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Jornal do Brasil | Quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Indicadores

PREJUÍZO

Contas externas terão rombo de US$ 60 bilhões Banco Central prevê para 2011 um déficit igual a quase 3% do Produto Interno Bruto O Banco Central divulgou ontem, pela primeira vez, sua expectativa para 2011. A projeção é que a conta corrente de pagamento (registro das transações de compra e venda de mercadorias e serviços no exterior) deverá ter um déficit de US$ 60 bilhões. O que equivale a 2,78% do Produto Interno Bruto (PIB). No caso de a projeção se confirmar, este será o maior déficit desde 1947, quando teve início a série histórica. Segundo o BC, para este ano o déficit em transações correntes manteve-se estável em US$ 49 bilhões, o que representa 2,49% do PIB. Segundo Altamir Lopes, chefe do Departamento Econômico do Banco Central, os valores no passado já foram maiores. – Havia uma carga de juros elevada. A carga de juros deixou de ser um peso, um componente que causava volatilidade para as transações correntes– disse, lembrando que a projeção de despesa líquida de juros, para este ano é de US$ 9,4 bilhões, e

de US$ 9,5 bilhões, para 2011. De janeiro a agosto deste ano, o déficit em transações correntes está em US$ 31,122 bilhões, contra US$ 9,609 bilhões registrados em igual período de 2009. Em agosto, o déficit em transações correntes ficou em US$ 2,861 bilhões, e a previsão para este mês é de US$ 3,8 bilhões. O Banco Central alterou sua estimativa para o superávit comercial, que subiu de US$ 13 bilhões para US$ 15 bilhões. Houve também revisão na projeção das exportações, que passaram de US$ 185 bilhões para US$ 192 bilhões. Nas importações, a estimativa subiu de US$ 172 bilhões para US$ 177 bilhões. Em 2011, a previsão do superávit comercial ficou em US$ 11 bilhões, com exportações de US$ 230 bilhões e importações de US$ 219 bilhões. Há uma estimativa na elevação das remessas de lucros ao exterior, ocasionadas pelo crescimento econômico. Este ano, a previsão foi mantida em US$ 32 bilhões e subiu no ano que vem para US$ 36 bilhões.

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Juros

Gastos de turistas brasileiros fora do país batem recorde Os gastos de brasileiros em viagem ao exterior bateram recorde em agosto. Segundo dados do Banco Central (BC) divulgados ontem, de janeiro a agosto deste ano, essas despesas ficaram em US$ 9,888 bilhões, contra US$ 6,414 bilhões do mesmo período de 2009. As despesas registradas nos oito meses do ano são recorde para o período na série histórica do BC, iniciada em 1947. Só no mês passado, esses gastos chegaram a US$ 1,302 bilhão. Nes-

te mês, até ontem, as despesas de brasileiros no exterior estão em US$ 1,012 bilhão. As despesas de estrangeiros no Brasil ficaram em US$ 3,867 bilhões nos oito meses do ano, enquanto no mesmo período de 2009 chegaram a US$ 3,467 bilhões. No mês passado, os estrangeiros deixaram no país US$ 489 milhões. Devido ao aumento das despesas de brasileiros no exterior maior do que as receitas deixa-

US$ 1,3 bi

é o quanto os brasileiros gastaram em turismo fora do país só no mês passado

EXPANSÃO – Bonança econômica fez brasileiro viajar mais

Selic (meta/efetiva % a.a)..........................10,75%/11,18% a.a CDB pré 30 dias..........................................................7,75/10,60 CDB pós 120 dias..................................................... 9,50/10,50tr DI Over taxa média.......................................... 10,62% a.a DI Over taxa média(a.m.).........................................1,20% Swap DI x pré 30 dias .......................................... 10,55/10,65% a.a Swap DI x pré 62 dias .......................................... 10,60/10,70% a.a Swap DI x pré 90 dias .......................................... 10,60/10,70% a.a Taxa Anbid 1 dia Para 20/09/2010.......................................... 10,56% a.a

Poupança

22/09/2010......................................................0,5682%

TR (%)

18/09/2010 a 18/10/2010 0,0003%

TR (%)

19/09/2010 a 19/10/2010 0,0286%

TR (%)

20/09/2010 a 20/10/2010 0,0783%

TBF (%)

das por estrangeiros no Brasil, o BC revisou a projeção de déficit na conta de viagens de US$ 8 bilhões para US$ 10 bilhões. Para 2011, a previsão de déficit é de US$ 11,5 bilhões. De janeiro a agosto deste ano, o déficit ficou em US$ 6,021 bilhões, contra US$ 2,947 bilhões registrados em igual período de 2009. Esse resultado de oito meses também é o maior registrado no período. O déficit de US$ 813 milhões do mês passado também é recorde. Segundo o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, a renda dos brasileiros tem crescido, e por isso, há um aumento das viagens ao exterior, “sem a contrapartida relacionada ao turista estrangeiro no Brasil”. No caso dos estrangeiros, ele explicou que, como a economia mundial está crescendo a uma taxa que pouco expressiva, as viagens para o Brasil se expandiram pouco.

18/09/2010 a 18/10/2010 ............................. 0,7303%

TBF (%)

19/09/2010 a 19/10/2010 ............................. 0,7688%

TBF (%)

20/09/2010 a 20/10/2010 ............................. 0,7889%

tjlp (% a.a.)

De 1º/07/2010 a 30/09/2010 ................................6,00

Ouro

Ouro (g) BM&F ................................................R$ 73,200 Ouro (onça troy*) NY ................................US$ 1.285,000 *1 onça troy = 31,103 g

Bolsas

Bovespa - Índice ..............................................67.719,13 Bovespa (var. %) ..................................................... -0,69 Nasdaq - Índice ..................................................2.349,35 Nasdaq (var. %) ....................................................... -0,28 Nova York - Índice ............................................10.761,03 Nova York (var.%) ................................................... 0,077

Câmbio/Dólar (R$/US$*)

Ptax**.................................................... 1,7247/1,7255 Paralelo ..................................................1,7700/1,8700 Cabo (BC) ..............................................1,6980/1,7380

Turismo

São Paulo................................................1,6400/1,7800 Rio.......................................................... 1,6600/1,8300

Euro*

US$/¤................................................. 1,32430/1,32440 R$/¤........................................... 2,2840202/2,2852522

Peso argentino*

$/US$ ................................................3,94900/3,95450 R$/$ ..........................................0,4361360/0,4369461 *Compra/venda **Taxa média do Banco Central Mais informações no site http://jbonline.terra.com.br/ editorias/economia


Jornal do Brasil | Sexta-feira, 24 de setembro de 2010

A mostra Panorama, que abriga grandes diretores e filmes premiados em contendas estrangeiras, ainda é a mais procurada do Festival do Rio

Volta ao mundo em 300 filmes São mais de três centenas de títulos, divididos em 18 mostras, distribuídas por um circuito composto por 40 endereços. Assistir a todos os filmes da 12ª edição do Festival do Rio, cujas sessões para público começam hoje, é uma tarefa impensável mesmo para Ilda Santiago, diretora executiva da maratona, que se estende até o dia 7 de outubro. – Há coisas que não vejo necessidade de ver, como os filmes da mostra Geração, voltada para o público infanto-juvenil, ou mesmo de rever, como os títulos das retrospectivas – confessa Ilda. – Claro que também conto com a ajuda da indicação de programadores de outros festivais para montar a grade. Mas posso garantir que a maior parte dos filmes passou por minha avaliação. Até mesmo os curtas brasileiros. O segredo, então, é saber qual sua prioridade diante de um festival dessa magnitude. Há quem corra atrás de raridades, já que muitos filmes não chegarão às salas brasileira, como Carlos, de Olivier Assayas, superprodução com mais de cinco horas de duração, sobre o terrorista venezuelano, feito de encomenda para a TV francesa. Ou mesmo os filmes da retrospectiva de Jerzy Skolimowski, o maior nome do cinema independente po-

lonês. A maioria, no entanto, corre atrás de programas certos, como os que chegam com o selo de qualidade de festivais internacionais. Para esses últimos, a Panorama do Cinema Mundial continua sendo a seção mais procurada. É lá que estão Um lugar qualquer, de Sofia Coppola, vencedor do Urso de Ouro do Festival de Veneza, e Tio Boonmee, que pode recordar suas vidas passadas, de Apichatpong Weerasethakul, ganhador da Palma de Ouro em Cannes. É também onde estão alocados os novos filmes de Woody Allen (Você vai conhecer o homem de seus sonhos), Ken Loach (Rout Irish) e Zhang Yimou (A woman, a gun and a noodle shop). A mostra abriga ainda os novos trabalhos dos atores Ben Affleck e Mathieu Amalric como diretores: Atração perigosa e Turnê, respectivamente. – Não vejo a Panorama como o filé mignon do festival, porque isso é tirar a importância das demais mostras – esclarece Ilda. – Analisando objetivamente, ela apenas é a mais facilmente reconhecida pelo público, por envolver nomes conhecidos e ter o reconhecimento em outros festivais. Mesmo sem saber nada a respeito sobre o filme, todo mundo vai querer ver os mais recentes trabalhos do Woody Allen, do Abbas Kiarostami

ou do Ken Loach, não é? É um evento internacional, habituado a receber convidados estrangeiros (Michael Madsen, Charlotte Rampling e Irène Jacob estão na longa lista deste ano), mas que não descuida da produção local: 17 títulos nacionais, entre documentários e ficção, concorrem ao troféu Redentor, na mostra Première Brasil. Cinematografia homenageada deste ano, o Festival do Rio recebe 18 títulos argentinos na seção Foco Argentina, que inclui as últimas crias de Pablo Trapero (Carancho) e Marcelo Piñeyro (Viúvas sempre às quintas).

MAPA MUNDI – ‘A woman, a gun and a noodle shop’, ’O universo de Keith Haring‘, ’Atração perigosa’, ‘Gainsbourg’, ’Carlos’, ’Turnê’, ‘Um lugar qualquer’ e ‘Carancho’ são atrações da maratona carioca deste ano

O serviço do festival está na seção B programa. A programação completa está no site www.festivaldorio.com.br

Arte sobre fotos de divulgação

Carlos Helí de Almeida

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Jornal do Brasil | Sábado, 25 de setembro de 2010

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As regras ELEIÇÕES 2010

Luiz Orlando Carneiro BRASÍLIA

A partir desta terça-feira – cinco dias antes das eleições nacionais e até 48 horas depois de seu encerramento – nenhum eleitor poderá ser preso ou detido, salvo em flagrante delito, ou em virtude de sentença condenatória por crime inafiançável, de acordo com o Código Eleitoral. Por esta mesma garantia já estão protegidos, desde o dia 18 (15 dias antes do pleito) os mais de 20 mil candidatos aos cargos de presidente da República, governadores, senadores, deputados federais, estaduais e distritais (Distrito Federal). De acordo com o calendário do Tribunal Superior Eleitoral, a próxima quinta-feira é o último dia da propaganda explícita, com a suspensão da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão, e a proibição de comícios, reuniões públicas e da utilização de aparelhagem de sonorização fixa. Os debates nos meios de comunicação entre candidatos estão também proibidos a partir de sexta-feira, dia 1º de outubro. Na semana passada, o TSE prorrogou até quinta-feira o prazo para que os eleitores possam obter uma nova via do título, sem o qual ficarão impedidos de votar. Nestas eleições, passou a ser obrigatória a apresentação do título eleitoral, juntamente com outro documento que contenha fotografia do portador, como carteira de identidade ou de motorista. No entanto, mais de 1 milhão de eleitores de 60 municípios, distribuídos por 23 estados, serão liberados para votar após identificados por suas impressões di-

na reta final A semana eleitoral Terça-feira, 28/09

A partir de terça-feira, eleitores só podem ser presos em flagrante. No dia 3, manifestações coletivas estão proibidas

gitais. Esse tipo de identificação – que deverá incluir todas as seções eleitorais do país, até 2018 – exige um recadastramento, a fim de que sejam colhidas as impressões dos eleitores inscritos. Os municípios onde os votantes já serão identificados pelo novo sistema são pequenos, e situados, em sua grande maioria, no Nordeste (11 em Alagoas e no Rio Grande do

Nenhum eleitor pode ser preso, salvo em flagrante. A mesma medida já vale para os candidatos desde o dia 18

Quinta-feira, 30/09 Último dia de propaganda eleitoral explícita, incluindo debates Último dia para concessão de 2ª via de título de eleitor

Domingo, 03/10 ( dia da eleição) É permitida a manifestação individual e silenciosa da preferência do eleitor por partido político, coligação ou candidato, pelo uso de bandeiras, broches, dísticos e adesivos É proibida a aglomeração de pessoas portando vestuário padronizado, bandeiras, broches, dísticos e adesivos que caracterizem manifestação coletiva No recinto das seções eleitorais e juntas apuradoras, servidores da Justiça eleitoral, mesários e escrutinadores não podem usar vestuário ou portar objetos que contenham qualquer propaganda de partido, coligação ou candidato; o mesmo para os fiscais partidários, que só podem usar crachás com o nome e a sigla do partido ou coligação.

Norte, quatro em Pernambuco). Mas em Minas Gerais o novo sistema vai funcionar em quatro cidades de eleitorado representativo: São João Del-Rei (64 mil), Pará de Minas (56 mil), Curvelo (52 mil) e Ponte Nova (43 mil). Dia da eleição

De acordo com a resolução específica do TSE (Res. 23.223/10),

é permitida, no dia da eleição, “a manifestação individual e silenciosa da preferência do eleitor por partido político, coligação ou candidato, revelada, exclusivamente, pelo uso de bandeiras, broches, dísticos e adesivos”. São proibidas as seguintes manifestações e atitudes: até o término da votação, a aglomeração de pessoas “portando vestuário pa-

dronizado, bem como bandeiras, broches, dísticos e adesivos que caracterizem manifestação coletiva”; nas seções eleitorais e juntas apuradoras, os servidores da Justiça eleitoral, os mesários e escrutinadores não podem usar vestuário ou portar objetos que contenham qualquer propaganda de partido, coligação ou candidato; o mesmo para os fiscais partidários, que só

podem usar crachás com o nome e a sigla do partido ou coligação. Comércio

O comércio pode funcionar no dia da eleição, com a ressalva de que os estabelecimentos que abrirem “deverão proporcionar as condições para que seus funcionários possam exercer o direito/dever do voto”.


Jornal do Brasil | Segunda-feira, 20 de setembro de 2010

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Preço médio de hotéis no segundo trimestre de 2010

nada

Paulo Nicolella - 23/8/2010

TURISMO

Preços

maravilhosos

Pesquisa mostra que diárias dos hotéis no Rio superam as de destinos internacionais Jorge Lourenço

Quando o assunto é preço de diária em hotéis, o Rio de Janeiro é um dos destinos turísticos mais caros do mundo. A capital fluminense supera cidades como Barcelona, Miami e Los Angeles. O dado é da pesquisa que indica o Índice de Preços de Hotéis (HPI, em inglês), feito pela Hoteis.com. O indicador mostra uma média baseada no número de quartos alugados por região. A razão, segundo a empresa que realizou a pesquisa, é a disparidade da deficiente expansão da rede hoteleira com o crescimento acelerado da cidade como destino turístico. Com alta procura e pouca oferta de quartos, os preços aumentaram significativamente em relação ao resto do mundo. O problema, inclusive, foi apontado pelo próprio Comitê Olímpico Internacional (COI) durante sua vi-

CLASSE A – Hotel Intercontinental, em São Conrado

sita ao Rio de Janeiro, antes de escolher a cidade como sede dos Jogos Olímpicos de 2016. Para receber o evento, a sede precisa ter, no mínimo, 40 mil apartamentos. Hoje, estão disponíveis 28 mil leitos. A cidade foi também na contramão da tendência mundial, que apontou a redução dos preços dos quartos de hotéis. Entre os principais destinos, apenas Rio e Nova Iorque tiveram alta. Eles aumentaram 6% e 3%, respectivamente. O preço médio por quarto nos hotéis cariocas é de R$ 310, perdendo apenas para Veneza, Paris,

Londres e Nova Iorque. O valor deixa o Rio de Janeiro em desvantagem em relação a outras cidades. Orlando (EUA), que tem uma infraestrutura melhor que a carioca, além de parques temáticos, como a Disney World, cobra uma média de R$ 137 por quarto. Capital mundial do cinema e vítima de constante especulação imobiliária, Los Angeles tem quartos que custam R$ 229. Já em Roma, que só perde para Paris em número de turistas na Europa, pode-se encontrar acomodações por R$ 298. – Mesmo sem oferecer a mesma

estrutura, o Rio cobra os preços de outras cidades por conta da globalização do valor destes serviços – explica a diretora de marketing da Hoteis.com, Maíra Barcellos. – É preciso um trabalho de se adaptar à realidade local. Projetos reaquecem setor

Na tentativa de sanar o problema, a Associação Brasileira de Indústria de Hotéis no Rio (ABIH-RJ) têm investido na expansão do setor na cidade. – Já temos cerca de 9 mil apartamentos garantidos a caminho – disse presidente da entidade , Alfredo Lopes. – São hotéis entre três e cinco estrelas. Os de maior porte deverão ficar na Barra da Tijuca.

Segundo a Secretaria municipal de Turismo, já existe uma série de projetos em andamento. A pasta confirma a previsão de mais 9 mil quartos. Para fomentar o desenvolvimento do setor, a prefeitura também reduziu de 5% para 2% o imposto sobre serviço cobrado dos hotéis. Hoje, os principais projetos de expansão hoteleira estão nas mãos da rede Windsor e da EBX. Juntas, as empresas devem criar mais 2 mil leitos até 2014. A reativação do Hotel Glória, um dos mais tradicionais da cidade, vai custar R$ 120 milhões à EBX, de Eike Batista. Já o Windsor está desenvolvendo dois novos hotéis e expandindo sua unidade no Flamengo.

Preço alto na baixa temporada ajuda a afastar turistas A falta de planejamento dos hotéis cariocas é um dos principais desafios do movimento de expansão da rede, segundo a diretora de marketing da Hoteis.com, Maíra Barcellos. O aumento da visibilidade do Rio de Janeiro deixou a cidade mais atraente para os turistas, e o pequeno número de quartos oferecidos mantém a lotação quase completa na alta temporada. No Réveillon deste ano, 96% dos hotéis da cidade estavam ocupados. – Em curto prazo, esses hotéis realmente pensam que não precisam baixar os preços, já que a cidade fica lotada na alta temporada – avalia Maíra. – É preciso ser feito todo um trabalho para atrair o turista na baixa temporada. Uma empresa não pode depender financeiramente do sucesso da alta temporada e se segurar no restante do ano. Estamos vivendo um bom momento no Brasil. Mas, se não nos atualizarmos, vamos perder os clientes. Maíra também lembra que o crescimento das redes sociais fez com que os turistas tivessem mais facilidade na busca pelo menor preço, o que é justamente o perfil dos estrangeiros. – Hoje, você pode entrar na internet e buscar um acordo melhor. Os hostels ganham muito com isso – disse a diretora. – A conscientização de que é válido ter preços flexíveis ao longo do ano é algo que a nossa indústria ainda precisa trabalhar.


Jornal do Brasil | Quinta-feira, 23 de setembro de 2010

OLHOS

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As

lentes estão com os dias

contados

Dentro de 10 anos, os óculos de grau, e mesmo as lentes, podem começar a se tornar obsoletos. Especialistas britânicos descobriram um defeito no gene responsável pela visão saudável, que pode ser o principal fator da miopia. Com o novo conhecimento, eles poderiam começar a desenvolver um colírio que evitaria que crianças se tornassem míopes no futuro. Pesquisadores dizem que o medicamento pode estar pronto em até 10 anos. Acredita-se que o gene, conhecido como RASGRF1, exerce um importante papel no desenvolvimento do olho e na transmissão de sinais visuais ao cérebro para processamento. Quando o gene é defeituoso, o globo ocular

pode crescer de forma exagerada, fazendo com que objetos distantes fiquem embaçados. Com a descoberta do gene, os pesquisadores do King’s College de Londres (KCL) anunciam poder produzir um colírio que impediria a deformação do globo ocular, prevenindo, ainda na infância, que crianças desenvolvessem o distúrbio. A pesquisa, publicada no jornal Nature Genetics, avaliou cerca de 4 mil gêmeos britânicos – o uso de gêmeos é comum por facilitar a identificação (e separação) de fatores de criação e da natureza. Depois de estudar a genética de outras 13 mil pessoas, os pesquisadores confirmaram que 45% dos voluntários têm o

Foto: Rafael Moraes

Cientistas britânicos podem desenvolver em 10 anos colírio que vai curar a miopia

PREVENÇÃO – Colírio também evitaria o agravamento do distúrbio

gene, e aqueles com duas cópias têm probabilidade duas vezes maior de apresentar a miopia, comparados aos que estão livres do distúrbio. – Sabíamos que o risco mais acentuado para ser míope é ter pais que sejam míopes, e pela primeira vez estamos identificando genes que podem estar envolvidos na transmissão da suscetibilidade – comenta Pirro Hysi, pesquisador do KCL e principal autor do estudo. Chris Hammond, também do KCL, observa que a miopia é o problema ocular mais comum no mundo, e afeta mais de um terço de adultos no Reino Unido. No Brasil, acredita-se que cerca de 15% da população apresentem o

distúrbio, o que equivale a 28,5 milhões de pessoas. Aqueles que são extremamente míopes carregam riscos significativos de uma futura perda de visão. – Percebemos, já há algum tempo, que fatores de risco ambientais, como o trabalho excessivo em lugares fechados e a falta de atividade ao ar livre, estão envolvidos no problema, mas nunca soubemos o porquê de as pessoas se tornarem míopes – diz Hammond. – Esperamos que, entendendo mais este mecanismo, possamos impedir que as crianças se tornem míopes ou que aquelas que já o são não apresentem agravamento do quadro. Tradução: Maíra Mello


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 1º de dezembro de 2010

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TEMAS SOCIAIS

Liberdade de imprensa Carlos Eduardo Novaes ESCRITOR

À

s vésperas de se tornar o ultimo presidente do regime militar, o general Figueiredo anunciou para quem quisesse ouvir: “A liberdade de imprensa é a liberdade do patrão”. Ele talvez não fosse a pessoa mais indicada para falar de liberdade – em qualquer sentido – mas sua afirmação não foi uma bala perdida. Alguma dúvida? Que leitor, mais sensível e perspicaz, não percebe a posição dos jornais e revistas – para ficar na imprensa escrita – durante, digamos, uma campanha eleitoral para presidente da República? Não será certamente uma posição determinada pelos gráficos, repórteres, empregados em geral. Em qualquer atividade – seja um jornal ou um supermercado – são os donos do negócio que ditam a política da empresa. Nada mais justo. São eles que investem o capital, correm os riscos e não têm por que de-

mocratizar suas decisões ouvindo o pessoal que só entra com o trabalho. Mas será que essa postura pessoal ou familiar (oito famílias controlam a comunicação no país!) não respinga na tão propalada liberdade de imprensa? Não é raro a informação sair dos trilhos da isenção quando se faz oposição sistemática. No segundo mandato de Getulio Vargas, a imprensa teve tanta liberdade para lhe

É o dono do negócio que dá o tom e, se você duvida, sugiro folhear alguns jornais do interior baixar o cacete que ele jogou a toalha e foi se refugiar na História. Você conhece alguém que tenha apanhado mais da liberdade de imprensa nos últimos 30 anos do que o Lula? Brizola, talvez, enquanto esteve por aqui. Os grandes jornais dirão sempre que seu compromisso é com a verdade, que não escamoteiam informações, que noti-

Sydronio

ciam tudo doa a quem doer e coisa e tal... Acredito piamente que alguns jornais e revistas fazem o chamado esforço hercúleo para não parecerem tendenciosos. Ocorre que a imparcialidade não existe na imprensa – seja qual for – e, mesmo que o noticiário se restrinja à frieza dos fatos, suas preferências (e interesses) transparecem na diagramação, fotos e títulos espalhados pelo corpo da publicação. Por exemplo: as “boas” notícias estarão sempre nas páginas ímpares (de frente para o leitor); as notícias não tão boas ficam nas pares e as “péssimas” acabam jogadas nos cantos inferiores das páginas. Claro que tal disposição depende do peso da notícia. Uma “péssima” mas importante notícia terá que ganhar destaque, mas os jornais podem compensar escolhendo a pior foto do personagem para ilustrar a matéria. Não tem jeito. É o dono do negócio que dá o tom e, se você duvida, sugiro folhear alguns jornais do interior, para os quais o preço da liberdade é um anúncio da prefeitura. A

imprensa remove montanhas e não por outra razão foi chamada de Quarto Poder. Que o digam José Sarney e o falecido ACM – para citar dois exemplos – que fundaram, cada um a seu tempo, um império midiático para, com certeza, ampliarem a liberdade da imprensa nas suas

respectivas paróquias. Quando estive em Salvador, em 1978, e soube do lançamento do Correio da Bahia, corri a uma banca atrás de conhecê-lo. Acredite: nas sete primeiras páginas do jornal havia sete fotos de ACM! Quer mais liberdade de imprensa do que isso?


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 1º de dezembro de 2010

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Clique aqui para ler as últimas notícias de ciência e saúde Arte Sydronio

PESQUISA

Nova causa para a

dor de cabeça Enxaqueca pode ser provocada por problemas nos músculos responsáveis pela mastigação

P

essoas com enxaqueca contam com mais uma explicação para as dores crônicas. Um estudo realizado pela Faculdade de Medicina da USP revelou que as Disfunções Temporomanbiludares (DTM), desordem que envolve os músculos mastigatórios, como o bruxismo, podem provocar ou agravar as dores. O surgimento dos sintomas da DTM acontece quando as articulações e músculos temporomandibulares ficam sobrecarregados. Essa sobrecarga provoca distúrbios como o bruxismo do sono, quando a pessoa tem o hábito involuntário de ranger ou apertar os dentes en-

quanto dorme, o que dificulta identificar o problema. Segundo uma pesquisa publicada na Revista Brasileira de Medicina, cerca de 80% dos pacientes com DTM que procuram por tratamento apresentam alguma parafunção oral, como o bruxismo. Hereditariedade, fumo, excesso de consumo de café, estresse e perturbações do sono são alguns dos fatores que aumentam o risco de desenvolvimento dos distúrbios. Na maioria dos casos, os sintomas da DTM somem sem a necessidade de intervenção – estima-se que apenas cerca de 5% a 10% dos

casos necessitem de auxílio especializado. A administradora de empresas Luciana Pitta identificou que tinha DTM depois que sentiu fortes dores de cabeça durante muito tempo. – Eu senti uma pressão muito forte no ouvido e procurei um

otorrino. Só lá, descobri que tinha que tratar com um dentista – conta. – Fui ao dentista e ele detectou a DTM. Por causa do estresse, eu dormia com os dentes trincados, o que me causava a dor de cabeça. Nunca pensei que pudesse ser a DTM que causava as dores.

Hoje, Luciana usa uma placa de acrílico na arcada dentária para evitar que pressione os dentes e toma relaxantes musculares em vez de analgésicos para controlar as dores de cabeça. Os resultados do estudo feito pela USP mostram que é importante avaliar a DTM nesses pacientes que apresentam fortes dores de cabeça. – Dores ao deitar no travesseiro ou amarrar o cabelo podem ser consideradas um marcador da cronificação da dor de cabeça – sugere Thaís Cristina Chaves, autora do estudo. – Ao mesmo tempo, apresentar DTM pode alterar a sensibilidade dolorosa e predispor a mais dores em pacientes com enxaqueca. Para a professora Débora Bevilaqua Grossi, do departamento de fisioterapia da USP, uma das saídas é o tratamento com a fisioterapia: – Ele pode diminuir a sensibilização desses pacientes e favorecer a redução da intensidade e frequência das crises de dor de cabeça. Com Agência USP


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 1º de dezembro de 2010

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REPRESENTAÇÃO

Apenas um estado atingiu cota de 30% de mulheres eleitas Estudo mostra que na Câmara, percentual foi de 8,8%. No Senado, índice foi o mesmo de 2002, com 14,8% Luiz Orlando Carneiro BRASÍLIA

E

mbora a mulher tenha conquistado, pela primeira vez, a Presidência da República no Brasil – que já tem um eleitorado feminino 4% maior do que o masculino e uma reserva obrigatória de 30% das vagas de candidaturas para as mulheres – não foi ainda nestas eleições que o sexo feminino conseguiu uma representação bastante significativa nas casas do Congresso e nos governos estaduais. Dos 3.927 concorrentes à Câmara dos Deputados, apenas 929 (19,1%) eram mulheres, das quais 45 foram eleitas (8,8%). Na renovação do Senado (2/3 das cadeiras), o número de senadoras ficou igual ao de 2002, quando

também se elegeram oito mulheres (14,8% do plenário). Estes números constam do trabalho intitulado “Radiografia dos Resultados das Eleições de 2010”, elaborado pelo analista judiciário do Tribunal Superior Eleitoral Jorge Marley de Andrade, em vias de ser publicado. Ele explica que a previsão legal da cota de 30% para as candidaturas femininas não foi ainda integralmente cumprida por que a interpretação do texto da chamada minirreforma eleitoral (Lei 12.034/10) só ocorreu em agosto último, às vésperas do pleito, quando o TSE decidiu que os partidos e coligações eram obrigados a “preencher”, e não apenas “reservar” o percentual previsto.

Apesar da legislação e interpretação “tardias”, a participação feminina no pleito para a Câmara dos Deputados “aumentou muito”, com relação às eleições anteriores, ainda de acordo com o analista. Se, neste ano, foi de 19,1% o percentual de mulheres que concorreram à Câmara Federal, em 2006 foi de 12,7% e, em 2002, de 11,4%. Mato Grosso do Sul foi o único estado em que se atingiu esse percentual (32,8%). Os estados que mais se aproximaram da cota legal foram o Amapá (27,4%) e Mato Grosso (27,3%).

Pela primeira vez

Jorge Marley destaca que se Dilma Rousseff foi a primeira mulher a chegar à chefia do Poder Executivo, alguns estados – com grande representação política no Congresso – elegeram também, pela primeira vez, representantes do sexo feminino para o Senado Federal: São Paulo (Marta Suplicy, PT), Rio Grande do Sul (Ana Amélia Lemos, PP), Paraná (Gleise Hoffmann, PT) e Bahia (Lídice da Mata, PSB). As primeiras mulheres a serem eleitas para o Senado, na história do país, foram Marluce Pinto (Rorai-

ma) e Junia Marise (Minas Gerais), em 1990. Com relação aos governos estaduais, o analista do TSE ressalta que Roseana Sarney (PMDB-MA) é a mulher mais bem sucedida, tendo sido reeleita governadora em 1998 e no último pleito. E ainda que, no Rio Grande do Norte, as mulheres “continuam no comando da política, o que não é, historicamente, característico do Nordeste”. Depois de dois mandatos de Vilma Faria (2002 e 2006), Rosalba Ciarlini (DEM) foi escolhida para sucedê-la.


Jornal do Brasil | Terça-feira, 2 de novembro de 2010

Encanto da eleição de 2008 se transformou em decepção e desespero para alguns Mik Moore, 36, do grupo Great Schlep, afirma que o clima entre os ex-ativistas pró-Obama era de decepção e desespero. – Decepção por mais coisas não terem acontecido, e desespero porque, mesmo tendo você uma grande maioria no Congresso, há milhares de coisas que você não pode fazer, e as coisas que pode são aquelas que você não quer – explica . Lynda Tran, porta-voz da Organizing for America, também á da opinião que Obama “estava ocupado, francamente, tentando nos desenterrar e garantir que não voássemos para outra Grande Depressão”. Na sexta-feira, o grupo organizou uma viagem a um distrito badalado da Pensilvânia. Oitenta pessoas disseram que iriam, 68 apareceram. – As pessoas estavam encantadas em 2008 – pondera Maddy Joseph, 20, membro do grupo. – A realidade apareceu e isso é frustrante para muitas pessoas. Tradução: Maíra Mello

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Arte Sydronio


Jornal do Brasil | Quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

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TEMAS SOCIAIS

A temporada de caos aéreo Arthur Rollo ADVOGADO

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esde o início de 2007 os consumidores brasileiros vêm enfrentando problemas mais sérios com as empresas aéreas. O chamado caos aéreo teve seu auge após a queda do segundo avião da TAM, em fevereiro daquele ano. De lá para cá muito foi dito e pouco foi feito em matéria de infraestrutura aeroportuária. Cogitava-se construir um novo aeroporto em São Paulo, bem como ampliar o Aeroporto de Guarulhos mas, passada a agitação decorrente do acidente, a questão caiu no esquecimento. Hoje nada de concreto existe para ampliar os aeroportos. Recentemente, a Infraero afirmou que instalaria plataformas de embarque provisórias para resolver o problema emergencial do grande fluxo de passageiros, mas também essa medida não passou de falatório. O presidente Lula, demonstrando sua visão otimista, atri-

bui os problemas aéreos a maior demanda de consumidores, em virtude da melhora do quadro econômico. No entanto, praticamente nenhum investimento foi feito durante o seu governo para melhorar a capacidade dos aeroportos. Reconhecendo o aumento das demandas de consumidores contra as empresas aéreas, o Judiciário, mais uma vez, promoveu a instalação de juizados especiais nos aeroportos, em julho de 2010. Cerca de dez dias após a sua inauguração a Anac fechou inúmeros postos nos aeroportos, supostamente porque não havia demanda de passageiros. Ainda que o caos aéreo tenha momentos de pico em feriados e nos fins de ano, pode-se dizer que não há mais uma temporada de caos. Ele é permanente. Quem chega do exterior ao Aeroporto de Guarulhos se depara com longas filas na Polícia Federal, não encontra carrinhos para colocar sua bagagem, nem tampouco espaço nas esteiras para reti-

rá-la. É inconcebível que um aeroporto que recebe tantos voos disponha apenas de duas ou três esteiras. Há tempos que os embarques ocorrem, tanto em Guarulhos como em Congonhas, por meio de ônibus. Isso,

O ato de usar ônibus para embarque e desembarque nos aeroportos traz enorme desconforto além de provocar atrasos, traz enorme desconforto aos passageiros. Aeroportos como o de Cuiabá, que será sede da Copa do

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Mundo, além de não contarem com plataformas de embarque, não dispõem sequer de esteiras para a retirada de bagagem. O Aeroporto de Brasília, que concentra grande parte dos voos do país, está sucateado. O sistema aéreo vem há tempos operando no limite da sua capacidade. Basta acontecer um atraso na partida ou na escala para provocar um efeito cascata, provocando atrasos sucessivos ainda maiores. Imprevistos acontecem, especialmente problemas climáticos. Entretanto, se o sistema opera na sua capacidade máxima, não há como enfren-

tá-los sem longos atrasos e inúmeros cancelamentos de voo. A Anac baixou em junho de 2010 a Resolução n° 141, ampliando os direitos dos passageiros e proibindo a prática do overbooking, que já era proibida segundo a legislação de consumo. O cumprimento das leis e das normas da Anac seria bem mais fácil se a infraestrutura aeroportuária fosse adequada. Basta fazer uma viagem ao exterior para perceber que estamos na idade da pedra em matéria de aeroportos. Enquanto esse quadro não mudar, os consumidores continuarão sofrendo, cada vez mais, com atrasos aéreos, cancelamentos de voos e extravios de bagagens, e o Judiciário terá uma infinidade de processos para resolver sobre esses temas. O consumidor deve ter paciência e, quando os problemas ocorrerem, buscar documentar seus direitos para poder propor ação judicial de ressarcimento. Advogado em São Paulo, mestre e doutorando pela PUC-SP


Jornal do Brasil | Quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

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POLÍTICA

A retomada dos presídios José Dirceu EX-MINISTRO CHEFE DA CASA CIVIL

O

país inteiro tem assistido ao desenrolar de uma operação de combate à violência de grandes proporções na cidade do Rio de Janeiro, deflagrada no complexo do Alemão. Em ações articuladas pelos governos federal e estadual, a estrutura de tráfico e medo tem sido desmontada, permitindo à população residente distanciar-se do crime organizado. Abriu-se, enfim, espaço à chegada do poder público, algo necessário há décadas. No entanto, a guerra não foi vencida. É preciso lembrar que o processo de consolidação do crime organizado nos morros tem como marca maior os muitos anos de ausência do Estado no cotidiano das favelas. Superar esse grave e profundo problema requer a continuidade de políticas de segurança, administrativas e sociais. Nessa construção de um no-

vo cenário, o Estado não pode recuar, sob pena de a criminalidade retornar aos morros, repetindo um velho filme. O trabalho de expulsão dos traficantes, sempre sucedido pela instalação de UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), está em seu início, e já nos permite perceber que há um outro flanco crucial: as penitenciárias. Tornou-se imprescindível redefinir os moldes da política prisional no país. Sem essa reestruturação, não have-

A situação é de extrema preocupação. É nos presídios que continuam as práticas criminosas rá avanços duradouros, e todos os demais conjuntos de esforços tenderão a naufragar. A situação atual é de extrema preocupação, porque os locais em que deveria haver punição são sinônimos de continuidade das práticas criminosas. Afinal, é dos presídios que partem as ordens para muitos crimes. Isso se dá

no Rio e em outras várias capitais brasileiras. É preciso mudar essa realidade, é preciso retomar os presídios! Uma política de segurança pública eficaz deve desmantelar as organizações criminosas nas grandes penitenciárias, inclusive as de alta periculosidade. A política prisional deve ser mais restritiva, sem dúvida, mas igualmente atacar a corrupção. Preso com telefone celular é inconcebível, e os aparelhos entram por apoio de familiares e amigos ou por conivência do aparato estatal. Adicionalmente, é preciso estimular projetos educacionais e de trabalho aos detentos de menor risco, para que as prisões cumpram seu objetivo de ressocializar. Urgem as mudanças nas polícias civis e militares. Equipar, valorizar, aperfeiçoar e ampliar a coordenação e união das diversas forças são ações primordiais. É importante a presença da Polícia Federal, da Rodoviária Federal e da Força Nacional de Se-

Sydronio

gurança no Rio, em ações subsidiadas pela presença das Forças Armadas na retaguarda — e nas fronteiras. Finalmente, o combate ao crime dará resultado sempre que acompanhado por medidas sociais, como as de crescimento do emprego e renda, acesso ao mercado de trabalho, educação, lazer e esporte, saneamento, habitação digna e melhores transportes públicos. Não por acaso esses são os alvos dos PACs 1 e 2. Na campanha eleitoral, o candidato de oposição José Serra dizia que o governo fe-

deral não tinha compromisso com o combate ao crime e ao narcotráfico. A realidade do Rio prova o contrário e escancara a ausência de uma política de segurança em São Paulo — a Baixada Santista, cada vez mais controlada pelo PCC e pelo narcotráfico, é um triste exemplo. Sabemos que não há caminho fácil depois de tantos anos de descaso das gestões anteriores. O Rio de Janeiro, contudo, tem boas chances de se transformar numa referência positiva de combate à criminalidade para todo o país.


Jornal do Brasil | Quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

ONU diz que legalização não resolve a violência No Brasil, a política anti-drogas ainda lembra muito o estilo americano. Tanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quanto a recém-eleita Dilma Rousseff já se posicionaram contra a legalização da maconha e de outros entorpecentes. A própria Organização das Nações Unidas (ONU) mantém uma postura firmemente contrária à legalização. – A Cannabis é uma planta ilícita – aponta o representante do Escritório das Nações Unidas para Crimes e Drogas (Unocd), Bo Mathiasen. – Nenhum país tem proposto legalizar esta planta. Será que você acaba com a violência e com o crime organizado legalizando a maconha? A resposta é não. Quem defende a liberação das drogas, especialmente da maconha, geralmente se apoia no exemplo da Lei Seca norte-americana. Em vigor de 1919

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de dólares foi o lucro da máfia bilhões nos EUA com a Lei Seca

a 1933, ela foi o eixo motor do crime organizado nos Estados Unidos naquela época. Estima-se que mafiosos como Al Capone, principal líder do crime organizado na ocasião, lucraram cerca de US$ 2 bilhões com a Lei Seca. A proibição custou US$ 12 milhões ao governo americano só em reforço policial, isso sem contar a queda na arrecadação. – Legalização não quer dizer deixar de ter controle – lembra o sociólogo Ignácio Cano, pesquisador do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). – O ideal é tratar as drogas como uma doença. É o mesmo que fazem com o tabaco e o álcool. Eles são legalizados, mas há controle do governo quanto a campanhas publicitárias e conscientização . O estado também arrecadaria impostos com a legalização, e as facções

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de reais. É quanto a União destinou milhões ao Rio na luta contra o crime

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O estado arrecadaria com a legalização das drogas, e as organizações criminosas seriam muito prejudicadas Ignácio Cano,

sociólogo da Uerj

criminosas seriam afetadas, já que boa parte da renda delas vem das drogas. Militarismo

Diretor da filial brasileira da ONG NORML, o empresário Ranieri Guimarães acredita que a guerra contra o tráfico que o Rio de Janeiro vive é fruto de um misto de militarismo e intolerância. A NORML é uma organização internacional que há mais de 70 anos luta pela legalização da maconha. – As políticas brasileiras seguem um viés americano de militarismo que se baseia na intolerância em relação ao tráfico e aos usuários – argumenta Ranieri. – Não adianta o estado entrar na favela e matar todos os traficantes, se os jovens daquela região continuarem vivendo na pobreza. Hoje, o que mantém a maconha na ilegalidade é a pura falta de informação da sociedade. Continua na página seguinte.


Jornal do Brasil | Quinta-feira, 4 de novembro de 2010

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TRANSPORTES

As faixas exclusivas para ônibus Marcus Quintella ENGENHEIRO

A

prefeitura da cidade do Rio de Janeiro divulgou que implantará, em janeiro de 2011, durante as férias escolares, faixas exclusivas para ônibus, com monitorização eletrônica, nas avenidas Nossa Senhora de Copacabana, em Copacabana, Zona Sul, e Cesário de Melo e Santa Cruz, em Campo Grande, Zona Oeste. O modelo é semelhante ao corredor viário da Alameda São Boaventura, em Niterói, que, segundo a autoridade local de trânsito, tem sido um sucesso na reorganização do sistema viário niteroiense. No caso das faixas exclusivas cariocas, o objetivo da prefeitura é reduzir o excessivo número de coletivos que trafegam diariamente nessas vias e, assim, aumentar a velocidade dos veículos, diminuindo os congestionamentos que tanto atormentam os moradores desses bairros.

A Avenida Nossa Senhora de Copacabana está saturada, há anos, com excesso de ônibus trafegando em fila dupla e, às vezes, tripla, geralmente vazios, cometendo infrações e sem coibição do poder público, além dos caminhões de carga, táxis e vans, que tumultuam o lado esquerdo da via e provocam mais transtornos para a população do bairro. Os automóveis de passeio trafegam nas quatro pistas, indiscriminadamente, numa disputa constante com os ônibus. No lado esquerdo da via, em trechos críticos, as placas de trânsito que proíbem os veículos de parar e estacionar, aquelas com um X sobre o E, são solenemente ignoradas pelos táxis, automóveis particulares e caminhões de entrega, uma vez que não há repressão alguma, por parte das autoridades de trânsito. Ainda no lado esquerdo da Avenida Nossa Senhora de Copacabana, o estacionamento é permitido, após as 19 horas, no dias de semana, e liberado nos domingos e feriados.

Cabe lembrar que, há muitos anos, talvez na década de 80, não me lembro bem, a Avenida Nossa Senhora de Copacabana já teve esse tipo de faixa exclusiva, que durou pouquíssimo tempo, pois não havia monitorização, nem fiscalização, e logo caiu em descrédito, e o modelo foi abandonado. O problema é complexo, e não será fácil para a prefeitura a implantação desse modelo, vez que haverá alteração no modo de vida das pessoas, que, infelizmente, es-

Sydronio

tão adaptadas já ao caos e à falta de disciplina que vigora nas vias públicas. Segundo estudos técnicos, passam pela Avenida Nossa Senhora de Copacabana cerca de 870 ônibus, de 46 itinerários diferentes, mas com muitas superposições de linhas. A velocidade média nessa via não passa de 15 km/h, quando o ideal seria em torno de 40 km/h. A prefeitura divulgou recentemente que reduzirá cerca de 120 ônibus por hora, tanto na Avenida Nossa Senho-

ra de Copacabana como na Rua Barata Ribeiro. Lógico que essa redução do número de ônibus é necessária, mas, ao mesmo tempo, não poderá haver redução de oferta de transporte na região, senão os táxis e vans ocuparão o espaço deixado pelos ônibus, e o excesso de veículos e os congestionamentos continuarão. Na prática, a prefeitura tem que olhar para o problema de forma sistêmica e atuar, em parceria com o Estado, junto ao metrô, para que haja menor intervalo entre as composições e, consequentemente, maior oferta de transporte subterrâneo. Para ajudar o modelo das faixas exclusivas, o intervalo entre trens do metrô terá de passar para dois minutos e meio, no máximo, contra os quatro minutos atuais. Além disso, a prefeitura precisa investir em estacionamentos subterrâneos, semaforização inteligente, campanhas educativas permanentes e repressão séria e competente, 24 horas por dia.


Jornal do Brasil | Quinta-feira, 4 de novembro de 2010

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Liquidação on line vira

fenômeno

Com descontos que passam dos 90%, sites de compra coletiva já superam marcas conhecidas do mercado Divulgação

Jorge Lourenço

Talvez você nem saiba, mas ontem poderia conseguir 51% de desconto num restaurante japonês na Barra da Tijuca (Zona Oeste do Rio) ou inscrever-se em aulas de dança de salão com mensalidades 85% mais baratas. São ofertas como essas que fizeram as compras coletivas saírem do zero para se tornarem uma das principais vertentes do comércio virtual. O sistema é resultado de uma equação simples. Consumido-

res em busca de descontos encontram empresas dispostas a baixar seus preços por um curto período a fim de fidelizar seus clientes. Quem media o contato são os sites de compra coletiva, que vendem promoções relâmpago atrás de marketing instantâneo. Foi assim que nasceram monstros como o Peixe Urbano. Principal site deste gênero no país, ele já superou o alcance de marcas famosas do comércio virtual, como a Saraiva e o Ponto Frio (veja gráfico ao lado). O Ibo- VARIEDADE – Compras coletivas incluem até aulas de dança

pe estima que as compras coletivas atraíram 4,5 milhões de usuários só em setembro. – Uma oferta num site de compras coletivas faz com que a marca fique exposta para milhares, talvez milhões de pessoas – explica Willian Rocha, sócio do Mel na Boca, recém-criado site de compras coletivas. – Você pode não ter dinheiro para fazer um outdoor, mas tem estoque para uma promoção relâmpago dessas e consegue sucesso. Continua na página seguinte.


Jornal do Brasil | Sábado, 4 de dezembro de 2010

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EDUCAÇÃO

O real problema do Brasil Jupira Lucas Zucchetti CONTABILISTA

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meados da década de 90, quando a inmternet começou a se propagar pelo país, com ela também veio a chamada globalização, que nada mais foi do que uma integração maior entre os países. Falou-se muito nessa época que, com o avanço da tecnologia provocada pela internet e a globalização, se tirariam muito empregos. E o que se observou de lá para cá foi exatamente isso, uma mecanização maior das empresas, porém, com a abertura de novas profissões. Quem por exemplo pensaria, 20 anos atrás, que existiria hoje a profissão de web design? E tantas outras profissões ligadas a tecnologia? Porém, o que podemos observar também é que se continua falando muito em desemprego, como tempos atrás. Porque nos dias de hoje é muito mais fácil conseguir-se trabalho do que antes, mesmo porque a internet trouxe esse grande facilitador. Não só por conta da internet mas das áreas ligadas a

ela, como da informática, em que o leque de opções se abriu enormemente. Então, como ainda se explica tanto desemprego? Tantas pessoas reclamando... Será que o mercado não consegue absorver tanta gente assim? Não, o que falta realmente, tanto há 20 anos como ainda hoje, é a qualificação no mercado de trabalho. “Ah, mas os cursos técnicos e a faculdade é uma coisa cara ainda, poucos têm

O que vemos muitas vezes são pessoas que apenas assinam seu nome e já são consideradas alfabetizadas acesso a um ensino de qualidade”. Muitas vezes escutamos esses argumentos de quem procura emprego ou ainda está se preparando para tal. Então, voltemos ainda lá atrás, falando exatamente da internet, porque hoje em dia, para se conseguir informações ou mesmo se aprender algo novo, consegue-se muita coisa através da internet, informa-

ções que enriquecem. Porque, em termos de qualificação profissional, o que vemos no nosso país muitas vezes são pessoas que apenas assinam o próprio nome e já são consideradas alfabetizadas. O que dizer então se for exigida alguma outra qualificação, se nem se comunicar através da escrita conseguem fazer direito? E não podemos esquecer que é apenas o básico saber expressar-se direito pela escrita para se conseguir um emprego, como secretária, por exemplo, anotando recados. Então, tudo está atrelado, não se pode ficar esperando que apenas o governo abra vagas em cursos técnicos ou profissionalizantes, que sejam gratuitos, ou mesmo se aumente o número de quotas raciais nas faculdades para os grupos menos favorecidos, mas também está na vontade da própria pessoa em se desenvolver, como ser humano, sua cultura, seus talentos. Em passar a ler, informar-se, não apenas como obrigação de currículo de escola ou algo parecido mas pelo

Arte Sydronio

simples fato de se enriquecer culturalmente. Porque tendo essa mentalidade de enriquecimento cultural, ela cresce, a empresa em que trabalha cresce, e a própria economia do país acompanha esse crescimento, ou seja, todos ganham. Porque muitas vezes também vemos estudantes universitários que sequer têm as mínimas condições de redigir um texto. Imagine então depois que forem para o mercado de trabalho! São fatos como esses sobre os quais a sociedade tem de parar um pouco para repensar. Principalmente o pessoal

mais jovem que está entrando no mercado de trabalho. Talvez seja caso de nas universidades deixar um pouco de lado algumas culturas inúteis – saber quem casou com quem – e passar a se atentar em fatos mais importantes que vão mexer com o seu futuro profissional. Porque também não adianta ficar reclamando que esse ou aquele governo não presta. Porque para analisar, precisa-se de um mínimo de cultura para entender. E todos precisam se desenvolver nesse sentido, justamente para que todos falem a mesma linguagem.


Jornal do Brasil | Terça-feira, 5 de outubro de 2010

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Novo Senado é mais favorável a Dilma Enquanto PT e PMDB conseguiram aumentar suas bancadas, PSDB e DEM perderam cadeiras José Cruz/ABr

Luiz Orlando Carneiro BRASÍLIA

Das 81 cadeiras do Senado, 54 estavam em disputa no domingo. Tentavam renovar seus mandatos por mais oito anos nada menos que 27 senadores. Nove deles foram derrotados, entre os quais parlamentares oposicionistas de grande expressão na vida política, como Marco Maciel (DEM-PE), Tasso Jeiressati (PSDB-CE), Arthur Virgílio (PSDB-AM) e Heráclito Fortes (DEM-PI). Os dois maiores partidos da situação, o PT e o PMDB, aumentaram suas bancadas de oito para 14 e de 17 para 20 senadores, respectivamente. As duas principais siglas da oposição tiveram reduzidas suas representações: o PSDB tinha 16 cadeiras, e passou a ter 11; o DEM ficou apenas com seis dos seus 13 senadores. Com a nova composição, estima-se que, se Dilma Rousseff for eleita, no segundo turno, o seu governo contará com maioria mais consistente na chamada Câmara revisora do que a que apoiou o presidente Lula, e poderá evitar surpresas como a votação em que foi derrubada a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), o “imposto do cheque”, em 2007. Naquela ocasião, faltaram quatro votos para atingir os 49 necessários para a aprovação de emendas constitucionais. Popularidade de Lula

O senador José Agripino (DEM-RN) – que conseguiu se reeleger em segundo lugar no seu estado (32,23% dos votos válidos),

AGRIPINO – Reeleito pelo DEM, senador descarta que influência de Lula tenha interferido no pleito em 2010

Marco Maciel, Arthur Virgílio e Heráclito Fortes não foram derrotados por Lula. Tiveram insucesso por questões regionais José Agripino senador pelo DEM-RN

secundando o candidato do PMDB, Garibaldi Alves (35,03%) – recusa-se a atribuir a derrota oposicionista nas eleições para o Senado à popularidade do presidente Lula e da candidata à sua sucessão.

– Marco Maciel, Arthur Virgílio e Heráclito Fortes não foram derrotados por Lula – diz ele ao JB. – Em cada estado há uma razão especial, mas todos tiveram insucesso devido a questões regionais. Virgílio e Tasso Jeiressati não tiveram palanques de governador, que é quem ajuda a puxar os votos para o Senado. Tasso foi vítima do sucesso de Cid Gomes (PSB, eleito governador com 61,27% dos votos), e Marco Maciel sucumbiu ao fenômeno Eduardo Campos (eleito governador, com 82,84% dos votos).

O PSDB pode, no entanto, comemorar as duas maiores votações para o Senado. O ex-governador Aécio Neves foi eleito com 7,5 milhões de votos (39,47%), secundado por outro representante da oposição, o ex-presidente Itamar Franco (PPS), que obteve 26,74% da preferência do eleitorado. O candidato do PT Fernando Pimentel (23,98%) ficou sem mandato. Em São Paulo, Aloysio Nunes recebeu 11 milhões de votos (30,42%) e foi eleito à frente da candidata do PT Marta Suplicy (22,61%).


Jornal do Brasil | Domingo, 5 de dezembro de 2010

Mauro Santayana

Mauro Santayana maurosantayana@jb.com.br

Ar te/Sydronio

NATAIS

O camelo de Baltazar

N

a manhã do dia 24 todas arrumavam a casa. O piso, de bom ladrilho antigo, brilhava, depois de lavado e polido. As janelas se vestiam de cortinas brancas, de morim, bordadas com anjos e flores. De longe vinham ramalhetes de margaridas e crisântemos. Era uma casa como todas as outras, só que um pouco afastada da cidade. Ao meio-dia, só ao meio-dia, retirava-se a toalha bordada que escondia o presépio, armado dias antes. A montanha, com seus precipícios estreitos e cimos agudos, era de papel espesso, coberto de grude, areia, pó de carvão e mica. Lena se desculpava, a fim de ficar, solitária, em seu quarto, bem uma hora, ou mais. “Ah gente, vou ficar lá dentro um pouco. Todo Natal é sempre assim. Eu fico esquisita, não sei, parece que sou menina de novo. Dá vontade de chorar”.

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Enquanto as outras conversavam na varanda, Lena se lembrava do outro presépio. O Menino e o berço, a Madona triste, São José de cabeça baixa. O quarto não era mais o quarto, purificado pelo incenso que queimava sobre brasas em todos os cantos da casa, mas a morada paterna. Ao longe se viam os poucos cafezais do morro, encarquilhados, decadentes. Ajudava a mãe e as tias a arrumar o presépio. O espelhinho redondo se convertia no lago, com o cisne muito grande, quase do tamanho do carneiro que pastava musgos. Os reis ficavam por sua conta. Vinham de longe, do Oriente. O Oriente era a despensa escura, e os viajantes cruzavam com ratos nas primeiras jornadas. Depois prosseguiam, conduzidos por seus dedos e chamados pela estrela. A estrela cortava o céu-de-faz-de-conta, pendente

da linha colada à parede. O irmão trazia do matinho besouros grandes, verdes e dourados. Arrancava as asas finas do meio, só deixava as grossas – e eles não conseguiam voar. Assim podiam caminhar por Belém, vivos e aleijados, ao lado dos bichos imóveis. Faltava uma pata ao camelo de Baltazar. Mas um camelo pode caminhar com três patas, quando o rei é mago, e o caminho é o de Belém. Passada a meia hora de saudades e solidão, ela se juntava às outras, na sala. Durante a tarde vinham os mais amigos daquela casa de mulheres. Chegavam por pou-

co tempo (“vocês sabem, hoje é dia de ficar com a família”), desejavam boas-festas e deixavam qualquer coisa: cinzeiros, jarrinhos, garrafas de licor. Respeitosos, despediam-se com desajeitadas e breves carícias nos ombros das moças. “Agora, só no ano que vem”. À noite ficavam sós. Servia-se a ceia nas mesinhas em que, nas outras noites, os homens esperavam, tomando cerveja. As moças contavam casos, ficavam mais ou menos tontinhas, mais ou menos inocentes. Debaixo da mesa do presépio amontoavam-se os presentes. À meia-noite Lena ia ao quarto, voltava com as mãos escondidas atrás das costas. Apagava-se a luz, todos diziam “aleluia”, as lâmpadas iluminavam, de repente, o Menino surgia em seu berço. Abriam-se os embrulhos. “Que

lindo, Deus te pague!” – abraçavam-se e se beijavam. O rapaz, amigo de todas, chegava nessa hora. Trazia sempre a garrafa de champanhe, nacional e ordinária, mas o que valia era a intenção. A dona da casa se despedia, por causa da vesícula, ia dormir, e a rolha saltava com estouro. Então todas o abraçavam, todas o beijavam, porque o rapaz era o irmão, o pai, o namorado perdido. Ele se sentava no meio delas e as acariciava como queriam ser acariciadas naquela noite. Eram meninas de novo, precisavam de morno acalanto para dormir. E quando chegava a antemanhã, o rapaz levava-as, cada uma delas, a seus respectivos quartos, beijava-lhes o rosto entre os olhos, cantava-lhes, baixinho, as estrofes de uma “berceuse” de sua meninice, e dormia, até tarde, muito feliz, na esteira armada e forrada no chão da sala, ao lado do presépio, quando elas o despertavam, rindo e felizes: “Vamos, acorda, preguiçoso. Está na hora de amar”.


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 6 de outubro de 2010

MEDICINA

drogas que agem na sinalização de glutamato podem prevenir sintomas psicóticos, isso significaria uma verdadeira mudança na forma como as pessoas portadoras de esquizofrenia são tratadas. O pesquisador adianta que o próximo passo será ver se os resultados obtidos serão confirmados em um grupo com amostragem maior de pessoas. – Já existe um bom número de drogas que interferem na sinalização de glutamato – ressalta Stone. – Então, espera-se que, em poucos anos, sejamos capazes de começar a testar novos tratamentos para pessoas com esquizofrenia.

remédio Novo

para a esquizofrenia

Estudo inglês pode levar a medicamentos que agem mais rapidamente, sem efeito colateral Uma nova pesquisa, feita em Londres, na Inglaterra, associou psicose a uma relação anormal entre duas substâncias químicas de sinalização no cérebro. Os resultados, publicados no jornal Biological Psychiatry, sugerem um novo enfoque para prevenir sintomas psicóticos, o que poderia gerar medicamentos melhores contra a esquizofrenia. A esquizofrenia é um dos mais comuns estados graves de saúde mental. Os pacientes apresentam sintomas de psicose – incapacidade de distinguir entre realidade e imaginação –, como alucinações e desilusões. O estado geralmente aparece no fim da adolescência (ou na casa dos 20 anos) e pode persistir pelo resto da vida da pessoa. Substâncias químicas cerebrais – chamadas neurotransmissores – carregam sinais de uma célula nervosa para outra. O estudo associou esquizofrenia a altos níveis, anormais, de um neurotransmissor chamado dopami-

na, em uma região do cérebro conhecida como estriato. Os medicamentos atualmente usados para tratar a esquizofrenia bloqueiam os efeitos da dopamina no cérebro. Mas estes remédios não são eficazes para todos os pacientes e podem apresentar sérios efeitos colaterais. A nova pesquisa-piloto, financiada pelo Conselho de Pesquisa Médica (MRC), juntou evidências de que altos níveis de dopamina em pessoas com sintomas psicóticos ocorrem como consequência de mudanças em outra substância química do cérebro, o glutamato. Células que liberam glutamato em uma região chamada hipocampo influenciam a atividade das células que liberam dopamina. Medicamentos que interferem nos sinais do glutamato no cérebro podem, portanto, prevenir sintomas psicóticos em pessoas com esquizofrenia. – A esquizofrenia é uma doença devastadora, que destrói a vida das pessoas afligidas e também

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Os remédios que existem hoje não atendem a todos e podem causar sérios efeitos colaterais

daquelas que vivem ao seu redor – observa James Stone, do Departamento de Medicina do Imperial College London, primeiro autor do estudo. – Neste momento, os medicamentos que temos simplesmente não são adequados. Além de não ajudarem a todos, não acabam com alguns dos sintomas mais debilitantes. Os pesquisadores fizeram exames nos cérebros de 16 pessoas com um estado mental em

risco para psicose e em 12 voluntários saudáveis, para medir os níveis de glutamato e de dopamina. Nas pessoas com indícios de sintomas psicóticos, houve uma correlação negativa entre níveis de glutamato no hipocampo e níveis de dopamina na área do estriato. Houve uma correlação particularmente acentuada naqueles que continuaram a desenvolver a psicose posteriormente. Os vo-

luntários saudáveis não apresentaram nenhum tipo de correlação. – Nos voluntários saudáveis, não houve relação clara entre glutamato e dopamina, mas nas pessoas com sinais de psicose percebemos esta relação anormal – constatou Stone. – Isso indica que o trajeto indicador entre o hipocampo e o estriato é disfuncional, e nós talvez sejamos capazes de tratar isso mirando no sistema de glutamato. Se

Chris Kennard, presidente do Conselho de Saúde e Neurociência do MRC, mostrou-se otimista com os resultados do estudo. – Estudos como esses ajudam a desvendar os complexos mecanismos de doenças psiquiátricas e a nos deixar próximos de drogas mais eficazes para pacientes com esquizofrenia – observa Kennard. – O MRC dá recursos para pesquisas com o intuito de levar descobertas científicas do laboratório para o paciente rapidamente. Se pudermos desenvolver drogas que previnam sintomas psicóticos, isso significará grande benefício para pacientes com esquizofrenia. Tradução: Maíra Mello e Victor Barros


Jornal do Brasil | Sábado, 6 de novembro de 2010

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Sem trégua na batalha entre sexos Guerra genética entre machos e fêmeas tem difícil solução, dizem pesquisadores Um estudo publicado por pesquisadores do Reino Unido e do Japão mostra que a guerra genética dos sexos talvez seja muito mais difícil de ser resolvida e tenha ainda mais importância para evolução do que se pensava anteriormente. A guerra, observada em muitas espécies e conhecida como seleção sexual, se define por um processo de escolha de características morfológicas e comportamentais que levam a um cruzamento mais bem sucedido. Um exemplo disso são as plumagens coloridas dos pássaros,

para atrair as fêmeas ao acasalamento. A princípio, os cientistas acreditavam que o impasse sobre a seleção sexual estivesse resolvido, já que a característica específica em questão beneficiava os machos mas não prejudicava as fêmeas, e vice-versa. Um novo estudo mostra, porém, que essa característica específica não significa, necessariamente, uma trégua na batalha entre os sexos. Os pesquisadores observa-

ram besouros com chifres. Os machos com mandíbulas grandes tinham vantagem na procriação, mas a herança dessa

veis razões para isso e descobrimos que, apesar de as fêmeas não desenvolverem as mandíbulas maiores, herdaram muitas das outras características genéticas do macho – conta o professor Takahisa Miyatake, da Faculdade de Ciência Ambiental da Universidade de Okayama, no Japão. – Uma delas é o tamanho reduzido do abdômen, o que pode afetar o número de ovos que ela pode carcaracterística provocou um regar, explicação possível para efeito contrário nas fêmeas a desvantagem. nascidas desse cruzamento. – Observamos todas as possí- Continua na página seguinte.


Jornal do Brasil | Sábado, 6 de novembro de 2010

Reproduções

A batalha genética entre os sexos também está presente no ser humano

xual. Significa que não se sabe mais como, quando e se é que algum dia esses conflitos serão totalmente resolvidos. Isso, por sua vez, significa que essa guerra poderia ser mais importante para o nosso processo A teoria da seleção sexual evolucionista do que se acreproposta por Darwin também ditava antes. é aplicada para o comportamento humano. Para o profes- Mito Para o pesquisador japonês sor Dave Hosken, do Centro de Ecologia & Conservação na Kensuke Okada, a visão de que Universidade de Exeter, Rei- o desenvolvimento de um trano Unido, esse tipo de batalha ço limitado por sexo resolva esgenética está presente tam- se tipo de guerra genética está bém no ser humano. No nosso baseada na concepção de que caso, por exemplo, quadris os traços são geneticamente masculinos têm nível ótimo independentes um do outro, o para atividade física, enquan- que, em geral, não é verdade: – O que estamos vendo aqui to os femininos precisam permitir a gestação de um bebê. é que a arquitetura genética – Esse é o tipo de conflito evo- pode fornecer uma barreira lucionista de que falamos – ob- geral para esse tipo de resoluserva. – O que estamos vendo ção de conflito. nesse estudo é que isso nem sempre é o fim do conflito se- Tradução: Victor Barros

Não se sabe mais como, quando e se algum dia esses conflitos serão resolvidos. Significa que essa guerra poderia ser mais importante para o processo evolucionista Dave Hosken Professor

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SELEÇÃO SEXUAL – Algumas espécies como pavão e besouro com chifre desenvolvem características que os colocam em vantagem para procriar


Jornal do Brasil | Sábado, 6 de novembro de 2010

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COISAS DA POLÍTICA VILLAS-BÔAS CORRÊA villas@jb.com.br

A tortura escancarada A ELEIÇÃO DE DILMA

Rousseff para presidente da República recolocou na pauta da imprensa o velho tema da tortura durante a ditadura militar dos cinco generais presidentes. Como é notório e sabido, a presidente eleita foi militante destacada no movimento de guerrilhas, sendo presa e torturada, antes de ser recolhida ao Presídio Tiradentes, em São Paulo. E, não por acaso, estou relendo os quatro volumes sobre a ditadura militar do grande jornalista e escritor Elio Gaspari, um amigo de muitas décadas. E no primeiro volume, A ditadura envergonhada, página 360 e seguintes, Gaspari conta a história escabrosa, no cenário da 1ª Companhia da PE, na tarde de 8 de outubro de 1969, quando oficiais do Exército brasileiro “escreveram uma triste página da história da corporação”.

Gaspari conta em detalhes: “Os presos eram dez. Entre eles, seis rapazes do Colina. Foram tirados das celas e escoltados em fila até um salão. No caminho ouviram uma piada de um cabo: “São esses aí os astros do show?”. A plateia, sentada em torno de mesas, chegava perto de cem pessoas. Eram oficiais e sargentos, tanto do Exército como da Marinha e Aeronáutica. Numa das extremidades do salão havia uma espécie de palco, e nele o “tenente Ailton” presidia a sessão com um microfone e um retroprojetor: “Agora vamos dar a vocês uma demonstração do que se faz clandestinamente no país”. O chefe da seção de informações da 1ª Companhia era o “tenente Ailton Joaquim”. Pulamos algumas linhas. Adiante: “Os presos foram enfileirados perto do palco e o “tenente Ailton” identificou-os para os

Villas-Bôas Corrêa escreve nesta coluna aos sábados.

Sydronio

convidados. Tinham três sargentos por acólitos. Com a ajuda de slides, mostrou desenhos de diversas modalidades de tortura. Em seguida os presos tiveram que ficar de cuecas. Maurício Vieira Prado, 24 anos, quintanista de engenharia, foi ligado a um magneto pelos dedos mínimos das mãos. Era a máquina dos choques elétricos. Depois de algumas descargas, o tenente ensinou que

deviam dosar as voltagens de acordo com a duração dos choques. Chegou a recitar algumas relações numéricas, lembrando que o objetivo do interrogador é obter informações e não matar o preso. Murilo Pinto da Silva, 22 anos, funcionário público, ficou de pés descalços sobre as bordas de duas latas abertas. Pedro Paulo Bretãs, 24 ano, terceiranista de medicina, foi submetido ao esmagamento dos dedos com barras de metal. Outro preso, um ex-soldado da Polícia Militar, apanhou de palmatória nas mãos e na planta dos pés. “A palmatória é um instrumento com o qual se pode bater num homem horas a fio, com toda a força”, explicou o tenente.

No pau de arara penduraram Zezinho, que estava na PE por conta de crimes militares. Ailton explicou – enquanto os soldados demonstravam – que essa modalidade de tortura ganhava eficácia quando associada a golpes de palmatória ou aplicações de choques elétricos, cuja intensidade aumenta se a pessoa está molhada. “Começa a fazer efeito quando o preso não consegue manter o pescoço firme e imóvel. Quando o pescoço dobra, é que preso está sofrendo”, ensinou o tenente-professor”. Gaspari conclui com uma frase que hoje soa como uma advertência: “O Exército brasileiro tinha aprendido a torturar”. E que ecoa não mais como advertência. Mas, como o contraste entre ditadura, fardada ou paisana, e a democracia que acaba de passar pela prova dos noves de uma eleição disputada, com debates ásperos, mas que termina sem mortos e feridos.


Jornal do Brasil | Quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Mais de R$ 16 mil por mês, casa, comida, roupa lavada...

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arte: Sydronio

Congresso aguarda a chegada de novos e velhos parlamentares eleitos Ana Paula Siqueira Paulo Marcio Vaz Poder, prestígio e fama. Esses são, inevitavelmente, grandes atrativos para quem quer entrar na vida pública. Principalmente, quando são levados em consideração os ganhos financeiros para quem consegue se eleger para uma vaga no Senado ou na Câmara dos Deputados. Apenas o salário – R$ 16.512 mensais tanto para deputados como para senadores –, já mostra porque os cargos eletivos são tão disputados no país. Nas duas Casas, ninguém fala em 14º e 15º salários. Para o pagamento de dois salários extras – em fevereiro e em dezembro, além do 13º salário – o Congresso preferiu o eufemismo “ajuda de custo”. No Senado, cada gabinete tem direito a nove servidores efetivos e mais 11 comissionados. O número pode aumentar se os salários forem divididos, permitindo maior contratação. Na Câmara, cada parlamentar tem direito a nomear entre cinco e 25 funcionários. Para isso, ele dispõe da chamada verba de gabinete. Os salários podem variar de R$ 540 a R$ 8.040. Para garantir que os parlamentares sejam bem acomodados na capital de República, inclusive os que foram eleitos no próprio Distrito Fe-

deral, existe o auxílio-moradia. Senadores tem direito a R$ 3.800 e deputados a R$ 3 mil para despesas com aluguel ou diárias de hotel. Eles também podem optar pelos apartamentos funcionais, onde não receberiam o auxílio, mas ficariam livres de despesas como água, luz e telefone. O número de apartamentos, no entanto, é insuficiente. Para completar, parte dos imóveis está sem condições de uso e vários outros em reforma.

Como “ajuda de custo”, tanto deputados quanto senadores recebem 14º e 15º salários Verba indenizatória

A grande vilã, no entanto, parece ser a verba indenizatória. No Senado, o teto de R$ 15 mil pode ser utilizado para pagar despesas com aluguel de carros, instalação e manutenção de escritórios políticos no estado do parlamentar. os comprovantes de despesa para ressarcimento podem ser entregues até março do ano seguinte aos gastos. Na Câmara, o valor varia entre R$ 23 mil até R$ 34 mil dependendo do estado do deputado. Entre outras despesas, na Câmara os parlamentares tem direito a serem res-

sarcidos pela utilização de passagens aéreas – tema que desencadeou grande crise no Congresso em 2009 após a descoberta de que até celebridades viajaram no Brasil e no exterior com recursos públicos. No Senado, a verba destinada às idas e vindas dos parlamentares aos seus estados varia de R$ 6 a R$ 23 mil, dependendo do local de origem. E corresponde a cinco trechos aéreos entre a capital do estado / Brasília. Assessores parlamentares continuam autorizados a viajar às custas do contribuinte, desde que autorizados pelos senadores e pela Mesa Diretora da Casa. Com relação às despesas com telefone, a cota mensal dos senadores para telefone fixo é de R$ 500. No caso do líder partidário, o valor é de R$ 1 mil. As despesas com o uso de telefone residencial podem ser ressarcidas com base nos mesmos valores. Para telefone celular não há limites Há poucos anos, quem passava pelo Congresso ainda tinha o privilégio de uma aposentadoria vitalícia como parlamentar. A regra, no entanto, foi modificada. Mas, só após muita pressão popular. Atualmente, deputados e senadores contribuem com um sistema de previdência e se aposentam pelo tempo de serviço.

Congressistas a favor de alguns gastos e contra outros Reduzir benefícios é um tema espinhoso no Congresso. Muitos preferem nem se manifestar, alegando não se tratar de assunto político. Mas, de uma forma ou de outra, parlamentares defendem que o mandato não tem como ser exercido, se não houver gastos. – É um salário excelente, não há dúvidas, e totalmente defensável.

O importante é ter transparência. A democracia é dispendiosa – defende o deputado reeleito Chico Alencar (PSOl-RJ). – É fundamental podermos alugar um escritório em nossa base eleitoral. E também termos o direito a um lugar para morar em Brasília. Só acho que os apartamentos funcionais não precisam ser tão grandes. Para o senador Alvaro Dias (PSDB-PR), a verba indenizatória “é uma complementação do salário que deveria ser considerada inconstitucional”. Ano passado, ele abriu mão da verba indeni-

zatória e do auxílio moradia. Defende, no entanto, despesas com passagens áreas. – Seria uma grande economia para o país se essas remunerações fossem eliminadas, e fosse pago um salário no qual coubessem todas as despesas – afirma Dias. Roberto Freire (PPS-PE), que volta à Câmara por São Paulo, concorda com o tucano: – Vou lutar para que a Casa unifique os gastos, mas não vou fazer só para dizer que fiz. Cuido muito para não fazer desses assuntos uma demagogia.


Jornal do Brasil | Domingo, 7 de novembro de 2010

Mauro Santayana RACISMOS

Mauro Santayana maurosantayana@jb.com.br

Ar te/Sydronio

As razões do medo

É

com amargura que somos obrigados a retomar o tema, mas o silêncio, nesse caso, é criminosa cumplicidade. Trata-se da estúpida e perigosa reação de jovens dos estados do Sul, sobretudo de São Paulo, contra os brasileiros do Nordeste, desta vez com relação aos resultados eleitorais. O racismo é abominável, ao não aceitar os seres humanos diferentes, mas é também incômodo ao revelar a profunda ignorância dos que o praticam. Todos os homens são iguais em sua essência, e a moderna biologia vai além: as diferenças entre os seres humanos e os demais mamíferos são insignificantes. A vida é a aventura comum da matéria. Não conhecemos suas razões e provavelmente jamais as conheceremos. Os grandes aceleradores de partícula podem identificar o bóson de Higgs, em que, confor-

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me a presunção de alguns físicos, Deus poderá ser encontrado. Mas, ainda que ali o encontrássemos, seria impossível com ele dialogar e conhecer as suas razões para criar o cosmo. Restará sempre a dúvida: por quê? Por que a vida, por que a morte, por que o ódio? Como seres humanos, tivemos que lutar pela sobrevivência contra outros seres vivos, das feras pré-históricas aos vírus e bactérias identificados em nosso tempo, e contra seus vetores, como os ratos e os insetos. Como seres humanos, não temos sabido conviver uns com os outros, como provam as guerras, e o racismo – suprema manifestação da ignorância – não é só um sentimento dos homens primitivos, que sobrevive entre nós. É a exposição mais transparente da debilidade, do medo. Esses jovens de São Paulo e de outras cidades meridionais, no fundo, não

desprezam os nordestinos. Temem, apenas, que eles os venham suplantar, o que já começa a ocorrer. O desempenho intelectual de moças e rapazes das universidades de Campina Grande, de Natal, de Recife – entre outras – está surpreen-

dendo os observadores, principalmente no que se refere ao conhecimento científico. As pessoas, quando aprendem a pensar, tornam-se poderosas – e riem dos preconceitos. Para aprender a pensar, basta duvidar das verdades tidas como absolutas. A única verdade absoluta é a morte. Temos que combater todos os racismos, mesmo quando eles se disfarçam na “defesa” da própria “raça”. Esse combate se inicia na constatação de que raça é substantivo abstrato. Não existem raças humanas. Houve, como confirma a ciência, durante a peregrinação da espécie, a partir da África, a adaptação dos seres humanos às condições próprias das latitudes, da alimentação, do clima, o que resultou na cor da pele e em outras alterações do corpo. Somos todos “afrodescendentes”, para fazer concessão a outra violação do bom-senso, que é o uso dos termos “politicamente corretos”. Se black is beautiful, por que rejeitar a palavra negro?

Mas, no caso dos nordestinos, não é o preconceito “racial” que atua. Eles são discriminados porque, em sua imensa maioria, são pobres. Sua pobreza secular é resultado de duas catástrofes: uma, natural, a da seca; outra, social, a da cruel opressão das oligarquias. Essas duas tragédias os tangeram à migração. Sendo-lhes negada a educação, viram-se, nos estados desenvolvidos, obrigados aos trabalhos mais penosos e mal remunerados. Da mesma forma que não há preconceito contra os negros ricos, tampouco há contra os nordestinos ricos; nem há no Nordeste mais mestiços do que no resto do Brasil. Ao contrário: numerosas de suas famílias descendem dos holandeses e franceses que ocuparam a região, e deixaram sua marca genética, na cor da pele, dos cabelos, dos olhos. O que eles temem é a ascensão dos pobres ao poder, nordestinos ou não, como é o caso de Lula. É necessário impedir que a infecção se alastre. Ela deve ser cauterizada logo, pela ação rápida e severa da Justiça.


Jornal do Brasil | Terça-feira, 7 de dezembro de 2010

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Sem tirar o pé do acelerador

Brasil alcança 3,36 milhões de veículos fabricados em 2010 e setor projeta mais recordes para o ano que vem Antonio Puga Jorge Lourenço

A

cada ano, são fabricados mais veículos no Brasil do que nascem crianças. São 2,8 milhões de nascimentos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) contra 3,36 milhões de carros construídos só de janeiro até novembro, de acordo com a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Deste total, mais de 70% são flex. Números do setor divulgados ontem pela Anfavea pre-

veem que o comércio de veículos deve fechar o ano com alta de 9,8%, o que representa de carros serão 3,45 milhões de unidades venvendidos até didas. Para 2011, a estimativa milhões o fim de 2010, é a de que a expansão seja de diz a Anfavea 5,2%, valor semelhante ao crescimento previsto para o Produto Interno Bruto (PIB). é a previsão – O índice da Anfavea dede aumento monstra a coerência do merda produção no cado interno, que está vivendo setor em 2011 um momento importante. O setor deve fechar com um crescimento na faixa de 8% e, em Para o diretor comercial da 2011, mais próximo dos 5% do Nissan, Abelardo Pinto, a conPIB – avaliou o diretor comer- juntura do país favoreceu este cial da Fiat, Lelio Ramos. impulso nas vendas.

3,45

1,1%

ção de carros e comerciais leves em território nacional não deve passar de 1,1%, por causa da forte valorização do real no mercado cambial, o que encarece os carros brasileiros. – O real forte e a conjuntura internacional não favorecem um aumento na produção – explica o presidente da Anfavea, Cledorvino Belini. – A queda no volume é parcialmente compensada pela exportação de Câmbio atrapalha Mesmo com a previsão de produtos de maior valor. manter o crescimento de vendas no ano que vem, a produ- Continua na página seguinte. – São vários fatores. Temos uma excelente linha de crédito disponível no Brasil, até mesmo para quem tem pouco dinheiro para a entrada – exemplifica Abelardo. – A classe C também cresceu muito e já não compra mais só carros populares. Hoje, as concessionárias ainda facilitam as compras, aceitando carros usados como entrada.


Jornal do Brasil | Terça-feira, 7 de dezembro de 2010

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UNIVERSO FEMININO

Remédio

para alta temperatura Modulação hormonal é o melhor tratamento para os efeitos da menopausa, segundo especialista Luisa Bustamante

U

m novo método de tratamento promete ser uma alternativa à tradicional reposição hormonal nas mulheres que chegaram à menopausa. Tra-

ta-se da modulação hormonal bioidêntica, método baseado na utilização da estrutura molecular exatamente igual à dos hormônios humanos, obtida por meio da engenharia genética recombinante. A descoberta rendeu ao cientista americano Louis Ignarro um Nobel de Medicina em 1998. No Brasil, a prática começou a ser difundida há cerca de dez

anos, mas é pouco conhecida entre mulheres. – A indústria farmacêutica só trabalha com produtos patenteados – observa Lair Ribeiro, médico cardiologista com treinamento em Harvard. – E como não se pode patentear criações da natureza, como a progesterona e a testosterona, eles pegaram hormônios e modificaram para oferecer aos seres huma-

nos. Isso acabou trazendo maiores problemas, como o desenvolvimento de câncer. Para Lair Ribeiro, a reposição hormonal tradicional deveria ser abolida, pois traz muitas complicações para o ser humano. Como alternativa, a modulação tem efeitos colaterais muito menores e não apresenta riscos à saúde. – Os hormônios para a reposição tradicional são ex-

traídos da urina de éguas prenhas – explica. – Mas esses hormônios têm 11 estruturas químicas que não dispõem de nada a ver com o organismo da mulher. Por isso, muitos médicos evitam este tratamento. Hormônio de cavalo deve ser usado em cavalo, hormônio de gente deve ser usado em gente. Continua na página seguinte.


Jornal do Brasil | Terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Novo método ajuda a regular ciclo menstrual A professora Glaucia Motta, ção de como estão as taxas de de 56 anos, entrou na meno- hormônios no sangue e uma repausa há pouco tempo e pro- posição de acordo com a necescurou a reposição hormonal sidade de cada mulher. para controlar os sintomas. O método previne o desen– Meus calores melhora- volvimento de doenças como a ram, e meu humor ficou mais osteoporose, comum com a falestável – declara. – Mas os me- ta de progesterona, hormônio dicamentos retêm muito lí- que estimula a renovação do quido, e eu fiquei muito in- tecido ósseo. Mas, segundo chada. Tentei quatro tipos de Lair, o público feminino deve remédios diferentes, todos ti- ter cuidado com os remédios nham o mesmo efeito. que consome para cuidar dos O médico Lair Ribeiro expli- efeitos da menopausa. ca que a fase da qual Glaucia (e – A indústria farmacêutica muitas mulheres) se queixa é o colocou no mercado a medroclimatério, momento que an- xiprogesterona, composto que tecede a menopausa, carac- se parece com a progesterona, terizado por ondas de calor, mas não é – explica Lair. – Ela sono entrecortado, infecções engorda, retém líquido, é canCPDoc do JB urinárias, mudanças de humor e outros sintomas. – Nesse período, os níveis de produção de progesterona e estrogênio (hormônios produzidos pelos ovários) caem – pondera Ribeiro. – A modula- FITO-HORMÔNIOS – Trevo vermelho ção faz uma medi- combate os sintomas da menopausa

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cerígena e prejudica a cognição, entre outros problemas. Pílula

Muitas mulheres, principalmente as que estão entrando na fase conceptiva, sofrem com ciclos menstruais irregulares. É o caso da estudante Elisa Fernandes, de 20 anos, que recorre ao anticoncepcional desde os 15 para corrigir o ciclo. – Se eu não tomar a pílula, fico até quatro meses sem menstruar – queixa-se. – Quando isso acontece, é horrível. Fico inchada, ganho mais ou menos dois quilos e não consigo dormir direito, sem falar na TPM constante. Hoje uso a pílula também como método contraceptivo, mas não acho que ter usado desde tão cedo possa ter feito bem. Na época, foi a única coisa a quual pude recorrer. Lair explica que o ciclo menstrual normal é de 28 dias e não pode ter menos do que 26 ou mais que 32. – O anticoncepcional não deixa a pessoa ovular, e no momento que ela não ovula também não produz progesterona – explica. – O ideal é que a menina faça um acompanhamento para repor o hormônio enquanto usa o contraceptivo.


Jornal do Brasil | Sexta-feira, 8 de outubro de 2010

POLÍTICA

Rio de Janeiro sempre na vanguarda

LITERATURA

Sydronio

Prato frio José Sarney

José Dirceu

EX-PRESIDENTE DA REPÚBLICA

EX-MINISTRO CHEFE DA CASA CIVIL

O

estado do Rio de Janeiro, nos momentos políticos mais decisivos da nossa história, sempre se diferenciou do restante do país. Sempre esteve na vanguarda. Foi o primeiro estado brasileiro, nas eleições de 1982, a eleger um governador com um perfil combativo como o do recém-retornado do exílio Leonel Brizola, do PDT, partido afiliado à Internacional Socialista. Uma afronta direta à ditadura que estava em seus derradeiros anos de sobrevida. Foi também no Rio que a criatividade do povo cunhou o grito olê, olê, olê, olá...Lula, Lula, incorporado à campanha presidencial do PT em 1989 e entoado até hoje. Essa demonstração inicial de carinho foi o prenúncio de um relacionamento estreito entre a população fluminense e o presidente Lula, que venceu as eleições no estado em 1998, 2002 e 2006. Nas eleições do último dia 3, a candidata que representa o governo Lula, Dilma Rousseff, manteve a tradição de vitória do PT no estado. Dilma recebeu 3,7 milhões de votos no Rio de Janeiro. Foi a primeira colocada, com ampla vantagem, como no restante do Brasil. A depender do desejo do eleitor fluminense, teríamos hoje uma mulher presidente: ex-ministra do Meio Ambiente de Lula, Marina Silva foi a segunda colocada. Marina che-

O

gou, inclusive, a vencer em Niterói e Volta Redonda, o que, além de revelar a debilidade no Rio da candidatura tucana, exige a reafirmação de nossa agenda ambiental. Até porque o governo Lula tem avanços na luta contra o desmatamento da Amazônia e assumiu compromissos com metas que o Brasil assumiu na conferência do clima. Precisamos também responder com firmeza para desmentir as calúnias contra Dilma a partir da valorização da vida, da família e da religião. O recado fluminense é claro: não existe espaço para os políticos de sempre, com o discurso velho e os projetos falidos que já foram postos em prática no passado e não funcionaram. Neste segundo turno, José Serra, ex-governador de São Paulo e braço direito do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, é a representação dessa ve-

lha política de governar para poucos, e sua eleição significará um retrocesso ao Brasil de FHC. De outro lado, Dilma representa a mudança, a continuidade de um projeto que começou a transformar o país, rumo a uma nação desenvolvida. Com Lula,

A depender do desejo do eleitor fluminense, teríamos hoje uma mulher presidente: Dilma Rousseff 28 milhões de pessoas saíram da linha da miséria, 31 milhões saíram da pobreza e mais da metade da população alcançou a condição de “classe média”. O desemprego está abaixo de 8%, e os salários acumulam ganho real ano a ano, fora os recordes de produção da indústria nacional —em especial, a indús-

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tria naval e petrolífera, especialmente visível para a população carioca. O Brasil e o Rio de Janeiro estão em franco processo de mudança, tão bem conduzido no estado pelo governador Sérgio Cabral, reeleito pelo povo em reconhecimento de seu excelente trabalho, inclusive pela parceria com o governo federal para enfrentar graves e antigos problemas, como a violência. Não podemos correr o risco de voltar a um período em que predominavam a explosão da dívida externa, o desemprego em massa, a falência da indústria nacional, os apagões, as privatizações, o sucateamento da Petrobras (que quase virou PetroBrax) e a compra de votos para aprovar a reeleição. Foi contra isso que o povo do Rio de Janeiro votou em Lula 2002 e em 2006. Nestas eleições, esse novo Brasil é representada por uma candidata: Dilma Rousseff.

Prêmio Nobel de Literatura sempre foi mais polêmico pelos autores que não o receberam do que pelos que o receberam – fora os casos dos que o recusaram, Pasternak, por imposição dos soviéticos, e Sartre, para marcar uma posição anticapitalista. Assim, ficam de fora de sua fileira muitos grandes nomes: Kafka, Proust, Joyce, Valéry, Ibsen, mais perto de nós, Onetti e Cortázar, e, em nossa casa, Drummond e Jorge Amado. O grande Jorge Luis Borges sempre estava nas listas dos que seriam premiados, mas nunca chegava sua vez. Quase no fim da vida, há muito cego, na última entrevista que concedeu em Paris, perguntaram-lhe se estava inconformado por não receber o Nobel. Respondeu com ironia: “Antigamente o Prêmio Nobel era dado a autores consagrados, com uma obra consolidada, e agora é um prêmio de incentivo a jovens escritores”. Referia-se a Gabriel García Márquez – que a meu ver mereceria o prêmio, mesmo que tivesse escrito apenas Cem anos de solidão. Quando o prêmio chegou à literatura de língua portuguesa, resolveram premiar um escritor português. Saramago tinha todos os méritos para ganhar o prêmio, menos um: passar na frente de Jorge Amado, que tinha uma obra monumental, e era desde moço um inovador e um grande batalhador da literatura. Jorge levou, como nenhum outro, a vida brasileira para o mundo, através de seus mi-

lhares de personagens, que estão até dicionarizados, são gente viva, nascida da cultura popular, mestiça, deste Brasil onde se encontram América, África e Europa, num universo mítico e folclórico, imaginário e real. Sua obra é feita de palavras, de gentes, e de eternidade. Mas nunca podemos esquecer que motivações políticas e pessoais foram causa da injustiça. Mario Vargas Llosa já recebe tarde o prêmio, há muito merecido. A nota da Real Academia Sueca fala em “cartografia das estruturas de poder e suas imagens vigorosas sobre a resistência, revolta e derrota individual”. É uma explicação literária. A verdade é que, depois de citado inúmeras vezes, ele vinha sendo discriminado sob o pretexto de ser

Motivações políticas e pessoais foram causa da injustiça para só agora Llosa ganhar o Nobel um homem de direita. Já recebera todos os prêmios. E construíra uma obra consagrada, como pedia Borges: Conversa na Catedral, Pantaleão e as visitadoras, Tia Júlia e o escrevinhador, A guerra do fim do mundo… Vargas Llosa sempre cita Juan Carlos Onetti e o Victor Hugo de Os miseráveis como os escritores a quem deve muito. Mas há outro, tão grande quanto estes e praticamente desconhecido mundo afora: Euclides da Cunha, cujo Os sertões – que Llosa conhece profundamente – deu origem ao seu livro sobre Canudos, e que é um dos maiores livros da literatura mundial.


Jornal do Brasil | Sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Arte: Sydronio

PESQUISA

– Primeiro, isso não significa que o NO² cause câncer de mama – esclarece. – Este gás não é o único poluente gerado por automóveis, e onde ele está presente há outros gases, partículas e compostos que associamos ao tráfego; alguns dos quais já eram conhecidos como cancerígenos. O NO² é apenas um marcador, não o verdadeiro agente. Apesar de os pesquisadores terem tentado identificar o máximo possível de erros, áreas de incerteza continuam a existir. – Não sabemos a quantidade de poluição a que as mulheres foram expostas em casa e no trabalho. Isso depende dos padrões diários das atividades, do tempo elas passam em ambientes abertos e daí por diante – explica Goldberg.

Uma ligação de

risco

Mulheres expostas à poluição do trânsito são mais vulneráveis ao câncer de mama A poluição do ar já foi relacionada a uma gama de problemas de saúde. Agora, um estudo indica que a poluição originada pelo tráfego intenso de veículos pode colocar mulheres em risco de contrair outra doença mortal. O estudo, publicado no jornal Environmental Health Perspectives, por pesquisadores do Instituto de Pesquisa do McGill University Health Centre (RI MUHC), em Montreal, e da Universidade de Montreal, no Canadá, relaciona o risco de câncer de mama (segunda maior causa de morte por câncer em mulheres) à poluição do ar no trânsito. – Vimos as taxas de câncer de mama aumentar durante algum tempo – relata o coautor do estudo, Mark Goldberg, pesquisador do RI MUHC. – Ninguém sabe ao certo o motivo, e apenas aproximadamente um terço dos casos é atribuído aos conhecidos fato-

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res de risco. Como ninguém estudou a ligação entre poluição do ar e câncer de mama usando mapas detalhados de poluição do ar, decidimos investigar isso. Goldberg e colegas abordaram o problema combinando dados de vários estudos. Primeiro, criaram dois mapas de poluição do ar, mostrando níveis de dióxido de nitrogênio (NO²), subproduto do tráfego veicular, em diferentes partes de Montreal. Depois, projetaram os endereços das casas das mulheres diagnosticadas com câncer de mama sobre os mapas de poluição do ar. A incidência do câncer de mama era claramente mais alta em áreas com níveis mais elevados de poluição do ar. – Encontramos uma ligação entre o câncer de mama pós-menopausa e a exposição ao dióxido de nitrogênio (NO²), que é um marcador para poluição do ar re-

Cientistas de Montreal checaram incidência do câncer com dados sobre o trânsito na cidade

lacionado ao trânsito – explica Goldberg. – Em Montreal, os níveis de NO² costumam variar entre cinco partes por bilhão (da sigla ppb, que representa uma unidade de medida de concentração de um material em outro) e

30 ppb. Descobrimos que o risco aumentou em aproximadamente 25% com cada aumento de NO² de 5 ppb. Outra forma de dizer isso é que mulheres que vivem nas áreas com os maiores níveis de poluição tinham quase duas vezes

mais chance de desenvolver câncer de mama do que aquelas vivendo nas áreas menos poluídas. Goldberg alerta, no entanto, que os resultados precisam ser interpretados com grande cautela.

France Labrèche, pesquisador da Universidade de Montreal, acredita que os resultados devem ser investigados. – Alguns estudos publicados nos Estados Unidos também mostraram relações possíveis entre câncer e poluição do ar – observa. – No momento, não temos condições de dizer com segurança que a poluição do ar causa câncer de mama. Podemos dizer, entretanto, que a relação possível merece séria investigação. Do ponto de vista de saúde pública, esta possível relação exige, também, ações específicas para reduzir a poluição do ar oriunda do tráfego em áreas residenciais.


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

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Ar te/Sydronio

ETNIAS

Há consciência branca? Benedito Cerezzo Pereira Filho JURISTA

I

nstituída por lei, a data de 20 de novembro passou a ser considerada como o dia da Consciência Negra. A necessidade de lei para se “criar”, ou se respeitar, uma consciência já denota o grau de dificuldade para compreensão da questão. A forma como as pessoas discutem a luta do negro contra qualquer tipo de preconceito é outro fator a demonstrar que, infelizmente, estamos longe de um final feliz, da igualdade sonhada por Martin Luther King: “I have a dream”. Toda medida que vise minorar ou evitar mais desgastes à raça negra encontra obstáculos de toda índole pelos segmentos da sociedade. É assim com a questão da cota racial para as universidades e tem sido, agora, com a celeuma levantada acerca da utilização, no ensino fundamental, das obras do imortal Monteiro Lobato por supostos conteúdos racistas. A censura é insana. Não se admite. Por outro lado,

fazer vista grossa ao fato de que uma criança negra será hostilizada pelos colegas ao se deparar com certas afirmações contidas na obra é menosprezar a dignidade humana. Rubem Alves relata no seu texto intitulado Crioulinha..., publicado na Folha de S.Paulo do dia 16 de novembro de 2010, seu enorme prazer ao ouvir a professora ler os textos o Saci, Viagem ao céu, As caçadas de Pedrinho, As rei- do pastoreio”, “o aleijadinações de Narizinho. nho”, “Saci Pererê”. Ao contrário dos prazeres do educador Rubem Alves, lemA dona Manoela me convenceu da importância bro-me da aula na qual a professora pediu para que lêssee da alegria de ser negro. mos um texto intitulado DitiMeu cabelo não era ruim nho pretinho. Bah!...justamente o meu nome e a minha cor. Confesso que minha situa- Fui motivo de risos. Cheguei a ção foi exatamente a oposta. minha casa desconsolado. Só Como era difícil, angustiante e voltei à escola porque tive uma decepcionante para mim, úni- mãe que, não obstante não ser co negro numa classe de bran- alfabetizada, tinha uma sabecos, trabalhar com textos cujo doria divina. A dona Manoela personagem negro não des- me convenceu da importância pertava nenhuma “qualida- e da alegria de ser negro. Disde” cobiçada pela avidez das se-me ela, e nunca mais me escrianças daquela época. Evi- queci, que meu cabelo, ao condente que a mim cabia ser tra- trário do que pensavam meus tado e chamado de “negrinho colegas, não era ruim. Era

bom. Muito bom. Não caía nos olhos e não ficava espetado. Que não deveria ser fácil ter cabelo liso, escorregadio e mole. Por isso, caríssimo Rubem Alves, as palavras duras, se inevitáveis, devem ser contextualizadas e orientadas no que tange às consequências interpretativas. Mesmo porque “a palavra pertence metade a quem a profere e metade a quem a ouve” (Michael Montaigne). Também não se tratava de mero costume da época as pessoas negras se oferecerem às famílias abastadas brancas para “trabalharem” em troca de criação. Era exploração mesmo. Escravidão continuada em pleno discurso da

“abolição”. Dizer que “assim é a vida” e que, portanto, está justificado o tratamento e o uso dos termos, sinceramente, é ofender-nos por demais. A consciência negra deseja que a consciência branca tenha consciência de que apenas não queremos ser subjugados, subvalorizados. De que não existe um papel reservado, por natureza, a nós. Que podemos ter conquistas. Sucesso. Que não é certo dizer “cada macaco noseugalho”.Não nos satisfaz a liberdade, precisamos ter o direito e condição para usufruirmos dela. “Não basta levantar o fraco, é preciso mantê-lo depois”. Que se leia... que se leia muito. E que se leia muito Monteiro Lobato. Mas, que se orientem os educadores a trabalhar com toda e qualquer desigualdade. Talvez, usando um pouco mais de Machado de Assis, para quem “o homem não pode compreender senão as penas que já padeceu”. O autor é mestre e doutor em direito pela Universidade Federal do Paraná e professor da USP, Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (SP)


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

esportes@jb.com.br

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O futebol não para no planeta

bola

Torneio com o campeão de cada continente começa hoje nos Emirados Árabes


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

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POLÍTICA

De volta, o PT Candido Mendes CIENTISTA POLÍTICO

A

reação partidária do começo do governo Dilma aí está. Se a popularidade de Lula é de 84%, a militância petista não passa dos 37%. As coligações aliadas do governo já começaram com o descarte e o isolamento do partido de Lula. Ledo engano, entretanto, o de pensar-se que é das frentes parlamentares comandadas pelo PMDB que vai depender a iniciativa do novo Executivo. Dilma não precisa, para levar adiante o que herdou, de nenhuma legislação básica, de imediato, e sabe que a reforma tributária ou a eleitoral vai ser obra da maturidade do seu governo, e do avanço do desenvolvimento sustentado, que só necessita do próprio Executivo, no reforço já assegurado do PAC. O que importa, sim, é desencalhar o partido histórico, e retemperá-lo, nas suas fontes de origem, dos movimentos so-

Ar te/Sydronio

ciais. Deparamos o avanço alarmante do corporativismo sindical na entrega, praticamente, de um Ministério a cada força trabalhadora, às vezes num clientelismo inquietante das retribuições do ganho eleitoral. E aí está a distância dos sem-terra, na interrogação que se dirige aos comandados de João Paulo Stédile, de saber se prosseguirão no sentido comunitário da reforma agrária, ou se se concentrarão no su-

Força rompante, por outro lado, do Brasil de Dilma é o dessa agricultura familiar, que controlou o fluxo migratório errante para as metrópoles. Este arranque desmonta as velhas utopias comunitárias das raízes históricas do PT. É toda esta nova prática social que hoje aduba os movimentos sociais, em que a militância renovada do PT – e aí está o exemplo do eleitorado de Alexandre Molon, no Rio de

Dilma não precisa de nenhuma legislação básica. Sabe que a reforma tributária exige maturidade

O essencial é o impacto do Bolsa Família, para a renovação dos quadros partidários do petismo

cesso dos assentamentos, nesse empuxe social básico contra a marginalidade nacional. Exigir-se-ia – e para a ampla reformulação de um PT voltado às bases – o enlace com as ONGs, hoje sob o escrutínio do Tribunal de Contas, no destino do sem-número de verbas assistenciais, transferidas à promoção dos direitos humanos, em núcleos muitas vezes erráticos e dispersos.

O essencial é o impacto do Bolsa Família, para a renovação dos quadros partidários do petismo. Mal realizamos ainda o que foi esse dinamismo coletivo, que permitiu o ingresso de uma população igual à Colômbia nos serviços de educação e de saúde, mesmo antes da garantia da carteira assinada. E é todo esse impulso que marca os seus beneficiários conscientes, cada vez mais, da autonomia do seu desempe-

nho, reptando as velhas formações sindicais enquistadas e cobrando uma nova e determinada presença política. É só destacar de que forma a melhoria dos orçamentos familiares está rompendo com as fatalidades da velha economia de consumo das classes médias brasileiras, e reforçando, em parcela tão ponderável, o que já são esses 56% do país, chegando a uma economia continuada de consumo.

Janeiro – confronta as coligações do velho Brasil, trazido à trilha, ainda da vitória de Dilma. Mas quem a ganhou foi esse “povo de Lula”, núcleo do que pode ser o novo partido. Livrou-se da ingenuidade e do apetite do poder de há oito anos, nesta militância emergente e prospectiva de quem sabe, de saída, e de vez, o que não quer.


Jornal do Brasil | Domingo, 10 de outubro de 2010

Mauro Santayana

Mauro Santayana maurosantayana@jb.com.br Sydronio

SAL VERMELHO

Uma das moças, grávida de meses, caiu do cavalo, abortou. Teve hemorragia brutal

Treze semanas em Cauaçu

O

que vou contar ocor- na, como se São Pedro tivesse insreu entre o dia 27 de talado um chuveiro maneiro em março e 26 de junho cima daquele pedaço. Com água de 1936. Durou exa- de cima e água de baixo, nascia ali tamente 13 sema- o Cauaçu que, ao contrário de nas, ou 91 dias, de acordo com a todos os rios, não crescia: desmemória de Demétrio Alexandri- cendo rumo ao Carinhanha enno Queirós, mestre em capação trava em terras sequíssimas e esvariada (de frango a elefante) e ponjosas, e acabava por desapamaçom renegado, inscrito no Li- recer, reduzido a mero rego de vro Negro por desvios singulares palmo e meio, no Açude Velho, e bem humanos. valhacouto dos restolhos humaNão fosse o povo de Cauaçu nos de toda aquela vasta e outrora reles e egoísta, gente ordinária e esquecida zona. pedante, devotada aos pecados Cauaçu era cidade dos paióis sem prazer – visto que são per- sempre cheios, de porcos de 15 doados os pecados arrobas, arroz de soque alegram os senca, de três cortes e tidos e podem ser di- O arraial de Açude espigada cheia, e vididos em sua prá- Velho fora fundado gente que chegava tica, como os de ca- por Negra Jovina, aos 90, cavalgando ma e mesa; e nefanpelo e sem dor amásia do beato em dos os do êxtase sonas cadeiras. Mas – e Mané Consola isso era o que mais litário, como os da avareza, da soberba espantava os raros e do onanismo – não guardaria na visitantes – não havia, no mundo memória a narração de Demétrio, inteiro, canalhas tão bem acabauma das estórias exemplares do dos. Primeiro, eram de especial sertão alto. avareza. Desde tempos muito veConvém gastar mais um pouco lhos, juntavam ali suas moedas de de tempo com a geografia física e ouro. Fazia-as mestre Cirilo, filho moral de Cauaçu, para o bom en- e neto de outros Cirilos, e punha tendimento do castigo. Ilha de em cada uma delas a efígie do terras roxas e úmidas, tão mo- cliente, cercado de seu nome e, no lhadas que os raríssimos calhaus anverso, as armas de Cauaçu: chegavam a suar em pleno verão, pé-de-meia cheio e a frase antiga: o município era também o único “Vintém poupado, vintém gaponto, em toda a comprida cha- nho”. Tais moedas não circulapada, de chuva regular. Chuva fi- vam: estava convencionado, e ha-

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via muito, que era a maior desonra desfazer-se de uma só delas. Cirilo não só as marcava, bem como as numerava e delas mantinha registro. O arraial de Açude Velho, depósito da ralé, fora fundado por Negra Jovina, amásia do beato Mané Consola, morto por uma patrulha da Força Pública, em episódio que não cabe aqui, e fica para ser contado depois. Jovina juntou ali cegos, leprosos, sifilíticas, aleijadas, abobados. Deus sabe como conseguia mantê-los, cozinhando raízes do mato, fazendo sopa de ervas do brejo e, segundo injuriosa gozação do pes-

soal de Cauaçu, assando pererecas e gafanhotos. No início de março de 36 passou pela estrada, ao lado do Açude, um circo mambembe, e houve o acidente. Uma das moças, grávida de meses, caiu do cavalo, abortou. Teve hemorragia brutal, ia morrer, e a salvou Jovina com benzedura, sal vermelho e chá de osso de capivara. O dono do circo ficou conhecendo a história do arraial desprezado. Houve então o convite: aparecessem na quinta-feira, em Cauaçu – a primeira função do circo seria apenas para eles. No sábado seguinte, o espetá-

culo começaria oficialmente. É fácil saber como reagiu aquela gente ordinária de Cauaçu, desviada dos mandamentos de Cristo e entregue à volúpia do ouro, quando soube do descabido privilégio. Encomendaram a Demétrio a capação do elefante, que dormia ao lado do circo, descuidado. Deram-lhe dose brutal de clorofórmio, e o bicho arriou. Demétrio fez o serviço, suturou o corte e passou creolina. Depois mandaram o cabo e os quatro soldados do Destacamento esperar a corja do Açude na entrada da cidade. Aos da frente, deram instrumentos musicais: cornetas,

flautins, tambores, pandeiros e taróis. Sob os gritos dos soldados, e a mira dos três mosquetões tipo 1914, da dotação do Destacamento, entraram na cidade tocando um dobrado imaginário e foram depois escorraçados a tiros de sal grosso. Não se sabe se a ideia foi de Jovina, das pessoas do circo ou dos próprios bichos – quem sabe? –, Cauaçu foi arrasada naquela noite. Com a ajuda dos animais, o elefante, meio trôpego pelo ferimento, mas decidido, e a zebra, à frente, os miseráveis do Açude tomaram a cidade, prenderam os cabeças e obrigaram os outros a servi-los, entre os quais os bravos militares, vencidos pelo medo. Uns contam que fizeram mal às donzelas e que Demétrio foi forçado a empregar seus talentos de castração in anima nobili, o que ele desmentiu. Tenho depoimentos seguros de que não houve tais abusos. Aquela gente quis viver suas treze semanas, sem fome e com a dignidade do poder. Depois ajustaram o pacto, dividiram entre si as moedas de ouro encontradas e se dispersaram no mundo. Um deles virou fazendeiro grosso no Urucuia. Era leproso. Desertado de seus ex-miseráveis, o Arraial do Açude Velho desapareceu do mapa. A gente de Cauaçu, que mudou de nome, continua ordinária até hoje.


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 13 de outubro de 2010

VISÃO

Brasil, querido Brasil

CIÊNCIA E FÉ

Sydronio

Mário Soares

EX-PRESIDENTE DE PORTUGAL

S

egui, com toda a atenção, as eleições presidenciais que se realizaram, no domingo passado, em todo o vastíssimo território do Brasil, com uma população votante de cerca de 192 milhões. Foram totalmente corretas e pacíficas, como é próprio de uma grande democracia consolidada. Como se sabe, adoro o Brasil, esse colosso, transformado em grande potência, que dá hoje cartas na cena mundial. Fui pela primeira vez ao Brasil em 1970, em tempo de ditadura. Apesar disso, fiquei fascinado com a alegria ímpar do povo, que fala um português de açúcar – quer dizer, mais doce – como todos os milhões de imigrantes, perfeitamente integrados, vindos de todos os lugares do mundo e que falam um português perfeito, com um saboroso toque brasileiro. Nesse tempo, o Brasil era um país com grandes diferenças sociais, pobre, embora com enormes potencialidades inexploradas. Stephan Zweig, refugiado no Brasil durante a Segunda Grande Guerra, como judeu, para escapar aos campos de concentração nazis, chamou-lhe, num livro, ainda hoje de leitura obrigatória, Brasil, país do futuro. Como disse o jornalista e escritor Alberto Dines, meu querido amigo, que fez sobre Zweig uma notável biografia, o livro teve um sentido profético e resultou de um profundo conhecimento da terra, dos costumes e da gente.

Contudo, hoje, o Brasil é um Estado-nação, num território vastíssimo e multifacetado, com uma identidade própria indiscutível, políticos e sindicalistas de primeira qualidade, um país hoje riquíssimo, que empresta dinheiro ao Fundo Monetário Internacional, que foi seu credor durante anos, embora ainda com grandes desigualdades sociais. Contudo, nos

O Brasil é ouvido e respeitado no mundo inteiro – voltado para o futuro, como um dos países emergentes últimos anos (2003 a 2008) criou 14 milhões de postos de trabalho, numa população de 192 milhões de habitantes, 25 milhões dos quais saíram da pobreza, durante os mandatos de Lula. É, pois, incontestavelmente, um “país do presente” – ouvido e respeitado no mundo inteiro – virado completamente para o futuro, como um dos países emergentes.

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Lula teve a inteligência de seguir a política de contenção e defesa do real, prosseguida por Fernando Henrique Cardoso, nos seus mandatos. Não o devemos esquecer. Mas essa atitude só avulta a inteligência política excepcional de Lula da Silva. Daí ter feito do Brasil um grande colosso mundial, que realmente é, pela sua enorme população e pela vastidão do seu território. Tudo isto vem a propósito das eleições presidenciais, para governadores de estado e membros do Congresso. Os comentadores – e as sondagens – contavam com a vitória, logo na primeira volta, de Dilma Rousseff, candidata apoiada pelo presidente de saída, Lula da Silva, de quem aliás foi chefe de gabinete. Lula, que conservou uma enorme popularidade de 80% dos brasileiros, foi talvez longe demais no apoio que deu a Dilma, aparecendo em todos os comícios e apelando ao voto na sua candidata, em todas as circunstâncias. Talvez

isso tivesse um efeito, no final, contraproducente. José Serra, do PSDB, é considerado justamente um grande administrador, impoluto, excelentemente preparado. Foi governador de São Paulo e antigo ministro da Saúde, sendo o segundo candidato que se apresentará à eleição no 2º turno, próximo dia 31. A luta é com Dilma, com 46,91% dos votos, e Serra com 32,61%. A diferença é enorme. Mas em eleições sérias, como são as brasileiras, os resultados ao certo só se sabem depois das eleições... Para além dos dois candidatos devo salientar ainda o fenômeno que foi Marina Silva, a candidata dos Verdes, que conseguiu um resultado surpreendente, de 19,33% dos votos. Para onde irão esses votos na próxima eleição? Eis o que ninguém pode agora dizer, com rigor. De qualquer maneira, o Brasil, mais uma vez, deu uma lição ao mundo. A votação foi um êxito de bom senso. Trata-se de um povo com uma coesão admirável, apesar do seu imenso território. O progresso vai prosseguir. A sua liderança em termos de ibero-América é hoje indiscutível. E, para nós, portugueses, irmãos dos brasileiros, é um orgulho imenso que o Brasil seja membro fundador da CPLP. Vi num inquérito recente que o sobrenome mais usado no Brasil – de longe – é Silva. Não é extraordinário, ao fim de cinco séculos, com tantos imigrantes? É caso para gritar – neste momento difícil para Portugal – Viva o Brasil!

Bento XVI, religião e modernidade Candido Mendes CIENTISTA POLÍTICO

O

papa acaba de realizar na Inglaterra viagem exemplar para dizer da sua lição sobre modernidade e secularização. Bento XVI, pouco dado a viagens, ao contrário de seu antecessor, tem buscado lugares canônicos para desenvolver esta visão contemporânea da Igreja, diante dos conflitos culturais emergentes da “guerra de religiões” ou, sobretudo, do confronto entre ciência e crença centrado na profunda discussão sobre o relativismo contemporâneo e os novos embates entre a fé e o conhecimento. O recado histórico da ruptura do anglicanismo vai à soberania temporal dos credos, a ter no cenário democrático daquele país, hoje, condição exemplar de superação. O papa reconhece a independência do espaço público, e vê na “praça”, literalmente, uma presença religiosa. Bento XVI sustenta que a Igreja deva ter uma noção corretiva, no plano do Estado contemporâneo, e que a prática da fé possa contribuir a um bem comum, definitivamente reconhecido na sua universalidade laica. O pontífice soube emprestar a maior casualidade ao contato reconhecido entre chefes religiosos com a rainha da Inglaterra. E o respeito à intrínseca diversidade de opinião permitiu a explosão de júbilo dessa minoria católica no país, em toda a força desempenada de sua expressão e no carinho pelo visitante. Confrontaria a força apregoada do dissenso à visita do papa, levando às ruas, em volta do Hyde Park, 20 mil

portadores de cartazes, como No to the pope, frente aos quase 100 mil que abarrotaram as mesmas vias públicas, no apoio a Bento XVI. O discurso do primeiro-ministro Cameron foi ao empenho comum com o Vaticano, na defesa da paz, no imperativo da justiça social, mas sem referência, por exemplo, ao programa efetivo de relance, no âmbito das Nações Unidas, de uma luta contra a miséria universal. A presença do pontífice foi a um extremo inesperado, inclusive, da conciliação de um passado, frente à história pregressa, nesta força da sinceridade que só uma tradição democrática como a inglesa pode legitimar. Permitiu o melhor eco ao mea-culpa pela pedofilia clerical, ou à candência das palavras do pastor. Mas ao lado do arrependimento pedir-se-ia a fala profética sobre as tensões emergentes de nosso tempo. A palavra a se cobrar é já do avanço, não da coexistência entre credos cristãos, mas com o mundo islâmico, no quadro das “guerras de religião” e da explosão do terrorismo, levando os dias do pontificado de Bento XVI à nova “civilização do medo”; ao preocupante fundamentalismo americano, das direitas mais radicais do “Tea party”, aos malthusianismos europeus, contra as migrações afro-asiáticas, a uma visão internacional, fora do Ocidente, de que os direitos humanos sejam uma nova ideologia da dominação. O semblante da última bênção de Bento XVI na Catedral de Birmingham foi o dos olhos percutentes, de quem sabe que o mundo à frente é o da aposta no encontro, de vez, da racionalidade, por sobre a tentação das cruzadas e do dito império dos justos e dos bons.


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 13 de outubro de 2010 Victor Ruiz Caballero / The New York Times AFP

– A Bolívia e sua história de emigrantes também fazem parte desse enorme afastamento – observa Jim Shultz, analista político. – A história de Mamani simboliza a de milhões de bolivianos que deixaram o país para buscar oportunidades, como vendedores de frutas em Buenos Aires, babás em Barcelona e mineiros em lugares como San José. Mamani está entre aqueles que devem fazer parte do primeiro grupo a sair da mina, por causa da boa saúde e da estrutura física.

Apesar de as relações entre os países terem, de certa forma, melhorado nos últimos dias, elas ainda permanecem tensas pela reivindicação da Bolívia sobre o território que daria acesso ao mar, e pela resistência do Chile à reivindicação – mesmo que Piñera tenha oferecido à Bolívia o uso do porto de Iquique com o intuito de melhorar as relações. Refletindo a cobiça por uma saída para o Pacífico, a Bolívia mantém uma frota que patrulha os próprios rios e desfila anualmente no Dia do Mar.

JUNTOS EM BREVE – Emili (alto) e Veronica (acima) aguardam a volta de Carlos Mamani (alto, à esquerda)

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Mineiro comerá pênis de touro feito pela sogra A tensão duradoura decorrente das disputas entre Chile e Bolívia parecia distante da mina, anteontem – parentes de Carlos Mamani se mostravam surpresos com a atenção que recebiam. Uma das primeiras coisas que Sabina Pacaje, 38, sogra de Mamani, espera fazer é dar ao mineiro um prato boliviano feito com pênis e testículos de touro, que leva 10 horas sendo cozido. – Queremos ajudar Carlos a ser forte e vigoroso quando ele olhar a luz do dia de novo – conta Sabina, rindo, enquanto compartilha um momento com a filha, Veronica Quispe. Mamani é o oitavo de 10 filhos, cujos pais agora estão mortos. Nasceu em uma família que sobreviveu cultivando batatas e pastoreando gado e ovelha na Bolívia. Como outras pessoas do país, foi para o Chile, quatro anos atrás, em busca de emprego. Trabalhou em outras minas antes de descer ao subsolo em San José, segundo a esposa Quispe, 20, que com ele tem uma filha de um ano e meio, Emili. O presidente Evo Morales enviou Walker San Miguel, maior autoridade consular da Bolívia no Chile (os países ainda carecem de embaixadores nas capitais uns dos outros), para visitar a família de Mamani, que a mídia chilena vinha descrevendo como “o boliviano” ou “o imigrante” nos perfis dos mineiros presos. – Sinto como se o governo da Bolívia estivesse prestando real atenção a nós pela primeira vez – declara Veronica Quispe, que chegou ao Chile oito anos atrás, aos 12 anos, quando a mãe passou a colher uvas para fazer aguardente. Tradução: Victor Barros


Jornal do Brasil | Segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

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LITURGIA CATÓLICA

Espiritualidade do Advento Dom Orani João Tempesta, O. Cist. ARCEBISPO DO RIO DE JANEIRO

C

om o Advento a Igreja inicia um novo ano litúrgico! Neste ano, na liturgia, as leituras dominicais são do ano A, por isso seremos guiados pelo evangelista Mateus. O tempo do Advento é o tempo de espera, acolhida do Senhor e preparação para o santo Natal. São quatro semanas que antecedem a data em que celebramos a encarnação do Verbo em nossa história. E a Igreja entoa, então, o cântico de esperança pela chegada do príncipe da paz, o Emanuel (Deus conosco). O refrão: “Vem, Senhor, vem nos salvar. Vem sem demora nos dar a paz” – cântico que expressa liturgicamente o sentido do Advento. É o sentimento do povo que espera ansiosamente a libertação. Este tempo tem dupla característica: preparação para as solenidades do Natal, nas quais se recorda a primeira vinda do filho de Deus no meio

Ar te/Sydronio

dos homens (advento natalício), simultaneamente, tempo em que, com esta recordação, os corações se dirigem para a expectativa da segunda vinda de Jesus no fim dos tempos (advento escatológico). Enquanto isso, a espiritualidade do Advento nos atualiza sobre a vinda hoje do Senhor em nossas vidas. Por isso, seria muito importante termos algumas atitudes neste tempo:

Há pessoas que por onde passam espalham discórdias. A vida é muito curta para viver odiando 1) Atitude de ESPERA: alegre chegada e amorosa acolhida. A chegada de uma pessoa importante é sempre bem preparada e desejada. Ora, o Senhor Jesus é a pessoa mais importante em nossa vida e na história. Por isso, a sua chegada merece uma boa e santa preparação. 2) Atitude de RENOVAÇÃO: o Advento é tempo de conversão e penitência. A cor

roxa usada na liturgia lembra essa atitude. Jesus se encarna para fazer do homem uma nova criatura. A Igreja recomenda aos fiéis o sacramento da confissão, que é um grande instrumento de renovação espiritual e de preparação para o Natal. 3) Atitude de ORAÇÃO: a oração é elemento primordial da espiritualidade cristã. Precisamos rezar mais e melhor

neste advento em preparação ao Natal do Senhor. Aprender a rezar é aprender a viver. 4) Atitude de CARIDADE FRATERNA: a caridade é a essência do nosso ser e agir cristão. Por isso, somos chamados a rever nossos relacionamentos de amizade, de fraternidade, de convivência na família, com os amigos, com os colegas de trabalho e com a vizinhança. A novena do Na-

tal em família, além de ser um momento forte de evangelização de nossas famílias, é um instrumento precioso de aprofundamento de nossas relações de amizades e de comunhão fraterna. O ideal cristão é viver, sempre, reconciliado com Deus e com o próximo. Há pessoas que por onde passam espalham discórdias.A vida é muito curta para viver odiando as pessoas e semeando discórdias. Por isso, ofereça a Jesus neste Natal um coração reconciliado com seus irmãos e amigos. Para tanto, precisamos dar e receber o perdão! Como gesto concreto de amor ao próximo e compromisso com a missão, a Igreja no Brasil, durante o Advento, promove a Campanha da Evangelização, para alavancar a formação dos evangelizadores da nossa Igreja. Tanto as lideranças leigas como as consagradas. Participe da campanha com sua doação! Porém, não vamos perder o foco do Natal, que é o encontro com Jesus, o Filho de Deus.


Jornal do Brasil | Domingo, 14 de novembro de 2010

Mauro Santayana

Mauro Santayana maurosantayana@jb.com.br

Arte Sydronio

MEMÓRIA

A lua sobre as tendas

E

ra noite, estávamos, minha mulher e eu, em um dos acampamentos saarauis. Regressáramos de uma visita com os guerrilheiros à zona de combate do Saara Ocidental, colônia espanhola de 1502 até 1975, quando morreu Franco. O governo espanhol negociou a entrega da área ao Marrocos e à Mauritânia, em troca da não intervenção de Rabat nos enclaves de Ceuta e Melilla. A ONU insistiu em que a Espanha assumisse as suas responsabilidades históricas e administrasse a descolonização, mas isso não ocorreu. Trinta e cinco anos depois, o território saaraui continua ocupado, com 250 mil refugiados vivendo da ajuda internacional. Naquela noite – e as noites são frescas no deserto – jantamos e saímos para pequeno passeio.

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Uma das mulheres que davam guarda ao acampamento nos acompanhou à pequena elevação, de onde podíamos ver as centenas de tendas reunidas, fracamente iluminadas em seu interior pelos lampiões, mas sob a poderosa luz prateada da grande lua cheia. Não havia jovens entre eles, a não ser os poucos que passavam algumas horas com as famílias, entre um combate e outro. A maioria era de mulheres, de pessoas idosas e de crianças. Mas havia um Estado, com suas instituições funcionando: juízes, sacerdotes islâmicos, escolas, pequenos hospitais, administração pública. Todas as tarefas, fora aquelas em que a presença masculina era tradicional, como as da justiça e da religião, estavam a cargo das mulheres. Era uma noite muito bonita, com a lua e as grandes estrelas

se destacando no céu profundamente negro. Comentamos, em espanhol – a jovem que nos acompanhava conhecia bem a língua que fora oficial até pouco tempo antes – que aquela era uma visão de paz e tranquilidade, embora soubéssemos do sofrimento de seu povo. Depois do passeio, regressamos à tenda, e nos serviram o chá preto, bem quente e doce, antes que nos acomodássemos na cama feita de tapetes. Quando apagamos o lampião, o luar entrava pela pequena janela da tenda, fechada pelo plástico transparente.

Isso foi há trinta anos. Há duas semanas, recebi a visita, em Brasília, de Hamni, da República Árabe Saaraui Democrática, a quem não via desde então. Ele me disse de seu desalento, que é o desalento de seu povo. O governo espanhol, ao descumprir as determinações da ONU, aplaca a consciência com modesta ajuda humanitária – e os outros países fazem o mesmo. O Brasil os ajudou com US$ 300 mil este ano, mais ou menos US$ 1 para cada um dos refugiados. “Nossagente aceitou a trégua proposta, confiando na comunidade internacional, que nos garantiu a realização de um plebiscito justo, que até hoje não se realizou, e já está cansada. Os jovens daquele tempo envelheceram, e os meninos, que se fizeram homens sob as tendas e debaixo da ocupação de nossas cidades, começam a sentir que é melhor morrer lutando”. Poucos dias depois desse encontro, jovens saarauis, residentes em El Aayun, decidiram protestar contra o governo de Rabat, armando suas ten-

das no deserto próximo à cidade. Tropas marroquinas destruíram o acampamento e o incendiaram matando, ferindo e prendendo, diante de uma resistência desarmada. As escolas foram transformadas em prisões. A Espanha, sob Zapatero, cruza os braços. Empresas espanholas já se encontram em contato com firmas europeias e americanas, interessadas em explorar o petróleo de Tindouf e o rico fosfato da região, além do bem sucedido banco pesqueiro, com o estímulo de seus governos e sob o beneplácito do rei de Marrocos. Quando Hamni se despediu de mim em Brasília, de volta ao deserto, lembrei-me das tendas e da lua. Hamni me disse que, se voltasse lá agora, provavelmente o luar invadiria mais ainda a tenda em que pernoitasse, porque muitas delas também envelheceram, estão esgarçadas, cheias de furos – e a comida mal dá para manter de pé os refugiados. Entendo que queiram morrer lutando.


Jornal do Brasil | Sexta-feira, 17 de setembro de 2010

CIVISMO

Aproximam-se as eleições

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA

Um livrão no Planalto Sydronio

Dom Orani João Tempesta, O. Cist. ARCEBISPO DO RIO DE JANEIRO

A

s eleições estão se aproximando! A Assembleia Geral de nossa Conferência Episcopal e o nosso Regional Leste 1 já distribuíram textos sobre as orientações para os católicos neste momento histórico de nosso país. Nesses documentos são explicitados para nós os critérios e as responsabilidades daqueles que irão votar no início do próximo mês. Todos nós, batizados, participamos da missão profética de Cristo, pela qual deve ser instaurado o Reino de Deus, a Justiça, a Verdade, o Amor e a Paz. Esta voz profética exige de nós uma vigilância e participação contínua sobre a realidade em que vivemos, infelizmente manchada com muitos contravalores e interesses que desencadeiam violência e injustiças. Sabemos que o pecado penetrou todo o Universo e temos em nós e na cultura que criamos o germe do Mal, a tendência para a destruição e o ódio. É o mistério da iniquidade que, de qualquer forma, quer nos afastar da ordem e da harmonia que provém da adesão a Cristo, pelo qual nos reordenamos no caminho do Bem. O Espírito Santo nos ilumine para que a preocupação com o bem comum e a fraternidade com respeito aos verdadeiros direitos humanos na construção da civilização do amor esteja presente neste instante de decisões importantes para o futuro da nação.

Há momentos, entretanto, em que esta missão se torna urgente e intensamente mais necessária, como agora: de profundas transformações sociais, religiosas, econômicas, de desenvolvimento técnico-científico que nos desafiam e exigem de nós novas posturas e comportamentos, julgamentos éticos fundamentados na Verdade para gozarmos da liberdade. As eleições devem marcar o rumo que desejamos imprimir na sociedade. Ainda hoje se nota nas campanhas políticas muito do interesse exclusivamente pessoal do poder pelo poder, do enriquecimento próprio e daqueles que os apoiam com promessas de recompensas no futuro. Uma reforma política, tão desejada e almejada por tantos, ainda se faz esperar. Com coragem, um esforço nacional tem procurado, sem êxito completo, através da lei comumente chamada de Ficha Limpa, eliminar candidatos que abusaram dos cargos públicos, desvian-

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do dinheiro para seus bolsos. A Lei 9.840, esta já mais antiga, trouxe muitos avanços para o processo político. Acredito que pouco a pouco novos costumes irão encontrando o espaço de um povo comprometido e desejoso de construir uma nação justa e solidária. A par do desejo de uma economia saudável, devemos ter

Votamos por uma pátria livre no respeito aos cidadãos, e na qual possamos nos sentir verdadeiramente irmãos em mente políticas que atendam à necessidade de todos sem distinção, sobretudo uma pátria livre no respeito aos cidadãos e onde possamos nos sentir irmãos. A pátria será aquela que desejamos com o nosso voto. O Senhor nos entregou o governo do mundo, o direito de fazê-lo pro-

gredir de modo que todos possam usufruir do progresso, da técnica, da terra e do pão. Isso só se obtém com o respeito à ordem natural. Se isso não é observado, vemos o que ocorre: assistimos à violência, aos assassinatos, rixas e fraudes de todo gênero, no mais completo relaxamento dos costumes, na ampla imoralidade. (Rom 1, 18). O nosso Regional Leste 1 da CNBB recordou alguns critérios para valorizar o nosso voto: defesa da dignidade da pessoa humana e da vida em todas as fases e manifestações, defesa da família segundo o plano de Deus, liberdade de educação e liberdade religiosa no ensino, a solidariedade com particular atenção aos pobres e excluídos, o respeito à subsidiariedade e o compromisso na construção de uma cultura da paz em todos os níveis. Esse mesmo texto assim conclui: “O trabalho político, ao qual todos somos chamados, cada um segundo a sua maneira de ser, é uma forma de mostrar a incidência do Evangelho na vida concreta, visando à construção de uma sociedade justa, fraterna e equitativa. Em consequência haverá uma esperança real para tantas pessoas céticas, desnorteadas e confusas com a política atual. É uma grande oportunidade que os católicos e todas as pessoas de boa vontade não podem perder”. Que a Virgem Aparecida interceda por todos os fiéis católicos para que votem com responsabilidade e de acordo com as mais lídimas tradições cristãs que formam a consciência e a identidade do povo brasileiro.

José Sarney EX-PRESIDENTE DA REPÚBLICA

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á três dias a Fundação Joaquim Nabuco lançou, no Palácio do Planalto, um livro que se destina a ser raro e fazer escola: dois volumes de entrevistas com os chefes de comunicação da Presidência da República, desde JK a Lula. É, no fundo, a primeira publicação sobre os segredos do poder presidencial, como se tomam decisões, e os bastidores de como elas chegam ao público. Foi uma inovadora iniciativa do ex-porta-voz André Singer com fotos de Orlando Brito. As entrevistas são excelentes e revelam a tensão permanente entre o governo e os comunicadores, jornalistas em síntese. O Brasil não tem o hábito de fazer História com fontes primárias. Em geral, são degraus repetindo uns aos outros. Autobiografias de presidentes, nem pensar. Campos Sales escreveu um livro medíocre, que é mais o relato da campanha republicana paulista. O diário de Getulio é uma sequência de fofocas diárias sem nenhuma visão prospectiva, sem as fontes nem as razões de decisão. O de Juscelino, escrito a quatro mãos, tem altos e baixos. O primeiro volume, sobre sua infância e vida, é primoroso. Os demais são relatos bem escritos, porém mais relativos a Brasília que a ele mesmo. Epitácio Pessoa guardou seu ressentimento na geladeira, como dizia Tancredo – e colocou-o para fora

nos livros de defesa irada do seu governo. Nos Estados Unidos a literatura de como se tomam as decisões na Casa Branca (título de um livro de Theodore Sorensen) é farta. Há uns 25 anos, Michael Nielson, professor da Vanderbilt University e jornalista do Washington Post, publicou um trabalho de profundidade sobre o assunto: A Presidência e o sistema político. Valeu-se de muitas informações de porta-vozes. Chegou a algumas conclusões: os presidentes que perseguiram e desejaram o poder saíam mais fortes do que entravam (veja-se Lula, cá, Roosevelt e Wilson, lá). A inflação dá a base de popularidade dos presidentes. Quanto mais baixa, mais popular. Arthur Schlesinger Jr., a exemplo do que fizera seu pai em 1948 e 1962, classificou, em 1996, depois de ouvidos 719 historiadores, acadêmicos e cientistas políticos, o desempenho dos presidentes norte-americanos – bons, regulares e ruins. Os bons quase sempre eram displicentes quanto à burocracia, se engajavam na liderança e exerciam o poder com energia e desenvoltura. “Idealismo” e “flexibilidade”, avaliados previamente pelo sociólogo Gary Maranell, já não eram importantes para o julgamento final do governo. No fundo, o que pesa mesmo é o que ficou para a História. O circunstancial não conta. Quem sabe, depois deste livro, cada porta-voz ficará tentado a escrever suas memórias da Presidência. Será bom para o Brasil e sua História, baseada em fonte direta.


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 17 de novembro de 2010

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ETNIAS

Olurun Eke e a República incompleta Gilson Caroni Filho SOCIÓLOGO

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o incluir o Dia da Consciência Negra no calendário escolar, a Lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003, não propiciou apenas um resgate da história dos povos negros. Foi bem além. Ensejou a necessidade de um novo olhar sobre culturas que, ao contrário da postulação ocidental, não colocam a questão da Verdade, de conteúdos absolutos e inarredáveis, de essências escondidas atrás de formas ou aparências. Sua riqueza é de outra ordem. E talvez este seja o significado mais profundo do dia 20 de novembro: memória e resistência como possibilidades históricas. Para os que estudam a cultura afro-brasileira, é importante registrar a dinâmica de suas origens. Nelas, observamos uma espécie de culto da forma pela forma, algo como a valorização das dimensões plásticas. Seus mitos, rituais, danças, jogos e orações não re-

metem a quaisquer referências que lhes sejam exteriores, não expressam “outra coisa”, não são aparências de uma essência. Portanto não podem ser “decifrados”, “interpretados” ou “descobertos”, como ainda pretendem algumas de nossas teorias da cultura, herdeiras do ranço etnocêntrico do velho colonizador. É o que apreciamos na aparentemente inconciliável visão de mundo que parece existir em alguns poetas negros, como Solano Trindade (1908-1974). Em versos como “A minha bandeira/ É da cor de sangue/ Olurun Eke/ Da cor da revolução/ Olurun Eke” há uma estranheza que parece apontar para ausência de sentido lógico. Pura ilusão. O que lemos são instantes culturais, sínteses de uma vida vivida, de um artista ao sentir a realidade trágica do que é ser negro, também no Brasil. Na verdade, do ponto de vista dos afro-descendentes, as expressões artísticas são mais para serem percebidas sensorialmente, vistas com a Alma,

O negro brasileiro consegue criar as coisas mais bonitas de sua produção simbólica do que para serem “entendidas”. Existe, portanto, uma defasagem entre aquilo que se quer dizer de um lado, e o que se consegue transmitir na realidade. É exatamente neste espaço que o negro brasileiro consegue criar as coisas mais bonitas de sua produção simbólica e de maior valor para

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sua negritude. Ser negro no Brasil de 2010 é, culturalmente, assumir a Alma Popular: é pensar a partir do ponto de vista do povo. É, sobretudo, estabelecer sintonia ideológica com as classes sociais que foram exploradas durante nossos 510 anos de história. O grande saque que se iniciou com a invasão portuguesa, por causa do pau-brasil, continuou e prosperou até depois da Independência, sempre a beneficiar os brancos. Consolidou-se

com a Abolição/Proclamação da República, e continua até os nossos dias. No terceiro milênio, da perspectiva do negro, a paz, objetivo perseguido por toda a espécie humana, passa necessariamente pela resolução dos problemas que o grande saque, ocidental e cristão, criou para a negritude. No Dia da Consciência Negra, é preciso repudiar a História do Brasil como um suceder de arranjos, combinações, “jeitinhos” em que o conflito nunca aparece ou, se vem à tona, é considerado como “coisa externa à nossa gente”. O processo de desestruturação do mito da “democracia racial” no campo teórico tem avançado muito nos últimos anos. Já no terreno social e da luta política, apesar das políticas públicas implementadas recentemente, o atraso ainda é considerável. Por isso, é necessário resgatar a memória histórica dos negros, em todos os tempos e sentidos. Olurun Eke, para que a República seja proclamada em definitivo.


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 17 de novembro de 2010

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Peças para um bom espetáculo SELEÇÃO BRASILEIRA

Mano Menezes faz seu primeiro teste de fogo contra uma Argentina igualmente cheia de craques


Jornal do Brasil | Segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Maria Lucia Dahl Era apenas um menino... Morto

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uando passei pela Praça Serzedelo Correia, algumas pessoas rodeavam um corpo. Era o de um menino. Coberto por um plástico negro como ele. Alguns lhe descobriam o rosto pra ver o horror da morte. Uns se benziam. Outros passavam reto. Uns tinham pressa. Outros nem se davam conta, absorvidos por pensamentos, buzinas, contas a pagar, enquanto os candidatos só pensam em acusar uns aos outros incriminando Paulo Preto, Erenice. E o menino ali estirado? Ninguém pensa numa solução para ele, não? Quero ouvir falar de moradia, educação. É claro que os roubos devem ser investigados, mas o que quero ouvir nos debates são as propostas de tirar esses meninos da droga, do tráfico. – Marginal! Cheirador de cola! Viciado em cocaína! Gritava uma senhora para o menino morto. Bem-feito. Quem mandou? Uma outra senhora reconheceu-o como o pivete da véspera. Aquele ameaçador que lhe pediu um trocado. – Me dá um trocado? O troco. – Bandido bom é bandido morto. Tomara que sumam também com os outros. Que deixem livre a minha portaria. Moleques! Isso aqui fica assim de mendigos! O porteiro avisou para eles sumirem, mas eles nem ligam. Con-

tinuam pedindo um trocado. O troco. Ora, foram avisados... Mas eles não estão nem aí! Só querem roubar para comprar cocaína, maconha, craque, cola... Por que não vão trabalhar, vagabundos? E fica a gente aqui pagando IPTU pra essa gentinha ocupar a calçada. Não olha para ele não, meu filho – diz a senhora ao seu neto. Finge que não vê. Mas desde sempre que eles foram transparentes, meu Deus ! Quem é que os vê? Quem é que os nota ? Quem é que se importa com eles? O troco. Tardou mas chegou. Esperavam por ele desde a época da escravidão. – Bem-feito! Esse não assalta mais! Menos um. – Vai de Bic? Três por dois? Oferece o vendedor aproveitan-

B Ideias&Livros

mldahl@ter ra.com.br

do o povo que se formou em torno do menino morto. – Poxa! Mas será que vão deixar esse corpo aí atrapalhando o tráfego? Até quando a gente vai ser obrigado a conviver com esse cadáver? Não olha, não, meu filho! Segura esse sanduíche direito. Anda, come, pronto. Lá vem outro pivete. Vamos embora. – Que fome! – Fome nada! Não dou dinheiro nenhum, não! Tudo bandido! Cês querem é comprar cocaína! E a gente aqui pagando imposto! Olha quantos têm ali na porta da igreja! Isso é uma pouca vergonha! Ai de ti, Copacabana! Lá vem eles! Bando de abutres! Anda, meu filho, entra logo na portaria. – Não foi nada, não, Dona Emília. Um pivete que morreu Bandido. Ladrão. Cheirador de cola. Já vão tirá-lo daí. Pronto. Já foi. Já foi tarde! Era só uma criança morta. Coberta por um plástico negro como a sua vida. Sydronio

A Fliporto e a literatura judaica

Antônio Campos

ADVOGADO E ESCRITOR

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ernambuco é o destino brasileiro cujo cosmopolitismo foi decidido desde o principio de sua colonização. Foi o primeiro lugar a organizar-se em torno da cultura. Cultura essa que não era apenas a da cana-de-açúcar, mas do urbanismo, das artes, das ciências. No século 17, mais precisamente entre 1630 e 1654, essa característica marcante da nossa terra se evidenciou. Era esse o famoso tempo dos flamengos, mais conhecidos como holandeses – tão estudados pelo grande historiador José Antônio Gonçalves de Mello. Na constituição dessa rica presença, uma das mais estudadas e decantadas foi a contribuição da cultura judaica. José Antônio, dentre seus inúmeros estudos e pesquisas, fez uma análise sobre a história, formação e costumes dos judeus que vieram para Pernambuco nesse período. Eles, que deixaram traços fortes na história e imaginação pernambucana, marcaram literalmente seus territórios através de construções como a da primeira sinagoga das Américas, ainda existente, na Rua do Bom Jesus. Outra importante recordação dos judeus pernambucanos foi a aventura que os levou, em um pequeno barco, a viajarem pelo Atlântico e construírem uma cidade litorânea, cidade esta que

hoje veio a ser a megalópole Nova York. Na verdade, os judeus sempre estiveram conosco. Desde a chegada dos portugueses ao Brasil com o explorador Pedro Álvares Cabral, Olinda e Recife foram destinos para vários judeus e cristãos novos (judeus convertidos ao cristianismo por medo da Inquisição) vindos da península ibérica (Portugal e Espanha). Graças à influência desses povos aprendemos a cultivar com igual intensidade o amor pela multiculturalidade e pelas

Herdamos a capacidade de vivermos o passado, o presente e as projeções do futuro como um só tempo nossas raízes mais profundas por meio de um forte orgulho regional, a tão aclamada pernambucanidade. Herdamos ainda a capacidade de vivermos o passado, o presente e projeções do futuro de forma integrada, como se fossem um só tempo. Os judeus deram, de fato, uma riquíssima contribuição em vários aspectos, sobretudo à cultura do estado. A inseparável influência deles em nossas identidades ibéricas e transnacionais despertou em nós a necessidade de transpor nosso orgulho pela rica base cultural e ideológica gerada

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por eles. Por isso escolhemos como tema da Fliporto 2010 “A literatura judaica e o mundo ibero-americano”. Dentro desse contexto, a escritora Clarice Lispector é a homenageada da 6ª Festa Literária Internacional de Pernambuco, que será realizada entre os dias 12 a 15 de novembro. Além de ter uma obra literária fantástica, digna de homenagens eternas, Clarice era de família judia de origem ucraniana e viveu no Recife até os 12 anos, tendo morado em um casarão da Praça Maciel Pinheiro, antigo tradicional reduto judeu no centro da cidade. Como história, cultura e literatura andam sempre juntas, a festa, antes realizada na praia de Porto de Galinhas, litoral sul de Pernambuco, muda-se para nossa mágica cidade-patrimônio e primeira capital brasileira da Cultura. Sinônimo de memória e inspiração para artistas plásticos, músicos, compositores e artesãos, Olinda abre suas portas de maneira inigualável para a literatura. A Fliporto, apesar das inúmeras novidades, preserva sua essência e a concepção de que os autores necessitam um “porto” a fim de interagirem com o público local. É através desses portos que esses “literatas viajantes" fazem um escambo de experiências e conhecimento. A natureza, os casarios seculares, a tradição e os ares de cidade colonial fazem do Sítio Histórico de Olinda o porto perfeito para o infinito mar da criação literária.


Jornal do Brasil | Quinta-feira, 18 de novembro de 2010

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Arte Sydronio

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Crianças

invisíveis Estudo mostra que filhos de presidiários são alvo de preconceito em escolas e abandono em abrigos

Os abrigos deveriam ser uma alternativa de moradia para as crianças que foram afastadas dos pais por motivo de violência doméstica, abandono ou prisão dos responsáveis. Em tese, o lugar deveria oferecer proteção aos menores. Na prática, não é bem o que acontece. Uma pesquisa realizada pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo revelou que filhos de presos passam por problemas como preconceito e abandono nos abrigos paulistanos. Pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o abrigo é considerado provisório e excep-

cional, uma forma de transição para posterior colocação das crianças e adolescentes em família substituta. No entanto, a professora Maria José Abrão conta o caso de um jovem de 14 anos que estava no abrigo desde que nasceu. – Pela lei, a criança não deveria permanecer por tanto tempo no abrigo – observa. – Essa não pode ser uma solução, mas uma medida paliativa e de urgência. Segundo Maria, esse mesmo adolescente também relatou situações de preconceito na escola. Colegas faziam brincadeiras por ele ser filho de pre-

sos, e até os professores o tratavam de forma diferente. Segundo Maria, o exemplo do garoto não é raro. Outras crianças e adolescentes que vivem em abrigos sofrem com diferentes tipos de preconceito. Ao visitar alguns desses locais, a professora percebeu que seus dirigentes e funcionários temiam comentar sobre as crianças filhas de pais encarcerados. Maria pondera que os menores acabam sendo penalizados e estigmatizados pelo crime cometido pelo pai ou pela mãe. Esse preconceito também seria responsável por uma dificuldade maior para que as crianças fossem adotadas. Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, o que diferencia um abrigo de um internato é que o primeiro deve preservar os vínculos familiares das crianças e não pode privá-las de liberdade. Apesar disso, as crianças e adolescentes que conversaram com a professora disseram que não tinham contato com os pais. Somente em um dos abrigos visitados o dirigente admitiu

que uma vez levou as crianças para visitarem seus pais na prisão, mas ele disse que a experiência não deu certo. – A criança não escolhe se quer visitar os pais, é o adulto quem decide o que ela deve fazer – comenta Maria. – Os abrigos estão mais preocupados com o status de presidiários dos pais do que com sua condição de responsáveis pela criança. A professora vê pouca preocupação nas autoridades com o cuidado destinado aos filhos de presidiários. – As crianças filhas de pais presos são invisíveis, socialmente falando: pouco se sabe o que elas pensam, quem são, quantas são e onde estão. Da Agência USP


Jornal do Brasil | Terça-feira, 19 de outubro de 2010

Arte Sydronio

CORPO HUMANO

A parcialidade do

horário de verão

Pesquisadora explica por que a mudança afeta mais umas pessoas do que outras O horário de verão começou no fim de semana, adiantando os relógios em uma hora. Se para algumas pessoas isso significa uma hora a mais de dia claro, para outras é sinônimo de sonolência e mau humor. Isso ocorre porque a mudança não ajusta somente os relógios que temos à nossa volta, mas altera também o nosso relógio biológico. Pesquisadora do Laboratório de Educação em Ambiente e Saúde do Instituto Oswaldo Cruz, Lúcia Rotenberg explica que o corpo apresenta diversos ritmos biológicos, fenômenos que se expressam de maneira periódica, indo desde a secreção de um hormônio até um comportamento – como o sono e a vigília. Estes ritmos são controlados por uma estrutura do sistema nervoso (o núcleo supraquiasmático) localizada no hipotálamo anterior, região do cérebro que atua como centro integrador das atividades dos órgãos. Essa estrutura é denominada de “relógio biológico”, já que é responsável pela temporização das funções biológicas.

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Características herdadas geneticamente e informações cíclicas do ambiente interferem no nosso relógio biológico. Em condições normais, ele está adaptado ao ambiente externo. No entanto, quando o ambiente se modifica – como no horário de verão –, o organismo também precisa se ajustar. É o mesmo fenômeno que ocorre quando cruzamos fusos horários. – Os horários que regulam nossas vidas, como parte do ambiente social onde estamos inseridos, sem dúvida interferem no nosso relógio biológico – sintetiza Lúcia. Mas, se todos têm relógios e ritmos biológicos funcionando de forma semelhante (somos uma espécie diurna), por que a mudança para o horário de verão afeta bastante algumas pessoas; e outras, não tanto? A cronobiologia é que dá esta resposta.

– A forma como cada pessoa vivencia as alterações de horário depende da característica genética de cada um, pois há cronotipos diferentes – explica a pesquisadora. – Algumas pessoas são do tipo com maior predisposição genética para realizar suas tarefas bem cedo. Essas pessoas têm o relógio biológico adiantado e, por isso, tendem a dormir cedo e levantar cedo. Outras são vespertinas, ou seja, tendem a dormir tarde e acordam mais tarde. De acordo com a especialista, a tendência matutina ou vespertina também se expressa em outros ritmos biológicos, como o ciclo de temperatura corporal. – O pico de temperatura do corpo é atingido mais cedo pelos matutinos do que pelos vespertinos – destaca. A pesquisadora explica que as pessoas matutinas costumam sofrer mais com a alteração do horário. Há indícios de que pessoas que dormem pouco também apresentariam maior dificuldade em relação à adoção do horário de verão. – Enquanto o organismo não se ajusta completamente ao novo horário, as pessoas se sentem mais irritadas, com sensação de cansaço e sono durante o dia – ressalta. – No entanto, este desconforto fica restrito aos primeiros dias, e as maiores queixas costumam ir embora uma semana depois da introdução do novo horário. Da Agência Fiocruz


Jornal do Brasil | Terça-feira, 21 de dezembro de 2010

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CULTURA

Poesia nas ruas Arnaldo Niskier

DOUTOR EM EDUCAÇÃO

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or uma natural associação de ideias, lembrei-me dos anúncios que enfeitavam os bondes do Rio de Janeiro. Quem tinha o privilégio de sentar nos seus bancos de madeira poderia distrair a vista em reclames (como eram chamados, na época) de bom gosto, alguns dos quais tornaram-se célebres, como o do Rhum Creosotado: “Veja o ilustre passageiro/ O belo tipo faceiro/ Que o senhor tem ao seu lado/ Mas no entretanto acredite/ Quase morreu de bronquite/ Salvou-o o Rhum Creosotado”. Mesmo que a bronquite pudesse piorar com o emprego equivocado do “no entretanto”, era um versinho de fácil apreensão e cumpria o seu papel de fazer propaganda do produto da moda. Agora, por iniciativa do acadêmico Marcos Vilaça, presidente da Academia Brasileira de Letras, preocupado em aproximar a instituição cada vez mais do povo, a poesia pega carona nos 8.600 ônibus da ci-

dade. A parceria com a Rio Ônibus prevê a fixação de cartazes no interior dos veículos, com a divulgação de obras de poetas brasileiros. A primeira leva selecionou trabalhos de Machado de Assis, Olavo Bilac, Coelho Neto, Gonçalves Dias, Luís Guimarães Jr., Raimundo Correa, Cruz e Souza e Mário Pederneiras, dentro de um projeto cultural denominado Circulando Cultura. “A poesia nos ônibus é importante como elemento motivador, porque provoca uma leitura prazerosa. A curiosidade de ler um poema enquanto viaja pode estimular, quem sabe, a procura por um livro”, comentou o acadêmico Domício Proença, que colaborou na difícil seleção das primeiras oito obras de um total de 400 poemas, todos eles de domínio público. Diariamente, cerca de 3,5 milhões de pessoas são alcançadas pela iniciativa. Os textos serão trocados de dois em dois meses, sempre com o mesmo objetivo de estimular a leitura dos livros desses autores consagrados.

Ar te/Sydronio

Todo dia, cerca de 3,5 milhões de pessoas são alcançadas com textos, trocados de 2 em 2 meses Por serem autores de outras épocas, é comum os passageiros matarem as saudades dos tempos da infância, com a leitura, por exemplo, do Círculo vicioso, de Machado de Assis: Bailando no ar, gemia inquieto um vagalume: “Quem me dera que fosse aquela loura estrela/ Que arde no eterno azul, como uma eterna vela!/ Mas a estre-

la, fitando a lua com ciúme:/ Pudesse eu copiar o transparente lume...”. Ou recordar Coelho Neto, com o seu imbatível Ser mãe: “Ser mãe é padecer num paraíso...”. Chegar a Raimundo Correa: “Vai-se a primeira pomba...”. Experimentar o gosto do parnasianismo de Olavo Bilac, o príncipe dos poetas brasileiros, com o seu Soneto. Sentir a Piedade, de Cruz e Souza, ou percorrer o Suave caminho, de Mário Pederneiras; acompanhar Luís Guimarães Jr. na sua Visita à

casa paterna, para finalmente vibrar com a famosa Canção do exílio, do poeta maranhense Gonçalves Dias: “Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá, as aves que aqui gorjeiam, não gorjeiam como lá”. Em breve, virão outros poetas, igualmente inesquecíveis, que irão enfeitar o interior dos nossos ônibus, levando cultura ao povo. Arnaldo Niskier é membro da Academia Brasileira de Letras e presidente do CIEE/Rio


B Numa folha Ivan LIns tinha um caderno de ideias perdido semana passada durante um assalto – como ele, muitos artistas da MPB têm seus segredinhos para não ver a inspiração escapar

MÚSICA

qualquer...

Jornal do Brasil | Domingo, 24 de outubro de 2010

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Jornal do Brasil | Domingo, 26 de setembro de 2010

DOUTRINA CATÓLICA

POLÍTICA

A quem servimos Dom Orani João Tempesta, O. Cist. ARCEBISPO DO RIO DE JANEIRO

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estes domingos, a Palavra de Deus nos mostra questões importantes com relação ao ensino social da Igreja e também com relação ao sentido último de nossa vida, perguntando-nos a quem queremos servir. Isso devido ao desenfreado encaminhar da vida para a posse de bens como se fosse a razão única da vida humana. Todos nós somos envolvidos por grandes preocupações diárias. O acúmulo das horas para o acúmulo de dinheiro é uma constante em nossas vidas. Mas será esse o destino final da vida? A correria para ganhar e acumular bens, como nos ensina a sociedade, e ao mesmo tempo vendo que a ideologia atual tem levado a grandes insatisfações e ao crescimento da violência. O fim último de nossa vida tem que ir além disso tudo. Devemos notar que o nosso senso de justiça está sempre envolto em nossas próprias preocupações. O nosso senso de justiça é individualizado. Temos muita dificuldade em nos sentirmos em coparticipação. Há toda uma atmosfera de egoísmo que nos envolve, que toma conta de nós. A divulgação por todos os meios desse tipo de sociedade leva as pessoas a encaminharem toda a sua existência para esse tipo de vivência. As preocupações com o dinheiro e o poder tomam conta de nossas vidas e ocupam a maior parte de nosso tempo. A vida é

muito mais do que o acúmulo progressivo e constante do dinheiro, da propriedade, do conhecimento ou mesmo do prazer. Esta busca incansável ocupa nossa vida e nos deixa em estado de agitação e de angústia existencial. É claro que temos necessidade de possuir, crescer no conhecimento, progredir – a diferença está em quem colocamos a razão do nosso viver. Claro que o esforço é necessário para alcançarmos o que a sociedade nos oferece como ideais de vida, mas este esforço não nos conduz ao grau de satisfação que buscamos. A dinâmica da vida vem antes da busca pela riqueza, pelo poder e pelo prestígio. Esses acabam por transformar a existência numa busca sem fim e nunca nos satisfazem por completo. Jesus quer que não nos acomodemos com esta busca desenfreada, mas que ganhemos a experiência da vida plena em Deus. Esta sede infinita que tenta se satisfazer pela posse não é exclusiva de uma classe social ou mesmo de um sistema econômico, mas encontra-se no SER do homem. O sistema em nossa volta tem, entretanto, o poder de nos seduzir. Os apelos pelo TER desenvolvem essa tendência pelo acumular. Aí, sim, entra em choque o nosso discernimento. Queremos preencher um vazio interior do sagrado pela posse das coisas. A ganância e a ânsia pelo ter são drogas aprovadas, socialmente falando. Embriagam-nos e nos entorpecem, impedindo-nos de ver a realidade do transcendente em nossa vida. Jesus nos quer atentos a isso.

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Que peão é esse? Sydronio

Eduardo Henrique Dantas

ENGENHEIRO DE TRANSPORTES/COPPE/UFRJ

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Numa sociedade onde a busca monstruosa pelo dinheiro é predominante, não há espaço para Deus. Só para os clientes, para a venda, pelo mercado, pelo sucesso, pelo lucro fácil. Não percebemos a riqueza em Deus, mas somente a riqueza na conta bancária. Devemos acreditar que hoje o mais urgente é a vida plena que Deus quer nos proporcionar. O nosso trabalho justo e honesto

O trabalho não pode ser uma busca apenas pelo ter, um desespero exagerado pelo acúmulo de dinheiro, prazeres não pode ser uma busca apenas pelo ter, um desespero exagerado pelo acúmulo de coisas, dinheiro, prazeres. Nosso trabalho deve ser humanizado. Não pode ser apenas baseado no sucesso comercial, mas no crescer como pessoa. Somente um mecanismo de sucesso deve nos mover: alcançar a plenitude do ser humano aos olhos de Deus.

Evidentemente que a situação que hoje vivemos vem de longe. Vide, por exemplo, a situação ambiental na degradação total do meio ambiente, o desaparecimento de florestas, a poluição da atmosfera, a extinção de espécies biológicas. Chega um momento em que o homem quer “derrubar celeiros e construir outros ainda maiores”. A situação ambiental é sinal, é reflexo desta busca desenfreada e desmedida pelo ter. Temos que abrir espaço para Deus em nossa vida. Ao final, seremos julgados pelo nosso bem ao outro e não pelo dinheiro armazenado, acumulado. Pensemos nisso. O que vamos dizer a Deus quando chegarmos a sua presença e nos apresentarmos? As mãos vazias de amor ou o dinheiro inteiro que conquistamos? Viver com os olhos voltados para o transcendente nos faz mais justos e felizes desde agora. Não podemos ficar “em cima do muro”. Não podemos servir a dois senhores. Pensemos muito sobre isso, e façamos uma reflexão a respeito do primeiro mandamento: amar a Deus sobre todas as coisas!

a reta final da campanha, o presidente Lula retoma aquele tom revolucionário de outras eleições. O “Lulinha paz e amor” já não frequenta mais os palanques, pois o outro – aquele que é parceirão de Fidel Castro, Hugo Chávez e Ahmadinejad, que vê a democracia como um ambiente que precisa de controle para veicular o que o governo quer, e que quer extinguir os partidos que lhes fazem oposição – bem, esse outro é o que está no comando. Sua indumentária reincorpora o vermelho e a estrela, que simbolizam o pensamento radical de esquerda, e o reaproximam, no momento certo, das massas que empunham bandeiras e frequentam os palanques, cujos líderes estão encastelados no poder, sugando recursos de toda a ordem, inclusive desonestos, em larga escala. E o que diz o presidente Lula, após dois governos de excelente aceitação pelo conjunto dos brasileiros: não querem que este peão dê certo! Que peão é esse a que Lula se refere? Será que é daquele trabalhador braçal, que, limitado pela falta de instrução, consome toda sua força física cortando cana, fazendo a roça, limpando as cidades? Será que ele se refere ao trabalhador que não é ouvido pela organização em que trabalha? Ou, ainda, será que ele se refere aos mais pobres? O Lula, que venceu José Serra, era dono de um partido político, o PT, não fazia trabalho braçal, e era ouvido por toda a organiza-

ção, tanto que sua vitória veio na quarta tentativa, e seu trabalho lhe rendeu recursos que lhe permitiam, à época, morar em uma cobertura duplex e ter um “sitiozinho” para descanso. Definitivamente, Lula e sua família estão muito bem financeiramente, mas ele prefere ver-se como um peão revolucionário, que vai juntar as foices para combater a burguesia. Isso é muito conveniente, pois o mesmo povo de Lula, que é a opinião pública, segundo diz, vive o paradoxo de ter ascendido economicamente sem ter ido a lugar nenhum, pois o Bolsa Família é um peixe que lhe entregam de um mar que pode não estar pra peixe daqui a algum tempo. Em algum momento, as pessoas terão que se defrontar com a verdade, não essas bravatas confessas de um cara que já foi peão, mas a farsa que se apropria do trabalho dos outros, que se aproveita do ambiente sustentável para desconstruí-lo, paulatina e vagarosamente, que deturpa o ideal das pessoas que imaginavam um projeto de governo praticando um projeto de poder, que subverte o maior valor da cidadania, a ética, para depois confundir limitações humanas com absoluta falta de discernimento. A verdade é que todas as pessoas decentes desejam um belo futuro para todos, pois não querem que ninguém se acomode em ser um eterno peão, muito menos, cego, mentiroso, manipulador, antiético, hipócrita e autocrata, pois esse peão em que qualquer um pode se transformar sempre cai do cavalo que não é seu.


Jornal do Brasil | Segunda-feira, 25 de outubro de 2010

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Arte Sydronio

TECNOLOGIA

TV com

vermelho, verde, azul e preto. Eles descobriram que os impulsos que duravam um décimo de segundo produziam aromas fugazes de hortelã, laranja, canela, lavanda, maçã e baunilha. Diferente das máquinas dos anos 60, o cheiro da tinta da impressora dura apenas duas respiradas humanas, permitindo que um cheiro diferente seja ativado. A equipe está procurando agora uma forma de juntar os cheiros às imagens. Se conseguir, uma única impressora poderia ser usada para imprimir o papel e emitir odores, diz a equipe.

Cientistas japoneses chegam cada vez mais perto de inventarem a televisão aromática

Gerador de cheiros

Cientistas estão desenvolvendo um aparelho que libera aromas que se combinam com imagens na tela de uma televisão ou do computador. O dispositivo no estilo Smell-O-Vision irá liberar cheiro de comidas sempre que um chef servir um prato na televisão, ou o cheiro de algodão doce quando uma pessoa assistir ao vídeo de um parque de diversões. Ele ainda poderá reproduzir o cheiro do mar quando olharmos para as fotos das

nossas férias no computador. O aparelho é uma invenção de pesquisadores japoneses que adaptaram uma impressora para produzir doses precisas de aroma. Apesar de a invenção estar ainda em fase inicial, os criadores acreditam que ela poderia revolucionar o modo pelo qual vemos televisão ou apreciamos fotografias antigas. Experimento antigo

Filme com cheiro não é algo novo. A tecnologia foi experimentada em 1960 em cinemas equipados com Smell-O-Vision – sistema que respingava perfume durante cenas chaves do filme Scent of mystery (Cheiro de mistério). Contudo, o aparelho – que podia liberar 30 cheiros diferentes – era barulhento e não agradava ao público que reclamava que os cheiros demoravam muito tempo a passar. Tempos depois, um

sistema rival, chamado AromaRama, também não teve muito sucesso. O novo dispositivo foi criado parar emitir aromas de forma mais precisa. Kenichi Okada da Universidade de Keio, em Tóquio, contou que está usando a técnica das impressoras para ejetar pequenas porções do material a fim de conseguir um controle preciso. Impressoras funcionam quando um impulso elétrico esquenta uma bobina de fio e cria uma bolha, levando uma pequena quantidade de tinta de um tubo para a página, em alta velocidade. A equipe japonesa adaptou uma impressora para esguichar quatro aromas no lugar das tintas nas cores

Reprodução de Internet

cheiro ANOS 60 – A técnica foi experimentada em cinema dos EUA, mas sem sucesso

Stephen Brewster, da Universidade de Glasgow, na Escócia, estuda o modo como as pessoas usam computadores. Segundo Brewster, a tecnologia poderia ter implicações que vão além do entretenimento. Ele estuda formas de ajudar pessoas com problemas mentais mais sutis a lembrar que elas precisam tomar remédios ou comer. – Um cheiro forte de comida pode fazer isso, mas nossa tecnologia é bem básica, girando um ventilador sobre um feltro com aroma – explica Bewster. – Precisamos de uma forma melhor de fazer o mesmo. Um gerador de aromas de propósito geral, contudo, ainda está muito longe de aparecer. – Não sabemos ainda como sintetizar todos os cheiros que pretendemos – acrescenta. – Não há vermelho-verde-azul para cheiros. Existem milhares de componentes necessários. Você não pode sintetizar framboesa de um chocolate. Tradução: Maíra Mello


Jornal do Brasil | Segunda-feira, 27 de setembro de 2010

TEOLOGIA

JUSTIÇA

Bento XVI no Reino Unido Sydronio

Maria Clara Bingemer TEÓLOGA E PROFESSORA DA PUC

Constitucionalidade da Ficha Limpa Dalmo Dallari PROFESSOR E JURISTA

T

alvez poucas visitas papais de Bento XVI hajam sido cercadas de expectativas negativas como sua recente passagem pela Inglaterra, sede viva e ativa do catolicismo de protesto. Pela cidade viam-se cartazes contra a visita do papa. Reinava um clima terrível decorrente dos recentes escândalos de pedofilia entre o clero, com inúmeros e graves casos em território britânico, que se somavam às reivindicações em favor da ordenação de mulheres, do casamento entre homossexuais, do uso de anticoncepcionais etc. Como se não bastasse, a mídia abria fogo diariamente contra o peso dos custos da visita no bolso do contribuinte inglês. Bento XVI desembarcou em um país líder do secularismo antirreligioso, antimonoteista e até mesmo anticristão. A Inglaterra desempenha papel de liderança no processo de secularização inapelável da Europa que tanto atormenta o Papa. E a visita se propôs a ser pastoral, a primeira desse teor na Inglaterra desde o cisma de 1533. No entanto, o Papa deixou a Inglaterra com um saldo sobretudo positivo, mesmo diante dos céticos e incrédulos que esperavam o pior. Creio que os pontos chaves do sucesso da visita foram dois: o primeiro, sem duvida, as palavras claras e sem tergiversação com as quais se dirigiu às vítimas da pedofilia. Chamou as coisas pelo nome: sofrimento imenso, tortura, crime inqualificável, vergonha e humilhação para a Igreja que, com esses tristes fatos, tem sua credibilidade moral minada. E recorrendo a Newman, por quem sente grande

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O admiração e a quem beatificou no O mais espantoso, porém, é o fato decurso da visita, recordou que os de que, naquele espaço, Bento XVI padres não são anjos, mas sim homens haja dito tudo que queria, sem agrescomo todos os outros. E, portanto, sividade, mas com firmeza inarredápecadores, falíveis, muitas vezes in- vel. Inclusive louvar a figura de Thodignos da missão sacerdotal. Carinho- mas More, santo católico que morreu samente rezou com as vítimas, pediu por não aceitar a separação da Inperdão, prometeu seguimento da to- glaterra da comunhão católica. E tulerância zero para com os pedófilos. do isso enquanto implorava textualO segundo foi a postura ecumênica, mente a união entre os cristãos. Se clara e incontestável. refundação não houNão se pode dizer que ve, acredito que se poBento XVI veio com Ele deixou a Inglaterra de falar de uma reaarrogância e autossu- com um saldo positivo, firmação do cristiaficiência. Os ingleses mesmo diante dos nismo histórico em tiveram diante de si a céticos e incrédulos, pleno coração da sefigura de um peregricularização. que esperavam o pior no humilde e com real Não sei se o catodesejo de diálogo. licismo saiu venceCreio não se poder afirmar como al- dor. Nem creio que isso seja o mais guns comentaristas britânicos que importante. O Evangelho foi proclahouve uma refundação católica da mado e testemunhado. E isso sem Inglaterra. Parece-me certo exagero. dúvida é o que se deseja ou, pelo Mas o fato de o Papa entrar na Abadia menos, o que se deve desejar. de Westminster, sede da monarquia e da Igreja da Inglaterra, como proClara Bingemer é autora de ‘Argila e o tagonista da cerimônia já é suficien- Maria espírito – Ensaios sobre ética, mística e temente espantoso sem as hipérboles poética’ (Ed. Garamond), entre outros livros. (wwwusers.rdc.puc-rio.br/agape) da mídia.

Supremo Tribunal Federal acaba de proferir julgamento de recurso que tinha como base a alegação de inconstitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, questionando, inclusive, a constitucionalidade de sua aplicação às eleições deste ano. O Brasil inteiro pode acompanhar a sessão de julgamento, que foi transmitida pela televisão, verificando-se que o tema foi amplamente debatido pelos dez Ministros, que deram os fundamentos de suas convicções e, depois disso, proferiram os seus votos. No final, registrou-se que cinco membros do Tribunal votaram contra a alegação de inconstitucionalidade e cinco votaram a favor. Houve, portanto, em números absolutos, um empate na votação, o que tem levado à interpretação, juridicamente equivocada, de que o julgamento terminou num impasse, não tendo havido decisão. Na realidade, em termos jurídicos não ocorreu o impasse e houve, sim, uma decisão do Tribunal, rejeitando a alegação de inconstitucionalidade. Com efeito, nos termos expressos do artigo 97 da Constituição, para declarar a inconstitucionalidade de uma lei é necessária a manifestação favorável de, pelo menos, a maioria absoluta dos membros do Tribunal. Neste momento, o Supremo Tribunal tem dez membros, havendo uma vaga, resultante da aposentadoria do Ministro Eros Grau. Ora, para se atingir a maioria absoluta dos dez membros seriam necessários seis votos e somente cinco Ministros votaram acolhendo a alegação de inconstitucionalidade, o que significa que tal alegação foi rejeitada. Assinale-se, desde logo, que é juridicamente errada a interpretação se-

gundo a qual o julgamento terminou num impasse, por ter havido empate na votação. De fato, todos os Ministros que atualmente compõem o Tribunal proferiram o seu voto e assim o julgamento foi concluído, não restando qualquer dúvida quanto à posição de cada Ministro e o resultado final da votação. A alegação de inconstitucionalidade da Lei da Ficha Limpa não foi acolhida por Ministros representando a maioria absoluta dos membros do Tribunal, o que significa que tal alegação foi rejeitada, concluindo-se desse modo a votação, sem que tenha havido impasse. Isso ocorreu com ampla publicidade e o Brasil inteiro conhece o resultado da votação. Terminada a votação cabia ao Presidente do Tribunal proclamar o resultado da votação, o que não foi feito, gerando a impressão de que o julgamento não estava concluído. De fato, colhidos os votos de todos os participantes do julgamento, que eram a totalidade dos atuais integrantes do Tribunal, só restava a proclamação formal do resultado da votação, que deveria ter sido feita pelo Presidente. Isso não foi feito, provavelmente porque, em vista das repercussões políticas e do grande interesse público, o Presidente preferiu redigir a proclamação com maior cuidado, mas, evidentemente, ele não poderá, na proclamação formal, alterar o resultado da votação, que foi pública e clara, rejeitando a alegação de inconstitucionalidade. Com esse resultado, os casos pendentes nos Tribunais questionando a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa poderão, eventualmente, dar ensejo a novo julgamento pelo Supremo Tribunal, mas enquanto isso não ocorrer a lei está em pleno vigor, devendo ser aplicada sem qualquer restrição sempre que ocorrer uma das hipóteses de inelegibilidade previstas na Lei da Ficha Limpa.


Jornal do Brasil | Quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Campanha tenta reduzir impostos para apenas 7%

JOGOS ELETRÔNICOS

Brasil cada vez mais próximo do

game over

Com impostos que dobram preço final no país, mercado favorece a pirataria Jorge Lourenço

Como um videogame que custa US$ 290 (pouco mais de R$ 500) nos Estados Unidos chega às lojas brasileiras custando R$ 2 mil? Essa é a pergunta que apaixonados por jogos de computador se fazem todos os dias. Hoje, antes de chegar ao país, um console recebe uma avalanche de impostos que ultrapassa os 100%: 30% de Imposto de Importação, 50% de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), 9,25% de PIS/Cofins e 18% de ICMS. Isso sem contar a margem de lucro que as importadoras tiram das vendas. No total, a tributação para trazer um aparelho para o país é maior do que a de máquinas de jogos de azar. Toda a cobrança faz com que os consumidores recorram à pirata-

ria. Hoje, segundo a Associação Brasileira de Desenvolvedores de Jogos Eletrônicos (Abragames), cerca de 90% dos jogos entram no Brasil de maneira ilegal. Isso sem contabilizar os milhares de downloads feitos em servidores de alta velocidade, como nas redes P2P. – O Brasil é um mercado de altíssimo potencial para videogames – observa Rafael Gómez. Ele é presidente da companhia panamenha Lamatel, que representa a Nintendo no país. – O problema é que muita coisa precisa ser resolvida para que alcancemos nossos objetivos aqui. O que Rafael Gómez diz não é pura demagogia. Segundo dados do International Development Group (IDG), entidade voltada apenas para pesquisas sobre videogames, o Brasil tem potencial

para se tornar um dos 10 maiores mercados do mundo se adaptar a sua legislação. A situação brasileira é muito semelhante à do México no fim dos anos 90. Assolado pela pirataria e cobrando altos impostos para importação de eletrônicos, o país reduziu os encargos sobre os jogos. Hoje, o mercado mexicano de videogames, que tem um potencial inferior ao brasileiro, é responsável por 2% das vendas mundiais. O Brasil responde por 0,5%. Representante da Sony no Brasil e responsável pelo Projeto Playstation no país, Anderson Gracias lembra que uma reclassificação dos videogames para outra categoria de tributação faria os preços caírem muito no país. – Meu produto não é um jogo de azar, é um produto familiar – justifica Gracias.

O Brasil é um mercado de altíssimo potencial para videogames.O problema é que muita coisa precisa ser resolvida antes Rafael Gómez, dono da empresa que representa a Nintendo no país

O importante é mostrar ao como impostos menores podem expandir a indústria, gerar empregos e atrair investimentos para o Brasil Moacyr Alves, idealizador da campanha Jogo Justo

Sucesso na internet, a campanha Jogo Justo vem tentando mudar o panorama da indústria de videogames no Brasil. Iniciada pelo empresário Moacyr Alves, ela pretende reduzir o total de impostos em casacata de 80% para 7%. – Essa indústria é milionária lá fora. Eles não apenas passaram Hollywood, mas dobraram – lembra Moacyr. – Este ano, os videogames movimentaram US$ 60 bilhões nos EUA, enquanto a indústria cinematográfica ficou nos US$ 30 bilhões. Com o apoio de empresas e políticos, Moacyr conseguiu mobilizar o setor, mas não sabe precisar quando o projeto renderá frutos. – O que posso dizer é que temos dois deputados muito engajados na questão, mas não dá para saber quando isso vai acontecer – explica. – O importante é conscientizar o governo sobre como uma tributação menor seria benéfica para o Brasil nesse sentido. Geraria empregos na área de desenvolvimento e traria investimentos das grandes empresas do ramo. Mudar a cabeça do consumidor, que precisa concordar em deixar de comprar jogos piratas ou baixá-los na internet, é o menor dos desafios para ele. – Se baixarmos o preço, tenho certeza de que os gamers vão aderir. As empresas dão benefícios para quem usa jogos originais, e você não tem a preocupação de danificar seu aparelho.

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Indicadores

Juros

Selic (meta/efetiva % a.a)..........................10,75%/11,18% a.a CDB pré 30 dias..........................................................7,80/10,65 CDB pós 120 dias..................................................... 9,50/10,50tr DI Over taxa média.......................................... 10,63% a.a DI Over taxa média(a.m.).........................................1,20% Swap DI x pré 30 dias .......................................... 10,60/10,70% a.a Swap DI x pré 62 dias .......................................... 10,55/10,65% a.a Swap DI x pré 90 dias .......................................... 10,60/10,70% a.a Taxa Anbid 1 dia Para 27/09/2010.......................................... 10,54% a.a

Poupança

29/09/2010......................................................0,5706%

TR (%)

25/09/2010 a 25/10/2010 0,0069%

TR (%)

26/09/2010 a 26/10/2010 0,0357%

TR (%)

27/09/2010 a 27/10/2010 0,0702%

TBF (%)

25/09/2010 a 25/10/2010 ............................. 0,7370%

TBF (%)

26/09/2010 a 26/10/2010 ............................. 0,7760%

TBF (%)

27/09/2010 a 27/10/2010 ............................. 0,8207%

tjlp (% a.a.)

De 1º/07/2010 a 30/09/2010 ................................6,00

Ouro

Ouro (g) BM&F ................................................R$ 73,501 Ouro (onça troy*) NY ................................US$ 1.308,600 *1 onça troy = 31,103 g

Bolsas

Bovespa - Índice ..............................................69.227,63 Bovespa (var. %) ...................................................... 0,60 Nasdaq - Índice ..................................................2.379,59 Nasdaq (var. %) ........................................................ 0,41 Nova York - Índice ............................................10.858,14 Nova York (var.%) ..................................................... 0,43

Câmbio/Dólar (R$/US$*)

Ptax**.................................................... 1,7085/1,7093 Paralelo ..................................................1,7600/1,8600 Cabo (BC) ..............................................1,6870/1,7330

Turismo

São Paulo................................................1,6300/1,7700 Rio.......................................................... 1,6400/1,8000

Euro*

US$/¤................................................. 1,35770/1,35780 R$/¤........................................... 2,3196305/2,3208875

Peso argentino*

$/US$ ................................................3,97200/3,97300 R$/$ ..........................................0,4300277/0,4303374 *Compra/venda **Taxa média do Banco Central

Mais informações no site www.jb.com.br


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