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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO PROCESSO Nº 0622848-60.2018.8.06.0000 AGRAVO DE INSTRUMENTO C/ PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO COMARCA: SABOEIRO – VARA ÚNICA AGRAVANTE: JOSÉ GOTARDO DOS SANTOS MARTINS AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ RELATOR: DES. ANTÔNIO ABELARDO BENEVIDES MORAES

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA Trata-se de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo interposto por JOSÉ GOTARDO DOS SANTOS MARTINS contra decisão (págs. 26/28) proferida pelo Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Saboeiro, nos autos da ação civil pública por ato de improbidade administrativa (Processo nº 4545-89. 2017.8.06.0159) proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ, determinando, com fundamento no parágrafo único, do art. 20 da Lei nº 8.429/92, a manutenção do afastamento temporário e cautelar do agravante do cargo de Prefeito Municipal de Saboeiro, a fim de resguardar a instrução processual. Em síntese, alega o agravante que a decisão ora recorrida merece reforma, porque: i) houve prorrogação do prazo de afastamento, com utilização de fundamentação genérica; ii) durante o período de afastamento jamais se teve qualquer notícia de que o Agravante estivesse agindo de forma desleal para com o processo; iii) o afastamento é medida que apenas se justifica quando presentes provas de que a permanência do servidor no cargo esteja causando prejuízos à produção da prova; iv) o extrapolamento da cautelar sem fundamento e por prazo superior ao que se entende razoável (180 dias) fere os princípios constitucionais, configura-se abuso de poder e reflete inegável antecipação de pena. Ao final, requereu a concessão de efeito suspensivo ao agravo de instrumento, para sobrestar os efeitos da decisão agravada

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por ANTONIO ABELARDO BENEVIDES MORAES, liberado nos autos em 09/07/2018 às 09:52 . Para conferir o original, acesse o site http://esaj.tjce.jus.br/esaj, informe o processo 0622848-60.2018.8.06.0000 e código D9ADDA.

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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO que manteve o afastamento do recorrente do cargo de Prefeito Municipal de Saboeiro. Com a inicial de págs. 1/21, o recorrente acostou a documentação de págs. 22/152. Despacho, à pág. 155, no qual reservei-me a apreciar o pedido de efeito suspensivo após o estabelecimento do contraditório. Contrarrazões do agravado, às págs. 160/172, pugnando, em síntese, pelo desprovimento do recurso, com a consequente manutenção da decisão recorrida. Eis o relato do que se faz essencial.

DECIDO Em análise superficial e provisória, própria do momento, tenho que não deve ser deferido o efeito suspensivo pleiteado pelo agravante. Deve-se inicialmente rememorar que o afastamento cautelar foi deferido com fundamento nos fartos e contundentes elementos cognitivos, esposados nas quase 100 (cem) laudas da inicial da ação civil pública, e na documentação acostada, os quais não restaram, ao menos em princípio, abalados pelas alegações do agravante. Contra a decisão que inicialmente deferiu a cautelar, foi interposto o Agravo de Instrumento nº 0625725-07.2017.8.06.0000, que restou desprovido, à unanimidade, mantendo-se o afastamento cautelar do ora recorrente. Dessa forma, cumpre enfatizar que a questão sob análise no presente recurso cinge-se tão somente a examinar o acerto da decisão que entendeu pela manutenção do afastamento anteriormente

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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO concedido. Nesse passo, não merece acolhida a alegação de que, durante o período de afastamento, jamais se teve qualquer notícia de que o agravante estivesse agindo de forma desleal para com o processo. Como restou decidido, o anterior deferimento da medida levou em consideração a existência de fartos elementos cognitivos. Assim, a contemporânea ausência de intervenção do recorrente na instrução do processo, durante o período de afastamento, é fato que, longe de indicar a desnecessidade da medida, comprova a eficácia da cautelar deferida, não podendo o agravante se valer da eficácia do afastamento como supedâneo para exigir a revogação da cautelar. Em outros termos, a atual ausência de ingerências indevidas na instrução do feito é fato que corrobora a necessidade de manutenção da medida, por comprovar sua eficácia, uma vez que elidiu a anterior situação de comprometimento na instrução processual, que levou ao anterior deferimento do afastamento cautelar. De fato, a argumentação no sentido da contemporânea inexistência de elementos que autorizem o afastamento cautelar não pode acarretar a rediscussão, mesmo que de maneira oblíqua, do que restou anteriormente decidido e confirmado no Agravo de Instrumento nº 0625725-07.2017.8.06.0000. Destarte, reitero, a atual ausência de indevidas ingerências na instrução do feito deve-se à eficácia da cautelar anteriormente concedida, não podendo esta eficácia servir como motivo para sua revogação. Melhor sorte não merecem os argumentos concernentes ao alegado extrapolamento da cautelar supostamente sem fundamento e por prazo superior a 180 dias. Dispõe o art. 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429/92, in verbis:

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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória. Parágrafo único – A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.

Assim, como bem consignado pelo magistrado a quo, o dispositivo em tela não estabelece limitação temporal ao afastamento do agente público, apresentando como único requisito a necessidade da medida para se garantir a regular instrução do processo. O aludido prazo de 180 dias, fruto de precedentes do Superior Tribunal de Justiça, não se afigura de aplicação obrigatória, sendo necessário destacar que os julgados colacionados pelo agravante não se enquadram nas hipóteses do art. 927 do CPC/2015, não vinculando, portanto, a atividade jurisdicional. A propósito, entendendo pela manutenção do afastamento até o fim da instrução processual, cito o seguinte precedente: AGRAVO DE INSTRUMENTO – Improbidade administrativa - Decisão que determinou o afastamento cautelar do exercício do cargo público até o término da instrução processual Artigo 20, parágrafo único da Lei nº 8.429/92 – O afastamento do agente público de suas funções visa garantir a instrução processual na apuração das irregularidades apontadas, interesse de toda a coletividade (STJ, Corte Especial, SL 467-AgRg, Min. Barros Monteiro, j. 7.11.07, DJU 10.12.07) – Análise perfunctória devidamente fundamentada

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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO que constatou ser necessário o afastamento cautelar do agente público para garantia da regular instrução processual – Decisão mantida – Não teratológica - Recurso improvido.1

Com efeito, mesmo que os precedentes citados pelo agravante constassem do rol do mencionado art. 927 do CPC/2015, ainda assim seria possível ao magistrado a demonstração fundamentada quanto à existência de distinção no caso sob julgamento. Nessa senda, verifico que o magistrado de primeiro grau fundamentou adequadamente a necessidade de manutenção da medida cautelar, analisando detalhadamente as circunstâncias justificadoras: Quando a Constituição Federal fixou o prazo de cento e oitenta dias, referia-se unicamente ao Presidente da República como réu, e a mais nenhuma outra pessoa, do que se infere que esse é o prazo de seu afastamento quando é acusado de ter cometido crime sozinho. Isto é, esse é o prazo quando apenas ele precisa se defender da acusação no processo, quando apenas um acusador e um único réu precisam trabalhar no processo para formularem suas alegações e para prová-las. Já neste processo, diferentemente, o prefeito municipal é acusado de ter cometido improbidade administrativa em conluio com outras vinte e sete pessoas, físicas e jurídicas, as quais também são rés, juntamente com ele. Isso significa que não apenas o réu requerente deve ter seu tempo para se defender da acusação, mas também todos os outros vinte e sete réus. Isso significa que todos os vinte 1

TJSP – Agravo de Instrumento 2236307-42.2017.8.26.0000; Relator: Desembargador Marcelo L Theodósio; Órgão Julgador: 11ª Câmara de Direito Público; Foro de São Sebastião - 1ª V.CÍVEL; Data do Julgamento: 07/06/2018; Data de Registro: 07/06/2018.

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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO oito réus deverão receber a oportunidade de trabalhar no processo para formularem suas alegações e para prová-las. Isso significa que o tempo de duração normal deste processo será aumentado, quando comparado com o tempo de duração normal de um processo em que apenas um réu é acusado. Por isso, não é proporcional que o prazo máximo de afastamento de um único réu seja o mesmo prazo máximo de afastamento de um réu que é co-réu com outros vinte e sete. Tenha-se em conta que, por causa desses muitos réus, este processo ainda está na fase de defesas preliminares, conforme previsto no art. 17, parágrafo sétimo, da referida lei nº 8.429. Para se cumprir a lei processual, todos esses mesmos vinte e oito réus ainda poderá ter a oportunidade de apresentarem, cada um, uma nova peça de defesa (contestação), conforme previsto no parágrafo nono do mesmo artigo 17 da referida lei; e somente depois que terminar toda essa fase postulatória é que eventualmente se iniciará a produção de provas complementares. Por isso, a fase de instrução não teve seu início ainda possível.

Como se depreende da mera leitura da decisão recorrida, igualmente não merece prosperar o argumento de que houve fundamentação genérica para manutenção do afastamento, eis que esta foi específica quanto aos exatos motivos que ensejaram a manutenção da medida cautelar. Assim, verifico que as circunstâncias do caso sob tela justificam plenamente a continuidade do afastamento, uma vez que, como ainda não houve a instrução do feito, a revogação da medida redundaria no indesejável retorno à situação que lhe deu causa, em inequívoco prejuízo a regular instrução processual. Saliente-se que o recorrente não está tendo prejuízos

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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO quanto à sua remuneração, já que o afastamento foi determinado com fundamento no art. 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429/92, que possibilita o afastamento da função pública, sem prejuízo da remuneração, sempre que tal medida se mostrar necessária para garantir a instrução processual. Enfatize-se, também, que a regular instrução processual é interesse de toda a coletividade2, devendo prevalecer, na ponderação dos princípios pertinentes ao caso, a efetiva proteção ao interesse público. Igualmente não merece acolhida o argumento quanto à violação ao princípio da congruência, uma vez que a medida tem inequívoca natureza cautelar, podendo o magistrado, portanto, valendose do poder geral de cautela, determinar, de ofício, medidas necessárias à garantia do resultado útil do processo. Nesse sentido, é o pacífico entendimento do STJ: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. DETERMINAÇÃO DE RENOVAÇÃO DA PROCURAÇÃO. PODER GERAL DE CAUTELA. REEXAME. SÚMULA 7/STJ. 1. "Valendo-se do poder geral de cautela, pode o magistrado determinar, de ofício, providência que lhe pareça cabível e necessária ao resultado útil do processo" (AgInt no AREsp 975.206/BA, Rel. Ministra Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 27/4/2017, DJe 4/5/2017). 2. Para infirmar o acórdão nesse ponto e afastar a determinação de renovação da procuração do advogado, necessário seria revolver o elementos de convicção colacionados ao feito, o que é obstado pelo teor da Súmula 7/STJ.

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Agravo Regimental na Suspensão de Liminar e de Sentença 467/PR, Relator o Ministro Barros Monteiro, Corte Especial, julgado em 07/11/2007, DJ 10/12/2007, p. 253.

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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO 3. Agravo interno a que se nega provimento.3

Destarte, constato que a decisão do primeiro grau não se mostra abusiva ou ofensiva constitucionais, ao contrário, é razoável e fundada no cautela do Judiciário, encontrando-se devidamente merecendo, portanto, nunc, ser mantida.

magistrado de aos princípios poder geral de fundamentada,

ISSO POSTO, indefiro o efeito suspensivo almejado, nos termos enunciados, devendo esta decisão ser comunicada imediatamente ao Juízo a quo. Encaminhem-se os autos à Procuradoria-Geral de Justiça para, caso entenda necessária sua intervenção, manifestar-se no prazo de 15 (quinze) dias, na forma do art. 1.019, III, do CPC/2015. Tudo feito, tornem para julgamento. Expediente necessário. Fortaleza, 9 de julho de 2018. Antônio Abelardo Benevides Moraes Desembargador Relator

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Agravo Interno nos Embargos de Declaração no Recurso Especial nº 1634558/RJ, Relator o Ministro Ogg Fernandes, Segunda Turma, julgado em 28/11/2017, DJe 05/12/2017.

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