A pocinha do leão
Era uma vez um MAR que uns dias enchia a areia de beijinhos, outros dias dançava o bailado das ondas com a praia e outros ainda batia e ralhava com as rochas, cheio de raiva e furor. Mas eu quero falar-vos daqueles dias em que este MAR é macio, calmo, doce, vazio, cheio de pocinhas, rios, algas e peixinhos pequeninos
Era assim o MAR numa manhã de Março em que o Rui e o pai foram como de costume (quando a maré está vaza) apanhar mexilhões e amêijoas. De carro, foram lá para os lados do porto de pesca da Póvoa de Varzim. Não sei se sabiam, mas os dois cais do porto de pesca fizeram com que o mar criasse uma pequena enseada onde há amêijoas. Foi para aí que os nossos amigos foram.
O Rui, com um ancinho de jardim, escavava a areia à procura das conchinhas redondinhas dos berbigões, enquanto o pai, de calças arregaçadas, ia mais à frente procurando as amêijoas enterradas na areia. Quando já tinham um baldinho cheio, o Rui pediu ao pai para irem para as rochas.
Saíram dali, meteram, no carro, o baldinho com água do mar para a areia sair de dentro das amêijoas e do berbigão e foram para as rochas da praia das Caxinas. O pai levava 2 grandes sacas de rede para guardar os mexilhões.
Chegaram às rochas e o pai avisou o Rui para não se afastar muito dele e para ter cuidado para não escorregar. Depois o pai escolheu um mexilhão de concha grande arrancou-o, mostrou-o ao filho e explicou: - Rui, vês o tamanho deste?! É assim que deves procurar. Se forem mais pequenos não dão nada para comer e é um crime matá-los. Temos de deixar os bichinhos crescer! Se não conseguires arrancá-los, chama por mim.
Os dois começaram a sua tarefa. Andava o Rui entretido a ajudar o pai quando ouviu chamar por ele: - Rui, oh Rui que estás a fazer? Vem para o pé de mim. Anda ver o que há nesta pocinha! O Rui olhou para todos os lados mas não viu ninguém e perguntou ao pai: - Pai, tu falaste comigo? - Não, filho. Eu não falei - respondeu-lhe o pai. - A sério?! Não ouviste chamar por mim?
- Oh filho, agora não dá para brincar! Não ouvi nada nem ninguém. Temos de nos despachar para encher estas sacas. A maré está a subir. Vá, ajudame. O menino não respondeu, mas também não ficou convencido com a resposta do pai. Saltou para a rocha na direção de onde lhe tinha parecido ouvir chamar e foi à procura da tal pocinha.
Foi fácil encontrá-la. Estava mesmo entre três rochas que protegiam a pocinha do bater das ondas. Que linda que era a pocinha! Tinha algas de variadas formas e cores, tinha anémonas, conchas e búzios, tinha 2 estrelinhas do mar e um peixinho encarnado. O Rui começou a chapinhar de mansinho, com as mãos para não assustar os animais. Foi ele que ficou assustado quando viu o peixinho encarnado nadar na sua direção . Vinha de boquinha aberta e foi-lhe tocar nas mãos. Fazia-lhe cócegas e o Rui começou a rir. Pareciam beijos de peixinho.
O menino estava de boca aberta de espanto e ainda mais ficou quando ouviu o peixe: - Olá Rui! Pensei que não vinhas. - Tu falas, peixinho?! Parece impossível! Eu não conheço a linguagem dos peixes, mas consigo compreender tudo o que dizes. Como pode ser isso? - Eu sou um peixinho mágico, mas sou também um menino como tu. Sabes, há muito tempo atrás, eu fugi do pé da minha mãe e vim brincar para esta pocinha do leão. A maré subiu e eu não dei por isso. Depois ficou tudo muito escuro. Só acordei quando vi uma sereia que me veio salvar.
Desde esse dia, eu fiquei a viver no mar, nesta pocinha. Às vezes, vou até ao mar alto para passear com a sereia, outras vezes vou brincar para o fundo do mar. Venho sempre brincar para aqui quando tenho saudades dos humanos e a maré está vaza. Olha , queres ser meu Amigo?
O Rui nem sabia o que dizer. Estava de boca aberta, mas dentro dele havia uma grande alegria. Depois de alguns instantes a abanar afirmativamente a cabeça, lá conseguiu falar: -Claro que sim. Claro que quero ser teu Amigo. É bom ter Amigos. O poeta dizia que “AMIGO” é quase a melhor palavra. - Olha Rui, posso contar contigo todos os dias? O menino respondeu-lhe: - Isso já não prometo. O mar é perigoso. Eu só posso vir à praia com o meu pai. Mas prometo, que quando vier à praia, te venho ver. - Combinado!- disse o peixinho doirado batendo as barbatanas de contente. O Rui despediu-se do seu novo amigo e foi para junto do pai.
Levava nas mãozinhas 3 ou 4 mexilhões grandes que colocou dentro do saco grande. O pai disse: - Por aqui não há mais mexilhões grandes. É melhor irmos embora porque a maré já subiu um pouco e se ficarmos mais tempo, depois não temos pé. Além disso, já temos bastantes mexilhões. Filho, pega aqui nesta asa do saco. O Rui fez o que o pai pediu e foram caminhando pela praia fora. O menino voltou-se para trás várias vezes, sorrindo e acenando um adeus em direção à pocinha do leão.
Fim