INSTITUTO TEOLÓGICO DE SANTA CATARINA EWERTON MARTINS GERENT
O ANÚNCIO DA PALAVRA DE DEUS NA CELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA
FLORIANÓPOLIS 2011
EWERTON MARTINS GERENT
O ANÚNCIO DA PALAVRA DE DEUS NA CELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA
Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do grau de Bacharel em Teologia pelo Instituto Teológico de Santa Catarina.
Orientador: Dr. Valter Mauricio Goedert
FLORIANÓPOLIS 2011
DEDICATÓRIA
Dedico a todos que buscam celebrar vivamente a Liturgia da Palavra nas Celebrações Eucarísticas.
AGRADECIMENTOS
Agradeรงo a Deus. Aos meus amigos e familiares, por estarem sempre me apoiando e incentivando. E aos meus professores, orientador e colegas do curso.
“A proclamação da Palavra de Deus na celebração comporta reconhecer que é o próprio Cristo que Se faz presente e Se dirige a nós para ser acolhido”.
(Verbum Domini, n.56)
RESUMO
O Concílio Vaticano II foi para a Igreja Católica um marco de renovação na dimensão litúrgica. E o Anúncio da Palavra de Deus teve um destaque especial. O Concílio contribui para darmos hoje uma maior ênfase ao anúncio da Palavra de Deus durante a Celebração Eucarística. É através da Liturgia da Palavra que a Palavra de Deus é refletida e abordada mais profundamente, e mistagógicamente. O povo tem o direito de se alimentar da Palavra de Deus, que é o primeiro e necessário alimento da vida cristã. Este anúncio, na Liturgia da Palavra, tem seu contexto dentro da Celebração Eucarística. Os documentos da Igreja auxiliam para melhor conhecimento para a preparação, a execução e a escuta deste anúncio. Como exemplo podemos ter os momentos de anúncio nas Sagradas Escrituras. O leitor é um „ministro‟ indispensável, como Jesus também foi na Sinagoga (Lc 4,1622). Para o anúncio na Celebração existe um espaço litúrgico específico, que é a Mesa da Palavra, em que se evoca a presença viva do Senhor que fala para seu povo. Assim, a Palavra anunciada deve ser emitida, deve haver a recepção e a resposta.
PALAVRAS - CHAVE:
1. Anúncio
2. Liturgia da Palavra
3. Celebração Eucarística
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 9 1. O ANÚNCIO DA PALAVRA NAS ESCRITURAS ............................................... 12 1.1. Do Antigo Testamento – Neemias 7,72b-8,12 ................................................ 12 1.2. Do Novo Testamento – Lucas 4,16-22 ........................................................... 15 1.3. Do Novo Testamento – Lucas 24,13-27 ......................................................... 16 2. A LITURGIA DA PALAVRA NO PROCESSO HISTÓRICO................................ 18 2.1. Igreja Primitiva I-VI ......................................................................................... 18 2.2. Igreja Medieval VI-XV ..................................................................................... 23 2.3. Igreja Moderna XVI-XX ................................................................................... 25 2.4. Concílio Vaticano II ......................................................................................... 26 3. O LEITOR E OS LIVROS .................................................................................... 27 3.1. O Leitor ........................................................................................................... 27 3.2. Os Livros......................................................................................................... 31 3.2.1. Lecionário................................................................................................... 32 3.2.2. Evangeliário ............................................................................................... 34 4. A LITURGIA DA PALAVRA ................................................................................ 37 4.1. Liturgia da Palavra parte por parte ................................................................. 38 4.1.1. Leituras ...................................................................................................... 38 4.1.2 Salmo Responsorial .................................................................................... 41 4.1.3. Aclamação ao Evangelho .......................................................................... 42 4.1.4. Evangelho .................................................................................................. 43 4.1.5. Homilia ....................................................................................................... 45 4.1.6. Profissão de Fé ................................................................................................. 49 4.1.7. Oração dos fiéis ......................................................................................... 50 4.2. Silêncio ........................................................................................................... 52
5. O ANÚNCIO DA PALAVRA NOS DOCUMENTOS DA IGREJA ........................ 54 5.1. Constituição Sacrosanctum Concilium ........................................................... 54 5.2. Constituição Dogmática Dei Verbum .............................................................. 55 5.3. Instrução Geral sobre o Missal Romano ......................................................... 56 5.4. Cerimonial dos Bispos – Cerimonial da Igreja ................................................ 60 5.5. Catecismo da Igreja Católica .......................................................................... 61 5.6. Código de Direito Canônico ............................................................................ 62 5.7. Exortação Apostólica Pós-Sinodal Sacramentum Caritatis............................. 63 5.8. Instrução Redemptionis Sacramentum ........................................................... 64 5.9. Guia Litúrgico-Pastoral da CNBB ................................................................... 67 5.10. Lineamenta do XII Sínodo dos Bispos: A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja .................................................................................................... 68 5.11. Mensagem do XII Sínodo dos Bispos ao povo de Deus: A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja ................................................................................ 68 5.12. Exortação Apostólica Pós-Sinodal Verbum Domini ...................................... 69 6. O ESPAÇO LITÚRGICO DO ANÚNCIO DA PALAVRA ..................................... 74 6.1. Percurso Histórico da Mesa da Palavra .......................................................... 75 6.2. A Mesa da Palavra na Liturgia ........................................................................ 79 CONCLUSÃO ........................................................................................................... 82 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 84 ANEXO ..................................................................................................................... 92
INTRODUÇÃO
A Liturgia da Palavra foi durante muito tempo como que um anexo da missa: O padre fazia esta parte em voz baixa, ressaltando somente o momento da homilia. O Concílio Vaticano II, porém, deu um grande avanço no reavivamento da Liturgia da Palavra. A Sacrosanctum Concilium nos diz que “a Liturgia da Palavra e a Liturgia Eucarística estão estritamente unidas, formam um só ato de culto” 1. O mistério da Palavra, como a Eucaristia, levam ao mistério de Jesus Cristo. São Jerônimo já dizia: “Quanto a mim, penso que o Evangelho é o corpo de Cristo e que a Sagrada Escritura é sua doutrina. Quando o Senhor fala em comer sua carne e beber seu sangue, é certo que fala do mistério (da Eucaristia). Entretanto, seu verdadeiro corpo e verdadeiro sangue são (também) a Palavra da Escritura e sua doutrina”2. Através da Liturgia da Palavra, a Palavra de Deus é refletida, abordada mais profundamente, e mistagogicamente. “Se considerarmos bem os vários modos de presença da Palavra de Deus, temos de reconhecer que ela não existe totalmente senão no momento da sua proclamação cultual na igreja, ou melhor, diante da Igreja”3. O povo tem o direito de se alimentar também da Palavra de Deus, que é o primeiro e necessário alimento da vida cristã. Infelizmente, a Igreja ficou durante muito tempo sem dar a importância devida à Palavra. Durante a Celebração Eucarística, a Liturgia da Palavra era realizada pelo padre e em voz baixa. Para refletir sobre „A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja‟, em 2008 aconteceu em Roma o Sínodo dos Bispos. Na lineamenta em preparação está escrito: 1
CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. Constituição Sacrosanctum Concilium: Sobre a Sagrada Liturgia. In: Documentos Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965). São Paulo: Paulus, 1997. n.56. 2 DEISS, L. A Palavra de Deus celebrada. Petrópolis: Vozes, 1996, p.36. 3 GIRAUDO, C. Admiração Eucarística. Para uma mistagogia da missa à luz da encíclica Ecclesia de Eucharistia. São Paulo: Loyola, 2008, p.84.
10
A finalidade deste Sínodo é eminentemente pastoral: aprofundando as razões doutrinais e deixando-se iluminar por elas, procura-se estender e reforçar a prática de encontro com a Palavra como fonte de vida nos diversos âmbitos da experiência, propondo, para tal, aos cristãos e a todas as pessoas de boa vontade, caminhos justos e fáceis para poder escutar Deus e falar com Ele4.
Tal é a importância da Palavra, que a Exortação Apostólica Pós-sinodal, deste mesmo sínodo fala da sacramentalidade da Palavra.
(...) na origem da sacramentalidade da Palavra de Deus, esteja precisamente o mistério da encarnação: o Verbo fez-Se carne (Jo 1, 14), a realidade do mistério revelado oferece-se a nós na carne do Filho. A Palavra de Deus torna-se perceptível à fé através do sinal de palavras e gestos humanos. A fé reconhece o Verbo de Deus, acolhendo os gestos e as palavras com que Ele mesmo se nos apresenta. Portanto, o horizonte sacramental da revelação indica a modalidade histórico-salvífica com que o Verbo de Deus entra no tempo e no espaço, tornando-Se interlocutor do homem, chamado a acolher na fé o seu dom5.
Com toda a realidade da Liturgia da Palavra, somos questionados: qual o sentido da Palavra de Deus na Celebração Eucarística? o anúncio da Palavra de Deus também é um elemento central na Celebração Eucarística? quais as dimensões do anúncio da Palavra de Deus? a Palavra de Deus age na comunidade durante a Liturgia da Palavra? o que a Liturgia da Palavra expressa aos fiéis, ou, pelo menos, o que ela deve expressar? quem lê a Escritura durante a Celebração Eucarística tem seu valor na liturgia? Esta pesquisa procura contribuir para um aprofundamento maior da realidade do anúncio, Liturgia da Palavra, na Celebração Eucarística, contribuição esta que busca: analisar seus aspectos constitutivos, suas partes, sua dimensão litúrgica e falar sobre o local onde acontece a Liturgia da Palavra. Assim, refletindo sobre o anúncio da Palavra de Deus na celebração litúrgica. 4
SÍNODO GERAL DOS BISPOS. Lineamenta. Disponível em : <http://www.vatican.va/roman_ curia/synod/documents/rc_synod_doc_20070427_lineamenta-xii-assembly_po.html>. Acesso em: 21 de abr. de 2010. n.5. 5 BENTO XVI. Exortação Apostólica Pós-Sinodal Verbum Domini. São Paulo: Paulinas, 2010. n.56.
11 Para melhor compreensão do assunto, esta reflexão está dividida em seis capítulos: no primeiro capítulo teremos uma abordagem sobre o anúncio da Palavra nas Sagradas Escrituras, perpassando três textos importantes do Antigo (Ne 7,72b8,12) e Novo Testamentos (Lc 4,16-22 e 24,13-27). No segundo, faremos uma retrospectiva histórica e evolutiva da Liturgia da Palavra, percorrendo desde os primeiros séculos do Cristianismo, passando pelo período de „abafamento‟, e chegando à renovação feita com o Concílio Vaticano II. No terceiro, analisaremos o papel do leitor e falaremos sobre os livros litúrgicos usados para o anúncio da Palavra. No quarto, serão analisadas as partes da Liturgia da Palavra e os abusos que acontecem. No quinto, serão elencados os documentos magisteriais e seus respectivos textos sobre a Liturgia da Palavra e seus constituintes. No sexto, será analisado o espaço (fisíco) central da Liturgia da Palavra, a sua mesa (ambão). Ao final desta pesquisa (anexo) consta o „Elenco das Leituras da Missa‟. Este, como é o documento magisterial que mais fala sobre essa realidade da Liturgia da Palavra, está disponível na integra para que possa ser consultado. E, sempre que no decorrer da pesquisa for mencionado o ELM, o leitor é convidado a consultar este documento em anexo.
1. O ANÚNCIO DA PALAVRA NAS ESCRITURAS
Para começar a reflexão sobre o anúncio da Palavra, iremos, neste capítulo, ver três passagens bíblicas que nos fazem lembrar o seu anúncio através da Liturgia da Palavra. Do Antigo Testamento, a passagem de Neemias 7,72b-8,12, e do Novo Testamento, as de Lucas 4,16-22, e 24,13-35. Neste capítulo, não pretendemos fazer uma exegese, mas sim uma análise litúrgica.
1.1.
Do Antigo Testamento – Neemias 7,72b-8,12
[72b] Ora, quando chegou o sétimo mês – os filhos de Israel estavam assim instalados em suas cidades -, [1] todo o povo se reuniu como um só homem na praça situada defronte da porta das Águas. Disseram ao escriba Esdras que trouxe o livro da Lei de Moisés, que Iahweh6 havia prescrito para Israel. [2] Então o sacerdote Esdras trouxe a Lei diante da assembleia, que se compunha de homens, mulheres e de todos os que tinham o uso da razão. Era o primeiro dia do sétimo mês. [3] Na praça situada diante da porta das Águas, ele leu o livro desde a aurora até o meio-dia, na presença dos homens, das mulheres e dos que tinham o uso da razão: todo o povo ouvia atentamente a leitura do livro da Lei. [4] O escriba Esdras estava sobre um estrado de madeira, construído para a ocasião; perto dele estavam, à sua direita, Matatias, Sema, Anias, Urias, Helcias, Maasias; e à sua esquerda, Fadaías, Misael, Melquias, Hasum, Hasbadana, Zacarias e Mosolam. [5] Esdras abriu o livro à vista de todo o povo – pois ele dominava todo o povo – e, quando ele o abriu todo o povo se pôs de pé. [6] Então Esdras bendisse a Iaweh,o grande Deus; todo o povo, com as mãos erguidas, respondeu: „Amém! Amém!‟, e depois se inclinaram e se prostraram diante de Iaweh, com o rosto em terra. [7] Josué, Bani, Serebias, Jamin, Acub, Sabatai, Hodias, Maasias, Celita, Azarias, Jozabad, Hanã, Falaías, que eram levitas, explicavam a Lei ao povo, enquanto todo o povo estava de pé. [8] E Esdras leu no livro da Lei de Deus, traduzindo e dando o sentido: assim podia-se compreender a leitura. 6
A Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, no ano de 2008, enviou às conferências episcopais do mundo uma instrução na qual pede que não se use o termo „Iahweh‟ nas liturgias, orações e cantos. Este termo deve traduzir-se de acordo com o equivalente hebraico „Adonai‟ ou do grego „Kyrios‟ – „Senhor‟, em português. Ou seja, ao ver a palavra „Iahweh‟, devemos ver „Senhor‟.
13 [9] Então Esdras, o sacerdote-escriba, disse a todo o povo: „Hoje é um dia consagrado a Iaweh, vosso Deus! Não vos entristeçais nem choreis!‟ É que todo o povo chorava ao ouvir as Palavras da Lei.7
Os sobreviventes da deportação se reúnem como um só homem, no mesmo dia e no mesmo lugar (v.1). Eles estavam com sede espiritual. Esta sede somente a Palavra de Deus pode saciar. E o povo se dirige a Esdras (escriba). Giraudo nos diz
o termo escriba (sofér), com que no texto hebraico é qualificada a função de Esdras, deve ser entendido em relação à expressão „o livro (séfer) da Lei‟. Do originário significado de funcionário real encarregado de „narrar‟ os anais da dinastia, o termo „escriba‟ passou no período do pós-exílio, a que pertence o nosso texto, a significar o pregador da Torá (lei) ou, se quisermos, o „narrador‟ qualificado dos empreendimentos divinos. Consideramos importante numa tradução de estudo manter a relação escriba-escrito‟, com o fim de perceber em contexto litúrgico o íntimo nexo que existe entre o leitor e o livro da Palavra de Deus.8
Esdras, de acordo com o que lhe é designado, pega o rolo diante de todo o povo. O texto em determinado ponto chama Esdras de escriba e em outro momento de sacerdote.
Esdras é apresentado em 8,1.4 como escriba, 8,2 como sacerdote e em 8,9 como sacerdote e escriba. No quadro da celebração, Esdras intervém formalmente como leitor. Nesse sentido, pode-se observar que, se a tradução canônica dos Setenta transforma sofér em grammatéus [escriba], a tradução apócrifa „sacerdote‟ ultrapassa a função de leitor. Ela, com efeito, além de corresponder ao estatuto social de Esdras, encontra confirmação na prática sinagogal, que reserva ainda a leitura da primeira perícope da Torá a um kohèn [sacerdote].9
A perícope bíblica também nos mostra que, enquanto Esdras explicava, dava sentido ao escrito, o povo entendia o que era proclamado (v.8). Por
7
BÍBLIA. Português. A Bíblia de Jerusalém. Nova edição revista e ampliada. São Paulo: Paulus, 2004. 8 GIRAUDO, C. Admiração Eucarística. Para uma mistagogia da missa à luz da encíclica Ecclesia de Eucharistia. São Paulo: Loyola, 2008. p.73-74. 9 Ibid., p. 74.
14 conseguinte, todo o povo percebia a importância da Palavra de Deus. Podemos remeter esse momento à nossa atual homilia. Um detalhe importante: o livro de Neemias relata que Esdras lia desde a aurora até o meio-dia, ou seja, ele fala longamente, sem se preocupar com o tempo. Esdras lê, e esse ler provém do hebraico qará, que corresponde ao latim clamare e ao nosso proclamar, clamar diante da assembleia. Assim, a Palavra na liturgia deve ser uma proclamação, uma leitura dirigida à assembleia que ouve. O leitor que proclama faz o papel de mediador entre os ouvidos do povo e o texto da Lei. Lendo o versículo quatro, percebemos que é mencionado uma espécie de ambão (estrado de madeira) que fora construído para o momento. Sobre esse estrado, o leitor toma seu lugar para a função, e com ele está um grupo que o auxiliará. No versículo cinco, Esdras abre o livro. Neste gesto de abrir o livro, o leitor empresta sua boca para que Deus fale a seu povo. E o povo é vigilante, escuta a Palavra de pé. O versículo seis lembra um momento importante: antes de ler, Esdras bendiz a Deus. Esse bendizer tem relação com a liturgia sinagogal, onde o verbo bendizer significa pronunciar a bênção.
Não podemos pretender estabelecer com exatidão que fórmula de bênção era pronunciada no tempo de Esdras; mas é licito supor que ela devia ter mais ou menos o seguinte teor: Bendito sejas tu, Senhor nosso Deus, rei do mundo, que nos escolheste dentre todos os povos e nos deste a Lei. Bendito sejas tu, Senhor, doador da Lei.10
Portanto, o povo todo entende a proclamação. A comunidade se reúne para entender a Lei e a Palavra.
10
GIRAUDO, 2008, p.78-79.
15
1.2.
Do Novo Testamento – Lucas 4,16-22
[16] Ele fora a Nazaré, onde fora criado, e, segundo seu costume, entrou em dia de sábado na sinagoga e levantou-se para fazer a leitura. [17] Foi-lhe entregue o livro do profeta Isaías; desenrolou-o, encontrando o lugar onde está escrito: [18] O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou pela unção para evangelizar os pobres; [19] enviou-me para proclamar a libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista, para restituir a liberdade aos oprimidos e para proclamar um ano de graça do Senhor. [20] Enrolou o livro, entregou-o ao servente e sentou-se. Todos na sinagoga olhavam-no atentos. [21] Então começou a dizer-lhes: Hoje se cumpriu aos vossos ouvidos essa passagem da Escritura. [22] Todos testemunhavam a seu respeito, e admiravam-se das palavras cheias de graça que saíam de sua boca.11
Nesta passagem, o próprio Jesus é o que faz o papel do leitor. O evangelista não quer descrever o que todos conhecem. Quer, a partir de uma circunstância específica, anunciar a mensagem. Neste texto, Jesus, que é o Verbo de Deus, fazendo as vezes do leitor, se identifica totalmente com a Palavra que anuncia ser ele quem dá cumprimento à profecia12. O versículo dezesseis nos mostra que Jesus costumava estar, aos sábados, na reunião, para a proclamação cultual da Palavra na sinagoga.
A expressão „entrou... na sinagoga‟, embora significando imediatamente o material ingresso de Jesus e dos seus conterrâneos na „casa da reunião‟ (synagoghé), contém subtendida a noção de reunião teológica; de modo que, parafraseando, poderíamos dizer que naquele dia Jesus e os nazarenos se constituíram „em Sinagoga‟, ou seja, em Igreja.13
Como já foi mencionado anteriormente, Jesus aqui é o leitor. Pela prática sinagogal, ele deve ter sido convidado pelo chefe da sinagoga, primeiro a ler e, em seguida, a tomar a palavra. Fora convidado pelo chefe da sinagoga, pois este é que é o encarregado de presidir à celebração, de cuidar de seu desenvolvimento e de escolher os leitores e os que farão o aprofundamento do assunto. 11
BÍBLIA, 2004. Cf. GIRAUDO, 2008, p. 80-81. 13 GIRAUDO, loc. cit. 12
16 Neste trecho do Evangelho também nos deparamos com a dignidade do livro sagrado. Nos versículos dezessete e vinte, o evangelista enfatiza os gestos de entrega, de desenrolamento e enrolamento do livro.
Com este gesto, Jesus
encontrou o local onde a passagem estava escrita. No versículo vinte e um, há uma espécie de homilia. Lucas menciona somente uma frase. Mas, provavelmente, o evangelista mostra o ponto central da mensagem, a síntese do que quer anunciar. Jesus, ao ler a Palavra, ao emprestar a sua boca a Deus, está atualizando a Palavra, colocando em condição de ser proclamada ao povo reunido. Jesus proclama que a profecia acaba de se cumprir em sua pessoa, procurando, assim, centrar sua mensagem no ano da graça do Senhor. Não faz referência a vinganças e castigos contra o império. No último versículo desta perícope aparecem os verbos testemunhar e admirar. Com o termo „testemunhas‟, vê-se que o evangelista mostra toda a convicção que está numa testemunha, alguém que confere veracidade a um fato, a uma realidade. E o termo „admiravam-se‟, mostra a reação “paralítica” de quem está diante da revelação divina14.
1.3.
Do Novo Testamento – Lucas 24,13-27
[13] Eis que dois deles viajavam nesse mesmo dia para um povoado chamado Emaús, a sessenta estádios de Jerusalém; [14] e conversavam sobre todos esses acontecimentos. [15] Ora, enquanto conversavam e discutiam entre si, o próprio Jesus aproximou-se e pôs-se a caminhar com eles; [16] seus olhos, porém estavam impedidos de reconhecê-lo. [17] Ele lhes disse: Que palavras são essas que trocais enquanto ides caminhando? E eles pararam, com o rosto sombrio. [18] Um deles, chamado Cléofas, lhe perguntou: Tu és o único forasteiro em Jerusalém que ignora os fatos que nela aconteceram nestes dias? [19] – Quais?, disse-lhes ele. Responderam: O que aconteceu a Jesus, o Nazareno, que foi profeta poderoso em obras e em palavras, diante de Deus e diante de todo o povo: [20] como nossos sumos sacerdotes e nossos chefes o entregaram para ser condenado à morte e o crucificaram. [21] Nós esperávamos que fosse ele quem redimiria Israel; mas, com tudo isso, faz três dias que todas essas coisas aconteceram! [22] É verdade que algumas mulheres, que são dos nossos, nos assustaram. Tendo ido muito cedo ao túmulo [23] e não tendo encontrado o corpo, voltaram dizendo que haviam tido uma visão de 14
Cf. GIRAUDO, 2008, p. 84.
17 anjos a declararem que ele está vivo. [24] Alguns dos nossos foram ao túmulo e encontraram as coisas tais como as mulheres haviam dito, mas não o viram! [25] Ele, então, lhes disse: Insensatos e lentos de coração para crer tudo o que os profetas anunciaram! [26] Não era preciso que o Cristo sofresse tudo isso e entrasse em sua glória? [27] E, começando por Moisés e percorrendo todos os Profetas, interpretou-lhes em todas as Escrituras o que a ele dizia respeito (...).15
Lucas descreve este episódio, para que os discípulos saibam o caminho que devem fazer para reconhecer a presença de Jesus na história. Ao ler esta perícope lucana, Discípulos de Emaús, contemplamos a estrutura básica da Missa (Liturgia da Palavra e Liturgia Eucarística). No que se refere à Liturgia da Palavra, a partir do versículo vinte e cinco Jesus interroga os discípulos, dizendo que não creram no que os profetas anunciaram. E começa, no versículo vinte e sete, a falar sobre as Escrituras, percorrendo o Antigo Testamento e interpretando-as. O versículo sobre a passagem pelas Escrituras remete às leituras; sobre a interpretação das Escrituras, à homilia, uma interpretação da Palavra na Missa. Esta perícope faz lembrar a Sacrosanctum Concilium quando diz: “presente está o Cristo pela sua Palavra, pois é ele mesmo que fala quando se leem as sagradas Escrituras na Igreja”16.
15
BÍBLIA, 2004. CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. Constituição Sacrosanctum Concilium: Sobre a Sagrada Liturgia. In: Documentos Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965). São Paulo: Paulus, 1997. n.7. 16
2. A LITURGIA DA PALAVRA NO PROCESSO HISTÓRICO
2.1. Igreja Primitiva I-VI
No início da Igreja Primitiva, a celebração da Palavra foi separada da Celebração Eucarística, mas depois aconteceu o vínculo.
A comunidade primitiva deve ter modelado esta celebração da palavra logo mais no sentido de um rito cristão independente, em reuniões próprias dentro dos pórticos do templo e, depois da ruptura introduzida pela perseguição no ano 44, separado de lá. Aos poucos, este rito se ligou, como celebração da palavra, com a Celebração Eucarística17.
Justino, em sua Apologia, trata da eucaristia dominical. Ele descreve a estrutura desenvolvida na Liturgia da Palavra, com cantos, leituras, exortações e preces.
No dia que se chama do sol, celebra-se uma reunião de todos os que moram nas cidades ou nos campos, e aí se leem, enquanto o tempo o permite, as Memórias dos apóstolos ou os escritos dos profetas. Quando o leitor termina, o presidente faz uma exortação e convite para imitarmos esses belos exemplos. Em seguida, levantamo-nos todos juntos e elevamos nossas preces. [...] Celebramos essa reunião geral no dia do sol, porque foi o primeiro dia em que Deus, transformando as trevas e a matéria, fez o mundo, e também o dia em que Jesus Cristo, nosso Salvador, ressuscitou dos mortos. Com efeito, sabe-se que o crucificaram um dia antes do dia de Saturno, e no dia seguinte ao de Saturno, que é o dia do Sol, ele apareceu a seus apóstolos e discípulos, e nos ensinou essas mesmas doutrinas que estamos expondo para vosso exame18.
17 18
84.
JUNGMANN, J.A. Missarum Sollemnia. São Paulo: Paulus, 2009. p.37. JUSTINO DE ROMA. I e II Apologias, Diálogo com Tristão. São Paulo: Paulus, 1997, p.83-
19 Na origem da liturgia cristã, o livro litúrgico não existia, a não ser as Sagradas Escrituras do Antigo Testamento, e posteriormente do Novo Testamento. Os textos eram escritos em rolos ou fragmentos de papiro.
Supõe-se que a leitura era feita empregando o mesmo ritual da sinagoga judaica. O encarregado entregava o volume ao leitor, o qual lia o texto sagrado começando no ponto onde havia sido interrompida a leitura na reunião anterior. Esse procedimento é conhecido como leitura continuada, e pode-se supor que foi seguido também na leitura dos Evangelhos e das cartas dos apóstolos19.
Todas as leituras eram proclamadas por leigos, até mesmo o Evangelho. Esses leigos leitores, durante a perseguição à Igreja, guardavam as Sagradas Escrituras, pois, nestes tempos de perseguição, os livros eram confiscados.
[...] os leitores guardavam os Lecionários de então, em suas casas, e muitos deles pagaram com a vida esse serviço prestado à comunidade a que pertenciam, enquanto outros, talvez menos corajosos, perante o número e a força das autoridades judiciais que lhes entravam, de repente, pelo porta dentro, nada mais podiam fazer do que entregar os Códices ou Escrituras que tinham em seu poder20.
Hipólito de Roma e Atanásio falam sobre a leitura dos salmos. “Segundo a Ordem da Ágape de Hipólito de Roma, os fiéis devem dizer „aleluia‟ quando, no início da ágape, são lidos os salmos. [...] Atanásio manda em determinada ocasião o diácono ler um salmo diante do povo reunido [...]”21. No séc. IV, os salmos estão inseridos no contexto da Liturgia da Palavra. “[...] Encontramos o canto dos salmos explicitamente atestado também na celebração das leituras na Liturgia da Palavra, a saber, no modo responsorial, que era o costume geral. O aleluia ganha uma especial importância”22. Mas é com as homilias de Santo Agostinho que conhecemos o canto responsorial dos salmos. “Ele menciona o salmo que escutamos ser cantado e ao 19
SECRETARIADO NACIONAL DE LITURGIA. O livro do leitor. Fátima/Portugal: Secretariado Nacional de Liturgia, 2007. p.30. 20 Ibid., p.201. 21 JUNGMANN, 2009, p. 413. 22 Ibid., p.414.
20 qual respondemos. [...] O refrão da comunidade parece ter abrangido sempre um versículo inteiro do respectivo salmo”23. Na Igreja primitiva era conhecida a exposição do Evangeliário.
o Evangeliário e o corpo de Cristo eram os únicos que gozavam desse privilégio, costume conservado até hoje pela Igreja grega. Nos concílios, como em Éfeso em 431, o Evangeliário era colocado num trono como para significar a presença de Cristo presidindo à sua Igreja24.
Este livro dos Evangelhos era feito com maior decoro.
Desde os séculos V-VI, certos livros são escritos em letras de ouro sobre pergaminhos de cor púrpura. É nos Evangeliários que a arte da iluminatura atinge o ápice do seu esplendor. As capas são surpreendentemente suntuosas. [...] é com razão, dizia Ruperto de Deutz (+1129/1130), que os livros dos Evangelhos são decorados com ouro, prata e pedras preciosas. Com efeito, neles resplandece o ouro da sabedoria celeste, brilha a prata da eloquência da fé, cintilam as pedras preciosas dos milagres operados pelas mãos de Cristo25.
A partir do século IV são realizadas leituras, mas a última é sempre o Evangelho. “Na igreja Antioquena [...] usava-se, como antigamente na sinagoga, uma leitura da Lei e uma dos Profetas, e a estas seguiam-se ainda uma leitura das Cartas dos Apóstolos e uma dos Evangelhos”26. E assim começam a surgir os primeiros indícios de uma ordem fixa das leituras, que podem ser observadas
nas homilias de santo Ambrósio de Milão (340-397), santo Agostinho (354-430), são Cesário de Arles (470-543) e de outros Padres. As listas de perícopes bíblicas com o começo e o final das leituras, seguindo o calendário litúrgico, eram chamadas capitularia lectionum – as leituras não evangélicas; capitularia evangeliorum – os
23 24
p.39
25
JUNGMANN, 2009, p. 414. DEISS, L. A Missa da comunidade cristã. Porto/Portugal: Editorial Perpétuo Socorro, 1998.
CELAM (Conselho Episcopal Latino-Americano). Manual de Liturgia 2 - A celebração do mistério pascal: fundamentos teológicos e elementos constitutivos. São Paulo: Paulus, 2005b. p.134. 26 JUNGMANN, 2009, p.388.
21 Evangelhos, e cotationes epistolarum et evangeliorum – ambas as séries de textos27.
Na liturgia romana provavelmente chegaram a ser proclamadas três leituras, “[...] a saber, de tal modo, pelo menos parcialmente, que uma leitura veterotestamentária se encontrava ao lado de duas neotestamentárias. Mais tarde, a leitura veterotestamentária desapareceu do plano fixo da liturgia da missa”28. Sobre a homilia, existem várias vertentes da prática. Há indícios de que no século IV,
em concelebrações, cada um dos celebrantes podia fazer seu comentário sobre as leituras bíblicas, cabendo ao bispo ser o último a falar. No entanto, em Alexandria, por causa dos desvarios teológicos de Ário, ou mesmo na África do Norte até Santo Agostinho, era vedada aos sacerdotes a pregação. O mesmo aconteceu em Roma e em outros lugares durante muito tempo. Pregações de Padres da Igreja, bispos ou simples sacerdotes constituem uma riqueza teológica de insuspeitada beleza e grandeza29.
E também haviam lugares em que os sacerdotes eram proibidos de realizar a prática da homilia, por exemplo em Alexandria e no Norte da África 30. Mas Santo Agostinho teve autorização para tal prática. “[...] as barreiras foram transpostas apenas no tempo de Santo Agostinho, que pessoalmente também já podia pregar enquanto sacerdote”31. Somente o bispo poderia fazer a pregação diante da comunidade, deixando clara a exaltação da figura do bispo como autoridade doutrinal. Mas depois os presbíteros também começaram a receber a autorização para pregar.
Se os tempos primitivos do cristianismo reservaram frequentemente a homilia diante da comunidade reunida para o bispo, isso expressava a autoridade doutrinal dele. [...] Na Gália, [...] o concílio de Vaison (529), estimulado por São Cesário, atribuiu o direito de 27
JUNGMANN, 2009, p.389. JUNGMANN, loc. cit. 29 LIBANIO, J. B. Como saborear a Celebração Eucarística? São Paulo: Paulus, 2008. p.52. 30 Cf. JUNGMANN, 2009, p.445. 31 JUNGMANN, loc. cit. 28
22 pregar explicitamente aos presbíteros da cidade e do campo; se o presbítero estivesse impedido, por exemplo, por doença, diáconos deviam ler das homilias dos Padres da Igreja32.
A oração dos fiéis era celebrada duplamente: “uma se fazia logo depois das leituras e homilia, antes, portanto, do Credo, de que os catecúmenos participavam e eram eles mesmos objetos dela. Depois eles recebiam a bênção e eram despedidos. Após sua saída, se faziam outras orações dos fiéis próprias para serem rezadas por cristãos”33. São Clemente de Roma utilizava, como oração dos fiéis, uma oração de intercessão.
„Salva entre nós os oprimidos. Levanta os caídos. Mostra-te aos que rezam. Cura os fracos. Liberta os nossos presos. Consola os pusilânimes. Conheçam-te todos os povos... Pois tu, Senhor dos seus, Rei dos séculos, dás aos filhos dos homens glória, honra e poder sobre o que existe na terra. Tu, Senhor, diriges sua vontade no sentido do que é bom e agradável aos teus olhos em tua presença, a fim de que exerçam a autoridade que lhes destes na paz e mansidão, e obtenham tua graça‟34.
A partir do século III, na liturgia romana conhecemos uma forma de oração dos fiéis parecida com a utilizada hoje na sexta-feira santa.
Rezamos nesta ocasião pela santa Igreja, pelo papa, pelo clero, pelos leigos, pelos que não creem no Cristo, pelos que não creem em Deus, pelos poderes públicos e por todos os que sofrem provações. Cada vez propõe-se primeiro a intenção; depois de um silêncio, que dá tempo para a oração particular, o presidente profere a oração em nome de todos. Finalmente a assembleia aclama com o Amém35.
Em Agostinho percebemos a prática da oração dos fiéis. “[...] um grande número de homilias termina com a fórmula: Conversi ad Dominum, ou seja, também
32
JUNGMANN, 2009, p.445-446. LIBANIO, 2008, p.71. 34 LUTZ, G. Liturgia ontem e hoje. São Paulo: Paulus, 1995. p.35. 35 Ibid., p.35-36. 33
23 aqui segue à homilia uma oração comunitária, durante a qual as pessoas se voltavam, como sempre quando a comunidade rezava, para o leste”36. Infelizmente, a partir do século VI, a oração dos fiéis praticamente desapareceu. Assim, na missa, até antes da reforma do Concílio Vaticano II, “terminado o credo, o sacerdote saudava o povo com Dominus vobiscum e dizia simplesmente oremus, rezando em voz baixa a antífona do ofertório, que era um texto bíblico, para logo em seguida fazer as ofertas do pão e do vinho”37.
2.2.
Igreja Medieval VI-XV
Os lecionários propriamente ditos aparecem a partir do século VIII e receberam diversos nomes: “Comes, Apostulus, Epistolare, Evangelium excerptum, Evangeliare, Comes Epistulae cum Evangeliis e Lectionarium”38. Com os estudos das homilias de Agostinho e de outros Padres da Igreja, foi possível
reconstituir as leituras que se faziam nas diferentes igrejas. A procura da passagem certa nem sempre era fácil para o leitor. E por vezes havia enganos. Foi principalmente para facilitar o ministério dos leitores que começaram a surgir livros com o texto completo das leituras, dispostas pela ordem do calendário e do ano litúrgico. Isto aconteceu a partir do ano 700. Tinha nascido o lecionário39.
Mas, no século XI, os lecionários, em si, deixariam de existir. Nesta época aparecem os missais plenários, que continham a totalidade dos textos necessários para a Celebração Eucarística. Os lecionários deixaram de existir como livros independentes, embora se tenha conservado o costume de usar o Epistolário e o Evangeliário para a missa solene. O Evangeliário era mais ricamente ornado, com encadernações de capa de ouro, prata ou marfim: era, por assim dizer, o tabernáculo da Palavra. “Em 1379, 36
JUNGMANN, 2009, p.466. LIBANIO, 2008, p.71. 38 SECRETARIADO NACIONAL DE LITURGIA, 2007, p.194. 39 SECRETARIADO NACIONAL DE LITURGIA, loc. cit. 37
24 Carlos V ofereceu um Evangeliário de ouro, do século X-XI, em que brilhavam 35 safiras, 24 rubis, 30 esmeraldas e 104 pérolas”40. Retornando ao século VIII, percebe-se que “todo o clero venerava o Evangeliário, beijando-o. Nalgumas comunidades (coptas e etíopes), é toda a comunidade que beija o livro. Tal como nós costumamos fazer com a cruz de Cristo, na Sexta-feira Santa”41. Sobre a prática da recitação do salmo responsorial, no século VII,
depois da epístola, os cantores subiam ao ambão, primeiro aquele que entoava o responsório, e depois o segundo, que entoava o Aleluia. [...] Eles ficavam como que elos autônomos entre as leituras, como um momento de meditação devota, como um alegre cantar e jubilar depois de a Palavra de Deus ter atingido o ouvido humano42.
Neste período, a homilia entrou em decadência.
Durante algum tempo, ficou restrita aos bispos, tanto para garantirlhes o poder doutrinal, quanto pela falta de preparo dos sacerdotes. Em outros momentos, o descuido pela pregação cresceu, afetando até os bispos que já não pregavam. Houve um ressurgimento da pregação por obra e graça dos frades mendicantes [...]43.
Infelizmente, este forte retrocesso do anúncio da Palavra na homilia é perceptível. A homilia saiu do uso de algumas comunidades eclesiásticas. Sobre a profissão de fé, percebe-se que foi tardiamente introduzida na liturgia romana.
No século XI (1041), o Imperador Henrique II, fazendo-se coroar em Roma pelo Papa Bento VIII, estranhou que na Igreja de Roma não se proclamasse o Credo, como nas igrejas do norte da Europa e da Espanha. O papa lhe respondeu que não havia necessidade, pois não havia em Roma o problema das heresias. No entanto, diante deste estranhamento do imperador, aos poucos o Credo foi sendo
40
DEISS, 1998, p.42. DEISS, loc. cit. 42 JUNGMANN, 2009, p.422. 43 LIBANIO, 2008, p.53. 41
25 introduzido também no rito romano da Missa, mas apenas aos domingos e solenidades maiores44.
Neste período, algumas regiões sentiram falta da oração dos fiéis, como ao norte dos Alpes. Por causa disso, “foram criadas várias formas de oração de intercessão depois da homilia, que substituíram a antiga oração dos fiéis. Estas formas sobreviveram, em parte, até o tempo do movimento litúrgico em nosso século”45.
2.3.
Igreja Moderna XVI-XX
Neste período da Igreja, “o rito da missa encontra pouco interesse, sendo ele apenas o quadro para o Santíssimo. A Missa é algo em si, ao redor do qual se encontram o sermão e a comunhão”46. Começam a aparecer elementos periféricos, e secundários, fazendo com que a Palavra de Deus fique ofuscada e não ressaltada. Com a Reforma de Trento ficou ressaltada a rigidez litúrgica e o devocionalismo. Sobre as leituras, nesta época existiam três: uma leitura, retirada geralmente do Novo Testamento, o gradual, e o Evangelho. Acontece também uma diluição do caráter homilético da pregação. E este acaba deixando o contexto da Missa, ficando somente no sermão. “O Concílio de Trento impôs a obrigação aos párocos e bispos de pregarem aos domingos e dias de festa”47. Neste período continua a não existência da oração dos fiéis, aparecendo depois da pregação uma oração do Pai-Nosso ou uma Ave-Maria. Mas, no séc. XX, o Movimento Litúrgico conseguiu uma renovação da oração dos fiéis segundo seu sentido e plano das origens.
44
BECKHEUSER, A. Celebrar Bem. Petrópolis: Vozes, 2010. p.141. LUTZ, 1995, p.36 46 LUTZ, G. História geral da liturgia: das origens até o Concílio Vaticano II. São Paulo: Paulus, 2010. p.57-58. 47 LIBANIO, 2008, p.53. 45
26 Uma primeira tentativa de formular uma nova Oração Universal da Igreja que varia de acordo com os tempos litúrgicos e as preocupações, orientada na forma de litania („ouvi-nos, Senhor!‟) e inspirada nas leis formais da ectenia, encontra-se nos esboços de J. Gulden48.
2.4.
Concílio Vaticano II
O Concílio Vaticano II, inspirado por algumas iniciativas do Movimento Litúrgico, trouxe grandes renovações à liturgia, e, em especial, à Liturgia da Palavra, renovações estas que podemos considerar um retorno às fontes. A Constituição Sacrosanctum Concilium traz algumas recomendações em relação à oração dos fiéis49, à homilia50, e sobre a seleção das leituras. No que diz respeito à seleção das leituras, o documento menciona “para que a mesa da Palavra de Deus seja preparada, com a maior abundância, para os fiéis, abram-se largamente os tesouros da Bíblia, de modo que, dentro de certo número de anos, sejam lidas ao povo as partes mais importantes da Sagrada Escritura”51. A reforma litúrgica do Vaticano II realizou a separação do lecionário e do missal, recomendando a edição e utilização do Evangeliário. Também foi restaurado o salmo responsorial. Assim, este Concílio resgatou a veneração pelas sagradas Escrituras. “A Igreja sempre venerou as divinas Escrituras como fez também para o próprio Corpo do Senhor, ela que não cessa, sobretudo na santa Liturgia, de tomar o pão da vida na mesa da Palavra e na do Corpo de Cristo para oferecê-lo aos fiéis”52.
48
JUNGMANN, 2009, p.475. Cf. p.54. 50 A homilia é reintroduzida na prática da Igreja, deixando o chamado „sermão‟. Cf. p.54. 51 CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. Constituição Sacrosanctum Concilium: Sobre a Sagrada Liturgia. In: Documentos Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965). São Paulo: Paulus, 1997.n.51. 52 CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. Constituição Dogmática Dei Verbum: Sobre a Revelação Divina. In: Documentos Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965). São Paulo: Paulus, 1997. n.21. 49
3. O LEITOR E OS LIVROS
Neste presente capítulo iremos tratar sobre quem é o leitor, qual sua função e os livros que são utilizados para o anúncio da Palavra.
3.1. O Leitor
A Igreja possui o ministério instituído do leitor. E a este deve ser dada importância.
Os que foram instituídos como leitores, se os houver, devem exercer sua função própria, pelo menos nos domingos e festas, durante a missa principal. Além disso, pode-se confiar a eles o encargo de ajudar na organização da Liturgia da Palavra, e de cuidar, se for necessário, da preparação de outros fiéis que, por designação temporânea, devem fazer as Leituras na celebração da missa53.
Esta instituição é conferida somente aos homens. Buyst lamenta que
as mulheres estão excluídas desta instituição. Talvez seja por isso que, na pastoral, esta instituição é praticamente inexistente. Ficamos com os leitores e leitoras „reconhecidos(as)‟, que assumem o ministério sem titulo oficial especial. Atuam por conta de seu sacerdócio batismal54.
53
ELENCO das leituras da missa. Restaurado por decreto do Sagrado Concílio Ecumênico Vaticano II e promulgado pela autoridade do Papa Paulo VI. Trad. Portuguesa da segunda edição típica para o Brasil realizada e publicada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e aprovada pela Sé Apostólica. São Paulo: Paulus, 1997. n.51. 54 BUYST, I. A Palavra de Deus na liturgia. São Paulo: Paulinas, 2001. p.12-13.
28 Como já lembra Buyst, nossas igrejas possuem os leitores reconhecidos. E o Elenco das Leituras da Missa nos diz que “a assembleia litúrgica precisa ter leitores, ainda que não tenham sido instituídos para esta função. Por isso, é preciso procurar que haja alguns leigos, os mais aptos, que estejam preparados para desempenhar este ministério”55. O leitor não possui o monopólio da Palavra. É toda a comunidade que possui o tesouro e que o partilha. “Conforme a antiga tradição da liturgia sinagogal, a Leitura da Palavra era assegurada por três leitores nas celebrações ordinárias, e até por sete leitores nos dias de sábado e de festas”56. O ministério do leitor não é um serviço qualquer, é um serviço da Palavra de Deus em benefício da comunidade celebrante. Tomando aqueles que estiverem aptos para a função, se for um homem, que se tome esse homem; se for uma mulher, que se tome essa mulher; e se for um menino ou uma menina, que se tome esse menino ou essa menina57. O leitor desempenha um verdadeiro serviço litúrgico.
Os leitores não estão aí para ajudar o padre, como muitos continuam pensando. Assumem um ministério próprio. Atuam a partir de seu sacerdócio de batizados. Não trabalham por conta própria, mas como representantes de Cristo, animados por seu Espírito. (...) Estão aí não para exercer um poder sobre a comunidade ou para aparecer. Ao contrário, trata-se de um serviço comunitário, eclesial. São chamados a prestar um serviço aos irmãos e irmãs reunidos em assembleia58.
O leitor anuncia a Palavra em nome de quem um dia a pronunciou suscitando vida nova. Deve tornar presente Jesus Cristo, sendo profeta e pregador deste anúncio da Boa Nova aos irmãos e irmãs que escutam sua Palavra e louvam o Pai. A proclamação da Palavra na assembleia litúrgica é sempre uma realidade densa da presença atual do Ressuscitado. É Cristo vivo que, pela voz do leitor,
55
ELENCO, 1997, n.52. DEISS, L. A Palavra de Deus Celebrada. Teologia da Celebração da Palavra de Deus. Petrópolis: Vozes, 1996. p.127. 57 Cf. Ibid., p.126. 58 BUYST, 2001, p.13. 56
29 convida os ouvintes a viver o memorial de sua vida, morte e ressurreição, com vistas à conversão e à salvação. A questão dos leitores, no pós-Vaticano II, de início foi discriminatória.
A primeira edição do novo missal, em 1969, só permitia que as mulheres lessem, com a autorização das conferências episcopais, se não houvesse um homem apto a exercer a função de leitor [mesmo o leitor reconhecido]. Parece que se preferia antes um mau leitor do que uma mulher lendo com clareza59.
Para a proclamação das leituras é inconcebível a falta de entusiasmo, de autoconsciência, de uma convicção que proceda do coração. O leitor não pode ter a postura de um leitor de jornal. Se ele não transmite vibração nem convicção à assembleia, dá mostras de um desempenho deficiente de seu ministério. Por isso,
[...] seu rosto, sua voz, sua postura e tudo nele deve expressar essa feliz novidade. Quando a palavra é proclamada com os sentimentos que correspondem à sua mensagem (alegria, esperança, tristeza, ameaça), abre-se o caminho para a compreensão e a vivência do mistério anunciado60.
O leitor proclama, anuncia a Palavra de Deus à assembleia. Transforma a palavra escrita em palavra viva acolhida pelo ouvido e pelo coração da comunidade. “Por isso, mais do que leitor, essa pessoa deveria denominar-se „pregador da Palavra de Deus à comunidade‟”61. Assim, mesmo as leituras devem ter entonação de proclamação. Proclamar é diferente de ler.
Fazer a Leitura significa ir lá na frente, ler o que está escrito, para informação minha e da comunidade. Ou, no pior dos casos, é apenas uma formalidade: celebração supõe Leitura, alguém deve fazê-la; 59
DEISS, 1996, p.126. CELAM (Conselho Episcopal Latino-Americano). Manual de Liturgia 2 - A celebração do mistério pascal: fundamentos teológicos e elementos constitutivos. São Paulo: Paulus, 2005b. p.174. 61 Ibid., p.172. 60
30 pouco importa se os presentes entenderam o que foi dito ou se foram atingidos pelo que ouviram. Proclamar a Palavra é um gesto sacramental. Coloco-me a serviço de Jesus Cristo que, através da minha Leitura, da minha voz, da minha comunicação... quer falar pessoalmente com seu povo reunido62.
O leitor raramente executa sua função com perfeição. Para fazer uma perfeita execução, o leitor deve se preparar. Pois, “trata-se de proclamar a Palavra de Deus à comunidade celebrante de maneira plenamente inteligível, com clareza e sabedoria. (...) A voz do leitor é a clara voz do Cristo que devemos escutar”63. A Sacrosanctum Concilium diz que é Cristo que fala enquanto se leem na igreja as Escrituras Sagradas64. A preparação do leitor deve ser espiritual e técnica.
A preparação espiritual supõe pelo menos dupla instrução: bíblica e litúrgica. A instrução bíblica deve encaminhar-se no sentido de que os leitores possam compreender as Leituras em seu contexto próprio e entender à luz da fé o núcleo central da mensagem revelada. A instrução litúrgica deve facilitar aos leitores certa percepção do sentido e da estrutura da Liturgia da Palavra e a relação entre a Liturgia da Palavra e a liturgia eucarística. A preparação técnica deve capacitar os leitores para que se tornem sempre mais aptos na arte de ler diante do povo, seja de viva voz, seja com a ajuda de instrumentos modernos para a amplificação vocal65.
O leitor deve ler e meditar a Leitura em casa, durante a semana, para poder ser um bom anunciador da Palavra. Ele deverá „desaparecer‟ diante do Cristo que pega emprestada sua voz. Ele, enquanto proclama a Palavra, presta atenção, com toda a comunidade, para tentar perceber o que o Espírito está querendo dizer à Igreja naquele dia. Então, é necessário que o leitor entenda aquilo que está lendo. Devendo saber sobre o texto em si, seu contexto, a circunstância em que foi escrito, a quem foi dirigido, a quem está falando e qual seu objetivo. Também saber o sentido do 62
BUYST, 2001, p.14-15. DEISS, 1996, p.124. 64 Cf. CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. Constituição Sacrosanctum Concilium: Sobre a Sagrada Liturgia. In: Documentos Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965). São Paulo: Paulus, 1997. n.7. 65 ELENCO, 1997, n.55. 63
31 texto no conjunto da revelação de Jesus Cristo, para que o texto possa se tornar uma Palavra de salvação para nós. O leitor que não entende o que lê, transmitirá dúvida. Somente o leitor que entende o que lê, fará um verdadeiro anúncio da Palavra. Na preparação pessoal, a lectio divina66 pode ser um bom método de preparação para a Leitura. O leitor não deve fazer sucessivamente a primeira leitura, depois o, com sua própria voz, renova-se a atenção da comunidade. Salienta-se também a especificidade de cada leitura. Também o leitor não deve dizer „Primeira leitura‟ ou „Segunda leitura‟, muito menos ler com pressa. E não deve falar „Palavras do Senhor‟ ou „Palavras da Salvação‟, pois Cristo é a única Palavra do Pai, é a „Palavra do Senhor‟, a „Palavra da Salvação‟.
3.2. Os Livros
O Concílio Vaticano II promoveu o reaparecimento dos livros litúrgicos, e entre eles estão o Lecionário e o Evangeliário. Esses dois livros lembram aos fiéis a presença de Deus que fala a seu povo. Portanto, “é preciso procurar que os próprios livros, que são sinais e símbolos das realidades do alto na ação litúrgica, sejam verdadeiramente dignos, decorosos e belos”67. Para a Liturgia da Palavra, especificamente, existem alguns livros litúrgicos: Lecionário, Evangeliário, e algumas Conferências Episcopais, por exemplo Portugal, possuem o livro da oração dos fiéis. Mas, neste, iremos tratar dos livros comuns em todas as Conferências Episcopais: o Lecionário e o Evangeliário.
66
A lectio divina é um método de oração com a Sagrada Escritura. “É um empenho de assiduidade com as sagradas Escrituras que a contém: assiduidade feita da leitura [bíblica] (lectio), de profunda reflexão do texto (meditatio), de oração (oratio), de experiência diária vivida sob o juízo da palavra de Deus (contemplatio)” (BIANCHI, E. Presbíteros: Palavra e Liturgia. São Paulo: Paulus, 2010. p.44-45). 67 ELENCO, 1997, n.35.
32 3.2.1. Lecionário
O lecionário é o livro litúrgico que contém os textos da Sagrada Escritura que são selecionados e organizados para serem proclamados nas celebrações litúrgicas.
[...] É fruto da seleção e organização dos textos bíblicos destinados às celebrações, e reflete a exigência de que cada Igreja tome em mãos a palavra divina para meditá-la, proclamá-la e vivê-la segundo a própria sensibilidade espiritual e histórica. [...] [Ele] aparece como um sinal da interpretação e do aprofundamento perene que a Igreja faz da Palavra em cada tempo e lugar, guiada pela luz do Espirito Santo68.
O lecionário é muito mais que um livro, é o modo, habitual e próprio, segundo o qual a Igreja lê nas Escrituras a Palavra viva de Deus, seguindo os diferentes fatos e palavras de salvação realizados por Cristo e, ordenados ao redor desses atos e palavras, os demais conteúdos da Bíblia. Respondendo à necessidade de proclamar os fatos e palavras de Cristo segundo os Evangelhos, e de reorganizar, ao redor dele, o restante das Escrituras. Deve-se conhecer o lecionário para compreender aquilo que a Igreja celebra e aquilo que ela vive. Para haver uma concordância de textos durante as celebrações litúrgicas, fez-se necessária uma seleção minuciosa. A introdução ao Elenco das Leituras da Missa destaca que a sucessão de Leituras está disposta da seguinte forma:
nos domingos e festas propõem-se os textos mais importantes, para que, num conveniente espaço de tempo, possam ser lidas diante da assembleia dos fiéis as partes mais relevantes da Palavra de Deus. A outra série de textos da Sagrada Escritura, que de certa forma completa o anúncio da salvação desenvolvido nos dias festivos, assinala-se para os dias da semana. [...] A ordem das Leituras dominical-festiva desenvolve-se num triênio, ao posso que a dos dias de semana o faz num biênio. Por isso, a ordem das Leituras dominical-festiva procede de maneira independente da dos dias de semana, e vice-versa69.
68 69
CELAM, 2005b, p.175-176. ELENCO, 1997, n.65.
33 Em relação às celebrações dos santos, e para missas rituais, ou votivas, ou dos defuntos, a seleção é de acordo com os próprios rituais70. Quanto às divisões, o lecionário se divide, em geral, por „gênero‟. No lecionário dominical constam as Leituras dos Domingos e Solenidades que são anunciadas neste dia. O ferial é o lecionário que se utiliza durante a semana. O santoral contém as Leituras que estão de acordo com a vida de cada santo, mártir71. Sobre a distribuição das Leituras nos domingos e festas, são três Leituras:
A primeira, do Antigo Testamento, a segunda, do Apóstolo (isto é, das Epístolas dos Apóstolos ou do Apocalipse, segundo os diversos tempos do ano), a terceira, do Evangelho. Com esta distribuição sublinha-se a unidade do Antigo e do Novo Testamento, e da História da salvação, cujo centro é Cristo e seu mistério pascal que celebramos72.
É importante mencionar que, nos domingos e festas, as Leituras somente se repetirão depois de três anos, pois, como já foi mencionado, elas seguem um esquema de triênio. Entre a Leitura do Antigo Testamento e do Novo, existe uma composição harmônica, principalmente nos casos que os ensinamentos e fatos expostos nos textos do Novo Testamento têm uma relação mais ou menos explícita com os ensinamentos e fatos do Antigo Testamento. “No presente Elenco das Leituras da Missa, os textos do Antigo Testamento foram selecionados principalmente por sua congruência com os textos do Novo Testamento, especialmente com o Evangelho que se lê na mesma missa”73. Os textos das Leituras, em alguns tempos, também possuem princípios, características temáticas quanto ao tempo litúrgico, para levar o fiel a conhecer mais profundamente a fé que professam e a história da salvação. Por exemplo, no tempo do Advento, da Quaresma e da Páscoa. Nos domingos do Tempo Comum, que não são Solenidades e nem Festas, as Leituras das Cartas e do Evangelho se distribuem
70
Cf. ELENCO, 1997, n.65. Cf. Ibid., n.113-118. 72 ELENCO, 1997, n.66. 73 Ibid., n.67. 71
34 segundo a ordem da Leitura semi-contínua, e o texto da Leitura do Antigo Testamento está em harmonia com o Evangelho74. Nos dias de semana, cada missa (ferial) possui duas Leituras. A primeira é do Antigo Testamento ou do Apóstolo, exceto no Tempo Pascal, quando é retirada dos Atos dos Apóstolos. E a segunda Leitura é o Evangelho. No Tempo Comum, as Leituras variam em ano par e impar, e são semi-contínuas, mas o Evangelho não. Nos tempos do Advento, Quaresma e Páscoa, a Leitura e o Evangelho não possuem variação. Para a tradução, pede-se que seja em língua vernácula e que se conserve o uso tradicional dos nomes dos livros bíblicos, exceto em alguns casos especiais75. Assim, vendo os aspectos do lecionário, podemos concluir que os princípios diretivos da sua organização são: três Leituras nos domingos e festas: profeta, apóstolo e Evangelho; ciclo de três anos para o lecionário dominical e festivo, e de dois anos para o lecionário ferial do tempo durante o ano; independência e complementariedade do lecionário ferial em relação ao dominical; possibilidade de seleção de Leituras nas missas rituais, do comum dos santos, votivas, por diversas necessidades e de defuntos; conservação do uso tradicional de alguns livros da Escritura em determinados tempos litúrgicos; maior presença do Antigo Testamento; e podemos também mencionar a recuperação de alguns textos evangélicos ligados ao catecumenato.
3.2.2. Evangeliário
O Evangeliário é um livro distinto do lecionário. É o livro dos Evangelhos, que contém a vida e missão de Jesus Cristo. Nele estão contidos os Evangelhos dos Domingos e Solenidades. “Ele é depositado sobre o altar, bem no centro, onde serão colocadas, depois, os dons para o Sacrifício e a Ceia do Senhor”76.
74 75
n.122.
76
Cf. ELENCO, 1997, n.67. Cf. ELENCO, n.111ss. Sobre as exceções do uso tradicional do nome dos livros bíblicos: BECKHÄUSER, A. Celebrar Bem. Petrópolis: Vozes, 2010. p.132.
35 O livro dos Evangelhos era, e deve ser, adornado e deve haver uma veneração superior à do lecionário, pois nele consta a vida de Jesus. Assim, “entre os ritos da Liturgia da Palavra, é preciso levar em consideração a veneração especial devida à Leitura do Evangelho”77. A Leitura do Evangelho é o ápice da própria Liturgia da Palavra. É conveniente que, em nossos dias, nas catedrais, nas paróquias e igrejas maiores, haja um Evangeliário. Ele é conduzido em procissão: na procissão de entrada e durante a aclamação ao Evangelho78. O rito da entronização deve ser valorizado.
[...] Não tem mais sentido receber depois a Palavra de Deus, em rito introduzido, indevidamente, porque se tem a impressão de que ainda não se descobrira o sentido da entrada solene do Evangeliário. As comunidades que não possuem ou ainda não possuem o Evangeliário, podem usar dois lecionários, um que já está no ambão, do qual se fazem as leituras, e outro, que será levado em procissão de entrada e será colocado sobre o altar para a procissão até o ambão na hora da Proclamação do Evangelho. São, então, dois lecionários. Não é o ideal, mas ajuda a viver a autenticidade do rito.79
O diácono recebe este livro no dia de sua ordenação. E sobre a cabeça do bispo, em sua ordenação, é sustentado o livro dos Evangelhos, simbolizando que ele é o conhecedor e principal propagador do Evangelho. O Evangeliário deve ser levado na procissão de entrada por diácono ou leitor. Quando ele estiver sobre o altar, é recomendado que
seja tirado do altar por um diácono ou, se não houver diácono, por um sacerdote, e seja levado para o ambão, acompanhado pelos ministros que levam velas e incenso ou outros sinais de veneração, conforme o costume. Os fiéis estão de pé e veneram o livro dos Evangelhos com suas aclamações ao Senhor80.
O Evangeliário recebe vários gestos. Deve ser levado entre luzes, incensado, beijado, colocado sobre o altar, mostrado ao povo, revestido de capas
77
ELENCO, 1997, n.17. Cf. CNBB. Guia Litúrgico-Pastoral. Brasília: Edições CNBB, 2007. p.31. 79 BECKHÄUSER, 2010, p.132. 80 ELENCO, 1997, n.17. 78
36 preciosas. E seu lugar próprio é o ambão, de onde o ministro lê e proclama a Palavra.
4. A LITURGIA DA PALAVRA
A Liturgia da Palavra nasce da liturgia sinagogal da Palavra81.
A dinâmica teológica da páscoa judaica comportava, com efeito, um conjunto de ações rituais que aconteciam em lugares e tempos diversos. Primeiramente havia a ação propriamente sacrifical [...]. Seguia imediatamente a aspersão do sangue [...]. A manducação do cordeiro acontecia pela tardinha, no quadro de uma ceia doméstica que era precedida por uma ampla Liturgia da Palavra, feita de perguntas rituais, leituras bíblicas e exegeses homiléticas.82
Através da Liturgia da Palavra, Deus nos fala. Ele toma a iniciativa, chama, ilumina, guia, interroga, impele, forma seu povo com sua Palavra. Esta precisa ser escutada e seguida, suscitando uma reação, que é a salvação. A Palavra deve ser emitida (as leituras e a homilia), haver a recepção (os cantos e o silêncio) e a resposta (oração dos fiéis). As leituras tiradas da Sagrada Escritura, com os cânticos que se intercalam, constituem a parte principal da Liturgia da Palavra. Já a homilia, a profissão de fé e a oração dos fiéis desenvolvem e concluem esta liturgia. Baseando-se em Justino, Giraudo explica o quadro abaixo, dizendo: “[...] podemos identificar duas colunas-mestras estruturais. Elas são para a LITURGIA DA PALAVRA: a proclamação atualizante da Palavra de Deus (=leituras + homilia) e a resposta suplicante da comunidade (=preces dos fiéis).”83
81
Cf.: GIRAUDO, C. Num só corpo. Tratado mistagógico sobre a eucaristia. São Paulo: Loyola, 2003. p. 553. 82 Ibid., p. 187. 83 Ibid., p. 554.
38
(fonte: GIRAUDO, 2003. p. 553.)
Da primeira leitura até a homilia acontece um discurso descendente. Deus fala por meio do leitor, e a assembleia escuta, é o ouvido que escuta Deus falar. Na oração dos fiéis, os „papéis‟ se invertem: acontece um discurso ascendente. O povo fala e suplica a Deus, que escuta seu povo.
4.1.
Liturgia da Palavra parte por parte
Após a introdução dada no início deste capítulo, veremos agora a Liturgia da Palavra nas suas peculiaridades. Perpassaremos as leituras (primeira e segunda), o salmo responsorial, a aclamação ao Evangelho e sua proclamação, a homilia, a profissão de fé e a oração dos fiéis. Por último, analisaremos o aspecto do silêncio na Liturgia da Palavra, aspecto que é essencial para bem celebrar o mistério da Palavra.
4.1.1. Leituras
Nas leituras põe-se aos fiéis a mesa da Palavra de Deus e abrem-se os tesouros da Bíblia. Convém, por isso, observar uma disposição das leituras bíblicas que ilustre a unidade de ambos os Testamentos e da história da salvação; não é lícito substituir as leituras e o salmo
39 responsorial, que contêm a Palavra de Deus, por outros textos não bíblicos84.
É através da Palavra de Deus escrita que “Deus continua falando a seu povo, e mediante o uso constante da Sagrada Escritura, o povo de Deus se faz mais dócil ao Espírito Santo por meio da luz da fé e assim pode dar ao mundo, com sua vida e seus costumes, o testemunho de Cristo”85. Na Celebração Eucarística, as leituras devem ser proclamadas sempre do ambão. E a primeira pessoa a escutar a Palavra é o próprio presidente da celebração. As leituras estão dispostas86 de modo tal que durante três anos se passam as principais perícopes bíblicas. Elas não devem ser substituídas por outros textos não bíblicos.
A sucessão de leituras do “próprio do tempo” foi disposta da seguinte maneira: nos domingos e festas propõem-se os textos mais importantes, para que, num conveniente espaço de tempo, possam ser lidas diante da assembleia dos fiéis as partes mais relevantes da Palavra de Deus. A outra série de textos da Sagrada Escritura, que de certa forma completa o anúncio da salvação desenvolvido nos dias festivos, assinala-se para os dias da semana87.
Na liturgia dominical, a primeira leitura é retirada do Antigo Testamento, e a segunda das Epístolas dos Apóstolos ou do Apocalipse. Nos tempos litúrgicos diversos, são respeitados os temas provindos do próprio tempo. Procura-se fazer uma relação dos ensinamentos do Antigo com o Novo Testamento.
A melhor composição harmônica entre as leituras do Antigo e do Novo Testamento tem lugar quando a própria Escritura a insinua, isto é, naqueles casos em que os ensinamentos e fatos expostos nos 84
ALDAZÁBAL, J (com.). Instrução geral sobre o Missal Romano: terceira edição. São Paulo: Paulinas, 2007. n.57. 85 ELENCO das leituras da missa. Restaurado por decreto do Sagrado Concílio Ecumênico Vaticano II e promulgado pela autoridade do Papa Paulo VI. Trad. Portuguesa da segunda edição típica para o Brasil realizada e publicada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e aprovada pela Sé Apostólica. São Paulo: Paulus, 1997. n.12. 86 Cf. Capítulo III sobre o leitor e os livros litúrgicos. 87 ELENCO, 1997, n.65.
40 textos do Novo Testamento têm uma relação mais ou menos explícita com os ensinamentos e fatos do Antigo Testamento. [...] os textos do Antigo Testamento foram selecionados principalmente por sua congruência com os textos do Novo Testamento, especialmente com o Evangelho que se lê na mesma missa88.
A liturgia dos dias de semana, segue num ciclo de biênio. A leitura provém do Antigo Testamento ou das Epistolas dos Apóstolos ou do Apocalipse, e, no Tempo Pascal, dos Atos dos Apóstolos. Libanio faz uma boa elucidação sobre as palavras de conclusão da leitura.
Ao dizer „Palavra do Senhor‟, os fiéis respondem: „Graças a Deus‟. Expressão que tem dois sentidos. O primeiro é um agradecimento de ter ouvido a Palavra de Deus. É sempre um presente de Deus que merece um sinal de agradecimento. O outro sentido refere-se ao uso que cristãos tinham no norte da África de significar por essa expressão uma aclamação como sinal de aprovação. Equivale a amém. Ou simplesmente queriam dizer que entenderam o que lhes foi anunciado e tomaram conhecimento89.
A leitura deve ser proclamada a partir do lecionário, e não de subsídios „litúrgicos‟, e nem da própria Bíblia. Como, também, a assembleia não deve estar acompanhando, nem com o folheto e nem com a Bíblia. Pois a leitura é proclamada para toda a assembleia, e não individualmente. A assembleia deve escutar, receber a Palavra em comunidade.
“[...] É muito comum as leituras serem lidas de folhetos chamados de litúrgicos [...]. É muito comum ainda o leitor não se comunicar com a assembleia e o povo todo acompanhar a leitura lendo no folheto, cada um por si. Em algumas comunidades insiste-se em que todos tragam a Bíblia para fazer este acompanhamento individual.90
88
ELENCO, 1997, n.67. LIBANIO, J. B. Como saborear a Celebração Eucarística? São Paulo: Paulus, 2008. p.33. 90 BUYST, I. A Palavra de Deus na liturgia. São Paulo: Paulinas, 2001. p.14. 89
41 4.1.2. Salmo Responsorial
O salmo é a oração mais comum da piedade judaica. Este é um dos livros do Antigo Testamento mais rezados. “Faz parte do patrimônio espiritual de oração do judaísmo que o cristianismo assumiu e transformou em oração da Igreja” 91. As comunidades cristãs foram entendendo os salmos como “profecias de Jesus, o Cristo”92. Orientados pelo Espírito Santo, reinterpretaram os salmos a partir dos acontecimentos da morte-ressurreição de Jesus. Assim, é preciso instruir “os fiéis sobre o modo de escutar a Palavra de Deus que nos é transmitida pelos salmos e sobre o modo de converter estes salmos em oração da Igreja”93. O Vaticano II, depois de treze séculos, reintroduziu o salmo de resposta, recuperando o seu espaço como canto após a primeira leitura da Liturgia da Palavra. O salmo é Palavra de Deus. É uma leitura bíblica cantada, que possui o valor das outras leituras. “Responde à Palavra de Deus ouvida, com a própria Palavra de Deus. Falamos a Deus com as palavras da revelação nascidas no decorrer da história do povo de Deus por inspiração do Espírito Santo e que foram moldando a espiritualidade do povo a caminho. O salmo de resposta nunca deveria ser substituído por um canto qualquer”94. O salmo responsorial deve ser cantado. Se não for cantado, o salmo deve ser recitado da maneira mais adequada para a meditação da Palavra de Deus.
O salmista, do ambão, recita os versículos do salmo; toda a assembleia escuta sentada, ou, de preferência, nele participa do modo costumado com o refrão, a não ser que o salmo seja recitado todo seguido, sem refrão. Se o salmo não puder ser cantado, recitase do modo mais indicado para favorecer a meditação da Palavra de Deus95.
O Elenco das Leituras da Missa nos mostra que existem duas formas de cantar o salmo: 91
LIBANIO, 2008, p.35. BUYST, 2001, p.42. 93 ELENCO, 1997, n.19. 94 BUYST, 2001, p.36. 95 ALDAZÁBAL, 2007, n.61. 92
42
a forma responsorial e a forma direta. Na forma responsorial, o salmista ou o cantor do salmo cantam as estrofes do salmo, e toda a assembleia participa cantando da resposta. Na forma direta, o salmo é cantado sem que a assembleia intercale a resposta, e o cantam, ou o salmista ou o cantor do salmo sozinho, e a assembleia escuta, ou então o salmista e os fiéis juntos96.
Das duas formas de recitação, a primeira é a mais indicada. A comunidade louva as maravilhas, manifestadas pela Palavra, e atualiza-as na celebração. Responde ao Deus das maravilhas com o salmo responsorial. A palavra proclamada na primeira leitura é Palavra da Aliança, assim, o salmo que lhe responde é o cântico da Aliança. O salmo não pode ser substituído.
[...] como não se pode substituir o Evangelho por uma palavra humana, por muito bela que seja, nem substituir o pão eucarístico por pão vulgar, também o salmo responsorial não pode ser substituído por um cântico puramente humano, por maravilhoso que seja. Seria cometer uma fraude no serviço de Deus ou, então, como diz São Paulo, „Falsificar a Palavra de Deus‟ (2Cor 2,17).97
4.1.3. Aclamação ao Evangelho
Na aclamação ao Evangelho, “a assembleia dos fiéis acolhe e saúda o Senhor, que lhe vai falar no Evangelho, e professa a sua fé por meio do canto” 98. Esta?? é cantada por todos de pé, iniciada por um cantor; repete-se o refrão, sendo que o versículo é cantado pelo solista. O canto do aleluia entoa-se em todos os tempos fora da Quaresma. E na Quaresma, por ser um tempo de penitência, canta-se em seu lugar, antes do Evangelho, o versículo que está proposto no Lecionário.
96 97
p.36.
98
ELENCO, 1997, n.20. DEISS, L. A Missa da comunidade cristã. Porto/Portugal: Editorial Perpétuo Socorro, 1998. ELENCO, 1997, n.23.
43 [...] O canto do aleluia tem um toque pascal que se enfatiza no Tempo Pascal, repetindo-o mais vezes, e permanece ao longo do ano como uma ressonância da Páscoa em toda celebração, exceto na Quaresma ou em celebrações de toque penitencial ou de tristeza.99
4.1.4. Evangelho
A proclamação do Evangelho é o ponto culminante da Liturgia da Palavra. Por isso, deve-se atribuir-lhe maior veneração.
[...] Assim o mostra a própria Liturgia, distinguindo esta leitura das outras com honras especiais, quer por parte do ministro encarregado de anunciá-la e pela bênção e oração com que se prepara para fazêla, quer por parte dos fiéis que, com as suas aclamações, reconhecem e confessam que é Cristo presente no meio deles quem lhes fala, e, por isso, escutam a leitura de pé; quer ainda pelos sinais de veneração ao próprio Evangeliário100.
Existe uma preparação litúrgica, na própria Liturgia da Palavra, para a escuta e proclamação do Evangelho. Com as outras leituras, a assembleia se prepara, seguindo a partir do Antigo Testamento e chegando ao Novo 101. A proclamação reserva-se ao ministro ordenado, mais especificamente ao diácono. Esta não é uma função presidencial, mas diaconal. Se não houver diácono, neste caso o padre proclame o Evangelho102. Mas “não é permitido a um leigo, embora seja religioso, proclamar a leitura evangélica na celebração da santa Missa; nem tampouco nos outros casos, nos quais não seja explicitamente permitido pelas normas”103. Como o próprio nome já indica, Evangelho é Boa Nova, isto é, Mensagem de Salvação. Portanto, o Evangelho se ouve de pé,
99
LIBANIO, 2008, p.37. ALDAZÁBAL, 2007. n. 60. 101 Cf. ELENCO, 1997. n.13. 102 Cf. BUYST, 2001, p.12. 103 CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO E A DISCIPLINA DOS SACRAMENTOS. Redemptionis Sacramentum – sobre alguns aspectos que se deve observar acerca da Santíssima Eucaristia. São Paulo: Paulinas, 2004. n.63. 100
44 [...] em posição de prontidão, do soldado que vigia as portas da caserna ou da cidade. Estamos prontos para ouvir a mensagem maior da fé, levando-a ao mundo inteiro. [...] Estamos prontos para vivê-la no cotidiano. Estamos prontos, no limite da exigência, a dar a vida por aquele que nos anunciou a mensagem, como milhões e milhões de mártires ao longo dos dois mil anos de cristianismo104.
O Evangelho é uma celebração de Cristo. E é em nome dele que a assembleia está reunida.
“[...] o diácono ou sacerdote interpela solenemente a comunidade: „O Senhor esteja convosco‟. Ela responde: „Ele está no meio de nós‟. Resposta maravilhosa que faz a comunidade consciente daquele em nome do qual ela está reunida, de quem ela vai ouvir a Palavra, com quem ela se compromete ao escutá-la. É o Senhor Jesus Cristo Ressuscitado que está no centro da celebração e em torno do qual todos se congregam na fé. Se ele não estivesse conosco, nada poderíamos fazer. Estando no nosso meio, tudo é possível”105.
As palavras do Evangelho remetem ao passado, mas são para o agora, para o hoje, para o presente. Em cada proclamação do Evangelho acontece um kairós.
Quase sempre, as duas primeiras palavras da leitura do Evangelho são: „Naquele tempo‟. Localizam o texto no tempo de Jesus. São palavras de um tempo para além de todo tempo e que chegam ao nosso com o mesmo valor. A comunidade não as ouve como ditas aos ouvintes de outrora, mas para si hoje. É kairós, o tempo privilegiado sagrado do agir de Deus que ultrapassa todas as circunstâncias e conjunturas efêmeras dos tempos passados para ser hoje uma Palavra dirigida aos presentes106.
Terminada a proclamação, toda a assembleia, dando glória ao Senhor, anuncia e confirma que crê naquilo que ouviu107.
104
LIBANIO, 2008, p.39. Ibid., p.44-45. 106 Ibid., p.46. 107 Cf. Ibid., p.48. 105
45
4.1.5. Homilia
Homilia provém do grego que “reflete uma experiência humana de estar em companhia, de ajuntar-se a, de conversar, de ter e estar num relacionamento profundo, de frequentar as pessoas” 108. E isto indica o espírito que deve marcar a homilia. Ela “deve criar entre o pregador e a assembleia um relacionamento de proximidade, de companhia, de presença, e não de distância nem de erudição magisterial”109. Nela deve-se anunciar Cristo, e somente anunciar a Palavra de Deus, e não outras palavras. O pregador será apenas um sinal que mostra o Cristo, pois não deve anunciar a si mesmo, e sim a Jesus Cristo. “A homilia é ação profética que segue a Palavra, traduzindo-a no hoje de determinada comunidade, para lhe orientar a fé e a oração, quer dizer, a resposta cultual e existencial em direção ao Deus que lhe fala”110. Mas, anteriormente, no chamado sermão não era assim.
No sermão falava-se de qualquer assunto, não necessariamente ligado com os textos sagrados. Ele também não fazia parte integrante da liturgia: interrompia-se a missa para fazer o sermão, e o padre até tirava a casula para subir ao púlpito e fazia o sinal da cruz no início e no fim. Então, o sermão era como um corte no meio da missa, uma interpolação.111
A homilia, ao contrário do sermão, instrui, dá introdução ao Mistério, faz a atualização do passado, o fortalecimento da Fé, traz a misericórdia de Deus, opera a salvação em Cristo, promove a edificação da Igreja povo de Deus, e mostra a missão para o mundo.
A homilia conduz seus irmãos a uma compreensão saborosa da Sagrada Escritura, abre as almas dos fiéis à ação de graças pelas maravilhas de Deus; alimenta a fé dos presentes acerca da Palavra que na celebração se converte em sacramento pela intervenção do
108
LIBANIO, 2008, p.51. Ibid., p.51. 110 BIANCHI, E. Presbíteros: Palavra e Liturgia. São Paulo: Paulus, 2010. p.59-60. 111 BUYST, I. Homilia, partilha da Palavra. São Paulo: Paulinas, 2001. p.9-10. 109
46 Espírito Santo; finalmente, prepara os fiéis para uma comunhão fecunda e os convida a praticar as exigências da vida cristã.112
A homilia “tem como finalidade que a Palavra de Deus anunciada, juntamente com a liturgia eucarística, seja como uma proclamação das maravilhas realizadas por Deus na história da salvação ou mistério de Cristo. [...] Cristo está sempre presente e operante na pregação de sua Igreja”113. E assim, a homilia deve levar “a assembleia dos fiéis a uma ativa participação na Eucaristia, a fim de que vivam sempre de acordo com a fé que professaram. Com esta explicação viva, a Palavra de Deus que se leu e as celebrações que a Igreja realiza podem adquirir maior eficácia, com a condição de que a homilia seja realmente fruto da meditação”114. A homilia, normalmente, deve ser feita pelo presidente da celebração, ou por um concelebrante. Proferindo a homilia, o presidente exerce a sua função própria de ministro da Palavra de Deus. Por isso, o leigo não deve fazer a homilia.
Deve ser lembrado que, com base no que está prescrito no cânone 767, §1, fica revogada toda norma anterior que tenha permitido a fiéis não-ordenados fazer a homilia durante a Celebração Eucarística. De fato, tal praxe é reprovada e não pode, portanto, ser concedida em virtude de algum costume. A proibição de admissão dos leigos à pregação durante a celebração da missa vale também para os seminaristas, para os estudantes de disciplinas teológicas, para aqueles que tenham recebido o encargo de assistentes pastorais e para qualquer outro tipo, grupo, comunidade ou associação de leigos115.
A homilia faz parte da liturgia, é recomendada e deve ser feita tanto nas celebrações dominicais e festas de preceito como também nas celebrações feriais116. Ela “é um elemento necessário para alimentar a vida cristã. Deve ser a explanação de algum aspecto das leituras da Sagrada Escritura ou de algum texto
112
ELENCO, 1997, n.42. Ibid., n.24. 114 ELENCO, loc. cit. 115 CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO E A DISCIPLINA DOS SACRAMENTOS, 2004, n.65-66. 116 Cf. IGREJA CATÓLICA. Código de Direito Canônico. Promulgado por João Paulo II, Papa. São Paulo: Loyola, 2001. cân. 767. 113
47 do Ordinário ou do Próprio da Missa do dia, tendo sempre em conta o mistério que se celebra, bem como as necessidades peculiares dos ouvintes”117 A homilia deve estar fundamentada nos mistérios da salvação. Deve-se expor os textos das leituras bíblicas e os textos litúrgicos, os mistérios da fé e as normas da vida cristã.
É claro que todas as interpretações da Sagrada Escritura devem conduzir a Cristo [...]. Ao fazer a homilia, procure-se iluminar, em Cristo, os acontecimentos da vida. Faça-se isto, sem dúvida, de tal modo que não se esvazie o sentido autêntico e genuíno da Palavra de Deus, por exemplo, tratando só de política ou de temas profanos, ou tomando como fonte noções que provém de movimentos pseudoreligiosos de nossa época.118
Bento XVI, em Sacramentum Caritatis, faz um apelo
[...] Os ministros ordenados devem preparar cuidadosamente a homilia, baseando-se num adequado conhecimento da Sagrada Escritura. Evitem-se homilias genéricas ou abstratas; de modo particular, peço aos ministros para fazerem com que a homilia coloque a Palavra de Deus proclamada em estreita relação com a celebração sacramental e com a vida da comunidade, de tal modo que a Palavra de Deus seja realmente apoio e vida da Igreja. Tenha-se presente, portanto, a finalidade catequética e exortativa da homilia. Considera-se que é oportuno oferecer prudentemente, a partir do Lecionário trienal, homilias temáticas aos fiéis, que tratem, ao longo do ano litúrgico, os grandes temas da fé cristã, haurindo de quanto está autorizadamente proposto pelo Magistério nos quatro pilares do Catecismo da Igreja Católica e no recente Compêndio: a profissão da fé, a celebração do mistério cristão, a vida em Cristo, a oração cristã.119
Para a preparação da homilia, Bento XVI cita os padres sinodais, mostrando alguns questionamentos que se devem levar em conta: “O que dizem as leituras proclamadas? O que dizem a mim pessoalmente? O que devo dizer à comunidade, tendo em conta a sua situação concreta?” De tal modo, “o pregador deve deixar-se 117 118
n.67.
119
ALDAZÁBAL, 2007. n.65. CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO E A DISCIPLINA DOS SACRAMENTOS, 2004,
BENTO XVI. Exortação Apostólica Pós-sinodal Sacramentum Caritatis. São Paulo: Paulinas, 2007. n.46.
48 interpelar primeiro pela Palavra de Deus que anuncia, porque, como diz Santo Agostinho, seguramente fica sem fruto aquele que prega exteriormente a Palavra de Deus sem a escutar no seu íntimo”120. A homilia liga os textos sagrados à realidade na qual vivemos e ao mistério que estamos celebrando. Assim, ao prepará-la, deve-se ter consciência de que existem 4 eixos básicos:
Um anúncio (kerigma), um chamado à fé em Cristo salvador; Um ensinamento (didascália) sobre o significado dos fatos e das palavras escutadas a partir da Escritura e da liturgia; Uma introdução (paraclese, parênese [exortação à conversão]), para provocar a resposta viva dos fiéis à Palavra anunciada; Uma introdução ao mistério da comunhão com o Senhor (mistagogia), devendo conduzir ao encontro pessoal com o Senhor que opera no sacramento e ao reconhecimento como irmãos dos que se unem na mesma confissão de fé e na mesma ação de graças.121
A pessoa é inseparável de seu contexto histórico-social. Como a homilia fala da relação de Deus com o ser humano, não se pode deixar por esquecido este contexto. O Reino de Deus se estabelece nas realidades humanas, visíveis, sociais... A homilia deve expor um kerigma, e não ficar numa moral. “Mais do que conselhos, [...] depois do kerigma vem a exortação à nossa conversão. [...] A homilia não é um receituário de normas, mas um convite à mudança radical das atitudes que, no âmbito da liberdade de iniciativa pessoal, será traduzida em fatos concretos”122.
a homilia conduz seus irmãos a uma compreensão saborosa da Sagrada Escritura; abre as almas dos fiéis à ação de graças pelas maravilhas de Deus; alimenta a fé dos presentes acerca da Palavra que na celebração se converte em sacramento pela intervenção do Espírito Santo; finalmente, prepara os fiéis para uma comunhão fecunda e os convida a praticar as exigências da vida cristã.123
120
BENTO XVI, 2007. n.59. CELAM (Conselho Episcopal Latino-Americano) Manual de Liturgia 2 - A celebração do mistério pascal: fundamentos teológicos e elementos constitutivos. São Paulo: Paulus, 2005b. passim. 122 CELAM, 2005b, p.183-184. 123 ELENCO, 1997, n.41. 121
49 4.1.6. Profissão de Fé
Foi aos grandes concílios de Nicéia (325) e Constantinopla (381) que coube a tarefa de dar ao catolicismo formulação definitiva do Credo, embora a maioria das diretrizes fosse de uso comum pelo menos desde o século III124. A liturgia romana adotou as fórmulas do Símbolo Niceno-Constantinopolitano e do Símbolo Apostólico.
O primeiro é mais longo e, depois do Concílio Vaticano II, se reza raramente nas liturgias, embora conste no missal. Prefere-se comumente o Símbolo Apostólico. Ambas as formulações conservam a mesma estrutura teológica. Repete-se três vezes o termo „creio‟, ou de maneira explícita ou elíptica, conforme a tradução, denotando-lhe a estrutura tripartida. Uma vez se refere ao Pai, outra ao Filho e a terceira ao Espírito Santo e à sua obra.125
A finalidade da profissão de fé é “permitir que todo o povo reunido responda à Palavra de Deus anunciada nas leituras da Sagrada Escritura e exposta na homilia, e que, proclamando a regra da fé, segundo a fórmula aprovada para o uso litúrgico, recorde e professe os grandes mistérios da fé, antes de começarem a ser celebrados na Eucaristia”126. O Credo deve ser cantado ou recitado nos domingos e nas solenidades, como também em celebrações solenes especiais. Este momento deve ser bem preparado, para que não se transforme em mero expediente para se dar continuidade à celebração. Também deve ser introduzido e motivado pelo presidente da celebração, para não se tornar algo meramente mecânico e formal. O Credo é recitado em primeira pessoa, mas é a fé da comunidade. E assim o é recitado, porque era recitado pessoalmente pelo catecúmeno antes de receber o batismo. “Na liturgia, cada um recitando no singular o Credo, manifesta como a fé da
124
Cf. HAHN, S. O Banquete do Cordeiro. A missa segundo um convertido. São Paulo: Edições Loyola, 2002. p. 52. 125 LIBANIO, 2008, p.66. 126 ALDAZÁBAL, 2007, n.67.
50 comunidade se constrói do entrelaçar da fé de todos na sua singularidade. E quanto mais pessoal for uma fé, mais se enriquece a comunidade”127.
4.1.7. Oração dos fiéis
A Oração dos Fiéis é como que o fruto da ação da Palavra de Deus nas almas dos fiéis, pois, uma vez por ela instruídos, dinamizados e renovados, estão agora todos aptos para orar pelas necessidades de toda a Igreja e do mundo. Ela é universal, pois o fato salvífico anunciado na Palavra deve se cumprir para todas as pessoas, segundo a vontade do Pai. Também porque a comunidade que celebra está em comunhão com toda a Igreja universal, compartilhando as intenções. Ela também é oração de súplica, de pedido, e não de ação de graças, mas, mesmo que é oração universal, não se excluem as necessidades da comunidade.
Na oração dos fiéis, o povo de Deus, reunido no Espírito Santo para celebrar a salvação do mundo, se dirige ao Pai através do seu sumo sacerdote Jesus Cristo. Os fiéis se sentem e agem como raça eleita, sacerdócio real, nação santa, que tem o direito de dizer „Abba, Pai‟ e „Jesus é o Senhor‟. [...] Exercendo assim o seu sacerdócio, o povo de Deus não se fecha dentro de si mesmo. Ele reza com o seu Senhor e como ele. Jesus rezou por Pedro, para que sua fé não esmorecesse128.
Como lembra a Instrução ao Missal, na oração dos fiéis “o povo responde, de algum modo, à Palavra de Deus recebida na fé, e, exercendo a função do seu sacerdócio batismal, apresenta preces a Deus pela salvação de todos”
129
. Assim,
convém que em todas as celebrações eucarísticas se faça a oração. A oração dos fiéis deve estar sob a orientação do presidente da celebração, que preside a esta oração e a toda a Celebração Eucarística. As intenções da oração são propostas, do ambão, por um diácono, e, na ausência dele, um leitor. A conclusão deve ser proferida pelo presidente, fazendo com que nela somente se peça a Deus que escute as preces formuladas. 127
LIBANIO, 2008, p.63. LUTZ, G. Liturgia ontem e hoje. São Paulo: Paulus, 1995. p.37. 129 ALDAZÁBAL, 2007, n.70. 128
51 A oração dos fiéis está situada no final da Liturgia da Palavra, fazendo ponte entre a mensagem ouvida e a fé proclamada, e o rito das ofertas, com todo o seu significado, e encaminhando para a liturgia eucarística. A oração dos fiéis é constituída de quatro grupos de intenções: pelas necessidades da Igreja, pelas autoridades civis e pela salvação do mundo, por aqueles que sofrem necessidade, e pela Comunidade local. Mas, devem ser incluídas as intenções da vida de cada comunidade. A oração dos fiéis é uma súplica dirigida a Deus, por isso não exprime somente a adoração ou a ação de graças, ou o louvor de algum Santo; pede a Deus benefícios para toda a Igreja, pelo mundo, por todos os que sofrem necessidades; e diz respeito ao povo fiel que se reúne em assembleia e pede por todos. As intenções podem ser apresentadas de três modos: de forma plena, na qual se proclama por quem vai ser feito e o que vai ser pedido (por exemplo: oremos por... para que...); primeira forma parcial, na qual se descreve a graça a pedir (por exemplo: oremos para que...); e a segunda forma parcial, na qual se diz somente em favor de quem se faz o pedido (por exemplo: oremos por...). O povo tem uma participação importante, pois é a oração de toda a comunidade. E a participação acontece com a manifestação do pedido por uma aclamação breve, ou por meio da oração em silêncio, ou, depois de algum tempo de silêncio, promovendo a aclamação do povo. Na oração dos fiéis acontece a participação ativa dos fiéis.
A oração dos fiéis é realmente um momento de oração, porque nos dirigimos a Deus. Ela é dos fiéis, porque não é apenas uma pessoa que a profere em nome de todos. Na oração dos fiéis, todos participam ativamente, pelo menos através de um refrão que exprime que todos fazem sua a intenção ou pedido formulado por um membro da assembleia130.
Para a seriedade do momento, é importante que ela não seja substituída por uma „oração ungida‟. E que de preferência não sejam feitas intenções espontâneas, para que não se torne algo confuso. 130
LUTZ, 1995, p.33.
52
Se deixar que os pedidos sejam espontâneos, especialmente se a comunidade for grande e não muito preparada (o que é frequente), a Oração dos Fiéis será caótica: os pedidos serão feitos simultaneamente, serão inaudíveis, repetitivos e, sobretudo, pouco universais. O importante nessa oração – a verdadeira participação – não são tanto os pedidos em si e sua quantidade, mas que a comunidade presente ore, cumprindo assim a tarefa de toda a Igreja de ser intercessora em favor de todos os homens.131
4.2.
Silêncio
A Liturgia da Palavra deve favorecer a meditação. “O diálogo entre Deus e as pessoas, que se realiza com a ajuda do Espírito Santo, requer breves momentos de silêncio, adequados à assembleia presente, para que nelas a Palavra de Deus seja acolhida interiormente e se prepare uma resposta, por meio da oração”132. Bento XVI, na Verbum Domini, explicita muito bem o valor do silêncio.
[...] A palavra pode ser pronunciada e ouvida apenas no silêncio, exterior e interior. O nosso tempo não favorece o recolhimento e, às vezes, fica-se com a impressão de se ter medo de se separar, por um só momento, dos instrumentos de comunicação de massa. Educar o Povo de Deus para o valor do silêncio. Redescobrir a centralidade da Palavra de Deus na vida da Igreja significa também redescobrir o sentido do recolhimento e da tranquilidade interior. A grande tradição patrística ensina-nos que os mistérios de Cristo estão ligados ao silêncio, e só nele é que a Palavra pode encontrar morada em nós, como aconteceu em Maria, mulher indivisivelmente da Palavra e do silêncio. [...] O silêncio deve ser considerado como parte da celebração.133
A Palavra precisa ser acompanhada do silêncio. Do “silêncio habitado, silêncio eloquente, silêncio que não deve ser preenchido com movimentos do corpo, da cabeça, dos olhos, mas apenas com o louvor e a tranquilidade”134.
131
CERVANTES, A.A.; PÉREZ, A.S. Firmino e Libério: pílulas litúrgicas. São Paulo: Loyola, 2008. p.124-125. 132 ELENCO, 1997, n.28. 133 BENTO XVI. Exortação Apostólica Pós-Sinodal Verbum Domini. São Paulo: Paulinas, 2010. n.66. 134 BIANCHI, 2010, p.20.
53 Deve-se evitar qualquer forma de „ruído‟ que impeça o recolhimento, e observar momentos de silêncio depois da primeira e da segunda leitura e, por fim, após a homilia135. Para que haja o silêncio, é necessária toda uma formação sobre o sentido e a linguagem dele na liturgia. Não pode ser um silêncio vazio, senão os fiéis podem ter a impressão de que o comentarista ou o leitor estão perdidos, quebrando a harmonia da celebração. É “no silêncio que o Espírito torna fecunda a Palavra no coração da comunidade”136.
135 136
Cf. ALDAZÁBAL, 2007, n.56. CNBB. Guia Litúrgico-Pastoral. Brasília: Edições CNBB, 2006. p.31.
5. O ANÚNCIO DA PALAVRA NOS DOCUMENTOS DA IGREJA
Neste capítulo iremos registrar o elenco dos documentos e seus respectivos itens sobre a Liturgia da Palavra.
5.1.
Constituição Sacrosanctum Concilium
Esta Constituição, do Concílio Vaticano II, foi a que tratou sobre a liturgia. No número sete consta que “Cristo está presente pela sua Palavra, pois é Ele mesmo que fala quando se leem as Sagradas Escrituras na igreja”137. A Constituição trouxe grandes renovações e revoluções na liturgia com um todo. Relativo ao tema da Liturgia da Palavra, o documento nos fala de alguns aspectos: A grande importância da Sagrada Escritura na celebração litúrgica.
É enorme a importância da Sagrada Escritura na celebração da Liturgia. Porque é a ela que se vão buscar as leituras que se explicam na homilia e os salmos para cantar; com o seu espírito e da sua inspiração nasceram as preces, as orações e os hinos litúrgicos; dela tiram a sua capacidade de significação as ações e os sinais. Para promover a reforma, o progresso e adaptação da sagrada Liturgia, é necessário, por conseguinte, desenvolver aquele amor suave e vivo da Sagrada Escritura de que dá testemunho a venerável tradição dos ritos tanto orientais como ocidentais138.
137
CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. Constituição Sacrosanctum Concilium: Sobre a Sagrada Liturgia. In: Documentos Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965). São Paulo: Paulus, 1997. n.7. 138 Ibid., n.24.
55 A revisão dos livros litúrgicos. Sobre isto, o documento menciona que “façase o mais depressa possível a revisão dos livros litúrgicos, utilizando o trabalho de pessoas competentes e consultando Bispos de diversos países do mundo”139. A homilia é recomendada.
A homilia, que é a exposição dos mistérios da fé e das normas da vida cristã no decurso do ano litúrgico e a partir do texto sagrado, é muito para recomendar, como parte da própria Liturgia; não deve omitir-se, sem motivo grave, nas missas dos domingos e festas de preceito, concorridas pelo povo.140
E o documento também pede a restauração da “Oração dos Fiéis”, que, aliás, foi uma das grandes inovações na Liturgia da Palavra.
Deve restaurar-se, especialmente nos domingos e festas de preceito, a “oração comum” ou “oração dos fiéis”, recitada após o Evangelho e a homilia, para que, com a participação do povo, se façam preces pela santa Igreja, pelos que nos governam, por aqueles a quem a necessidade oprime, por todos os homens e pela salvação de todo o mundo141.
5.2.
Constituição Dogmática Dei Verbum
A Constituição Dogmática Dei Verbum, do Concílio Vaticano II, trata da Revelação Divina, das Sagradas Escrituras. E mostra que a Igreja venera a Sagrada Escritura, como venera a Eucaristia.
A Igreja venerou sempre as divinas Escrituras, como também venera o próprio Corpo do Senhor; sobretudo na sagrada liturgia, nunca deixou de tomar e distribuir aos fiéis, da mesa da palavra de Deus como do corpo de Cristo, o pão da vida. Sempre considerou as divinas Escrituras, e continua a considerá-las, juntamente com a Sagrada Tradição, como regra suprema da sua fé; elas, com efeito, inspiradas como são por Deus, e escritas uma vez para sempre, continuam a dar-nos imutavelmente a palavra do próprio Deus, e 139
CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II, 1997, n.25. Ibid., n.52. 141 Ibid., n.53. 140
56 fazem ouvir a voz do Espírito Santo através das palavras dos profetas e dos apóstolos. É preciso, pois, que, do mesmo modo que a religião cristã, também toda a pregação eclesiástica seja alimentada e dirigida pela Sagrada Escritura142.
5.3.
Instrução Geral sobre o Missal Romano
Nesta instrução, muito se refere à Liturgia da Palavra. No número 55 consta:
A parte principal da Liturgia da Palavra é constituída pelas leituras da Sagrada Escritura com os cânticos intercalares. São seu desenvolvimento e conclusão a homilia, a profissão de fé e a oração universal ou oração dos fiéis. Nas leituras, comentadas pela homilia, Deus fala ao seu povo, revela-lhe o mistério da redenção e salvação e oferece-lhe o alimento espiritual. Pela sua palavra, o próprio Cristo está presente no meio dos fiéis. O povo faz sua esta palavra divina com o silêncio e com os cânticos e a ela adere com a profissão de fé. Assim alimentado, eleva a Deus as suas preces na oração universal pelas necessidades de toda a Igreja e pela salvação do mundo 143 inteiro .
Tratando da Liturgia da Palavra, o documento fala de suas várias partes: o silêncio, as leituras bíblicas, o salmo responsorial, a aclamação antes da proclamação do Evangelho, a homilia, a profissão de fé, e a oração dos fiéis. O silêncio:
56. A Liturgia da Palavra deve ser celebrada de modo a favorecer a meditação. Deve, por isso, evitar-se completamente qualquer forma de pressa que impeça o recolhimento. Haja nela também breves momentos de silêncio, adaptados à assembleia reunida, nos quais, com a ajuda do Espírito Santo, a Palavra de Deus possa ser interiorizada e se prepare a resposta pela oração. Pode ser oportuno observar estes momentos de silêncio depois da primeira e da segunda leitura e, por fim, após a homilia.144
142
CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. Constituição Dogmática Dei Verbum: Sobre a Revelação Divina. In: Documentos Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965). São Paulo: Paulus, 1997. n.21. 143 ALDAZÁBAL, J (com.). Instrução geral sobre o Missal Romano: terceira edição. São Paulo: Paulinas, 2007. n.56. 144 Ibid., n.56.
57 As leituras bíblicas:
57. Nas leituras põe-se aos fiéis a mesa da palavra de Deus e abrem-se-lhes os tesouros da Bíblia. Convém, por isso, observar uma disposição das leituras bíblicas que ilustre a unidade de ambos os Testamentos e da história da salvação; não é lícito substituir as leituras e o salmo responsorial, que contêm a palavra de Deus, por outros textos não bíblicos. 58. Na celebração da Missa com o povo, as leituras proclamam-se sempre do ambão. 59. Segundo a tradição, a função de proferir as leituras não é presidencial, mas sim ministerial. Por isso, as leituras são proclamadas por um leitor, mas o Evangelho é anunciado pelo diácono ou por outro sacerdote. Se, porém, não estiver presente o diácono nem outro sacerdote, leia o Evangelho o próprio sacerdote celebrante; e se também faltar outro leitor idôneo, o sacerdote celebrante proclame igualmente as outras leituras. Depois de cada leitura, aquele que a lê profere a aclamação; ao responder-lhe, o povo reunido presta homenagem à palavra de Deus, recebida com fé e espírito agradecido. 60. A leitura do Evangelho constitui o ponto culminante da Liturgia da Palavra. Deve ser-lhe atribuída a maior veneração. Assim o mostra a própria Liturgia, distinguindo esta leitura das outras com honras especiais, quer por parte do ministro encarregado de a anunciar e pela bênção e oração com que se prepara para o fazer, quer por parte dos fiéis que, com as suas aclamações, reconhecem e confessam que é Cristo presente no meio deles quem lhes fala, e, por isso, escutam a leitura de pé; quer ainda pelos sinais de veneração ao próprio Evangeliário.145
O salmo responsorial:
61. A primeira leitura é seguida do salmo responsorial, que é parte integrante da Liturgia da Palavra e tem, por si mesmo, grande importância litúrgica e pastoral, pois favorece a meditação da Palavra de Deus. O salmo responsorial corresponde a cada leitura e habitualmente toma-se do Lecionário. Convém que o salmo responsorial seja cantado, pelo menos no que se refere à resposta do povo. O salmista ou cantor do salmo, do ambão ou de outro lugar conveniente, recita os versículos do salmo; toda a assembleia escuta sentada, ou, de preferência, nele participa do modo costumado com o refrão, a não ser que o salmo seja recitado todo seguido, sem refrão. Todavia, para facilitar ao povo a resposta salmódica (refrão), fez-se, para os diferentes tempos e as várias categorias de Santos, uma seleção de responsarias e salmos, que podem ser utilizados, em vez do texto correspondente à leitura, 145
ALDAZÁBAL, 2007, n.57-60.
58 quando o salmo é cantado. Se o salmo não puder ser cantado, recita-se do modo mais indicado para favorecer a meditação da palavra de Deus. Em vez do salmo que vem indicado no Lecionário, também se pode cantar ou o responsório gradual tirado do Gradual Romano ou um salmo responsorial ou aleluiático do Gradual simples, na forma indicada nestes livros.146
A aclamação antes da leitura do Evangelho:
62. Depois da leitura, que precede imediatamente o Evangelho, canta-se o Aleluia ou outro cântico, indicado pelas rubricas, conforme o tempo litúrgico. Deste modo, a aclamação constitui um rito ou um ato com valor por si próprio, pelo qual a assembleia dos fiéis acolhe e saúda o Senhor, que lhe vai falar no Evangelho, e professa a sua fé por meio do canto. É cantada por todos de pé, iniciada pelo grupo de cantores ou por um cantor, e pode-se repetir, se for conveniente; mas o versículo é cantado pelo grupo de cantores ou pelo cantor. a) O Aleluia canta-se em todos os tempos fora da Quaresma. Os versículos tomam-se do Lecionário ou do Gradual; b) Na Quaresma, em vez do Aleluia canta-se o versículo antes do Evangelho que vem no Lecionário. Também se pode cantar outro salmo ou trato, como se indica no Gradual. 63. No caso de haver uma só leitura antes do Evangelho: a) nos tempos em que se diz Aleluia, pode escolher-se ou o salmo aleluiático, ou o salmo e o Aleluia com o seu versículo; b) no tempo em que não se diz Aleluia, pode escolher-se ou o salmo e o versículo antes do Evangelho ou apenas o salmo. c) O Aleluia ou o versículo antes do Evangelho, se não são cantados, podem omitir-se. 64. A sequência, que, exceto nos dias da Páscoa e do Pentecostes é facultativa, canta-se depois do Aleluia.147
A homilia:
65. A homilia é parte da liturgia e muito recomendada: é um elemento necessário para alimentar a vida cristã. Deve ser a explanação de algum aspecto das leituras da Sagrada Escritura ou de algum texto do Ordinário ou do Próprio da Missa do dia, tendo sempre em conta o mistério que se celebra, bem como as necessidades peculiares dos ouvintes. 66. Habitualmente a homilia deve ser feita pelo sacerdote celebrante ou por um sacerdote concelebrante, por ele encarregado, ou algumas vezes, se for oportuno, também por um diácono, mas nunca por um leigo. Em casos especiais, e por justa causa, a homilia 146 147
ALDAZÁBAL, 2007, n.61. Ibid., n.62-64.
59 também pode ser feita por um Bispo ou presbítero que se encontra na celebração, mas sem poder concelebrar. Nos domingos e festas de preceito, deve haver homilia em todas as Missas celebradas com participação do povo, e não pode omitir-se senão por causa grave. Além disso, é recomendada, particularmente nos dias feriais do Advento, Quaresma e Tempo Pascal, e também noutras festas e ocasiões em que é maior a afluência do povo à Igreja. Depois da homilia, observe-se oportunamente um breve espaço de silêncio.148
A profissão de fé:
67. O símbolo, ou profissão de fé, tem como finalidade permitir que todo o povo reunido responda à palavra de Deus anunciada nas leituras da Sagrada Escritura e exposta na homilia, e que, proclamando a regra da fé, segundo a fórmula aprovada para o uso litúrgico, recorde e professe os grandes mistérios da fé, antes de começarem a ser celebrados na Eucaristia. 68. O símbolo deve ser cantado ou recitado pelo sacerdote juntamente com o povo, nos domingos e nas solenidades. Pode também dizer-se em celebrações especiais mais solenes. Quando cantado pelo sacerdote ou, se for oportuno, pelo cantor ou pelo grupo de cantores, é cantado por todo o povo junto, ou pelo povo alternando com o grupo de cantores. Se não for cantado, será recitado por todos juntos, ou por dois coros alternando entre si.149
A oração dos fiéis:
69. Na oração universal ou oração dos fiéis, o povo responde, de algum modo, à palavra de Deus recebida na fé e, exercendo a função do seu sacerdócio batismal, apresenta preces a Deus pela salvação de todos. Convém que em todas as Missas com participação do povo se faça esta oração, na qual se pede pela santa Igreja, pelos governantes, pelos que se encontram em necessidade, por todos os homens em geral e pela salvação do mundo inteiro. 70. Normalmente a ordem das intenções é a seguinte: a) pelas necessidades da Igreja; b) pelas autoridades civis e pela salvação do mundo; c) por aqueles que sofrem dificuldades; d) pela comunidade local. Em celebrações especiais – por exemplo, Confirmação, Matrimônio, Exéquias – a ordem das intenções pode acomodar-se às circunstâncias. 148 149
ALDAZÁBAL, 2007, n.65-66. Ibid., n.67-68.
60 71. Compete ao sacerdote celebrante dirigir da sede esta prece. Ele próprio a introduz com uma breve exortação, na qual convida os fiéis a orar, e a conclui com uma oração. As intenções que se propõem, formuladas de forma sóbria, com sábia liberdade e em poucas palavras, devem exprimir a súplica de toda a comunidade. Habitualmente são enunciadas do ambão ou de outro lugar conveniente, por um diácono, por um cantor, por um leitor, ou por um fiel leigo. O povo, de pé, faz suas estas súplicas, ou com uma invocação comum proferida depois de cada intenção, ou orando em silêncio.150
Os números 196 a 198 falam sobre a função do leitor na liturgia. O leitor
[...] lê no ambão as leituras que precedem o Evangelho. Na ausência do salmista, pode proferir o salmo responsorial, depois da primeira leitura. Na ausência do diácono, o leitor pode proferir as intenções da oração universal, no ambão, depois da introdução feita pelo sacerdote. Se não houver cântico de entrada nem da Comunhão e os fiéis não recitarem as antífonas que vêm no Missal, pode proferir, no momento próprio, estas antífonas.151
5.4.
Cerimonial dos Bispos – Cerimonial da Igreja
O Cerimonial dos Bispos, nos números 115 a 118, traz algumas orientações sobre a maneira de tratar os livros litúrgicos e proferir os diversos textos:
Os livros litúrgicos hão se ser tratados com cuidado e respeito, pois é deles que se proclama a Palavra de Deus e se profere a oração da Igreja. Por isso, mormente quando se trata de celebrações litúrgicas realizadas pelo Bispo, tenham-se à mão os livros litúrgicos oficiais das edições mais recentes, belos e dignos, quer na apresentação gráfica quer na encadernação. Nos textos que devam ser proferidos em voz alta e clara, tanto pelo Bispo como pelos ministros e todos os demais, a voz há de corresponder ao gênero de cada texto, conforme se trata de leitura, de oração, de admonição, de aclamação, de canto, tendo ainda em conta a forma de celebração e a solenidade da assembleia. Nas rubricas e normas que vêm a seguir, as palavras “dizer”, “recitar”, “proferir” devem entender-se tanto do canto como da recitação, respeitando os princípios expostos em cada um dos livros litúrgicos e as normas dadas à frente nos respectivos lugares. 150 151
ALDAZÁBAL, 2007, n.69-71. Ibid., n.196-198.
61 A expressão “cantar ou dizer”, usada adiante com frequência, deve entender-se do canto, a não ser que haja algum motivo que não aconselhe o canto.152
É importante mencionarmos que, quando o Cerimonial se refere aos diversos ritos (sacramentos e sacramentais), a Liturgia da Palavra é feita conforme prescreve o rito da missa.
5.5.
Catecismo da Igreja Católica
O Catecismo da Igreja Católica, quando fala sobre a Economia Sacramental, mais especificamente sobre o Espírito Santo e a Igreja na liturgia, nos diz:
O Espírito Santo lembra à assembleia litúrgica, em primeiro lugar, o sentido do acontecimento salvífico, dando vida à Palavra de Deus, que é anunciada para ser recebida e vivida. (...) É o Espírito Santo que dá aos leitores e ouvintes, segundo a disposição dos seus corações, a inteligência espiritual da Palavra de Deus. Através das palavras, ações e símbolos, que formam a trama duma celebração, o Espírito Santo põe os fiéis e os ministros em relação viva com Cristo, Palavra e Imagem do Pai, de modo a poderem fazer passar para a sua vida o sentido daquilo que ouvem, veem e fazem na celebração. (...) O anúncio da Palavra de Deus não se limita a um ensinamento: faz apelo à resposta da fé, enquanto assentimento e compromisso, em vista da aliança entre Deus e o seu povo. É ainda o Espírito Santo que dá a graça da fé, a fortifica e a faz crescer na comunidade. 153 A assembleia litúrgica é, antes de mais, comunhão na fé.
Ao tratar do aspecto de como se celebra, o Catecismo mostra vários pontos que devem ser valorizados:
Para alimentar a fé dos fiéis, os sinais da Palavra de Deus devem ser valorizados: o livro da Palavra (lecionário ou Evangeliário), a sua veneração (procissão, incenso, luz), o lugar da sua proclamação 152
CERIMONIAL DOS BISPOS (Cerimonial da Igreja). Restaurado por decreto do Sagrado Concílio Ecumênico Vaticano II e promulgado pela autoridade do Papa João Paulo II. Trad. Portuguesa da edição típica realizada pelo Secretariado Nacional de Liturgia de Portugal, adaptada e publicada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. 3.ed. São Paulo: Paulus, 2004. n.115-118. 153 CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. São Paulo: Loyola, 2000. n.1100-1102.
62 (ambão), a sua leitura audível e inteligível, a homilia do ministro que prolonga a sua proclamação, as respostas da assembleia (aclamações, salmos de meditação, litanias, confissão de fé...).154
Sobre a Liturgia da Palavra na celebração litúrgica eucarística:
A Liturgia da Palavra comporta os escritos dos Profetas, quer dizer, o Antigo Testamento e „as Memórias dos Apóstolos‟ ou seja, as suas epístolas e os Evangelhos. Depois da homilia, que é uma exortação a acolher esta Palavra como o que ela é na realidade, Palavra de Deus, e a pô-la em prática, vêm as intercessões por todos os homens, segundo a palavra do Apóstolo: Recomendo, antes de tudo, que se façam preces, orações, súplicas e ações de graças, por todos os homens, pelos reis e por todos os que exercem autoridade.155
5.6.
Código de Direito Canônico
O Código de Direito Canônico, falando sobre a função do pároco, diz que ele tem o dever de fazer com que a Palavra de Deus seja anunciada aos que vivem na Paróquia.
O pároco tem a obrigação de fazer que a palavra de Deus seja integralmente anunciada aos que vivem na paróquia; cuide, portanto, que os fiéis leigos sejam instruídos nas verdades da fé, principalmente por meio da homilia, que deve ser feita nos domingos e festas de preceito, e mediante a instrução catequética que se deve dar. Estimule obras que promovam o espírito evangélico, também no que se refere à justiça social. Tenha especial cuidado com a educação católica das crianças e jovens. Procure com todo o empenho, associando a si o trabalho dos fiéis, que o anúncio evangélico chegue também aos que se afastaram da prática da religião ou que não professam a verdadeira fé.156
No cânon 767, o Código nos fala das normas em relação à forma de pregação, de modo especial da homilia.
154
CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA, 2000, n.1154. Ibid., n.1349. 156 IGREJA CATÓLICA. Código de Direito Canônico. Promulgado por João Paulo II, Papa. São Paulo: Loyola, 2001. cân.528, §1. 155
63 § 1. Entre as formas de pregação, destaca-se a homilia, que é parte da própria liturgia e se reserva ao sacerdote ou diácono; nela se devem expor, ao longo do ano litúrgico, a partir do texto sagrado, os mistérios da fé e as normas da vida cristã. § 2. Em todas as missas que se celebram com participação do povo, nos domingos e festas de preceito, deve-se fazer a homilia, que não se pode omitir, a não ser por causa grave. § 3. Havendo suficiente participação do povo, recomenda-se vivamente que se faça a homilia também nas missas celebradas durante a semana, principalmente no tempo do advento e da quaresma ou por ocasião de alguma festa ou acontecimento de luto. § 4. Compete ao pároco ou reitor da igreja cuidar que essas prescrições sejam observadas religiosamente.157
5.7.
Exortação Apostólica Pós-Sinodal Sacramentum Caritatis
Nesta Exortação Apostólica Pós-Sinodal, sobre a Eucaristia como fonte e ápice da vida e da missão da Igreja, o papa Bento XVI deixa clara a importância de a Liturgia da Palavra ser vivida e preparada.
Juntamente com o Sínodo, peço que a Liturgia da Palavra seja sempre devidamente preparada e vivida. Recomendo, pois, vivamente que se tenha grande cuidado, nas liturgias, com a proclamação da palavra de Deus por leitores bem preparados; nunca nos esqueçamos de que, quando na igreja se lê a Sagrada Escritura, é o próprio Deus que fala ao seu povo, é Cristo presente na sua palavra que anuncia o Evangelho. Se as circunstâncias o recomendarem, pode-se pensar numas breves palavras de introdução, que ajudem os fiéis a tomar renovada consciência do momento. Para ser bem compreendida, a palavra de Deus deve ser escutada e acolhida com espírito eclesial e cientes da sua unidade com o sacramento eucarístico. Com efeito, a palavra que anunciamos e ouvimos é o Verbo feito carne (Jo 1, 14) e possui uma referência intrínseca à pessoa de Cristo e à modalidade sacramental da sua permanência: Cristo não fala no passado mas no nosso presente, tal como Ele está presente na ação litúrgica. Neste horizonte sacramental da revelação cristã,(136) o conhecimento e o estudo da palavra de Deus permitem-nos valorizar, celebrar e viver melhor a Eucaristia; também aqui se mostra em toda a sua verdade a conhecida asserção: A ignorância da Escritura é ignorância de Cristo. Para isso, é necessário ajudar os fiéis a valorizarem os tesouros da Sagrada Escritura presentes no Lecionário, por meio de iniciativas pastorais, de celebrações da palavra e da leitura orante.158 157
IGREJA CATÓLICA, 2001, cân. 767. BENTO XVI. Exortação Apostólica Pós-sinodal Sacramentum Caritatis. São Paulo: Paulinas, 2007. n.45. 158
64
Bento XVI pede que se melhore a qualidade das homilias.
Pensando na importância da palavra de Deus, surge a necessidade de melhorar a qualidade da homilia; de fato, esta constitui parte integrante da ação litúrgica, cuja função é favorecer uma compreensão e eficácia mais ampla da palavra de Deus na vida dos fiéis. Por isso, os ministros ordenados devem preparar cuidadosamente a homilia, baseando-se num adequado conhecimento da Sagrada Escritura. Evitem-se homilias genéricas ou abstratas; de modo particular, peço aos ministros para fazerem com que a homilia coloque a palavra de Deus proclamada em estreita relação com a celebração sacramental e com a vida da comunidade, de tal modo que a palavra de Deus seja realmente apoio e vida da Igreja. Tenha-se presente, portanto, a finalidade catequética e exortativa da homilia. Considere-se que é oportuno oferecer prudentemente, a partir do Lecionário trienal, homilias temáticas aos fiéis, que tratem, ao longo do ano litúrgico, os grandes temas da fé cristã, haurindo de quanto está autorizadamente proposto pelo Magistério nos quatro pilares do Catecismo da Igreja Católica e no recente Compêndio: a profissão da fé, a celebração do mistério cristão, a vida em Cristo, a oração cristã.159
5.8.
Instrução Redemptionis Sacramentum
Uma instrução é escrita porque algum abuso está ou estava sendo cometido, neste caso abusos litúrgicos. Assim, este documento apresenta muitas normas. Sobre a celebração da Missa, o documento lembra que a Liturgia da Palavra e a liturgia eucarística estão intimamente unidas. “Portanto, não é lícito separar uma da outra, nem celebrá-las em lugares e tempos diversos. Tampouco é permitido realizar cada parte da sagrada Missa em momentos diversos, mesmo sendo feitas num mesmo dia”160. Sobre a escolha das leituras para a missa, “devem-se seguir as normas que se encontram nos livros litúrgicos, a fim de que verdadeiramente a mesa da Palavra de Deus se prepare com mais abundância para os fiéis e se abram a eles os
159
BENTO XVI, 2007, n.46. CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO E A DISCIPLINA DOS SACRAMENTOS. Redemptionis Sacramentum – sobre alguns aspectos que se devem observar acerca da Santíssima Eucaristia. São Paulo: Paulinas, 2004. n.60. 160
65 tesouros bíblicos”161. E, “não é permitido omitir ou substituir, arbitrariamente, as leituras bíblicas prescritas nem, sobretudo, modificar as leituras e o salmo responsorial, que contém a Palavra de Deus, com outros textos não bíblicos”162. É importante vermos também as normas em relação à proclamação do Evangelho:
A leitura evangélica, que constitui o momento culminante da Liturgia da Palavra, nas Celebrações da sagrada Liturgia, reserve-se apenas ao ministro ordenado, conforme à tradição da Igreja. Por isso não é permitido a um leigo, embora seja religioso, proclamar a leitura evangélica na celebração da santa Missa; nem tampouco nos outros casos, nos quais não seja explicitamente permitido pelas normas163.
Em relação à homilia, várias são as recomendações:
A homilia, feita durante a celebração da santa missa, é parte da própria liturgia; geralmente é feita pelo próprio sacerdote celebrante, ou por ele confiada a um sacerdote concelebrante, ou às vezes, segundo a oportunidade, também ao diácono, mas nunca a um leigo. Em casos particulares e por justo motivo, a homilia pode ser feita também por um bispo ou um presbítero que participa da celebração, mesmo que não possa concelebrar164.
Fala da reprovação de alguém não ordenado fazer a homilia:
Deve ser lembrado que, com base no que está prescrito no cânone 767, §1, fica revogada toda norma anterior que tenha permitido a fiéis não-ordenados fazer a homilia durante a Celebração Eucarística. De fato, tal praxe é reprovada e não pode, portanto, ser concedida em virtude de algum costume. A proibição de admissão dos leigos à pregação durante a celebração da missa vale também para os seminaristas, para os estudantes de disciplinas teológicas, para aqueles que tenham recebido o encargo
161
n.61.
162
CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO E A DISCIPLINA DOS SACRAMENTOS, 2004,
Ibid., n.62. Ibid., n.63. 164 Ibid., n.64. 163
66 de assistentes pastorais e para qualquer outro tipo, grupo, comunidade ou associação de leigos165.
Deve-se cuidar do fundamento da homilia:
Sobretudo, se deve cuidar que a homilia se fundamente estritamente nos mistérios da salvação, expondo ao longo do ano litúrgico, desde os textos das leituras bíblicas e os textos litúrgicos, os mistérios da fé e as normas da vida cristã, e oferecendo um comentário dos textos do Ordinário e do Próprio da Missa, e dos outros ritos da Igreja. É claro que todas as interpretações da Sagrada Escritura devem conduzir a Cristo, como ele sendo centro da economia da salvação, onde isto se deve realizar examinando-o desde o contexto preciso da celebração litúrgica. Ao fazer a homilia, procure-se iluminar, em Cristo, os acontecimentos da vida. Faça-se isto, sem dúvida, de tal modo que não se esvazie o sentido autêntico e genuíno da palavra de Deus, por exemplo, tratando só de política ou de temas profanos, ou tomando como fonte noções que provém de movimentos pseudoreligiosos de nossa época166.
O Bispo diocesano deve ter atenção quanto à prática da homilia. Ele “vigie com atenção a homilia, difundindo, entre os ministros sagrados, inclusive normas, orientações e ajudas e promovendo para este fim reuniões e outras iniciativas; desta maneira terão ocasião frequente de refletir com maior atenção sobre o caráter da homilia e encontrarão também uma ajuda para sua preparação”167. Outro abuso que teve que ser norteado foi a questão da Profissão de fé: “na santa Missa e em outras Celebrações da sagrada Liturgia não se admita um Credo ou Profissão de fé que não se encontre nos livros litúrgicos devidamente aprovados”168.
165
CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO E A DISCIPLINA DOS SACRAMENTOS, 2004,
n.65-66.
166
Ibid., n.67. Ibid., n.68. 168 Ibid., n.69. 167
67
5.9.
Guia Litúrgico-Pastoral da CNBB
No Guia Litúrgico-Pastoral, o segundo capítulo trata da Celebração Eucarística. Ao tratar da Liturgia da Palavra, vemos:
Na Liturgia da Palavra, Deus chama e propõe as condições da aliança, o povo as ouve e aceita. Na Liturgia Eucarística, a aliança é “selada” no sangue do Cordeiro. Agora o Cristo, em seu mistério pascal (Evangelho), é a chave de leitura da revelação bíblica (demais leituras) e dos acontecimentos atuais (a vida que trazemos para a eucaristia). Quando, na missa, lemos e interpretamos as Sagradas Escrituras, é o próprio Cristo que fala (cf. SC 7). A força sacramental da Palavra na liturgia faz acontecer aquilo que anuncia; realiza nossa transformação pascal. Na Liturgia da Palavra, Cristo está realmente presente e atuante no Espírito Santo169.
O Guia faz algumas recomendações em relação aos leitores:
Daí decorre a exigência para os leitores, ainda maior para quem proclama o Evangelho, de ter uma atitude espiritual de quem está sendo porta-voz de Deus que fala ao seu povo. À preparação espiritual se alia a preparação técnica: postura do corpo, tom de voz, semblante, a maneira de aproximar-se da mesa da palavra, as vestes.170
Também menciona a importância do salmista. “Sua função ministerial corresponde à função dos leitores e leitoras, pois o salmo é também Palavra de Deus posta em nossa boca para respondermos à sua revelação. Por isso, o salmo deve ser proclamado do ambão e, se possível, cantado”171. Fala do que é a homilia. “A homilia (conversa familiar) interpreta as leituras bíblicas dentro da realidade atual, tem o mistério de Cristo como centro do anúncio e faz ligação com a liturgia eucarística (dimensão mistagógica) e com a vida (compromisso e missão)”172.
169
CNBB. Guia Litúrgico-Pastoral. Brasília: Edições CNBB, 2006. p.30. CNBB, loc. cit. 171 CNBB, loc. cit. 172 CNBB, loc. cit. 170
68 O silêncio é um outro ponto destacado pelo documento: “Em todo o rito, a Palavra é realçada também por momentos de silêncio, por exemplo, após as leituras, o salmo e a homilia, fortalecendo a atitude de acolhida à Palavra. No silêncio, o Espírito torna fecunda a Palavra no coração da comunidade”173. E quanto à utilização do Evangeliário na procissão de entrada, e a orientação de quando entrar a Bíblia: “Priorize-se a entrada solene do Evangeliário na procissão inicial. Na falta deste, embora não mereçam a mesma solenidade, podem ser trazidos o Lecionário ou a Bíblia. A entrada com a Bíblia se faça só em ocasiões bem especiais”174.
5.10. Lineamenta do XII Sínodo dos Bispos: A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja
No XII Sínodo Geral dos Bispos foi tratado sobre A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja. A lineamenta em preparação a este sínodo nos diz:
[...] dever-se-á dar a máxima atenção à Liturgia da Palavra, antes de mais na Eucaristia, mas também em todos os outros sacramentos, com a proclamação clara e compreensível dos textos; com a homilia, que da Palavra se torna ressonância límpida e encorajadora, ajudando a interpretar os acontecimentos da vida e da história à luz da fé; com a oração dos fiéis, que seja resposta de louvor, de ação de graças e de pedido a Deus que nos falou.175
5.11. Mensagem do XII Sínodo dos Bispos ao povo de Deus: A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja
A mensagem de encerramento do Sínodo faz menção ao anúncio da Palavra, em especial através da homilia:
173
CNBB, 2006, p.31. CNBB, loc. cit. 175 SÍNODO GERAL DOS BISPOS. Lineamenta. Disponível em: <http://www.vatican.va/roman_ curia/synod/documents/rc_synod_doc_20070427_lineamenta-xii-assembly_po.html>. Acesso em: 21 de abr. de 2010. n.22. 174
69
(...) o vértice da pregação está na homilia que, ainda hoje, para muitos cristãos, é o momento capital do encontro com a Palavra de Deus. Neste ato, o ministro deveria transformar-se também em profeta. De fato, ele deve, com uma linguagem nítida, incisiva e substanciosa, não só, com autoridade, “anunciar as maravilhosas obras de Deus na história da salvação” (SC 35) - anteriormente oferecidas - através de uma clara e viva leitura do texto bíblico proposto pela liturgia. Ele deve também atualizar essas obras para os tempos e os momentos vividos pelos ouvintes e suscitar nos seus corações a questão da conversão e do compromisso de vida: “Que devemos fazer?” (Atos 2, 37). Anúncio, catequese e homilia supõem, portanto, uma leitura e uma compreensão, uma explicação e uma interpretação, um envolvimento da mente e do coração. Na pregação realiza-se, deste modo, um duplo movimento. Com o primeiro, remonta-se às origens dos textos sagrados, dos acontecimentos, das palavras geradoras da história da salvação, para compreendê-las no seu significado e na sua mensagem. Com o segundo movimento, volta-se ao presente, ao hoje vivido por quem escuta e lê, sempre à luz de Cristo, que é o fio luminoso destinado a unir as Escrituras. Foi o que o próprio Jesus realizou – como já foi dito – no itinerário de Jerusalém a Emaús, na companhia de dois dos seus discípulos.176
5.12. Exortação Apostólica Pós-Sinodal Verbum Domini
Esta Exortação Apostólica Pós-Sinodal, do Papa Bento XVI, sobre a Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja, nos mostra pontos importantes sobre a Liturgia da Palavra. Destaca a sacramentalidade da Palavra:
Com o apelo ao caráter performativo da Palavra de Deus na ação sacramental e o aprofundamento da relação entre Palavra e Eucaristia, somos introduzidos num tema significativo, referido durante a Assembleia do Sínodo: a sacramentalidade da Palavra. A este respeito é útil recordar que o Papa João Paulo II já aludira ao horizonte sacramental da Revelação e, de forma particular, ao sinal eucarístico, onde a união indivisível entre a realidade e o respectivo significado permite identificar a profundidade do mistério. Daqui se compreende que, na origem da sacramentalidade da Palavra de Deus, esteja precisamente o mistério da encarnação: o Verbo fez-Se carne (Jo 1, 14), a realidade do mistério revelado oferece-se a nós na carne do Filho. A Palavra de Deus torna-se perceptível à fé através 176
SÍNODO GERAL DOS BISPOS. Mensagem do Sínodo dos Bispos ao Povo de Deus. Disponível em: <http://www.vatican.va/roman_curia/synod/documents/rc_synod_doc_20051022_mess age-synod_po.html>. Acesso em: 21 de abr. de 2010. n.7.
70 do sinal de palavras e gestos humanos. A fé reconhece o Verbo de Deus, acolhendo os gestos e as palavras com que Ele mesmo se nos apresenta. Portanto, o horizonte sacramental da revelação indica a modalidade histórico-salvífica com que o Verbo de Deus entra no tempo e no espaço, tornando-Se interlocutor do homem, chamado a acolher na fé o seu dom. Assim é possível compreender a sacramentalidade da Palavra através da analogia com a presença real de Cristo sob as espécies do pão e do vinho consagrados. Aproximando-nos do altar e participando no banquete eucarístico, comungamos realmente o corpo e o sangue de Cristo. Na proclamação da Palavra de Deus na celebração comporta reconhecer que é o próprio Cristo que Se faz presente e Se dirige a nós para ser acolhido. Referindo-se à atitude que se deve adotar tanto em relação à Eucaristia como à Palavra de Deus, São Jerônimo afirma: Lemos as Sagradas Escrituras. Eu penso que o Evangelho é o Corpo de Cristo; penso que as santas Escrituras são o seu ensinamento. E quando Ele fala em “comer a minha carne e beber o meu sangue” (Jo 6, 53), embora estas palavras se possam entender do Mistério [eucarístico], todavia também a palavra da Escritura, o ensinamento de Deus, é verdadeiramente o corpo de Cristo e o seu sangue. Quando vamos receber o Mistério [eucarístico], se cair uma migalha sentimo-nos perdidos. E, quando estamos a escutar a Palavra de Deus e nos é derramada nos ouvidos a Palavra de Deus que é carne de Cristo e seu sangue, se nos distrairmos com outra coisa, não incorremos em grande perigo? Realmente presente nas espécies do pão e do vinho, Cristo está presente, de modo análogo, também na Palavra proclamada na liturgia. Por isso, aprofundar o sentido da sacramentalidade da Palavra de Deus pode favorecer uma maior compreensão unitária do mistério da revelação em ações e palavras intimamente relacionadas, sendo de proveito à vida espiritual dos fiéis e à ação pastoral da Igreja.177
O Sínodo destaca também a importância do Lecionário:
A reforma desejada pelo Concílio Vaticano II mostrou os seus frutos, tornando mais rico o acesso à Sagrada Escritura que é oferecida abundantemente, sobretudo nas liturgias do domingo. A estrutura atual, além de apresentar com frequência os textos mais importantes da Escritura, favorece a compreensão da unidade do plano divino, através da correlação entre as leituras do Antigo e do Novo Testamento, centrada em Cristo e no seu mistério pascal. Certas dificuldades que se sentem ao querer identificar as relações entre as leituras dos dois Testamentos devem ser consideradas à luz da leitura canônica, ou seja, da unidade intrínseca da Bíblia inteira. Onde se sentir a necessidade, os organismos competentes podem prover à publicação de subsídios que tornem mais fácil compreender o nexo entre as leituras propostas pelo Lecionário, que devem ser 177
n.56.
BENTO XVI. Exortação Apostólica Pós-Sinodal Verbum Domini. São Paulo: Paulinas, 2010.
71 todas proclamadas na assembleia litúrgica, como previsto pela liturgia do dia. Eventuais problemas e dificuldades sejam assinalados à Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos. Além disso, não devemos esquecer que o Lecionário atual do rito latino tem também um significado ecumênico, visto que é utilizado e apreciado mesmo por confissões em comunhão ainda não plena com a Igreja Católica. De modo diverso se apresenta o problema do Lecionário nas liturgias das Igrejas Católicas Orientais, que o Sínodo pede para ser examinado com autoridade segundo a tradição própria e as competências das Igrejas sui iuris e tendo em conta também o contexto ecumênico.178
No número 58, os padres sinodais se detiveram em falar sobre a proclamação da Palavra e o ministério do leitorado:
Como é sabido, enquanto o Evangelho é proclamado pelo sacerdote ou pelo diácono, a primeira e a segunda leitura na tradição latina são proclamadas pelo leitor encarregado, homem ou mulher. Quero aqui fazer-me eco dos Padres sinodais que sublinharam, também naquela circunstância, a necessidade de cuidar, com uma adequada formação, o exercício da função de leitor na celebração litúrgica e de modo particular o ministério do leitorado que, enquanto tal, no rito latino, é ministério laical. É necessário que os leitores encarregados de tal serviço, ainda que não tenham recebido a instituição no mesmo, sejam verdadeiramente idôneos e preparados com empenho. Tal preparação deve ser não apenas bíblica e litúrgica, mas também técnica: A formação bíblica deve levar os leitores a saberem enquadrar as leituras no seu contexto e a identificarem o centro do anúncio revelado à luz da fé. A formação litúrgica deve comunicar aos leitores uma certa facilidade em perceber o sentido e a estrutura da Liturgia da Palavra e os motivos da relação entre a Liturgia da Palavra e a liturgia eucarística. A preparação técnica deve tornar os leitores cada vez mais idôneos na arte de lerem em público, tanto com a simples voz natural, como com a ajuda dos instrumentos modernos de amplificação sonora.179
Um outro ponto tratado neste documento é a homilia.
(...) A homilia constitui uma atualização da mensagem da Sagrada Escritura, de tal modo que os fiéis sejam levados a descobrir a presença e a eficácia da Palavra de Deus no momento atual da sua vida. Aquela deve levar à compreensão do mistério que se celebra; convidar para a missão, preparando a assembleia para a profissão de fé, a oração universal e a liturgia eucarística. Consequentemente, 178 179
BENTO XVI, 2010, n.57. Ibid, n.58.
72 aqueles que, por ministério específico, estão incumbidos da pregação tenham verdadeiramente a peito esta tarefa. Devem-se evitar tanto homilias genéricas e abstratas que ocultam a simplicidade da Palavra de Deus, como inúteis divagações que ameaçam atrair a atenção mais para o pregador do que para o coração da mensagem evangélica. Deve resultar claramente aos fiéis que aquilo que o pregador tem a peito é mostrar Cristo, que deve estar no centro de cada homilia. Por isso, é preciso que os pregadores tenham familiaridade e contato assíduo com o texto sagrado; preparem-se para a homilia na meditação e na oração, a fim de pregarem com convicção e paixão. A assembleia sinodal exortou a ter presentes as seguintes perguntas: O que dizem as leituras proclamadas? O que dizem a mim pessoalmente? O que devo dizer à comunidade, tendo em conta a sua situação concreta?. O pregador deve deixar-se interpelar primeiro pela Palavra de Deus que anuncia, porque – como diz Santo Agostinho – seguramente fica sem fruto aquele que prega exteriormente a Palavra de Deus sem a escutar no seu íntimo. Cuide-se, com atenção particular, da homilia dos domingos e solenidades; e mesmo durante a semana, nas Missas cum populo, quando possível, não se deixe de oferecer breves reflexões, apropriadas à situação, para ajudar os fiéis a acolherem e tornarem fecunda a Palavra escutada.180
Os padres sinodais insistiram na importância do silêncio durante a Liturgia da Palavra:
De fato, a palavra pode ser pronunciada e ouvida apenas no silêncio, exterior e interior. O nosso tempo não favorece o recolhimento e, às vezes, fica-se com a impressão de ter medo de se separar, por um só momento, dos instrumentos de comunicação de massa. Por isso, hoje é necessário educar o Povo de Deus para o valor do silêncio. Redescobrir a centralidade da Palavra de Deus na vida da Igreja significa também redescobrir o sentido do recolhimento e da tranquilidade interior. A grande tradição patrística ensina-nos que os mistérios de Cristo estão ligados ao silêncio e só nele é que a Palavra pode encontrar morada em nós, como aconteceu em Maria, mulher indivisivelmente da Palavra e do silêncio. As nossas liturgias devem facilitar esta escuta autêntica: Verbo crescente, verba deficiunt. Que este valor brilhe particularmente na Liturgia da Palavra, que deve ser celebrada de modo a favorecer a meditação. O silêncio, quando previsto, deve ser considerado como parte da celebração. Por isso, exorto os Pastores a estimularem os momentos de recolhimento, nos quais, com a ajuda do Espírito Santo, a Palavra de Deus é acolhida no coração.181
180 181
BENTO XVI, 2010, n.59. Ibid., n.66.
73 O Sínodo também insiste em solenizar os momentos da Palavra.
(...) solenizar, sobretudo em ocorrências litúrgicas relevantes, a proclamação da Palavra, especialmente do Evangelho, utilizando o Evangeliário, conduzido processionalmente durante os ritos iniciais e depois levado ao ambão pelo diácono ou por um sacerdote para a proclamação. Deste modo ajuda-se o Povo de Deus a reconhecer que a leitura do Evangelho constitui o ápice da própria Liturgia da Palavra. Seguindo as indicações contidas no Ordenamento das Leituras da Missa, é bom valorizar a proclamação da Palavra de Deus com o canto, particularmente o Evangelho, de modo especial em determinadas solenidades. A saudação, o anúncio inicial: „Evangelho de Nosso Senhor…‟ e a exclamação final „Palavra da salvação‟, seria bom proferi-los em canto para evidenciar a importância do que é lido.182
182
BENTO XVI, 2010, n.67.
6. O ESPAÇO LITÚRGICO DO ANÚNCIO DA PALAVRA
O Espaço litúrgico do Anúncio da Palavra é a Mesa da Palavra, também conhecida pelo nome de ambão183. A palavra ambão deriva do gregoque significa subir para o alto, lugar elevado. O ambão, que costuma estar em um lugar elevado, é o lugar de onde Deus fala. Este espaço possui um sentido simbólico-sacramental de fundamental importância: evoca a presença viva do Senhor que fala para seu povo. A introdução do ritual de bênção de novo ambão diz que “o ambão, isto é, o lugar donde se anuncia a Palavra de Deus, deve corresponder à dignidade da mesma e fazer lembrar aos fiéis que a mesa da Palavra de Deus está sempre posta”184. A Instrução Geral ao Missal Romano afirma que a Mesa da Palavra é um lugar condigno: “a dignidade da Palavra de Deus requer na igreja um lugar condigno de onde possa ser anunciada e para onde se volte espontaneamente a atenção dos fiéis no momento da Liturgia da Palavra”185. A Mesa da Palavra situa-se em lugar de destaque, pois expressa a veneração que a Igreja tem pelas Sagradas Escrituras. Segundo Jounel, ela é “herdeira da tribuna de madeira construída para a ocorrência, sobre a qual o escriba Esdras diante da porta das águas leu o livro da lei. “Esdras abriu o livro na presença de todo o povo, pois se achava acima de todo o povo” (Ne 8, 5)”186. Mais adiante, ele
183
Em alguns momentos utilizarei o termo ambão e em outros Mesa da Palavra. Mas prefiro dar ênfase ao termo Mesa da Palavra pela sua correlação com a Mesa Eucarística (altar). 184 RITUAL de Bênçãos. Restaurado por decreto do Concílio Ecumênico Vaticano II e promulgado por autoridade de João Paulo II. Trad. Portuguesa da edição típica para o Brasil realizada e publicada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. São Paulo: Paulus, 1990. n.900. 185 ALDAZÁBAL, J (com.). Instrução geral sobre o Missal Romano: terceira edição. São Paulo: Paulinas, 2007. n. 309. 186 JOUNEL, P. Lugares da celebração. In: SARTORE, D. & TRIACCA, A.M. Dicionário de Liturgia. São Paulo: Paulinas, p. 698.
75 continua dizendo que o púlpito onde o leitor coloca o livro se torna uma espécie de trono187. A mesa da Palavra, “segundo a tradição cristã, faz referência ao sepulcro vazio, ao lugar da Ressurreição e do anúncio do Cristo vivo” 188. Wilmsen nos diz que o anúncio “Ele ressuscitou, ele não está mais aqui”189 “é o anúncio fundamental cristão. Não há outra mensagem. A chave de leitura de qualquer pronunciamento do ambão é a novidade absoluta do anjo: Cristo ressuscitou”190. A Constituição Dogmática Dei Verbum nos fala da mesa da Palavra em paralelo com a da Eucaristia. “A Igreja venerou as divinas Escrituras, como também o próprio Corpo do Senhor; sobretudo na sagrada liturgia, nunca deixou de tomar e distribuir aos fiéis, da mesa da Palavra de Deus como do Corpo de Cristo”191. E a Constituição Sacrosanctum Concilium nos afirma que “as duas partes de que se compõe de certa forma a Missa, isto é, a Liturgia da Palavra e a liturgia Eucarística, estão estritamente unidas, que formam um só ato de culto”192.
6.1. Percurso Histórico da Mesa da Palavra
Na antiguidade, os mestres ensinavam de sua cadeira, em torno da qual estavam os discípulos. E, vendo Mt 23,2, percebemos que, nas sinagogas, os escribas e fariseus falavam e ensinavam da “cadeira de Moisés”. A
comunidade
cristã
primitiva
era
doméstica,
a
vida
comunitária
desenvolveu-se em casas privadas. Richter cita Hans-Josef Klauck descrevendo que “a pregação apostólica e a refeição tomada com alegria indicam que a Palavra e a Ceia do Senhor são as colunas da vida das comunidades domésticas. (...) A casa, 187
Cf. JOUNEL, loc. cit. CNBB. Guia Litúrgico-Pastoral. Brasília: Edições CNBB, 2007.p.94. 189 Lc 24,6. 190 WILMSEN, Klaus Carlos. Ambão Monumentum Paschale: algumas considerações a respeito do espaço litúrgico atual. In: SILVA, Fr. José Ariovaldo da e SIVINSKI, Marcelino. Liturgia: um direito do povo. Petrópolis: RJ, Vozes, 2001. p. 208. 191 CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. Constituição Dogmática Dei Verbum: Sobre a Revelação Divina. In: Documentos Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965). São Paulo: Paulus, 1997. n. 21. 192 CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. Constituição Sancrosanctum Concilium: Sobre a Sagrada Liturgia. In: Documentos Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965). São Paulo: Paulus, 1997. n.56. 188
76 cuja indicação muitas vezes é ignorada, é utilizada para que a comunidade doméstica possa desenvolver as suas atividades”193. Sobre o local do anúncio da Palavra, ele mostra que “encontra-se no lado oriental do pequeno espaço comunitário um estrado (...). Se não era o próprio bispo a ler a leitura, levantava-se certamente um dos presbíteros sentados a seu lado, avançava talvez um ou dois passos e em pé proclamava os textos”194. Na Grécia, no final do sec. IV, é conhecida uma tribuna para os leitores. Ela servia para a proclamação das leituras, enquanto o lugar da homilia continuava a ser da cátedra. Na Síria desenvolve-se o “bema” (semelhante ao bema do judaísmo), uma tribuna situada no meio da igreja, mais ou menos elevada sobre o chão e provida com grades. O “bema” era o lugar central da Liturgia da Palavra e era estruturado precisamente com a mesma importância da zona do altar. “A assembleia estava ao redor do “bema” durante a celebração da Palavra, enquanto que em seguida se reunia para a Celebração Eucarística à volta do altar, colocado mais a Oriente”195. Com as invasões árabes e a islamização, perde-se esta concepção. Os ambões antigos eram formados por escadas, degraus, e cada qual representava a categoria e a função exercidas. “A plataforma superior era utilizada pelo diácono para o Evangelho, o subdiácono lia a epístola no segundo plano e os clérigos inferiores liam as outras partes da Escritura no degrau inferior” 196. Como diz Jungmann:
A maior dignidade do Evangelho é ressaltada agora, por exemplo, pelo local onde acontece sua leitura. A altura completa do ambão é reservada exclusivamente para ele; a epístola e os cânticos entre as leituras, principalmente o “graduale”, devem se contentar com o degrau (...)197.
193
RICHTER, Klemens. Espaços de igrejas e imagens de Igreja: O significado do espaço litúrgico para uma comunidade viva. Coimbra: Gráfica de Coimbra 2. p.51. 194 Ibid., p.101. 195 Ibid., p.102. 196 PLAZAOLA, J. El Arte Sacro Actual. Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos, 1965. p. 173. 197 JUNGMANN, J.A. Missarum Sollemnia. São Paulo: Paulus, 2009. p.93.
77 Na antiguidade, o ambão devia ser, “como disse Santo Isidoro de Sevilla, um lugar elevado e solene, provido de um átrio de dimensões proporcionais ao caráter sagrado de sua função”198. Durante a Idade Média, percebemos que, no Ocidente, o lugar do anúncio muda várias vezes, sempre na procura de uma solução ideal. Quando o altar se desloca para a parede oriental, e o sacerdote lia em latim voltado para o altar em vez de voltado para a assembleia, a Epístola do lado direito do presbitério e o Evangelho do lado esquerdo, deixou de ser necessário um ambão. A celebração da Palavra perdeu o seu verdadeiro significado. No período românico, o ambão teve seu apogeu. Erguido em colunas e enriquecido de significativa iconografia, em mosaico e esculturas, sempre calcada em tipos e antítipos da Escritura, tendo ao lado um candelabro para o Círio Pascal199. Segundo Frade
com as mudanças ocorridas na compreensão e no rito da missa, por razões simbólicas e de evolução histórica, no século XII, o lugar destinado à leitura do Evangelho passou a ser o lado norte do presbitério, e ao mesmo tempo começou o subdiácono a sustentar o Evangeliário, que já não se colocava mais sobre a estante.200
No século XIII acontece uma grande transformação,
aparecendo então um elemento de separação entre a assembleia, que ficava na nave, e os presbíteros, que ocupavam o presbitério. Este elemento é uma espécie de meia parede para proteger do frio intenso que fazia no interior das igrejas e catedrais góticas. Sobre estas meias paredes havia uma espécie de corredor e nas suas extremidades, um espaço um pouco mais amplo de onde os presbíteros liam algum texto da palavra de Deus ou faziam as suas pregações. Este espaço passou a chamar-se jubé, da palavra latina, iube domne benedicere201.
198
PLAZAOLA, 1965, p. 174. MORAES, F.F. O espaço do culto: à imagem da Igreja. São Paulo: Loyola, 2009. p.131. 200 FRADE, Gabriel. Arquitetura Sagrada no Brasil. Sua evolução até as vésperas do Concílio Vaticano II. Edições Loyola: São Paulo, 2007. p. 165-166. 201 SONDA, L. O Ambão. Revista de liturgia, São Paulo, p.22, n. 189, maio./jun. 2005. 199
78 No início da época barroca, o ambão é retirado de quase todas as igrejas católicas. Agora, Cristo presente no tabernáculo e na custódia devia poder ver toda a assembleia202. No século XIII surgiram os púlpitos. Nas igrejas paroquiais203 verifica-se que se passa de ambões próximos do altar para púlpitos situados na nave. Isto aconteceu “na medida em que desaparecem os vários livros litúrgicos, pouco a pouco concentrados todos no missal com praticamente um único ministro, o sacerdote”204, e também aconteceu por causa da crescente ascensão da pregação. Para a pregação eram usados inicialmente lugares de pregação feitos de madeira, e a partir do século XIV usam-se púlpitos de pedra. Por motivos práticos, estes locais de pregação deixaram de ser colocados no meio da igreja, onde podiam estorvar, por causa de procissões, mas eram colocados junto a uma coluna, geralmente no lado do Evangelho da nave central.
O púlpito se tornará peça indispensável nas igrejas, pois a pregação da doutrina terá prioridade sobre a celebração propriamente dita (...). Muitas igrejas possuem dois púlpitos, para que a pregação fosse dialogada entre dois pregadores, um deles fazendo o papel de „advogado do diabo‟. Ele se transforma em emblema da pregação, nem sempre necessário do ponto de vista funcional (...). Mas era elemento importante na composição do espaço205.
O Concílio Vaticano II trouxe uma grande renovação litúrgica, renovação esta que já vinha sendo trabalhada pelo Movimento Litúrgico. Neste Concílio, como já vimos anteriormente, se redescobre o valor da Palavra de Deus e o espaço para a sua proclamação, a mesa da Palavra. E, percebe-se que a importância que o Concílio Vaticano II atribui à proclamação da Palavra dificilmente se pode harmonizar com o sermão no púlpito. Assim pareceu sensato aproximar novamente o altar da assembleia e ao mesmo tempo reorganizar o lugar do anúncio, voltando à mesa da Palavra da Igreja dos primeiros séculos, única e também próxima do povo. 202
RICHTER, p.104. As igrejas paroquiais eram importantes centros organizadores e estruturadores do espaço urbano, congregando os habitantes da freguesia, sobre os quais exerciam a sua jurisdição. Entre si traçavam-se as fronteiras invisíveis, que delimitavam os espaços de cada paróquia, definindo a quem os fregueses deveriam as suas obrigações. 204 MORAES, 2009, p.131. 205 Ibid., p.132. 203
79 No Pós-Concílio Vaticano II, com a Instrução Geral do Missal Romano vemos que
a dignidade da palavra de Deus requer na igreja um lugar condigno de onde possa ser anunciada e para onde se volte espontaneamente a atenção dos fiéis no momento da Liturgia da Palavra. De modo geral, convém que esse lugar seja uma estrutura estável e não uma simples estante móvel. O ambão seja disposto de tal modo em relação à forma da igreja que os ministros ordenados e os leitores possam ser vistos e ouvidos facilmente pelos fiéis. Do ambão são proferidas somente as leituras, o salmo responsorial e o precônio pascal; também se podem proferir a homilia e as intenções da oração universal ou oração dos fiéis. A dignidade do ambão exige que a ele suba somente o ministro da palavra206.
Muitos foram os padres que interpretaram de modo equivocado os ensinamentos do Concílio. Na questão das construções de igrejas, teve-se um grande relaxamento litúrgico e arquitetônico. Tanto que, ainda hoje, em muitas igrejas percebemos a ausência da mesa da Palavra. “Vemos estantes móveis embrulhadas em panos, no presbitério, que às vezes devem dar lugar a outras cenografias de ocasião: o “altar” de algum santo ou o presépio, por exemplo” 207. Mesmo percebendo a ausência da mesa da Palavra em algumas igrejas, temos a alegria de que muitas já possuem, ou estão se esforçando para ter, um lugar condigno para o anúncio da Palavra.
6.2. A Mesa da Palavra na Liturgia
A Mesa da Palavra, por ser o lugar digno da proclamação da Palavra no espaço celebrativo-litúrgico, é um lugar constitutivo da liturgia da missa e das celebrações litúrgico-sacramentais. A Mesa da Palavra é o ponto convergente da Liturgia da Palavra, é o lugar de onde os ministros proclamam a Palavra de Deus. Ela é reservada, por sua natureza, às leituras, ao salmo responsorial e ao anúncio da Páscoa.
206 207
ALDAZÁBAL, 2007. n.309. MORAES, 2009, p.132.
80 Na missa e em todas as celebrações, a Liturgia da Palavra é parte integrante. Assim, a Mesa da Palavra é um elemento físico necessário em todas as celebrações litúrgico-sacramentais. Em questão de espaço litúrgico, a Igreja deve ter um lugar elevado para ser utilizado para a proclamação da Palavra. A Mesa da Palavra não deve ser portátil, mas sim estável. Deve ser de material nobre, mostrando uma nobre simplicidade, que atenda à dignidade da Palavra de Deus e recorde aos fiéis que na missa se prepara a mesa da Palavra de Deus e do corpo de Cristo. Também deve estar adequadamente disposto, segundo a estrutura de cada igreja, para que os fiéis possam ver e ouvir bem os ministros208. A Mesa da Palavra deve ser abençoada antes de ser utilizada para as ações litúrgicas. E a bênção deve ser conforme o rito proposto no ritual de bênção209. A Mesa da Palavra, como já foi mencionado anteriormente, deve ser de material nobre, e também deve ser sólido. O material deve estar de acordo com o utilizado no altar e na cadeira presidencial. Vemos no Código de Direito Canônico que o altar deve, “de acordo com o costume tradicional da Igreja, ser de pedra e de uma única pedra natural; mas pode ser usada também outra matéria digna e sólida, a juízo da Conferência dos Bispos. Contudo, os suportes ou base podem ser feitos de qualquer matéria”210. E no apêndice do Código de Direito Canônico, o cânon 1236 descreve que “na confecção da mesa do altar fixo, além da pedra natural, poderão também ser empregadas madeiras de lei, granitina, marmorite, metal e outras matérias de reconhecida durabilidade”211. Sobre a iluminação, deve ser boa, para que o ministro possa proferir a leitura com boa claridade, e qualidade. Referente à harmonia do tamanho e do material da Mesa da Palavra, Laide mostra que
208
Cf. ALDAZÁBAL, 2007. n.309; ELENCO das leituras da missa. Restaurado por decreto do Sagrado Concílio Ecumênico Vaticano II e promulgado pela autoridade do Papa Paulo VI. Trad. Portuguesa da segunda edição típica para o Brasil realizada e publicada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e aprovada pela Sé Apostólica. São Paulo: Paulus, 1997. n.32; 209 Cf. RITUAL, 1990, n.902-918. 210 IGREJA CATÓLICA. Código de Direito Canônico. Promulgado por João Paulo II, Papa. São Paulo: Loyola, 2001. cân.1236. 211 Ibid., p.425.
81 isso pode ser garantido adotando nas peças o mesmo design e material e evitando rebuscamento e excesso de elementos simbólicos, que ofuscam o essencial. Nunca houve, nos melhores momentos da vida da Igreja, peças carregadas de detalhes, como às vezes se insiste em fazer, apesar de não estarmos mais vivendo na época do barroco. As peças devem combinar unidade, se, ao projetar, não se contempla o espaço como um todo. Devemos pensar as peças junto com o projeto e evitar o uso de móveis fabricados em série, sem nenhum compromisso com o estilo da construção onde serão colocados212.
A Mesa da Palavra deve ser única, e sobre o local não se tem unanimidade na definição. Pode estar de um lado do presbitério, não havendo a necessidade de assegurar a existência de algo exatamente do outro lado para equilibrar os elementos estéticos. Mas, pode também estar junto da assembleia, ou próximo a ela. Moraes nos diz que, como a mesa da Palavra deve ser um lugar elevado, “essa característica é o que autoriza também supor que a mesa da Palavra não esteja no presbitério, que já possui sua própria elevação”213. Ainda segundo Moraes, “é natural que o lugar da proclamação da Escritura seja elevado, pois faz referência direta às „grandes revelações‟ que se deram em lugares altos. [...] Os sinóticos todos localizam a transfiguração, a grande revelação do Filho amado para os discípulos, sobre uma alta montanha”214. Depois do Concílio Vaticano II, achando-se que se poderia fazer do jeito que quisesse o espaço celebrativo-litúrgico, muitas igrejas foram deixando de ter o aspecto litúrgico-celebrativo. A Mesa da Palavra acabou “sofrendo muitos pecados”. Muitas vezes, simplesmente não há; outras vezes, há duas mesas da Palavra, derivadas dos lugares de leitura, uma para a epístola e outra para o Evangelho; em outras, uma simples estante, pouco significativa e móvel; muitas vezes ainda, é escondida pela quantidade de flores e ornamentos; também é usada para o que não é de sua finalidade: dirigir cantos, fazer os comentários, dar avisos, rezar o rosário, etc.; a sonorização e sua iluminação são deficientes215; a Mesa da Palavra serve de apoio para livros e papéis durante a Celebração Eucarística, da Liturgia das Horas e em outras celebrações litúrgico-sacramentais. 212
SONDA, p.22-23, n.189, maio/jun. 2005. MORAES, 2009, p.133. 214 MORAES, loc. cit. 215 Cf. CERVANTES, A.A.; PÉREZ, A.S. Firmino e Libério: pílulas litúrgicas. São Paulo: Loyola, 2008. p.357-359. 213
CONCLUSÃO
Ao longo deste trabalho, perpassamos algumas reflexões sobre o anúncio da Palavra de Deus nas Escrituras; as mudanças na Liturgia da Palavra no decorrer do processo histórico; a importância do livro, e o papel do leitor; a estrutura da Liturgia da Palavra, o significado e a importância de cada momento; o Anúncio da Palavra nos documentos da Igreja; e o local do anúncio da Palavra. E, assim, podemos concluir: A Palavra possui uma dimensão sacramental. Sobre esta dimensão, a Verbum Domini, no número 56, mostra que “é possível compreender a sacramentalidade da Palavra através da analogia com a presença real de Cristo sob as espécies do pão e do vinho consagrados. Aproximando-nos do altar e participando no banquete eucarístico, comungamos realmente o Corpo e o Sangue de Cristo. A proclamação da Palavra de Deus na celebração comporta reconhecer que é o próprio Cristo que Se faz presente e dirige-se a nós para ser acolhido”. Essa sacramentalidade proporciona uma melhor ação da Palavra na vida da Igreja. A Liturgia da Palavra ficou por séculos sem ter recebido o devido valor. O Concílio Vaticano II provocou na Igreja uma verdadeira revalorização da Palavra. O número 24 da Constituição Sacrosanctum Concilium afirma que “é enorme a importância da Sagrada Escritura na celebração da Liturgia. Porque é a ela que se vão buscar as leituras que se explicam na homilia e os salmos para cantar; com o seu espírito e da sua inspiração nasceram as preces, as orações e os hinos litúrgicos; dela tiram a sua capacidade de significação as ações e os sinais”. Dessa forma, o sentido da Escritura para a vida do povo de Deus recebeu um grande impulso através da liturgia. O povo tem o direito de se alimentar da Palavra de Deus, não sendo somente a Eucaristia, mas também a Palavra, o alimento da vida cristã. Na
83 Liturgia da Palavra, o povo recebe o anúncio dos ensinamentos de Jesus Cristo e de sua paixão, morte e ressurreição. Com o Concílio Vaticano II, alguns momentos da Liturgia da Palavra foram revalorizados. Entre esses momentos, o salmo, a homilia e a oração dos fiéis. O salmo é a oração da Igreja. No salmo responsorial acontece a resposta à Palavra de Deus ouvida; inspirados pelo Espírito Santo, os salmos são reinterpretados a partir dos acontecimentos da morte-ressurreição de Jesus. A homilia tem como estrutura a reflexão da passagem bíblica, relacionandoa com a vida, e com a realidade. Ela deve ser a Palavra que converte e que muda a vida. Não é o sermão, com lições de moral; mas é uma reflexão sobre a Palavra de Deus na vida e na realidade da comunidade. A Oração dos Fiéis é o fruto da ação da Palavra de Deus nos corações dos fiéis, pois, uma vez por ela instruídos, dinamizados e renovados, estão agora aptos para orar pelas necessidades de toda a Igreja e do mundo. O evento salvífico anunciado na Palavra deve cumprir-se em todas as pessoas, segundo a vontade do Pai. A Igreja, atualmente, experimenta um grande momento de reavivamento da Palavra na sua vida e missão. Com a contribuição deste trabalho, juntamente com todos os documentos da Igreja, somos convidados a aprofundar esses temas e a refletir sobre todo o significado da Palavra na vida da Igreja.
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ANEXO ELENCO DAS LEITURAS DA MISSA216 Introdução Geral Proêmio CAPÍTULO I Princípios gerais para a celebração litúrgica da Palavra de Deus 1. Algumas premissas a) Importância da Palavra de Deus na celebração litúrgica 1. O Concílio Vaticano II, o magistério dos Sumos Pontífices e os vários documentos promulgados depois do mesmo Concílio por diversas Congregações da Santa Sé apontaram muitos aspectos sobre o valor da Palavra de Deus e sobre a restauração do uso da Sagrada Escritura em toda celebração litúrgica. Além disso, na Introdução ao Elenco das Leituras da Missa, publicados em 1969, foram oportunamente propostos e brevemente ilustrados alguns princípios de especial importância. Mas agora, por ocasião desta nova edição do Elenco das Leituras da Missa, já que de diferentes lugares se pedia que se redigissem com mis precisão tais princípios, elaborou-se esta introdução de forma mais ampla e clara; nela, depois de uma afirmação genérica sobre a conexão entre a Palavra de Deus e a ação litúrgica, tratar-se-á primeiramente da Palavra de Deus na celebração da Missa e, depois, se apresentará a estrutura detalhada da ordem das leituras. b) Termos que utilizam para designar a Palavra de Deus 2. Ainda que para esta matéria possa parecer realmente necessária uma delimitação dos termos, para maior clareza e exatidão do sentido, nesta introdução, no entanto, utilizaremos as mesmas palavras usadas nos documentos conciliares e pós-conciliares, e chamaremos indistintamente Sagrada Escritura ou Palavra de Deus os livros inspirados pelo Espírito Santo, evitando, porém, toda confusão de nomes e coisas.
216
ELENCO das leituras da missa. Restaurado por decreto do Sagrado Concílio Ecumênico Vaticano II e promulgado pela autoridade do Papa Paulo VI. Trad. Portuguesa da segunda edição típica para o Brasil realizada e publicada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e aprovada pela Sé Apostólica. São Paulo: Paulus, 1997. n.1-125.
93 c) Valor litúrgico da Palavra de Deus 3. Nas diferentes celebrações e nas diversas assembleias das quais os fiéis participam de maneira admirável, exprimem-se os múltiplos tesouros da única Palavra de Deus, seja no transcorrer do ano litúrgico, em que se recorda o mistério de Cristo em seu desenvolvimento, seja na celebração dos sacramentos e sacramentais da Igreja, seja nas respostas de cada fiel à ação interna do Espírito Santo. Desse modo, a mesma celebração litúrgica, que se sustenta e se apoia principalmente na palavra de Deus, converte-se num acontecimento novo e enriquece a palavra com uma nova interpretação e eficácia. Por isso, a Igreja continua fielmente na liturgia o mesmo sistema que usou Cristo na leitura e interpretação das Sagradas Escrituras, visto que ele exorta a aprofundar o conjunto das Escrituras, partindo do “hoje” de seu acontecimento pessoal. 2. Celebração litúrgica da Palavra de Deus a) Característica própria da Palavra de Deus na ação litúrgica 4. Na celebração litúrgica, a Palavra de Deus não se exprime sempre do mesmo modo, nem penetra sempre nos corações dos fiéis com a mesma eficácia; mas Cristo está sempre em sua palavra e, realizando o mistério da salvação, santifica os homens e presta ao Pai o culto perfeito. Mais ainda, a economia da salvação, que a Palavra de Deus não cessa de recordar e prolongar, alcança seu mais pleno significado na ação litúrgica, de modo que a celebração litúrgica se converta numa contínua, plena e eficaz apresentação desta Palavra de Deus. Assim, a Palavra de Deus, proposta continuamente na Liturgia, é sempre viva e eficaz pelo poder do Espírito Santo, e manifesta o amor ativo do Pai, que nunca deixa de ser eficaz entre os homens. b) A Palavra de Deus na economia da salvação 5. A Igreja anuncia o mesmo e único mistério de Cristo quando proclama, na celebração litúrgica, o Antigo e o Novo Testamento. Com efeito, no Antigo Testamento está latente o Novo, e no Novo se faz patente o Antigo. O centro e a plenitude de toda a Escritura e de toda a celebração litúrgica é Cristo: por isso deverão beber de sua fonte todos os que buscam a salvação e a vida. Quanto mais profundamente se compreende a celebração litúrgica, mais profundamente também se estimará a importância da Palavra de Deus; e o que se diz de uma pode-se afirmar da outra, visto que ambas lembram o mistério de Cristo e o perpetuam cada qual a seu modo. c) A Palavra de Deus na participação litúrgica dos fiéis 6. Na ação litúrgica, a Igreja responde fielmente o mesmo “Amém” que Cristo, mediador entre Deus e os homens, pronunciou, de uma vez para sempre, ao derramar seu sangue, a fim de selar, com a força de Deus, a nova aliança no Espírito Santo. Quando Deus comunica a sua Palavra, sempre espera uma resposta, que consiste em escutar e adorar “em Espírito e verdade” (Jo 4,23). O Espírito Santo, com efeito, é quem faz que esta resposta seja eficaz, para que se manifeste na vida o que se escuta na ação litúrgica, segundo aquelas palavras: “Sedes por isso executores da palavra, e não apenas ouvintes” (Tg 1,22).
94 As atitudes corporais, os gestos e palavras com que se exprime a ação litúrgica e se manifesta na participação dos fiéis não recebem seu significado unicamente da experiência humana, de onde são tirados, mas também da Palavra de Deus e da economia da salvação, à qual se referem. Por isso, os fiéis tanto mais participam da ação litúrgica quanto mais se esforçam, ao escutar a Palavra de Deus nela proclamada, por aderir intimamente à Palavra de Deus em pessoa, Cristo encarnado. Assim, procurem que o que celebrem na liturgia seja uma realidade em sua vida e costumes e, inversamente, o que fizerem em sua vida se reflita na liturgia. 3. A Palavra de Deus na vida do Povo da “Aliança” a) A Palavra de Deus na vida da Igreja 7. A Igreja cresce e se constrói ao escutar a Palavra de Deus, e os prodígios que de muitas formas Deus realizou na história da salvação fazem-se presentes, de novo, nos sinais da celebração litúrgica, de modo misterioso, mas real; Deus, por sua vez, vele-se da comunidade dos fiéis que celebra a liturgia para que a sua Palavra se propague e seja conhecida, e seu nome seja louvado por todas as nações. Portanto, sempre a Igreja, congregada pelo Espírito Santo na celebração litúrgica, anuncia e proclama a Palavra de Deus, se reconhece a si mesma como o novo povo, no qual a aliança antigamente selada chega agora à sua plenitude e perfeição. Todos os cristãos, que pelo batismo e confirmação no Espírito se convertem em mensageiros da Palavra de Deus, depois de receberem a graça de escutar a palavra, devem anunciá-la na Igreja e no mundo, ao menos com testemunho de vida. Esta Palavra de Deus, proclamada na celebração dos divinos mistérios, não só se refere às circunstâncias atuais, mas também olha para o passado e penetra o futuro, e nos faz ver quão desejáveis são as coisas que esperamos, para que, no meio das vicissitudes do mundo, nossos corações estejam firmemente postos onde está a verdadeira alegria. b) A Palavra de Deus na explicação que dela faz a Igreja 8. Por vontade de Cristo, o novo povo de Deus está formado por uma admirável variedade de membros; por esta razão são também vários os ofícios e as funções que correspondem a cada um, no que se refere à Palavra de Deus. Os fiéis a escutam e a meditam, mas somente a explicam aqueles a quem, pela sagrada ordenação, corresponde a função do ministério, ou aqueles aos quais foi confiado este ministério. Assim, em sua doutrina, vida e culto, a Igreja perpetua e transmite a todas as gerações tudo o que ela é e tudo o que ela crê, de tal modo que, ao longo dos séculos, vai caminhando continuamente para a plenitude da verdade divina, até que nela mesma se realize completamente a Palavra de Deus. c) Relação necessária entre a Palavra de Deus proclamada e a ação do Espírito Santo 9. Para que a Palavra de Deus realmente produza nos corações aquilo que se escuta com os ouvidos, requer-se a ação do Espírito Santo, por cuja inspiração e ajuda a Palavra de Deus se converte no fundamento da ação litúrgica e em norma e ajuda de toda a vida.
95 Assim pois, a atuação do Espírito Santo não só precede, acompanha e segue toda a ação litúrgica, mas também sugere ao coração de cada um tudo aquilo que, na proclamação da Palavra de Deus, foi dito para toda a comunidade dos fiéis; e, ao mesmo tempo que consolida a unidade de todos, fomenta também a diversidade de carismas e a multiplicidade de atuações. d) Íntima relação entre a Palavra de Deus e o mistério eucarístico 10. A Palavra de Deus e o mistério eucarístico foram honrados pela Igreja com a mesma veneração, embora com diferente culto. A Igreja sempre quis e determinou que assim, fosse, porque, impelida pelo exemplo de seu Fundador, nunca deixou de celebrar o mistério pascal de Cristo, reunindo-se para ler “todas as passagens da Escritura que a ele se referem” (Lc 24,27) e realizando a obra da salvação, por meio do memorial do Senhor e dos sacramentos. Com efeito, “a pregação da Palavra é necessária para o próprio ministério dos sacramentos, visto que são sacramentos da fé, a qual nasce da palavra e dela se alimenta”. Espiritualmente alimentada nessas duas mesas, a Igreja, em uma, instrui-se mais, e na outra santifica-se mais plenamente; pois na Palavra de Deus se anuncia a aliança divina, e na Eucaristia se renova esta mesma aliança nova e eterna. Numa, recorda-se a história da salvação com palavras; na outra a mesma história se expressa por meio de sinais sacramentais da Liturgia. Portanto, convém recordar sempre que a Palavra divina que a Igreja lê e anuncia na Liturgia conduz, como a seu próprio fim, ao sacrifício da aliança e ao banquete da graça, isto é, à Eucaristia. Assim, a celebração da missa, na qual se escuta a Palavra e se oferece e se recebe a Eucaristia, constitui um só ato de culto divino com o qual se oferece a Deus o sacrifício de louvor e se realiza plenamente a redenção do homem. PRIMEIRA PARTE A Palavra de Deus na Celebração da Missa CAPÍTULO II A Celebração da Liturgia da Palavra na Missa 1. Elementos e Ritos da Liturgia da Palavra 11. “As leituras tiradas da Sagrada Escritura, com os cânticos que se intercalam, constituem a parte principal da Liturgia da Palavra; a homilia, a profissão de fé e a oração universal ou oração dos fiéis, a desenvolvem e concluem.” a) As leituras bíblicas 12. Não é permitido que na celebração da missa as leituras bíblicas, juntamente com os cânticos tirados da Sagrada Escritura, sejam suprimidas, nem abreviadas nem, coisa ainda mais grave, substituídas por leituras não bíblicas. É por meio da própria Palavra de Deus, transmitida por escrito, que “Deus continua falando a seu povo”, e mediante o uso constante da Sagrada Escritura, o povo de Deus se faz mais dócil ao Espírito Santo por meio da luz, da fé e assim pode dar ao mundo, com sua vida e seus costumes, o testemunho de Cristo. 13. A Leitura do Evangelho constitui o ponto alto da Liturgia da Palavra, para a qual a assembléia se prepara com as outras leituras, na ordem indicada, isto é, a partir do Antigo Testamento até chegar ao Novo.
96 14. O que mais contribui para uma adequada comunicação da Palavra de Deus à assembléia por meio das leituras é a própria maneira de proclamar dos leitores, que devem fazê-lo em voz alta e clara, tendo conhecimento do que leem. As leituras, tiradas de edições aprovadas, segundo a índole dos diferentes idiomas, podem ser cantadas, mas de forma que o canto não obscureça as palavras, mas as esclareça. Se forem feitas em latim, observe-se o indicado no Ordo Cantus Missae. 15. Na Liturgia da Palavra, antes das leituras, e especialmente antes da primeira, podem-se fazer algumas admoestações breves e oportunas. É preciso levar muito em consideração o gênero literário dessas admoestações. Convém que sejam simples, fiéis ao texto, breves, bem preparadas e adaptadas em tudo ao texto, ao qual servem de introdução. 16. Na celebração da missa com o povo, as leituras devem ser feitas sempre do ambão. 17. Entre os ritos da Liturgia da Palavra, é preciso levar em consideração a veneração especial devia à leitura do Evangelho. Quando se dispõe de um Evangeliário, que nos ritos de entrada e tenha sido levado processionalmente por um diácono ou por um leitor, é conveniente que este mesmo livro seja tirado do altar por um diácono ou, se não houver diácono, por um sacerdote e seja levado para o ambão, acompanhado pelos ministros que levam velas e incenso ou outros sinais de veneração, conforme o costume. Os fiéis estão de pé e veneram o livro dos Evangelhos com suas aclamações ao Senhor. O diácono que vai anunciar o Evangelho, inclinado diante do presidente da assembléia, pede e recebe a bênção. No caso de não haver diácono, o sacerdote se inclina diante do altar e diz em voz baixa a oração: “Ó Deus todo-poderoso, purifica-me o coração e os lábios…”. No ambão, aquele que proclama o Evangelho saúda os fiéis, que estão de pé, lê o título da leitura, faz o sinal-da-cruz na fronte, na boca e no peito; a seguir, se for utilizado incenso, incensa o livro e, finalmente, lê o Evangelho. Ao terminar, beija o livro, dizendo secretamente as palavras prescritas. É bom que se cantem a Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo e Palavra da Salvação, para que o povo, por sua vez, possa aclamar do mesmo modo, mesmo que o Evangelho tenha sido lido. Dessa forma, exprime-se a importância da leitura evangélica e se promove a fé dos ouvintes. 18. No final das leituras, a conclusão Palavra do Senhor pode ser cantada por um cantor, diferente do leitor que proclamou a leitura, e todos cantam a aclamação. Deste modo, a assembléia honra a Palavra de Deus recebida com fé e com espírito de ação de graças. b) O salmo responsorial 19. O salmo responsorial, chamado também gradual, dado que é “parte integrante da Liturgia da Palavra”, tem grande importância litúrgica e pastoral. Por isso, é preciso instruir constantemente os fiéis sobre o modo de escutar a Palavra de Deus que nos é transmitida pelos salmos e sobre o modo de converter estes salmos em oração da Igreja. Isso “se realizará mais facilmente quando se promover com diligência, entre o clero, um conhecimento mais profundo dos salmos, segundo o sentido com que se cantam na sagrada liturgia, e quando se fizer que participem disso todos os fiéis com uma catequese oportuna”. Também podem ajudar algumas breves admoestações, nas quais se indique o porquê daquele salmo determinado e da resposta, em relação com as leituras. 20. O Salmo responsorial deve ser preferencialmente cantado. Há duas formas de cantar o salmo depois da primeira leitura: a forma responsorial e a forma
97 direta. Na forma responsorial, que se deve preferir enquanto for possível, o salmista ou o cantor do salmo cantam as estrofes do salmo, e toda a assembléia participa cantando da resposta. Na forma direta, o salmo é cantado sem que a assembléia intercale a resposta, e o cantam, ou o salmista ou o cantor do salmo sozinho, e a assembléia escuta, ou então o salmista e os fiéis juntos. 21. O canto do salmo ou da resposta contribuem muito para compreender o sentido espiritual do salmo e para meditá-lo profundamente. Em cada cultura, deve-se utilizar tudo aquilo que possa favorecer o canto da Assembléia, e especialmente as faculdades previstas no Elenco das Leituras da Missa, referentes às respostas para cada tempo litúrgico. 22. O salmo que segue a leitura, se não for cantado, deve ser recitado de maneira mais adequada para a meditação da palavra de Deus. O salmo responsorial é cantado ou recitado por um salmista ou por um cantor, estando este no ambão. c) A aclamação antes da leitura do Evangelho 23. Também o “Aleluia” ou segundo o tempo litúrgico, a aclamação antes do Evangelho “têm por si mesmos valor de rito ou de ato”, mediante o qual a assembléia dos fiéis recebe e saúda o Senhor que vai falar, e professa a sua fé cantando. O “Aleluia” e as outras aclamações antes do Evangelho devem ser cantados, estando todos de pé, de modo que todo o povo cante unanimemente, e não somente o cantor que o inicia, ou o coro. d) A homilia 24. A homilia que ao longo do ano litúrgico expõe, a partir do texto sagrado, os mistérios da fé e as normas da vida cristã, como parte da Liturgia da Palavra a partir da Constituição litúrgica do Concílio Vaticano II, muitas vezes e com muito interesse foi recomendada e até prescrita para certas ocasiões. Na celebração da missa, a homilia, que normalmente é feita pelo próprio presidente, tem como finalidade que a Palavra de Deus anunciada, juntamente com a liturgia eucarística, seja como “uma proclamação das maravilhas realizadas por Deus na história da salvação ou mistério de Cristo”. Com efeito, o mistério pascal de Cristo, anunciado nas leituras e na homilia, realiza-se por meio do sacrifício da missa. Cristo está sempre presente e operante na pregação de sua Igreja. Assim, pois, a homilia, quer explique as palavras da Sagrada Escritura que se acaba de ler, quer explique outro texto litúrgico, deve levar a assembléia dos fiéis a uma ativa participação na Eucaristia, a fim de que “vivam sempre de acordo com a fé que professaram”. Com esta explicação viva, a Palavra de Deus que se leu e as celebrações que a Igreja realiza podem adquirir maior eficácia, com a condição de que a homilia seja realmente fruto da meditação, devidamente preparada, não muito longa nem muito curta, e de que se levem em consideração todos os presentes, inclusive as crianças e o povo, de modo geral as pessoas simples. Na concelebração, a homilia, ordinariamente, é feita pelo celebrante principal ou por um dos concelebrantes. 25. Nos dias em que ela for prescrita, a saber, nos domingos e festas de preceito, deve-se fazer a homilia em todas as missas que se celebram com assistência do povo, sem excluir as missas celebradas na tarde do dia precedente. Também deve haver homilia nas missas celebradas para as crianças ou para grupos particulares.
98 Recomenda-se muito a pregação da homilia nos dias de semana do Advento, da Quaresma e do Tempo Pascal, para o bem dos fiéis que participam regularmente da celebração da missa; e também em outras festas e ocasiões nas quais há maior assistência de fiéis na Igreja. 26. O sacerdote celebrante profere a homilia na cadeira, de pé ou sentado, ou no ambão. 27. Não pertence à homilia os breves avisos que se devam fazer à assembléia, pois seu lugar é em seguida à oração depois da comunhão. e) O silêncio 28. A Liturgia da Palavra deve ser celebrada de tal maneira que favoreça a meditação; por isso deve-se evitar a pressa, que impede o recolhimento. O diálogo entre Deus e os homens, que se realiza com a ajuda do Espírito Santo, requer breves momentos de silêncio, adequados à assembléia presente, para que neles a Palavra de Deus seja acolhida interiormente e se prepare uma resposta, por meio da oração. Podem-se guardar estes momentos de silêncio, por exemplo, antes de comentar a Liturgia da Palavra, depois da primeira e da segunda leitura, e ao terminar a homilia. f) A profissão de fé 29. O símbolo ou profissão de fé, dentro da missa, quando as rubricas o indicam, tem como finalidade que a assembléia reunida dê seu consentimento e sua resposta à Palavra de Deus ouvida nas leituras e na homilia, e traga à sua memória, antes de começar a celebração do mistério da fé na Eucaristia, a norma de sua fé, segundo a forma aprovada pela Igreja. g) A oração universal ou oração dos fiéis 30. Na oração universal, a assembléia dos fiéis, iluminada pela Palavra de Deus, à qual de certo modo responde, pede normalmente pelas necessidades da Igreja universal e da comunidade local, pela salvação do mundo, pelos que se encontram em qualquer necessidade e por grupos determinados de pessoas. Sob a orientação do celebrante, um diácono, um ministro ou alguns dos fiéis proporão oportunamente algumas breves petições composta com sábia liberdade, mediante as quais “o povo, exercendo o seu ofício sacerdotal, roga por todos os homens”. Desta forma, recolhendo o fruto da Liturgia da Palavra, a assembléia poderá passar mais adequadamente para a liturgia eucarística. 31. O sacerdote preside a oração universal estando na cadeira; e as intenções são enunciadas do ambão. A assembléia participa da oração de pé, dizendo ou cantando a invocação comum depois de cada intenção, ou então orando em silêncio. 2. Coisas que ajudam a celebrar devidamente a Liturgia da Palavra a) O lugar de onde se proclama a Palavra de Deus 32. No recinto da igreja, deve existir um lugar elevado, fixo, adequadamente disposto e com a devida nobreza, que ao mesmo tempo corresponda à dignidade da Palavra de Deus e recorde aos fiéis que na missa se prepara a mesa da Palavra de Deus e do Corpo de Cristo, e que ajude da melhor maneira possível a que os fiéis ouçam bem e estejam atentos durante a Liturgia da Palavra. Por isso se deve
99 procurar, segundo a estrutura de cada igreja, que haja uma íntima proporção e harmonia entre o ambão e o altar. 33. Convém que o ambão, de acordo com a sua estrutura, seja adornado com sobriedade, ou de maneira permanente ou, ao menos ocasionalmente, nos dias mais solenes. Dado que o ambão é o lugar de onde os ministros proclamam a Palavra de Deus, reserva-se por sua natureza às leituras, ao salmo responsorial e ao sermão pascal. A homilia e a oração dos fiéis podem ser pronunciadas do ambão, já que estão intimamente ligadas a toda a Liturgia da Palavra. Mas não é conveniente que subam ao ambão outras pessoas, como o comentarista, o cantor, o dirigente do coro. 34. Para que o ambão ajude, da melhor maneira possível, nas celebrações, deve ser amplo, porque em algumas ocasiões têm de estar nele vários ministros. Além disso, é preciso procurar que os leitores que estão no ambão tenham suficiente luz para ler o texto e, na medida do possível, bons microfones para que os fiéis possam escutá-los facilmente. b) Os livros para anunciar a Palavra de Deus nas celebrações 35. Os livros de onde se tiram as leituras da Palavra de Deus, assim como os ministros, as atitudes, os lugares e demais coisas, lembram os fiéis a presença de Deus que fala a seu povo. Portanto, é preciso procurar que os próprios livros, que são sinais e símbolos das realidades do alto na ação litúrgica, sejam verdadeiramente dignos, decorosos e belos. 36. Sendo sempre o anúncio evangélico o ponto alto da Liturgia da Palavra, as duas tradições litúrgicas, a ocidental e a oriental, mantiveram uma diferença entre o Evangelho e as demais leituras. com efeito, o livro dos Evangelhos era elaborado com grande cuidado, adornado e venerado mais do que qualquer outro lecionário. Assim, pois, é muito conveniente que também em nossos dias, nas catedrais, nas paróquias e igrejas maiores e mais concorridas, haja um Evangeliário, formosamente adornado e diferente do livro das demais leituras. Este é o livro entregue ao diácono na sua ordenação, e na ordenação episcopal é erguido e sustentado sobre a cabeça do eleito. 37. Por último, os livros das leituras que se utilizam na celebração, pela dignidade que a Palavra de Deus exige, não devem ser substituídos por outros subsídios de ordem pastoral, por exemplo, pelos folhetos que se fazem para que os fiéis preparem as leituras ou as meditem pessoalmente. CAPÍTULO III Ofícios e Ministérios na Celebração da Liturgia da Palavra na Missa 1. Funções do presidente na Liturgia da Palavra 38. Quem preside a Liturgia da Palavra, ainda que escute a Palavra de Deus proclamada aos outros, continua sendo sempre o primeiro ao qual se confiou a função de anunciar a Palavra de Deus, compartilhando com os fiéis, sobretudo na homilia, o alimento que esta palavra contém. Embora ele deva cuidar por si mesmo ou por outros que a Palavra de Deus seja proclamada adequadamente, a ele corresponde, ordinariamente, preparar algumas admoestações que ajudem os fiéis a escutar com mais atenção, e principalmente fazer a homilia, para facilitar-lhes uma compreensão mais profunda da Palavra de Deus.
100 39. Em primeiro lugar, é necessário que quem deve presidir a celebração conheça perfeitamente a estrutura do elenco das Leituras da Missa, a fim de que possa fazê-la frutifica nos corações dos fiéis; além disso, com oração e estudo compreenda muito bem a relação entre os diversos textos da Liturgia da Palavra para que, aproveitando o Ordo Lectionum, faça entender convenientemente o mistério de Cristo e sua obra salvífica. 40. Quem preside pode usar amplamente as diversas opções propostas no Lecionário no que se refere às leituras, respostas, salmos responsoriais, aclamações antes do Evangelho, mas de comum acordo com todos os interessados, sem excluir os fiéis naquilo que lhes diz respeito. 41. O presidente exerce, também, a sua função própria e o ministério da Palavra de Deus quando pronuncia a homilia. Com efeito, a homilia conduz seus irmãos a uma compreensão saborosa da Sagrada Escritura; abre as almas dos fiéis à ação de graças pelas maravilhas de Deus; alimenta a fé dos presentes acerca da Palavra que na celebração se converte em sacramento pela intervenção do Espírito Santo; finalmente, prepara os fiéis para uma comunhão fecunda e os convida a praticar as exigências da vida cristã. 42. Cabe ao presidente introduzir, ocasionalmente, os fiéis com alguma admoestação à Liturgia da Palavra, antes da proclamação das leituras. Estas admoestações poderão ser de grande ajuda para que a assembléia escute melhor a Palavra de Deus, já que promovem a fé a boa vontade. Pode exercer esta função por meio de outras pessoas, por exemplo, o diácono ou um comentarista. 43. O presidente, dirigindo a oração universal e, se for possível, relacionando as leituras daquela celebração e a homilia com a oração, por meio da admoestação inicial e da oração conclusiva, conduz os fiéis à liturgia eucarística. 2. Função dos fiéis na Liturgia da Palavra 44. A palavra de Cristo reúne, faz crescer e alimenta o povo de Deus, “isso vale especialmente para a Liturgia da Palavra na celebração da missa, na qual o anúncio da morte e ressurreição do Senhor e a resposta do povo que escuta se unem inseparavelmente com a própria oblação, pela qual Cristo confirmou com o seu sangue a nova Aliança, oblação de que participam os fiéis com o desejo e com a recepção do sacramento”. Com efeito, “não somente quando se lê o que se escreveu para nosso ensinamento (Rm 15,4), mas também quando a Igreja ora, canta ou age, a fé dos assistentes se alimenta e suas almas se elevam para Deus, a fim de tributar-lhe um culto espiritual e receber a sua graça com maior abundância”. 45. Na Liturgia da Palavra, pela fé com que escuta, também hoje a assembléia dos fiéis recebe de Deus a palavra da aliança, e deve responder a esta palavra com a fé para que se vá convertendo cada vez mais em povo da nova Aliança. O povo de Deus tem o direito de receber abundantemente o tesouro espiritual da Palavra de Deus, o que se consegue com o uso do Ordo Lectionum, com a homilia e com a ação pastoral. Na celebração da missa, os fiéis escutam a Palavra de Deus com tal devoção interior e exterior que cada dia neles aumente a vida espiritual e os introduza cada vez mais no mistério que se celebra. 46. Para que possa celebrar vivamente o memorial do Senhor, lembrem-se os fiéis de que a presença de Cristo é uma só, tanto na Palavra de Deus, “Pois quando se lê na Igreja a Sagrada Escritura, é ele quem fala”, como “especialmente sob as espécies eucarísticas”.
101 47. A Palavra de Deus, para que seja acolhida e traduzida na vida dos fiéis, exige uma fé viva, que cresce continuamente ao escutar a Palavra de Deus proclamada. Com efeito, as Sagradas Escrituras são, sobretudo na proclamação litúrgica, uma fonte de vida e de força segundo o que diz São Paulo, quando afirma que o Evangelho é uma força de salvação para todo o que crê, por isso, o amor às Escrituras contribui para o vigor e a renovação de todo o povo de Deus. Portanto, é muito conveniente que todos os fiéis estejam sempre dispostos a escutar com alegria a Palavra de Deus. A Palavra de Deus, quando é anunciada pela Igreja e levada à prática, ilumina os fiéis pela atuação do Espírito Santo e os impele a viver na totalidade o mistério. A Palavra de Deus, recebida com fé, move o homem do fundo do seu coração à conversão e a uma vida resplandecente de fé, pessoal e comunitária, visto que a Palavra de Deus é o alimento da vida cristã e a fonte de toda oração da Igreja. 48. A íntima relação entre a liturgia da Palavra e a liturgia eucarística na missa conduzirá os fiéis a estarem presentes, já desde o princípio, e a participarem atentamente. Enquanto possível, eles se prepararão para escutar a Palavra de Deus, adquirindo de antemão um profundo conhecimento das Sagradas Escrituras. Além disso, terão o desejo de alcançar a compreensão litúrgica dos textos que se lêem e a vontade de responder por meio do canto. Desta forma, por meio da Palavra de Deus escutada e meditada, os fiéis podem dar uma resposta cheia de fé, esperança e amor, de oração e entrega de si mesmos, não somente durante a celebração da missa, também em toda a vida cristã. 3. Ministérios na Liturgia da Palavra 49. A tradição litúrgica assinala a função de proclamar as leituras bíblicas na celebração da missa a ministros: leitores e diácono. Mas se não houver diácono nem outro sacerdote, o celebrante deve ler o Evangelho, e no caso em que não haja leitor, todas as demais leituras. 50. Na Liturgia da Palavra da missa, cabe ao diácono anunciar o Evangelho, fazer de vez em quando a homilia, se parecer conveniente, e propor ao povo as intenções da oração universal. 51. “Na Celebração Eucarística, o leitor tem um ministério próprio, reservado a ele, ainda que haja outro ministro de grau superior”. É importante dar a devida importância ao ministério do leitor, conferido por ato litúrgico. Os que foram instituídos como leitores, se os houver, devem exercer sua função própria, pelo menos nos domingos e festas, durante a missa principal. Além disso, pode-se confiar a eles o encargo de ajudar na organização da Liturgia da Palavra e de cuidar, se for necessário, da preparação de outros fiéis que, por designação temporânea, devem fazer as leituras na celebração da missa. 52. A assembléia litúrgica precisa ter leitores, ainda que não tenham sido instituídos para esta função. Por isso, é preciso procurar que haja alguns leigos, os mais aptos, que estejam preparados para desempenhar este ministério. Se houver vários leitores e várias leituras a serem feitas, convém distribuí-las entre eles. 53. Se não houver diácono na missa, a função de propor as intenções da oração universal caberá a um cantor, especialmente quando estas intenções forrem cantadas, ou a um leitor, ou a outra pessoa. 54. O sacerdote diverso daquele que preside, o diácono e o leitor instituído, quando sobem ao ambão para ler a Palavra de Deus na missa, devem usar as
102 vestimentas sagradas próprias de seu ofício. Porém os que ocasionalmente, e mesmo ordinariamente, desempenham o ofício de leitor podem subir ao ambão com sua roupa normal, mas respeitando os costumes das diversas regiões. 55. “Para que os fiéis cheguem a adquirir uma estima viva da Sagrada Escritura pela audição das leituras divinas, é necessário que os leitores que desempenham esse ministério, embora não tenham sido oficialmente instituídos nele, sejam realmente aptos e estejam cuidadosamente preparados”. Tal preparação deve ser em primeiro lugar espiritual, mas é necessária também a preparação técnica. A preparação espiritual supõe pelo menos dupla instrução: bíblica e litúrgica. A instrução bíblica deve encaminhar-se no sentido de que os leitores possam compreender as leituras em seu contexto próprio e entender à luz da fé o núcleo central da mensagem revelada. A instrução litúrgica deve facilitar aos leitores certa percepção do sentido e da estrutura da Liturgia da Palavra e a relação entre a Liturgia da Palavra e a liturgia eucarística. A preparação técnica deve capacitar os leitores para que se tornem sempre mais aptos na arte de ler diante do povo, seja de viva voz, seja com a ajuda de instrumentos modernos para a amplificação vocal. 56. Cabe ao salmista, ou cantor do salmo, cantar de forma resp9onsorial ou direta o salmo ou outro cântico bíblico, o gradual e o “Aleluia”, ou outro cântico interlecional. Ele mesmo pode iniciar o “Aleluia” e o versículo, se parecer conveniente. Para exercer esta função de salmista é muito conveniente que em cada comunidade eclesial haja leigos dotados da arte de salmodiar e de uma boa pronúncia e dicção. O que se disse anteriormente sobre a formação dos leitores também se aplica aos salmistas. 57. Também o comentador exerce um verdadeiro ministério litúrgico quando, de um lugar adequado, propõe oportunas, claras, sóbrias, cuidadosamente preparadas, normalmente escritas e antecipadamente aprovadas pelo celebrante. Segunda parte Estrutura do Elenco das Leituras da Missa CAPÍTULO IV Distribuição Geral das Leituras da Missa 1. Finalidade pastoral do Elenco das Leituras da Missa 58. O Elenco das Leituras da Missa, tal como se encontra no Lecionário do Missal Romano, foi realizado, em primeiro lugar, para obter um fim pastoral, seguindo o espírito do Concílio Vaticano II. Para conseguir esse fim, não só os princípios em que se baseia o novo Ordo, mas também a escolha dos próprios textos que se colocam a seguir, foram revistos e elaborados várias vezes, com a cooperação de muitas pessoas de todo o mundo, versadas em matérias exegéticas, litúrgicas, catequéticas e pastorais. O Elenco das leituras da Missa é o resultado deste trabalho comum. Esperamos que uma contínua leitura e explicação da Sagrada Escritura ao povo cristão na Celebração Eucarística, segundo este Elenco das Leituras da Missa, seja muito eficaz para alcançar a finalidade exposta várias vezes pelo Concílio Vaticano II.
103 59. Nesta reforma pareceu conveniente elaborar um só Elenco das Leituras da Missa, rico e abundante quanto possível, de acordo com a vontade e as normas do Concílio Vaticano II, mas que, ao mesmo tempo, por sua forma se acomodasse aos determinados costumes e exigências das Igrejas particulares e das assembléias celebrantes. Por esta razão, os encarregados de elaborar essa reforma se preocuparam em salvaguardar a tradição litúrgica do rito romano, sem detrimento de uma grande estima pelo valor de todas as formas de seleção, distribuição e uso das leituras bíblicas nas demais famílias litúrgicas e em algumas Igrejas particulares, valendo-se daquilo que já havia sido comprovado por experiência e procurando ao mesmo tempo evitar alguns defeitos existentes na tradição precedente. 60. Portanto, o presente Elenco da Leituras da Missa é uma distribuição das leituras bíblicas que possibilita aos cristãos o conhecimento de toda a Palavra de Deus, conforme uma adequada explicação. Durante todo o ano litúrgico, mas sobretudo no tempo da Páscoa, da Quaresma e do Advento, a escolha e distribuição das leituras tende a que, de maneira gradual, os cristãos conheçam mais profundamente a fé que professam e a história da salvação. Por isso o Elenco das Leituras da Missa corresponde às necessidades e desejos do povo cristão. 61. Ainda que a ação litúrgica por si mesma não seja uma forma de catequese, inclui, não obstante, um caráter didático que se exprime também no Lecionário do Missal Romano, de maneira que com razão pode ser considerada como um instrumento pedagógico para estímulo da catequese. Com efeito, o Elenco das Leituras da Missa oferece os fatos e palavras principais da história da salvação, tomando-os da Sagrada Escritura, de tal modo que esta história da salvação, que a Liturgia da Palavra vai recordando passo a passo, em diversos momentos e eventos, aparece diante dos fiéis como algo que tem uma continuidade atual, ao se fazer presente de novo o mistério pascal de Cristo, celebrado pela Eucaristia. 62. Outra razão pela qual se compreende também a conveniência e a utilidade pastoral de um só Elenco das Leituras do Lecionário da missa no rito romano é o fato de que todos os fiéis, principalmente aqueles que por diversos motivos nem sempre participam da mesma assembléia, ouçam, em qualquer parte, em determinados dias e tempos, as mesmas leituras e as meditem aplicando-as às circunstâncias concretas, inclusive naqueles lugares em que, por falta de sacerdote, um diácono ou outra pessoa delegada pelo bispo dirige a celebração da Palavra de Deus. 63. Os pastores que quiserem dar uma resposta mais apropriada, tirada da Palavra de Deus, às circunstâncias especiais de suas próprias comunidades, sem esquecer que eles devem ser antes de mais nada arautos da totalidade do mistério de Cristo e do Evangelho, podem usar, segundo a conveniência, as possibilidades que o mesmo Elenco das Leituras da Missa oferece, sobretudo por ocasião da celebração de alguma missa ritual, votiva, ou em honra dos santos ou por diversas circunstâncias. Levando em consideração as normas gerais, concedem-se faculdades particulares quanto às leituras da Palavra de Deus nas celebrações da missa para grupos particulares. 2. Princípios na elaboração do Elenco das Leituras da Missa 64. Para alcançar a finalidade própria do Elenco das Leituras da Missa, a escolha e distribuição das perícopes foi feita levando-se em consideração a
104 sucessão litúrgicos e também os princípios hermenêuticos que os estudos exegéticos de nosso tempo permitiram descobrir e definir. Por isso pareceu conveniente expor aqui os princípios observados na elaboração do Elenco das Leituras da Missa. a) Seleção de textos 65. A sucessão de leituras do “próprio do tempo” foi disposta da seguinte maneira: nos domingos e festas propõem-se os textos mais importantes, para que, num conveniente espaço de tempo, possam ser lidas diante da assembléia dos fiéis as partes mais relevantes da Palavra de Deus. A outra série de textos da Sagrada Escritura, que de certa forma completa o anúncio da salvação desenvolvido nos dias festivos, assinala-se para os dias da semana. No entanto, nenhuma das duas séries dessas partes principais do Elenco das Leituras da Missa, isto é, a dominical-festiva e a série dos dias de semana, depende uma da outra. Mais ainda, a ordem das leituras dominical-festiva desenvolve-se num triênio, ao posso que a dos dia de semana o faz num biênio. Por isso, a ordem das leituras dominical-festiva procede de maneira independente da dos dias de semana, e vice-versa. A sucessão de leituras propostas para as demais partes do Elenco das Leituras da Missa, tais como a série de leituras para as celebrações dos santos, para as missas rituais ou por diversas necessidades, ou as votivas, ou as missas de defuntos, rege-se por normas próprias. b) Distribuição das leituras nos domingos e festas 66. As características dos Elenco das Leituras da Missa para os domingos e festas são as seguintes: 1. Toda missa apresenta três leituras: a primeira , do Antigo Testamento; a segunda, do Apóstolo (isto é, das Epístolas dos Apóstolos ou do Apocalipse, segundo os diversos tempos do ano); a terceira, do Evangelho. Com esta distribuição sublinha-se a unidade do Antigo e do Novo Testamento, e da História da salvação, cujo centro é Cristo e seu mistério pascal que celebramos. 2. O fato de que para os domingos e festas se proponha um ciclo de três anos é par que haja uma leitura mais variada e abundante da Sagrada Escritura, já que os mesmos textos não voltarão a ser lidos, a não ser depois de três anos. 3. Os princípios que regulam a ordem das leituras dos domingos e festas são os chamados de “composição harmônica” ou de “leitura semicontínua”. Emprega-se um ou outro princípio segundo os diversos tempos do ano e as características especiais de cada tempo litúrgico. 67. A melhor composição harmônica entre as leituras do Antigo e do Novo Testamento tem lugar quando a própria Escritura a insinua, isto é, naqueles casos em que os ensinamentos e fatos expostos nos textos do Novo Testamento têm uma relação mais ou menos explícita com os ensinamentos e fatos do Antigo Testamento. No presente Elenco das Leituras da Missa, os textos do Antigo Testamento foram selecionados principalmente por sua congruência com os textos do Novo Testamento, especialmente com o Evangelho que se lê na mesma missa. No tempo do Advento, Quaresma e Páscoa, isto é, naqueles tempos dotados de importância e características especiais, a composição entre os textos das leituras de cada missa baseia-se em princípios especiais. No entanto, nos domingos do Tempo Comum, que não têm uma característica peculiar, os textos da leitura das Epístolas e do Evangelho se
105 distribuem segundo a ordem da leitura semicontínua, ao passo que a leitura do Antigo Testamento se compõe harmoniosamente com o Evangelho. 68. O que era conveniente para os tempos, anteriormente citados não pareceu oportuno aplicá-lo também para os domingos do Tempo Comum, de modo que neles houvesse certa unidade temática que tornasse mais fácil a instrução das homilias. O genuíno conceito da ação litúrgica está em contradição, com efeito, com semelhante composição temática, já que tal ação litúrgica é sempre a celebração do mistério de Cristo e, por tradição própria, usa a Palavra de Deus, movida não só por algumas inquietações de ordem racional ou externa, mas pela preocupação de anunciar o Evangelho e levar os fiéis à verdade plena. c) Distribuição das leituras para os dias da semana 69. A distribuição das leituras para os dias de semana foi feita com estes critérios: 1. Toda missa apresenta duas leituras: a primeira do Antigo Testamento ou dos Apóstolos (isto é, das Epístolas dos Apóstolos ou do Apocalipse), e no Tempo Pascal dos Atos dos Apóstolos; a segunda, do Evangelho. 2. O ciclo anual do Tempo da Quaresma ordena-se segundo princípios peculiares que levam em consideração as características deste tempo, a saber, sua índole batismal e penitencial. 3. Também nos dias de semana do Advento e dos tempos do Natal e da Páscoa, o ciclo é anual e portanto as leituras não variam. 4. Nos dias de semana das trinta e quatro semanas do Tempo Comum, as leituras evangélicas se distribuem num só ciclo que se repete cada ano. A primeira leitura, ao contrário, distribui-se em duplo ciclo que se lê em anos alternados. O ano primeiro emprega-se nos anos ímpares; o segundo, nos anos pares. Deste modo, também o Elenco das Leituras da Missa para os dias de semana, da mesma forma que nos domingos e festas, põem-se em prática os princípios da composição harmônica e da leitura semicontínua, de maneira semelhante, quando se trata daqueles tempos que ostentam características peculiares ou do Tempo Comum. d) As leituras para as celebrações dos santos 70. Para as celebrações dos santos oferece-se dupla série de leituras: 1. Uma no próprio, para as solenidades, festas e memórias, principalmente se para cada uma delas se encontram textos próprios. Ou então, indica-se algum texto mais adequado, dentre os que se encontram no Comum, de preferência aos outros. 2. Outra série, mais ampla, encontra-se nos Comuns dos Santos. Nesta parte, primeiro propõem-se os textos próprios para as diversas categorias de santos (mártires, pastores, virgens etc.); depois uma série de textos que tratam da santidade em geral, e que podem ser empregados à livre escolha, desde que se remeta aos Comuns para a escolha das leituras. 71. No que se refere à ordem em que estão colocados os textos nesta parte, ajudará saber que se encontram grupados na ordem em que devem ser lidos. Assim, encontram-se primeiro os textos do Antigo Testamento, depois dos textos do Apóstolo, em seguida, os salmos e versículos interlecionais e, finalmente, os textos do Evangelho. Estão colocados dessa maneira para que o celebrante os escolha à vontade, levando em consideração as necessidades pastorais da assembléia que participa da celebração, a não ser que se indique expressamente algo diferente.
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e) As leituras para as missas rituais, para diversas necessidades, votivas e de defuntos 72. Nessa mesma ordem são dispostos os textos das leituras para as missas rituais, para diversas necessidades, votivas e de defuntos: oferecem-se vários textos juntos, como nos Comuns dos Santos. f) Principais critérios aplicados na seleção e distribuição das leituras 73. Além desses princípios, que regulam a distribuição das leituras em cada parte do Elenco das Leituras da Missa, há outros de caráter mais geral, que podem ser enunciados da seguinte maneira: 1º. Reserva de alguns livros segundo os tempos litúrgicos 74. Pela importância intrínseca do assunto e por tradição litúrgica, no presente Elenco das Leituras da Missa, alguns livros da Sagrada Escritura reservam-se para determinados tempos litúrgicos. Por exemplo, respeita-se a tradição, tanto ocidental (ambrosiana e hispânica) como oriental, de ler os Atos dos Apóstolos no Tempo Pascal, já que este livro serve grandemente para fazer ver como a vida da Igreja encontra suas origens no mistério pascal. Conserva-se, também, a tradição, tanto ocidental como oriental, de ler o Evangelho de São João nas últimas semanas da Quaresma e no Tempo Pascal. A leitura de Isaías, principalmente da primeira parte, é atribuída por tradição ao Tempo do Advento. Não obstante, alguns textos deste livro são lidos no Tempo do Natal. No Tempo do Natal, lê-se também a primeira carta de São João. 2º. Extensão dos textos 75. Com relação à extensão dos textos, guarda-se um termo médio. Faz-se uma distinção entre as narrações, que demandam certa extensão maior do texto e que geralmente os fiéis escutam com atenção, e aqueles textos que, pela profundidade de seu conteúdo, não podem ser muito extensos. Para alguns textos mais longos, prevê-se dupla forma, a longa e a breve, segundo a conveniência. Estas abreviações foram feitas com grande cuidado. 3º. Os textos mais difíceis 76. Por motivos pastorais, nos domingos e solenidades evitam-se os textos bíblicos realmente difíceis, seja objetivamente, porque suscitam árduos problemas de índole literária, crítica ou exegética, seja também, pelo menos até certo ponto, porque são textos que os fiéis dificilmente poderiam entender. Contudo, era inadmissível não proporcionar aos fiéis as riquezas espirituais de alguns textos pela simples razão de serem difíceis de entender, quando esta dificuldade deriva de uma insuficiente formação cristã, da qual nenhum fiel deve estar privado, ou de uma insuficiente formação bíblica, que todo pastor de almas deve possuir abundantemente. Algumas vezes, uma leitura difícil torna-se fácil por sua harmonia com outra leitura da mesma missa. 4º. Omissão de alguns versículos 77. A tradição de algumas liturgias, sem excluir a própria liturgia romana, às vezes costumava omitir alguns versículos das leituras da Escritura. Certamente, deve-se admitir que essas omissões não podem ser feitas com superficialidade, para que não aconteça que fiquem mutilados o sentido do texto ou o espírito e o estilo
107 próprio da Escritura. Contudo, salvando sempre a integridade do sentido no essencial, pareceu conveniente, por motivos pastorais, conservar também nessa ordem a tradição mencionada. Do contrário, alguns textos ficariam excessivamente longos, ou haveria a necessidade de omitir totalmente algumas leituras de não pouca importância para os fiéis, porque contêm uns poucos versículos que, do ponto de vista pastoral, não menos proveitosos ou incluem algumas questões realmente muito difíceis. 3. Princípios a aplicar no uso do Elenco das Leituras da Missa a) Faculdade de escolher alguns textos 78. No Elenco das Leituras da Missa, às vezes se concede ao celebrante a faculdade de escolher a leitura d e um ou outro texto, ou de escolher um texto entre os diversos propostos ao mesmo tempo para a mesma leitura. Isso raramente acontece nos domingos, solenidades e festas, para que não fique diluída a índole própria de algum tempo litúrgico, ou não se interrompa indevidamente a leitura semicontínua de algum livro; pelo contrário, esta faculdade dá-se com mais facilidade nas celebrações dos santos e nas missas rituais, para as diversas necessidades, votivas e de defuntos. Tal faculdade, juntamente com outras, indicadas na Instrução Geral sobre o Missal Romano e no Ordo Cantus Missae, tem finalidade pastoral. O sacerdote, portanto, ao organizar a Liturgia da Palavra, “levará em consideração mais o bem espiritual de toda a assembléia do que as suas preferências pessoais. Além disso, deve ter presente que uma escolha desse tipo deverá ser feita de comum acordo com os que celebram com ele e com os outros que deverão tomar parte na celebração, sem excluir os próprios fiéis na parte que mais diretamente a eles se refere”. 1º. As duas leituras antes do Evangelho 79. Nas missas em que se propõem três leituras é preciso fazer efetivamente três leituras. Não obstante, se a Conferência Episcopal, por motivos pastorais, permitir que em alguma parte se façam somente duas leituras, a escolha entre as duas primeiras leituras deve ser feita de modo que não se desvirtue o projeto de instruir plenamente os fiéis sobre o mistério da salvação*. Por isso, a não ser que em algum caso se indique de outro modo, entre as duas primeiras leituras é preciso preferir aquela que esteja mais diretamente relacionada com o Evangelho, ou aquela que, segundo o projeto antes mencionado, seja de mais ajuda para realizar durante algum tempo uma catequese orgânica, ou aquela que facilite a leitura semicontínua de algum livro.. 2º. Forma longa ou breve 80. Ao escolher entre as duas formas em que se apresenta um mesmo texto, é preciso guiar-se também por um critério pastoral. Com efeito, às vezes se dá uma forma longa e outra breve do mesmo texto. Neste caso é preciso atender a que os fiéis possam escutar com proveito a forma mais curta ou a mais extensa, e também à possibilidade de que escutem o texto mais completo, que depois será explicado na homilia.
108 3º. Duplo texto proposto 81. Quando se concede a faculdade de escolher entre um ou outro texto já determinado, ou quantos e deixa à escolha, será mister atender à utilidade dos que participam. Isso pode acontecer quando se teme que um dos textos escolhidos apresente dificuldades para a assembléia. Nesse caso, deve-se optar pelo texto mais fácil ou mais conveniente para a assembléia reunida. Pode também acontecer que o mesmo texto deva ser proclamado de novo dentro de alguns dias, no domingo ou num dia de semana que seguem imediatamente, de maneira que uma vez ele seja leitura própria e a outra vez seja leitura de livre escolha por motivos pastorais. Nesse caso, deve-se ver se é melhor repetir este texto ou substituí-lo por outro. 4º. As leituras dos dias de semana ou feriais 82. Na ordem das leituras dos dias de semana, propõem-se alguns textos para cada dia da semana, durante todo o ano; portanto, como norma geral, se tomarão estas leituras nos dias que lhes são assinalados, a não ser que coincida uma solenidade ou uma festa, ou uma memória que tenha leituras próprias. No elenco das leituras da Missa para os dias de semana, é preciso ver se durante aquela semana, em razão de alguma celebração que coincida, se deverá omitir alguma ou algumas leituras do mesmo livro. Verificando-se este caso, o sacerdote, tendo em vista a distribuição das leituras de toda a semana, deverá prever que partes omitirá, por serem de menor importância, ou a maneira mais conveniente de unir estas às demais, quando são úteis para uma visão de conjunto do assunto de que tratam. 5º. As celebrações dos santos 83. Para as celebrações dos santos propõem-se, quando elas existem, leituras próprias, isto é, que tratam da mesma pessoa do santo ou do mistério que a missa celebra. Estas leituras, embora se trate de uma memória, devem ser feitas no lugar das leituras correspondentes ao dia da semana. Quando se dá este caso numa memória, o Elenco das Leituras da Missa o indica expressamente em seu lugar. Às vezes, dá-se o caso de leituras apropriadas, isto é, que sublinham algum aspecto peculiar da vida espiritual ou da atividade do santo. Em tal caso, não parece que se deva impor o uso destas leituras, a não ser que o motivo pastoral o aconselhe realmente. Geralmente, indicam-se as leituras que existem nos Comuns, para facilitar a escolha. Trata-se apenas de sugestões: em vez da leitura apropriada ou simplesmente proposta, pode-se escolher qualquer outra dos Comuns indicados. O sacerdote que celebra com participação do povo procurará em primeiro lugar o bem espiritual dos fiéis e evitará impor-lhes as próprias preferências. Procurará de maneira especial não omitir com freqüência e sem motivo suficiente as leituras indicadas para cada dia no Lecionário Ferial, pois é desejo da Igreja que os fiéis disponham da mesa da Palavra de Deus ricamente servida. Há também leituras comuns, isto é, as que figuram nos Comuns par determinada categoria de santos (por exemplo, mártires, virgens, pastores) ou para os santos em geral. Como nestes casos se propõem vários textos para uma mesma leitura, cabe ao celebrante escolher o que mais convenha aos ouvintes. Em todas as celebrações, além dos Comuns aos quais se remete em cada caso, sempre que o aconselhe algum motivo especial, as leituras podem ser escolhidas do Comum dos Santos e Santas. 84. Além disso, nas celebrações dos santos, é preciso levar em consideração o seguinte:
109 a) Nas solenidades e festas devem-se empregar sempre as leituras que se encontram no Próprio ou no Comum; nas celebrações do calendário geral indicamse sempre leituras próprias. b) Nas solenidades dos calendários particulares devem propor-se três leituras: a primeira do Antigo Testamento (no Tempo Pascal, dos Atos dos Apóstolos ou do Apocalipse), a segunda do Apóstolo e a terceira do Evangelho, a não ser que a Conferência Episcopal* tenha determinado que se deva haver só duas leituras. c) Nas festas e memórias em que há somente duas leituras, a primeira pode ser escolhida do Antigo Testamento ou do Apóstolo, a segunda do Evangelho. Todavia, no tempo pascal, segundo o costume tradicional da Igreja, a primeira leitura deve ser do Apóstolo, a segunda, na medida do possível, do Evangelho de São João. 6º. As outras parte do Elenco das Leituras da Missa 85. No Elenco das Leituras da Missa para as missas rituais, indicam-se os mesmos textos que já foram promulgados nos respectivos Rituais, excetuando, como é natural, os textos pertencentes às celebrações que não se podem juntar com a missa. 86. O Elenco das Leituras da Missa para diversas necessidades, votivas e de defuntos, apresenta diversidade de textos que podem prestar uma valiosa ajuda para adaptar estas celebrações às características, às circunstâncias e aos problemas das diversas assembléias que delas participam. 87. Nas missas rituais, para diversas necessidades, votivas e de defuntos, quando se propõem vários textos para a mesma leitura, a escolha se faz com os mesmos critérios anteriormente descritos para escolher as leituras do Comum dos Santos. 88. Quando alguma missa ritual estiver proibida e, segundo as normas indicadas em cada rito, se permitir tomar uma leitura daquelas propostas para as missas rituais, deve-se atender ao bem comum espiritual dos que participam. b) O salmo responsorial e a aclamação antes da leitura do Evangelho 89. Entre esses cânticos, tem especial importância o salmo que se segue à primeira leitura. Como norma, deve-se tomar o salmo indicado para leitura, a não ser que se trate de leituras do Comum dos Santos, das missas rituais, para diversas necessidades, votivas ou de defuntos, já que nestes casos a escolha cabe ao sacerdote celebrante, que agirá segundo a utilidade pastoral dos participantes. Entretanto, para que o povo possa mais facilmente dizer a resposta salmódica, o Elenco das Leituras da Missa assinala alguns textos de salmos e de respostas escolhidos para os diversos tempos do ano ou para as diversas categorias de santos, os quais poderão ser empregados em vez do texto que corresponde à leitura, sempre que o salmo for cantado. 90. O outro canto, que se faz depois da segunda leitura, antes do Evangelho, é determinado em cada missa e está relacionado com o Evangelho, ou então é deixado à livre escolha entre a série comum de cada tempo litúrgico ou do Comum. 91. No Tempo da Quaresma, pode-se empregar alguma das aclamações propostas mais adiante; ela precede e segue o versículo antes do Evangelho.
110 CAPÍTULO V Descrição do Elenco das Leituras da Missa 92. Para ajudar os pastores de almas a conhecer a estrutura do Elenco das Leituras da Missa, para que usem de forma viva e com proveito dos fiéis, parece oportuno dar dele uma breve descrição, pelo menos no que se refere às principais celebrações e aos diversos tempos do ano litúrgico, em atenção aos quais se escolheram as leituras segundo as normas antes indicadas. 1. Tempo do Advento a) Domingos 93. As leituras do Evangelho têm uma característica própria: refere-se à vinda do Senhor no final dos tempos (primeiro domingo), a João Batista (segundo e terceiro domingos), aos acontecimentos que preparam de perto o nascimento do Senhor (quarto domingo). As leituras do Antigo Testamento são profecias sobre o Messias e o tempo messiânico, tiradas principalmente do livro de Isaías. As leituras do Apóstolo contêm exortações e ensinamentos relativos às diversas características deste tempo. b) Dias da semana 94. Há duas séries de leituras, uma desde o princípio até o dia 16 de dezembro, a outra do dia 17 a 24. Na primeira parte do Advento, lê-se o livro de Isaías, seguindo a ordem do livro, sem excluir aquelas perícopes mais importantes que se lêem também aos domingos. Os Evangelhos destes dias estão relacionados com a primeira leitura. A partir da quinta-feira da segunda semana, começam as leituras do Evangelho sobre João Batista; a primeira leitura é uma continuação do livro de Isaías ou um texto relacionado com o Evangelho. Na última semana antes do Natal, lêem-se os acontecimentos que preparam imediatamente o nascimento do Senhor, tirados do Evangelho de São Mateus (cap. 1) e de São Lucas (cap. 1). Para a primeira leitura foram selecionados alguns textos de diversos livros do Antigo Testamento, levando em consideração o Evangelho do dia; entre eles se encontram alguns vaticínios messiânicos de grande importância. 2. Tempo do Natal a) Solenidades, festas e domingos 95. Na vigília e nas três missas do Natal, as leituras, tanto proféticas como as demais, foram tiradas da tradição romana. No domingo dentro da oitava do Natal, festa da Sagrada Família, o Evangelho é da infância de Jesus, as outras leituras falam das virtudes da vida doméstica. Na oitava do Natal e solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, as leituras tratam da Virgem, Mãe de Deus, e da imposição do Santíssimo Nome de Jesus. No segundo domingo depois do Natal, as leituras tratam do mistério da encarnação. Na Epifania do Senhor, a leitura do Antigo Testamento e o Evangelho conservam a tradição romana; na leitura apostólica, lê-se um texto relativo à vocação dos pagãos à salvação.
111 Na festa do Batismo do Senhor, os textos referem-se a este mistério. b) Dias de semana 96. Desde o dia 29 de dezembro, faz-se uma leitura contínua de toda a primeira carta de São João, que já se começou a ler no dia 27 de dezembro, festa do mesmo São João, e no dia seguinte, festa dos santos inocentes. Os Evangelhos referem-se às manifestações do Senhor. Lêem-se os acontecimentos da infância de Jesus, tirados do Evangelho de São Lucas (dias 29 e 30 de dezembro), o primeiro capítulo do Evangelho de São João (31 de dezembro a 5 de janeiro), e as principais manifestações do Senhor, retiradas dos quatro Evangelhos (7 a 12 de janeiro). 3. Tempo da Quaresma a) Domingos 97. As leituras do Evangelho são distribuídas da seguinte maneira: no primeiro e segundo domingos, conservam-se as narrações das tentações e da transfiguração do Senhor, mas lidas segundo os três sinóticos. Nos três domingos seguintes, foram recuperados, para o ano A, os Evangelhos da samaritana, do cego de nascença e da ressurreição de Lázaro; estes, por serem de grande importância em relação à iniciação cristã, podem ser lidos também nos anos B e C, sobretudo quando há catecúmenos. Todavia, nos anos B e C há também outros textos, a saber: no ano B, alguns textos de São João sobre a futura glorificação de Cristo por sua cruz e ressurreição; no ano C, alguns textos de São Lucas sobre a conversão. No domingo de Ramos da Paixão do Senhor, foram escolhidos para a procissão dos textos que e referem à solene entrada do Senhor em Jerusalém, tirados dos três Evangelhos sinóticos; na missa lê-se o relato da Paixão do Senhor. As leituras do Antigo Testamento referem-se à história da salvação que é um dos temas próprios da catequese quaresmal. Cada ano há uma série de textos que apresentam os principais elementos desta história, desde o princípio até a promessa da nova aliança. As leituras do Apóstolo foram escolhidas de tal forma que tenham relação com as leituras do Evangelho e do Antigo Testamento e haja, na medida do possível, uma adequada conexão entre as mesmas. b) Dias de semana 98. As leituras do Evangelho e do Antigo Testamento foram escolhidas de modo que tivessem uma relação mútua e tratam de diversos temas próprios da catequese quaresmal, em consonância com o significado espiritual deste tempo. Desde a segunda-feira da quarta semana, oferece-se uma leitura semicontínua do Evangelho de São João, na qual se incluem aqueles textos deste Evangelho que melhor correspondem às características da Quaresma. Como as leituras da samaritana, do cego de nascença e da ressurreição de Lázaro agora se lêem aos domingos, mas somente no ano A (e nos outros anos de maneira opcional), previu-se que possam ser lidas, também nos dias de semana; por isso, no começo da terceira, quarta e quinta semanas, acrescentaram-se algumas “missas opcionais” que contêm esses textos; tais missas podem ser empregadas em qualquer dia da semana correspondente, em lugar das leituras do dia.
112 Nos primeiros dias da Semana Santa, as leituras consideram o mistério da Paixão. na missa do Crisma, as leituras sublinham a função messiânica de Cristo e sua continuação na Igreja, por meio dos sacramentos. 4. Tríduo sacro e Tempo Pascal a) Sacro Tríduo Pascal 99. Na quinta feira Santa, na missa vespertina, a recordação do banquete que precedeu o êxodo ilumina, de maneira especial, o exemplo de Cristo ao lavar os pés dos discípulos e as palavras de Paulo sobre a instituição da Páscoa cristã na Eucaristia. A ação litúrgica da sexta-feira santa chega ao seu momento culminante no relato segundo São João da Paixão daquele que, como o Servo do Senhor, anunciado no livro de Isaías, tornou-se realmente o único sacerdote a oferecer-se a si mesmo ao Pai. Na vigília pascal da noite santa, propõem-se sete leituras do Antigo Testamento, que lembram as maravilhas de Deus na história da salvação, e duas do Novo, a saber, o anúncio da ressurreição, segundo os três Evangelhos sinóticos, e a leitura apostólica sobre o batismo cristão como sacramento da ressurreição de Cristo. Para a missa do dia da Páscoa, propõe-se a leitura do Evangelho de São João sobre o encontro do sepulcro vazio. Pode-se ler também, caso se prefira, os textos dos Evangelhos propostos para a noite santa, ou, quando houver missa vespertina, a narração de Lucas sobre a aparição aos discípulos que iam para Emaús. A primeira leitura é retirada dos Atos dos Apóstolos, que se lêem durante o Tempo Pascal, em vez da leitura do Antigo Testamento. A leitura do Apóstolo referese ao mistério da Páscoa vivido na Igreja. b) Domingos 100. Até o terceiro domingo da Páscoa, as leituras do Evangelho relatam as aparições de Cristo ressuscitado. As leituras do Bom Pastor são proclamadas no quarto domingo da Páscoa. No quinto, sexto e sétimo domingos da Páscoa lêem-se passagens escolhidas do discurso e da oração do Senhor depois da última ceia. A primeira leitura é tirada dos Atos dos Apóstolos, no ciclo dos três anos, de modo paralelo e progressivo; dessa forma, em cada ano oferecem-se algumas manifestações da vida, testemunho e progresso da Igreja primitiva. Para a leitura apostólica, no ano A, lê-se a primeira carta de São Pedro; no ano B, a primeira carta de São João; e no ano C, o Apocalipse; estes textos estão de acordo com o espírito de uma fé alegre e uma firme esperança, próprios deste tempo. c) Dias de semana 101. A primeira leitura é tirada dos Atos dos Apóstolos, como nos domingos, de modo semicontínuo. No Evangelho, dentro da oitava da Páscoa, lêem-se os relatos das aparições do Senhor. Depois, faz-se uma leitura semicontínua do Evangelho de São João, do qual se tiram, agora, os textos de cunho pascal, para completar assim a leitura já começada no tempo da Quaresma. Nesta leitura pascal ocupam uma grande parte o discurso e a oração do Senhor depois da ceia.
113 d) Solenidade da Ascensão e Pentecostes 102. A solenidade da Ascensão conserva como primeira leitura a narração do evento segundo os Atos dos Apóstolos, e este texto é completado pelas leituras apostólicas acerca do Cristo elevado à direita do Pai. Na leitura do Evangelho cada ciclo apresenta o texto próprio segundo as variantes de cada evangelista. Na missa que se celebra na tarde da vigília de Pentecostes, oferecem-se quatro textos do Antigo Testamento, para que se escolha um deles, que ilustram o múltiplo significado da solenidade. A leitura apostólica explica como o Espírito realiza a sua função na Igreja. finalmente, a leitura evangélica recorda a promessa do Espírito feita por Cristo, quando ainda não havia sido glorificado. Na missa do dia, toma-se como primeira leitura a narração que nos fazem os Atos dos Apóstolos do grande acontecimento de Pentecostes, ao passo que os textos do Apóstolo manifestam os efeitos da atuação do Espírito na vida da Igreja. A leitura evangélica traz à memória como Jesus, na tarde do dia de Páscoa, torna os discípulos participantes do Espírito, ao passo que os outros textos opcionais tratam da ação do Espírito nos discípulos e na Igreja. 5. Tempo Comum a) Distribuição e seleção dos textos 103. O Tempo Comum começa na segunda-feira que segue o domingo depois do dia 6 de janeiro e termina na terça-feira antes da Quaresma, inclusive; recomeça na segunda-feira depois do domingo de Pentecostes e termina antes das primeiras vésperas do primeiro domingo do Advento. O Elenco das Leituras da Missa contém leituras para os 34 domingos e as semanas que os seguem. Às vezes, porém, as semanas do Tempo Comum são apenas 33. Além disso, alguns domingos ou pertencem a outro tempo litúrgico (o domingo em que se celebra o Batismo do Senhor e o domingo de Pentecostes), ou ficam impedidos por uma solenidade que coincide com eles (por exemplo: Santíssima Trindade, Jesus Cristo Rei do Universo). 104. Para ordenar corretamente o uso das leituras estabelecidas para o Tempo Comum, deve-se observar o seguinte: 1) O domingo em que se celebra a festa do Batismo do Senhor ocupa o lugar do 1º domingo do Tempo Comum; portanto, as leituras da Semana I começa na segunda-feira depois do domingo após o dia 6 de janeiro. Se a festa do Batismo do Senhor se celebra na segunda-feira depois do domingo em que se celebrou a Epifania, as leituras da Semana I começam na terça-feira. 2) O domingo que segue a festa do Batismo do Senhor é o 2º do Tempo Comum. Os outros numeram-se em ordem progressiva, até o domingo que precede o início da Quaresma. As leituras da semana em que ocorre a Quarta-feira de Cinzas interrompem-se depois do dia que precede esta quarta-feira. 3) Ao recomeçar as leituras do Tempo Comum depois do domingo de Pentecostes, é preciso levar em consideração o seguinte: - Se os domingos do Tempo Comum são 34, toma-se a semana que segue imediatamente à semana cujas leituras foram lidas em último lugar antes da Quaresma. - Se os domingos do Tempo Comum são 33. omite-se a primeira semana que se deveria tomar depois de Pentecostes, para conservar assim, no final do ano litúrgico, os textos escatológicos assinalados para a duas últimas semanas.
114 b) Leituras para os domingos 105. 1) Leituras do Evangelho O 2º domingo do Tempo Comum ainda se refere à manifestação do Senhor, celebrada na solenidade da Epifania, pela perícope tradicional das bodas de Caná e outras duas, também elas tiradas do Evangelho de São João. A partir do 3º domingo, começa a leitura semicontínua dos três Evangelhos sinóticos: esta leitura ordena de tal forma que apresenta a doutrina própria de cada Evangelho, à medida que se vai desenrolando a vida e a pregação do Senhor. Além disso, graças a esta distribuição, consegue-se certa harmonia entre o sentido de cada Evangelho e a evolução do ano litúrgico. Com efeito, depois da Epifania, lêem-se os começos da pregação do Senhor, que têm uma estreita relação com o Batismo e as primeiras manifestações de Cristo. No final do ano litúrgico, chega-se espontaneamente ao tema escatológico, próprio dos últimos domingos, já que os capítulos do Evangelho que precedem o relato da Paixão tratam deste tema, de maneira mais ou menos ampla. No ano B intercalam-se, depois do 16º domingo, cinco leituras do capítulo 6 do Evangelho de São João (o “discurso sobre o pão da vida”); esta intercalação fazse de modo conatural, já que a multiplicação dos pães do Evangelho de São João substitui a mesma narração segundo São Marcos. Na leitura semicontínua de São Lucas do ano C antepõe-se ao primeiro texto (isto é, o 3º domingo) o prólogo do Evangelho em que se explica a intenção do autor, e para o qual não se encontra um espaço adequado em outro lugar. 106. 2) Leituras do Antigo Testamento Estas leituras foram selecionadas em relação às perícopes evangélicas, com o fim de evitar uma excessiva diversidade entre as leituras de cada missa e sobretudo para evidenciar a unidade de ambos os Testamentos. A relação entre as leituras da missa torna-se evidente através da cuidadosa escolha dos títulos que se encontram no princípio de cada leitura. Ao selecionar as leituras procurou-se, na medida do possível, fazer que fossem breves e fáceis. mas previu-se, também, que nos domingos fosse lido o maior número possível dos textos mais importantes do Antigo Testamento. Estes textos foram distribuídos sem uma ordem lógica, atendendo apenas à sua relação com o Evangelho; todavia, o tesouro da Palavra de Deus ficará de tal forma aberto que todos os que participam da missa dominical conhecerão quase todas as passagens mais importantes do Antigo Testamento. 107. 3) Leituras do Apóstolo Para esta segunda leitura propõe-se uma leitura semicontínua das cartas de São Paulo e de São Tiago (as cartas de São Pedro e de São João são lidas no Tempo Pascal e no Tempo do Natal). A primeira Carta aos Coríntios, por ser muito longa e tratar de diversos temas, foi distribuída nos três anos do ciclo, no princípio deste Tempo Comum. Também pareceu oportuno dividir a Carta aos Hebreus em duas partes, a primeira das quais se lê no ano B, e a outra no Ano C. Convém advertir que foram escolhidas somente leituras bastante breves e não muito fáceis para a compreensão dos fiéis. A tabela II que se encontra mais adiante indica a distribuição das cartas nos domingos do Tempo Comum para os três anos do ciclo.
115 c) Leituras para as solenidades do Senhor no Tempo Comum 108. Para as solenidades da Santíssima Trindade, do Santíssimo Sacramento do Corpo e do Sangue de Cristo e do Sagrado Coração de Jesus escolheram-se alguns textos que correspondem às principais características destas celebrações. As leituras do 34º e último domingo celebram Jesus Cristo, Rei do Universo, esboçado na figura de Davi, proclamado no meio das humilhações da Paixão e da Cruz, reinante na Igreja, e que deve voltar no fim dos tempos. d) Leituras para os dias de semana 109. 1) Os Evangelhos ordenam-se de tal modo que em primeiro lugar se lê o de São Marco (semanas 1ª -9ª), depois o de São Mateus (semanas 10ª - 21ª), finalmente o de São Lucas (semanas 22ª - 34ª). Os capítulos 1-12 de São Marcos lêem-se integralmente, excetuando-se apenas duas perícopes do capítulo 6 que se lêem nos dias de semana de outros tempos. De São Mateus e São Lucas lê-se tudo aquilo que não se encontra em São Marco. Aqueles versículos que no Evangelho têm uma índole totalmente própria ou que são necessários para entender adequadamente a continuidade do Evangelho lêem-se duas ou até três vezes. O discurso escatológico lê-se integralmente em São Lucas, e deste modo esta leitura coincide com o final do ano litúrgico. 110. 2) Na primeira leitura, vão-se alternando os dois Testamentos, várias semanas cada um, segundo a extensão dos livros que se lêem. Dos livros do Novo Testamento, lê-se uma parte bastante notável, procurando dar uma visão substancial de cada uma das cartas. Quanto ao Antigo Testamento, não era possível oferecer mais do que aquelas passagens escolhidas que, na medida do possível, dessem a conhecer a índole própria de cada livro. Os textos históricos foram selecionados de modo que dêem uma visão de conjunto da história da salvação antes da encarnação do Senhor. Era praticamente impossível integrar os relatos muito extensos: em alguns casos foram selecionados alguns versículos, com a finalidade de abreviar a leitura. Além disso, algumas vezes se ilumina o significado religioso dos fatos históricos por meio de alguns textos tirados dos livros sapienciais, que se acrescentam em forma de proêmio ou de conclusão a determinada série histórica. No Elenco das Leituras da Missa para os dias de semana do Próprio do Tempo, entram quase todos os livros do Antigo Testamento. Omitiram-se unicamente alguns livros proféticos muito breves (Abdias, Sofonias) e um livro poético (o Cântico dos Cânticos). Entre as narrações escritas com uma finalidade exemplar, que exigem uma leitura bastante extensa para que se entenda, lêem-se os livros de Tobias e de Rute; os outros são omitidos (Ester, Judite). Não obstante, encontram-se alguns textos destes livros nos domingos e nos dias de semana de outros tempos. A tabela III, que figura mais adiante, indica a distribuição em dois anos dos livros de ambos os Testamentos nos dias de semana do Tempo Comum. No final do ano litúrgico lêem-se os livros que estão em consonância com a índole escatológica deste tempo, a saber, Daniel e o Apocalipse.
116 CAPÍTULO VI Adaptações, traduções para a língua vernácula e indicações do Elenco das Leituras da Missa 1. Adaptações e Traduções 111. Na assembléia litúrgica, a Palavra de Deus deve ser proclamada sempre ou com os textos latinos preparados pela Santa Sé ou com as traduções em língua vernácula aprovadas para o uso litúrgico pelas Conferências Episcopais, segundo as normas vigentes. 112. O Lecionário da missa deve ser traduzido integralmente, sem excetuar a introdução, em toas as suas partes. Se a Conferência Episcopal considerar necessário e oportuno introduzir algumas acomodações, estas devem obter antes a confirmação da Santa Sé. 113. Devido ao tamanho do Lecionário, as edições do mesmo constarão necessariamente de vários volumes, acerca dos quais não se prescreve nenhum gênero de divisão. Cada volume deverá incluir os textos em que se explica a estrutura e a finalidade da parte correspondente. Recomenda-se o antigo costume de editar separadamente o livro dos Evangelhos e das outras leituras do Antigo e do Novo Testamento. Mas, caso se julgue conveniente, poder-se-á editar separadamente o Lecionário Dominical - no qual se poderá incluir uma seleção do santoral - e o Lecionário Ferial. O dominical poderá ser divido acertadamente segundo o ciclo dos três anos, de modo que em cada ano se tenha tudo em seqüência. Onde se encontrar algumas distribuição que pareça mais apta para o uso pastoral, há liberdade para pô-la em prática. 114. Juntamente com as leituras devem estar sempre os textos dos cânticos; mas é permitido fazer livros que contenham somente os cânticos. Recomenda-se que se imprima o texto dividido em estrofes. 115. Sempre que a leitura conste de partes diversas, esta estrutura do texto deverá manifestar-se claramente na disposição tipográfica. Recomenda-se também que os textos, inclusive os não-poéticos, se imprimam em forma de verso, para facilitar a proclamação das leituras. 116. Quando uma mesma leitura apresenta as formas longa e breve, convém colocá-las separadamente, para que se possa ler com facilidade uma e outra; mas se essa separação não parecer oportuna, deve-se encontrar a maneira mais conveniente para que um e outro texto possam ser proclamados sem erro. 117. Nas traduções em línguas vernáculas não se deve omitir o título que precede o texto. A esse texto pode-se acrescentar, caso se julgue oportuno, uma admoestação que explique o sentido geral da perícope, com algum sinal adequado ou com caracteres tipográficos distintos, para que se veja claramente que se trata de um texto opcional. 118. Em cada volume se acrescentará, oportunamente, um índice bíblico das perícopes, como se encontra no Elenco das Leituras da Missa, para que se possam encontrar com facilidade nos Lecionários da missa os textos necessários ou úteis para determinadas ocasiões.
117 2. Indicações para cada leitura em particular Propõe-se para cada leitura a indicação do texto, do título e as palavras iniciais com relação aos quais deve-se observar o seguinte: a) Indicação do texto 119. A indicação do texto (isto é, do capítulo e dos versículos) dá-se sempre segundo a edição da nova Vulgata, excetuando os salmos; às vezes se acrescenta uma indicação ao texto original (hebraico, aramaico ou grego), sempre que houver discrepância. Nas traduções em língua vernácula, de conformidade com o que decretar a autoridade competente em cada língua, pode-se seguir a numeração que corresponde à versão aprovada pela mesma autoridade para o uso litúrgico. Mas convém que haja sempre uma cuidadosa indicação dos capítulos e versículos, que se colocará também dentro do próprio texto à margem dele, quando isso julgar oportuno. 120. Disto segue-se que nos livros litúrgicos deve haver a “indicação do texto que se deve ler na celebração, e que não se coloca no Elenco das Leituras da Missa”. Esta indicação se fará segundo as seguintes normas, que podem ser modificadas por decisão das autoridades competentes, segundo os costumes e conveniências de cada lugar ou de cada língua: 121. 1) Dir-se-á sempre “Leitura do livro…” ou “Leitura da carta…”, ou “Proclamação do santo Evangelho…”, e não “Princípio” (a não ser que em alguns casos especiais pareça oportuno) ou “Continuação” 122. 2) Conservar-se-á o uso tradicional quanto ao nome dos livros, excetuando os seguintes casos: a) Quando houver dois livros do mesmo nome se dirá “primeiro livro” e “segundo livro” (por exemplo, dos Reis, dos Macabeus) ou então “primeira carta” “segunda carta”. b) Empregar-se-á o nome mais usado na atualidade nos seguintes livros: “1ª e 2ª livro de Samuel”, em vez de 1º e 2º livro dos Reis; “1º e 2º livro dos Reis”, em vez de 3º e 4º livro dos Reis; “1º e 2º livro das Crônicas”, em vez de 1º e 2º livro dos Paralipômenos; “Livro de Esdras e Neemias”, em vez de 1º e 2º livro de Esdras. c) É preciso distinguir entre si os livros sapienciais, com os seguintes nomes: Livro de Jó, dos Provérbios, do Eclesiastes ou Coélet, do Cântico dos Cânticos, da Sabedoria, do Eclesiástico ou Sirac. d) Quanto aos livros que na nova Vulgata figuram entre os profetas, se dirá: “Leitura do Livro de Isaías, de Jeremias, de Baruc”, e “Leitura da Profecia de Ezequiel, Daniel, Oséias… de Malaquias”, inclusive naqueles livros que alguns consideram não verdadeiramente proféticos. e) Dir-se-á “Lamentações” e “Cartas aos Hebreus”, sem mencionar Jeremias ou Paulo. b) Títulos 123. Cada texto traz título cuidadosamente estudado (formado quase sempre com palavras do mesmo texto em que se indica o tema principal da leitura e, quando for necessário, a relação entre as leituras da missa).
118 c) As palavras iniciais 124. As palavras iniciais são como de costume: “Naquele tempo”, “Naqueles dias”, “Irmãos”, “Caríssimos”, “Diz o Senhor”. Omitem-se, quando no texto houver uma suficiente indicação de tempo ou de pessoas, ou quando pela própria natureza do texto estas palavras não forem oportunas. Nas traduções em línguas vernáculas, essas fórmulas poderão ser mudadas ou omitidas, por decisão das autoridades competentes. Depois dessas palavras vem o começo da leitura propriamente dito, tirando ou acrescentando algumas palavras segundo for necessário para entender o texto separado de seu contexto. No Elenco das Leituras da Missa, dão-se as convenientes indicações, quando o texto consta de versículos descontínuos, se isso obrigar a introduzir alguma mudança no texto. d) Aclamação final 125. No final das leituras, para facilitar a aclamação do povo, convém imprimir as palavras que o leitor pronuncia: “Palavra do Senhor”, ou outras do mesmo teor, segundo os costumes de cada lugar.