Leon

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ENSAIOS FOTOGRAFICOS E POESIAS DE LEANDRO BORGES



à beira da praia sinto o pensamento dos rochedos e em meus lábios arde a flor de sal recém-chegada da noite escorre pela garganta seca de silêncio a inundar o meu corpo de areia tentando cobrir esta solidão da sua incapacidade de expressão


e nas ondas surge um vazio de uma concha fĂłssil secular a rasar a vastidĂŁo do mar onde ferve um tempo reprimido entrego-me ao fundo do oceano para encontrar outra luz outra vida suspensa na densidade das ĂĄguas



contei para a brisa e para um doce luar, As coisas mais sagradas de meu coração. Bordei minha lenda com os beijos do mar E com todos os belos sentidos da paixão.


"Certo querer..." Uma longa espera... Pelo que nunca veio e talvez jamais venha. Um querer provar outro gosto, outro bocado. Perco-me nas voltas que traço E meus territórios abertos Mostram-me o horizonte longe demais. Inalcançável aos meus olhos... É querer esse “nada” cheio de mistérios. Outras palavras, antes jamais ditas. Rios que querem fluir, ir ao encontro Do mar desconhecido, assustador. Ao mesmo tempo o medo De ficar a deriva, num mar bravio... É me olhar do alto de mim. Nada entender, ainda assim me permitir. É o querer ser o que digo E o que penso, sem negar, nem me esconder. É querer o plano “B”, antes até Da estratégia montada. A ânsia por descobrir, conhecer, ouvir. É contornar minhas margens Preencher meus espaços... E aprender a nesses vácuos... Não tecer fios de solidão. Confuso esse querer ir embora De mim mesma...



Saiu da sala de jantar. Ninguém reparou. Desceu alguns degraus e baixou-se para tirar os sapatos de salto alto. Então, desceu o último degrau e sentiu a areia seca tomando-lhe os pés. Deu alguns passos seguindo o chamamento das ondas. Sentou-se, pousou os sapatos e abraçou os joelhos. A noite estava quente e húmida. O vestido branco agarrava-se à pele, do mesmo modo que, a espuma branca das pequenas ondas, se vinha agarrar à areia. Ainda conseguia ouvir a música tropical vinda da sala e as vozes sem palavras definidas. Tinha sido um jantar muito agradável. Tudo era bom e bonito. Perfeito, se não fosse a sua fome de silêncio e de solidão. Sentia-se bonita naquela noite, Sentia-se em paz. Mais ainda, ali sentada sozinha. Num ímpeto deixou-se cair para trás e ficou deitada. Olhou o céu azul escuro e viu milhões de estrelas. Definiu algumas constelações. Tentou definir caminhos de estelas. Complexos caminhos que lhe fizeram lembrar as estradas da vida. Viu as estrelas desalinhadas e iniciou um árduo trabalho de tentar alinhá-las. Pareceu-lhe possível. Mas, nessa noite sentia-se cheia de força. Uma força interior que nem sempre conseguia ter. Com a ajuda do mar, conseguiu mesmo alinhar alguns caminhos. Caminhos seus. Caminhos irreais. Talvez tenha adormecido. Decerto que sonhou e, só acordou, quando sentiu a presença de alguém perguntando o que fazia ali, tão só.



saiu da sala de jantar. Ninguém reparou. Desceu alguns degraus e baixou-se para tirar os sapatos de salto alto. Então, desceu o último degrau e sentiu a areia seca tomando-lhe os pés. Deu alguns passos seguindo o chamamento das ondas. Sentou-se, pousou os sapatos e abraçou os joelhos. era bom e bonito. Perfeito, se não fosse a sua fome de silêncio e de solidão.


contrariamente Ă s leis da natureza, Sou eu fĂŞmea em cio, Que o penetro lentamente E me sacio na sua frescura Inebriante.



o Eterno Espanto que haverá com a lua que sempre que a gente a olha é com o súbito espanto da primeira vez?


o Banho como demora esse banho. Envolta em toalhas ela desfila entre espelhos embaçados. As lamparinas da nudez conferem à pele os vários tons da madrugada.


POESIA DO PÉ Quem dá no pé quer fugir. Ao pé da letra é resposta pronta, sem vacilação. Quem aperta o pé só quer andar mais rápido. Meter os pés é pagar favor com ingratidão...


quando tuas mãos saem, amada, para as minhas, o que me trazem voando? Por que se detiveram em minha boca, súbitas, e por que as reconheço como se outrora então as tivesse tocado, como se antes de ser houvessem percorrido minha fronte e a cintura?


Velhas Árvores Olha estas velhas árvores, mais belas Do que as árvores novas, mais amigas: Tanto mais belas quanto mais antigas, Vencedoras da idade e das procelas... O homem, a fera, e o inseto, à sombra delas Vivem, livres de fomes e fadigas; E em seus galhos abrigam-se as cantigas E os amores das aves tagarelas. Não choremos, amigo, a mocidade! Envelheçamos rindo! envelheçamos Como as árvores fortes envelhecem: Na glória da alegria e da bondade, Agasalhando os pássaros nos ramos, Dando sombra e consolo aos que padecem!


Mãos dadas Não serei o poeta de um mundo caduco. Também não cantarei o mundo futuro. Estou preso à vida e olho meus companheiros. Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças. Entre eles, considero a enorme realidade. O presente é tão grande, não nos afastemos. Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas. Não serei o cantor de uma mulher, de uma história, não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela, não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida, não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins. O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente.



Não chame o meu amor de Idolatria Nem de ídolo realce a quem eu amo, Pois todo o meu cantar a um só se alia, E de uma só maneira eu o proclamo. É hoje e sempre o meu amor galante, Inalterável, em grande excelência; Por isso a minha rima é tão constante A uma só coisa e exclui a diferença. 'Beleza, Bem, Verdade', eis o que exprimo; 'Beleza, Bem, Verdade', todo o acento; E em tal mudança está tudo o que primo, Em um, três temas, de amplo movimento. 'Beleza, Bem, Verdade' sós, outrora; Num mesmo ser vivem juntos agora.


LEANDRO BORGES


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