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Arquitetura e Urbanismo e a experiência democrática CATHERINE OTONDO

¶ A INVOCAÇÃO DO TEMA DEMOCRACIA como eixo condutor da revista Móbile n° 24 se dá, de um lado, pela consolidação da prática de chamada pública de trabalhos, iniciada na edição 23, e, de outro, ao colocar “na mesa” um tema atual, urgente, e que provoca a reflexão sobre nossa função enquanto arquitetos e urbanistas na construção de processos sociais, além do papel desta instituição, o CAU/SP, como forma política de representação.

Para nós, que somos formados para projetar e desenhar o espaço da vida cotidiana, da casa à cidade, da esquina ao território, o exercício da democracia é diretamente relacionado ao exercício da profissão, afinal ambos exigem processos múltiplos e diversificados, sempre em busca do consenso – o projeto como tal – para um bem viver comum, equilibrado, digno e justo. Assim como a democracia, projetar não é uma ação que se finda em si mesma, trata-se de um processo em movimento, que se realiza também pelo seu próprio exercitar.

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Cabe então refletir sobre o papel do CAU enquanto autarquia pública, nesta construção?

Sabemos que a função original dos conselhos de classe é zelar pelo exercício profissional, pelas boas práticas técnicas e éticas, em resguardo à sociedade. A partir disso, acreditamos que, nesta gestão do CAU/SP, o Conselho pode e deve ter uma atuação mais próxima, presente e articulada junto à sociedade na construção de seus espaços democráticos.

Para tanto, é necessário o planejamento e desenvolvimento de ações mais amplas e transversais com foco na diversidade e nas demandas dos arquitetos e urbanistas do século XXI, em um cenário de desigualdades estruturais que impactam diretamente o exercício profissional e de cidadania nos espaços de trabalho; bem como na articulação institucional do CAU com outras entidades, exigindo que o Conselho repense o alcance de sua função social no mosaico da democracia, seja para o exercício da arquitetura, seja para a afirmação do seu papel junto à sociedade.

Os profissionais de Arquitetura e Urbanismo ainda enfrentam uma série de entraves e obstáculos técnicos, fiscais, financeiros, além da pouca visibilidade junto à sociedade. Os profissionais servidores públicos, por exemplo, raramente têm seu cargo registrado no CAU, o que dificulta a comprovação técnica de sua trajetória profissional, e sua representatividade junto ao Conselho.

Paradoxalmente, nas articulações institucionais realizadas pelo CAU/SP neste último ano, vemos uma aderência de agendas, e uma demanda pelos serviços de profissionais arquitetos e urbanistas, em várias escalas e frentes de trabalho.

Em reunião com a presidente da OAB/SP, Patrícia Vanzolini, por exemplo, vimos a possibilidade de ampliar os campos de atuação fazendo cursos de capacitação, e a necessidade da Ordem de compor um corpo técnico de arquitetos que os

Arquitetura e Urbanismo e a experiência democrática POR CATHERINE OTONDO

assessorem para elaborar projetos de ocupação das suas diversas sedes. A mesma receptividade tivemos junto às Secretarias de Acessibilidade e Pessoas com Deficiência, Infraestrutura e Meio Ambiente, Urbanismo, Cultura, Finanças e Educação, em âmbitos municipal e estadual.

Tais costuras institucionais, além de criar possibilidades diretas de cooperação capazes de transformar efetivamente o cotidiano da prática profissional, inserem o CAU/SP em uma rede de agentes públicos e privados, o que de fato amplia e fortalece suas contribuições à construção dos processos democráticos e à melhoria das condições de vida em nossas cidades, notadamente em seus territórios mais vulneráveis.

Para conduzir e medir estas ações, elaboramos um planejamento estratégico, cuja própria elaboração constitui exercício democrático que surge a partir de um desejo comum e se desenvolve pela compreensão das diferenças, considerando resistências e disputas, e se estabelece como o resultado do entendimento e do consenso. O que se pretende é que tal prática, dentro de sua viabilidade, torne-se uma marca do nosso Conselho, ou seja, que esta experiência fique impressa na forma (ou na máquina) política:

Um Conselho que pretende ser “POP”, como instituição popular, visível, acessível e comum;

Um Conselho que pretende ser (porque não) “SEXY”, como instituição atraente, para aqueles que se amparam nele para trabalhar, bem como para aqueles que pretendem participar como seus representantes políticos;

Um Conselho que pretende estar na linha de frente da construção dos processos e dos espaços democráticos da nossa sociedade.

Para aqueles que ainda apoiam a dissolução dos conselhos de classe, o CAU, nestes pouco mais de 10 anos de vida, tem demonstrado por meio de suas atividades, as possiblidades de uma atuação direta e articulada, que cumpre suas obrigações junto à sociedade e ainda realiza através de seus programas e projetos estruturantes, tais como ATHIS, patrocínios e fomentos, ações que o próprio Estado não teve chance de implementar de modo efetivo, realizando uma ponte importante entre uma política pública, ou uma lei, e sua efetiva realização.

Os trabalhos que compõem a Móbile n°24 demonstram, na sua especificidade, esta realidade virtuosa.

Boa leitura! ✗

CATHERINE OTONDO, ARQUITETA E URBANISTA. DESDE 2017, LECIONA PROJETO NA UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE. É SÓCIA DO ESCRITÓRIO DE ARQUITETURA BASE URBANA. PRESIDENTE DO CONSELHO DE ARQUITETURA E URBANISMO DE SÃO PAULO – CAU/SP - GESTÃO 2021-2023.

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