Desafios 24 Cadernos de trans_formação Janeiro de 2018
Ousar ser autor nos tempos de crise
Ficha técnica:
Título: Reagir aos Desafios do Ensino Profissional no Século XXI
Direção: José Matias Alves
Coordenação e Organização deste número: Luísa Orvalho
Composição: Francisco Martins
Autores: Diretores e Professores da Escola Profissional do Val do Rio
Editor: Faculdade de Educação e Psicologia da Universidade Católica Portuguesa
Data de edição: janeiro de 2018
Local: Porto Rua Diogo Botelho,1327|4169-005|Porto | Portugal
Foto de capa: Cartaz do Seminário de avaliação da oficina de formação
ISBN: 2183-7406
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Colaboraram neste número:
Ana Isabel Bandeira – Diretora Pedagógica
Ana Paula Carvalho – Coordenadora dos Cursos Técnico de Apoio à Infância e Técnico de Apoio Psicossocial
Ana Gomes – Professora de Inglês
Ana Diva Pereira – Professora de Área de Integração
António Moreira da Silva – Coordenador dos Cursos Técnico de Gestão de Equipamentos Informáticos e Técnico de Multimédia
Bruno Santos – Professor de Educação Física
Catarina Justino – Professora de Inglês e Português
Cláudio Gonçalves – Coordenador do Curso Técnico de Eletrónica e Telecomunicações
Cristina Coelho – Professora de Física e Química e de Biologia
Diogo Martinho – Coordenador do Curso Técnico de Design Gráfico
José Carlos Tavares – Diretor EPVR Sede (Oeiras)
Madalena Ghira – Professora de Expressão Plástica
Nuno Toco – Professor de Eletrónica 3
Patrícia Garção – Professora de Ética Social e Profissional
Patrícia Simões – Professora de Português
Rui Oliveira – Coordenador do Curso Técnico de Desenho Digital 3D
Tânia Flamino – Professora de Português
Teresa Figueira – Professora de Inglês
Vera Casteleiro – Coordenadora do Curso Técnico de Auxiliar de Saúde
Vitor Sousa – Professor de História e Cultura das Artes
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Índice Editorial ......................................................................................................................................... 6 A Determinação de Ver ................................................................................................................ 6 Introdução .................................................................................................................................... 7 Reagir aos Desafios do Ensino Profissional no Século XXI .......................................................... 7 Escola Profissional Val do Rio: um projeto educativo ............................................................... 13 1.
Seminário “(Re)Agir aos Desafios do Ensino Profissional no Século XXI” ........................ 16
2.
Plano de Melhoria e Critérios Gerais de Avaliação da EPVR............................................. 19
3.
Pedagogia de Projeto como Metodologia de Trabalho na EPVR ...................................... 24
4.
Diferenciação Pedagógica: a chave para o sucesso ........................................................... 35
5.
Escola-Empresa: formas de cooperação para a qualificação de RH com competências 4.0 ....................................................................................................................................... 40
6.
Testemunhos de diplomados do Ensino Profissional na EPVR ......................................... 43
7. Testemunho de uma professora da EPVR ………………………………………………………………………45
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Editorial A Determinação de Ver
José Matias Alves Diretor-Adjunto da FEP
Este número ilustra várias possibilidades de agir, re_agir e pro_agir no campo do ensino profissional. Desafiar a ver oportunidades de desenvolvimento; inscrever na ação um olhar avaliativo que compreende as realidades e as faz evoluir de forma positiva; construir, a partir daí, planos de melhoria e desenvolvimento profissional e organizacional, não esquecendo a inscrição territorial; fazer da pedagogia um projeto de envolvimento e ação; estabelecer relações de soma positiva entre a escola e a empresa; e dar voz aos atores e autores de outro presente. Estas são algumas das sementes deste número. Que abrem horizontes de metamorfose e melhoria. Parabéns a todos os que não desistem de inventar dias mais claros.
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Introdução Reagir aos Desafios do Ensino Profissional no Século XXI
Luísa Orvalho Consultora do SAME-EP
No dia 22 de setembro, no auditório Templo da Poesia, do Parque dos Poetas, em Oeiras, decorreu o seminário final da Oficina “Re) Aprender a Ensinar e Avaliar no Ensino Profissional: o saber em ação”, organizado pela Escola Profissional Val do Rio.
Figura 1- Equipa de professores e diretores da EPVR
Como “Fazedores da mudança” (Pedro Barroso, 2018), os professores e diretores da EPVR, que participaram na formação, quiseram partilhar os caminhos de reflexãoação trilhados, as melhorias e as evidências de transformação e de desenvolvimento 7
profissional e organizacional alcançadas com esta Oficina, com outras escolas, professores, alunos, empresários, representantes das autarquias de Oeiras e Cascais, de associações socioprofissionais, e ainda, com o representante da ANESPO e o Senhor Secretário de Estado da Educação.
Figura 2 - Sessão de Encerramento do Seminário
Pensar a mudança no Ensino Profissional e estar preparados para “REAGIR AOS DESAFIOS DO ENSINO PROFISSIONAL NO SÉCULO XXI”, foi a questão orientadora de partida. O que já fazemos bem, e o que queremos fazer melhor? O que temos de mudar? E porquê? Uma mudança progressiva ou disruptiva? A Educação e Formação, enquanto processo através do qual se enriquecem o pensamento, o conhecimento, as competências, as atitudes e valores daquele que APRENDE, exige uma conexão permanente com a vida, ter as antenas sempre ligadas, ser um observador atento, para se poder ser um professor(a) reflexivo(a) capaz de intervir nos diferentes contextos e ajudar os alunos a serem pessoas e profissionais qualificados capazes de aprenderem, numa relação com os outros. A vida é troca, permuta, escâmbio, mutação, transação, transferência e metamorfose (José Tolentino Mendonça, in Revista do Expresso, Edição2359, de 13 de janeiro de 2018). Quem quiser mudar, transformar, metamorfosear, de “ pintar passados vai ter muito para emendar” (Sérgio Godinho, 2018).
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Educar é preparar o ser humano para a vida! Ensinar é fazer aprender. Temos que Mudar, porquê? Porque o Mundo está a Mudar… O professor tem de mudar, porquê? A Ciência as Tecnologias avançam a uma velocidade vertiginosa… O futuro traz novos empregos e mais qualificados… As crianças e os jovens que chegam às escolas são muitos diferentes … O trabalho na sala de aula tem de ser alterado… (Guilherme d´ Oliveira Martins, 2017, in O perfil do aluno para o século XXI). Para Roberto Carneiro (2017, in Revista Expresso, de fevereiro de 2017) “Temos perdido tempo demais numa hesitação doentia em mudar os ambientes educativos, o papel dos docentes, a sua formação” e “as formas de avaliação dos alunos”. Continuamos a “relegar os percursos comportamentais para um plano inexistente”. Não haverá mudança sustentável sem um empenho sério dos docentes, das famílias, das empresas, da sociedade em geral sobre quem repousa a responsabilidade pelo nosso futuro coletivo. As finalidades do modelo educativo e formativo do Ensino Profissional são muito claras e objetivas: Formação para a Mudança; Formação Qualificada; Formação Integral (ser Pessoa, ser Cidadão, ser Trabalhador). São imprescindíveis duas condições, para se aplicar este modelo inovador. 1ª - A construção de um novo modelo de profissionalidade docente; 2ª - Lideranças de topo e intermédia transformacional e facilitadora.
Que ambientes e metodologias podem potenciar o desenvolvimento das qualificações baseadas nos resultados de aprendizagem e facilitar o acesso ao emprego e à cidadania responsável dos diplomados do EFP? Como devemos ensinar para desenvolver estas qualificações e avaliar se os alunos as desenvolveram efetivamente (na escola e fora dela, em parceria com os stakeholders estratégicos)? Que impactos e efeitos transformativos no desenvolvimento profissional e pessoal efetivamente queremos que produzam no aluno?
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Como fazer o equilíbrio entre as soft skills e as hard skills? “As hard skills são as que permitem chegar a uma entrevista de trabalho, mas são as soft skills que nos ajudam a ficar com o lugar” (Gonçalo Costa de Andrade). As tendências atuais variam em função de 2 grandes fatores: Economia Digital - Desenvolvimento científico, o uso das tecnologias e da inovação técnica incorporada no desempenho das tarefas. Progresso social - Dinâmicas específicas de costumização e diferenciação dos processos e produtos e o desenvolvimento de novas soluções de cooperação e colaboração que estimulem a inovação. Antes de qualquer revisão e flexibilidade curriculares é preciso uma reflexão profunda sobre a intensidade e relevância destas skills e como as desenvolver na prática. “É evidente que as transformações no mundo do trabalho e da organização empresarial, induzidas sobretudo por inovações tecnológicas, determinarão a cada momento as competências mais exigidas”, “se soubermos aliar os nossos pontos fortes de competências a um maior rigor de gestão” estaremos em condições “de liderar o campeonato mundial das soft skills 4.0, tal como elas se apresentam como sustentáculo de uma economia 4.0” (Roberto Carneiro, 2018, in Revista Expresso de, 25 de fevereiro de 2017).
Figura 3- Painel 1 do Seminário
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Os professores fascinantes (Augusto Cury, 2006) procuram conhecer melhor a forma como os seus alunos aprendem para os educar melhor, face às suas necessidades peculiares. No admirável mundo novo, da “ Inteligência das Coisas” e já não só da “Internet das Coisas”, as TIC, associadas a esta forma de entender a educação, poderão definitivamente aproximar professor e aluno, ajudando a que cada aluno aprenda melhor e atinja o máximo do seu potencial. A integração das TIC no processo de ensino pretende exercer um impacto positivo na aprendizagem dos alunos, através da criação de ambientes de aprendizagem estimulantes, como o uso de APP´s, Gamificação, Tablets, Telemóveis, … na sala de aula. A integração da tecnologia no processo de ensino e aprendizagem baseado no conhecimento científico, pedagógico e tecnológico do conteúdo, e não só na tecnologia em si, mas sobretudo na forma como ela é integrada, realçando as conexões entre conteúdo, pedagogia e tecnologia em contexto, é fundamental. A tecnologia de aprendizagem ao longo da vida e de acordo com o Projeto de vida e Projeto carreira de cada um dos alunos. Como exemplos de caminhos de reflexão-ação-mudança, e de tentativas de praxis de concretização nas escolas com ensino profissional, que foram experienciados pelos professores da EPVR: Flexibilidade e Aprendizagem Contextualizada: gestão flexível do currículo modular e avaliação formativa; Participação e Criatividade: na resolução de problemas, trabalhando por projetos integradores (PI), com base em fenómenos e na aprendizagem baseada em projetos (AbP); Facilitação e Liderança Transformacional: inclusão de todos na tomada de decisões em cada etapa do projeto (Que aprendizagens? Que realidade? Dar voz e escolha aos alunos. Avaliação multifacetada, reflexiva e crítica que faz avançar. Colaboração estruturada que não permite que ninguém fica parado na AbP); Investigação-Ação permanente: desenvolvendo ciclos de melhoria, com base na ferramenta Appreciative Inquiry; Colaboração, Partilha e Networking: desenvolvimento da escola como comunidade de práticas e de aprendizagem.
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Cada escola, cada professor(a) não pode ficar a navegar sozinho(a), num mar de horizontes indefinidos. Os desafios são muitos, e cada vez mais desconhecidos, só a colaboração entre escolas e entre profissionais de ensino, pode ajudar a encontrar a bússola que nos leve à Educação e Formação de 2030. Nesta edição podem apreciar alguns dos caminhos já percorridos pela EPVR. A criação de um futuro em que a inovação e a tecnologia servem às pessoas. Convido-os a ler.
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Escola Profissional Val do Rio: um projeto educativo Ana Bandeira Diretora pedagógica da EPVR
“A Escola Profissional Val do Rio tem como objetivo oferecer aos seus alunos uma formação humana integral: técnica, intelectual e espiritual, de modo a formar profissionais competentes e cidadãos responsáveis, conscientes dos seus deveres na sociedade civil.” (In Projeto Educativo EPVR, 2013)
A Escola Profissional Val do Rio (EPVR) iniciou a sua atividade em maio de 1989, com uma turma do Curso Técnico de Indústrias Gráficas nas instalações facultadas para o efeito na Fundição de Oeiras pela Câmara Municipal. Após obras de remodelação, a Escola fixou-se definitivamente no antigo edifício de uma associação benemérita, Associação A Junção do Bem, junto à Câmara Municipal de Oeiras. Em 1992, surge o polo de Cascais.
Figura 4 - 1.ª turma da EPVR, curso de Técnico de Indústrias Gráficas, na Fundição de Oeiras (1989) 13
A EPVR, desde a sua fundação, tem como objetivo oferecer aos seus alunos uma formação humana integral (técnica, intelectual e espiritual) para formar profissionais competentes e cidadãos responsáveis, conscientes dos seus deveres na sociedade civil. A partir da bandeira da “educação personalizada”, a Escola pretende a progressão de cada aluno no processo de desenvolvimento das suas capacidades, que passa para além da sala de aula, prolongando o seu âmbito educativo. A singularização e a participação levada a cabo por ação da Escola conduzem todas as partes envolvidas (aluno, encarregado de educação/pais, professor) a assumirem um compromisso.
Figura 5 - Uma das primeiras aulas de Fotomecânica, na Fundição de Oeiras (1989)
Todos os momentos de permanência na Escola são momentos importantes para a educação e a formação do caráter do aluno. Por isso, como ferramentas que dão corpo ao seu projeto educativo, na Escola destacam-se de forma especial as tutorias e as aulas de Ética Social e Profissional: 1. A Tutoria é um importante instrumento para a formação integral e personalizada do aluno, estando orientada para todos os aspetos da pessoa, tendo na educação do caráter um papel central. O professor-tutor, respeitando a liberdade do aluno e as características pessoais, ajuda-o no desenvolvimento das suas potencialidades.
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2. A Ética Social e Profissional é uma disciplina lecionada na Escola ao longo dos três anos de formação e foca a atenção nas componentes saber-ser e saber-viver em conjunto. Não se resume a atuação da Escola à orientação do aluno nos seus estudos e à sua integração na turma e na Escola. É também atuação da Escola motivar a participação do aluno na vida social, ajudá-lo a resolver os seus dilemas e orientá-lo para o trabalho e para a construção do seu projeto de vida. Trabalhar com o aluno é possível quando se trabalha com os pais/encarregados de educação. Assim, ainda na condição de pais/encarregados de educação de um candidato a frequentar a Escola, acompanham o seu educando em workshops aos sábados de manhã para conhecerem a escola, alunos e professores, espaços e recursos tecnológicos, para conhecerem o projeto da Escola. Depois como pais/encarregados de educação de alunos da EPVR são convidados a participar em sessões de formação para pais. A EPVR diferencia-se por corresponder às necessidades e expetativas dos alunos e da comunidade escolar, em articulação com a comunidade envolvente, oferecendo cursos de acordo com as necessidades dos concelhos onde está inserida. Atualmente, a oferta formativa da escola são cursos profissionais de nível IV de dupla certificação: Em Oeiras: Vídeo, Gestão de Equipamentos Informáticos, Design e Produção Gráfica, Multimédia, Desenho Digital 3D, Eletrónica e Telecomunicações; Em Cascais: Apoio à Infância, Apoio Psicossocial, Auxiliar de Saúde. Desde a sua fundação há quase 30 anos, a Escola teve sempre a preocupação de adaptar as suas instalações e os seus equipamentos às práticas de cada setor e reproduzir os ambientes profissionais em que vão ser inseridos os seus alunos. Assim, a Escola equipou as suas salas técnicas e laboratórios de equipamentos modernos e em número suficiente para praticar uma aprendizagem individual ou em grupos.
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1. Seminário “(Re)Agir aos Desafios do Ensino Profissional no Século XXI”
O seminário “(Re)Agir aos Desafios do Ensino Profissional no Século XXI” foi um momento de divulgação das práticas pedagógicas implementadas na Escola Profissional Val do Rio e que foram o resultado da Oficina de Formação, ministrada ao longo do ano letivo 2016/2017 pela consultora da Universidade Católica do Porto, Doutora Luísa Orvalho. A Oficina de formação teve como principais objetivos: 1. Construir alternativas de ação para dar resposta aos problemas prioritários identificados na prática pedagógica de forma a promover o sucesso de todos; 2. Reconhecer e utilizar a estrutura modular com as suas potencialidades no processo de ensino-aprendizagem; 3. Elaborar um plano de melhoria e de inovação educacional a implementar na Escola. A transformação do trabalho individualista numa cultura de trabalho colaborativo em rede foi, sem dúvida, um objetivo concretizado através da articulação curricular, da implementação de projetos integradores (baseados nos resultados de aprendizagem) e numa avaliação essencialmente formativa e responsabilizante. Muita investigação, muita reflexão, muita partilha, muitos documentos produzidos… numa ação que trouxe sucesso para todos, que trouxe melhorias e boas práticas pedagógicas e que resultou na divulgação e abertura à comunidade com a realização do Seminário “(Re)Agir aos Desafios do Ensino Profissional no Século XXI” realizado no dia 22 de setembro de 2017, no Templo da Poesia (em Oeiras). O Seminário contou com as presenças: na abertura, do Dr. Paulo Vistas, exPresidente da Câmara Municipal de Oeiras; no encerramento com as presenças do Dr. Carlos Fernando Vieira, Diretor Executivo da Associação Nacional das Escolas Profissionais (ANESPO), o Dr. Frederico Almeida, Vereador da Educação da Câmara Municipal de Cascais e com o Secretário de Estado da Educação, Prof. Doutor. João Costa. O corpo do Seminário centrou-se em quatro painéis, como se ilustra na Figura 6: 1. Pedagogia de Projeto como Metodologia de Trabalho na EPVR: contextualização teórica e casos práticos (projetos integradores); 16
2. Diferenciação Pedagógica, a chave para o sucesso: contextualização teórica e casos práticos (e-portefólio); 3. Escola-Empresa: formas de cooperação para a qualificação de RH com competências 4.0; 4. Testemunhos de diplomados do Ensino Profissional na EPVR.
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Figura 6 – Programa do Seminário
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2. Plano de Melhoria e Critérios Gerais de Avaliação da EPVR
José Carlos Tavares Diretor da EPVR Sede (Oeiras)
Com a participação de todos os professores envolvidos no seminário, a primeira tarefa conjunta foi elaborarmos uma análise SWOT, uma radiografia da escola a partir da seguinte questão: “Como ensinamos, fazemos aprender e avaliamos nos cursos profissionais da nossa Escola?” Nesta tarefa, que foi o ponto de partida para o nosso trabalho futuro, consideramos como pontos fortes da Escola Val do Rio: 1. que a escola está focada num ensino personalizado; 2. que a escola tem professores e formadores qualificados que atuam com profissionalismo; 3. que a escola tem ferramentas tecnológicas e os seus professores têm competências digitais acima da média; 4. e que a escola tem parcerias com instituições onde os seus alunos concretizam as aprendizagens em contexto de trabalho. Resumindo os aspetos positivos, a Escola Val do Rio tem um propósito claro; tem os meios para lá chegar e não faz o caminho sozinha. Continuando o exame de consciência coletivo, entramos nos pontos fracos da Escola. Na nossa prática pedagógica, se é certo que trabalhávamos muitas vezes com projetos, nem sempre planeávamos devidamente e nem sempre os parâmetros de avaliação eram adequados ao perfil do curso e ao perfil do aluno do século XXI. Se compararmos as avaliações realizadas nas diferentes disciplinas, nem sempre trabalhávamos os mesmos domínios, nem sempre dávamos o mesmo peso, nem sempre fazíamos uma avaliação de caráter formativo, e, por vezes, a avaliação reduzia-se a uma mera classificação. As carências mencionadas dispararam na direção de outra carência: é que nem sempre trabalhávamos de forma colaborativa, nem sempre partilhávamos leituras, nem sempre discutíamos e refletíamos em conjunto e, por isso, nem sempre éramos um! 19
Depois da radiografia feita, sempre em conjunto, passamos para a prescrição e elaborámos um Plano de Melhoria! Quais as mudanças que desejávamos para a Escola? A primeira mudança desejada por todos era incrementar uma avaliação formativa entendida como a melhor forma de combater o insucesso do aluno, do professor e da Escola. No ensino profissional, eliminar o insucesso traduz-se na expressão “acabar com os módulos em atraso”. Numa publicação do GETAP (Gabinete de Educação Tecnológica, Artística e Profissional do Ministério da Educação), num texto que remonta aos primórdios do ensino profissional e que foi escrito com o propósito de orientar as escolas e os professores para trabalhar com a estrutura modular, nesse documento, a páginas tantas, levanta-se a questão: “E se o aluno não conseguir completar todos os módulos no final dos três anos de formação?” E a resposta é, e passo a citar: “Este problema deve ser equacionado desde a primeira hora, desde o primeiro mês, desde o primeiro ano e não no final da formação.” Vivíamos este problema e tínhamos de encontrar uma forma de ao longo das nossas aulas interagirmos com cada aluno, detetarmos as competências a trabalhar naquele aluno, e assim evitarmos arrastar no tempo o insucesso do aluno e com ele o nosso próprio insucesso. Porque os módulos em recuperação do nosso aluno são os nossos módulos em recuperação. Assim, porque queremos alunos com sucesso, porque sabemos que o melhor caminho é trabalharmos uns com os outros, porque temos de saber o que vamos avaliar e como vamos avaliar, e porque temos de dar esta informação de um modo claro aos nossos alunos no início de cada módulo, reformulamos a avaliação e escrevemos o documento “Critérios Gerais de Avaliação na EPVR”. Atualmente, já é o documento orientador da avaliação na Escola Profissional Val do Rio. O que é que nos diz esse documento? Em primeiro lugar, o que é que avaliamos. A resposta a esta questão não é nova no ensino profissional e não é nova na nossa escola. Para percebermos melhor, vamos recordar um texto, mas desta vez um texto interno da Escola Val do Rio. Trata-se de um excerto de uma sebenta da disciplina de Ética Social e Profissional que foi produzida nos anos 90 e que serviu de base para o trabalho em sala de aula. A determinada altura, quando fala sobre a realidade única da natureza humana, o autor da sebenta, um colega nosso, escreveu: “Em termos simples 20
podemos dizer que na nossa existência se conjugam três aspetos fundamentais que conduzem todas as situações da nossa vida: o ser, o saber e o fazer.” E continua: “Antes de mais somos; somos pessoas humanas vivendo no seio de uma família, de uma sociedade. Ao longo da nossa vida vamos adquirindo conhecimentos e vamos fazendo coisas. Estes três aspetos (ser, saber e fazer) estão intimamente relacionados em nós.” E o autor conclui: “Porque somos, sabemos e fazemos; porque sabemos, fazemos; e porque fazemos, sabemos e somos.” E porque estão intimamente relacionadas no ser humano, são estas capacidades que trabalhamos e avaliamos nos nossos alunos: a capacidade dos nossos alunos conhecerem fatos e teorias; a capacidade dos nossos alunos aplicarem esses conhecimentos através dos recursos que fornecemos para eles solucionarem problemas; e a capacidade dos nossos alunos estarem como é digno da sua natureza humana, relacionando-se com os outros. Avaliar os conhecimentos, avaliar as aptidões e avaliar as atitudes e os valores são competência dos professores da Escola Val do Rio, ponderando da mesma maneira e utilizando a mesma escala qualitativa e quantitativa. E, citando agora o povo, “porque nos detalhes mora o diabo”, para cada nível de desempenho temos o respetivo descritor, que nos indica o que se espera que o aluno seja capaz de fazer. Foi a partir deste documento, repetimos, produzido de modo colaborativo, que os pequenos grupos disciplinares, também num trabalho de modo colaborativo, pensaram e produziram os critérios específicos de avaliação para as disciplinas e os módulos a lecionar. A segunda questão que o documento dá orientação é como é que avaliamos. Teremos de colocar em ação a avaliação formativa. Para o aluno aprender, temos de: 1. adequar ao perfil do curso profissional escolhido; 2. fazer o diagnóstico, verificando o que é que ele já sabe ou o que é que ele sabe erradamente; 3. proceder à diferenciação pedagógica; 4. orientar o aluno ao longo das atividades, reforçando o que está bem e corrigir o que está mal, e assim contribuirmos para tornar o aluno mais confiante, para que, com autonomia, o próprio tome consciência das suas dificuldades e das suas potencialidades. Quando repetirmos o processo, veremos que conquistámos o aluno para a aprendizagem. Finalmente, depois de termos orientado o aluno na forma como
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conheceu, na forma como aplicou o que conheceu e na forma como agiu face aos desafios, finalizamos o módulo com a avaliação sumativa. Certamente que todos questionamos “Como é que tudo isto se faz?” Bem… voltando ao Plano de Melhoria, damos uma resposta à questão com a segunda mudança desejada: trata-se de promovermos a articulação interdisciplinar. Através dos painéis que se irão seguir, a Escola irá mostrar como construiu, implementou e avaliou trabalhos de projeto com os nossos alunos com o objetivo de concretizarmos as aprendizagens das diferentes componentes de formação, de diferentes módulos, numa ação concertada entre todos, alunos e professores. Por defeito de formação de um licenciado em História, e recorrendo à memória de colegas nossos que protagonizaram esses tempos, recordamos agora o ano de 1989 e o que ele nos trouxe. Nesse ano nasce o Ensino Profissional em Portugal, e nesse ano nasce a Escola Profissional Val do Rio em Oeiras. Três anos depois, nasce o polo de Cascais (que mais tarde deslocou-se para o Estoril). 1989 foi um ano que será recordado para a História como o início de uma nova ordem mundial. No mesmo ano em que se quebram as fronteiras com a Queda do Muro de Berlim, o mundo liga-se através de uma rede mundial de computadores, a Internet. É neste mundo que anuncia grandes mudanças, que entra a lucidez do ministro de educação, Eng.º Roberto Carneiro, e do seu Diretor-Geral do Ministério de Educação no GETAP, Dr. Joaquim de Azevedo, quando lançam um desafio à sociedade civil: que se organizem projetos de ensino profissional em Portugal.
Figura 7 - A 1.ª turma da EPVR com o diretor à época, no cimo do torreão das atuais instalações em Oeiras (1990) 22
Um grupo de jovens professores, apoiando-se na experiência de gente com mais idade, aceitam o desafio e fundam, a 11 de maio de 1989, a Escola Val do Rio. O que move os promotores deste projeto é um imperativo ético: se por um lado, acolhem jovens que se encontram à margem do sistema de ensino e dão-lhes ferramentas para se tornarem úteis à sociedade, por outro lado dão uma resposta à falta de qualidade e de competências técnicas com que muitos serviços eram prestados em Portugal. Aceitaram um desafio e assumiram um compromisso com inteligência, com entusiasmo, com força e com persistência. Mais tarde, em 2014, o Dr. Joaquim Azevedo glorificou estes jovens quando escreveu, e passamos a citar: «Se há heróis em todo este processo, eles são os promotores das escolas profissionais, essas centenas de instituições da sociedade portuguesa e de portugueses que se dedicaram à promoção do bem comum. Como Camus disse um dia, eles são heróis porque são “gente comum que faz coisas extraordinárias por simples razões de decência.”» Ao fim de 28 anos, estes jovens são as nossas referências e o Projeto Val do Rio é o nosso património! A história não se repete. Os tempos são outros, e as pessoas também. O que desejamos é que o trabalho do Seminário que hoje termina e a disseminação por todos os que fazem parte da nossa Escola que hoje se inicia seja um ato de renovação de um compromisso cultivado desde 1989, com a mesma atitude de superar desafios com inteligência, com entusiasmo, com força e com persistência. E quando não soubermos o que é que fazemos? Recordamos um episódio que decorreu na primeira sessão do seminário quando a professora questionou os nossos professores com esta mesma questão: “Quando não souberem, o que é que fazem?” Uma colega nossa, prontamente, respondeu: “Pergunto aos meus colegas como é que eles fazem”.
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3. Pedagogia de Projeto como Metodologia de Trabalho na EPVR
Catarina Justino Professora de Inglês e Português
O Ensino Profissional surgiu para preencher uma lacuna existente na educação que o ensino regular não estava a conseguir colmatar. Por isso, foi concebido com características muito próprias que o fizeram único. Assim, existe um conjunto de particularidades ímpares que, apesar da evolução, têm norteado este ramo do ensino, a saber: a estrutura curricular presente desde a sua génese; é organizado por um currículo modular que em si é aberto, flexível e integrado; promotor de uma cultura de avaliação essencialmente formativa, valorizando mais o processo do que o produto; fomentadora de interação que privilegia a aprendizagem de todos, tendo em conta os diferentes ritmos dos alunos; assenta num formato novo de escola e por isso tem tipologias de horários, tempos letivos e locais de aprendizagem específicos; e equaciona novas lideranças pedagógicas, destacando a figura do coordenador como orientador das equipas pedagógicas que orientam os cursos. Deste modo, é um ensino que promove uma formação integral, qualificada, orientada para a mudança. (Azevedo, 2009) O Ensino Profissional na Escola Val do Rio (EPVR) desde sempre sentiu necessidade de refletir sobre a renovação. Sabemos que a escola nasce com a implementação do Ensino Profissional em Portugal, e por isso assenta em princípios fundamentais que não se podem desperdiçar. No entanto, a dada altura, foi urgente apostar na mudança e por isso a EPVR tem trilhado um percurso fora da sua zona de conforto nos cursos científicohumanísticos do ensino secundário. A renovação tem incidido em vários âmbitos: na mudança da operacionalização de práticas pedagógicas, fazendo um upgrade de aprendizagens; na promoção das competências de literacia digital transversais às várias componentes de currículo; na reflexão das suas competências, por isso contextualizou aprendizagens tendo em conta o perfil de saída de cada curso para 2020, e agora a implementação da metodologia de projeto. Para a implementação desta ferramenta pedagógica foi importante pensar o perfil do aluno do século XXI e a este propósito lembra-se a citação de Abel Salazar, o vicereitor da Universidade de Aveiro: “O médico que só sabe medicina, nem medicina sabe!” 24
Hoje em dia não são só os cursos profissionais que têm de apostar na literacia digital e na mudança, são também os outros cursos que têm de dominar estas competências, pois hoje, o médico do século XXI, já tem de dominar estas ferramentas para conseguir manter-se atualizado. (in Expresso, 08.10.2016). Assim, preparar os alunos para uma mudança que se faz a um ritmo mais acelerado do que a nossa capacidade de adaptação, obriga a que se desenvolvam outras competências não para o que já existe e se mostra obsoleto, mas para o que está em fase embrionária, e estará a todo o vapor quando os alunos integrarem o mercado de trabalho. Por isso, é urgente preparar e pensar o futuro no presente. Desta feita, preparar profissionais num futuro próximo impõe refletir sobre a questão: Quais as características que estão previstas para o perfil do aluno do século XXI? As características estão hierarquizadas, e assim se enunciam da base para o topo da pirâmide: resolução de problemas complexos; gestão de pessoas; coordenar-se com os outros; tomada de decisão e discernimento; orientação para o serviço; negociação e flexibilidade cognitiva. Destacam-se a criatividade, o pensamento crítico e a inteligência emocional, porque estas são verdadeiramente orientadores e diferenciadores; fundamentais para aceitar a mudança com novos produtos, novas tecnologias, novas formas de trabalho. Importa perceber que, se os formandos estão a aparelhar máquinas com inteligência artificial, é fundamental não preparar os alunos para o que as máquinas sabem fazer, mas sim trabalhar a inteligência emocional, o que verdadeiramente nos diferencia de tudo o que é robotizado. Para conseguir preparar e treinar profissionais a partir do perfil apresentado, importa adequar metodologias eficazes que promovam aprendizagens e conhecimento. Assim, a Pedagogia de Projeto engloba as características mais importantes a serem treinadas nos alunos para 2020. (The Future of Jobs) A Pedagogia de Projeto (Projet-Based Learning) como metodologia de trabalho é uma das ferramentas que permite corporizar as características basilares do Ensino Profissional. A referida metodologia tem duas condições sine qua non: (1) a aprendizagem dever ter sentido para os alunos, despertando o “querer fazer bem”; ativar a paixão e o brio em conseguir fazer; (2) articular e integrar o projeto no currículo.
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Existem sete passos essenciais que são orientadores para conceber e gerir a metodologia do projeto: (1) despertar o interesse do aluno, levando para a sala de aula uma problemática e que seja em si um desafio; (2) direcionar para um propósito, fazendo com que os alunos não se desviem do objetivo que é trabalhar um conteúdo; (3) criar empatia e sentido, para que o aluno trabalhe um produto da sua eleição; (4) fomentar a criatividade, o espírito crítico e a literacia digital; (5) a partir de várias ferramentas e recursos, questões, ideias, perspetivas; (6) dar feedback, proceder a revisões e alterações, de modo a que percebam que o co-work faz parte do mundo do trabalho; (7) motivar o aluno a apresentar os produtos de topo de gama (pais, colegas, alunos, experts da área, comunidade em geral). (Tommi Franssila, 2007). Sintetizando, os projetos integradores levados a cabo na EP Val do Rio pretendem pôr em prática as características que caracterizam este tipo de ensino fazendo com que todos os critérios estejam orquestrados em sinergia. Primeiro, a flexibilidade; depois, os saberes integrados (o saber-saber, o saber-fazer e o saber-estar e ser); as competências definidas para o perfil de saída de cada curso; o perfil do aluno para viver e trabalhar na sociedade da 4.ª Revolução Industrial (2020). Todos os projetos concorrem para um desenvolvimento curricular flexível e integrado. (Cláudia Gouveia, 2011)
Caso Prático 1 – Projeto 100 Calorias (Professoras Cristina Coelho, Patrícia Garção & Vera Casteleiro)
O Projeto “100 Calorias” foi desenvolvido com uma turma do 2.º ano do Curso Técnico de Auxiliar de Saúde do Polo do Estoril da EPVR, realizado no ano letivo de 2016-2017. O curso integra-se na área de formação e família profissional de saúde. Os profissionais desta área prestam cuidados de saúde aos utentes, sempre supervisionados por profissionais de saúde de formação superior, nomeadamente enfermeiros e médicos, e têm a seu cargo: (1) a recolha e transporte de amostras biológicas, (2) a limpeza, higienização e transporte de roupas, materiais e
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equipamentos e (3) limpeza e higienização dos espaços e no apoio logístico e administrativo das diferentes unidades e serviços de saúde.
• Técnico Auxiliar de Saúde
Saída Profissional
• Saúde
Área Formação
• Saúde
Família Profissional
Quadro 1 – Contextualização do Projeto “100 Calorias”: curso técnico
O projeto teria de envolver o aluno em sala de aula e a comunidade envolvente, contar com o perfil do aluno do século XXI e fazer a ponte com o mundo profissional, aquilo que o aluno vai encontrar quando terminar o curso. O projeto foi desenvolvido nas três áreas curriculares (sociocultural, científica e técnica), decorreu durante o mês de março de 2017, num total de 20 horas. As atividades desenvolvidas passaram por aulas de pesquisa e aulas laboratoriais de Biologia e Química, pelo Congresso “100 Calorias” e pela elaboração e apresentação dos relatórios de atividade. A turma do 2.º ano é composta por 24 alunas do sexo feminino, bastante heterogénea nos ritmos de aprendizagem e de trabalho e nos métodos de estudo, mas interessadas e participativas e que trabalham bem em aulas práticas.
Sociocultural
Ciências
Saúde
• Condições socioculturais • Orientações das diferentes religiões • Biologia - Metabolismo • Química – Reações oxidação - redução • Nutrição • Dietética
Quadro 2 – Contextualização do Projeto “100 Calorias”: áreas curriculares
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O projeto foi desenvolvido nas três áreas curriculares (sociocultural, científica e técnica) e as disciplinas que desenvolveram o projeto integrador foram a Ética, a Biologia, a Química e a disciplina técnica de Higiene, Segurança e Cuidados Gerais. Na disciplina de Ética trabalhou-se a alimentação nas diferentes religiões do mundo, nomeadamente as restrições alimentares. Separadas por grupos de trabalho na sala de informática, cada grupo trabalhou um tema e, no final, apresentou a pesquisa sobre as restrições alimentares durantes períodos específicos e datas celebrativas de cada uma das religiões. Nas disciplinas de Biologia e Química, pretendia-se que relacionassem as reações de oxidação com a obtenção/gasto de energia no metabolismo celular dos diferentes nutrientes assimilados na alimentação. As alunas procederam à investigação sobre os alimentos que fornecem energia ao organismo, como é que se processa a degradação dos alimentos e como é que a energia é gasta. Na área técnica, após o trabalho realizado previamente nas disciplinas da componente científica, o aluno deveria ser capaz de selecionar os alimentos disponíveis com base no aporte nutricional, aquilo que traz de bom para o nosso organismo, mas também no aporte calórico, com o propósito final de promover uma alimentação saudável e adequada a cada indivíduo. Este trabalho permitirá concretizar as aprendizagens na área da saúde, tendo conhecimento das diferentes dietas, não no sentido de restrição alimentar, mas sim de adequação aos alimentos que podem e devem ser digeridos por cada doente, em situações de fragilidade ou em etapas diferentes da vida. Na disciplina de Ética, no domínio cognitivo, o aluno teria de reconhecer a influência das religiões nas restrições alimentares dos seus seguidores e identificar os alimentos proibidos em períodos específicos do ano. No domínio das atitudes e valores, cumprir as regras de sala de aula, respeitar a opinião dos colegas e trabalhar em equipa. As atividades privilegiadas foram a pesquisa sobre o tema, a participação no Congresso “100 calorias” com a apresentação dos resultados. Nas disciplinas de Biologia e Química, no domínio cognitivo, o aluno teria de identificar anabolismo e catabolismo, reconhecer a necessidade de regulação e interpretar os mecanismos de produção e consumo de energia. No domínio das atitudes e valores, cumprir com as regras de aula de laboratório, nomeadamente as regras de 28
segurança, e demonstrar autonomia e responsabilidade no trabalho que a desenvolver. As atividades decorreram nas salas de laboratório na EPVR-Oeiras. Nas aulas laboratoriais de Biologia, as alunas observaram ao microscópio grãos de amido (presentes nas bolachas e no pão, vulgarmente conhecidos como hidratos de carbono lentos), identificaram a presença de amido em alimentos e descreveram o processo de fermentação láctea através do fabrico de iogurtes. Nas aulas laboratoriais de Química, monitorizaram a oxidação de frutos em contacto com o ar, observaram o efeito antioxidante de substâncias ácidas e descreveram o processo de conversão da glucose a etanol e ácido acético. Na disciplina de Higiene, Segurança e Cuidados de Saúde, no domínio cognitivo, trabalharam os cuidados na alimentação e hidratação para chegarem às noções básicas de dietética e nutrição. No domínio dos valores e das atitudes, o cumprimento das regras de conduta. O momento alto do projeto foi o Congresso “100 Calorias”. Numa primeira parte, realizaram as suas comunicações especialistas das áreas curriculares em estudo. Na área da saúde, a Enf.ª Susete Pires, especialista em saúde materno-infantil do Serviço de Neonatologia do Hospital de Cascais, e a Enf.ª Ana Sofia Santos, especialista em reabilitação na Unidade de Cuidados Continuados e Paliativos do Hospital da Luz. No domínio da religião, o P.e Gonçalo Portocarrero de Almada.
Figura 8 – Imagens de momentos do Congresso “100 Calorias”.
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Numa segunda parte, as comunicações foram direcionadas para a dieta alimentar, com a colaboração da nutricionista Dr.ª Helena Vasco, técnica superior da Divisão de Intervenção Social da Câmara Municipal de Cascais, e a Dr.ª Maria Helena, representante da firma Bfood. As alunas participaram num show cooking, uma parte integrante do Projeto de Cozinha Educativa Eco-criativa da Câmara Municipal de Cascais, onde foram convidadas a confecionar alguns pratos mais saudáveis. A avaliação conjunta do projeto consistiu numa reflexão que se baseou na avaliação dos relatórios produzidos pelas alunas, na participação das alunas nos diferentes momentos de atividade/aprendizagem e nas grelhas de avaliação produzidas.
Caso Prático 2 – Projeto Photofinish
António Moreira da Silva, Bruno Santos, Catarina Justino & Nuno Toco Professores da EPVR
O projeto “Photofinish” foi pensado e delineado tendo em conta não só o perfil de um aluno do curso Técnico de Gestão de Equipamentos Informáticos, mas também a especificidade da turma de 2.º ano do curso. A turma é constituída por 24 alunos do sexo masculino com idades compreendidas entre os dezasseis e os dezanove anos. É uma turma homogénea na disciplina de Educação Física, sendo que a sua maioria é praticante federado nas modalidades de futebol, futsal, rugby, remo e kickboxing. Os restantes praticam regularmente atividade física através de atividades no ginásio ou já foram federados nas modalidades enunciadas. Em disciplinas mais teóricas, como seja Inglês, a turma revela-se heterogénea podendo-se classificar entre o suficiente e o bom nas competências de Reading, Writing, Listening e Speaking. O ritmo de desempenho destes discentes tornase mais ajustado à turma com trabalho de pares e exercícios com um grau de dificuldade médio, a partir de instruções mais simples e tipologias de exercícios mais intuitivos e mecânicos. No domínio dos valores e atitudes, a turma revela competitividade e autonomia. Todavia, manifesta alguma resistência em saber dominar um código de conduta mais
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formal, exigido em determinados momentos de trabalho. Esta caraterização de turma perpassa de forma igual na disciplina de Eletrónica. A partir do perfil de saída determinado para os alunos de Técnico de Gestão de Equipamentos Informáticos, criou-se um projeto que articulasse a polivalência das diferentes áreas de intervenção na criação de um gadget atual, inovador e com aplicação ao mundo real. Assim, o projeto visa a produção de um sistema de photofinish. Este processo emprega tecnologia avançada e aplicada a situações desportivas. Este gadget tira uma fotografia, onde se reproduz a imagem da linha de chegada, determinando com rigor o vencedor da prova, bem como todo o escalonamento da tabela classificativa no que diz respeito a todos os atletas. As disciplinas envolvidas no projeto são Eletrónica Fundamental, área do saber responsável pela concatenação de conhecimentos e aquisições técnicas e operacionalização do sistema; Educação Física, responsável pela aplicação e materialização do projeto; e Inglês, responsável pela divulgação utilizando meios de comunicação atuais e efetivos. Cada disciplina contribuiu em uníssono na criação de autonomia e desenvolvimento de responsabilidade através de conteúdos, estratégias e metodologias diversificadas. O projeto iniciou-se na disciplina de inglês com um briefing apresentado pelos três professores. Nesta mesma disciplina os alunos começaram de imediato por pesquisar o conceito de Photofinish e os elementos necessários num cartaz publicitário sobre este produto. Construíram-se grupos de trabalho e passou-se à fase de pesquisa em Eletrónica Fundamental - porém, numa perspetiva mais eletrónica, ou seja, os alunos tentaram perceber não só o funcionamento técnico da máquina, mas também a utilização prática de vários tipos de sensores. Inglês e Eletrónica funcionaram ao mesmo tempo através da criação de cartazes publicitários na primeira e de diagramas e circuitos na segunda. Daqui passou-se para a aplicação em contexto real, na aula de Educação Física. Torna-se importante mostrar mais um exemplo de diferenciação pedagógica através da utilização das inteligências múltiplas numa aula de Educação Física. O professor inicia a aula apresentando os objetivos de aprendizagem, critérios de avaliação e entrega dos descritores dos níveis de desempenho. 31
Inteligência Múltipla
Critérios de Êxito Os alunos dispõem-se em meia-lua de frente para o professor.
Verbal-linguística (instrução inicial)
Escutam
atentamente
a
apresentação
dos
objetivos
de
aprendizagem definidos para a aula com base na grelha de observação/avaliação do professor e da grelha de autoavaliação.
De seguida, procede à ativação geral com corrida à volta do campo. Posteriormente distribuem-se em 4 colunas e realizam exercícios de mobilização articular, força, velocidade e resistência.
Inteligência Múltipla
Critérios de Êxito Os alunos correm à volta do campo. De seguida, dividem-se em 4
Corporal - Cinestésica (Ativação Geral)
colunas e realizam exercícios de mobilização articular com amplitude e fluidez.
Terminam o aquecimento por realizar exercícios de corrida de resistência, força e flexibilidade (aumentando o grau de flexibilidade de cada músculo ou segmento) O professor solicita a contagem da frequência cardíaca e informa a turma da duração da mesma. De seguida, solicita o registo desse valor. Em função da duração o aluno tem de identificar o valor pelo qual irá multiplicar para dar o número de batimentos cardíacos ao fim de um minuto (ex. 10sx6). Este exercício contribui para a aplicação prática da matéria referente ao módulo de conhecimentos.
Inteligência Múltipla Lógico – Matemática (Cálculo da frequência
Critérios de Êxito Os alunos conhecem a definição de frequência cardíaca e aplicamna.
cardíaca)
Os alunos são distribuídos em quatro colunas. O aluno aplica, partindo de diversas posições, a técnica correta de partida aumentando progressivamente a velocidade e inclina o
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tronco à frente ou avança o ombro oposto à perna da frente e oscilando os braços à retaguarda atravessando a linha de chegada na velocidade máxima.
Inteligência Múltipla Corporal – Cinestésica, espacial e interpessoal (corrida de velocidade com partida através de
Critérios de Êxito O aluno reage ao sinal sonoro e/ou visual de uma forma rápida, adquirindo uma posição vertical de corrida, aumentando gradualmente a velocidade e atravessa a linha de meta sem desaceleração nítida.
diferentes sons e posições.)
O professor regista as observações referentes ao desempenho das tarefas pelos alunos. No final é feita uma reflexão conjunta sobre a estratégia seguida, tendo em consideração os resultados atingidos e a autorregulação de cada aluno, para sugerir melhorias do trabalho já realizado (autoavaliação).
Inteligência Múltipla
Critérios de Êxito
Verbal – linguística,
Os alunos dispõem-se em meia-lua de frente para o professor. O
interpessoal e intrapessoal
aluno escuta atentamente o professor, assimilando a informação.
(Instrução final) O professor fará o
Em caso de dúvida coloca as suas questões. Comunica ao professor a sua autoavaliação.
balanço da aula e solicita a autoavaliação
Terminado o projeto os professores reuniram-se para uma reflexão conjunta atendendo aos objetivos de aprendizagem delineados. Em primeiro lugar, é necessário perceber que o curso, a turma, os professores, as atividades e o produto resultou. Isto significa que houve uma articulação e um feedback permanente entre professores, alunos e professores/alunos. De qualquer forma, há sempre espaço para melhorar. Hoje, certamente atribuiríamos mais tempo à execução da parte técnica, garantiríamos com uma maior antecedência a atribuição de salas de informática e blocos letivos mais extensos para se rentabilizar o trabalho presencial. O trabalho de projeto revelou-se uma mais-valia no processo de ensino aprendizagem porque para além do respeito, de alteração da rotina da passagem da 33
teoria à prática, da proximidade entre professor aluno, os alunos participaram ativamente na fase planificação, conceção e execução do produto final.
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4. Diferenciação Pedagógica: a chave para o sucesso Contextualização Teórica
Teresa Figueira Professora de Inglês da EPVR
Começamos por fazer uma breve contextualização teórica e, apesar de não ir ler as definições aqui apresentadas, chamamos a vossa atenção para a ideia subjacente na definição de Tomlinson de agitar a sala de aula, não para que caibam mais alunos, mas para que a sala acomode da melhor forma os grupos mais heterogéneos e a definição de Gomes, segundo a qual podemos seguir caminhos distintos para atingir o mesmo objetivo. Assim, quando falamos em diferenciação pedagógica, devemos ter em conta o perfil de aprendizagem do aluno e, aproveitando a teoria das Inteligências Múltiplas de Howard Gardner, proporcionar situações de aprendizagem favoráveis e adequadas às características de cada um. Exemplificando, se um aluno é tendencialmente interpessoal, devemos atribuir-lhe trabalhos em grupo. Se privilegia a inteligência verbal-linguística, deve ler e escrever textos. Se é mais musical, deve ler em voz alta, com ritmo e criar mnemónicas que facilitem a sua aprendizagem. Logo, o professor promove junto do aluno o desenvolvimento da sua autonomia como aprendiz, apostando na motivação do mesmo, definindo objetivos de aprendizagem baseados nas capacidades do aluno e tendo em conta o perfil do aluno do século XXI, que valoriza características como o pensamento crítico e criativo, a capacidade de resolução de problemas, o relacionamento interpessoal, etc., sempre com metodologias de trabalho diversificadas e flexíveis. E é função do professor ajudar a preparar esse caminho, deixando de ser o foco, passando para os alunos a responsabilidade, a autonomia, conduzindo-os. O professor pode orientar, mas já não pode ser o centro, já não pode estar tudo em torno dele, assumindo-se como “a sapiência com pernas” que passa conhecimento. O professor tem de ser mais proativo e interagir. O ensino tradicional como ensino de tamanho único, não faz sentido. Na nossa realidade atual, não faz de todo sentido! Nós temos de valorizar cada aluno que temos 35
dentro da sala de aula. Sabemos que é difícil, pois por vezes temos turmas com trinta alunos e não podemos olhar para os trinta e trabalhá-los em simultâneo. Mas temos de tentar ir ao encontro daquilo que cada um oferece como mais-valias. Citando Albert Einstein, “everybody is a genius. But if you judge a fish by its ability to climb a tree, it will live its whole life believing that it is stupid.” De facto, todos nós temos potencialidades, todos nós somos geniais nalguma coisa. Se não nos for dada a oportunidade de o demonstrar, se não nos for mostrado o caminho para demonstrar essas potencialidades, ficaremos na mesma. Voltando à citação, se avaliarmos o peixe pela capacidade que ele tem de trepar uma árvore, estamos a contrariar aquilo que ele sabe fazer bem. Regressando aos nossos alunos, acontece por vezes verbalizarem que não conseguem. Pois todos eles conseguem, e nós temos de os ajudar a acreditar que conseguem. Utilizando outra analogia, o professor é como um maestro e os nossos alunos são a nossa orquestra. Agora, quando são a nossa orquestra, cada um deles vai tocar um instrumento diferente, cada um deles vai desafinar vezes sem conta e até inquietar os nossos tímpanos em alguns momentos. Mas, nós como maestros, e todos eles tocando aos seus ritmos e com as suas imperfeições, vamos limando aqui e ali, onde for preciso. Recordando que “caminhos diferentes, objetivo comum”, o objetivo final é que cada um consiga tocar uma melodia como uma orquestra, como um todo. O que é que a diferenciação pedagógica pressupõe? Primeiro, e arriscando uma afirmação polémica, os professores e os alunos aprendem em conjunto. Aprendemos muito com os nossos alunos. E aquele professor que julga não ter nada a aprender com os seus alunos, está a perder muita coisa. Todos aprendemos em conjunto. Como é que isso acontece? Primeiro, na sala de aula, fazendo uma avaliação diagnóstica para saber quem são os nossos alunos, quem é o nosso público-alvo, quem é que está à nossa frente. Depois, com a informação recolhida, vamos trabalhando várias etapas, fazendo uma avaliação contínua, fazendo reajustes, por vezes dando um passo à frente e depois dois atrás, sempre com maleabilidade e sempre com a capacidade de conseguir ir ao encontro… Mas, acima de tudo, sempre a aprender em conjunto. Não são só eles que aprendem, nós também. 36
Figura 9 - Técnicas de diferenciação pedagógica
Segundo, tendo em conta os interesses dos alunos, as suas necessidades, os seus perfis de aprendizagem, os professores podem, ao longo do processo e sem perder de vista o objetivo final, ir mudando a forma como trabalham (os processos), alterando os conteúdos e os produtos. O que é o produto? Um aluno pode demonstrar que atingiu os objetivos através de um texto belíssimo que escreveu. Outro aluno pode mostrar que atingiu os mesmos objetivos através de um cartaz que concebeu. Os produtos também não têm de ser iguais, voltando uma vez mais a referir que temos de ter em conta as características e as mais-valias que cada um dos alunos tem e que devem ser potenciadas.
Figura 10 - Técnicas de diferenciação pedagógica
Como é que esta teoria se aplica e se vivencia na Escola Val do Rio? Nós temos disciplinas transversais a todos os cursos, mas a forma como nós ministramos esses conteúdos aos alunos de um curso de Design Gráfico não pode nem 37
deve ser igual à forma como são ministrados e adaptados esses conteúdos aos alunos de um curso de Gestão de Equipamentos Informáticos. Esta preocupação faz parte da nossa realidade. Recentemente, o e-portefólio tem vindo a demonstrar-se não apenas como uma ferramenta essencial para concretizar a diferenciação pedagógica, mas também como uma ferramenta que os alunos sentem como deles. São eles que, como um lego, vão montando as peças, as evidências da sua aprendizagem, as evidências que eles consideram importantes e relevantes. E, se há algum aspeto que não correu tão bem, estamos cá nós, no nosso papel de professores, para corrigir a peça que precisa se ser reajustada para consolidar a construção. O e-portefólio tem vindo a ser, até pelo seu formato digital, encarada na Escola como uma ferramenta pedagógica que valoriza, que envolve e que dá aos alunos autonomia e, ao mesmo tempo, os faz sentir orgulhosos daquilo que estão a construir. Caso Prático – E-portefólios Tânia Flamino Professora de Português da EPVR
“Ferramenta pedagógica que valoriza, que envolve e que dá aos alunos autonomia e, ao mesmo tempo, os faz sentir orgulhosos daquilo que estão a construir.” Indo de encontro às palavras de Teresa Figueira estamos perante uma definição clara daquilo que o e-portefólio representa para alunos e professores. Este método, estratégia, modalidade, ferramenta ou de forma mais instigadora construtor de identidade pessoal é utilizado pelos professores da EPVR como início e meio de um processo de ensino aprendizagem. Sendo nós professores sabemos bem que nunca se deixa de aprender. Um e-portefólio é isto: aprendizagem constante, mudança, evolução, erro e readaptação. Deve começar de forma clara para que o docente possa avaliar “o que foi intencionalmente trabalhado, e não o que resulta dos dotes ou possibilidades culturais do aluno exteriores ao processo de ensino e, por outro lado, deve-se criar situações de avaliação (…) – situações que nos permitam perceber se o aluno sabe usar o que aprendeu numa situação ou tarefa diferente do contexto em que a adquiriu” (Roldão, 38
2009, p.65). O professor decide quais os objetivos que pretende alcançar com a utilização desta ferramenta e cria situações para que os alunos mostrem a sua competência a compreender o que lhe é pedido, a transformar o objetivo em algo prático e tornando sempre o produto final em algo representativo da sua individualidade. Esta é a verdadeira razão pela qual se utiliza o e-portefólio. Os objetivos são meras instruções vazias de individualidade. Aliás, seja para um ou para 30 alunos os objetivos de um módulo de Português são os mesmos. A forma como cada aluno os interpreta e os utiliza na construção dos seus trabalhos é que os distingue. Impera, pois, salientar que o e-portefólio não é um depósito de trabalhos, mas sim uma “coleção organizada e devidamente planeada de trabalhos produzidos por um aluno durante um certo período de tempo” (FERNANDES, 2004, p.21). Nós professores estabelecemos objetivos, mas cada aluno deve escolher os trabalhos que considera que melhor representem cada objetivo. Sendo singular o e-portefólio são escolhas. Os alunos têm de escolher qual o caminho mais coerente, significativo e representativo do seu perfil pessoal e profissional. Este caminho é acompanhado pelo professor que ajuda o aluno a refletir e a autorregular a sua aprendizagem através de um feedback constante. O professor orienta o trabalho, avalia-o formativamente e auxilia o aluno a desenvolver a sua capacidade de pensar. Assim, o enfoque não está em nós, mas nos alunos que dão vida a uma instrução simples: “constrói um e-portefólio”. Passando esta instrução do papel para a vida digital eles têm uma perceção mais exata do que já sabem, do que ainda não dominam, dos seus pontos fortes, dos seus pontos fracos e do que necessitam de fazer para melhorar Cada aluno constrói um e-portefólio que o distinga dos restantes e lá coloca os seus melhores trabalhos, fundamentando a sua escolha. Funciona então como a nova carteira profissional. Muitas são as empresas que apostam nos e-portefólios como método de seleção de candidatos em entrevistas de emprego. Também nós professores temos e-portefólios muito diferentes, de acordo com aquilo que consideramos mais relevante. Seguem então dois exemplos feitos pelos professores da Escola Profissional Val do Rio: https://oliveirarui.wixsite.com/valdorio/reflexao https://taniaflamino.wixsite.com/evidenciasreflexivas 39
5. Escola-Empresa: formas de cooperação para a qualificação de RH com competências 4.0
A Escola convidou personalidades representativas de diferentes áreas em que oferece formação para, em conjunto, procurarem respostas às seguintes questões: - Que competências precisam os cidadãos e o RH qualificados para viver no séc. XXI e para trabalhar na sociedade da 4.ª Revolução Industrial? - Que ambientes e metodologias podem potenciar o desenvolvimento das qualificações baseadas nos resultados de aprendizagem e facilitar o acesso ao emprego e à cidadania responsável dos diplomados da EPVR?
Hugo Fernandes Fundador e Administrador da empresa Ocyan
Ex-aluno da EPVR, integrou a primeira turma do curso de Técnico de Indústrias Gráficas (turma 1989-1992). Após a conclusão do curso, começou a trabalhar no setor e, em 1996, fundou a Ocyan, uma empresa que é atualmente uma referência na indústria gráfica em Portugal. A Ocyan manteve sempre uma relação privilegiada com a Val do Rio ao nível dos estágios curriculares dos seus cursos técnicos: inicialmente com alunos dos cursos de indústrias e artes gráficas, mais tarde com alunos do curso de design gráfico e, recentemente, de alunos do curso de desenho digital 3D. Reconhecida no mercado atual como uma empresa inovadora, Hugo Fernandes destacou três aspetos essenciais para a inovação e que, em grande medida, nascem na família e na Escola. Em primeiro lugar, a Escola é fundamental para formar o aluno para o pensamento crítico. Constantemente, os colaboradores de uma empresa são chamados a questionar os modos de fazer e de perceber como ganhar uma maior eficiência, ou, no caso de uma gráfica, como é que a empresa poderá ter um reduzido impacto ambiental, entre outras questões que são colocadas todos os dias. Em segundo lugar, o processo de questionamento e de reflexão deverá ser transversal na empresa. O grande desafio para a inovação nas empresas é tornar o
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processo da inovação ao alcance de todos, onde todos são ouvidos, o que terá ganhos evidentes para todos. Por último, numa empresa onde dominam as tecnologias, as pessoas continuam a ser o seu capital mais importante, pois são as pessoas que fazem a mudança. Estar bem informado e ter crédito na banca permite ter máquinas com tecnologia avançada, mas a grande dificuldade é ter numa empresa uma grande percentagem de pessoas que geram valor, que arriscam e que contribuem para a mudança.
Humberto Candeias Repórter de imagem na empresa SIC
A empresa SIC recebe regularmente estagiários da EPVR. Também na escola dão formação aos alunos da Val do Rio alguns profissionais da SIC que desempenham funções nas áreas da produção, da captação e da edição de imagem na estação de televisão. Os alunos que estagiam, e alguns que acabam por trabalhar mais tarde para a empresa, têm-se destacado por responder bem às expetativas criadas com a sua chegada. Humberto Candeias considerou que, para a Escola manter a performance na formação de técnicos de vídeo que respondam às necessidades de uma estação de televisão como a SIC, é fundamental que os formadores na área técnica na Escola continuem a ser profissionais do setor, porque estes são mais capazes de adequar a formação àquilo que são as necessidades do mercado de trabalho. Em segundo lugar, se é certo que a tecnologia tem um crescimento exponencial, também é impossível uma escola manter-se permanentemente atualizada ao nível material. No entanto, não é de todo crucial que exista uma paridade ao nível da tecnologia entre a empresa e a escola. Aquilo que é verdadeiramente importante é que o aluno veja na tecnologia que manipula uma ferramenta, que saiba o que está a fazer e que aprenda a linguagem própria do audiovisual inerente ao seu uso adequado. Terceiro, e intimamente relacionado com o ponto anterior, é essencial formar o aluno para que desenvolva uma cultura visual, que aprenda a ver televisão, a ver cinema, que aprenda a ler e a interpretar as imagens.
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Fátima Sttau Monteiro Psicóloga do Serviço de Psicologia e Orientação (SPO) - do Agrupamento de Escolas Conde de Oeiras
Enquanto psicóloga do SPO de um agrupamento de escolas, destacou a intensa colaboração no âmbito do ensino profissional com a EPVR, em especial nas áreas da informação, da transição do acompanhamento, da especificidade técnica da formação e no desenvolvimento das competências esperadas. Considerou fundamental a abertura da Escola à comunidade. Nas participações de professores e sobretudo de alunos da EP Val do Rio nas ações de divulgação junto dos agrupamentos de escola, onde são evidentes as particularidades do seu projeto educativo pela voz dos seus alunos: um projeto voltado para a dimensão humana, o acompanhamento de cada aluno com regime de tutoria que o ajuda a avançar tanto na aprendizagem como na responsabilidade pessoal e social e o envolvimento dos pais/encarregados de educação.
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6. Testemunhos de diplomados do Ensino Profissional na EPVR
A Escola convidou dois diplomados da EP Val do Rio para dar testemunho da sua formação na instituição.
Ana Rita Almeida Diplomada do curso Técnico de Apoio à Infância, EPVR - polo do Estoril, turma 2007-2010)
A ex-aluna destacou a importância da Escola na sua formação, nomeadamente porque percebeu que aquilo que pensava e verbalizava tinha valor para a aula. Ali, todos conversavam e discutiam, todos contribuíam para organizar as ideias e todos definiam conceitos que só se tornaram significativos porque tinham sido contruídos por todos os alunos. E por esta razão, aprendeu também a ter prazer em ouvir os professores. Foi na Escola que Ana Rita aprendeu o que é o trabalho com pessoas e não para as pessoas e foi na Escola que começou a construir os seus princípios orientadores. Em 2010, concluiu o curso na EPVR e candidatou-se ao ensino superior. A confiança para avançar naquela direção encontrou-a nos professores da Escola, foram eles os principais impulsionadores. Eram os professores que passavam para a aluna a certeza de que iria ingressar na universidade. Após o anúncio da colocação na Escola Superior de Educação de Lisboa, a sua primeira opção, as primeiras pessoas com quem contactou para dar a tão esperada notícia foram duas professoras da Escola. E naquele momento deu-se conta que durante os três anos de formação na Val do Rio, os seus colegas e os seus professores faziam parte daquele que era o seu núcleo central, e que era tão necessário naquele momento. Destacou a importância do estágio ao nível do ensino profissional do secundário. Aliás, voltou a realizar um estágio no final de três anos como aluna do ensino superior e, entre 160 alunos, só dois alunos tiveram a nota máxima… E esses dois alunos tinham sido alunos do Ensino Profissional, alunos da EP Val do Rio. Em 2014, tornou-se educadora de infância na escola onde realizou o primeiro estágio quando ainda era aluna da EP Val do Rio.
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Rodrigo Rimourinho Diplomado do curso Técnico de Vídeo da EPVR - sede Oeiras, turma 2012-2015
O Rodrigo nunca imaginou ser técnico de vídeo. O Rodrigo queria ser biólogo. Depois do 9.º ano, entrou em Ciências e não demorou muito tempo a perceber que não era aquilo que ele queria para a sua vida. Conheceu a Val do Rio através de um amigo, pesquisou sobre a Escola, participou num workshop para candidatos e manifestou grande interesse pelos cursos técnicos de design gráfico e de vídeo. Acabou por escolher o curso de vídeo porque já tinha um gosto por fotografia e por cinema e assim começou a sua aventura. Recorda-se da primeira aula com o coordenador de curso e daquilo que disse aos alunos: se fizessem aquilo que gostavam, nunca mais iriam trabalhar para o resto das suas vidas. Ganhou um gosto pela área de vídeo ao longo do curso e, já como profissional, tem constatado aquela afirmação no seu trabalho como repórter de imagem da SIC. Considera importante, como aconteceu com ele, a Escola preparar para o mercado de trabalho. O curso foi muito prático, e de um modo regular esteve envolvido em gravações de eventos desportivos (por exemplo, jogos do campeonato de vólei feminino e de futsal masculino), de eventos culturais (por exemplo, peças de teatro), entre outras. Chegou mesmo a gravar uma operação médica! Um episódio que deixou marca, não só porque foi diferente, mas sobretudo porque não estava à espera de o fazer no âmbito escolar. Considerou também importante os professores da área técnica serem profissionais da área com anos de carreira que partilharam conhecimentos, exemplos e histórias de vida. Estágios longos, como o que realizou no final do curso, assumiram uma grande importância porque permitiram uma boa integração na empresa e a própria empresa conhecer o estagiário. Após a conclusão da formação em contexto de trabalho, muitos dos alunos ficaram a trabalhar na área. Depois de concluir o curso de vídeo na Val do Rio, pensou em seguir o ensino superior. Adiou a ideia. Obteve formação específica em mais dois cursos avançados na área do audiovisual, e voltou a trabalhar em televisão.
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7.
Testemunho de uma professora da EPVR
Ana Diva Pereira Professora da Área de Integração e de História da Cultura e das Artes da EPVR
Sair da nossa zona de conforto é essencial. Foi com este espírito que iniciei esta formação. Gosto de ensinar e de aprender e uma formação, principalmente nesta área, é sempre bem-vinda e tem sido, até ao momento, uma mais-valia. Não é fácil sermos confrontados com os nossos erros e sermos obrigados a reconhecê-los, mas é essencial para o nosso crescimento, como profissionais e como seres humanos. Ao longo destes anos fui muitas vezes questionada acerca da minha metodologia de ensino, já que nunca concordei com a forma como via recorrer constantemente e quase unicamente à avaliação sumativa, ao método expositivo e ao exagerado valor que é atribuído ao "quadro de honra". Não foi fácil, mas sem baixar as mãos fui contornando "os velhos do Restelo" e adaptando a minha forma de ser e de estar como professora. Como aluna sempre adorei estudar, mas nunca entendi por que razão a nota de um teste me definia. Afinal, só por decorar e copiar numa folha tudo o que tinha decorado era considerada uma boa aluna? Ser uma boa aluna era só isso? Tive a sorte de encontrar ao longo do meu percurso de estudante muitos professores que me fizeram ver outra realidade, aquela que está para além do simples decorar, do ter boas notas. Professores que me obrigavam a pensar, a reagir, a criticar, a inventar, a descobrir, a crescer. Professores que me mostravam outras formas de aprender, outras realidades. Através de filmes, de documentários, de trabalhos de grupo, de debates, de passeios, de palestras, ... e foi graças a esses professores que eu própria me quis tornar professora. Curiosamente, esta formação veio ao encontro de tudo aquilo em que acredito. Uma formação que nos abriu os olhos para a importância da avaliação formativa, do ensino individualizado que vai ao encontro do aluno, do trabalho colaborativo, da necessidade da utilização de metodologias pedagógicas dinâmicas e baseadas em projetos multidisciplinares.
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Esta formação abriu as mentes de muitos, fez alguns pensarem e outros agirem. Espero que não fiquemos por aqui, porque o caminho é longo e ainda há muito para aprender para podermos ensinar. “Estimule os seus alunos a abrir as janelas da mente, a ter ousadia para pensar, questionar, debater, romper paradigmas” (Augusto Cury).
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