As práticas culturais: ponto de partida para investigação das experiências de audiências e públicos

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As práticas culturais: um ponto de partida para a investigação das experiências das audiências e dos públicos1

Pedro Güell2

Qual é o tipo de investigação que precisamos para cuidarmos do que foi aprendido em várias décadas de investigação de públicos culturais e para assumirmos a crescente exigência de que as experiências culturais contribuam para ampliar a democracia de cidadãos? Esta apresentação se desenvolve em torno de sete afirmações. A primeira afirmação se refere ao ponto de vista normativo da nossa exposição. Pensamos na experiência cultural – aquilo que sentimos, fazemos e nos ocorre no espaço das ofertas culturais – como um fim humano em si mesmo, que não requer mais justificativas, mas além disso tem um efeito muito importante sobre nossa relação com a vida em comum com outros e sobre as imagens que fazemos da sociedade. Como observar os públicos culturais desde a perspectiva do impacto que suas experiências tem sobre a formação da cidadania? A segunda é que as investigações sobre públicos e audiências são realizadas a partir de certa suposição de exterioridade e autonomia entre públicos, métodos de investigação e interesses dos investigadores. Mas os interesses que nos guiam e os métodos que aplicamos tendem a constituir performativamente os públicos que observamos e os resultados da observação. As suposições normativas e metodológicas devem ser criticamente explicitadas. Uma terceira afirmação assinala que os estudos de audiências ou públicos têm tendido a observar a relação entre eles e as ofertas culturais como se ela ocorresse antes de um espaço delimitado e autônomo: o campo cultural ou o circuito da oferta pública de bens culturais. Isto teve uma dupla consequência: tende-se a excluir a influência de outras esferas da sociedade, como a economia, a política, os movimentos sociais globais, ou as TICs; e tende-se a separar os modos de percepção cultural dos indivíduos do efeito das percepções que eles desenvolvem em outros campos. Uma quarta afirmação menciona que os estudos de públicos e audiências tendem a centrar-se exclusivamente no olhar síncrono, e deixam de lado as trajetórias que os indivíduos seguem no tempo em sua relação com a oferta cultural. Esta é em parte uma consequência da ideia de 1

Esse texto foi parte da apresentação de Pedro Güell, durante a mesa “O instável cenário dos públicos culturais. Notas para a investigação” no Encontro Internacional Públicos da Cultura, realizado em novembro de 2013. O texto foi traduzido por Carla Pinochet. 2 Doutor em Sociologia pela Universidade Erlangen-Nürnberg (Alemanha). É professor de Sociologia da Universidade do Chile. Tem trabalhado com a questão das trocas culturais no Chile, bem como com Teoria da Cultura e Desenvolvimento da América Latina. Realiza assessorias em comunicação estratégica e análises de públicos, avaliação e planejamento de políticas culturais.


2 que os indivíduos se relacionam com a oferta cultural a partir de certo hábito muito estável. Isto limita a capacidade dos estudos para se observar as “biografias culturais”, isto é, o impacto que a participação cultural tem sobre a participação cultural. A quinta afirmação se refere ao tipo de definição de públicos culturais que permitiria de uma parte observá-los com base em cidadania, e de outra, cuidar das transformações culturais objetivas que afetam os processos de subjetivação e cidadania dos indivíduos. Desenvolvemos uma noção de públicos e audiências a partir das dinâmicas relativamente abertas e emergentes das práticas de acesso, interpretação e apropriação dos bens culturais. Nessas práticas, elas realizam “experiências”, cujas formas de constituição e cujos efeitos são nosso objeto de observação. Uma sexta afirmação assinala que é possível definir três formas de observação das práticas culturais. Uma remete às práticas dos “visitantes”: as dinâmicas objetivas e subjetivas do acesso e não acesso aos espaços culturais. Outra se dirige às práticas das “audiências”: as experiências subjetivas realizadas na interação direta com os bens culturais. Uma terceira é a observação das práticas dos “públicos culturais”: o efeito das experiências culturais sobre as interações com outros no espaço público. O impacto das práticas culturais sobre a democracia deve ser analisado em cada nível, mesmo que somente possa ser abordado em toda sua complexidade no nível dos “públicos culturais”. Uma sétima afirmação se refere aos métodos de investigação adequados a esses diversos modos de definição ou a suas combinações. Não existem métodos adequados ou inadequados a priori; o que existe são boas ou más definições teóricas e normativas dos públicos a serem observados em função de nossos interesses e das características do real. A seleção das técnicas depende dessas definições.


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