Artistas da moda e antropólogos da cozinha: estilistas e chefes

Page 1

1

Artistas da moda e antropólogos da cozinha: estilistas e chefes. Praticas culturais, tradições brasileiras e estilos de vida na globalização cultural1

Maria Lucia Bueno Ramos 2

A expansão e a sofisticação das práticas de consumo transformaram alguns redutos associados à tradição e ao mundo dos objetos em esfera cultural, lugar de construção de identidades. As transformações no âmbito do consumo evoluem sintonizadas com transformações análogas no contexto da produção, num movimento que vem esgarçando os limites entre as práticas culturais e as práticas estéticas, promovendo uma aproximação entre elas. Nesse cenário o estilista e o chef despontam como novas modalidades de produtores que lidam com a estética e a cultura. Os universos da moda e da gastronomia estão associados ao desenvolvimento do mercado de luxo e sintonizados com a dinâmica do circuito globalizado, despontando como espaços econômicos e culturais relevantes no Brasil a partir dos anos 1980. Os estilistas e os chefs são os personagens mais proeminentes desses contextos, onde a organização do trabalho assume configurações extremamente individualizadas. Em nosso estudo procuramos traçar, a partir desses agentes e das suas conexões, um primeiro esboço da evolução histórica e da organização cultural e material dos redutos da moda e da gastronomia. A moda e a gastronomia se converteram em espaços de construção de estilos de vida, o que resultou numa elevação cultural dos seus principais profissionais, transformando o caráter do trabalho que desempenham que evolui de prática artesanal a prática intelectual.

1

Esse texto foi parte da apresentação de Maria Lucia Bueno Ramos, durante a mesa “Moda e gastronomia como práticas culturais. Consumo e estilos de vida na globalização cultural”, no Encontro Internacional Públicos da Cultura, realizado em novembro de 2013. 2 Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) com pós-doutorado no Instituto de Artes da Unicamp, na École des Hautes Études em Science Sociales e na Université Paris Est (Marne-La-Vallée). Atualmente é professora do Instituto de Artes e Design na Universidade Federal de Juiz de Fora, onde coordena o Programa de Pós-graduação em Artes, Cultura e Linguagens.


2

Uma hipótese que permeia nossa reflexão é que a moda e a gastronomia no universo contemporâneo, extrapolando o âmbito restrito do comércio de luxo, expandem-se para um público mais amplo a partir da sua dimensão estética e cultural. A amplificação da visibilidade desses setores a partir da mídia, da multiplicação de publicações especializadas (livros, jornais, revistas, guias e manuais) e dos programas de televisão, consolidam uma cultura de moda e uma cultura gastronômica como esfera de debates, de constituição de diferentes correntes e tendências teóricas, na qual o estilista e o chef se configuram, cada vez mais, como agentes culturais. Nessa perspectiva talvez a moda e a gastronomia possam vir a ser pensadas como uma modalidade de indústria cultural, onde o consumo simbólico suplanta a apropriação individual.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.