante chuva de brasas. O primeiro grupo é punido deitado na areia, o segundo correndo pelo deserto e o terceiro perto da descida para o oitavo círculo, acocorados na areia quente com pequenas bolsas penduradas nos pescoços. Os poetas visitam o terceiro giro do sétimo círculo andando por um pequeno bosque ao lado do deserto, devido ao fato de que as brasas não atingiam o bosque. Neste pequeno bosque encontram um dos afluentes do rio Flegetonte, que tinha as margens e o leito feito de pedra. Ao ser questionado sobre a origem do riacho, Virgílio explica a origem de todos os rios do Inferno:
“Em meio ao mar pousa um país já gasto”, então ele disse, “que é chamado Creta, que sob um rei já foi um mundo casto.
Há uma montanha que lá foi dileta de águas e frondes, e tem nome de Ida, agora abandonada e obsoleta. 57
Réa a escolhera então para guarida do infante seu; por provido conselho, sua manha com mais grita era escondida.
Ergue-se nesse monte um grande Velho, que pra Damiata tem voltado o dorso, e olha pra Roma como seu espelho.
Sua cabeça, de ouro, é um esplendor só; de pura prata os braços são e o peito, e de cobre é depois todo o seu torso.
Daí pra baixo todo o resto é feito de ferro, salvo que é de terracota, sobre o qual mais se apoia o pé direito.
Cada parte, salvo a de ouro, é rota por fendas onde lágrimas gotejam que, recolhidas, cavam essa grota.
No vale pelas fragas se despejam E o Aqueronte, o Estige e o Flegetonte, deste estreito canal então ensejam,
até que lá, onde há o final desmonte, formam o Cocito; e que lagoa é essa verás, pois não precisa que eu te conte.”
Inferno 14:94-120
O velho de Creta mencionado por Virgílio é uma figura retirada da Bíblia (Daniel 2:3235), mas possui interpretação diferente da pretendida por Dante (ROCHA, 1999). Segundo Rocha, 58
a interpretação que mais se assemelha à de Dante é a de Ovídio em Metamorfoses, no qual o autor atribui o ouro, a prata, o bronze e o ferro às quatro idades do homem. A estátua dá as costas para o mundo antigo (Damieta, Egito) e tem a frente virada para o mundo moderno (Roma, Itália) (ROCHA, 1999). Os poetas seguem então em direção ao oitavo círculo. Ao chegar à beira do precipício, Virgílio pede que Dante lhe entregue a corda que levava amarrada na cintura e então a atira no abismo. Instantes depois, surge Gerión, rei da Espanha segundo a mitologia clássica. Dante o representa como uma criatura dividida em três naturezas (ROCHA, 1999), cabeça de homem, tronco e garras de fera, corpo e cauda de serpente. O rosto é de um homem honesto e bom, que esconde sua verdadeira natureza terrível, qualificando Gerión como a personificação da fraude e o colocando corretamente no oitavo círculo (ROCHA, 1999). Os poetas sobem então na garupa de Gerión, que salta em direção ao abismo escuro, e após cem voltas, Gerión pousa no oitavo círculo.
Figura 55 - A Descida do monstro, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
A proposta para o terceiro giro do sétimo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Propor mecanismo para a chuva de brasas;
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2. A chuva de brasas por si só já é capaz de manter a areia do deserto em temperatura elevada, portanto não há necessidade de aquecimento da mesma; 3. Assegurar que os afluentes do Flegetonte possuam mata ciliar, e que tenham diques e leito de pedra; 4. Assegurar que a chuva de brasas não atinja a mata ciliar de cada afluente. Sugestão se programa de necessidades: 1. Deserto com chuva de brasas; 2. Afluentes do Flegetonte.
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8º círculo (Fraude)
T
ambém chamado de Malebolge (bolsas ou valas malditas), o oitavo círculo do inferno é destinado às almas condenadas por fraude. A fraude é uma característica humana por exigir o uso do intelecto (ROCHA, 1999), portanto as criaturas mitológicas desse círculo são demônios que mentem, enganam e trapaceiam. Dante descreve o Malebolge como sendo feito de pedras da cor de ferro, assim como as paredes da grande encosta que circunda este nível. Cada modalidade de fraude é punida em uma vala diferente, 10 ao todo. As valas são interligadas por pontes, e a vala seguinte é sempre ligeiramente mais baixa do que a vala anterior.
Figura 56 - Malebolge, sem data - Helder da Rocha. Fonte: ALIGHIERI, 1999.
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Recomenda-se que as pontes sigam o padrĂŁo construtivo do exemplo a seguir:
Figura 57 - Ponte de D. Goimil, 1258. Localizada em Santiago de CustĂłias. Fonte: http://fotoscustoias.blogs.sapo.pt/304.html
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1ª vala – Sedutores – Canto XVIII
Figura 58 - Demônios e sedutores, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
A
primeira vala do Malebolge é destinada aos sedutores e rufiões, aqueles que exploraram as paixões dos outros, os controlando e usando-os para servir a interesses próprios (ROCHA, 1999). As almas desta vala são divididas em filas de acordo com o seu pecado, que correm em direções opostas enquanto são açoitadas eternamente pelos demônios. A proposta para a primeira vala do oitavo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Assegurar de que o espaço seja propício para que dois grupos diferentes corram em direções opostas sem que haja interferência em ou outro. Sugestão de programa de necessidades: 2. Área punitiva com raias separadas para cada tipo de pecador; 3. Ponte
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2ª vala – Aduladores – Canto XVIII
Figura 59 - Aduladores, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
A
segunda vala do oitavo círculo é destinada aos aduladores e lisonjeadores, que exploraram os outros ao tirar proveito de seus medos e desejos por meio do uso fraudulento da linguagem (ROCHA, 1999). Estes pecadores estão imersos em fezes ácidas, e se coçam de maneira asquerosa na tentativa de se livrar da sujeira. Dante descreve esta vala como sendo mais funda do que a primeira. A proposta para a segunda vala do oitavo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Garantir que o nível das fezes seja mais baixo do que o fundo da vala anterior; 2. Assegurar que a vala seja impermeabilizada, de modo que as fezes não infiltrem as valas adjacentes. Sugestão de programa de necessidades: 1. Piscina de fezes ácidas; 2. Ponte.
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3ª vala – Simoníacos – Canto XIX
Figura 60 - Os Simoníacos, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
N
a terceira vala do oitavo círculo estão os chamados simoníacos, em outras palavras, os traficantes de itens religiosos. O nome deriva de Simão o mago, que tentou comprar dos apóstolos o poder do Espírito Santo (ROCHA, 1999). Estão aqui clérigos e papas vendedores de indulgências, de lugares no Paraíso e de relíquias sagradas falsas ou verdadeiras. A vala em questão é repleta de buracos onde os pecadores estão enfiados pela cabeça. Vários pecadores ocupam a mesma vala, porém somente os pés do mais recente ficam para fora, sendo queimados com fogo e óleo quente, até que um próximo simoníaco ocupe seu lugar. A proposta para a terceira vala do oitavo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Assegurar que as covas tenham diâmetro suficiente para que acomode uma pessoa de estatura mediana; 2. Assim como no sexto círculo, estas covas possuem fundo infinito, uma vez que não se pode estimar a quantidade de pecadores em cada vala; 65
3. Propor mecanismo para queimar os pés do simoníaco mais recente de cada cova. 4. Deve se pensar na exaustão da fumaça produzida pelas almas, para que não afetem as valas adjacentes. Sugestão de programa de necessidades: 1. Covas circulares; 2. Ponte.
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4ª vala – Adivinhos – Canto XX
Figura 61 - Adivinhos, 1587 - Giovanni Stradano. Fonte: http://www.wikiwand.com/it/Inferno_-_Canto_ventesimo
O
quarto valado é, segundo Dante, o destino daqueles que alegavam poder ver o futuro. O contrapasso dos pecadores desta vala é ter a cabeça torcida de maneira que não podem mais olhar para a frente, somente para trás, enquanto choram e caminham vagarosamente pela vala. A proposta para a quarta vala do oitavo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Dante não faz referência a elementos espaciais nesta vala, portanto presume-se que o ambiente seja constituído de chão e paredes de pedra de cor ferrenha, assim como mencionado na descrição do oitavo círculo. Sugestão de programa de necessidades: 1. Ponte.
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5ª vala – Corruptos – Cantos XXI e XXII
Figura 62 - Inferno canto XXII, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
A
quinta vala do oitavo círculo é o destino dos culpados por corrupção, que dão tendo em vista um benefício pessoal, estão aqui juízes que receberam propina para alterar julgamentos ou políticos que só defendem os interesses de seus representantes. Aqui os culpados por corrupção passam a eternidade imersos em betume fervente, e qualquer alma que tentasse escapar do líquido espesso era brutalmente perfurado pelos demônios, que nesta vala são chamados de Malebranche (malvadas garras) (ROCHA, 1999). Virgílio pede para que Dante fique escondido atrás de uma pedra enquanto conversa com os demônios, pois precisava perguntar sobre o caminho para a próxima vala. O demônio diz que a ponte está quebrada, e que ruiu na mesma ocasião em que ocorreu o deslizamento de terra no sexto círculo. Indicou então a existência de outra ponte mais adiante, e ordenou que outros dez demônios escoltassem os poetas até lá. Enquanto escoltavam os poetas, os demônios acabaram caindo no betume fervente, o que os deixou bastante irados e os fez perseguir os poetas. Dante e Virgílio assumem que estariam sendo perseguidos e resolvem descer para a sexta vala por um declive que encontram à direita. Dessa maneira os poetas se livram dos demônios, que não são autorizados a deixar a quinta vala.
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A proposta para a quinta vala do oitavo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Assegurar que a vala seja devidamente impermeabilizada para que o betume não infiltre as valas adjacentes; 2. O betume é um líquido escuro e viscoso que ferve entre 148,9 e 287,8 °C. Deve-se assegurar que o betume seja mantido nessa faixa de temperatura; 3. Dante se esconde dos Malebranche atrás de uma pedra. Assume-se então que a vala possui várias pedras grandes o suficiente para que isso seja feito sem que os demônios notem alguma anormalidade. Sugestão de programa de necessidades: 1. Piscina de betume fervente; 2. Pedras com 1,60 metros de altura em média; 3. Ponte.
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6ª vala – Hipócritas – Canto XXIII
Figura 63 - Hipócritas, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
N
a quinta vala estão os culpados por hipocrisia, que são punidos vestindo roupas aparentemente luminosas e atraentes, mas que na realidade são pesadas como chumbo. O contrapasso é o peso que não tiveram na consciência ao dizer uma coisa e fazer outra. Entretanto, uma das almas desta vala tinha uma punição diferente. Crucificado ao chão por três cravos estava Caifás, sacerdote que propôs a morte de Cristo (ROCHA, 1999). Os poetas seguem à procura da ponte que os demônios da quinta vala mencionaram. Ao perguntar a uma das almas da sexta vala, Virgílio descobre que, na realidade, não havia outra ponte, e a única existente teria sido destruída. Mas felizmente o declive deixado pela destruição da ponte permitia, ainda que com dificuldade, a descida à próxima vala.
Figura 64 - Os Hipócritas - Fariseu crucificado, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
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Figura 65 - Corte mostrando a quinta e sexta valas do Malebolge e a rampa formada pelas ruínas da ponte destruída, sem data - Helder da Rocha. Retirado da tradução em prosa da Divina Comédia feita por Rocha.
A proposta para a sexta vala do oitavo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Assim como na quarta vala, Dante não faz referência a elementos espaciais, portanto presume-se que o ambiente seja constituído de chão e paredes de pedra de cor ferrenha, assim como mencionado na descrição do oitavo círculo; 2. Assegurar que as ruínas da ponte no sexto valado sejam íngremes, mas que ainda assim permitam a escalada para o próximo círculo. Sugestão de programa de necessidades: 1. Ponte quebrada reduzida a um monte íngreme de pedras a serem escaladas pelos poetas.
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7ª vala – Ladrões – Cantos XXIV e XXV
Figura 66 - Ladrões, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
N
o sétimo valado do oitavo círculo são punidos os ladrões, os falsários dos negócios, os estelionatários. A punição por roubar em vida é ter seu corpo roubado por serpentes das mais variadas espécies e outros répteis mutantes que os atravessam e os desintegram, roubando seus traços humanos e os transformando em cinzas, das cinzas a alma ressurge para continuar padecendo os horrores do ninho das cobras (ROCHA, 1999). A proposta para a sétima vala do oitavo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Dante não faz referência a elementos espaciais nesta vala, portanto presume-se que o ambiente seja constituído de chão e paredes de pedra de cor ferrenha, assim como mencionado na descrição do oitavo círculo. Sugestão de programa de necessidades: 1. Ponte; 2. Criadouro de cobras.
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8ª vala - Maus conselheiros – Cantos XXVI e XXVII
Figura 67 - Maus conselheiros, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
A
oitava vala do oitavo círculo é destinada aos maus conselheiros, aqueles que induziram outros a praticar a fraude. Nesta vala, as almas são eternamente queimadas por uma chama que lhe aprisiona como se fosse uma peça de roupa, nunca abandonando lhes o corpo, como longas chamas acesas em cujo interior se encontram as sombras dos falsos conselheiros. A proposta para a oitava vala do oitavo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Dante não faz referência a elementos espaciais nesta vala, portanto presume-se que o ambiente seja constituído de chão e paredes de pedra de cor ferrenha, assim como mencionado na descrição do oitavo círculo; 2. Deve se pensar na exaustão da fumaça produzida pelas almas, para que não afetem as valas adjacentes. Sugestão de programa de necessidades: 1. Ponte. 73
9ª vala – Cismáticos – Canto XXVIII
Figura 68 - Cismáticos, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
A
nona vala do oitavo círculo é aquela em que estão os semeadores de discórdias, ou os cismáticos. São divididos em três tipos: Os criadores de cismas religiosas, os instigadores de conflitos sociais e os semeadores da desunião familiar. A punição por ser cismático é a mutilação, aqui as almas têm braços decepados, cortes profundos que expunham suas entranhas, orelhas arrancadas etc. A proposta para a nona vala do oitavo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Dante não faz referência a elementos espaciais nesta vala, portanto presume-se que o ambiente seja constituído de chão e paredes de pedra de cor ferrenha, assim como mencionado na descrição do oitavo círculo; Sugestão de programa de necessidades: 1. Ponte.
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10ª vala – Falsários – Cantos XXIX e XXX
Figura 69 - Falsários, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
O
décimo e último valado é destinado aos que falsificam coisas, palavras, dinheiro ou pessoas. A punição varia de acordo com o tipo de pecador. Os falsificadores de matéria, ou alquimistas, são os que falsificam coisas. Segundo Sayers, essa categoria pode ser exemplificada na nossa sociedade por pessoas que adulteram remédios, comida ou que constroem com materiais de baixa qualidade e camuflam com acabamentos caros. A punição por falsificar coisas é estar coberto de sarnas e sofrer com a coceira incessante. Os falsificadores de pessoas são os impostores, que assumem identidades falsas ao se passar por outras pessoas. São punidos com a insanidade extrema e correm pela vala mordendo e arrastando os outros condenados (ROCHA, 1999). Os falsificadores de palavras são aqueles que deram falso testemunho, e fervem de febre tão intensa que os deixa imóveis (ROCHA, 1999). Já 75
os falsificadores de moedas sofrem de hidropisia tão grave que os derrete. Ao mesmo tempo, sentem uma insaciável sede, enquanto vêem rios e fontes em seus sonhos. A proposta para a décima vala do oitavo círculo deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Dante não faz referência a elementos espaciais nesta vala, portanto presume-se que o ambiente seja constituído de chão e paredes de pedra de cor ferrenha, assim como mencionado na descrição do oitavo círculo; Sugestão de programa de necessidades: 1. Ponte.
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9º círculo (Traição)
O
nono círculo do inferno de Dante é destinado às almas que praticaram o pecado da traição. Este nível é constituído por um grande lago congelado chamado Cocito, lago formado a partir das lágrimas de Lúcifer e pelos outros rios do inferno, que desembocam aqui. Neste lago as almas ficam imersas de acordo com a gravidade da traição que cometeram. A profundidade em que a alma está congelada é diretamente proporcional à gravidade da traição cometida. Assim como os dois círculos anteriores, o nono círculo sofre subdivisões, mas estas não são escalonadas, já que o círculo é todo tomado pelo lago. Não havendo necessidades específicas ou descrição de detalhes espaciais nestas zonas (já que a única diferença entre elas é a profundidade na qual as almas estão imersas no lago congelado), as diretrizes serão dadas em conjunto ao final da descrição das zonas.
Figura 70 - Lago Cócito, sem data - Helder da Rocha. Fonte: ALIGHIERI, 1999.
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Ao sair do Malebolge os poetas vão em direção ao próximo círculo, e Dante avista o que parecem ser torres de uma cidade. Virgílio então explica que na verdade não eram torres e sim gigantes, que Dante descreve como tendo a cabeça em igual tamanho à cúpula da basílica de São Pedro em Roma. Todos os gigantes estão acorrentados, menos Anteu, pois não se rebelou contra Júpiter, e é Anteu que leva os poetas para o último círculo.
Figura 71- Anteu - Descida para o último círculo, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
Caína – Canto XXXII A primeira zona do nono círculo chama-se Caína, nome derivado de Caim, que segundo a Bíblia matou seu irmão Abel por inveja. Aqui são punidos os que traíram seus parentes, e aqui as almas ficam imersas no gelo presas da cintura para baixo.
Figura 72 - Inferno canto 32, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
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Antenora – Cantos XXXII e XXXIII A segunda zona do nono círculo tem o nome de Antenora, nome derivado de Antenor, príncipe tirano que traiu seu país ao manter correspondência secreta com os gregos (ROCHA, 1999). Aqui são punidos, portanto, aqueles que traíram a sua pátria, e as almas estão congeladas até o pescoço.
Ptolomeia – Canto XXXIII A penúltima zona do nono círculo é a Ptoloméia, nome derivado do personagem bíblico Ptolomeu, que, quando Simão e os filhos se hospedam em seu castelo, os mata a sangue frio (ROCHA, 1999). Estão aqui os que traíram seus hóspedes, e os condenados estão, assim como no giro anterior, congelados até o pescoço, porém com os rostos retorcidos para cima. As lágrimas das almas congelam nas órbitas tornando-os cegos para tudo à sua volta.
Judeca – Canto XXXIV A última zona do último círculo do Inferno de Dante é chamada de Judeca, nome derivado de Judas Iscariotes, traidor de Jesus Cristo. Estão aqui, portanto, os traidores de seus benfeitores, e aqui os pecadores estão completamente submersos no gelo.
Figura 73 - Inferno canto 34, sem data - Gustave Doré. Fonte: https://www.wikiart.org/pt/gustave-dore
Nesta zona está Lúcifer, que traiu a Deus. Dite é um monstro enorme, cujo braço é maior do que os gigantes, e está congelado da cintura para baixo no centro da Terra. O monstro tem três faces (segundo Longfellow, cada face representava um dos continentes conhecidos), uma vermelha, uma amarela e uma preta, e seis asas como as de morcegos, porém maiores do que uma vela de navio. 79
As seis asas de Lúcifer produzem os três ventos que mantêm o Cocito congelado. Seus seis olhos choram sangue e espuma, e cada uma das três bocas mastiga um pecador. Na boca do meio está Judas Iscariotes, na segunda está Brutus, o traidor de Júlio Cesar, e na terceira, Cassio, cúmplice de Brutus. Os poetas então vão em direção à Dite, pois somente pelo fosso que ele guarda é que se pode sair do Inferno. Dante e Virgílio saltaram então nas costas do monstro e desceram até a junção da coxa e do tronco de Lúcifer, e pularam para uma fenda nas rochas. Neste momento os poetas passam pelo centro da Terra, e a gravidade que fazia com que descessem, agora os faz subir. Seguem então pelo caminho subterrâneo até que passam por outra abertura nas pedras, para enfim rever as estrelas (ROCHA, 1999). A proposta para o nono e último círculo do Inferno de Dante deverá levar em consideração as orientações a seguir: 1. Não se faz necessário propor equipamento para manter a temperatura negativa no Cocito pois Dante já especifica como isso é feito; 2. Deve-se lembrar que a Divina Comédia é uma obra de ficção, e, portanto, não deve ser levado em consideração a composição ou o diâmetro real do centro da Terra; 3. A cúpula da Basílica de São Pedro é formada por quatro arcos de 26 metros de vão e 46 metros de altura. O dimensionamento dos gigantes e consequentemente de Lúcifer, deve ser feito a partir desses dados. Sugestão de programa de necessidades: 1. Cinco espaços destinados aos gigantes acorrentados; 2. Espaço destinado ao gigante Anteu, que não está acorrentado; 3. Lago Cocito congelado; 4. Fosso de Lúcifer.
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CONCLUSÃO
Figura 74 - O inferno de Dante, sem data - Helder da Rocha. Fonte: ALIGHIERI, 1999.
A
Divina Comédia é um poema extremamente bem estruturado. Dante não só escreveu, Dante criou, projetou e construiu um cosmos em forma de palavras. Ler a Comédia não é simplesmente ler. Em se tratando de uma alegoria, há que se analisar e refletir sobre cada terceto, desvendando assim a real intenção do autor. A análise da Divina Comédia é exercício frequente em todo o mundo, das mais variadas maneiras possíveis e imagináveis, e ainda assim continua a ser feita. O universo de Dante instiga a imaginação de quem se permite conhecer esta obra, gerando resultados diferentes em cada uma das abordagens e interpretações já feitas a seu respeito. Projetar o inferno pode soar ambicioso, mas nada mais natural diante de uma narrativa tão rica em detalhes. Como estudante de arquitetura, enxergo o ato de projetar no primeiro livro da Comédia, como uma simples consequência do fato de ter lido e me apaixonado pela obra, e no presente ensaio foi produzido o Termo de Referência que guiará este projeto. Foram elaboradas 55 diretrizes no total, divididas ao longo dos nove círculos do Inferno de Dante. Os círculos culposos possuem maiores peculiaridades espaciais, enquanto os dolosos são mais contidos nesse quesito. Prevalece na obra o caráter de manifesto político e não somente de epopeia, portanto muitas vezes Dante prioriza os personagens ao ambiente no qual eles se encontram. O ambiente tem papel de crítica à sociedade medieval, e age como contrapasso ao pecado que as almas presentes ali cometeram. Sendo um manifesto político medieval, a Divina comédia reflete o pensamento de uma era, expondo seus medos, sonhos, anseios e preconceitos, que por muitas vezes não refletem o 81
pensamento contemporâneo sob os mesmos aspectos. Como o caráter do trabalho em questão é ser referência para o projeto do arcabouço descrito por Dante, não cabe a mim mudar elementos que reflitam esse pensamento antiquado. Foi discutido mudar algumas punições e/ou adaptar alguns locais a fim de amenizar o sofrimento destas almas, mas isto acarretaria em uma mudança drástica no que Dante descreveu. Portanto, escolhi não entrar em detalhes nessas situações, uma vez que elas não mudam a conformação do espaço, que é o objeto de trabalho. Concluo então afirmando que os objetivos pretendidos para este ensaio foram atingidos, e que, se a Divina Comédia merece ser conhecida, por que não ser projetada?
Escopo do projeto São identificados, abaixo, o conteúdo e as informações técnicas mínimas que devem integrar o projeto do Inferno de Dante, nos termos das regras de apresentação a serem apresentadas pela Coordenação de Diplomação. Deve conter uma planta geral e plantas individuais de cada círculo, cortes gerais, detalhes, diagramas, perspectivas, entre outros recursos gráficos. As escalas, a diagramação e o padrão gráfico são livres, desde que garanta a legibilidade das informações. Deverão ser indicadas as escalas dos desenhos e soluções. As ampliações em planta, corte e perspectiva devem permitir a leitura das soluções de arquitetura. Recomenda-se a representação de eventuais movimentações de terra (cortes esquemáticos, hachuras ou diagramas). Deve-se ainda prever a indicação, de forma diagramática, das soluções para drenagem, armazenamento, captação e reuso de água. Os desenhos de edificações deverão conter, quando pertinente: a) Layouts internos em escalas e padrões que permitam a compreensão dos compartimentos e propostas de ocupação; b) Indicação das áreas e níveis; c) Identificação dos acessos; d) Plantas, cortes e volumetria das edificações.
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BIBLIOGRAFIA A seguir é apresentada a bibliografia utilizada para a elaboração do presente termo de referência, que poderá ser utilizada na elaboração da proposta de projeto, sem prejuízo para outras fontes que julgue pertinentes: ALIGHIERI, D., 1867. The Divine Comedy. Translation and notes by Henry Wadsworth Longfellow. Disponível no sítio http://www.gutenberg.org/ebooks/1004 ______, 1995. The portable Dante. Translation and notes by Mark Musa. 1ª ed. EUA: Viking Press. ______, 1999. A Divina Comédia: inferno. Versão em prosa, notas, ilustrações e introdução por Helder L. S. da Rocha. Ilustrações de Gustave Doré, Sandro Botticelli e William Blake. 1ª ed. São Paulo: s.n. ______, 2014. A Divina Comédia. Tradução, comentários e notas de Ítalo Eugênio Mauro; prefácio de Otto Maria Carpeaux. 2ª ed. São Paulo: Editora 34. BLACK, J., 2013. A história secreta de Dante: revelando os mistérios do Inferno na vida real. 1ª ed. Rio de Janeiro: Rocco. BULFINCH, T., 2013. O livro da mitologia: a idade da fábula. 1ª ed. São Paulo: Martin Claret. HOMERO, 2013. Odisseia. Tradução, posfácio e notas de Trajano Vieira; texto em apêndice de Franz Kafka. 1ª ed. São Paulo: Editora 34. LUCCHESI, M., 2013. Nove cartas sobre A Divina Comédia: Navegações pela obra clássica de Dante. 1ª ed. Rio de Janeiro: Casa da Palavra. SAYERS, D., 1949. The Comedy of Dante Alighieri the Florentine: Hell (L’Inferno). 1ª ed. EUA: Penguin. VIGLIO, S., 1970. Introdução ao Estudo de Dante. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Electra VIRGÍLIO, 2004. Eneida. Traduzida por José Victorino Barreto Feio, José Maria da Costa e Silva; edição organizada por Paulo Sérgio de Vasconcellos. 1ª ed. São Paulo: Martins Fontes.
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