nossa Roça Dezembro 2003 - nº 02
O campo de sementes dos agricultores e agricultoras de Divino Experiências da agricultura familiar na Zona da Mata de Minas Gerais
A ORGANIZAÇÃO E AS PARCERIAS AJUDAM A TRANSFORMAR IDÉIAS EM AÇÃO
Dizem que na China a palavra crise (wei-chi) tem dois significados: problema e oportunidade. Cabe às pessoas escolher o significado dela, se um momento de recuo ou uma época de oportunidade para novas idéias. Em Divino, prevaleceu a segunda opção. Algumas idéias surgiram justamente num período difícil para os/as agricultores/as, que sofriam com a crise do café, no início dos anos 90. Na verdade, as ações só aconteceram porque, ao invés do desânimo e do isolamento, comuns em momentos de dificuldades, o pessoal decidiu se unir para encontrar uma saída. Depois de muitas conversas, que ocorriam na escolinha sindical do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STR), eles perceberam que para superar a crise seria necessário diversificar a produção, retomando algumas atividades.
Por coincidência, nesta época, mais precisamente em 1992, o Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata (CTA) e o STR estavam iniciando o Programa Milho Crioulo, em Divino. Um dos objetivos era o resgate de sementes crioulas. O primeiro campo de sementes foi plantado na comunidade de Viletes, havia um monitor responsável pela ampliação e discussão da experiência em outros locais; todos se envolviam e o trabalho era feito em mutirão. Mais tarde, a experiência foi ampliada para Retiro, Periquito, Carolas e Bom Jesus, outras comunidades de Divino. Eram nove variedades de milho: Pedra Dourada, Maia, Asteca, Caiana, Cravo, Pedra Branca, Cuba e Dente de Burro. Na comunidade do Morro Redondo o campo surge a partir de um encontro onde se discutiu a Lei de Patentes. Só que, infelizmente, não teve continuidade, pois o campo havia sido implantado num terreno cedido “à meia”. E o dono do terreno, que não participava do mutirão, achou que a produção das variedades escolhidas foi pequena. Mas como o objetivo do grupo não era apenas a produtividade, procuraram outra área. Apesar das dificuldades, as pessoas não queriam ficar somente na discussão, então, em 1998, o grupo foi fortalecido com o envolvimento da Pastoral da Juventude Rural de Divino. Jovens de várias comunidades se organizaram e, mais uma vez, os agricultores e as agricultoras se juntaram para plantar campos de semente e de ensaio.
O grupo fez uma parceria informal para utilizar uma área na comunidade dos Ferreiras, que há mais de cinco anos não era cultivada. No primeiro ano, o campo chegou a seis hectares e o número de boas sementes selecionadas a 1.200 quilos. Só que, mais uma vez, o proprietário do terreno tinha outros planos e os agricultores tiveram que deixá-lo. O resultado da experiência em Divino foi muito importante, e o trabalho com campo de sementes colocou em prova quais variedades seriam mais viáveis para as condições do local. Embora o município tenha contabilizado sete campos de produção, seleção e multiplicação de sementes de milho, dificuldades como a falta de contrato registrado para uso da terra, acabaram interrompendo a experiência. Mas o plantio de milho para produção continuou e as pessoas mantiveram - e ainda mantêm - em suas propriedades as sementes crioulas. Estima-se que mais de 200 famílias do município ainda tenham as sementes.
Retomada da Experiência Como toda boa idéia não pode morrer, os agricultores e agricultoras de Divino decidiram retomar a idéia do campo de sementes, em 2002. A principal razão para a nova tentativa surgiu de uma discussão, na escolinha sindical, a respeito dos transgênicos e suas conseqüências sobre os agricultores/as. A conclusão da conversa foi a de que a semente representa autonomia para quem vive na terra e da terra. Como nesta época o CTA e o Sindicato estavam iniciando um trabalho com produção de café orgânico no município, os parceiros envolvidos no projeto tiveram a idéia de plantar um novo campo de sementes. Desta vez, não só de milho, mas também de leguminosas, que seriam utilizadas como adubo verde. Assim, calejados com as experiências anteriores e preocupados com a continuidade do campo, agricultores e agricultoras, através do Sindicato, arrendaram um terreno, com aproximadamente seis hectares, na comunidade dos Teixeiras. E ali fizeram o plantio de crotalária, feijão de porco, soja, mucuna-anã, lab-lab e de duas variedades de milho (Pedra Dourada e Maia Antigo). Os resultados ainda não foram os esperados; a chuva não ajudou e os recursos foram poucos em relação aos gastos. Mas isto não esfriou a vontade do grupo. Este ano, o trabalho já está a todo vapor, graças à união e à força das pessoas para concretizar a idéia. A experiência em Divino comprova que a organização dos agricultores e agricultoras e as parcerias fortalecem o Movimento, transformando idéias em ação.
Nossa Roça é produzido pela equipe técnica do CTA-ZM.
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