Decisão de cassação de Arnon, Pedro e Maria Loureto

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Tribunal Superior Eleitoral PJe - Processo Judicial Eletrônico

30/07/2021

Número: 0603153-88.2018.6.06.0000 Classe: AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Órgão julgador colegiado: Colegiado do Tribunal Superior Eleitoral Órgão julgador: Ministro Alexandre de Moraes Última distribuição : 20/05/2021 Valor da causa: R$ 0,00 Assuntos: Conduta Vedada ao Agente Público, Cargo - Deputado Federal, Abuso - De Poder Econômico, Abuso - De Poder Político/Autoridade, Captação Ilícita de Sufrágio, Ação de Investigação Judicial Eleitoral Segredo de justiça? NÃO Justiça gratuita? NÃO Pedido de liminar ou antecipação de tutela? NÃO Partes

Procurador/Terceiro vinculado

Ministério Público Eleitoral (AGRAVANTE) MARIA LOURETO DE LIMA (AGRAVADO)

JOSEILSON FERNANDES SOARES (ADVOGADO)

JOSE ARNON CRUZ BEZERRA DE MENEZES (AGRAVADO) JOSE BOAVENTURA FILHO (ADVOGADO) PEDRO AUGUSTO GEROMEL BEZERRA DE MENEZES (AGRAVADO)

JOSE BOAVENTURA FILHO (ADVOGADO) MICHEL EGIDIO GONCALVES CARDOSO (ADVOGADO) LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO (ADVOGADO) DANIELA MAROCCOLO ARCURI (ADVOGADO) BRUNA LOSSIO PEREIRA (ADVOGADO) RODRIGO LEPORACE FARRET (ADVOGADO) HUMBERTO BORGES CHAVES FILHO (ADVOGADO) DIEGO RANGEL ARAUJO (ADVOGADO)

DIEGO BARRETO MOREIRA (AGRAVADO)

CARLOS EDUARDO MACIEL PEREIRA (ADVOGADO)

EVALDO EVANGELISTA MOREIRA FILHO (AGRAVADO)

CARLOS EDUARDO MACIEL PEREIRA (ADVOGADO)

BENONI FLOR DE SOUSA (AGRAVADO)

CARLOS EDUARDO MACIEL PEREIRA (ADVOGADO)

Procurador Geral Eleitoral (FISCAL DA LEI) Documentos Id.

Data da Assinatura

Documento

14108 15/07/2021 16:00 Decisão 6288

Tipo Decisão


TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (12626) Nº 0603153-88.2018.6.06.0000 (PJe) F O R T A L E Z A C E A R Á RELATOR: MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL Advogado do(a) AGRAVANTE: AGRAVADO: MARIA LOURETO DE LIMA, JOSE ARNON CRUZ BEZERRA DE MENEZES, PEDRO AUGUSTO GEROMEL BEZERRA DE MENEZES, DIEGO BARRETO MOREIRA, EVALDO EVANGELISTA MOREIRA FILHO, BENONI FLOR DE SOUSA Advogado do(a) AGRAVADO: JOSEILSON FERNANDES SOARES - CE0011915 Advogado do(a) AGRAVADO: JOSE BOAVENTURA FILHO - CE0011867 Advogados do(a) AGRAVADO: JOSE BOAVENTURA FILHO - CE0011867, MICHEL EGIDIO GONCALVES CARDOSO - CE0019113A, LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO DF0015410, DANIELA MAROCCOLO ARCURI - DF0018079, BRUNA LOSSIO PEREIRA DF0045517, RODRIGO LEPORACE FARRET - DF0013841, HUMBERTO BORGES CHAVES FILHO PE0023614, DIEGO RANGEL ARAUJO DF0056315 Advogado do(a) AGRAVADO: CARLOS EDUARDO MACIEL PEREIRA - CE0011677 Advogado do(a) AGRAVADO: CARLOS EDUARDO MACIEL PEREIRA - CE0011677 Advogado do(a) AGRAVADO: CARLOS EDUARDO MACIEL PEREIRA - CE0011677

DECISÃO

Trata-se de Agravo em Recurso Especial interposto pelo Ministério Público Eleitoral e de Recursos Ordinários interpostos por Maria Loureto de Lima e por Pedro Augusto Geromel Bezerra de Menezes contra acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE/CE) que julgou parcialmente procedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) para determinar a cassação do diploma de Deputado Federal do candidato investigado, na condição de beneficiário do sobredito abuso de poder político, bem como declarar a inelegibilidade da Secretária de Educação de Juazeiro do Norte, com fulcro no artigo 22, XIV, da LC 64/1990, e determinou o desmembramento do feito com extração de cópias necessárias para a autuação da representação por conduta vedada, procedendo-se à apuração da suposta prática de conduta vedada prevista no art. 73, I e III, da Lei 9.504/97 (ID 135055838). Opostos Embargos de Declaração (IDs 135056288 e 135056488), foram rejeitados (ID 135057138). O Recurso Especial do Ministério Público Eleitoral (MPE) não consta no PJE. Nada obstante o erro no sistema, o Recurso foi protocolizado, considerado que: i) há certidão atestando seu protocolo no dia 12/12/2020 (ID 135057838); e ii) o Recurso foi submetido a juízo de admissibilidade

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(135057888); iii) foi manejado Agravo pelo MPE visando ao seguimento do Recurso Especial e este consta no sistema; e iv) os Recorridos apresentaram contrarrazões ao Recurso, de modo que tiveram acesso a esse. No Recurso Ordinário de Maria Loureto de Lima (ID 135057638), a Recorrente aduz, em síntese: i) os arquivos de áudio extraídos pela Polícia Federal do seu aparelho celular, por si sós, “não possuem força probatória suficiente para comprovar o abuso de poder político”; ii) não há prova demonstrando que o Instituto Juazeiro de Educação Superior (IJES) e a Faculdade de Juazeiro do Norte (FJN), utilizados pela Secretária de Educação para a realização de reuniões políticas, tinham convênio com o Poder Público municipal; iii) a cessão de 150 cadeiras locadas pela Secretaria de Educação para uso em reunião política na casa da ex-vereadora Mara teve baixa repercussão financeira (cerca de R$ 300,00), o que foi desconsiderado pela Corte Regional Eleitoral; iv) as provas testemunhais evidenciam que não houve coação moral para que os servidores da Secretaria de Educação ajudassem na campanha de Pedro Bezerra, bem como que “os atos da campanha eleitoral do candidato Pedro Bezerra, ocorriam fora do expediente de trabalho dos servidores do Município de Juazeiro do Norte, normalmente nos horários da noite e nos finais de semana (sábados e domingos)”; e v) no tocante à tese de que teria se desvirtuado das funções de Secretária de Educação para se dedicar à campanha do candidato Pedro Bezerra, “em razão de ostentar a recorrente a condição de agente político e não de servidora pública, sem a obrigação de cumprimento de expediente fixo ou carga horária preestabelecida, não é possível a incidência da promovida no art. art. 73, III, da lei 9.504/97, mesmo que tenha ocorrido eventual participação de sua parte em atos de campanha eleitoral durante o horário de expediente, o que também não restou comprovado”. No Recurso Ordinário de Pedro Augusto Geromel Bezerra de Menezes (ID 135057788), o Recorrente sustenta, em síntese: i) os arquivos de áudio e vídeo que instruem a petição inicial não foram degravados, o que configurou cerceamento de defesa; ii) os atos tidos como abusivos, conforme narrado na inicial, foram praticados por terceiros que não integraram a lide na condição de litisconsortes passivos necessários, de modo que o feito deve ser extinto pela decadência; iii) a condenação está embasada em fato não imputado na petição inicial – cessão de cadeiras da Secretaria de Educação para reunião de campanha –, o que configurou nulidade por violação aos arts. 141 e 492 do CPC; iv) o conjunto probatório não expõe o abuso de poder político, tendo em vista as seguintes constatações: a) o Instituto Juazeiro de Educação Superior e a Faculdade de Juazeiro do Norte são ambientes privados e não há evidências de que eram conveniados com a Secretaria Municipal de Educação ou que seu uso era remunerado pelo Poder Público; b) não há prova que indique que a reunião política entre a Secretária Maria Loureto e Isabella Bezerra (irmã do Recorrente) ocorreu na sede da Secretaria de Educação ou que esta efetivamente cedeu cadeiras para evento político ou que a reunião ocorreu em horário do expediente; v) os servidores da Secretaria de Educação participaram dos atos de campanha de forma voluntária e fora do horário de expediente; vi) que não teve participação nos fatos e que, mesmo descontado os votos de Juazeiro do Norte, ainda assim seria eleito; e vii) “verifica-se a absoluta fragilidade da condenação, de modo que se faz necessário a revisão do acórdão regional no que toca à gravidade dos fatos articulados, tendo em vista que várias situações consideradas ilícitas não ofendem a dispositivos legais” (fl. 30). Decisão de admissibilidade (ID 135057888) na qual o Presidente do TRE/CE negou seguimento ao Recurso Especial do Ministério Público Eleitoral (MPE) ante o teor da Súmula 36/TSE e, em relação aos Recursos Ordinários, determinou a intimação para contrarrazões. Nas razões do Agravo em Recurso Especial (ID 135058088), o MPE aduz, em síntese: i) que interpôs Recurso Especial “para ver reconhecida a inelegibilidade de José Arnon Cruz Bezerra de Menezes e de Pedro Geromel Bezerra”; ii) “o recurso especial buscou discutir a aplicação do art. 22, XIV, da LC nº 64/90, pugnando tão somente que essa Corte Superior reconhecesse a inelegibilidade como consequência necessária do acórdão regional. Não se buscou obter provimento de natureza condenatória e tampouco revolver a matéria fática, mas apenas delimitar o correto âmbito de aplicação do dispositivo legal”; e, iii) embora não se desconheça o teor da Súmula 36/TSE, cabível a aplicação da fungibilidade recursal.

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Contrarrazões do MPE nas quais requer seja negado provimento aos Recursos Ordinários (ID 135058188). Sem contrarrazões de Maria Loureto de Lima (ID 135058338). Contrarrazões de Pedro Augusto Geromel Bezerra de Menezes nas quais requer o não provimento do Agravo em Recurso Especial e do Recurso Especial do MPE (IDs 135058588 e 135058688). Contrarrazões de José Arnon Cruz Bezerra de Menezes nas quais requer o não provimento do Recurso Especial do MPE (ID 135058788). Nos termos da certidão de ID 135145188, os autos foram distribuídos ao Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, e, posteriormente, redistribuídos à minha relatoria, nos termos do art. 260 do CE, considerado que a “EXC 0601013-49.2018.6.00.0000 foi o primeiro processo originário do Estado do Ceará, nas eleições de 2018, conferindo ao seu relator e sucessores a prevenção dos demais processos que tenham o condão de alterar o resultado do referido pleito”. No ID 136017438, Pedro Augusto Geromel Bezerra de Menezes suscita a inexistência de prevenção, considerado que “o Tribunal Superior Eleitoral, em 18.9.2018, ao julgar a Questão de Ordem no RO nº 0602475-8/SP - suscitada por Vossa Excelência, Ministro Luis Roberto Barroso - definiu que o dispositivo não se aplica às eleições proporcionais, mas apenas aos processos das eleições majoritárias” (fl. 2). O Vice-Procurador-Geral Eleitoral manifesta-se pelo não provimento do Agravo em Recurso Especial do Ministério Público Eleitoral e dos Recursos Ordinários de Maria Loureto de Lima e de Pedro Augusto Geromel Bezerra de Menezes (ID 140467438). É breve o relato. Decido. Da prevenção Nos termos da certidão de ID 135145188, os autos foram distribuídos ao Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, e, posteriormente, a mim redistribuídos, nos termos do art. 260 do CE, considerado que a “EXC 0601013-49.2018.6.00.0000 foi o primeiro processo originário do Estado do Ceará, nas eleições de 2018, conferindo ao seu relator e sucessores a prevenção dos demais processos que tenham o condão de alterar o resultado do referido pleito”. O art. 260 do CE prevê que a distribuição do primeiro Recurso que chegar ao Tribunal Regional ou ao TRIBUNAL SUPERIOR prevenirá a competência do Relator para todos os demais casos do mesmo município ou Estado. Sobre a questão, a jurisprudência do TSE firmou-se no sentido de que “a incidência da regra prevista no art. 260 do CE alcança tão somente os feitos que têm o condão de alterar o resultado das eleições [...]” AI 64093 (Rel. Min. ROSA WEBER, DJe de 16/3/2018), aplicável, assim, nas Ações de Impugnação de Mandato Eletivo e Ações de Investigação Judicial Eleitoral. Sendo assim, como bem ponderado no parecer do Vice-Procurador-Geral Eleitoral, “essa regra de prevenção é perfeitamente aplicável ao caso, porque não há dúvidas de que o desfecho do processo pode repercutir no resultado do pleito, sobretudo tendo em vista o recente entendimento desse Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que, 'cassado o registro ou diploma de candidato eleito sob o sistema proporcional, em razão da prática das condutas descritas nos arts. 222 e 237 do Código Eleitoral, devem ser considerados nulos, para todos os fins, os votos a ele atribuídos, sendo inaplicável à espécie o disposto no art. 175, § 4º, do mesmo diploma legal’” (fl. 21).

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No mais, o precedente trazido pelo Recorrente diz respeito aos processos de registro de candidatura, nos quais “o art. 260 do Código Eleitoral deve se aplicar apenas aos cargos majoritários, em razão da necessidade de evitar decisões conflitantes” (RO 060247518 Rel. Min. LUÍS ROBERTO BARROSO, PSESS em 18/9/2018). Logo, correta a distribuição do presente feito à minha relatoria. Do Agravo do MPE Conforme relatado, o Recurso Especial do Ministério Público Eleitoral (MPE) não consta no PJE. Nada obstante o erro no sistema, o Recurso foi protocolizado, considerado que: i) há certidão atestando seu protocolo no dia 12/12/2020 (ID 135057838); e ii) o Recurso foi submetido a juízo de admissibilidade (135057888); iii) foi manejado Agravo pelo MPE visando ao seguimento do Recurso Especial e este consta no sistema; e iv) os Recorridos apresentaram contrarrazões ao Recurso, de modo que tiveram acesso a esse. Ressalto, contudo, embora não conste o Recurso no sistema, verifica-se, das razões do Agravo, que o Recurso Especial visava ao reconhecimento da “inelegibilidade de José Arnon Cruz Bezerra de Menezes e de Pedro Geromel Bezerra” (ID 135058088). Nesse contexto, conforme pontuado no parecer do Vice-Procurador-Geral Eleitoral, “como é perfeitamente possível saber, desde logo, que o recurso especial visa à declaração da inelegibilidade de deputado federal, esta Procuradoria-Geral Eleitoral reputa desnecessária e contraproducente a realização de diligência voltada à juntada da petição do recurso aos autos, porque já é dado concluir que o agravo não reúne condições de êxito” (fl. 20). É que, nos termos do art. 276 do Código Eleitoral c.c art. 121, § 4º, da Constituição Federal, previsto Recurso Ordinário dirigido a este TRIBUNAL SUPERIOR quando versar o aresto atacado sobre inelegibilidade, expedição ou anulação de diplomas ou perda de mandatos eletivos nas eleições federais e estaduais. No mesmo sentido é o teor da Súmula 36/TSE: “cabe recurso ordinário de acórdão de Tribunal Regional Eleitoral que decida sobre inelegibilidade, expedição ou anulação de diploma ou perda de mandato eletivo nas eleições federais ou estaduais (art. 121, § 4º, incisos III e IV, da Constituição Federal)”. O Recorrente interpôs Recurso Especial Eleitoral contra acórdão do TRE/CE que versa sobre inelegibilidade nas eleições estaduais. Trata-se, portanto, de erro grosseiro que inviabiliza a aplicação do princípio da fungibilidade recursal. Nessa linha é o recente entendimento do TSE: “com a edição da Súmula 36 do TSE, inexiste dúvida objetiva no cabimento de recurso ordinário contra acórdão de Tribunal Regional Eleitoral que decida sobre inelegibilidade, expedição ou anulação de diploma ou perda de mandato eletivo nas eleições federais ou estaduais, não havendo falar em alteração jurisprudencial. A interposição de Recurso Especial, na hipótese, constitui erro grosseiro, o que inviabiliza a incidência da fungibilidade recursal” AI 060372475, de minha relatoria, DJe de 19/11/2020. Dos Recursos Ordinários de Maria Loureto de Lima e de Pedro Augusto Geromel Bezerra de Menezes Inicialmente, no tocante ao suposto cerceamento de defesa pela ausência da degravação dos áudios e de vídeos que instruíram a inicial, destaco, nos termos do acórdão regional, que “a Polícia Federal, no período de 12/08/2018 a 06/09/2018, analisou 1.454 (mil quatrocentos e cinquenta e quatro) áudios, dos quais destacou os 90 (noventa) mais importantes, dispostos no Relatório 02/2018 PF (ID nº 1195277), bem como áudios e transcrições encontradas no Relatório 14/2018 PF (ID nº 1187827), frutos de mandado de busca e apreensão deflagrado na operação ‘Voto Livre’, que objetivava apurar a prática

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de crimes eleitorais”, de modo que os relatórios instruíram a inicial, o que permitiu aos Recorrentes amplo acesso ao conteúdo veiculado, sem prejuízo à defesa desses. A propósito, a jurisprudência do TSE de que, “se à parte é garantido o amplo acesso à mídia, torna-se dispensável a sua transcrição integral” RMS 6167 (Rel. Min. LUCIANA LÓSSIO, DJe Tomo 165, págs.156-157). Imperioso destacar, ainda, que a decretação de nulidade processual pressupõe efetiva demonstração de prejuízo, a teor do art. 219 do CE, que dispõe: “na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo”, ausente quando é facultado às partes acesso livre aos arquivos e não indicada a relevância para o esclarecimento dos fatos. Nessa linha: AgR HC 173.478 (Primeira Turma, de minha relatoria, DJe de 30/8/2019). Em relação à necessidade de inclusão no feito de diversos servidores da pasta educacional como litisconsortes passivos necessários, pois, de alguma forma, participaram dos atos abusivos, observo que, conforme descrito na inicial, os servidores atuavam cumprindo ordens de Maria Loureto, participando do esquema de abuso de poder como meros mandatários. Sobre o tema, recentemente, esta CORTE ELEITORAL firmou a tese, relativa às eleições de 2018, de inexigência de litisconsórcio passivo necessário entre o candidato e o agente público, responsável pelo abuso de poder político, oportunidade em que manifestei posição sobre a ausência de razoabilidade na formação de litisconsórcio, considerado que a Aije pretende, exatamente, apurar e, eventualmente, sancionar agentes públicos e políticos mais importantes eleitoralmente, que usaram de meios ilícitos. Nesse sentido: RO 0603030-63.2018 (Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, julgado em 10/6/2021). Assim, nos termos do acórdão regional, “verifica-se que o Ministério Público elencou no rol dos Investigados o Sr. José Arnon Cruz Bezerra de Menezes e a Sra. Maria Loreto, que na condição de Chefe do Executivo e Secretária de Educação, respectivamente, detinham, com exclusividade, poder de ingerência sobre a máquina administrativa da Secretaria de Educação de Juazeiro do Norte/CE, restando prescindível e até contraproducente citar todos os servidores públicos, que de forma indireta ou tangencial, tiveram alguma participação nas condutas investigadas”, de modo que afasto a preliminar suscitada. Quanto à suposta ofensa aos arts. 141 e 492 do CPC, uma vez que a condenação por abuso de poder estaria amparada em fato não imputado na inicial, qual seja, a cessão de cadeiras da Secretaria de Educação para reunião de campanha, observo que o MPE narrou, em linhas gerais, que Maria Loureto utilizou os bens e servidores da Secretaria de Educação com vistas a beneficiar a candidatura de Pedro Bezerra ao cargo de Deputado Federal. Conforme observado pelo Vice-Procurador-Geral Eleitoral em seu parecer, “a prova da cessão das cadeiras, vale ressaltar, consiste num áudio (id 135053738) cuja juntada pelo Ministério Público Eleitoral ocorreu após o ajuizamento da petição inicial, em razão de problemas no processamento de dados (id 135053638). Como a juntada da prova ocorreu após a propositura da ação, o Relator do caso, em respeito ao contraditório, abriu vista às demais partes do processo para que sobre ela se manifestassem, no prazo de dois dias (id 135053988). Somente depois do término desse prazo é que a prova foi admitida no processo, fundamentadamente (id 135054238)” (fl. 34). No mais, destacado que, de fato, a Secretária de Educação, tratou os bens públicos da Secretaria de Educação como extensão de seus bens particulares, cedendo e usando-os com desvio de finalidade: i) realizou reuniões de campanha no Instituto Juazeiro de Educação Superior - IJES, bem como na Faculdade de Juazeiro do Norte - FJN, entidades conveniadas com a SEDUC; ii) promoveu reunião política na sede da Secretaria de Educação; e iii) utilizou servidores públicos, mediante coação, na campanha de Pedro Bezerra.

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Assim, a Corte Regional assentou que o reconhecimento do abuso de poder decorreu da globalidade dos fatos, e não da cessão de cadeiras de forma isolada. Dessa forma, no contexto de uma Aije, em que analisada a gravidade das condutas sob o prisma da legitimidade das eleições em face do interesse público da lisura do pleito, pouco importava o valor da cessão, mas sim o fato de uma gestora pública dispor, durante todo o período eleitoral, de bens públicos em benefício de candidatura política. Ultrapassadas essas questões, prossigo na análise dos Recursos. No caso, após minuciosa instrução processual e robusto acervo probatório – vasta documentação, fotografias, vídeos, áudios e rol de testemunhas –, restou evidenciada a gravidade dos fatos na manipulação da máquina administrativa em favor da campanha eleitoral do Pedro Geromel, instrumentalizada a Secretaria de Educação de Juazeiro do Norte e o uso de servidores, especialmente comissionados (coordenadores pedagógicos e diretores escolares), que, agindo sob o manto da coação e do assédio moral perpetrados pela gestora da pasta da educação naquele município, Maria Loureto de Lima, configurou um cenário de desvio de finalidade e abuso de poder político e de autoridade, desequilibrando o pleito em prejuízo à igualdade de oportunidades entre candidatos, à normalidade e legitimidade das eleições de 2018. O TRE/CE julgou parcialmente a ação para determinar a cassação do diploma de Deputado Federal do candidato investigado, na condição de beneficiário do sobredito abuso de poder político, bem como declarar a inelegibilidade da Secretária de Educação de Juazeiro do Norte, com fulcro no artigo 22, XIV, da LC 64/1990. Em relação ao emprego de servidores da Secretaria de Educação na campanha eleitoral, contrariamente ao alegado pelos Recorrentes, extrai-se do conjunto probatório dos autos que os servidores eram constantemente coagidos a apoiar e participar, inclusive durante o expediente, da campanha eleitoral de Pedro Bezerra. Nos termos do acórdão regional, a Secretária Maria Loreto, “após aceitar coordenar a campanha do então candidato Pedro Geromel, usa dos serviços de alguns servidores, como: Afonso, detentor de cargo comissionado do Setor de Informática da Secretaria de Educação; Ana Maria Soares, coordenadora das Escolas Integradas; e Yada Pimentel, ocupante de cargo comissionado na Secretaria de Educação para a realização de trabalho político-eleitoral. Visando arregimentar e controlar diretores escolares e pessoas ocupantes de cargo comissionado da Educação, a Secretária criou um grupo de WhatsApp, denominado GRUPO POLÍTICO, utilizando-se dos servidores Afonso, Ana Maria e Yada durante o horário de expediente”. Como exemplo, entre muitos outros elencados, da coação/assédio exercidos, extrai-se que “a conduta de Loreto oscilou entre atos de abuso de poder com elevado grau de constrangimento, em forma de coação ou ameaça - quando impedia coordenadores pedagógicos e diretores de saírem do grupo político GP, dizendo que iria chamar ‘para conversar” e que iria ‘aprumar’ -, mas também, quando usava do artifício ‘de intimidação’ por meio de intenso e reiterado sugestionamento, persuadindo os chefes, diretores, coordenadores e gestores a ‘trabalharem’ para campanha e a ‘conquistar’ mais votos para Pedro Bezerra, independente de saber se as suas vontades políticas eram realmente aquelas, criando empecilhos às alternativas de escolha e de ação dos servidores em apoiar o candidato que melhor lhes aprouvesse, tolhendo-lhes o direito ao voto livre e consciente. [...] A contundente intimidação dos servidores para que não abandonassem o noticiado grupo, acabara resultando, por receio de perderem suas funções e gratificações, em intensa adesão dos subordinados de Maria Loreto ao trabalho de campanha eleitoral de Pedro Bezerra, formando assim uma vasta rede de articulação política em favorecimento da candidatura do filho do Prefeito”. Além disso, ressalto comprovado nos autos que a Secretária de Educação organizava as reuniões políticas durante os turnos da manhã, tarde e noite e, ainda, determinava o encerramento do expediente mais cedo para permitir que os servidores comparecessem aos atos de campanha. Não há,

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portanto, “participação voluntária” como alegam os Recorrentes. Estavam os servidores comissionados, de fato, à disposição da Secretária de Educação, por meio do WhatsApp, em tempo integral, para tratar da estratégia política de campanha do candidato Pedro Bezerra. No que diz respeito à alegação de que a Secretária, por ser agente público, não se submeteria ao regime de expediente com horários fixos, de modo que sua participação em reuniões durante o expediente não seria ilegal, irretocável o entendimento da Corte Regional de que “o cargo de agente político não representava uma chancela ou uma permissão prévia para que a Secretária de Educação cometesse desmandos e manipulasse a máquina administrativa em prol de candidatura eleitoral, mas ao contrário, aceitando coordenar campanha política, mantendo-se em cargo comissionado de gestão, esperava-se da Secretária conduta ainda mais proba, de total imparcialidade, pautada no princípio da moralidade administrativa, o que não ocorreu”. Em relação à suposta ausência de provas dos convênios entre as entidades de ensino superior e a SEDUC, observa-se que as conclusões foram extraídas dos relatórios da Polícia Federal, de modo que as conclusões da Corte de origem se fundaram em elementos aptos quanto à existência do convênio. Conforme mencionado no acórdão recorrido, corrobora a afirmação de que “a existência de um áudio (PTT-20180910- WA0033) em que o agente da PF afirmara categoricamente que havia um ‘convênio entre o IJES e a Secretaria de Educação de Juazeiro do Norte para sediar as formações de professores. Loureto estava usando o prédio para fazer as reuniões políticas (...)’. Além disso, as testemunhas asseveraram em seus depoimentos que as instalações da IJES e da FNJ eram frequentemente utilizadas pela SEDUC para sediar reuniões com professores e educadores em geral, versando sobre temas relacionados à educação no município, fato que só poderia ser justificado pela existência de um convênio formal entre o ente público e as instituições privadas de ensino [...]. Como se não bastasse, a própria Secretária de Educação confessou que ‘deveria encontrar outro local para fazer as reuniões políticas, pois poderia receber reclamações’ Por óbvio, a Sra. Maria Loureto, ao externar seu ‘desconforto com o uso do espaço da FJN’, não se referia à eventual caracterização de propaganda irregular em bens de uso comum, [...] mas sim reuniões organizadas e supervisionadas pela Secretária de Educação, cujo público-alvo eram coordenadores pedagógicos e diretores escolares, ou seja, servidores públicos municipais da SEDUC, que se reuniram nas dependências das faculdades conveniadas, com a finalidade de definir as estratégias de campanha eleitoral do filho do Prefeito, conforme se depreendeu dos áudios acostados [...]”. No que diz respeito à reunião política entre Maria Loureto e Isabella Bezerra, não há dúvidas de que ela ocorreu na sede da Secretaria de Educação. Nos termos do acórdão regional, “muito embora o arquivo de áudio (ID 1195377) não tenha informado categoricamente que a noticiada reunião ocorrera na SEDUC, essa seria a única conclusão lógica a ser inferida da análise conjunta das provas, uma vez que a própria Loureto negara, em sede de alegações finais, que tenha se afastado do exercício normal de suas atividades na SEDUC e que houve a confirmação das testemunhas, notadamente da servidora Francisca Célia Viana de Brito, que trabalhava no gabinete da Secretária, de que esta cumpria expediente nos horários da manhã e tarde na SEDUC (ID 2276027). Por óbvio, se a reunião foi agendada pela Secretária de Educação para uma segunda feira, à tarde, é inevitável se concluir que essa reunião tenha ocorrido na sede da SEDUC, local onde Maria Loureto trabalhava com regularidade”. No mais, ressalto que, independentemente do conhecimento ou da participação do candidato nos atos indicados como irregulares, o art. 22, inciso XIV, da LC 64/1990, impõe a cassação do registro ou diploma ao candidato diretamente beneficiado pelo abuso de poder, uma vez que esse abuso interfere na higidez do processo eleitoral. Nesse sentido: “conquanto o mero benefício seja suficiente para cassar o registro ou o diploma do candidato beneficiário do abuso de poder econômico, nos termos do art. 22, inciso XIV, da LC nº 64/90, segundo o qual, ‘além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação’, a parte inicial do citado inciso esclarece que a declaração de inelegibilidade se restringe apenas ao ‘representado e de quantos hajam contribuído para a prática do

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ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou’” RO 29659 (Rel. Min. GILMAR MENDES, DJe de 29/9/2016). Registro, ainda, o entendimento do TSE de que, para a configuração do ato abusivo, será considerada apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam, e não a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição. Com efeito, verifica-se que as circunstâncias fáticas dos autos permitem a conclusão acerca da gravidade suficiente a comprometer a normalidade e a legitimidade do pleito eleitoral, demonstrada a manipulação da máquina pública orquestrada pela Secretária de Educação que, extrapolando do seu poder de autoridade administrativa e do uso de bens públicos, intimidou servidores a trabalhar em benefício da candidatura de Pedro Augusto Geromel Bezerra de Menezes. Desse modo, constata-se a presença de conjunto probatório robusto e convergente acerca da prática ilícita, circunstância que reafirma a jurisprudência do TSE de que, para a caracterização do abuso de poder econômico, se faz necessária a existência de prova inequívoca de fatos concretos, não meras conjecturas ou presunções. Nesse sentido: RO 060293560 (acórdão de minha relatoria, DJe de 16/3/2021). Ante o exposto, NEGO SEGUIMENTO ao Agravo do Ministério Público Eleitoral e aos Recursos Ordinários de Maria Loureto de Lima e de Pedro Augusto Geromel Bezerra de Menezes, nos termos do art. 36, § 6º, do RITSE. Publique-se. Intime-se. . Brasília, 15 de julho de 2021. Ministro ALEXANDRE DE MORAES Relator

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