O imaginário no design gráfico autoral um estudo a partir de coleções literárias
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Universidade Federal de Pelotas Instituto de Artes e Design Curso de Artes Visuais Habilitação em Design Gráfico
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O imaginário no design gráfico autoral: um estudo a partir de coleções literárias Carolina Moraes Marchese
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Curso de Artes Visuais Habilitação Design Gráfico da Universidade Federal de Pelotas, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em design gráfico
Orientadora Profa. Ms. Ana da Rosa Bandeira
Pelotas, 2010
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Banca examinadora Guilherme Carvalho da Rosa Marcos Namba Beccari Maria de Lourdes Valente Reyes
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Agradecimentos
Ao Caio Fernando Abreu, por reaparecer nesse momento. À Ana, por compartilhar o amor pelos livros e entender meus encantamentos. E por ser a melhor orientadora. À Maria de Lourdes e ao Guilherme, por terem aceito o convite para a banca e me presentearem com suas considerações. Ao Marcos Beccari, pelas oficinas no N-Curitiba, as trocas de e-mail, os referenciais e, principalmente, por ter aceito ser membro da banca mesmo à distância. Aos professores Fernando, Kelly, Duda, Daniel e Vivian, por terem sido ótimos nos encontros durante esses quatro anos de IAD, provocando reconsiderações e reencantamentos. Ao PET Artes Visuais, pelas experiências. Aos amigos, por serem lindos. Sempre. Ao Lauro, por estar junto. Ao meu avô Ery e à minha avó Eunice, por existirem e compartilharem isso comigo. Aos meus pais, por serem e permanecerem. *
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Resumo O presente trabalho procura estabelecer algumas relações entre o objeto livro e seu projeto gráfico, focando o estudo em coleções literárias. Através da história da leitura, vista a partir de André Belo e das mudanças de configuração do objeto ao longo do tempo, pela visão histórica de Philip Meggs, são realizadas considerações à respeito da apresentação deste objeto na contemporaneidade. Utilizando a sociologia compreensiva de Michel Maffesoli e as noções discutidas pelos Estudos do Imaginário, são realizadas algumas considerações a respeito da identidade gráfica de coleções literárias selecionadas e do próprio
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objeto, refletindo também algumas ideias do filósofo Vilém Flusser. Ao final da pesquisa teórica, são apresentadas as capas pertencentes a uma coleção autoral, cuja estruturação do projeto utiliza as noções desenvolvidas ao longo deste processo. Palavras-chave: design editorial, capa de livro, imaginário
Abstract This study tries to estabilish some relationships between the book object and its graphic project, focusing the study in literary collections. Throughout the history of reading, seen since André Belo and the changes of the object configuration over time, through the historical view of Philip Meggs, considerations are made about how this object is presented in contemporary times. Using Michel Maffesoli’s comprehensive sociology and the notions discussed by the Imaginary Studies, some considerations are made about graphical identity of selected literary collections and the object itself, also reflecting some ideas of philosopher Vilém Flusser. After the theoretical research, covers from an authorial collection whose design structure uses the notions developed throughout this process are presented. Keywords: editorial design, book cover, imaginary
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Lista de figuras
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Figuras 41,42 e 43 - Capas da Colecção de obras célebres..................................46 Figura 44 - Capas da editora José Olympio.............................................................47
Figura 1 - Capa do Livro das perguntas ................................................................... 17
Figura 45 - Capas de Eugenio Hirsch.........................................................................48
Figura 2 - Lombada do Livro das perguntas ...........................................................17
Figura 46 - Capa de Ziraldo.........................................................................................49
Figura 3 - Capa de Bartleby, o escrivão.....................................................................18
Figura 47 - Capa de Bea Feitler...................................................................................49
Figura 4 - Páginas de Bartleby, o escrivão sendo refiladas.............................18/19
Figura 48 - Capa de Marius Bern................................................................................49
Figura 5 - Rolo de velino. ............................................................................................22
Figura 49 - Capas do Clube do Livro.........................................................................49
Figura 6 - Tipos móveis ..............................................................................................23
Figura 50 - Capas do Clube do Livro.........................................................................50
Figura 7 - Bíblia de Gutenberg .................................................................................24
Figura 51 - Capas da coleção Debates......................................................................51
Figura 8 - Página de Vita et Fabulae, impressão de Anton Sorg, 1479...............25
Figuras 52 e 53 - Capas d’O Livro amarelo do terminal.........................................53
Figura 9 - Página de livro de geometria projetado por Pickering.................26/27
Figura 54 - Capa e quarta-capa d’O Livro amarelo do terminal...........................54
Figura 10 - Página interna de The works of Geoffrey Chaucer.....................26/27
Figura 55 - Diferentes tipos de papel d’O Livro amarelo do terminal.................55
Figura 11 - Imagem tipográfica do livro Alice no país das maravilhas................28
Figura 56 - Uso da transparência dos diferentes tipos de papel d’O Livro
Figura 12 - Páginas de Un coup de dés....................................................................28
amarelo do terminal ....................................................................................................55
Figura 13 - Capa para livro de Reiner Maria Rilke...................................................29
Figura 57 - Coleção Clássicos da Editora Abril........................................................58
Figura 14 - Base nine and twelve, tipografia de Zuzana Licko.............................29
Figuras 58, 59 e 60 - Capas da coleção Great Ideas...............................................59
Figura 15 - Página interna da revista Ray Gun.........................................................29
Figura 61 - Lombadas da coleção Great Ideas........................................................59
Figura 16 - Sobrecapa e capa para livro de David Sedaris.....................................30
Figura 62 - Capa da Penguin, 1935............................................................................60
Figura 17 - Capa para livro de Kurt Andersen...........................................................31
Figura 63 - Capa da Penguin, 1949...........................................................................60
Figura 18 - O leitor de livre postura...........................................................................35
Figura 64 - Capa do selo Penguin-Companhia, 2010...........................................60
Figura 19 - Livros incorporados à decoração..........................................................36
Figuras 65, 66, 67 e 68 - Capas da coleção Raymond Chandler..........................61
Figuras 20, 21, 22, 23 - Estrutura do livro...........................................................38/39
Figuras 69, 70, 71 e 72- Capas para livros de Caio Fernando Abreu...................61
Figura 24 - Página de The telephone book..............................................................40
Figuras 73, 74, 75 e 76 - Capas da coleção Particular............................................62
Figura 25 - Página de Hella Lonjerius........................................................................40
Figura 77- Caixa da coleção Moda Brasileira I.........................................................63
Figura 26 - Página de Informal....................................................................................40
Figura 78- Livros da coleção Plenos Pecados..........................................................63
Figura 27 - Capa de Antologia Poética......................................................................41
Figura 79 - Detalhes da coleção Particular..............................................................65
Figura 28 - Capa de Budapeste..................................................................................41
Figura 80 - Detalhes da abertura de páginas em Zazie no metrô........................66
Figura 29 - Capa de Love Poems................................................................................41
Figura 81 - Detalhes de Primeiro Amor.....................................................................67
Figura 30 - Capa de A pista de gelo...........................................................................42
Figura 82 - Detalhes da abertura de páginas em Primeiro Amor.........................67
Figura 31 - Capa de Atlas.............................................................................................42
Figura 83 - Detalhes da coleção José Lins do Rego..............................................68
Figura 32 - Capa de Em outros quartos, outras surpresas.....................................42
Figura 84 - Detalhe da impressão da coleção José Lins do Rego.......................69
Figura 33 - Capa de Até o dia em que o cão morreu..............................................43
Figuras 85, 86, 87, 88, 89 e 90 - Volumes da coleção Moda Brasileira I.............71
Figura 34 - Capa de Satolep........................................................................................43
Figura 91 - Estrutura de capa da coleção Moda Brasileira I..................................72
Figura 35 - Capa de A disciplina do amor.................................................................43
Figura 92 - Detalhes internos de Ronaldo Fraga.....................................................73
Figura 36 - Capa de Urupês.........................................................................................44
Figura 93 - Detalhes da coleção Plenos Pecados...................................................74
Figura 37 - Capa de Caravana dos destinos.............................................................45
Figura 94 - Detalhes da aplicação de verniz............................................................75
Figuras 38,39 e 40 - Capa, página de abertura de capítulo e página dupla de
Figura 95 - Detalhes da estrutura interna dos livros..............................................76
miolo de Nós..................................................................................................................45
Figura 96 - Detalhe da página de abertura de capítulo.........................................77
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Sumário
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Introdução..............................................................................15 1 O livro....................................................................................21 1.1 O objeto.............................................................22 1.2 A imprensa no Brasil........................................32
2 O design no livro.................................................................37 2.1 A estrutura.........................................................38 2.2 O design de livros no Brasil............................44
* * *
2.3 O livro e o designer.........................................52 3 Coleções literárias como base para criação.................57 3.1 O que é coleção literária.................................58 3.2 Análises..............................................................64 3.2.1 Coleção Particular................................65 3.2.2 Coleção José Lins do Rego................68 3.2.3 Coleção Moda Brasileira I...................71 3.2.4 Coleção Plenos Pecados....................74 3.3 Criando uma coleção.....................................80
* * * *
4 Descrição metodológica.................................................143
* *
12
* *
1.3 A leitura, o leitor...............................................34
Considerações finais...........................................................149 Referências Bibliográficas..................................................157
13
*
A única magia que existe é estarmos vivos e não entendermos nada disso. A única
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magia que existe é a nossa incompreensão. Caio Fernando Abreu
Introdução
amor (ô). [Do lat. amore.] S. m. 1. Sentimento que predispõe alguém a desejar o bem de outrem, ou de alguma coisa: amor ao próximo; amor ao patrimônio artístico de sua terra. 9. Afeição, amizade, carinho, simpatia, ternura. 10. Inclinação ou apego profundo a algum valor ou alguma coisa que proporcione prazer; entusiasmo, paixão. 11. Muito cuidado; zelo, carinho. (In: FERREIRA, 1986, p. 107). mania. [Do gr. manía, ‘loucura’, pelo lat. mania.] S. f. 4. Gosto exagerado ou imoderado por alguma coisa; obcecação resultante de desejo imoderado. 5. O alvo desse gosto ou desejo: Colecionar borboletas tornou-se a sua mania. (In: FERREIRA, 1986, p. 1080). A pesquisa a partir da qual esse texto foi gerado não
trata, de maneira alguma, das possibilidades do amor entre pessoas, assim como o ato de colecionar borboletas não faz
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parte do corpus referencial do trabalho. Esse texto trata de livros: o objeto
ção que o designer estabelece com os livros, através das seguintes perguntas:
livro, suas possibilidades e formatos.
“Quais as possibilidades de criação da identidade gráfica de um volume único e de uma coleção?”, “Quais as relações do projeto gráfico com a obra que este
livro. [Do lat. libru] S. m. 1. Reunião de folhas ou cadernos, soltos,
comporta?” e “Como se apresenta o processo de autoria em design gráfico,
cosidos ou por qualquer outra forma presos por um dos lados e
especialmente em projetos editoriais?”.
enfeixados ou montados em capa flexível ou rígida. (In: FERREIRA, 1986, p.1042). É possivel unir os conceitos de amor e livro, assim como o de mania e livro. Desta forma, são originados dois conceitos que foram muito impor-
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tantes na geração do problema de pesquisa e na estruturação deste trabalho de conclusão de curso:
Para falar em autoria no projeto gráfico de livros, parto da edição de 2008, da editora brasileira Cosacnaify, do Livro das Perguntas, de Pablo Neruda (Fig. 1). Neste volume, o nome de Isidro Ferrer, autor das ilustrações, está presente na capa, com mesmo destaque e importância que o nome de Neruda. Na lombada (Fig. 2), lemos: Neruda+Ferrer+Gullar, o que coloca autor, ilustrador e tradutor em mesmo grau de importância.
bibliofilia. [De bibli(o)- + -filia.] S. f. 1. Amor aos livros. (In: FERREIRA, 1986, p. 253). bibliomania. [De bibli(o)- + -mania.] S. f. Mania de acumular livros. (In: FERREIRA, 1986, p. 253). Devo dizer que este trabalho parte do meu grande interesse por livros e literatura, do carinho pelo objeto. A ideia deste trabalho vem da vivência e da observância deste comportamento, da relação afetiva dos homens com seus livros. Como unir a literatura ao design gráfico de uma forma mais dinâmica do que simplesmente projetar capa e miolo de um volume? Criando um objeto, um livro que seja suporte para a criação gráfica, que permita ao designer a impressão de sua marca, a reflexão de suas vivências, o imaginário como reservatório/motor (SILVA, 2006). O que me proponho a investigar, utilizando conceitos do Imaginário já abordados por Michel Maffesoli e Juremir Machado da Silva, é a rela-
Figura 1 (esquerda) - Capa do Livro das perguntas. Fonte: da autora Figura 2 (direita) - Lombada do Livro das perguntas. Fonte: da autora
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Ainda neste sentido cito a edição de 2005, também da editora Co-
forma, ao projetar e propor experiências com seu produto, o designer, assim
sacnaify, da obra Bartleby, o escrivão: Uma história de Wall Street (Fig. 3), es-
como o poeta, ao escrever, “desperta as vozes adormecidas na memória cole-
crita no século XIX por Herman Melville. O livro pede mais do que uma sim-
tiva” (MAFFESOLI, 2001).
ples leitura: o leitor necessita, literalmente, descosturá-lo. Capa e contracapa
O estudo aqui apresentado tem seu método baseado na sociologia
são costuradas uma na outra em linha vermelha. Após o exercício da (des)
compreensiva, descrita por Maffesoli como uma “atitude que pensa em ter-
costura, o leitor se depara com um volume que, para a leitura da história, pede
mos de globalidade” (2007, p. 30). É uma postura que recusa toda discrimi-
auxílio de uma lâmina cortante para suas páginas se abrirem e o texto surgir
nação e repudia qualquer avaliação de mérito, tendo sua base na descrição
(Fig. 4). Cria-se aí uma nova experiência, uma nova interpretação proposta
fenomenológica do objeto de estudo, considerando que este é imerso em “um
por Elaine Ramos para a novela escrita na segunda metade do século XIX.
rio cujas águas passam muitas vezes no mesmo lugar, sempre iguais e sempre
Além disso ,este projeto acaba propondo uma reflexão (mesmo que involun-
diferentes” (SILVA, 2006, p. 8), em imaginários.
tária) sobre o próprio objeto livro e sua história, visto que, na época em que
A fim de melhor estruturar o estudo do fenômeno apresentado, di-
a história foi escrita, por falta de acabamento e refile do volume, os próprios
vidi o trabalho em três partes, que dão origem aos capítulos aqui presentes: O
leitores muitas vezes tinham de destacar ou abrir as páginas de um livro novo.
livro; O design no livro; e Coleções literárias como base para criação.
Michel Maffesoli, em seu livro Elogio da razão sensível (2001), colo-
Na primeira parte, O livro, procuro contextualizar o objeto livro e
ca o fator sensível como sendo primário no conhecimento, aliado ao intelecto.
situá-lo ao longo da história, abordando suas modificações e evoluções. Para
É certo que se a experiência sensorial/estética se dá de maneira empírica, e
compreender melhor como se configura este objeto, se mostrou necessário re-
relaciona-se com o imaginário no qual o indivíduo-receptor está imerso, a pro-
alizar uma breve pesquisa sobre a leitura e o sujeito leitor e sobre a imprensa
dução de objetos/produção em design deve-se valer desta sensibilidade para
no Brasil.
criar, reconhecer e projetar experiências/produtos para este indivíduo. Desta
Figura 3 (esquerda) - Capa de Bartleby, o escrivão. Fonte: da autora Figura 4 (direita) - Páginas de Bartleby, o escrivão sendo refiladas. Fonte: da autora
19
As relações do objeto livro com sua apresentação visual dão origem à segunda parte do trabalho, denominada O design no livro. Esta parte se caracteriza pela apresentação da estrutura do livro e referências históricas em projeto gráfico, visto que é necessário realizar este apanhado para melhor analisar e vislumbrar as possibilidades de produção do objeto na contemporaneidade. Ainda nesta etapa, faço um estudo centrado no caso brasileiro, tanto por minha própria posição geográfica de habitante do Brasil, quanto pela originalidade e maestria dos profissionais que aqui trabalham (e trabalharam), tornando o país referência nesta área do design. Ao final do capítulo, apresento o estudo relativo à autoria no projeto gráfico.
20
A prática projetual neste trabalho se encontra no capítulo Coleções literárias como base para criação gráfica, que, além de apresentar diferentes possibilidades de coleções, comporta análises, por mim realizadas, de coleções projetadas por Victor Burton e Elaine Ramos, dois projetistas brasileiros de diferentes momentos históricos e de grandes projetos. Tais análises seguem o que Maffesoli apresenta como “descrições de elementos díspares, os quais, posteriormente, serão passíveis de análise e comparação” (MAFFESOLI, 2007, p. 34), que posteriormente darão origem a “grupos de afinidades morfológicas” (SPENGLER apud MAFFESOLI, 2007, p. 34). Apresento o projeto gráfico resultante deste estudo no subcapítulo Criando uma coleção. Neste último momento, utilizo todo o estudo construído ao longo dos capítulos anteriores para estabelecer meus próprios parâmetros de unidade de uma coleção: do agrupamento das obras literárias à construção da identidade gráfica da coleção criada e de seus volumes individuais.
1
O livro 21 Historiadores consideram a história do livro não só a partir do aparecimento deste objeto no formato que conhecemos hoje, mas considerando qualquer material que serve de suporte para escrita, como jornais; tábuas de argila; rolos de pergaminho; e até mesmo a tela luminosa do computador, como parte integrante da história deste objeto. Ou seja, “livro é uma metáfora que usamos para designar um suporte do texto” (BELO, 2002, p. 27). A palavra livro é derivada do latim liber, termo utilizado para designar uma parte da árvore que era utilizada como suporte para escrita. Com a História da Leitura ocorre um fenômeno parecido: são consideradas, neste caso, não só a leitura verbal, mas também a leitura imagética, pelo fato de o alfabetismo ser um privilégio das elites em dados momentos da história, e a leitura coletiva, ou oral, era um modo fácil já que era necessário apenas um livro e um leitor para um número expressivo de indivíduos. A partir destas considerações, pode-se então entender que a história do livro e da leitura é, antes de tudo, a história da difusão e do acesso ao conhecimento.
1.1 22
Entre os séculos II e IV, uma nova forma de livro sur-
O objeto
giu: o códice, ou códex, a forma utilizada até hoje, que consiste
Como já mencionado anteriormente, o livro obteve diversos
em um “conjunto de cadernos
formatos até configurar-se no objeto que se conhece hoje.
costurados uns aos outros e en-
Mas, para fins de melhor estudá-lo neste trabalho, escolhi
cadernados” (BELO, 2002, p.
discorrer apenas sobre os dois formatos mais difundidos ao
25). Este novo formato provo-
longo da história - o rolo e o códice.
cou inovações não só na maneira
Os rolos, ou volumem, em latim, eram pesados ro-
de armazenar e projetar o livro,
los de papiro ou pergaminho e por isso sua leitura se dava de
mas também na relação corpo-
maneira horizontal: era exigida do leitor uma postura especí-
ral e no processo intelectual da
fica, como descreve André Belo:
leitura, já que as mãos ficavam
[...] as duas mãos ficavam ocupadas com a tarefa de desenrolar e segurar o rolo; a porção de texto visível a cada momento da leitura era relativamente pequena e a operação de avançar ou recuar no texto para relembrar certas frases ou comparar trechos distantes não era cômoda (BELO, 2002, p. 26).
23 Figura 6 - Tipos móveis. Fonte: HEITLINGER, 2007.
livres e o leitor era capaz de realizar apontamentos e navegar livremente pelas páginas, revisitando trechos com facilidade a qualquer momento. Outra revolução no modo de leitura e expansão de conhecimento ocorreu no século XV, com o advento da impressão tipográfica (Fig. 6), desenvolvida por Johannes Gutenberg. De acordo com Meggs, Tipografia é o termo para a impressão com pedaços de metal ou madeira independentes, móveis e reutilizáveis, cada um dos
Desse modo, a leitu-
quais com uma letra em alto-relevo em uma de suas faces. Essa
ra tornava-se trabalhosa e “tor-
definição seca não dá a devida proporção do enorme potencial de
nava impossível ao leitor escre-
conexão entre as pessoas e os novos horizontes para o design grá-
ver apontamentos ao mesmo
fico que foram desencadeados por esse extraordinário invento, em
tempo que lia” (BELO, 2002, p.
meados do século XV, por um incansável inventor alemão cujo re-
26), o que, a princípio, dificulta-
trato e assinatura se perderam na implacável passagem do tempo.
va a existência do leitor crítico,
A invenção da tipografia pode ser classificada ao lado da invenção
já que este estava ocupado em
Figura 5 - Rolo de velino.
da escrita como um dos avanços mais importantes da civilização
segurar e desenrolar o rolo.
Fonte: PAIVA, 2010, p. 16
(MEGGS, 2009, p. 90).
Antes da tipografia, os livros
Outros autores, como Roger Chartier, acreditam que as mudanças
eram manuscritos, logo, sua reprodução
ocorridas a partir de Gutenberg não foram tão importantes quanto as que se
era lenta, o que fazia com que os livros, e
sucederam com o surgimento do códice (CHARTIER apud BELO, 2002, p.
portanto, o conhecimento, ficassem pre-
25). De fato, a numeração de páginas, a presença dos títulos de capítulos e
sos a um círculo determinado de pessoas.
ainda os índices - elementos que hoje são considerados essenciais para orien-
A partir do século XV a impressão permi-
tação do leitor - surgiram quando o livro tomou esta nova configuração, na
tiu, então, a expansão do conhecimento e
época dos livros manuscritos.
o aumento do índice de alfabetismo.
24
Apesar da revolução técnica na edição de livros ocorrida neste perí-
De fato, os livros tipográficos
odo, as contribuições para o design gráfico foram realizadas por um pequeno
não foram facilmente absorvidos. Os co-
número de impressores, já que “a maioria se contentava em imprimir cópias
Figura 7 - Bíblia de Gutenberg.
lecionadores de livros e os copistas - res-
de manuscritos ou edições anteriores já publicadas” (MEGGS, 2009, p. 107).
Fonte: MEGGS, 2008, p. 100.
ponsáveis pela cópia dos livros manuscri-
A efetiva inovação ocorreu em território alemão, liderada por xilogravuristas e
tos - buscavam o retorno à tradição dos livros reproduzidos manualmente. Os
impressores tipográficos, dando origem ao livro tipográfico ilustrado (Fig. 8).
primeiros, por acreditarem que o livro manuscrito era mais vistoso e, por ter
Um novo período de inovação na produção de livros começou com
menos cópias, mais valioso, e os últimos - os copistas -, pelo temor de serem
a chegada dos livros tipográficos ilustrados na Itália. O período renascentista
rapidamente substituídos pela nova ferramenta, não tendo de onde tirar seu
era propício para o avanço da edição de livros, visto que ocorreu um renasci-
sustento.
mento da literatura clássica grega e romana. Durante muito tempo, após Gutenberg ter divulgado sua invenção
Neste momento o design do livro como um
e esta estar a pleno uso, os dois meios de reprodução de livros, manual e mecâ-
todo foi repensado: tipografia; ilustrações;
nico, “eram utilizados de forma complementar, não oposta, consoante a situa-
leiaute de página e ornamentos foram qua-
ção e o público que se pretendia atingir” (BELO, 2002, p. 87). Assim, os livros
lificados. Sobre esta contribuição italiana
impressos eram destinados a grandes públicos e os manuscritos a pequenos
Meggs comenta:
círculos de leitores. Além disso, os livros manuscritos eram livres de censura, O livro tipográfico chegou da
enquanto os tipográficos teriam de ser submetidos à revisão.
Alemanha à Itália como um livro
É importante, também, fazer uma análise das mudanças sociais e
de estilo manuscrito impresso
culturais ocorridas com o surgimento da tipografia e não somente as trans-
com tipos. Uma série de inova-
formações de cunho técnico. Elisabeth Eisenstein defende que a imprensa
ções, como a folha de rosto, tipos
alterou significativamente a leitura e a compreensão dos textos de forma intelectual e que seu surgimento possibilitou o pensamento científico moderno
Figura 8 - Página de Vita et Fabulae, impressão de Anton Sorg, 1479. Fonte: MEGGS,
(EISENSTEIN apud BELO, 2002, p. 23).
2008, p. 109.
25
romanos e itálicos, números de página
defensor do trabalho manual em plena efervescência
impressos, ornamentos em xilogravuras
industrial. O parodoxo reside no fato de que enquan-
e metal fundido e métodos inovadores no
to Morris “procurava refúgio no trabalho manual
leiaute de ilustrações com tipos, permitiu
feito no passado, desenvolveu atitudes em relação ao
aos impressores italianos do Renasci-
design que delineavam o futuro.” (MEGGS, 2009, p.
mento legar à posteridade o formato
226).
básico do livro tipográfico como hoje o
Após Morris os livros passaram a ter proje-
conhecemos (MEGGS, 2009, p. 135). Dessa maneira pode-se entender que, em um curto período de tempo da História - um intervalo de aproximadamente dois séculos -, ocorreram
26 as mudanças mais significativas da história do livro. Somente ao final do século XIX e com a Revolução Industrial, a
tos gráficos mais elaborados, quase sempre com foco Figura 9 - Página de livro
especial na tipografia, pois acreditava-se que a legibi-
de geometria projetado por
lidade do texto era a prioridade. A tipografia, portan-
Pickering. Fonte: MEGGS, 2008,
to, deveria chegar ao ponto de não ser percebida pelo
p. 216/217.
leitor, o que ainda é prezado por muitos designers
produção de livros foi revista. Neste momento a figura de Willian Pickering é
contemporâneos, como Richard Hendel comenta em
essencial: de aprendiz de livreiro se tornou editor e montou sua própria livraria
O design do livro:
em Londres. Pickering foi especialmente importante “na separação do design gráfico da produção tipográfica” (MEGGS, 2009, p. 215). Assim, definia for-
O trabalho real de um designer de livros
matos, ilustrações, tipografias, e o trabalho era executado por editores contra-
não é fazer as coisas parecerem “legais”, diferentes ou bonitinhas. É descobrir
tados sob sua supervisão. Apesar de Pickering ter produzido uma série de tra-
como colocar uma letra ao lado da outra
balhos de alto nível, o design de livros - assim como o de produtos - continuou
de modo que as palavras do autor pare-
sofrendo desgaste de qualidade (pela falta de projetos adequados a esta nova
çam saltar da página (HENDEL, 2006,
maneira de produção) com o advento da tecnologia das máquinas industriais.
p. 3).
Foi com os esforços de William Morris e com o surgimento do mo-
Estes pressupostos foram base para a cria-
vimento Arts and crafts que a produção editorial finalmente se abriu para no-
ção até o surgimento das vanguardas artísticas do sé-
vos horizontes. Morris, em 1888, iniciou-se na produção de tipos e impressão. Desta maneira nasceu a Kelmscott Press, cujo principal objetivo era recuperar
Figura 10 - Página interna de
a tradição de beleza dos livros incunabulares. Os livros (Fig. 10) projetados
The works of Geoffrey Chaucer.
por Morris eram pensados em sua globalidade: tipografia; ilustrações; orna-
Fonte: MEGGS, 2008, p. 225.
mentos; filetes; capitulares etc, todos em perfeita harmonia conceitual, tornando-os verdadeiras obras de arte. É importante frisar que Morris era um fiel
culo XX. A partir daí o design, como as artes visuais, tomaria um novo rumo, se valendo de experiências plásticas dos artistas modernos. Neste período destacam-se, especialmente, os futuristas e dadaístas. Estes grupos realizavam colagens tipográficas com letras de diferentes pesos, estilos e tamanhos, utili-
27
pouca ou completamente despreocupada com a clareza e legibilidade. (...) Tendência a fragmentar imagens e criar múltiplas camadas (fotos sobre texturas, por exemplo). Uso de espaçamentos tipográficos aleatórios e mistura de pesos e estilos de tipo dentro da mesma palavra. Opção por colagens, paródias e citações históricas do design e da arte. Inclusão do ruído (sujeira, imperfeições, Figura 11 (esq.) - Página de Alice no país das maravilhas. Fonte: MEGGS, 2008, p. 322.
rompimento com o acabamento “limpo”, etc) como elemento
Figura 12 (dir.) - Páginas de Un coup de dés. Fonte: MEGGS, 2008, p. 322.
visual. De uma forma geral, essas características encontram-se nos movimentos que, inconscientes disso ou não, fazem parte das
zando o texto como base para criação e expressão visual, herança do escritor Lewis Carroll (Fig. 11) e do poeta francês Stephan Mallarmé (Fig. 12).
28
As vanguardas foram um marco importante na história do design gráfico. Assim surgiram uma série de projetos que propunham quebrar com a tradição da beleza e legibilidade, tratando a tipografia como um elemento passível de interpretação pelo leitor. Além disso, as capas também buscavam mais do que ser bonitas e informar: elas questionavam e provocavam o leitor. Outro ponto importante foi a substituição da tipografia de Gutenberg pela fotocomposição*, que possibilitava o fácil ajuste de dimensão e espacejamento do tipo, além de criar deformações, contornos e itálicos, através de lentes especiais. O clima da década de 1970 era plural, os questionamentos a respeito da institucionalização e das normas sociais eram correntes. O design gráfi-
raízes do design pós-moderno (KOPP, 2004, p. 73). Nos anos de 1980, o mundo assistia à tecnologia e à eletrônica avançarem continuamente. Neste momento a fotocomposição, que havia sido amplamente utilizada desde a década de 1960, foi sendo gradativamente substituída pelo uso do computador. Uma série de experimentações - antes de alto custo financeiro e grande demora, como a manipulação fotográfica - eram agora possíveis. Nesse período destacam-se o trabalho com tipos de Zuzana Licko (Fig. 14) e a experimentação em design de revistas por David Carson (Fig. 15). Figura 13 - Projeto de capa de livro de Daniel Pleavin. Fonte: MEGGS, 2008, p. 621.
co, assim como a arte, e literatura e a política, vivia a queda do modernismo e o surgimento do design pós-moderno, como define Kopp:
Figura 14 - Base nine and twelve, tipografia de Zuzana
As características gerais do pós-modernismo se referem a uma estética que rompe com a previsibilidade e assepsia do alto moder-
Licko, 1995. Fonte: http://www. emigre.com/EF.php?fid=79
nismo. (...) A geometria é utilizada de forma descontraída, ou seja, *Fotocomposição é a composição tipográfica feita por projeção de caracteres sobre papel (ou película de filme) fotossensível (HEITLINGER, 2007).
Figura 15 - Página interna da revista Ray Gun, direção de arte de David Carson, 1994. Fonte: MEGGS, 2008, p. 634.
29
Figura 16 - Sobrecapa e capa para livro de David Sedaris. Fonte: MEGGS, 2008, p. 657.
30
Meggs (2002) destaca em seu livro a importância do trabalho do
31
designer Chip Kidd (Fig. 16 e 17) para o design de capas de livro. Seu trabalho é propor a leitura da capa pelo leitor. Os trabalhos de Chip Kidd são um ótimo exemplo de como o repertório do designer atua na criação, como ele interpreta
Figura 17 - Capa para livro de Kurt Andersen. Fonte: MEGGS, 2008, p. 657
e reescreve a história de maneira visual, ou seja, como é, ele próprio, autor. Estas observações ficam claras quando o designer as coloca em suas próprias
com o conceito de imaginário como reservatório/motor (SILVA, 2006), visto
palavras: “nunca sei realmente se os leitores entendem os trocadilhos visu-
que estes profissionais acumulam referências, observações e, a partir delas,
ais de minhas capas, mas não posso deixar que isso guie meu trabalho, a um
projetam e propõem novas experiências e estruturas.
ponto em que eu tenha que fazer concessões” (KIDD apud MEGGS, 2009, p. 657). Para Véronique Vienne “Kidd coloca sobre os leitores uma pressão muito específica: pede a eles que transponham a distância entre o que leem e o que veem. Nesse processo ele os educa por demandar que assumam o controle da comunicação” (VIENNE apud MEGGS, 2009, p. 657) e que façam uso do imaginário para sua interpretação. Assim pode-se concluir, no que diz respeito à história do livro, que os editores/escritores/projetistas gráficos são atentos às mudanças e ao espírito social de cada época. As características, após observadas, são então traduzidas em aspectos gráficos - como o geometrismo modernista e a fragmentação contemporânea, por exemplo. Este trabalho pode ser facilmente relacionado
1.2
chegada de S.A.R. ao Estado do Brasil até o dito dia. Rio de Janeiro. A partir
A imprensa no Brasil
daí um expressivo número de tipografias começou a operar em todo o país. É importante aqui citar um trecho de José Barboza Mello: “Naquelas circunstâncias, o 13 de maio de 1808, dia da Impressão Régia, foi, sem falsa retórica,
Nas Américas, o primeiro registro de instalação de Oficina Ti-
no Brasil, o início da libertação do pensamento” (MELLO, 1979, p. 329).
pográfica é no México, em 1535. Estima-se que até 1550 já haviam sido impressos duas dezenas de incunábulos em território mexicano. No Brasil a imprensa se instalou de forma tardia, se comparado a outros países americanos, em 1808, com o Decreto de Criação da Impressão Régia. Curiosamente,
32
os primeiros livros brasileiros datam de 1705, 1710 e 1728, tendo sido impressos, o primeiro e o último em Lisboa, e o segundo no México. A experiência tipográfica tardia do país se deve à colonização portuguesa que, em 1706, baixou a Ordem Régia, proibindo a impressão de livros e papéis avulsos em território brasileiro. Esta ordem supostamente teria fechado a Oficina tipográfica de Recife, embora não existam registros comprovando sua real existência. A proibição de Portugal deve-se ao fato de que “a cultura, além de não ser negócio, desenvolve a inteligência e, paralelamente, o sentimento de libertação dos nativos” (MELLO, 1979, p. 324). No dia 13 de maio de 1808 foi decretada a criação da Impressão Régia no Brasil. O primeiro trabalho executado consistia em um in-folio de 27 páginas, sob o título de Relação dos despachos publicados na Corte pelo expediente da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra no faustíssimo dia dos anos de S.A.R. o Príncipe Regente N.S. e de todos os mais que se têm expedido pela mesma Secretaria desde a feliz
33
1.3
posterior encadernação, além das obras completas em livros. O público dos romances era feminino e as mulheres não liam, segundo correspondência de
A leitura, o leitor
Que vida desperdiçada - escreveu o marceneiro James Hopkinson - é a daquele que não tem livro favorito, que não possui coleção de pensamentos ou de lembranças felizes sobre o que tenha feito, experimentado ou lido (LYONS, 1999, p. 191).
Sthendal, menos de cinco ou seis volumes por mês. Esse crescimento da leitura entre mulheres é um dos fatores associados “ao desenvolvimento da leitura individual e silenciosa, algo que relegava a leitura em voz alta para um mundo que estava em vias de desaparecer.” (LYONS, 1999, p. 176) Este período também foi o período de criação de muitas bibliotecas públicas, onde a classe média baixa tinha acesso à leitura, especialmente para
34
O século XIX foi especialmente impactante para os hábitos de
lazer e diversão. A leitura era realizada, geralmente, ao ar livre, em bosques e
leitura e a formação de sujeitos leitores, já que a alfabetização
campos, em intervalos do trabalho ou aos domingos.
atingiu altos níveis nas classes mais baixas e na comunidade
No século XIX ler tornou-se ação diária. A leitura oral foi sendo
feminina. Martyn Lyons, em seu artigo Os novos leitores no
gradativamente substituída pela leitura silenciosa e intimista, apesar da pri-
século XIX: mulheres, crianças, operários, coloca que a últi-
meira ainda ter sido preservada em locais de trabalho e para melhor fixação do
ma geração a ver o livro sem a competição de outros meios
texto lido. Os cadernos de anotação surgiram, neste momento, como “método
de comunicação/entretenimento foi a do final do século XIX.
pessoal de apropriar-se da cultura literária e manter um diálogo pessoal com
Dessa forma o livro era, sobretudo, objeto de descanso e lazer. Sobre a importância da leitura para a população em geral há um curioso relato:
os textos” (LYONS, 1999, p. 196). A partir do século XIX a leitura, que antes se restringia a livros religiosos e clássicos, se tornou cada vez mais livre. Alguns autores con-
Os leitores americanos, segundo se conta, apinhavam-se no cais para esperar o navio que trazia o último fascículo de The old curiosity shop, de Dickens, tão ansiosos estavam por saber o destino da heroína Little Nell (LYONS, 1999, p. 166). Neste período o romance se consolidou como gênero literário, visto que até o século XVIII não era respeita-
sideram essa liberdade como uma forma de leitura “anárquica, egoística, egocêntrica, baseada num único imperativo: “leio o que bem entendo” (PETRUCCI, 1999, p. 218). Este fato se deve também ao aparecimento de outras mídias de informação, comunicação e entretenimento, como a televisão, que expandiu seu alcance rapidamente.
do e por isto recebia o rótulo de “arte menor”. Os romances eram facilmente encontrados em fascículos veiculados no jor-
Figura 18 - O leitor de livre postura. Fonte: flickr.com/
nal, os quais muitas mulheres recortavam e guardavam para
photos/edanjohna/4536986
35
Os hábitos de leitura foram fortemente modificados ao longo do século XX, pelas modificações de postura corporal (Fig. 18) - se antes o leitor teria de se sentar à sua escrivaninha, hoje ele pode deitar-se em sua cama, sentar-se no chão ou até mesmo na poltrona do ônibus; de armazenamento do objeto - não só em bibliotecas, mas dividindo o espaço doméstico com objetos decorativos (Fig. 19); e das ações que o leitor exerce nos livros - a escrita, a marcação de páginas, as dobras etc. Petrucci realiza observações sobre estes novos hábitos dos novos leitores. Para o autor “o leitor sempre tem razão e ninguém pode retirar-lhe a liberdade de fazer de um texto o uso que mais lhe agradar” (1999, p. 223), o
36
que indica aos autores, editores e designers atentarem para seu público, valorizando-o e propondo novos projetos e experiências. Figura 19 - Livros incorporados à decoração. Fonte: fuckyeahreading.tumblr.com/ post/627012236/via-atticarobatics
2
O design no livro O livro difere de outros suportes gráficos comuns (cartaz, folder, flyers etc.) principalmente por sua característica tridimensional. O livro possui altura, largura e profundidade, logo, estas especificidades necessitam ser levadas em conta no momento do projeto. Talvez sejam justamente suas características específicas que oferecem inúmeras possibilidades de exploração e de (re)configuração do objeto ao longo da história, para criar “objetos que estabeleçam uma nova emoção no leitor - informando, estimulando, intrigando, comovendo e entretendo” (PAIVA, 2010, p. 91) e, para tal criação ,é necessário o conhecimento da estrutura do livro, dos elementos que o compõem.
37
2.1
A estrutura Fontoura apresenta, através de infográficos, os elementos componentes do livro. Na imagem do livro fechado pode-se observar os vários elementos que compõem a capa. É interessante perceber que essa estrutura é pouco encontrada hoje, em novos livros, mas continua sendo a ideia comum do que
38
Figuras 20, 21, 22 e 23 - Estrutura do livro. Fonte: STOLF, 2010
seria o objeto. Essas estruturas de nervo, casa e cabeceira são
Hoje, os livros encontrados se apresentam, em maioria, seguindo
ainda utilizadas em alguns volumes, mas a grande maioria dos
a estrutura da figura 21. É uma estrutura mais simples e de produção mais
livros hoje apresenta encadernação do tipo brochura e capas
barata do que a primeira apresentada. Geralmente, a capa se apresenta em pa-
flexíveis. O marcador de tecido caiu em desuso, sendo substi-
pel flexível e suas extensões, as orelhas, auxiliam na sustentação do objeto. A
tuído pelo marcador de papel, que passa de livro em livro. A
sobrecapa e a cinta já não são encontradas na maioria dos livros, mas são um
cantoneira, assim como o marcador de página, é dificilmente
recurso ainda explorado - principalmente para promoção do livro, indicando
encontrada em novos livros, inclusive tornou-se um recurso
que prêmios a obra conquistou, que filme teve seu roteiro baseado na história,
utilizado comumente para criar uma atmosfera antiga em tor-
quantas cópias da edição foram vendidas etc.
no de um livro novo.
39
É importante salientar que a estrutura
da página e da tela. Pode ser sólido ou líquido, corpo ou sangue” (LUPTON,
complexa apresentada nas imagens é dificilmente
2006, p. 63).
utilizada em sua totalidade. Muitos projetos não
As figuras 24, 25 e 26, apresentam algumas destas possibilidades
apresentam todos os elementos explicitados nas
de apresentação do texto. Na figura 24 o texto é interrompido por dois espaços
imagens e não são raras as mudanças de configu-
verticais, quebrando a uniformidade do texto corrido, o que não acontece na
ração e até mesmo de localização da folha de ros-
figura 25, onde o texto é apresentado em blocos rígidos. A figura 26 combina
to, guarda, folha de guarda etc. Desse modo, essa
diversos alinhamentos e espaçamentos, fazendo uma ponte direta com o título
estrutura pode ser considerada como tradicional,
do livro, Informal.
sendo ainda hoje utilizada em alguns projetos, mas é fundamental ter em mente que ela não é fixa e
40
imutável.
41
A princípio, a tipografia é o elemento mais presente no projeto de livro. Ela faz parte
Figura 24 - Página de The
do texto e, justamente por isso, também o define.
telephone book. Projeto de
A maneira com que a tipografia será utilizada dirá
Richard Eckersley. Fonte:
muito ao leitor, mesmo que este não saiba exata-
LUPTON, 2006, p. 66
mente o que acontece (HENDEL, 2003). Existem diversas possiblidades de apresentação de um texto, podendo este “ser visto como uma coisa - um objeto impávido e robusto - ou como um fluido derramado nos continentes Figura 25 - Página de
Mas nem só no miolo do livro encontramos tipografia. A capa, na grande maioria
Hella Lonjerius. Projeto
dos casos, também dá importância a este ele-
do Studio COMA. Fonte:
mento. Muitas vezes a letra também aparece
LUPTON, 2006, p. 87
reinando absoluta, como nas figuras 27, 28 e 29. A imagem é outro elemento bastante
Figura 26 - Página de
presente em projetos editoriais, principalmente
Informal. Projeto de januzzi
na capa. Desse modo, ela pode tornar o volume
Smith. Fonte: LUPTON, 2006, p. 89.
mais enigmático, apresentando pistas sobre a
Figura 27 - Capa de Antologia Poética. Projeto de Bea Feitler. Fonte: MELO, 2006, p. 75. Figura 28 - Capa de Budapeste. Projeto de Raul Loureiro. Fonte: da autora
narrativa, ou contar a história através de seus
Figura 29 - Capa de Love Poems.
elementos.
Projeto de Marian Bantjes. Fonte: bantjes.com/project/love-poems
Se forem observadas as capas das figuras 30, 31 e 32, pode-se notar que estas constroem, através da imagem utilizada, uma relação muito diferente com a narrativa. Na capa de A pista de gelo, de Roberto Bolaño, através do fragmento de uma pintura abstrata, a relação se dá pela cor e textura, diretamente ligada ao nome do livro. Já em Atlas, a capa apresenta a fotografia do próprio autor do livro, Jorge Luis Borges, uma alternativa corrente para livros cujos autores já são conhecidos. Finalmente, em Em outros quartos, outras surpresas, a aura da narrativa é captada pela imagem. Os oito contos
42
presentes no livro se passam no Paquistão e, apesar de poderem ser lidos inde-
Figura 33 - Capa de Até o dia
Figura 34 - Capa de
Figura 35 - Capa de A
pendentemente, possuem uma forte relação entre si, “é um retrato do Paquis-
em que o cão morreu. Fonte:
Satolep. Fonte: da
disciplina do amor. Fonte:
tão tecido como uma colcha de retalhos”. Assim, a capa apresenta elementos
companhiadasletras.com.br
autora
companhiadasletras.com.br
próprios da cultura do país e diferentes texturas aplicadas nas figuras, o que relaciona-se com a ideia de colcha de retalhos, aspecto da narrativa.
separados, em diferentes camadas, mas ainda existem relações entre essas in-
Alguns livros como Até o dia em que o cão morreu integram texto e
formações: as linhas da arquitetura, os fios ao lado da palavra Satolep, o céu
imagem em sua capa. O texto, neste caso, é tratado como ilustração, tomando
parece uni-los. Em A disciplina do amor, as informações de imagem e texto são
a forma do desenho e fazendo parte deste. Já em Satolep, texto e imagem são
totalmente descoladas uma da outra, interrompidas por um rígido retângulo branco na superfície de cor. É claro que existem infinitas possibilidades de projetar livros, explorando diferentes elementos gráficos. Os elementos citados e exemplificados aqui são apenas as possibilidades mais utilizadas, mais comuns de sua estruturação como objeto. Além disso busquei estabelecer relações de estrutura mais diretas com as peças que são analisadas e as possibilidades existentes para a criação do projeto prático apresentado.
Figura 30 - Capa de A pista
Figura 31 - Capa de Atlas.
Figura 32 - Capa de
de gelo. Projeto de Raul
Fonte: companhiadasletras.
Em outros quartos,
Loureiro. Fonte: da autora
com.br
outras surpresas. Fonte: companhiadasletras.com.br
43
2.2
Figura 37 - Capa de Caravana dos destinos.
O design de livro no Brasil
Projeto de Correia Dias, 1921. Fonte: CARDOSO, 2005, p. 170.
O Brasil possui no projeto gráfico de livros sua maior contri-
44
buição e reconhecimento no campo do design, o que se mostra
É nesta década de 1920 que surgem algumas das mais importantes
um tanto peculiar se, voltando os olhares para nossa história,
editoras da história do país, como a Livraria do Globo, na cidade de Porto Ale-
constatarmos que a imprensa chegou no país tardiamente.
gre, e a Civilização Brasileira, no Rio de Janeiro. Estas editoras, mais tarde,
Entre os fatores que possibilitaram essa posição/postura do
revelariam profissionais gráficos como Ernest Zeuner e Eugênio Hirsch, além
país - e, portanto, supre o atraso de quatro séculos - é a adoção
de escritores como Érico Veríssimo.
e o avanço dos sistemas de produção, distribuição e consumo
45
de impressos, desenvolvidos na década de 1830, ou seja, em um período em que a imprensa já estava instalada no país (CARDOSO, 2005). Além, é claro, da contribuição dos designers e desenhistas que aqui trabalharam. A década de 1920 é especialmente importante no que diz respeito à edição de livros: surgem diversas editoras no eixo Rio-São Paulo, preparando o surto editorial da década de 1930 (CARDOSO, 2005). Neste período as editoras focam sua produção em brochuras, apostando em belos projetos grá-
Figuras 38, 39 e 40 - Capa, página de abertura de capítulo e página dupla de miolo de Nós.. Projeto de Correia Dias, 1921. Fonte: CARDOSO, 2005, p. 173/174.
ficos para desviar a atenção dos materiais precários utilizados na confecção do livro. As capas ilus-
As inovações realizadas na década de 1920 dizem respeito a “uma
tradas surgem então para tornar o
nova concepção do livro como objeto gráfico industrial” (CARDOSO, 2005,
objeto mais vistoso e impulsionar
p. 176). Atentou-se, principalmente, para o livro como objeto tridimensional,
as vendas. Aqui cabe citar o nome
pensando no papel, encadernação, peso e tamanho como partes integrantes
do pioneiro no projeto destas capas,
de seu projeto gráfico. Além disso, uma atenção especial foi dada à mancha
Fernando Correia Dias.
tipográfica, às margens e à disposição do texto na página. Questões de identidade visual e unidade editorial aparecem, mais
Figura 36 - Capa de Urupês. Projeto de Washt Rodrigues, 1918. Fonte: CARDOSO, 2005, p. 162.
especificamente, em 1930. A Colecção de obras célebres, inicialmente publicada pela Editora Americana e continuada pela Waissman, Reis & Cia, eviden-
como produtor gráfico em 1935 pela editora José Olympio. Sobre a produção editorial da época pode-se dizer que as editoras não tinham um projeto editorial explícito para dar unidade à sua produção. Os livros dessa época parecem dever sua feição gráfica ao gosto variável do autor ou do editor, que possivelmente indicavam alguém de suas relações para elaborar sua forma Figuras 41, 42 e 43 - Capas da Colecção de obras célebres. Projetos de Di Cavalcanti (1930), Oswaldo
(CARDOSO, 2005, p. 208).
Teixeira (1931) e Geraldo Orthof (1931), respectivamente. Fonte: CARDOSO, 2005. Figura 44 - Capas
cia a preocupação em diagramar os elementos em uma malha e manter uma
da editora José
46 estrutura gráfica reconhecível, apesar de os parâmetros gráficos da coleção
Olympio. Projetos de Santa Rosa. Fonte:
terem sido estabelecidos pelo artista Di Cavalcanti e posteriormente seguidos
CARDOSO, 2005, p.
por pelo menos outros dois projetistas - Geraldo Orthof e Oswaldo Teixeira.
218.
Sobre este caso específico, Cardoso coloca que A coincidência entre esses três projetos evidencia uma preocupação da editora com questões de identidade visual que vão muito além daquilo que se tem propagado sobre a ilustração de capas na primeira metade do século XX. Apesar da alteração no próprio nome da editora, a unidade projetual estava sendo utilizada como ferramenta para conquistar a fidelidade do público leitor. Longe
Uma das preocupações de Santa Rosa diz respeito exatamente às questões de identidade visual, tanto para pequenas coleções literárias como para as diversas diferentes publicações de uma mesma editora. Para este trabalho, é especialmente importante a declaração de
de ser meramente “decorativa”, a ilustração de capas já era nessa
1952, de Santa Rosa, sobre a relação texto e imagem em projetos editoriais,
época um recurso poderoso de comunicação, visando a melhor
principalmente por dar atenção aos aspectos processuais de interpretação e
comercialização do produto (CARDOSO, 2005, p. 192).
reinterpretação da linguagem.
No cenário editorial da década de 1930 destaca-se Santa Rosa, pa-
(...) o que conta para o ilustrador não é o descritivo do poema, do
raibano autodidata que encontrou no design de livros a forma para seu sus-
conto, do romance, mas a atmosfera espiritual em que se movem
tento, ao chegar na cidade do Rio de Janeiro. Santa Rosa, primeiramente,
os ritmos, os sentimentos, os personagens, o clima que evoca suas
realizou alguns trabalhos para as editoras Ariel e Schimdt, sendo contratado
situações íntimas. Tomamos várias atitudes, portamo-nos como cineastas quando procuramos o ângulo justo em que o assunto
47
mais avulta, mais se define, mais se precisa. Ora, espionamos os personagens de um romance, cercamo-los, esmiuçamos suas vidas, seus hábitos mais íntimos, suas manias, seu andar, as rugas da face (...) (Santa Rosa apud CARDOSO, 2005, p. 220). Embora o período entre 1920 e 1950 tenha sido de grande evolução para o design de livros, a estrutura diagramática clássica de capa centralizada é questionada apenas nos anos de 1960. Segundo Chico Homem de Mello (2006) é neste período que a figura do designer é de fato valorizada. É importante contextualizar estas mudanças gráficas com o públi-
48
Figura 46 - Capa de Ziraldo. Fonte: MELO, 2006, p. 80. / Figura 47 - Capa de Bea Feitler. Fonte: MELO, 2006, p. 76. / Figura 48 - Capa de Marius Bern. Fonte: MELO, 2006, p. 71.
co leitor da época, “mais informado, mais aberto a novidades, mais crítico,
mais ativo, mais jovem” (MELO, 2006, p. 61), o que possibilitava, por exem-
É importante destacar, neste trabalho, dois casos específicos de co-
plo, a existência das capas projetadas por Eugenio Hirsch, e o pensamento de
leções: as edições populares do Clube do Livro, com projeto gráfico de Vicente
que “uma capa é feita para agredir, não para agradar” (MELO, 2006, p. 62),
Di Grado, e a Coleção Debates, com projeto gráfico de Moysés Baumstein.
sempre apostando no impacto da capa no leitor.
Figura 49 - Capas do Clube do Livro. Fonte: MELO, 2006, p. 71.
Figura 45 - Capas de Eugenio Hirsch. Fonte: MELO, 2006, p. 65.
As centenas de volumes editados pelo Clube do Livro de São Paulo eram recebidas por seus sócios periodicamente. Por este motivo, o livro não
A década de 1960 foi plural: conviviam a agressividade de Hirsch,
precisava se portar como cartaz no ponto de venda, mas apenas “conciliar
o equilíbrio de Marius Bern, o cartum de Ziraldo e Jaguar, a leveza de Bea
uma visualidade atraente a um custo de produção baixo” (MELO, 2006, p.
Feitler, a integração texto-imagem de Vicente di Grado etc.
88). A coleção não possui logotipo, apenas as informações de autor e editora
49
fica da obra, inscrito em dois largos fios horizontais - de cor correspondente à área de conhecimento, uma grande área branca e, alinhados inferiormente, nome do autor e título da obra, terminando em um retângulo preto com logo e nome da editora em branco. Neste caso,
Figura 50 - Capas do Clube do Livro. Fonte: MELO, 2006, p. 71.
50
51 permanecem com a mesma tipografia e posição - superior e inferior, respecti-
Figura 51 - Capas
vamente. Outro fator que colabora com a identificação destes volumes como
da coleção
coleção é a capa em apenas duas cores, ainda que estas mudem de acordo com
Debates. Fonte:
o título. Há sempre o preto junto a outra cor, uma economia de recursos que
MELO, 2006, p. 96
acabou por servir ao projeto e dotá-lo de riqueza expressiva. Não há tipografia padrão para o título, nem tamanho definido para a ilustração, é de acordo com
“sai valorizada a coleção, em detrimento da particularidade de
a obra que a capa é dada: algumas com tipografia leve e traço áspero, outras
cada volume. Ao mesmo tempo, ele podia se dar a esse luxo. Em
com tipografia pesada e traço delicado: não há padrão. O que pode-se afirmar
sua maioria, os textos eram tão fundamentais em suas áreas de co-
destas capas é que Di Grado “aposta todas as fichas na síntese: um título e
nhecimento que podiam prescindir de particularização” (MELO,
uma imagem” (MELO, 2006, p. 90). Além disso, a contracapa permanece a
2006, p. 95).
mesma em todos os volumes, e a lombada apenas altera as informações de autor/título e a cor correspondente ao desenho de capa.
A década de 1960 configura-se, então, em um marco de “ruptura
Já Moysés Baumstein construiu sua coleção baseada em elemen-
com as convenções da cultura editorial gráfica” (MELO, 2006, p. 59), ou seja,
tos fixos. Como cita Homem de Melo “na balança das variantes e invariantes,
as grades pré-determinadas são deixadas de lado e, em seu lugar, inicia-se
Moysés jogou todo o peso nas invariantes” (MELO, 2006, p. 95). A coleção
um novo modo de pensar o livro de acordo com cada situação. As mudanças
Debates é, até hoje, um catálogo das áreas científicas. De fácil identificação,
ocorridas no design editorial nos anos de 1960 são, sem dúvida, referências e
possui uma grade rígida: cabeçalho, com seu logotipo seguido da área cientí-
possibilidades que movem o design de hoje.
2.3
dos grupos e ironizando sutilmente cânones e estereótipos visuais hegemônicos e banalizados da alta cultura (DALPIZZOLO; RAH-
O livro e o designer
52
DE, 2007, p.3).
A autoria em design gráfico é considerada fruto da condição
Ainda falando de construção de sentido, é importante colocar que
pós-moderna. No período modernista, o design tinha como
“na estética pós-moderna, este mundo original somente se constitui com a
orientação o racionalismo, o que deixava poucos espaços para
presença do outro” (WEYMAR, 2009, p. 2), o que relaciona-se diretamente
as construções individuais e emoções.
com a ideia de que “só há imaginário social, nunca individual” (MAFFESOLI
Foi somente com as vanguardas artísticas, surgidas
apud SILVA, 2003, p. 14). Logo, quando, neste trabalho, falo do imaginário
no período de transição à pós-modernidade, que o design to-
do designer-autor, me refiro não ao imaginário individual - que segundo Ma-
mou novos rumos e quebrou os paradigmas de legibilidade,
ffesoli não existe - mas ao imaginário ao qual o indivíduo pertence e é imerso,
clareza, geometrismo e harmonia. O modelo moderno, reflexo
visto que o imaginário “é determinado pela idéia de fazer parte de algo” (MA-
da industrialização e da guerra, já não era mais válido. O perí-
FFESOLI apud SILVA, 2006, p. 14).
odo que se iniciava era marcado pela subjetividade e emoção, os materiais se tornavam efêmeros e transitórios. O pós-moderno propõe espaço para todos os estilos, logo, “não há uma rejeição da modernidade, mas uma inclusão da mesma junto às tendências contemporâneas” (DALPIZZOLO; RAHDE, 2007, p. 3). Desse modo, na contemporaneidade, valoriza-se o profissional de design como indivíduo e seu repertório, há espaço para impressão do imaginário do designer-autor, que propõe experiências buscando, através da polissemia das diversas formas visuais, Figuras 52 e 53 - Capa do Livro amarelo do terminal.
a participação ativa do espectador num jogo de
Fonte: da autora
interpretação, ao manifestar visualidades efêmeras e descartáveis, tolera a imperfeição, a imprecisão,
Para um melhor entendimento das questões que movem e possibili-
a poluição e as interferências externas pós-pro-
tam a construção de um objeto-livro, que seja suporte para autoria, chego a O
dução, valorizando a comunicação e as emoções
livro amarelo do terminal, de Vanessa Barbara, com projeto gráfico de Elaine
53
Ramos e Maria Carolina Sampaio. Neste trabalho, a relação de autoria é extremada, considerando que as designers “projetaram” inclusive o título do livro juntamente com a escritora. A primeira obra jornalística a entrar no catálogo da Cosacnaify consiste na reportagem de final de curso de jornalismo de Vanessa Barbara, um mergulho no Terminal Rodoviário do Tietê, na cidade de São Paulo. A jorna-
Figura 55 - Diferentes tipos de papel d’O Livro amarelo do terminal. Fonte: da autora
lista chegou à conclusão de que tal rodoviária é uma “versão condensada do
gramatura (menos delicado, sem uniformidade de textura na superfície); além
mundo” e a partir daí começou sua pesquisa sobre a empresa que administra
da cartolina amarela laminada da capa.
o terminal e as pessoas que frequentam aquele lugar.
Em meio ao texto - em tipografia sem serifa - há interferências com imagens e texturas. A entrelinha do texto é generosa, a transparência do papel pede um espaçamento maior que o normal, pois é possível enxergar o texto
54
impresso no verso da página. Assim, existe um jogo de avanço e recuo do texto: o que pertence à frente e o que pertence ao verso, o que deve ser lido agora e o que deve ser lido em outro momento. Essa transparência também é utilizada na folha que apresenta título e autor do livro, na qual o nome da autora é impresso no verso da página e, portanto, espelhado.
Figura 54 - Capa e quarta-capa d’O Livro amarelo do terminal. Fonte: da autora Figura 56 - Uso da transparência dos diferentes tipos de papel d’O Livro amarelo do
O projeto gráfico do livro conta com três tipos diferentes de papel:
terminal. Fonte: da autora
amarelo de gramatura baixa (semelhante ao utilizado na segunda via das no-
Voltando à autoria do volume, após a breve apresentação da es-
tas fiscais manuais), papel copiativo (papel branco que leva carbono na com-
trutura do livro, observa-se que as designers construíram um objeto repleto
posição e, quando manuseado, deixa algumas manchas) e papel roxo de maior
de referências pessoais (muitas das imagens pertencem à coleção de tickets e
55
bilhetes de Elaine Ramos) e consonantal com a narrativa do texto (repleta de fragmentos de conversas ouvidas pela escritora no terminal rodoviário). Observando a relação título-objeto, vê-se que o primeiro é construído em função do segundo, um intenso traço de autoria em design. Assim, o texto parece exigir esse projeto gráfico. E o projeto gráfico, por sua vez, parece integrar a narrativa. É certo que em outra estrutura visual - asséptica, padronizada -, o texto realmente seria outro, assim como a sua interpretação. Nas palavras de Elaine Ramos, “Se criássemos um projeto gráfico apenas organizado e competente, seria como ver a rodoviária vazia, sem ninguém”�. É exatamente este fazer parte da narrativa, proposto pelo designer, o que interessa
56
neste trabalho. Gruzinksi fala que “o designer gráfico será sempre um mediador entre o leitor e o texto, e a ele caberá a decisão de configurar a mensagem de forma mais próxima da transparência ou da co-autoria” (GRUZYNSKI, 2000, p. 88-89) o que pode indicar - pela presença da expressão “mais próxima” - que o designer e seu projeto nunca serão invisíveis, assim como nunca serão autores totais do trabalho, ou seja: sempre existirá, por mais discreta e
3
Coleções literárias como base para criação A identidade gráfica de uma coleção de livros e de seus volumes é o tema central deste capítulo. Antes de tudo, é necessário entender o que são coleções literárias e como elas se apresentam. Para isso, são expostos alguns casos, com breves comentários, a fim de esclarecer critérios de agrupamento de seus volumes integrantes e características de seu projeto gráfico.
recatada que seja, a voz do designer, e sempre existirão vozes externas. A neu-
Na segunda parte do capítulo são apresentadas as
tralidade existe, mas “por mais neutros que desejemos ser, por mais racionais
análises de algumas destas coleções, dando início à prática
que tenhamos de ser, dificilmente as emoções deixam de participar de nossos
projetual deste trabalho, pois é analisando a maneira como as
julgamentos, das nossas ações” (DALPIZZOLO; RAHDE, 2007, p. 4).
peças gráficas são construídas que melhor se vislumbram as possibilidades de criação. Ao final do capítulo é apresentada a prática projetual deste trabalho.
57
3.1
David Pearson, designer conhecido por seu trabalho junto à Pen-
O que é coleção literária
guin Books, possui em seu portfólio uma série de projetos em design de livro e, mais especificamente, coleções. Seus trabalhos primam, pode-se dizer, pela delicadeza e sutileza na composição gráfica dos elementos identitários. Na
O dicionário Aurélio da Língua Portuguesa conceitua coleção
coleção Great Ideas, de 2004, os livros possuem apenas formato e cor fixas,
como: “1. Conjunto ou reunião de objetos da mesma natureza
o restante das informações visuais são variáveis a cada volume. Além disso,
ou que têm qualquer relação entre si [...]”. Pode-se concluir,
Pearson cria capas que se assemelham a partes internas do livro (como folhas
desta maneira, que uma coleção literária é composta por di-
de rosto ou páginas de entrada de capítulos), por trazer parte do texto para a
versos títulos agrupados por algum critério escolhido.
capa.
58
59
Figura 57 - Coleção Clássicos da Editora Abril. Fonte: editorabril.com.br
A primeira coleção a ser citada neste capítulo é a coleção Clássicos (Fig. 56), da Editora Abril, lançada no ano de 2010. A coleção consiste em um agrupamento de 30 obras, de diferentes autores e épocas, já reconhecidas pela história
Figuras 58, 59 e 60 - Capas da coleção Great Ideas Fonte: davidpearsondesign.com
da literatura, como O engenhoso fidalgo Dom Quixote de La Mancha, de Miguel de Cervantes; Crime e castigo, de Fiodór
Figura 61 - Lombadas da coleção Great Ideas
Dostoievski; Madame Bovary, de Gustave Flaubert; Os Ser-
Fonte: davidpearsondesign.com
tões, de Euclides da Cunha e Hamlet, de William Sheakspeare. Tratam-se de edições populares, vendidas em bancas de jornal. Assim, a preocupação estética reside, principalmente, na capa - serigrafada em tecido - pois esta é o contato do volume com o leitor, já que os livros se encontram envoltos em plástico no ponto de venda.
A inglesa Penguin Books é um caso especial no que diz respeito à coleções literárias. A editora, fundada em 1935, é um marco no design de livros de bolso. A identidade gráfica de seus livros, datada da abertura da empresa e sutilmente modificada ao longo dos anos, é reconhecida mundialmente sendo até hoje utilizada pela editora em algumas de suas publicações.
Figuras 65, 66, 67 e 68 - Capas da coleção Raymond Chandler. Fonte: lpm-editores.com.br
capa e foi inspirado nas capas de literatura policial dos anos 1940/1950, uma referência à época em que o autor mais publicou*.
60
Um outro exemplo de identidade gráfica baseada na obra do autor
61
são as capas tipográficas para obras do escritor Caio Fernando Abreu (Fig. 68 a 71). Neste conjunto, a identidade do grupo é dada pela tipografia e seu posicionamento no espaço, enquanto a identidade individual do volume se constrói pela cor e fundo e por sutis alterações na tipografia, que fazem referência Figura 62 - Capa da Penguin, 1935. Fonte: BAINES, 200, p. 18 / Figura 63 - Capa da Pen-
ao título do livro (um corte nas letras se refere à palavra apunhalado; uma
guin, 1949. Fonte: BAINES, 200, p. 57 / Figura 64 - Capa do selo Penguin-Companhia,
letra “r” se apresenta escura em meio a uma massa de letras claras por conta
2010. Fonte: companhiadasletras.com
da palavra negras e a forma triangular da letra “a” é evidenciada na própria palavra triângulo).
No Brasil, a editora L&PM, com seu selo L&PM pocket, possui a maior publicação de livros de bolso do país. Diferentemente da Penguin, a editora brasileira não possui identidade pré-estabelecida para seus livros, projetando a identidade - na grande maioria dos casos - em função do autor ou da obra. As capas da coleção do autor Raymond Chandler (Fig. 64 a 67) são um exemplo de como a identidade gráfica dos livros é pensada pela editora: o projeto gráfico dos volumes aposta em elementos da narrativa como ilustração de Extraído de http://www.lpm-editores.com.br/site/default.asp?Template=../livros/layout_ produto.asp&CategoriaID=608155&ID=745390
Figuras 69, 70, 71 e 72- Capas para livros de Caio Fernando Abreu. Fonte: lpm-editores.com.br
Assim como a Coleção Clássicos, citada no início deste capítulo, as
variam de livro para livro, porém, apresentam uma
coleções dos autores Raymond Chandler e Caio Fernando Abreu tratam-se de
grade estrutural padrão para a capa.
edições populares, de bolso. A preocupação principal, nestes casos, reside na
Um outro exemplo de coleção literária é a
economia de recursos e, por isso, o projeto gráfico interno das publicações é
coleção Plenos Pecados, lançada pela editora Objeti-
padrão e o investimento na particularização dos volumes se dá na capa.
va no final da década de 1990. São sete livros com o
Algumas editoras, como a brasileira Cosacnaify, apostam no proje-
caráter de conjunto bem explícito, com cores e grade
to gráfico total como identidade gráfica de uma coleção, projetando também
padrão.
o miolo com traços característicos do agrupamento. É o caso da coleção Par-
62
A partir da pesquisa sobre coleções, aqui
ticular, que conta com quatro obras editadas em projetos gráficos especiais,
Figura 77- Caixa da coleção
brevemente apresentada, é que foram escolhidas as
que contribuem para a interpretação do texto. Além do já citado na introdu-
Moda Brasileira I. Fonte:
peças gráficas a serem analisadas. Optei por escolher
ção do trabalho Bartleby, o escrivão, fazem parte da coleção Primeiro Amor, de
cosacnaify.com.br
dois designers, Elaine Ramos e Victor Burton, com
Samuel Beckett, Zazie no metrô, de Raymond Queneau e A Fera na Selva, de Henry James. Este último volume possui projeto gráfico de Lucianna Facchini, enquanto os outros são assinados por Elaine Ramos.
trajetórias e produções distintas no tempo e em diferentes espaços (diferentes editoras, com diferentes visões de projeto). Elaine Ramos é atual coordenadora das publicações de design da editora Cosacnaify, além de ser responsável por diversos projetos gráficos da editora. É graduada em arquitetura e urbanismo pela USP e em seu currículo constam vários prêmios por seus projetos editoriais. Victor Burton é um designer autodidata. Já projetou mais de duas mil capas de livro e mais de duzentos projetos gráficos de miolo. Começou a trabalhar como capista da editora Nova Fronteira, logo que chegou ao Brasil em 1979. Burton nunca planejou ser designer, o
Figuras 73, 74, 75 e 76- Capas da coleção Particular. Fonte: cosacnaify.com.br
envolvimento com a profissão se deu pela sua paixão por livros
Elaine Ramos também é responsável pelo projeto gráfico da cole-
(PERROTTA, 2006).
ção Moda Brasileira I, também da editora Cosacnaify. A coleção conta com
Figura 78- Livros da coleção Plenos
cinco volumes, cada um dedicado à obra de um estilista específico, acondicio-
Pecados. Fonte: editoraobjetiva.com.br
nados em uma caixa. Assim como na coleção Particular os projetos gráficos
63
3.2
Análises
3.2.1
Como citado anteriormente, esta parte do trabalho se dedica
Livros integrantes:
à análise gráfica de coleções literárias, dando início à práti-
Primeiro Amor, de Samuel Beckett (edição de 2004)
ca projetual deste trabalho. As coleções escolhidas, Coleção
Bartleby, o escrivão - uma história de Wall Street, de Herman
Particular e Coleção Moda Brasileira I, da editora Cosacnaify;
Melville (edição de 2005)
Coleção Plenos Pecados, da Editora Objetiva; e Coleção José
A Fera na Selva, de Henry James (edição de 2007) Zazie no metrô, de Raymond Queneau (edição de 2009)
Lins do Rego, da Editora José Olympio, serão analisadas uti-
64
Coleção Particular
lizando as noções de informação fixa e informação variável,
65
descritas por Chico Homem de Melo em seu artigo Design de livros: muitas capas, muitas caras (MELO, 2006). Ao falar do trabalho de Odilea Toscano para a Editora Brasiliense, mais especificamente da Coleção Jovens do Mundo Todo, Melo lança estas noções de informações fixas e variáveis: O barrado com silhuetas variadas de jovens muda de cor de volume para volume, mas seu desenho permanece o mesmo. Uma linha com o nome da coleção separa o barrado superior do campo destinado ao título e à ilustração. Dessa forma, fica estabelecido com clareza o que é informação fixa e informação variável (MELO, 2006, p. 92).
Figura 79 - Detalhes da coleção Particular. Fonte: da autora
A coleção Particular, da editora Cosacnaify, aposta no projeto grá-
a decisão de refilar manualmente o livro, para apreciação plena, ou manter
fico como fator a ser interpretado pelo leitor, além do texto. Serão analisados
as folhas intactas, fazendo uma leitura das imagens de maneira invertida e
três dos quatro volumes que compõe a coleção, pelo fato de que Bartleby, o
sob o texto através da transparência do papel. Diferentemente dos exemplos
escrivão, Primeiro amor e Zazie no metrô tem seu projeto gráfico assinado por
citados é o uso das páginas não-refiladas em Primeiro Amor. Neste livro o “en-
Elaine Ramos (este último em parceria com Maria Carolina Sampaio) e, por-
tre-páginas” é em branco, sem impressão e então a folha é utilizada para dar
tanto, respondem ao critério utilizado para seleção de peças. O quarto livro da
continuidade, nas páginas pares, ao desenho das páginas ímpares. A operação
coleção, A fera na selva, possui projeto gráfico de Luciana Facchini.
de corte/abertura que pode ser feita, neste caso, é junto à linha de costura (da
À primeira vista, os volumes podem parecer díspares, não tendo um caráter identificável de coleção, já que não possuem o mesmo suporte, ele-
encadernação) nas páginas pares, unindo duas páginas em uma e não separando-as.
mento identitário (como um logotipo ou selo), cores e texturas ou tipografia
66
semelhantes. Até mesmo a encadernação difere de um volume para outro, o
67
que me faz pensar que a unidade da coleção busca, justamente, a não-unificação, o que é também reforçado pelo seu nome. E se forem observadas as datas de lançamento de cada livro, esse caráter de não-unificação é ainda mais
Figura 81 - Detalhes de Primeiro Amor. Fonte: da autora
destacado, visto que as obras foram lançadas em diferentes momentos, o que Figura 82 - Detalhes da
também dá a idéia de que a coleção pode ainda ser acres-
abertura de páginas em
cida de volumes.
Primeiro Amor. Fonte: da
Internamente, os três volumes projetados por
autora
Elaine Ramos possuem uma estrutura de cadernos semelhante: são todos compostos por folhas não refiladas, configurando uma invariável desta coleção. A diferença neste aspecto reside em seu uso, na maneira gráfica de explorá-lo. Em Bartleby, o escrivão, é necessário o abrir de páginas para acontecer o ato de leitura (como já mencionado na introdução deste trabalho). Zazie no metrô possui o texto aparente e a abertura é necessária apenas para observação das ilustrações, cabendo ao leitor
Principalmente nesta coleção, foi observado o que Flusser (2007) nomeia “não-coisa”, algo impalpável, fruto do desvio de interesse das coisas para as informações. O homem hoje busca conforto em experiências e sensações e não mais nos aspectos materiais de sua existência. Dessa maneira, a
Figura 80 - Detalhes da abertura de páginas em Zazie no metrô.
coleção Particular vai ao encontro destes desejos, de “experimentar, conhecer
Fonte: da autora
e, sobretudo, desfrutar” (FLUSSER, 2007, p. 58).
3.2.2
Diferentemente da coleção Particular, os projetos de capa de Victor Burton para obras de José Lins do Rego são facilmente identificados como
Coleção José Lins do Rego
conjunto. Ambos os livros - Fogo Morto e Menino de engenho - possuem, em sua capa, ilustrações em preto e branco, de Santa Rosa, originais da primeira
Livros integrantes:
edição dessas obras. Além da ilustração, Burton opta pela presença de uma
Menino de engenho, de José Lins do Rego (edição de 2009)
Fogo morto, de José Lins do Rego (edição de 2010)
caixa de bordas irregulares, no qual título e autor são inseridos. Deste projeto pode-se destacar o caráter pouco variável. Burton modifica cores, posições, papéis, mas os elementos básicos são os mesmos. A principal variável do projeto reside na impressão. Menino de engenho, talvez pelo fato de se tratar da centésima edição, possui a capa em papel colorido e
68
relevos (alto para título e autor e baixo-relevo na forma quadrada). Já Fogo morto apresenta capa completamente plana, em papel branco com cobertura em brilho. O fato de Menino de engenho ser impresso no lado opaco do papel (na verdade, há uma inversão da folha: o lado normalmente utilizado para impressão é o que possui cobertura brilhosa), cria uma maior relação com a xilogravura de Santa Rosa, causando a sensação de que esta realmente havia sido impressa na capa, pela técnica original (xilogravura) pela qual estas foram produzidas. A lombada e a quarta-capa dos volumes é bastante semelhante ambas possuem fundo correspondente à cor utilizada na capa (vermelho para Fogo Morto e verde para Menino de engenho). Na lombada variam apenas cor e nome do livro, apesar de Fogo Morto possuir quase o dobro do número de páginas presentes em Menino de engenho. Na quarta-capa os livros repetem a caixa existente na primeira-capa, mas em cores in-
Figura 83 - Detalhes da
Figura 84 - Detalhe da impressão em um
coleção José Lins do
volume da coleção José Lins do Rego.
Rego. Fonte: da autora
Fonte: da autora
69
vertidas: a forma apresenta a cor do suporte. E, se na capa as informações de autor/título eram localizadas no interior da caixa, na quarta-capa esta abriga a sinopse da obra.
3.2.3
Coleção Moda Brasileira I
Um fato observado nestes dois volumes é a iniciativa da editora Record em lançar livros sob o selo “José Olympio Editora”, visto que esta última
Livros integrantes:
foi uma das primeiras editoras do país a publicar escritores não-consagrados
Alexandre Herchcovitch, de Charles Cosac (edição de 2007)
Gloria Coelho, de Carlos Mauro Fonseca (edição de 2007)
Lino Villaventura, de Jackson Araújo (edição de 2007)
Ronaldo Fraga, de Carol Garcia (edição de 2007)
Walter Rodrigues, de Eva Joory (edição de 2007)
na literatura e valorizar escritores locais, desempenhando um importante papel na história editorial do Brasil.
70
71
Figuras 85, 86, 87, 88, 89 e 90 - Volumes integrantes da coleção Moda Brasileira I. Fonte: cosacnaify.com.br
A coleção Moda Brasileira 1 conta com cinco livros que resgatam trajetória e projetos de cinco estilistas do Brasil. Nas palavras de Ronaldo Fra-
agrupados em conjunto em uma prateleira, por exemplo. Na quarta-capa o bloco inferior dá lugar a um texto referente ao que é apresentado no livro.
ga: “A coleção traz cinco estilistas com processos de pesquisa e criação muito
O projeto gráfico do
diferentes, o que revela a diversidade da moda brasileira. E mais, demonstra
miolo do livro constitui a informa-
como essa variedade está construindo a tão falada identidade nacional” .
ção variável da coleção, pois cada
�
72
Nas capas, a coleção valoriza os aspectos invariáveis. Apesar de
volume foi projetado utilizando
cada capa se adequar ao estilista, com desenhos e ilustrações que conversem
elementos próprios do universo
com sua produção em moda (utilizando até mesmo croquis do próprio estilis-
de cada estilista. No volume dedi-
ta) há uma grade estrutural padrão muito forte para todos os volumes.
cado ao estilista Ronaldo Fraga,
Essa grade estrutural é visível apenas com a presença da sobreca-
por exemplo, as molduras utiliza-
pa. Sem ela, as capas apresentam apenas uma ilustração (ou fotografia) e a
das pelo artista são utilizadas para
identificação de coleção e título do volume. Na presença da sobrecapa, a capa
reforçar blocos de texto e suas
é dividida em três blocos: um ocupando toda a metade inferior e outros dois
colagens, sobreposições e combi-
formados a partir da divisão da metade superior. O primeiro bloco, inferior,
nações de texturas são utilizadas
possui imagens características da produção de cada estilista. O segundo é
Figura 92 - Detalhes internos de Ronaldo
uma faixa de cor, que muda de acordo com o livro/estilista em questão. Final-
Fraga. Fonte: da autora
mente, o terceiro nada mais é do que um pedaço aparente da capa do livro (a sobrecapa apresenta-se em tamanho menor do que a capa), apresentando as informações do volume.
o tempo todo: em títulos, fundos e como elementos auxiliares na
diagramação de fotos. Já o volume que apresenta Gloria Coelho possui características mais sóbrias, que já podem ser observadas na capa. A diagramação é contida, os ângulos são retos e as cores mais escuras, pois a produção em moda de Gloria Coelho pede uma apresentação mais formal e discreta.
Figura 91 - Estrutura de capa da coleção Moda Brasileira I. Fonte: da autora
A quarta-capa e a lombada também seguem esta estrutura. Na lombada, na porção de sobrecapa ausente, a costura das páginas do livro é aparente, o que se configura em um elemento identitário quando os livros são
73
3.2.4
Os sete pecados capitais são o tema da Coleção Plenos Pecados, lan-
Coleção Plenos Pecados
çada pela editora Objetiva ao final da década de 1990. Para a coleção, foram convidados a escrever, sobre cada um dos pecados, sete autores brasileiros. O projeto gráfico de Victor Burton é um dos mais conhecidos de
74
Livros integrantes (edições de 2009):
Canoas e marolas, de João Gilberto Noll
A casa dos budas ditosos, de João Ubaldo Ribeiro
Mal secreto, de Zuenir Ventura
O clube dos anjos, de Luis Fernando Veríssimo
Terapia, de Ariel Dorfman
Vôo da rainha, de Tomás Eloy Martínez
Xadrez, truco e outras guerras, de José Roberto Torero
sua trajetória como designer e configura-se em uma das raras vezes em que editoras de público mais abrangente - como é a editora Objetiva - apostam no projeto gráfico total (capa e miolo) para determinado livro ou coleção. Assim como as capas da Coleção Moda Brasileira I, as capas de Plenos Pecados possuem uma grade estrutural padrão, na qual a posição de nome do autor, título, logotipo da coleção e logotipo da editora são iguais em todos os volumes. Também a tipografia, tanto na capa quanto no miolo, e cores predominantes são informações fixas. As ilustrações de capa são de autoria de artistas brasileiros, como Luiz Zerbini, Leda Catunda e Adriana Varejão. Sua cor predominante é sempre o vermelho, acompanhado do preto. No livro Canoas e Marolas, a ilustração de Leda Catunda apresenta a figura de uma árvore com folhas verdes, sendo a única imagem com cor variante no projeto, o que pode ser relacionado com a ausência de cor nas informações textuais nesta capa, visto que as outras apresentam cores no título, no nome do autor e no logotipo da coleção. Figura 94 - Detalhes da aplicação de verniz. Fonte: da autora
Os livros também possuem o nome do pecado correspondente em Figura 93 - Detalhes da
sua capa, em uma camada de verniz. O nome do pecado é relacionado dire-
coleção Plenos Pecados.
tamente com o título, pois a camada de verniz é impressa em cima deste. A
Fonte: da autora
leitura se dá pelo contraste entre o papel opaco e a palavra envernizada.
75
A lombada e quarta-capa dos livros também segue um mesmo pa-
Na parte interna do livro observa-se a mudança de função da folha
drão. Na lombada encontra-se o nome do autor seguido do título do livro, em
de guarda, que era antes utilizada para unir a capa do livro aos cadernos com
cores correspondentes às utilizadas na capa, sobre fundo preto. A quarta-capa
melhor acabamento. Neste projeto, o que se assemelha à folha de guarda são
apresenta detalhes ou uma continuação das ilustrações de capa e a sinopse do
ilustrações colocadas nas duas páginas seguintes à folha de rosto. O miolo se-
livro.
gue apresentando as ilustrações, ou apenas detalhes das mesmas, ora em tons Os livros apresentam pequenas variantes na estrutura de capa,
de cinza, ora em vermelho, em papel de cor branca ou vermelha. Há inversão
como o alinhamento do texto na quarta-capa (adaptado à ilustração) e cores
da estrutura tradicional do livro, uma não preocupação em manter a ordem
das informações textuais (relacionadas às cores da ilustração e, provavelmen-
clássica de seus elementos. O que importa, neste caso, é apenas criar uma nar-
te, ao pecado a que o livro corresponde).
rativa pré-textual através das imagens. As entradas de capítulo, nos livros apresentam-se em branco sobre fundo preto, diferentemente das demais folhas de texto, todas brancas com
76
texto impresso em preto. Além disso, o texto, nas entradas de capítulo é de corpo duas vezes maior e não obedece às margens estabelecidas nas outras páginas. Esta estrutura se repete a cada capítulo, em todos os volumes, exceto em Mal Secreto, que apresenta a estrutura apenas no capítulo inicial, para assim manter a identidade da coleção, e provavelmente sua ausência se deva ao fato da narrativa não se adaptar a este tipo de recurso gráfico. Nesta coleção identificam-se várias situações de autoria. A primeira delas reside no fato de que o editor cria o tema da coleção (pecados capitais) e convida escritores a escrever sobre um pecado específico, tendo em mente as relações possíveis entre a personalidade e característica estilística desse Figura 95 - Detalhes da estrutura interna dos livros. Fonte: da autora
escritor com o imaginário em
Figura 96 - Detalhe da página de abertura de capítulo. Fonte: da autora
torno de determinado pecado.
77
A segunda relação de autoria é a própria narrativa, a própria história que refle-
Quando Flusser (2007) aponta as diferenças entre linha e super-
te e apresenta a visão do escritor sobre o pecado. As ilustrações presentes nos
fície, coloca que no processo de leitura linear o indivíduo obede-
livros são realizadas por outros autores, por sete artistas visuais. E, finalmen-
ce a uma ordem pré-definida, enquanto no outro, processo em
te, a última das relações de autoria identificadas, a figura do designer-autor,
superfície, a leitura se dá por uma ordem sugerida (e portanto
Victor Burton.
é provável que diferentes indivíduos façam diferentes leituras).
Victor Burton, em seus projetos, “sempre traz as referências daquilo que gosta - principalmente história da arte” (PERROTTA, 2006, p. 14). O estilo burtoniano valoriza a tipografia e os ornamentos (molduras, fios etc) e recorre a elementos como o céu, a lua e sol seguidamente (PERROTTA, 2006) - inclusive, o logotipo da coleção Plenos Pecados possui a figura de um
78
sol.
Relacionando esses pensamentos com as análises realizadas, percebo que no projeto gráfico de livro há a convivência entre esses dois tipos de leitura: o texto como pensamento linear e o projeto gráfico (seja por ilustrações, uso de cor, texturas etc) como pensamento em superfície. E que o mágico do livro está na integração e na contaminação de um tipo de pensamento pelo outro.
79
3.3
Caio Fernando Loureiro Abreu é gaúcho de Santiago, conhecida no Rio Grande do Sul como “a terra dos poetas”. Nascido em 1948, faleceu aos
Criando uma coleção
80
quarenta e sete anos, em 1996, vítima do vírus HIV. Chegou a estudar Letras e Artes Cênicas, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), mas
A prática projetual deste trabalho apresentou-se de maneira
não concluiu nenhum dos dois cursos. Trabalhou em revistas como Manchete
natural, enquanto a revisão teórica era construída. Nos inter-
e Nova, jornais como Correio do Povo, Folha de São Paulo e Zero Hora. Morou
valos entre leituras sobre metodologia, imaginário e design,
no Rio de Janeiro, Porto Alegre e em vários países da Europa. Foi perseguido
meu descanso se dava, principalmente, lendo obras literárias.
pelo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) durante a ditadura.
Neste período, então, comecei a reler os contos de Caio Fer-
Refugiou-se na casa da escritora Hilda Hilst (vários de seus textos foram escri-
nando Abreu, um dos meus escritores favoritos.
tos no sítio de Hilda). Escreveu peças de teatro e, acima de tudo, deixou para
Os textos de Caio sempre me proporcionaram ima-
as pessoas as suas palavras.
gens inesquecíveis de seus personagens, situações e lugares.
A coleção desenvolvida agrupa sete livros do autor: Morangos mo-
Assim como Vitor Ramil tem a sua Satolep*, cidade que é fru-
fados, Os dragões não conhecem o paraíso, O ovo apunhalado, Fragmentos,
to do imaginário do escritor/músico a partir da observação de
Ovelhas negras, Limite branco e Inventário do Ir-remediável. Tais livros foram
sua própria cidade natal, Caio tem seu Passo da Guanxuma,
escolhidos por se tratarem de textos que eu já havia lido.
cidade onde se passam parte de suas histórias. Essas duas ci-
É importante deixar claro que este trabalho apresenta somente ca-
dades, esses dois imaginários que são construídos a partir do
pas para os livros - e não o projeto gráfico total - pelo pouco tempo disponí-
real, sempre me encantaram, talvez pela sensação de perten-
vel durante este semestre. O projeto gráfico de capa e miolo demandaria mais
cer a Pelotas/Satolep ou dessas cidades também pertencerem
atenção e, portanto, mais tempo. Também é necessário falar sobre os mate-
a mim.
riais disponíveis para impressão dos protótipos, aqui mostrados em material Então, após esse reencontro com os textos do escri-
e impressão mais próximos do ideal. As especificações dos materiais que se-
tor, surgiu pronta minha coleção. Não foi uma escolha, uma
riam utilizados caso o projeto fosse realmente editado encontram-se junto ao
opção. O que eu lembrava e o que me sensibilizava nos mo-
memorial descritivo de cada uma das capas.
mentos em que eu estudava e escrevia eram essas palavras, contos, lugares, pessoas, acontecimentos, o imaginário desse
A narrativa dramática de Caio Fernando Abreu revela um ser inclassificável,
autor. *Satolep é palíndromo da palavra Pelotas, “é presença fixa na obra
[...] obssessivo com o lado escuro de todas as coisas, mas apaixo-
de Ramil - um lugar a qual ele recorre, percorre e busca recriar para
nado pela vida, sempre em busca da luz, das flores, da leveza. O
constituir a si próprio”. Extraído de http://editora.cosacnaify.com.br/
Caio simpático com os outsiders, com quem, curioso e temerário,
ObraSinopse/11053/Satolep.aspx
81
gostava de andar no limite, nas noites mais perigosas, mas nunca
tipo de encadernação chama-se encadernação copta, desenvolvida por egíp-
a ponto de se perder, nunca a ponto de perder o caminho de volta,
cios, entre os séculos II e III, sendo utilizada comumente na Etiópia até os dias
que marcava, como João e Maria da fábula, não com pedacinhos
atuais**. Com esta costura, o livro acaba não tendo lombada impressa e, se por
de pão ou pedrinhas, mas com seus textos, a literatura (CALLE-
um lado, em uma prateleira de livros não se dará a identificação imediata da
GARI, 2008, p. 11).
obra, por outro, haverá uma interrupção, uma massa branca entre as demais
Fazendo relações com esses sentimentos e sensações é que foram criadas as capas da coleção. Primeiramente, pensei em utilizar manchas em nanquim, por ser algo que eu tenha contato direto (as manchas e escorridos do líquido como sugestão e ponto de partida para desenhos), e por ser um material delicado,
82 no sentido de que qualquer gota d’água que caia sobre o papel ainda úmido provoca reações na cor e nas formas da tinta, além de muitas vezes seu resultado ser imprevisível - uma relação que acaba sendo estabelecida com o autor e suas mudanças, suas épocas e sua característica de “inclassificável”. A opção por realizar cortes na capa, mostrando detalhes do que se encontra na folha de rosto, é uma tentativa de integrar capa e miolo do livro e provocar uma contaminação entre estas partes, que é também reforçada pela presença de trechos de cada um dos livros em cada uma das capas. As diferentes camadas que se sobrepõem, mostrando detalhes internos do livro, são parte de um jogo em que descobrir, encobrir, fazer emergir, esconder, proteger, expor e revelar são as jogadas-chave. E neste jogo estas camadas se confudem, cabendo ao leitor, através de sua experiência com o objeto, desvendar as mesmas. Outro ponto importante, que também revela a estrutura interna do livro, é a encadernação*, com a costura e estrutura de cadernos aparente. Este *A fim de mostrar este tipo de encadernação, o presente trabalho é encadernado da mesma maneira. **Extraído de www.doe.in.gov/olt/grantprojects/books/Coptic%20Book.htm
lombadas. Na quarta capa dos livros optei por repetir a folha de rosto, seguindo a noção da integração da parte exterior do livro com seu interior. A única diferença é o espelhamento dos elementos contidos na folha, o que pode se identificar como mais uma das jogadas propostas. A ausência de uma grade estrutural padrão para as sete capas devese à escolha de adequar os elementos às manchas, já que estas possuem aparências e tamanhos distintos. Adequadas à mancha também foram escolhidas as tipografias e cores. Por tais escolhas, as variantes neste projeto tornam-se muito mais explícitas do que as invariantes, sendo a unidade da coleção observada no todo e não em poucos volumes. Além disso, existem aproximações entre capas, criando pequenos conjuntos (de dois ou três livros), que serão melhor comentados na descrição de seus projetos gráficos.
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Agora abria a porta devagarinho, atento aos ruĂdos que na hora da sesta sempre parecem maiores do que realmente eram.
Limite branco A capa de Limite Branco, ao contrário de seu nome, apresenta uma grande mancha negra, que se espalha pela superfície. A mancha foi obtida através de pinceladas de nanquim preto e pingos d’água sobre o papel. Após a secagem, o papel foi arrastado contra a mesa que continha vestígios da tinta, por isso algumas partes mais claras e outra textura. A mancha não acaba, ela se estende por toda a capa. Existem algumas áreas mais delimitadas, mas ainda assim fazem parte de um todo, de uma mesma massa. O limite, presente no título, é sugerido pelo corte que separa o nome do livro do nome do autor e revela apenas um fragmento do texto presente na folha de rosto. Quanto às camadas, essa capa, especialmente, possui muitas: a camada da folha de rosto, a camada da tipografia* e as inúmeras camadas de tinta.
*As famílias tipográficas utilizadas serão citadas, juntamente com as especificações de produção gráfica, em forma de cólofon, ao final da descrição de cada capa.
A capa foi composta com tipografia Galette, e impressa em off-set sobre papel-cart達o TP Premium 300g/m da Suzano.
.mare etnemlaer euq od seroiam mecerap erpmes atses ad aroh an euq sodĂur soa otneta ,ohniragaved atrop a airba arogA
No começo, tinha nojo dele. O homenzinho apagado demais, humilde demais, sempre quieto, como consciente do desprezo que provocava, e por isso mesmo mais desprezĂvel.
Ovelhas negras Uma mancha negra que vai se diluindo até um cinza claro é ponto de partida para a capa de Ovelhas negras, livro que apresenta diversos contos de Caio Fernando Abreu, escritos dos 14 aos 46 anos e que, por diferentes razões, nunca haviam sido editados em um livro. Ao final da introdução, Caio ainda comenta: “como Rita Lee, sempre dediquei um carinho todo especial pelas mais negras das ovelhas” (ABREU, 2002, p. 4) e assina como O Autor-Pastor, o pastor dessas ovelhas negras. A mancha negra, envolta por uma forma clara, é uma referência ao título do livro, à própria ovelha-negra, “pessoa que num grupo sobressai por suas más qualidades, por seu mau proceder” (HOLANDA, 1986, p. 1241). O excerto de texto presente na folha de rosto é do conto O príncipe sapo, e quando o corte revela o trecho “e por isso mesmo mais desprezível” cria uma forte relação com o título do livro.
A capa foi composta com tipografias Sub-pear e Book Antiqua, e impressa em off-set sobre papel-cart達o Art Premium 300g/m da Suzano.
,siamed odagapa ohniznemoh O .eled ojon ahnit ,oçemoc oN ozerpsed od etneicsnoc omoc ,oteiuq erpmes ,siamed edlimuh .levĂzerpsed siam omsem ossi rop e ,avacovorp euq
O limo do poço. A umidade do poço. A água do poço. A terra do poço. O cheiro do poço. O poço do poço.
O ovo apunhalado As manchas presentes no livro podem ser relacionadas tanto com o trecho de texto escolhido quanto ao apunhalado do título. Esparsas, elas parecem sair de um mesmo ponto, fora da capa, como se algo estivesse se abrindo e deixando um líquido interior se expandir. Ou então parecem manchas úmidas, mofadas, criando relação com o poço do texto. Nesta capa, o nome do autor quase desaparece. Ele está ali, mas por se tratar de um dos livros mais comentados do autor esta informação é deixada em segundo plano, em uma tipografia de corpo delicado, que contrasta com as manchas fortes e o peso da caixa formada pelo corte.
A capa foi composta com tipografias St Marie Thin, e Museo 500 impressa em off-set sobre papel-cart達o Quartz 230g/m da Suzano.
od edadimu A .oçop od omil O .oçop od oriehc O .oçop od arret A .oçop od augá A .oçop .oçop od oçop O
Inventário do Ir-remediável A capa de Inventário do Ir-remediável não fosse pelo texto e nome do autor seria uma capa quase transparente, já que não existem contrastes intensos entre os elementos. A tipografia do nome do livro some em uma mancha quase inexistente, transparente, de pinceladas delicadas e aguadas. A folha de rosto revela apenas sua textura, não há informação agregada à ela. Pode-se observar uma pequena relação desta capa com a capa de O ovo apunhalado; ambas utilizam informações em segundo plano, quase transparentes, para passar atenção à outros detalhes. Na capa de Inventário do Ir-remediável dá-se importância e destaque ao trecho da obra e ao detalhe da folha de rosto, por se tratar de outro material.
A capa foi composta com tipografias St Marie Thin, Lido STF e Pill Gothic 600, e impressa em off-set sobre papel-cart達o Quartz 230g/m da Suzano e papel Kraft 300g/m
O rapaz de camisa vermelha aproveitou o silêncio para gritar bem alto que Urano estava entrando em Escorpião. Os outros pareceram perturbados, menos com a informação e mais com o barulho, e pediram psiu, para ele falar baixo, se não lembrava do que tinha acontecido a última vez.
Morangos mofados Assim como O ovo apunhalado, esta é uma das obras mais divulgadas do autor. A mancha aqui é escorrida e escura, sem grandes variações tonais. A palavra mofados traz características de coisas em decomposição, esquecidas, esgotadas e sempre imagino algo líquido, escorrendo, se perdendo aos poucos. Também lembro que, durante a leitura do livro, me marcou a quantidade de vezes em que sangue era presente na narrativa. Assim, o escorrido da capa refere-se às minhas impressões do livro. O escorrido da capa parece acabar em um ponto vermelho - corte na capa -, que estabelece essa relação com o sangue e com o trecho do texto utilizado, no qual a figura de um “rapaz de camisa vermelha” é presente. Relacionando esta com as outras capas pode-se identificar semelhanças com a capa de Limite branco, pelas duas possuírem um elemento vertical de destaque, e com a capa de Inventário do ir-remediável, pelo corte revelar apenas cor e textura da folha de rosto.
A capa foi composta com tipografias Andron, Galette e Gill Sans MT impressa em off-set sobre papel-cart達o Quartz 230g/m da Suzano.
ratirg arap oicnêlis o uotievorpa ahlemrev asimac ed zapar O sortuo sO .oãiprocsE me odnartne avatse onarU euq otla meb o moc siam e oãçamrofni a moc sonem ,sodabrutrep marecerap od avarbmel oãn es ,oxiab ralaf ele arap ,uisp maridep e ,ohlurab .zev amitlú a odicetnoca ahnit euq
Um por um, foi abrindo os botões. Acendeu a luz do abajur, para que a sala ficasse mais clara quando, sem camisa, começou a acariciar as manchas púrpura, da cor antiga do tapete na escada - agora, que cor? - espalhadas embaixo dos pêlos do peito. Na ponta dos dedos, tocou o pescoço.
Os dragões não conhecem o paraíso Uma mancha que parece delimitar um território, e apenas parece pois essa mancha se confude com o próprio fundo sobre o qual é colocada. E apenas pode parecer, pois o paraíso não é um território, ou ao menos não um território limitado, que exista concretamente. Este livro é um livro sobre amor. Como diz o autor, em sua introdução, “um livro com 13 histórias independentes, girando sempre em torno de um mesmo tema: amor”. Principalmente neste livro a mancha tem grande importância. É o elemento que proporciona a maior leitura, o elemento central. O texto é do conto Linda, uma história horrível, primeiro conto do livro e um de meus preferidos. O trecho aparente na capa Um por um foi abrindo os botões tem relação com o ato de abrir o próprio livro para descobrir o que se guarda por trás da capa. Esta capa se relaciona com a capa de Ovelhas negras, tanto pela mancha quanto pelo corte horizontal que revela o texto e com a capa de Inventário do ir-remediável, pela mancha clara e luminosa.
A capa foi composta com tipografias Fertigo Pro e Museo, e impressa em off-set sobre papelcart達o Royal Quartz 230g/m da Suzano.
.seõtob so odnirba iof ,mu rop mU a euq arap ,rujaba od zul a uednecA mes ,odnauq aralc siam essacfi alas -nam sa raiciraca a uoçemoc ,asimac etepat od agitna roc ad ,aruprúp sahc -lapse - ?roc euq ,aroga - adacse an .otiep od solêp sod oxiabme sadah o uocot ,soded sod atnop aN .oçocsep
Fragmentos A última capa da coleção possui uma tensão muito forte, obtida com a simples rotação dos elementos de capa. Além disso, a mancha é presente na folha de rosto, o que não acontece em nenhum dos outros volumes, e é vista em detalhe, por um corte circular deslocado do centro de seu conteúdo - que relaciona a mancha mais solta e fragmentada com o próprio título do livro. A princípio esta capa seria modificada, por ser a mais destacada como diferente entre as outras, mas com o tempo observei que todas as capas tinham suas particularidades e que enfatizavam diferentes elementos, o que acabou por justificar a presença da tensão neste caso. As relações com outras capas podem ser vistas principalmente pela tipografia - como em Morangos mofados e pela configuração da mancha - como em O ovo apunhalado.
A capa foi composta com tipografias Florin Sans, Andron e Consolas, e impressa em off-set sobre papel-cart達o Royal Quartz 230g/m da Suzano.
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Descrição metodológica Após ter o objeto de pesquisa escolhido comecei uma busca por referenciais que sustentassem meus pensamentos, registrando tudo que lia e me parecia pertinente para me auxiliar no trabalho em um caderno - que me acompanha até agora. Também criei um blog, onde cheguei a registrar alguns pensamentos mais soltos, que acabou não funcionando como eu pretendia - um reservatório de referências. Durante a busca, lembrei das oficinas que pude participar no 20º Encontro Nacional dos Estudantes de Design - N Design Imersão, ocorido do dia 11 ao dia 18 de julho de 2010 em Curitiba. As oficinas Por uma filosofia do design e Design+Literatura=Criação literária, ministradas por Marcos Beccari e Ivan Mizanzuk me introduziram aos Estudos do Imaginário, pelos quais me identifiquei imediatamente. Hoje vejo que naquele momento descobri um outro mundo. Cheio de outras possibilidades. Um mundo que conversa, que se relaciona e que respeita o mundo das antigas possibilidades. Minha atenção se voltou para essas questões do designer como narrador do vivido, o designer como um in-
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divíduo que projeta a partir das suas percepções e vivências, pois “o ser huma-
alidade única, mas maneiras diferentes de concebê-la” (MAFFESOLI, 2010,
no é movido pelos imaginários que engendra” (SILVA, 2006, p. 7).
p. 36). Assim, a sociologia compreensiva aceita a subjetividade, por crer que
Essas noções habitaram meu pensamento por muitas semanas e fui pesquisando referenciais para melhor compreende-las. Ainda no mês de julho,
o pesquisador é movido por suas próprias vivências e aceita “a presença do imponderável, do acaso, do etéreo na cultura” (SILVA, 2003, p. 16).
do dia 26 ao dia 29, tive a chance de participar, pela segunda vez, do Encuentro
Consonante à visão de Maffesoli sobre a pesquisa em ciências so-
Latinoamericano de Diseño - Diseño en Palermo. Lá, pude assistir a apresenta-
ciais é a visão de Juremir Machado da Silva, professor da Pontifícia Universi-
ção do designer mexicano Alejandro Magallanes sobre sua produção editorial.
dade Católica do Rio Grande do Sul e discípulo de Maffesoli, sobre o imaginá-
Assim como outros amigos - incluso minha orientadora - fiquei fascinada com
rio. Para Silva, o imaginário é o que move os indivíduos, é por ele que “o ser
a produção e a paixão com que Magallanes falava do próprio trabalho. Seus
constrói-se na cultura” (SILVA, 2006, p. 14) e “encontra reconhecimento no
trabalhos eram ideias simples, nada de grandes produções e recursos financei-
outro e reconhece-se a si mesmo” (SILVA, 2006, p. 14).
ros, mas únicas. E, apesar de não conhecer grande parte do seu trabalho, eu
Assim, essas noções me pareceram (e ainda parecem) um bom
144 via Magallanes naquelas peças, o imaginário que impulsionava sua produção.
modo de refletir sobre o ser designer, que, segundo Flusser é um ser que “de-
Esses pensamentos foram aos poucos tomando forma em mim.
duz e maneja eternidades” (FLUSSER, 2007, p. 191), por possuir um “olho-
E algumas opções foram se re-apresentando em minha memória. Antes das
sentinela”, que “olha para o longe, em direção à eternidade” (FLUSSER,
orientações começarem ainda lembrei dos livros Bartleby, o escrivão e Livro
2007, p.188).
das Perguntas, já citados na introdução, por serem livros que comprei por sua
Paralelamente à leitura sobre imaginário, dei início a busca por
forma e pela experiência que me proporcionavam. Possivelmente, escolheria
fontes que tratassem da história do livro, da evolução do design editorial e de
outro livro - talvez de meus autores preferidos no momento: Jorge Luis Bor-
autoria no design gráfico. Assim, foram encontrados muitos artigos, que me
ges, Roberto Bolaño ou Chico Buarque - não fossem seus projetos gráficos. E
levaram a outros muitos livros que tratavam destes assuntos. A história do
por conta destes livros comecei a me interessar cada vez mais sobre questões
design é vista a partir de Meggs, que realiza um apanhado da história das ma-
de autoria em design gráfico, especialmente no projeto gráfico dos livros - que
nifestações gráficas desde a comunicação visual da pré-história. É importante
sempre foi a área que mais me encantou.
citar que Meggs acredita que “por mais que nos empenhemos em busca da ob-
Para minha sorte, logo no primeiro encontro para orientação, mi-
jetividade, as limitações do conhecimento e das percepções pessoais acabam
nha orientadora indicou os livros As tecnologias do Imaginário, de Juremir
por se impor” (MEGGS, 2009, p. 10), pensamento consonante aos pressupos-
Machado da Silva e O conhecimento comum, de Michel Maffesoli, como apor-
tos da sociologia compreensiva. As reflexões a respeito da história do livro e
te teórico para o trabalho.
leitura são vistas através das lentes de André Belo, que realiza um apanhado
Michel Maffesoli é um sociólogo francês, professor da Sorbonne.
histórico sobre as formas do livro e suas mudanças sociais, Martyn Lions, que
Em seu livro O conhecimento comum: introdução à sociologia compreensi-
faz uma leitura das mudanças na leitura, fruto de mudanças sociais ocorridas
va, deixa alguns pressuspostos a respeito da pesquisa nas ciências humanas e
no século XIX, Armando Petrucci e José Barboza Mello, com reflexões sobre
ressalta a importância de o pesquisador ter em mente que “não existe uma Re-
história da imprensa no Brasil.
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A escolha de falar do livro enfatizando suas mudanças de configuração como objeto durante a História deu-se pela minha necessidade de reali-
tabelecer relações de unidade da coleção foi utilizado o critério de informação váriável e informação invariável, de Chico Homem de Mello (2006).
zar esse apanhado para melhor compreender as possibilidades de inovação no
As análises realizadas serviram como ponto de partida para a ela-
design de livros. Além disso, a opção de dedicar parte do trabalho ao estudo da
boração do projeto gráfico da nova coleção por mim proposta. A princípio, a
leitura e do sujeito leitor foi tomada por perceber que as mudanças de configu-
coleção se daria por agrupamento de obras que eu me identificasse e possuís-
ração dos objetos são impulsionadas por forças sociais e não apenas por forças
sem pontos em comum. Essa opção me parece viável, mas houveram alguns
tecnológicas. Assim, construí um pequeno relato histórico destas principais
acontecimentos no processo que fizeram com que eu mudasse a maneira de
mudanças na relação dos indivíduos com seus livros, acreditando que o de-
reunir os livros. As escolhas das obras se deram de forma natural, da maneira
signer gráfico pode se valer dessa interação entre objeto e leitor ao projetar. E,
com que as possibilidades se mostravam, relacionadas com o momento que eu
para melhor compreender como as mudanças do livro se deram no Brasil são
estava vivendo. De um momento para o outro a coleção se apresentou pronta
utilizados os autores Rafael Cardoso e Chico Homem de Mello, pois resgatam
à minha frente, trazendo livros de um dos meus autores preferidos - o escritor
importantes personagens e fatos históricos que colaboraram para a evolução
Caio Fernando Abreu - e o que fiz foi aceitar essa sugestão apresentada, ape-
146 das artes gráficas no Brasil.
Falando de autoria no design gráfico encontrei poucas referências, comparando à quantidade encontrada sobre os outros temas. Durante essa pesquisa, coincidentemente, encontrei um artigo de uma professora do meu próprio instituto - Lúcia Weymar - que fala sobre relações de autoria e alteridade no design gráfico contemporâneo. Partindo da revisão teórica foram construídas as análises das peças gráficas escolhidas - iniciando a parte prática deste trabalho - para posteriormente servirem de base para o projeto gráfico de uma coleção literária. Embora o projeto gráfico construído nesse trabalho tenha seu foco voltado para a capa (por questões de tempo), escolhi analisar duas coleções que trabalham o miolo do livro para construir identidade e proporcionar uma nova experiência ao leitor e outras duas coleções que focam as questões identitárias em suas capas. As coleções Moda Brasileira I, Particular, José Lins do Rego e Plenos Pecados foram analisadas em seus aspectos formais (o que pode ser relacionado com o conceito de formismo, proposto por Maffesoli, no qual a forma não é apenas mais um atributo do objeto, mas também seu formante). E para es-
nas (re)configurando-a.
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*
*
Considerações Finais
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Sempre dediquei uma atenção especial aos livros e, desde que comecei a estudar e conhecer as possibilidades do design gráfico, foi nesse objeto que depositei meu especial carinho. Este trabalho aqui apresentado me fez pensar muito sobre o ser (indivíduo) designer e rever alguns conceitos muito fechados, que eu considerava imutáveis. Este trabalho mudou muito desde a entrega do projeto de pesquisa, ainda no primeiro semestre do ano. Como já mencionado, reconsiderei muitos dos meus pensamentos e, para isso, foram necessárias muitas conversas e reflexões acerca do objeto para que eu realmente desenvolvesse uma linha de pensamento coerente com o que estava pensando no momento. Procurei, durante este trabalho, estabelecer relações entre o livro e o leitor, entre o livro e o designer e entre o livro e sua própria estrutura. Falo de relações pois nada que escrevi é eterno ou a única verdade. É o meu recorte, a partir das minhas referências, do imaginário a que estou inserida, o
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meu “ponto de vista”, a minha “vista de um ponto” (SILVA, 2006), e assim, este imaginário “é uma aura em constante mutação” (SILVA, 2006, p. 17).
Finalmente, o sentimento é de que este é um trabalho aberto, que pode ser retomado. Este processo, desenvolvido durante aproximadamente
Creio que as perguntas que estabeleci quando dei início a esta pes-
quatro meses, não acaba neste trabalho. O que apresentou-se aqui é apenas
quisa foram abordadas ao longo dos capítulos. Analisei coleções e, a partir
uma introdução ou uma pequena parte das considerações que tenho a fazer.
delas, pude perceber os diferentes modos de criar identidades gráficas, apos-
Minhas únicas certezas são as de que a cada dia me (re)encanto com as possi-
tando na semelhança das grades estruturais ou, surpreendentemente, até na
bilidades e de que este processo deve ser continuado.
total diferença. É também distinto o modo com que o designer cria relações do projeto gráfico de um livro com a narrativa presente no mesmo, pois muitas vezes a intenção é que a leitura se dê quase que inteiramente pelo texto (digo quase já que sempre haverá algo externo as próprias palavras, considerando que até
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as letras são códigos a serem interpretados) e em algumas outras propostas não só o texto é valorizado, mas sua disposição na página, as imagens que o ilustram, as texturas de papéis etc. A noção de autoria no projeto de livro, da maneira como foi abordada neste trabalho, me faz pensar que todo designer é um autor, pois ele sempre levará em conta aquilo que o move ao projetar. Além disso, suas próprias referências e repertório aparecem em suas escolhas, direta ou indiretamente. Neste ponto, mais especificamente, considero que ainda há muito o que estudar e refletir - tanto por este ser um trabalho introdutório no assunto quanto pela dificuldade em encontrar estudos que me serviriam de aporte teórico. O projeto gráfico de coleção, resultante da pesquisa desenvolvida, como já dito anteriormente, apresentou-se para mim. Digo que este se apresentou pelo fato de eu não ter tido dificuldade alguma em estabelecer ou escolher entre um ou outro autor, entre uma ou outra obra literária. Acredito que o trabalho apenas seguiu seu curso e que, de maneira indireta, eu estava pensando nas opções a serem consideradas para este projeto, levando em conta a trajetória desta pesquisa - para que o projeto prático não se encontrasse distante de minha pesquisa teórica.
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Ainda bem que sempre existe outro dia. E outros sonhos. E outros risos. E outras coisas. Caio Fernando Abreu
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Composto nas tipografias Lido STF, Museo Sans e Museo Slab. Impresso laser sobre papel sulfite 75g/m. Capa em papel paranĂĄ 240g/m forrada com tecido 100% algodĂŁo. Costurado com fio encerado.