sócia
01 A N O # 1 M A I 2 0 ASSOCIAÇÃO DAS COLECTIVIDADES
de todas as coletividades.
DO CONCELHO DA FIGUEIRA DA FOZ
40
VISÕES
PARA A DÉCADA M O V I M E N T O
MIGUEL PEREIRA EM ENTREVISTA
A S S O C I A T I V O
RICARDINA LORIGO Do palco para o
O pelouro das
hospital: "A vida tem
coletividades é "uma
coisas guardadas
moto topo de gama"
para nós"
CONTROVERSOS A opinião sem tabus sobre temas polémicos no seio das coletividades
ORDEM DE TRABALHOS E D I T O R I A L
A NOVA SÓCIA R I C A R D O
12>15 RICARDINA LORIGO
S A N T O S
Na linha da frente do combate à COVID-
A capacidade de nos deslumbrarmos com as coisas simples, com o restolho, com as pedras da calçada, com o movimento das copas, com o silêncio das portas
19,
a
enfermeira
Ricardina
revela-nos
o
que leva do palco da coletividade para os corredores do hospital.
16>18 AS COLETIVIDADES
que se fecham e abrem a todo o instante, é, porventura, o mistério dos dias felizes. Nas coletividades cultivamos, como em poucos lugares, a filosofia dessa (re)descoberta. De nós e dos outros.
A partir da contextualização histórica, percebemos
Sem a poesia destas palavras, mas com a rudeza dos
por
dias, com calos e palavrões, com esperança e
conceitos umbilicais para o movimento associativo.
ansiedade, animados pela presença de todos aqueles
Uma investigação de Frederica Jordão.
que
que, mesmo sem essa consciência, partilham desse
de alimentar e entreter “o bichinho” que se entranha em nós.
a
instrução
e
a
beneficência
são
22>25 CONTROVERSOS
esforço coletivo de servir a comunidade.
Diria o meu avô que nada mais é do que a necessidade
razão
Um engenheiro, uma psicóloga e um jornalista, com ligações
díspares
confrontados
com
ao
associativismo,
perguntas
controversas
no
são seio
das coletividades.
Em tempos de pandemia, em que vivemos numa
26>29 RUI FÉTEIRA, O POETA
espécie de distopia, as nossas coletividades fecharam as portas para impedir a entrada do vírus. Alinharam na narrativa do “fique em casa”, numa rendição
Professor,
forçada e garantidamente temporária.
ator
projeto de comunicação associativa.
30>32 SOPHIA, EDUCAR PELA DANÇA Sophia
Gil,
responsável
e
Esta revista tem nome de mulher, porque, citando
coreógrafa do 'Vaisah Dançar',
Balzac, “a mulher é o ser mais perfeito entre as
revela-nos como a dança pode
criaturas; é uma criação transitória entre o homem e o
ser agente de ativação social.
anjo”. Não temos a pretensão de fazer esta publicação tão perfeita quanto as mulheres, mas ninguém nos tira a ousadia de a tratar com o mesmo enlevo.
Sabíamos que não queríamos um produto de fast-food. Queríamos fazer algo que perdurasse no tempo, que pudesse ser guardado na gaveta (ainda que digital)
associativo, genuinamente
ligações simbióticas entre as artes.
potenciadores de mudança. Aproveitando o momento
idealizou, concebeu e trouxe à luz do dia um novo
mas
poeta, numa conversa que cruza as
As revoluções são, por definição, momentos
de exceção, a Associação das Colectividades
dirigente
acidental,
34>37 AMBIÇÃO DE CAMPEÃO José
Fonseca
é
o
treinador
do
Figueira Volei Clube e explica-nos como
a
modalidade
tem
conquistado adeptos no concelho.
para consultar mais tarde, para se ir lendo devagarinho
38>79 40 VISÕES PARA A DÉCADA
e sem pressa.
Sabíamos que não queríamos uma revista que apenas compilasse a nossa atividade ou a das nossas associadas. Queríamos mais. Queríamos conhecer as pessoas que fazem o associativismo: quem são, como são, o que fazem. Queríamos conhecer melhor as instituições: como nasceram, o que fazem, para onde vão. Intimamente, num desejo inconfesso, ansiávamos por despertar o interesse mesmo daqueles que não têm ligação ao mundo associativo.
Queríamos e ansiávamos tudo isto. Depois fizemos a SÓCIA, "a revista de todas as coletividades".
Desafiámos 40 personalidades, com e sem ligações ao movimento associativo, para que nos dessem a sua visão sobre a próxima década. Como estaremos em
2030?
Como
lá
chegaremos?
Que
oportunidades e desafios se colocam à sociedade e em
particular
às
coletividades?
As
respostas
aí
estão. Um dossier para voltar a ler em 2030.
80>89 ENTREVISTA: MIGUEL PEREIRA Uma
grande
entrevista
com
o
vereador do pelouro das coletividades
O tempo nos dirá se o fizemos bem feito.
da
Câmara
Foz. que
Fique
Municipal a
da
conhecer
interessam
ao
Figueira as
da
questões
movimento
associativo e as respostas do autarca figueirense.
Diretor da SÓCIA e vice-presidente da
Associação das Colectividades do Concelho da Figueira da Foz
SESSÃO DE ABERTURA
A IDADE ADULTA A N T Ó N I O
A
R A F A E L
Associação
Figueira
da
das
Foz
Colectividades
comemorou
a
5
do
de
Concelho
maio
o
seu
da 19.
º
aniversário.
Entrámos
definitivamente
na
idade
adulta.
A
experiência adquirida, o conhecimento do terreno e a confiança
que
em
nós
deposita
o
movimento
associativo concelhio dão-nos a segurança e o arrojo necessários para abraçar novos e desafiantes projetos. Na génese da nossa fundação estava a necessidade de criar
uma
estrutura
reivindicativa.
Hoje,
agregadora,
para
além
representativa
desses
propósitos
e
que
se mantêm, acrescem muitos outros: a necessidade de um
maior
envolvimento
empresarial;
de
financiamento áreas
de
e
de
os
o
mundo
de
humanos,
a
fontes explorar
comunitárias,
direitos
académico
novas
motivação;
interesse
ambiente,
com
procurar
como
ação
e de
outras
o
meio
social,
entre
outras; ou de construir projetos em rede que potenciem as dinâmicas associativas.
A
revista
cada
SÓCIA,
um
dos
homenagem
que
vós, que
é
pela um
primeira
momento
serve
muitos
vez de
trazemos reflexão
desses
até
e
de
propósitos.
Envolve, explora, reflete, aproxima e motiva.
Partilhamos
convosco
quarenta
visões
para
a
década
sobre o movimento associativo numa dimensão crítica e de
perspetiva
futura.
A
todos
os
que
disseram
“presente” e contribuíram com a sua disponibilidade e saber o nosso muito obrigado.
Destaque porque
também
não
para
podemos
ter
a
rubrica
medo
de
“Controversos”,
falar
das
coisas.
Mesmo quando não concordamos com elas.
Aos
visados
em
agradecimento representam
e
todas pelo
as
reportagens
trabalho
pela
que
mais-valia
e
rubricas
fazem, que
pelo
são
o
que
para
o
movimento associativo.
Lançamos
esta
Coletividades.
publicação
no
Homenageamos,
Dia
Nacional
assim,
todos
das os
dirigentes, colaboradores voluntários, sócios e amigos das nossas coletividades. Muito obrigado por fazerem parte da nossa família e por nos ajudarem a fazer do mundo em que vivemos um lugar mais feliz.
Orgulhosamente, e com a vossa licença, dou as boasvindas
à
nova
SÓCIA
da
Associação
das
Colectividades do Concelho da Figueira da Foz.
Presidente da Direção
Associação das Colectividades do Concelho da Figueira da Foz
sócia
03 | MAIO 2020
RECONHECER E AGRADECER C A R L O S
M O N T E I R O
Começo por louvar a iniciativa do lançamento da
Continuamos atentos e sempre presentes no que
revista “Sócia”, um estímulo para a nossa
diz respeito a reconhecer a importância do
comunidade associativa e uma voz que ecoa a
movimento associativo no desenvolvimento da
ação deste movimento intergeracional que se vive
coesão territorial. Temos dito “presente” sempre
por todo o concelho e país.
que nos deparamos com problemas inesperados, como o furacão Leslie, tendo plena noção de que,
Particularmente, no concelho da Figueira da Foz, o
sem o apoio municipal, muitas coletividades
associativismo pauta-se por um historial abnegado
poderiam ter fechado as suas portas.
no apoio às populações, no desenvolvimento cultural, na instrução, no ensino musical, entre
Aproveito, ainda, para demonstrar o meu apreço a
tantas outras atividades. A proatividade e
todos os órgãos sociais das nossas associações
resiliência de todos os envolvidos, sejam os órgãos
pelo trabalho desenvolvido, bem como a todos os
sociais ou associados, constituem uma marca
voluntários que, mesmo não sendo parte dos
indelével e uma prova do espírito que se vive no
órgãos sociais, tudo fazem para dignificar o
seio das nossas coletividades.
movimento associativo. O vosso trabalho é por nós muito louvado.
Não sendo este momento em que nos encontramos fácil, temos desenvolvido inúmeras iniciativas no
Deixo, por fim, uma palavra de agradecimento à
sentido de diminuir o impacto da pandemia e,
Associação das Colectividades, por esta iniciativa
também aqui, muitas coletividades têm sido nossas
e o desejo de que trilhe um caminho de
parceiras e dado a sua mão a quem mais precisa.
consolidação e crescimento. Um bem-haja a todos!
Em resposta a esta entrega, o Município também
Viva o movimento associativo!
tem sabido reconhecer o contributo inestimável do associativismo e, nos últimos anos, tem aumentado o apoio às coletividades, à formação musical, às associações juvenis, aos clubes desportivos, instituindo-se como pioneiro em diversos projetos
Presidente da
que traduzem a importância do trabalho
Câmara Municipal da Figueira da Foz
desenvolvido pelas coletividades.
COMUNICAÇÃO E PARCERIA: UM EXEMPLO A SEGUIR A U G U S T O
F L O R
Destaco e valorizo a importância da relação de
Tal como a Associação, também a “Sócia” poderá,
grande proximidade entre o poder local
desde o primeiro dia de vida, contar com a
democrático que são as Autarquias e o poder
sensibilidade do executivo municipal que,
local associativo que são as Colectividades de
enquanto entidade de gestão dos recursos
Cultura, Recreio e Desporto. Ambas, agindo em
públicos, tem sabido reconhecer o papel
cooperação e parceria, são essenciais para a
fundamental do associativismo figueirense.
qualidade de vida das populações, da economia, da coesão social e territorial e da democracia
À Associação Concelhia de Colectividades e à
participativa.
Câmara Municipal da Figueira da Foz desejo êxitos associativos e autárquicos e, aos seus
Um bom exemplo dessa relação é o caso da
responsáveis, as maiores felicidades pessoais.
Associação das Colectividades do Concelho da Figueira da Foz e da Câmara Municipal da Figueira
Bem hajam!
da Foz que aqui quero reconhecer e valorizar no Dia Nacional das Colectividades e de apresentação de um novo órgão de informação
Presidente da Direção da
associativo da maior importância para a sociedade
Conf. Portuguesa das Coletividades
figueirense – a Sócia!
sócia
04 | MAIO 2020
NOTÍCIAS CENTRO QUALIFICA
QUALIFICAÇÃO DE ADULTOS A ACCFF desenvolveu um protocolo de
COMISSÃO PERMANENTE A ACCFF, enquanto estrutura descentralizada
colaboração com a Sodenfor – Sociedade
da Confederação Portuguesa das Coletividades
Difusora de Ensino da Figueira da Foz, no
de Cultura, Recreio e Desporto (CPCCRD),
âmbito da rede dos Centros Qualifica. A estrutura associativa comprometeu-se a divulgar a oferta educativa/formativa daquele Centro Qualifica e a sensibilizar as
integra a Comissão Permanente do Gabinete Centro, sediado no Covilhã.
suas associadas para a importância da
ELEIÇÕES INTERNAS
qualificação. Por seu turno, aquele Centro
Em junho, decorrem as eleições para os órgãos
comprometeu-se a disponibilizar os recursos materiais e humanos para a realização de ações junto das coletividades.
sociais da ACCFF. A Assembleia Geral eleitoral está agendada para o dia 18 de junho, na sede do Grupo Recreativo e Desportivo da Chã.
COIMBRA BUSINESS SCHOOL
CONSELHO MUNICIPAL DE TURISMO
FORMAÇÃO SUPERIOR
A Câmara Municipal da Figueira da Foz aprovou
A ACCFF e o ISCAC|Coimbra Business School
stakeholders nas políticas turísticas do concelho.
desenvolveram um protocolo geral de
Nos termos do Regulamento aprovado, a ACCFF
cooperação, que surge da necessidade de potenciar a colaboração entre as duas instituições em projetos de investigação ou prestação de serviços a empresas e outras
a criação do Conselho Municipal de Turismo, que visa promover a participação e o envolvimento dos setores público e privado, sociedade civil, movimento associativo e
é um dos parceiros daquele Conselho Municipal.
instituições comunitárias e na divulgação dos
PROFISSIONAIS DO ANO
eventos organizados pelas duas entidades.
António Rafael e Fernando Gonçalves,
Este protocolo prevê a aplicação de descontos em todos os cursos não conferentes de grau aos associados das
Presidente e Vice-presidente da ACCFF, respetivamente, foram homenageados pelo
coletividades associadas da ACCFF e a
Rotary Clube da Figueira da Foz pela sua ação
partilha de recursos e experiências com vista
enquanto dirigentes associativos,
à afirmação e valorização do movimento associativo concelhio.
"reconhecendo-lhes o exemplo de dedicação e o mérito com que se vêm entregando à valorização do movimento associativo no concelho". A cerimónia decorreu durante um
FUNDAÇÃO INATEL
CRIAR SINERGIAS A ACCFF procedeu, em agosto de 2019, à inscrição como Beneficiário Associado, na qualidade de Centro de Cultura e Desporto,
jantar daquele clube de serviço, em fevereiro, no Grande Hotel da Figueira.
DIA DAS COLETIVIDADES NA FIGUEIRA A CPCCRD escolheu a Figueira da Foz para a realização do espetáculo comemorativo do Dia Nacional das Coletividades. Pesou na decisão a experiência da ACCFF na realização de
da Fundação INATEL, concorrendo assim para
iniciativas semelhantes e a disponibilidade da
a criação de sinergias entre as duas
Câmara Municipal e do Casino Figueira para
entidades.
apoiar a iniciativa. O evento, que esteve agendado para o dia 31 de maio, foi adiado, para data ainda não definida, devido à crise pandémica.
sócio
02 | MAIO 2020
sócia
05 | MAIO 2020
CURTAS PROGRAMA DE FORMAÇÃO
COLÓQUIO
A APOSTA NO ACORDEÃO
O TURISMO E O MAP
O Município da Figueira da Foz e a ACCFF
Numa organização conjunta entre a ACCFF e
assinaram, em 2018, um protocolo para o
a Fundação INATEL, realizou-se em
desenvolvimento da formação musical de
novembro, no Auditório Municipal da Figueira
acordeão para os Ranchos Folclóricos e Grupos de Cantares do concelho da Figueira da Foz, cujo objetivo central é colmatar a
da Foz, um colóquio subordinado ao tema
Popular (MAP)
falta de acordeonistas verificada no concelho, contribuindo para a valorização e qualificação da oferta cultural de cariz
«O
interesse turístico do Movimento Associativo
».
O colóquio visou debater e alertar para a relevância das coletividades, no conjunto da
tradicional promovida pelas associações e
sua ação e do seu património
coletividades locais.
material e imaterial, enquanto produto turístico de elevado potencial na
A formação, financiada a 100% pelo
dinamização e valorização dos territórios.
município e operacionalizada pela ACCFF, arrancou em janeiro de 2019 e decorreu até maio, ministrada em quatro centros de formação, sediados em coletividades locais, distribuídos pelo concelho.
A ocasião deu a conhecer três visões distintas sobre o tema. A visão do próprio MAP, através de Artur Martins, assessor da Direção da CPCCRD; do poder local, através da Dra. Paula Silvestre, chefe de divisão da
37 formandos, dos quais 19 homens e 17
Comunidade Intermunicipal da Região de
mulheres, oriundos de 12 coletividades,
Coimbra (CIM RC); e dos agentes turísticos,
inscreveram-se no programa de formação, que foi ministrado por Márcio Cabral, Bruno Gomes e Rui Jordão, todos com formação
pela voz de Jorge Simões, vice-presidente da Associação Comercial e Industrial da Figueira da Foz para a área do turismo.
musical superior e larga experiência na prática do acordeão.
O debate contou com a moderação de Manuel Castelo Branco, docente da Coimbra
Está prevista uma segunda fase do
Business Shcool e, na sessão de abertura,
projeto, direcionada para um nível de
marcaram presença, para além do vice-
estudos mais avançados, ainda sem data
presidente da Direção da ACCFF, Ricardo
definida.
Santos, Rosa Baptista, Presidente do Conselho Fiscal da CPCCRD, Bruno Paixão, Diretor Regional da Fundação INATEL, e o
ANIVERSÁRIO
Vereador Miguel Pereira, em representação
19 ANOS DE MÃOS DADAS
da Câmara Municipal da Figueira da Foz.
Ainda no âmbito da iniciativa, a SIRL Street Band, da Sociedade Instrução e Recreio de Lares (SIRL), animou durante a manhã o Mercado Municipal e o Grupo Praia Mar do
A ACCFF comemorou a 5 de maio o seu 19.
º
aniversário. As comemorações, agendadas
Grupo Instrução e Sport (GIS) encerrou, ao final da tarde, os trabalhos do colóquio.
para o Centro Cultural e Recreativo OUCOFRA, na freguesia do Paião, foram
Em jeito de balanço, a organização salientou
canceladas devida à pandemia da COVID-19.
"
Na ocasião iria ser entregue o e Mérito Associativo
»,
« Prémio
Valor
cerimónia que será
realizada em data ainda a anunciar.
o mundo de oportunidades por explorar pelas coletividades ", evidenciado pelas possibilidades de trabalho em rede e pelas potencialidades de um maior envolvimento
o reduzido número de participantes numa ação relevante ". com o setor do turismo. Lamentou, contudo, "
sócio sócia
02 || MAIO MAIO 2020 2020 06
NOTÍCIAS
ESPETÁCULO
UNIVERSAL CONCERT Promovido pela ACCFF e concebido pelo tenor Luís Pinto, teve lugar em outubro, no Grande Auditório do CAE, o espetáculo “Universal Concert”, que, através do canto lírico, conduziu o público para o universo das obras geniais e como que o "teletransportou" para o ambiente verista/renascentista das ruas de Itália.
)zoF ad arieugiF EAC( ohnidoG leinaD ed aifargotoF
Participaram a Filarmónica da Sociedade Boa União Alhadense, dirigida pelo maestro José Firme; a soprano lírica Sara Carneiro; o tenor Luís Pinto; a bailarina Tânia Carvalho; o grupo de danças tradicionais ReviverDance do GRV; e a Klasika - Academia de Bailado da Figueira da Foz.
FESTIVAL DA CANÇÃO
FIGUEIRA VOZ FEST '19
O acompanhado musical esteve a cargo da Big Band da ACCFF, dirigida pelo Maestro António Matias e constituída por músicos de filarmónicas do concelho.
Dez concorrentes, entre os 12 e os 68 anos de idade, oriundos de vários pontos do país, disputaram o título de vencedor do 7.
º
O painel de jurados foi composto por Nuno Figueira, produtor da RTP, Maestro Silva
FIGUEIRA VOZ FEST - Festival da Canção da
Cascão, o conhecido radialista Sansão
Figueira da Foz.
Coelho, Adelaide Sofia, professora de piano e fadista, e Jorge Magalhães, ator e produtor
O festival decorreu em novembro, na
de espetáculos.
Sociedade Boa União Alhadense, e contou com a apresentação de Ricardina Lorigo e
Carlos Pinheiro, de Amarante , foi o grande
com as participações especiais do Grupo de
vencedor. Liliana Soares, do Porto, e Rúben
Dança Alkimia, de Lara Ramalho e da
Nascimento, da Figueira da Foz, arrecadaram
representante de Portugal no Festival
o 2.
Eurovisão da Canção Júnior 2019, Joana
Lopes, também da Figueira da Foz, ganhou o
Almeida.
prémio de Melhor Interpretação.
º
e 3.
º
lugares, respetivamente. Irina
sócia
07 | MAIO 2020
INCUBADORA SOCIAL
MICRONINHO O projeto Microninho ISI - Incubadora Social e de Inovação da Figueira da Foz destina-se à promoção da inclusão social e ao desenvolvimento local sustentável do concelho, criando e dinamizando para o efeito um ecossistema de inovação e empreendedorismo local. Promovido por uma parceria nascida de entidades privadas sem fins lucrativos - Incubadora de Empresas da Figueira da Foz (IEFF), Associação das Colectividades do Concelho da Figueira da Foz (ACCFF) e Associação de Desenvolvimento Social e Cultural dos Cinco Lugares (ADSCCL), sediada na Lousã -, assume apoiar 300 agregados familiares que se encontrem numa situação potencial ou efetiva de exclusão social. O projeto prevê a autonomização destas famílias através da metodologia Microninho, já testada e validada noutros concelhos, na criação de micronegócios inclusivos e sustentáveis e na capacitação e intervenção para a empregabilidade, ancorada na cocriação de projetos de vida autónomos. Em paralelo, os parceiros assumem a capacitação para a inovação social do ecossistema de inovação e empreendedorismo como estratégia de desenvolvimento local sustentável, assim contribuindo ativamente para a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). A candidatura, entretanto aprovada, foi submetida ao Programa de Parcerias para o Impacto com um orçamento global aproximado de
€
345.000,00. A Câmara
Municipal da Figueira da Foz, na qualidade de investidor social, suportará 30% deste montante, sendo os restantes 70% financiados pelo PO ISE. Para Ricardo Santos, vice-presidente da ACCFF e responsável interno pelo projeto, o
oportunidade para as coletividades se comprometeram com os ODS e ativarem o setor social ", num Microninho ISI é uma "
regresso àquela que foi a origem de muitas
o apoio aos mais necessitados ". Por outro lado, acrescenta " é também uma oportunidade de dinamização associativa, de financiamento e de reforço do envolvimento e das sinergias com entidades do setor social e empresarial ". coletividades: "
O projeto tem duração de três anos e início agendado para o 2.
sócia
08 | MAIO 2020
º
trimestre de 2020.
VOLUNTARIADO
AGENTES DE SOLIDARIEDADE A beneficência e a solidariedade são pilares do associativismo.
Não são de estranhar, por
isso, as iniciativas realizadas por várias coletividades do concelho da Figueira da
Santos, acompanhado de outras entidades,
Foz, no âmbito do combate à pandemia
que testemunhou e validou a importância da
provocada pelo novo coronavírus COVID-19.
ação no contexto do atual surto epidemiológico.
De norte a sul do concelho, de portas fechadas, mas abertas de par em par ao
No zona sul, o Centro Recreativo e Cultural
serviço comunitário, foram várias as
Carvalhense também mostrou a sua veia
associações que se lançaram em iniciativas
solidária, através da distribuição de
solidárias. Respondendo, de imediato, aos
alimentos e de outros bens de primeira
apelos feitos pelos profissionais de saúde,
necessidade.
numa primeira fase, voluntários da Sociedade Filarmónica Paionense e do Grupo Instrução
Já em Tavarede, respondendo ao repto da
e Sport (GIS) lançaram mãos à obra e
Junta de Freguesia local, as coletividades da
costuraram vários equipamentos de proteção
freguesia (Grupo Desportivo e Recreativo da
individual, nomeadamente batas, botas e
Chã, Grupo Musical Carritense, Grupo
golas, depois entregues ao Hospital Distrital
Musical e de Instrução Tavaredense,
da Figueira da Foz.
Sociedade de Instrução Tavaredense e Clube Desportivo e Amizade do Saltadouro) estão a
O GIS envolveu-se também na confeção de
produzir máscaras comunitárias para
sopas e sobremesas, com o apoio de
distribuição pela população.
empresas locais, para mimar os profissionais de saúde que estão no “campo de batalha”.
Provas mais do que dadas de que o
A iniciativa da coletividade mereceu uma
associativismo faz e pode fazer a diferença
visita do Ministro do Mar, Ricardo Serrão
mesmo em tempos de pandemia.
sócia
09 | MAIO 2020
RESILIÊNCIA
FAZER ACONTECER Num tempo em tudo de exceção, que forçou a suspensão de todas as atividades associativas e levou ao confinamento domiciliário da população, há sempre quem resista ao vírus do individualismo.
Focadas na necessidade de manter viva a chama do associativismo, foram muitas as coletividades que se desdobraram em iniciativas de dinamização cultural e comunitária, criativas e inovadoras, evidenciando a capacidade de resiliência e de superação dos dirigentes associativos.
Na Sociedade Instrução e Recreio de Lares, os músicos da Filarmónica, dirigidos pelo Maestro Paulo Silva, sempre disponíveis para um bom desafio, “ligados e ativos a partir de casa”, juntaram-se on-line, por diversas vezes, para em conjunto interpretarem vários temas que foram disponibilizando na página do Facebook. A coletividade também promoveu uma Páscoa 94.
º
»
« Audição
da
no mesmo formato e, para comemorar o
aniversário, agendou uma sessão drive-in, no
Parque Urbano da localidade, que faz uma viagem pela história da instituição.
A Sociedade Boa União Alhadense alinhou pela mesma matriz e partilhou na página do Facebook a "Marcha do Vapor", interpretada a partir da casa de cada um dos músicos da Filarmónica, dirigidos on-line pelo Maestro António Firme.
EFEMÉRIDE
CENTENÁRIAS
Já em Quiaios, o 107.
º
aniversário do Grupo
Instrução e Recreio Quiaense (GIRQ) comemorouse com a publicação, na mesma rede social, de trechos de vários espetáculos de revista, desde os anos noventa até aos dias de hoje.
No final da primeira grande guerra, os raios da
Ainda nesta freguesia do norte do concelho, o
esperança de um tempo novo inspiraram a
primeiro de maio é por tradição um dia de festa.
fundação de muitas associações. Cem anos
Numa tradição secular, anualmente organizada
depois, muitas delas chegam aos nossos dias
pelo GIRQ, logo pela manhã as mulheres
investidas de um enorme dinamismo, orgulhosas
percorrem as ruas da vila com potes floridos à
do seu passado e confiantes no futuro.
cabeça e dançam acompanhadas por uma tocata.
No concelho da Figueira da Foz, há duas coletividades que comemoram em 2020 o seu primeiro centenário.
O Sport Clube de Lavos fez a festa logo nos primeiros dias de janeiro e o Grupo Instrução e Sport, da Praia de Buarcos, soprou as cem velas
Neste ano, impedida de cumprir a tradição, a coletividade adaptou a iniciativa e convidou a comunidade a colocar às portas, nos jardins e nas varandas de suas casas potes enfeitados de flores. A adesão foi enorme e, no dia, não faltou a música, gravada, que percorreu as ruas da vila, tendo reafirmado a esperança e a certeza de que nenhum vírus é maior do que a força do querer.
no início de fevereiro. Os programas comemorativos de ambas as coletividades
Exemplos de criatividade e inovação que
estendem-se ao longo do ano, embora a
testemunham a vitalidade do movimento
COVID-19 tenha forçado o cancelamento ou o
associativo popular na Figueira da Foz.
adiamento de muitas das atividades previstas.
sócio sócia
02| |MAIO 10 MAIO2020 2020
DIA NACIONAL COLETIVIDADES O Dia Nacional das Coletividades, que se celebra a 31 de maio, foi instituído pela Lei n.
º
34/2003, de 22 de agosto, como forma de reconhecimento e valorização do movimento associativo popular. Esta lei conferiu ainda ao movimento associativo português o estatuto de parceiro social. Mas porquê o dia 31 de maio? A data coincide com a realização do congresso que, em 1924, deu vida à Federação Distrital das Sociedades de Educação e Recreio, atual Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto (CPCCRD).
De acordo com a Conta Satélite da Economia Social (2016) publicada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), existem hoje mais de 31.700 entidades de cultura, recreio e desporto e mais
e benévolos.
Um longo caminho
Disseminadas por todo o território nacional, as
No plano institucional, 96 anos depois desse
coletividades cumprem um importante papel,
congresso histórico de 1924, muita coisa mudou
consagrado pela Constituição da República
no movimento associativo nacional. Através da
Portuguesa, de dinamização cultural e
CPCCRD, desenvolveram-se processos
desportiva, muitas vezes em substituição do
reivindicativos junto dos poderes políticos e
próprio Estado. Contudo, estas entidades são
estabeleceram-se parcerias com dezenas de
também o berço da cidadania, um elo de
entidades públicas, privadas, sociais, de
coesão territorial, guardiãs das tradições e
investigação e conhecimento. Conseguiram-se
identidades locais e promotoras de laços de
resultados muito positivos no plano legislativo,
partilha e solidariedade.
do reconhecimento institucional e das relações
de 425.000 dirigentes associativos, voluntários
internacionais. O movimento associativo popular, através desta estrutura, tem hoje assento em diversas estruturas nacionais, como o Conselho Económico e Social, o Conselho Nacional da Economia Social, o Conselho Nacional do Desporto e o Conselho Nacional de Cultura.
Contudo, ainda há um longo caminho a seguir. Assegurar verbas diretas do Orçamento do Estado para o financiamento da atividade associativa, o estatuto do dirigente voluntário e um estatuto fiscal próprio são algumas das reivindicações que exigem resiliência e determinação.
Nada que intimide os milhares de dirigentes que, diariamente, junto das suas comunidades, dão o melhor de si em prol das suas coletividades, na certeza de que sem a sua ação comunitária e voluntária o país seria certamente mais pobre e mais triste.
sócia
11 | MAIO 2020
DESTAQUE
DO PALCO PARA O HOSPITAL: "A VIDA TEM COISAS GUARDADAS PARA Nร S"
RICARDINA sรณcia
12 | MAIO 2020
RICARDINA LORIGO Começou no palco do Grupo Instrução e Recreio Quiaense, ainda antes de saber ler e escrever. O teatro é uma segunda pele, que veste amiúde, para ser feliz. A juventude rasga-se-lhe no olhar. Gosta de comunicar, de estar com os outros. E, também por isso, gosta de ser enfermeira, ainda que o momento seja de difíceis batalhas: "
tem coisas guardadas para nós ",
a vida
afirma. Na Unidade de Cuidados
Intensivos (UCI) do Hospital dos Covões, onde presta serviço, enfrenta diariamente a COVID-19. Assim no hospital como no palco: com determinação e vontade de vencer.
Quais são os lugares da tua infância?
Porquê enfermagem?
A casa da minha avó, o Grupo
teatro, do contacto com as
[Instrução e Recreio Quiaense] e
pessoas e de poder fazer algo
a escola primária.
que tivesse influência direta na
O que guardas desses lugares?
vida do outro. A enfermagem permite-me isso. No teatro aquilo
Tanta coisa… Da Escola Primária
que fazemos, seja bem ou mal, é
guardo as brincadeiras, gostava
imediatamente apreendido pelo
muito de jogar à bola, e o real
público que nos está a ver. A
valor da amizade. Muitas das
enfermagem também, pois todas
amizades desse tempo ainda hoje
as nossas ações impactam
perduram. O Grupo moldou a
diretamente no outro, neste caso
pessoa que sou hoje no que
nos doentes. Por outro lado, não
respeita a valores sociais e a
gostava de ter uma profissão
relações interpessoais. Saber do
redutora. A enfermagem alarga o
outro, que o outro é diferente,
espectro: é muito diversificada e
que tem gostos, credos, ideias
consegue acompanhar todo o
próprias, e que não deixa de ser
ciclo de vida de uma pessoa.
uma pessoa que merece ser respeitada é da escola do associativismo.
E da casa da tua avó…
"Eu só me consigo realizar enquanto profissional se me sentir realizada enquanto pessoa e o teatro dá-me essa realização."
Eu gostava muito, e isso vem do
Com o ingresso na vida profissional que lugar reservaste para o teatro? Mantém o mesmo lugar, é um
Fui lá criada, é lá que está a
lugar cativo. (Risos) Nunca
minha base e a minha essência.
abandonei o teatro, nem durante
Todas as minhas recordações
a formação, embora tivesse
desde que sou gente passam por
menos disponibilidade. Eu só me
aquela casa, assim como todas as
consigo realizar enquanto
pessoas que são importantes na
profissional se me sentir realizada
minha vida ocupavam aquele
enquanto pessoa e o teatro dá-
lugar.
me essa realização. Houve
Consideras que a vivência no associativismo foi importante no teu percurso académico?
grandes projetos em que participei já depois de ingressar na profissão.
Sim, claro que sim. O
Que projetos foram esses?
associativismo ensina-nos a
No Grupo, tivemos sempre
preocupar-nos com o outro, a dar
grandes teatros de revista.
de nós aos que nos rodeiam e a
O tempo vai passando e vamos
não ter medo de partilhar
acumulando experiências,
emoções e sentimentos. Muitas
personagens, que nos dão
vezes vivemos a reprimir as
bagagem para outros desafios.
emoções. Se o Grupo moldou a
Recentemente, destacaria a
minha pessoa, naturalmente que
opereta “Flor do Mondego” e um
influiu na minha formação.
outro projeto, que apesar de não ter sido na minha casa, no meu berço, me abriu as portas: 'O Enredo'.
sócia
13 | MAIO 2020
"'O Enredo' abriume os horizontes do teatro"
O teatro "deu-me ferramentas para ser a profissional que sou"
A participação n'O Enredo' foi uma experiência marcante? Sem dúvida. Foi um projeto da
Entretanto, tiveste algumas experiências na área da apresentação…
CIM Região de Coimbra e da
Sim, é verdade. Comecei por
social assim muito interessante.
Rede de Muralhas e Castelos do
fazer esse papel nalguns eventos
Tinha dificuldade em estabelecer
Baixo Mondego, em que tive o
do Grupo apenas por brincadeira,
contacto com os doentes. O
privilégio de representar o
de forma muita amadora.
teatro foi importantíssimo nessa
concelho da Figueira da Foz.
Rapidamente percebi que a
altura. No palco transformava-
Foram selecionados dez artistas,
apresentação me obrigava a
me, era muito mais extrovertida e
um por cada um dos municípios
vestir uma determinada pele, a
comunicativa. Percebi que o
da linha defensiva do Mondego, e
criar uma personagem própria
teatro me podia ajudar. Deu-me
a partir daí fizeram-se várias
para cada evento. Ganhei algum
as ferramentas de que precisava
residências artísticas e
reconhecimento e acabei por ser
para melhorar a minha
brainstormings que resultaram na
convidada para apresentar a
comunicação e tornar-me na
criação de um espetáculo
Gala da Dez de Agosto no Casino
profissional que sou hoje.
multidisciplinar, de grande efeito
Figueira, em 2016, ou, mais
Portanto, sou esse alguém que
visual, que envolvia teatro, canto,
recentemente, o Figueira Voz
gosta muito de comunicar e que
dança e música. Atuámos nos dez
Fest. Fiz também o Dez&10, que
usa essa qualidade para ser
concelhos sempre com lotações
me deu a oportunidade de
melhor enfermeira.
esgotadas.
explorar ainda mais a área,
O que te acrescentou enquanto atriz?
trabalhando essa vertente da criação.
problema de comunicação. Eu era muito tímida, recatada, até porque não tinha uma figura
O que levas dos palcos para o hospital? Não consigo materializar as
acrescentam qualquer coisa. Este
Preferes o teatro ou a apresentação?
foi diferente porque acabou por
Isso não funciona assim. Não se
de se relacionar com os doentes,
ser a minha primeira experiência
consegue dissociar uma coisa da
com os colegas, com os outros
profissional – se é que lhe posso
outra. A escola que se tem do
profissionais de saúde, muitas
chamar assim. Quando saímos da
teatro é precisa para a
vezes em ambientes de stress, que
zona de conforto, acabamos
apresentação. Mesmo os
potenciam os conflitos. É um
sempre por aprender. Cresci
apresentadores que não são
trabalho de equipa tal como o
enquanto atriz, quer ao nível da
atores têm obrigatoriamente de
trabalho do ator. Não podemos
representação, quer na
ter conhecimentos de
ser individualistas, temos de ter
compreensão do espetáculo
representação. O papel dos
uma grande capacidade de
teatral no seu todo. 'O Enredo'
apresentadores será porventura
envolvimento. Sinto que as
abriu-me os horizontes do teatro.
até mais difícil do que o dos
relações e o ambiente profissional
atores, porque eles têm de
ficam a ganhar com a experiência
conduzir um espetáculo sem um
dos palcos. Acaba por ser uma
guião escrito, obrigando-os a uma
competência que coloco ao
Tudo o que faço gosto de fazer o
enorme capacidade criativa e de
serviço do hospital.
melhor que posso e sei. Neste
improviso. São duas áreas
caso havia esse peso acrescido
desafiantes. Gosto tanto das duas
que era o de representar a minha
que me recuso a escolher. (Risos)
Todos os projetos nos
Como foi representar o Município da Figueira da Foz?
cidade. Foi uma grande responsabilidade, mas também um enorme orgulho.
sócia
14 | MAIO 2020
Sente-se a tua paixão pela área da comunicação. És uma enfermeira que gosta de comunicar ou uma comunicadora que é enfermeira?
coisas assim. O teatro facilita o contacto. O enfermeiro precisa
Os artistas vivem das palmas. Os enfermeiros também? Não! (Risos) É evidente que nesta fase [do surto da COVID-19] as palmas trazem motivação. Mas isso não é o mais importante. O que seria bom é que os nossos governantes olhassem para a nossa profissão de forma
(Silêncio) Diria que sou uma
diferente… que não nos batessem
comunicadora que é enfermeira,
palmas, mas que nos dessem
sem dúvida. É fácil de explicar.
efetivas condições de carreira e
No tempo da faculdade, quando
de trabalho para que pudéssemos
estava a fazer os ensinos clínicos,
fazer aquilo que temos de fazer:
diziam-me que tinha um grande
ajudar a salvar vidas.
Na linha da frente do combate à COVID-19 És enfermeira na UCI do Hospital dos Covões. Estás na linha da frente do combate à COVID-19. Como vives este desafio? Com determinação e na certeza de que vamos vencer o vírus.
É o desafio da tua vida?
Conseguem abster-se do mundo, das notícias, e concentrar-se na recuperação da doença, ou seja, esquecer a COVID e pensar que é apenas mais um doente que precisa ser recuperado? Temos de nos focar. Não nos podemos deixar envolver, nem
Não sei responder… Gosto
pela comunicação social, nem
muito de ser enfermeira. E se
pelos vídeos de outros países. É
alguma vez tive dúvidas, depois
um doente infetado, que tem
disto desvaneceram-se
défices e tem de ser tratado. Se
completamente. Acredito que este
nos deixamos levar pela dimensão
desafio estava guardado para
disto, não resulta.
mim. Surgiu na minha vida para me dizer assim: “Era isto que estava guardado para ti. Estás aqui por esta razão.”
Acreditas na predestinação? Acredito que a vida tem coisas
A COVID-19 é "provação pela qual tinha de passar para a enfermagem fazer ainda mais sentido na minha vida".
guardadas para nós. Vejo esta situação como uma provação pela qual tinha de passar para a enfermagem fazer ainda mais sentido na minha vida.
Para além do esforço físico, vem a necessidade de superação psicológica… Sim. Estou convencida de que,
Qual é a sensação de estar em contacto direto com o vírus, de saber que ele está ali mesmo à tua frente?
depois de tudo isto, muitos profissionais de saúde vão dar de si. É normal acontecer na fase da descompressão. São dias muito
A primeira vez que recebemos
desgastantes, tanto ao nível físico
um doente o aparato foi muito
como mental. No mesmo turno, és
grande. Só pensas: "Caramba!
capaz de te ir abaixo duas vezes.
Isto veio da China que é do outro
Sais exausto lá de dentro, depois
lado do mundo!" Começas a
de três ou quatro horas intensas,
pensar naqueles filmes de ficção
tomas um banho e só pensas que
que mostram este tipo de
não vais aguentar isto até ao fim,
ambientes e onde tu achas que
que é impossível aguentares.
nunca vais estar. Foi estranho,
Depois, respiras fundo, mudas de
mas depois começas a ambientar-
farda, alimentas-te e voltas a
te e passado pouco tempo já
entrar. É uma montanha russa.
tratas a doença por tu.
com uma vida normal,
Sentes que as pessoas, nomeadamente as que te estão mais próximas, se orgulham de ti?
principalmente idosos, que não
Sim, claro. Sinto que toda a gente
foram a lado nenhum de especial
está solidária comigo. Mesmo os
e que mesmo assim foram
mais próximos fazem questão de
infetados. Isso é que preocupa.
mo dizer e esse "mimo" é a
Percebemos essencialmente que isto não acontece só aos outros. Os doentes são pessoas normais,
energia de que preciso.
Ricardo Santos Fotografias de Ricardina Lorigo (pág. 12 e 15) e Diogo Jerónimo (pág. 13) Entrevista de
sócia
15 | MAIO 2020
PATRIMÓNIO
COLECTIVIDADES "CENTROS DE CONSTRUÇÃO DE SOCIEDADE" POR PÓ DE SABER
sócia
16 | MAIO 2020
Veloso Salgado, 1920, Cortes Constituintes de 1821. Assembleia da República. Manuel Fernandes Tomás discursando.
AS COLECTIVIDADES Fará parte do folclore do concelho da Figueira da
procurador à Junta Geral do Distrito, Provedor da
Foz a ideia de que, por aqui – como em poucos
Santa Casa da Misericórdia (1859-1861) e
lugares – se multiplicam as associações, “de tudo e
importante benemérito da construção da sede da
para tudo”. Nada mais verdadeiro!
Sociedade de Instrução Tavaredense ]
preconizava a necessidade de uma instituição que Há-as fundadas de raiz, as refundadas, as nascidas
tivesse por finalidade “a beneficência, ensinar as
de dissidências; as de classe, mutualistas,
pessoas a ler, ensinar música e proteger os
recreativas, instrutivas, as secretas… Assim
pobres”. Como interpretar, pois, que uma
categorizadas numa perspectiva funcional, são
sociedade filarmónica se apresentasse com tão
insuspeitas as complexidades do tempo e do
ousados e diversificados objectivos?
contexto em que cada uma emerge, traindo vocações e desígnios que mais as enobrecem.
Na realidade, o voluntarismo para a fundação de
associações decorria de uma evolução legislativa
O advento da República, em Outubro de 1910, é um
ambiciosa da Constituição de 1838(*) que
marco assinalável da democratização da educação
positivava as liberdades de reunião e de
para a cidadania através da literacia, que os seus
associação.
fundadores abraçaram como causa charneira da sua missão regeneradora face à Monarquia e aos
“A lei não existe; a lei estamos nós a fazer”,
atavismos da religião. Na Figueira, antes e depois
afirmou Manuel Fernandes Tomás nas Cortes Gerais
de 5 de Outubro, são, pois, inúmeros os exemplos
de 19 de Maio de 1837.
das instituições fundadas por partidários republicanos com o objectivo de alavancar a alfabetização dos mais desprotegidos, num tempo em que o analfabetismo rondaria os 75%.
Assim a
Associação de Instrução Popular ,
com
estatutos de 20 de Agosto de 1902, fundada por simpatizantes da causa – Dr. Joaquim da Silva Cortesão e os negociantes Henrique Raimundo de Barros, Joaquim Maria do Amaral, Adriano Dias Barata Salgueiro e Augusto Dias.
De acordo com
os seus estatutos, tinha por missão promover a “propaganda da instrução popular e a educação liberal e cívica” e “o desenvolvimento e progresso moral e intelectual das classes trabalhadoras do concelho da Figueira”, através do ensino gratuito para homens e mulheres – sem necessidade de autorização marital, como refere Rui Cascão (Monografia da Freguesia de São Julião, JFSJ,
Sociedade Filarmónica Figueirense, em 1881.
2009). (*) Constituição de 1838 (Diário do Governo, de 24 de Abril de
Mas logo a 5 de Julho de 1842 nasce a associação recreativa
Sociedade Filarmónica Figueirense .
1838, n.° 98), Artigo 14
º
— Todos os cidadãos têm o direito de se
associar na conformidade das Leis.
§
1.
º
— São permitidas, sem
dependência de autorização prévia, as reuniões feitas
§
º
Ainda longe dos anos dourados da educação
tranquilamente e sem armas.
democratizada, já João José da Costa [n. 1818 – f.
em lugar descoberto, os cidadãos darão previamente parte à
29/03/1893, Director e Presidente da ACIFF, sócio
autoridade competente.
fundador da
Assembleia Figueirense ,
Presidente
da Câmara Municipal da Figueira (1862-1865),
§
3.
º
2.
— Quando, porém, se reunirem
— A força armada não poderá ser
empregada para dissolver qualquer reunião, sem preceder intimação da autoridade competente.
§
4.
º
— Uma Lei especial
regulará, em quanto ao mais, o exercício deste direito.
sócia
17 | MAIO 2020
Dando-se, de facto, tais liberdades no país, elas não estavam regulamentadas, notando-se a necessidade de criar modelos de organização da convivialidade que protegessem o Estado da sedição mas que defendessem simultaneamente os interesses políticos, económicos e sociais, transversalmente por todas as classes.
Mais, uma nova consciência e valorização do exercício da participação cívica que então se afirmavam na esteira das revoluções Industrial e Francesa vão permitir a fundação de espaços de acção colectiva que, a partir da dissolução em Portugal das grandes corporações mesteirais na sequência da revolução liberal, irão actuar como uma terceira esfera – entre o Estado e o Mercado – para a conquista de direitos, habilitando os seus associados à negociação, mas igualmente à cooperação e à aprendizagem de sociabilidades outras.
Assim se justifica que a
Alhadense
Sociedade Boa União
tivesse nascido como “Sociedade
Montepio Phylarmónico União Alhadense” (1854); que a
Sociedade Filarmónica Paionense
(1858)
anunciasse como sua finalidade social “a instrução e recreio” dos sócios e o auxílio no custeamento de despesas com medicamentos; que o Grémio Carvalhense (1883), berço da
Musical Carvalhense
Sociedade Artística
(1887), tivesse organizado
uma escola de ensino elementar masculina ou que
Sociedade Musical Recreativa Instrutiva e Beneficente Santanense (1894) dinamizasse aulas a
de educação primária para as crianças da freguesia, e que quase todas mantivessem uma biblioteca geral funcionando em paralelo e complementarmente à divulgação e ensino da música entre os sócios e entre os públicos.
As sociedades recreativas, como as citadas bem demonstram, são um refinado produto do seu tempo e herdeiras dos valores caros ao constitucionalismo e ao liberalismo. Desenvolvendo-se junto das camadas populares pari passu com os clubes de cavalheiros, as associações de classe e as agremiações patronais, foram e são centros de construção de novos projectos de sociedade, tornando espúria qualquer tentativa de as reduzir a inócuos centros de convívio e recreio.
Texto de
sócia
Frederica Jordão
Pó de Saber - Cultura e Património, maio 2020 18 | MAIO 2020
VALOR E MÉRITO
JOSÉ MARIA MONTEIRO NOSSA
A TOCAR DESDE 1955 Nasceu em Alhadas, freguesia rural da Figueira
José Nossa integrou orquestras de teatro (nas
da Foz, a 4 de dezembro de 1937. Iniciou a
famosas operetas), o Rancho 1
aprendizagem musical com 14 anos de idade na
Marchas de S. João, o Grupo de Metais e a
Sociedade Boa União Alhadense (SBUA), tendo
Orquestra Ligeira. Foi dirigente durante largos
tido como professor Joaquim da Silva Pessoa,
anos, tendo ocupado diversos cargos nos
contramestre da Filarmónica. Em 1955, estreou-
Órgãos Sociais da coletividade. Pessoa de bom
se na banda daquela Sociedade, como
trato, conseguiu sempre manter um bom
executante de cornetim, instrumento que tocou
relacionamento com dirigentes e músicos.
até aos 22 anos. A partir dessa idade, e dada a
Ganhou a simpatia e a admiração dos
falta de executantes de contrabaixo, passou a
alhadenses, sendo hoje um referencial de
integrar esse naipe, numa relação que durou até
dedicação, tomado por todos aqueles que com
1989. Seguiu-se a tuba durante 30 anos e, mais
ele trabalham na SBUA como um exemplo vivo
recentemente, o regresso ao contrabaixo. Para
de valor e mérito associativo. O segredo para
além da Filarmónica, ao longo destes 65 anos
65 anos de serviço ininterruptos? O sentido de
de intensa atividade musical e associativa,
missão, a música e o amor à Boa União.
sócio sócia
02 | MAIO 2020 20
º
de Maio, as
aierroC ariereP/seraoS saiD
ropaV od ahcraM
A bordo ninguém se teme, Ninguém aqui se receia, O homem que vae ao leme Ouç'ó canto da sereia.
Sereias da marinhagem Emmudeceram aquellas Soltando à branda aragem A sua canção mais bella.
Se nos acharmos em guerra A nossa infantaria Atira beijos p'ra terra - Um primor de pontaria!
Lindos olhos do meu par Vão fazer um servição, Rutilando sobre o mar Em tempo de cerração.
(Refrão)
Oh! Noites d'amor Que as almas seduz Envolve o "Vapor" Em ondas de luz
É cantar sem medo Ó minha beldade, O mar é de rosas, Viv'á mocidade.
Fotografia de
António Ramos Silva
sócia
21 | MAIO 2020
DOSSIER
CONT ROVE RSOS Há coletividades a mais na Figueira da Foz? As sessões solenes ainda fazem sentido? E as
coletividades que só fazem almoços dignificam o associativismo? Convidámos um engenheiro, uma psicóloga e um jornalista, com ligações díspares ao movimento associativo, para nos dizerem de sua justiça. E, claro, perguntas controversas puxam respostas (ainda mais) controversas.
sócia
22 | MAIO 2020
AS SESSÕES SOLENES AINDA FAZEM SENTIDO?
HOMENAGEAR REFORMULAR J O S É
D U A R T E
O L G A
B R Á S
INOVEM! J O S É
L U Í S
S O U S A
As sessões solenes comemorativas
Todas as coletividades querem ter
Até há bem pouco tempo, a
dos aniversários, obviamente,
o seu momento de glória. O seu
obrigatória sessão solene de
fazem todo o sentido. A nossa
Ponto de Honra. Qual a melhor
aniversário era quase uma
presença será sempre um preito
data? A comemoração do
finalidade em si mesma!
de homenagem àqueles
aniversário. Agora, as sessões
Convidava-se umas quantas
benévolos, homens e mulheres,
solenes são a melhor forma de o
personalidades, sendo o
que, em prol da sua coletividade
fazer? Não. Não da forma como
presidente da Câmara
e da sua comunidade, tudo
são feitas. Num mundo moderno,
naturalmente omnipresente e
sacrificam, pese embora, muitas
onde impera a tecnologia e os
desenrolava-se um rol de feitos
vezes, não terem o merecido
dias são passados a correr, onde
ao longo do ano, acompanhados
reconhecimento.
todos os pequenos momentos são
por queixumes e pedidos de
Felizmente, temos no nosso
poucos para nos dedicarmos ao
apoio. E, na altura, não havia
concelho um associativismo de
que mais gostamos, fazer sessões
‘meros’ vereadores a representar
grande qualidade e quantidade, o
solenes ao estilo de quatro, cinco,
o município pois que o ato pedia
que, paradoxalmente e por si só,
seis ou até sete décadas atrás
a presença de Deus e não de um
é gerador de constrangimentos,
não faz sentido nenhum; em que
anjo coadjuvante! O presidente
ao não conciliar a presença de
de discurso em discurso muitas
do município lá discursava e,
todos aqueles que, por inerência
vezes repetitivo, com recados e
invariavelmente, entregava o
de função ou de preito de
trocadilhos políticos, é algo que
cheque do apoio (até me lembro
homenagem, ali gostariam de
já deveria ter sido reformulado.
de ver quem o exibisse para a
estar. Este constrangimento de
É uma cerimónia muito pouco
plateia em quase êxtase). Nos
simultaneidade das sessões
apelativa. Tantos os menos jovens
dias de hoje, se o cheque foi
solenes, é um facto, algumas
como os mais jovens já não se
substituído por resoluções
vezes, muitas vezes, impede que a
identificam com este tipo de
administrativas de apoios
imprensa, os autarcas e outros
efemérides.
variados, a solenidade do ato
convidados reiterem nesse dia o
As direções passam e aceitam
mantém-se: invariavelmente, com
seu preito de homenagem ao
passivamente a forma como estas
uma mesa corrida em que todos
associativismo. Compreendo o
sessões são realizadas, mas é
os convidados se acotovelam! Os
constrangimento, mas enquanto
hora de haver um debate interno
autarcas, esses, a não ser que
autarca e elemento executivo do
dentro das estruturas associativas
algo os ligue à coletividade (como
associativismo, prefiro do mal o
a fim de repensar um modelo mais
memórias de tempos por lá
menos, que é este
atrativo, dinâmico e integrativo. É
passados ou uma efetiva
constrangimento pela ausência da
normal irmos a estas sessões e
intervenção social da instituição,
imprensa e dos autarcas, ao
encontrarmos mais pessoas no
o que é sempre popular), vão, mas
desgosto e à dor do associado,
painel de entidades formais que
estão-se nas tintas para as
do amigo ou do colaborador da
na plateia. Se em vez desta
sessões solenes, já que as veem
sociedade, por naquele dia e
cerimónia substituíssemos por um
como um soporífero de dose
naquele lugar (na sua associação)
breve discurso de um elemento da
cavalar! Deixem lá os discursos,
não poder recordar com emoção
estrutura seguido de uma mostra
que ninguém quer saber de
o pai, a mãe, demais familiares e
das atividades desenvolvidas ao
discursos de ocasião. Sejam
amigos já falecidos, por em tão
longo do ano e com um pequeno
criativos, inovem. Façam algo
boa hora terem fundado a sua
apontamento cultural, será que a
pelos vossos, transformem um
coletividade.
adesão e o interesse não seriam
discurso numa ação de conforto,
consideravelmente superiores?
de alegria e de boa disposição.
Engenheiro
Psicóloga
Jornalista
Pres. Assembleia Municipal Fig. Foz
Pres. Assembleia Geral ACCFF
Agência Lusa
sócia
23 | MAIO 2020
EXISTEM COLETIVIDADES A MAIS NA FIGUEIRA DA FOZ?
FUSÃO O L G A
B R Á S
Não existem coletividades a mais, nem existem coletividades a menos. Há as coletividades que os fundadores e que os sócios entenderam que houvesse. Outros tempos. Hoje, em pleno século XXI, as coletividades vão por si fechando, pois já existem coletividades de portas fechadas
PRESERVAR
COOPERAÇÃO
por falta de elenco diretivo, e esta é uma área muito pouco atrativa para os
J O S É
D U A R T E
J O S É
L U Í S
S O U S A
jovens; os jovens hoje têm outras aspirações e outros objetivos e não se reveem neste tipo de estruturas. Porquanto não é difícil encontrar-se
Antes de responder aos temas que
A questão não se devia, sequer,
coletividades no nosso concelho cujas
me propuseram, se calhar fará
colocar assim. Não há
direções se perpetuam à frente das
todo o sentido expressar uma
coletividades a mais, como não há
declaração de interesses, isto é,
a menos. O direito de associação
dizer que o associativismo foi, é e
- felizmente - é livre e cada um
nível nacional, tem falta de cultura
continua a ser entendido por mim
que tiver um sonho e um objetivo
associativa, os próprios sócios das mais
como uma escola de vida coletiva,
de caráter social, cultural ou
diversas coletividades têm falta de brio e
de compreensão, de cooperação,
desportivo, pode e deve, a cada
de solidariedade, de amizade e
momento, associar-se a outros
de humanismo. No associativismo,
como ele e criar uma qualquer
Se na década de 70 do século XX, houve
aprendemos a respeitar as
nova entidade na sua
o emergir de muitas coletividades no
diferenças, partilhamos a
comunidade. Coisa bastante
nosso concelho para dar respostas onde
cidadania e fazemos da
diferente é a ideia peregrina (e
coletividade um espaço de cultura
estapafúrdia) que anda por aí da
e de vivência democrática.
redução do número de
Instrução.
Quando afirmo que
coletividades por decreto,
As coletividades para sobreviverem têm
Reconhecimento é a expressão do
apontando as fusões como o
de ter a capacidade de se reinventar em
meu olhar, ao passar junto a uma
caminho a trilhar. Dito isto,
coletividade, expresso-o
qualquer decisão de eventual
sentidamente, é uma verdade
fusão deve resultar da vontade
reinventar-se vai ser o grande desafio da
insofismável e por isso não
declarada dos sócios e não de
próxima década, só quem tiver a
considero que o concelho da
pressões exteriores ou de
capacidade de se reinventar no tempo e
Figueira da Foz tenha
objetivos a curto prazo. Mais do
coletividades a mais. No
que fusões, onde tenho a certeza
concelho, existem aquelas
de que o movimento associativo
que a sua coletividade se mantenha de
coletividades que, ao tempo da
ficaria a ganhar é na real
portas abertas, quem o não conseguir,
sua fundação, as comunidades
cooperação com outras
não tenha quaisquer dúvidas que o
deste concelho entenderam que
associações e coletividades - seja
eram as necessárias. Compete-
da sua área territorial seja de
nos a nós, gerações vindouras,
outras -, buscando objetivos
de tempo.
respeitar a vontade dos
comuns, porque está provado que
Vai ser a lei do mais forte, do mais
fundadores, garantindo a
os proveitos aumentam quando se
capacitado que vai ditar a sobrevivência.
preservação do nome da
ganha escala. Há anos que dou
comunidade onde se inserem,
exemplos da necessária
perpetuando e potenciando os
‘pacificação’ entre entidades que
seus usos, costumes e tradições.
passaram o século XX em
coletividades que dirigem por vários anos consecutivos. A nossa sociedade figueirense, e quiçá a
contribuem muito pouco para o bom desempenho das coletividades, das quais são sócios.
o Estado falhava, hoje o Estado já vai dando essas mesmas respostas, nomeadamente no que concerne à
áreas como a cultura e muito eficazmente na parte social, onde o Estado falha de forma sistemática. E o
no espaço, de conseguir trabalhar em rede, de preconizar projetos e candidatar-se aos mesmos irá conseguir
tempo as levará ao encerramento. Já nem sequer é uma questão se vão encerrar ou não, é mesmo uma questão
A grande solução para esta situação será a capacidade de as coletividades dentro duma mesma freguesia se fundirem. Poupam recursos humanos, recursos económicos e esta fusão visa
‘guerrilhas’ sem jeito nenhum
também a união de todos os atores
(como se a história de andarem
dessa mesma freguesia. Já não é tempo
constantemente ‘à batatada’
de rivalidades clubísticas, grupistas, seja
fosse tradição para se orgulharem
do que for. O tempo agora é um novo tempo. De União, Solidariedade e
e necessária de manter),
Inclusão. Ponamque divisionem unum
destacando o que os diferencia
sumus.
ao invés de assinalarem o que os aproxima!
Psicóloga
Engenheiro
Jornalista
Pres. Assembleia Geral ACCFF
Pres. Assembleia Municipal Fig. Foz
Agência Lusa
sócia
24 | MAIO 2020
AS COLETIVIDADES QUE APENAS FAZEM ALMOÇOS DIGNIFICAM O ASSOCIATIVISMO?
RESPEITAR J O S É
D U A R T E
NÃO, MAS... O L G A
B R Á S
NÃO! J O S É
L U Í S
S O U S A
Quantos às coletividades que
Penso que não existe
A resposta a esta é mais ou
apenas fazem almoços, para mim
necessariamente um tipo de
menos óbvia. Desconhecia a
continuam a dignificar o
atividade ou um conjunto de
existência de coletividades “que
associativismo e o amor ao
interesses que dignifique o
apenas fazem almoços” - imagino
próximo que é o outro, desde logo
associativismo. As associações
que noutros tempos seriam
porque não são de memória curta,
têm de servir os associados e
aquelas que viram os apoios
preservando a coletividade muitas
restantes usuários da forma que
cortados por apenas servirem
vezes a expensas suas, mantendo-
estes as idealizaram e
‘para jogos de sueca e copos de
a operacional, respeitando a
respeitando os valores basilares
tinto’ - mas, se o tema exige uma
vontade, o valor e o mérito dos
da génese das mesmas, bem
pergunta, é porque alguma coisa
seus fundadores, até ao dia em
como a sua história. Respondendo
não está bem! Com a exceção de
que de novo apareçam, na
a esta questão segundo os meus
poder existir, eventualmente, uma
comunidade, pessoas que possam
valores e interesses dentro do
qualquer Associação dos Amigos
fazer mais e melhor. Não sou
associativismo, não me
dos Almoços de Domingo, que
político, mas apetece-me citar os
identificaria com uma associação
tenha a realização daquelas
políticos quando dizem que a
que fizesse dos almoços a sua
refeições como objeto social. Não
política é a arte do possível e que
atividade “gold standard”. No
sendo assim, obviamente que é
quem faz o que pode faz o que
entanto, os almoços são
uma atividade pobrezinha e que
deve. De algum modo, no
atividades que trazem um retorno
em nada dignifica o
parágrafo anterior, já estaria
financeiro interessante e são,
associativismo!
justificado este tema.
acima de tudo, um momento de
A tolerância que nos é devida
união dos associados. Se aliarmos
aconselha-nos a respeitar todas
este tipo de atividades a uma
as opiniões, contrárias ou não
agenda gastronómica regional ou
coincidentes, na totalidade ou em
a outro tipo de atividades, sejam
parte.
elas do âmbito cultural,
Jornalista Agência Lusa
desportivo ou solidário, podem dignificar e muito o associativismo.
Engenheiro
Psicóloga
Pres. Assembleia Municipal Fig. Foz
Pres. Assembleia Geral ACCFF
sócia
25 | MAIO 2020
CULTURAS
RUI FÉTEIRA
O POETA ACIDENTALMENTE ATOR
RUI FÉTEIRA Professor de filosofia, cofundador e dirigente do Pateo das Galinhas - Grupo Experimental de Teatro da Figueira da Foz, ator acidental, mas, acima de tudo, poeta. É através da poesia, "
a mãe da literatura ",
que
descobre as coisas do mundo. Essa procura de conhecimento, que partilha com a filosofia e com o teatro, resultou na publicação de cinco livros de poesia, um deles,'O Rumor das Máquinas', vencedor do Prémio Literário Aldónio Gomes. Embora nomeado na categoria de "Melhor Interpretação Secundária Masculina", no Concurso Nacional de Teatro, em 2018, pelo seu desempenho na peça "Maria, Senhora de Mim", afirma que o palco não é o seu "quintal". Talvez a "
dimensão teatral "
da poesia, "
feita para ser dita em voz alta ",
justifique a feliz relação entre o poeta e o (ainda que acidental) ator.
"A poesia é uma procura de conhecimento. Como a ciência e a filosofia procuram conhecimento, a poesia também." "Não é a poesia no sentido narcisista que me interessa. O centro da minha poesia não sou eu." "A poesia, o teatro e outras artes assentam sobre a mesma ideia: uma procura através de linguagens diferentes."
És um ator que gosta de poesia ou um poeta que gosta de teatro? Um poeta que gosta de teatro. A poesia surgiu primeiro.
Quando é que a descobriste? No início da adolescência, por volta dos 12 anos. Como era pequenito e tímido, serviu-me para me aproximar das raparigas. Mandava-lhes poemas.
E a estratégia dava resultados? Sim, algumas vezes. (Risos) Depois
Quais são os ingredientes dessa procura? É uma procura acerca de tudo. Não propriamente acerca de mim. A poesia que se centra nos problemas da pessoa que escreve pode ser interessante, mas eu acho que é mais do que isso. Não é uma procura interior. Há uma dimensão interior, obviamente, porque o sujeito poético procura qualquer coisa. Mas não é a poesia no sentido narcisista que me interessa. O centro da minha poesia não sou eu.
essa fase passou, mas o interesse pela poesia manteve-se.
O que te inspira? As mulheres? Começou por ser, sim, mas agora não. Nem sei dizer exatamente o que me inspira. Praticamente é tudo. São uma espécie de flashes que acontecem. Preciso de uma ideia, de qualquer coisa que surja, de uma frase, de um verso, dois versos, é a partir daí que começo a trabalhar. Concordo neste sentido com aquele princípio de que a poesia é noventa por cento
Concordas com Fernando Pessoa quando dizia que “o poeta é um fingidor”? Concordo, embora entenda que é mais do que isso. É um fingidor porque finge completamente que é dor a dor que deveras sente. É uma dor sentida, que se sente efetivamente. O fingimento – não sei se Fernando Pessoa o entendia assim – é o trabalho poético. O teatro também é um fingimento. É um trabalho sobre a própria
de trabalho e dez por centro de
realidade numa outra linguagem.
inspiração. Os dez por cento
A dor que deveras sente é aquilo
resumem a parte inicial, depois
que de facto sentimos. Não uma
vem o trabalho sobre essa brecha
dor no sentido restrito do termo,
que se abriu algures, a propósito
mas a dor da alegria, a dor do
de qualquer coisa. É uma procura
amor, ou seja, a dor num sentido
de conhecimento. Como a ciência
mais amplo. A poesia, o teatro e
e a filosofia procuram conhecimento, a poesia também.
outras artes assentam sobre a mesma ideia: uma procura através
Não no sentido de o transmitir aos
de linguagens diferentes. Na
outros, mas no conhecimento que
poesia através da linguagem
eu próprio descubro. Quando acabo um poema, descubro coisas que, provavelmente, não seria
poética, no teatro através da linguagem teatral, na pintura através da tinta, das telas, etc.
capaz de descobrir de outra maneira. Em resumo, diria que é uma procura de conhecimento de mim próprio acerca das coisas.
sócia
27 | MAIO 2020
Rui Miguel Fragas: o pseudónimo que começou numa brincadeira
"A boa poesia dá cabo de mim"
Assinas os teus livros com o pseudónimo Rui Miguel Fragas. Porquê este nome?
A poesia é o parente pobre da literatura?
Começou por ser uma
considerada como a matriz da
O Rui Miguel Fragas é mais rural como ‘O Nome das Árvores’ ou mais industrial como ‘O Rumor das Máquinas’?
brincadeira. Foi uma forma que
literatura, logo nessa perspetiva
É tudo. Por exemplo, no livro de
arranjei para publicar poemas no
não é o parente pobre, é a mãe
contos é tudo muito rural, passa-
Facebook sem as pessoas
da literatura. É uma ideia
se tudo numa aldeia, em meados
saberem que eram meus.
amplamente aceite que a poesia
do século XX, e essa parte
nasceu até antes de os seres
interessa-me, mas o lado
humanos saberem escrever, em
industrial também me interessa. O
termos orais. A poesia, assim,
último livro [‘Sobre o Prumo das
Não era resguardar. Foi uma
nasceu primeiro que a literatura.
Falésias’] já não é uma coisa, nem
estratégia, ainda anterior à
Podemos afirmar que é um
outra, já é uma visão mais
publicação do meu primeiro livro,
parente pobre, sim, no que
cósmica. O próximo livro iria sair
que encontrei para saber a
respeita à edição e divulgação.
em junho, mas já não deve sair
Tinhas essa necessidade de te resguardar perante a tua obra?
reação dos leitores.
Normalmente, a poesia é
[devido à pandemia da COVID-
Não confiavas nos poemas que escrevias?
Mas concordas que há um distanciamento da sociedade em relação à poesia…
Nunca confio completamente.
Sim, claro. A poesia interessa a
transformação da palavra na voz
Mesmo em tudo o que publiquei
um círculo restrito de pessoas. Um
e coisas assim.
guardo sempre alguma
romance tem uma plateia muito
desconfiança.
mais ampla. Um romance médio
Voltando ao pseudónimo... Depois dessa brincadeira inicial, quando publiquei o primeiro livro,
pode vender milhares de exemplares, um livro de poesia venderá centenas…
19]. Está ligado a outras matérias. É um livro que aborda a temática do ator e do teatro, da
És professor do ensino secundário, dirigente do Pateo, produtor de peças de teatro, o que adivinha uma agenda sobrecarregada. A poesia também tem horários?
Fragas seria mais interessante
O que é para ti um bom livro de poesia?
que Rui Féteira e ficou. O Rui sou
Não sei explicar. Eu sei quando
essas tarefas todas. Aquilo que
eu, o Miguel é a aldeia onde eu
leio. Não tenho uma definição
disse inicialmente, descobrir uma
nasci [São Miguel, Vila Nova de
teórica. A boa poesia é uma
ideia, uma luz, isso não tem
Poiares] e o Fragas o lugar dessa
poesia que dá cabo de mim, que
horário, o trabalho sobre isso é
aldeia onde eu cresci que se
entra e que toca e que me faz
que é, sobretudo, à noite.
chama Fraga.
vacilar. É uma poesia que
a editora achou que Rui Miguel
Tem. É à noite, depois de fazer
questiona. E que é bela. Reúne a
O poeta não dorme?
procura do conhecimento com a
O problema do poeta é que ele
arte. Tem beleza, tem música. É
dorme. É normalmente quando
aquela poesia que se sente
estou a adormecer que surgem
quando se lê e que não deixa de
ideias interessantes, mas estou
se sentir mesmo depois do poema
tão cansado para me levantar que
acabar.
não vou registar a ideia, achando que no dia a seguir ainda me lembro. Obviamente, quando acordo, não me lembro de nada.
A criação exige solidão? Quando me dedico ao trabalho poético, sim. Tenho sorte porque tenho as condições ideias para isso. Habitualmente tenho uma casa só para mim, o que é ótimo.
Escreves em silêncio ou com música? Em silêncio. Com música é raro. Sou um privilegiado: moro ao lado do mar, escrevo com o mar.
sócia
28 | MAIO 2020
"A poesia é feita para ser dita em voz alta e para ser ouvida. Há uma dimensão teatral muito própria na poesia."
A dolorosa experiência dos palcos: "não me considero ator amador" Como chegas ao teatro?
amador. Nos projetos teatrais
Cheguei quase por acidente.
tento estar mais na parte da
Consideras que o teatro gosta de poesia?
Sempre gostei de teatro, como
produção. Entrei em cinco ou seis
Gosta, claro. Aliás, o teatro é
gosto de pintura ou de escultura.
peças do Pateo e uma ou outra
poesia também. Apenas utiliza
Se não estivesse no teatro,
fora, mas são participações
ferramentas que a poesia não
poderia estar em qualquer outra
pontuais. Não é uma área que me
pode utilizar, como a encenação,
dessas áreas. Acidentalmente e
interesse particularmente.
o corpo, as luzes, o som, etc. O
por causa de duas pessoas – tu
Pontualmente gosto de fazer a
teatro pode também pegar em
[Ricardo Santos] e a Donzília
experiência, embora seja dolorosa
textos poéticos e levá-los para o
[Freire] – cheguei ao teatro. A
pelo stress que me provoca.
palco. O Pateo já o fez uma vez,
Donzília convidou-me para fazer
Tento, acima de tudo, divertir-me.
com textos de Fernando Pessoa e
um clube de teatro na escola
Almada Negreiros, na peça 'O
depois, com ela e contigo nasceu
O que levas da poesia para o palco?
o Pateo [das Galinhas] e o meu
Levo tudo aquilo que faço na
Aliás, trabalhar textos poéticos
interesse pelo teatro, no sentido
poesia: dar o meu melhor. Na
teatralmente é um projeto que
de estar lá dentro e não apenas
poesia, no teatro, seja onde for,
gostaria que o Pateo pudesse
como espetador.
não gosto de brincar. Não gosto
concretizar. Por outro lado, a
de estar só para fazer número. É
poesia gosta de teatro. A poesia
ao dar o melhor que me divirto e
é feita para ser dita em voz alta e
tiro algum prazer em estar lá [no
para ser ouvida. Há uma dimensão
palco]. É também a única forma
teatral muito própria na poesia
[Secundária de Cantanhede] e,
Estás a falar no campo da produção. No entanto, depois experimentas o palco também… Sim, mas foram participações
de reduzir o stress que a situação
pontuais. Não me considero ator
me provoca, porque sei que não é
Mistério do Mundo é do Tamanho Disto'. Gostaria que se repetisse.
.
propriamente o meu quintal.
Ricardo Santos Fotografias de Filomena Praça (pág .26), Nuno Caetano (pág. 27) e Carlos Gomes (pág. 29) Entrevista de
sócia
29 | MAIO 2020
SOPHIA
EDUCAR PELA DANร A
sรณcia
30 | MAIO 2020
SOPHIA GIL Leptossómica, com ar de menina rebelde, Sophia Gil, 38 anos, educadora social de formação, ocupa grande parte do seu tempo livre a alinhar movimentos com o ritmo da música. “
Gosto de criar ”,
confessa a
responsável e coreógrafa do grupo de dança
emociono-me com o que faço, com o que vejo os meus alunos fazerem ”. Mais essência do que matéria, o ‘Vaisah Dançar’: “
discurso, exposto sobre um sorriso largo e contagiante, faz lembrar Fernando Pessoa:
« viver
não é necessário, necessário é criar
».
Sophia, que nunca se imaginou bailarina profissional e que em criança queria mesmo era ser astronauta, reinventa-se em cada nova coreografia. Leva para o palco o mundo que a rodeia e desse exercício de criação livre retira um prazer maior, diferente daquele que sente quando ela própria se entrega à dança.
O gosto pela dança já vem desde pequenina ”. Uma paixão “ escondida ” redescoberta quando, no final da Mas, afinal, como tudo começou? “
licenciatura, foi dar aulas de atividade física na “
extinta e saudosa EB1 dos Vais ”,
na Freguesia
boas pessoas, sempre simpáticas, atenciosas, divertidas, cúmplices ”, merece-lhe um carinho de Buarcos. Aquela comunidade, feita de “
especial ou não residisse nela a génese de um tempo novo na sua vida. Após a apresentação de um número de dança com os alunos numa
davam-me a chave da coletividade dos Vais [Sociedade União e Operária dos Vais] para que todos os sábados pudesse dar aulas de dança ”. Os festa da escola, chega o desafio: “
pais acreditavam que o passatempo seria
em vez de ficarem agarrados ao telemóvel, juntavam-se para dançar, conversar, brincar, trocar ideias, fazer os seus próprios espetáculos ”, numa benéfico para os filhos: “
relação simbiótica entre sociabilização e
Comecei com vinte miúdos e, entretanto, começaram a aparecer muitos mais ”. Estava dado o pontapé de saída para criatividade. “
colocar os Vais a dançar. Em linguagem artística: ‘Vaisah Dançar'.
Todavia, a exigente Sophia viu naquela oportunidade um trabalho para levar a sério. Inscreveu-se numa academia de dança [a Figueira Stage School], onde apreendeu conhecimentos e desenvolveu competências técnicas. Explorou quase todos os géneros, menos o teatro musical, e não deixa de sublinhar a relação difícil com o ballet:
frequentei três meses e desisti. Tive necessidade de perceber a base, mas aquilo já não era para a minha idade [tinha 29 anos] e estrutura óssea ”. Focou-se nas outras “
disciplinas e certificou-se em Hip Hop, Sapateado e Contemporâneo. Agora já podia "
dar mais e melhor "
aos seus alunos.
muitos não tinham condições monetárias para estar numa academia a aprender e a ter formação nas várias áreas ”. Na realidade, “
A consciência social sempre a acompanhou e,
não são as ditas aulas normais, não são aulas técnicas ”. Sophia faz questão de levar a sua talvez por isso, as aulas do ‘Vaisah Dançar’ “
"Levo para as aulas [do 'Vaisah Dançar'] todo o tipo de assuntos. Há sempre uma mensagem que fica."
área de formação – a educação social – para a
levo todo o tipo de assuntos para a aula e esmiúço, exploro ”, acicatando o espírito crítico. E resulta? “ Há sempre uma mensagem que fica ”, diz com a determinação dança: “
de quem tem uma missão a cumprir.
sócio
02 | MAIO 2020
sócia
31 | MAIO 2020
Dez anos a dançar o espírito de união, a arte e o associativismo ”, até porque, sublinha, “ se não fosse a dança, muitos dos elementos do grupo não tinham qualquer contacto com o meio associativo ”. A coreógrafa não isenta de culpas as próprias coletividades: “ muitas não têm o poder da divulgação ”, fazendo com Nas aulas, privilegia “
que os jovens se mantenham afastados e alheados das atividades que nelas se realizam.
As aulas no ‘Vaisah Dançar’ são pagas, porque o
grupo de dança não é um hobbie, mas um trabalho que complementa a [sua] atividade como professora de expressões artísticas " e, claro, como " qualquer trabalho deve ser remunerado ". Mas as verbas também são precisas “ para pagar os adereços e vestuário do grupo, assim como o seguro desportivo e outras coisas ”, ainda que os pais suportem sempre a " despesa maior ". Por outro lado, "
também é uma forma de ajudar a coletividade,
"Sinto que o ‘Vaisah Dançar’ é o meu projeto de educação social." “Há dez anos, os miúdos davam tudo para sair de casa, para estar com os amigos numa atividade. Hoje, alguns deles vão aos ensaios mais pelos pais do que por eles ”. As redes sociais também não ajudam: “ a dança tem de ser a dos vídeos do YouTube ou imitar o Tik Tok, porque está na moda ”. “ Mas nem tudo é mau ”, faz questão de sublinhar, afastando o desalento. “ Tenho três alunas que permanecem comigo desde a raiz, a Inês Moreira, a Isabel Ferraz e a Matilde Teixeira ”. Nomes que se juntam a cadenciado e alegre.
tantos outros que fazem a história do ‘Vaisah
tenho muito orgulho nos alunos e no trabalho que eles realizam comigo. São super talentosos ". Dançar’ e envaidecem a mentora Sophia: "
que fica com uma parte da receita. Dez anos depois, a responsável quer continuar a
vivacidade ”
Depois da fundação na SUO Vais, a que se
fruir da “
seguiu um longo período no Grupo Caras
proporciona. Até quando? “
que a dança lhe
instalações do Grupo Instrução e Sport (GIS),
Até ter alunos interessados, motivados e com vontade de seguir e continuar com o sonho ”. Depois,
também em Buarcos. Conta atualmente com 35
impõe-se a si própria uma pausa, a fazer
elementos, entre os seis e os vinte e dois anos,
lembrar que o silêncio também é música. Um
mas já foram mais de sessenta. “
silêncio que também se dança, este talvez
Direitas, o grupo utiliza desde fevereiro as
Os miúdos crescem ”, desabafa, “ as ambições e as prioridades acabam por ser outras. Apegome demasiado e acabo por sentir uma espécie de abandono ". Um misto de nostalgia e desânimo ensombra o discurso, habitualmente
Ricardo Santos Fotografias de Catarina Campos (pág. 30) e de Sophia Gil (pág. 31 e 32) Texto de
apenas com o coração, numa coreografia que
Sinto que o ‘Vaisah Dançar’ é o meu projeto de educação social ”, remata. faz questão de partilhar com os outros. “
asuoS e agerbóN/satierF asuoS oinótnA
zoF ad arieugiF Fotografia de
Figueira, Figueira da Foz Das finas areias Berço de sereias Procurando abrigo. Estrelas, doiradas estrelas Enfeitam o Mar Que pede a chorar Para casar contigo. Figueira, e à noite o luar, Deita-se a teu lado A fazer ciúmes Ao teu namorado. E a Serra, que te adora e deseja, Também sofre com a luz do Sol Que te abraça e te beija.
António Ramos Silva
sócia
33 | MAIO 2020
DESPORTO
AMBIÇÃO DE CAMPEÃO
sócia
34 | MAIO 2020
FIGUEIRA VOLEI CLUBE A prática desportiva do voleibol na Figueira da Foz deve muito à fundação do Figueira Volei Clube (FVC), em julho de 2016. Em quatro anos de atividade, os resultados desportivos alcançados falam por si. A paixão pela modalidade de José Fonseca, que, para além de treinador, gere também os destinos da associação, é a força motriz de um clube que tem "
Masculinos ".
a ambição de vir a ser Campeão Nacional de Seniores Femininos e
O voleibol, a nível nacional, tem crescido nos últimos anos e na Figueira da Foz o mister não
tem dúvidas: vem aí um "
grande e risonho futuro ".
Porquê um clube de voleibol na Figueira da Foz?
a funcionar em simultâneo. Foi
E porquê esse pavilhão?
uma fase de grande dinâmica,
Após a época 2018/2019, em que
O Figueira Volei Clube surge para
uma vez que tínhamos todos os
treinámos num espaço da Escola
colmatar
escalões a trabalhar ao mesmo
Secundária Dr. Bernardino
oferta desportiva da cidade. Havia
tempo, cada um em seu espaço
Machado e ainda sem o Pavilhão
futebol,
basquetebol,
autónomo. Antevia-se uma
Hélio Cardoso recuperado, surgiu
desportos
náuticos,
excelente época. Contudo, na
a possibilidade de alugar esse
noite de 13 de outubro de 2018, a
pavilhão. Não era o ideal, mas era
tempestade Leslie, ao destruir a
substancialmente melhor do que o
cobertura do Pavilhão, deixou-
espaço onde treinávamos. Não
nos, literalmente, sem teto!
hesitámos! Não conseguimos
Tínhamos duas opções: ou
"montar" três campos em
acabava por ali o sonho ou íamos
simultâneo, mas conseguimos
à luta. Como não somos pessoas
desenvolver um trabalho com
de desistir, escolhemos a segunda
muito maior qualidade do que na
opção. Fomos à procura de
época anterior.
outras
uma
lacuna
ofertas,
existente
dança,
entre
mas
na
tantas
não
havia
voleibol.
É fácil atrair voleibol? No
início
não
trabalho criação do
que do
Centro
Foz.
Na
jovens
foi
fácil,
para apesar
desenvolvi
Centro Escolar
de da
realidade,
o do
com
a
Gira-Volei Figueira
da
alguns
dos
alternativas, que na altura eram
depois estávamos a treinar
O que se privilegia nos treinos do FVC?
novamente. Num espaço três
Acima de tudo, damos privilégio
vezes mais pequeno e cada vez
ao divertimento, de forma
com mais atletas. Foi uma fase
responsável. Isto é, tentamos
felizmente, temos tido e, modéstia
muito conturbada, com muitas
incutir aos nossos atletas que é
à
dificuldades logísticas. Imagine-
possível aprender e evoluir no
se o que é colocar três equipas
voleibol, divertindo-se, mas com
num espaço onde mal cabia uma,
sentido de responsabilidade. O
mas, com muita vontade,
cumprimento de horários de
conseguimos ultrapassar todos
chegada, a saudação a todos os
Falta de meios materiais. Fizemos
esses obstáculos e acabámos por
elementos do treino, o
um esforço tremendo para
fazer uma época com grande
encerramento do treino com
apetrechar o Pavilhão Hélio
evolução dos atletas e com
o“nosso” Grito, são algumas das
Cardoso [Grupo Caras Direitas]
alguns sucessos desportivos.
rotinas que os nossos atletas
atuais
atletas
altura.
No
temos
tido
maior,
uma
em
exposição
parte,
do
FVC
entanto,
vêm
hoje
dia,
cada
vez
devido
à
procura
parte
dessa
em
mediática
ao
desenvolvido,
trabalho
que
por
vezes
que,
temos em
condições bem difíceis…
A que condições te referes?
com o mínimo necessário para
muito escassas, mas uma semana
adquirem desde o primeiro dia.
desenvolver os treinos de voleibol.
Onde treinam habitualmente?
Foi necessário adquirir postes,
No Pavilhão Gimnodesportivo da
nossos atletas saem com um
redes, bolas, etc., mas
Escola Infante D. Pedro, em
sorriso nos lábios, sabemos que
conseguimos ter três campos
Buarcos.
cumprimos a nossa tarefa.
Quando o treino acaba e os
"O Figueira Volei Clube surge para colmatar uma lacuna existente na oferta desportiva da cidade."
"O FVC tem a ambição de, um dia, vir a ser Campeão Nacional"
O mister: dedicação total à modalidade
Qual é a realidade do voleibol a nível regional e nacional?
acumulando também com as
O clube pende mais para a competição ou para a prática saudável da atividade física?
funções de Presidente da Direção.
Procuramos oferecer soluções
uma fase de grande crescimento
Com 46 anos, professor de
para todas as vertentes. Por isso,
a nível local, regional e nacional.
Educação Física do 3
temos equipas a participar em
A nível regional, no distrito de
Ensino Secundário, não consegue
Campeonatos Nacionais,
Coimbra, existem seis clubes
explicar a opção pela
Regionais, Amadores e também
filiados na Associação de Voleibol
modalidade. “
temos atletas que simplesmente
de Coimbra. A nível nacional, dos
gostam de jogar voleibol, sem a
cerca de 10 000 praticantes, em
seu fado. E se Amália Rodrigues
componente competitiva… Todos
2000, passámos para quase
dizia que
são sempre muito bem recebidos
50 000, em 2020. Estes números
e bem integrados.
são bem elucidativos da
José Fonseca é o treinador do Figueira Volei Clube (FVC),
paixão ”,
sente-se
º
CEB e
Sempre foi uma
assume, como se fosse o
«o
»,
fado não se explica,
também José Fonseca
alinha pelo mesmo padrão: “
não
consigo explicar, apenas sentir ”. “ Acordo a pensar no voleibol e deito-me a pensar no voleibol ”, confessa o mister que, entre “ preparação de treinos, treinos, viagens, jogos, entre muitas outras tarefas ”, dedica
Que caraterísticas tem de ter um bom jogador de voleibol? Tem, acima de tudo, de ter
A modalidade está a atravessar
crescente evolução do voleibol em Portugal. Valores apenas superados pelo futebol.
ter uma grande capacidade de
Que troféus ambiciona conquistar o FVC?
atenção e observação, ser
O FVC tem a ambição de, um dia,
disciplinado, ter vontade de
vir a ser Campeão Nacional de
muitas horas diárias à atividade.
aprender e de evoluir e um grande
Seniores Femininos e Masculinos.
Empreendedor, para além do FVC,
espírito de grupo e de sacrifício,
É importante lembrar que o clube
que idealizou, fundou e gere, o
pois as conquistas coletivas têm
é muito recente, mas já tem
dirigente cofundou o Clube de
de ser, sempre, mais importantes
alguns registos interessantes.
Voleibol da Tocha, em 2004, o
do que as individuais.
Centro Gira-Volei do Centro
vontade de o ser. Para isso deverá
O voleibol na Figueira da Foz tem futuro?
da Foz, em 2014 e, entre outros
Como sobrevive um clube recém-formado?
campeonatos, ressalva a
O FVC consegue manter a sua
dirigentes, pais e familiares
organização da “
atividade graças à contribuição
excecionais como tem o FVC, o
mensal de cada atleta, aos
voleibol na Figueira da Foz estará
patrocinadores que, desde o
sempre garantido e com grande e
início, têm sido inexcedíveis e ao
risonho futuro.
Escolar de São Julião – Figueira
Final 4 da Taça de Portugal de Voleibol, em Seniores Masculinos, na Figueira da Foz, em 2016 ”. José Fonseca partilha o palmarés com
apoio do Município, excelente
o FVC, mas a título individual,
também desde o momento inicial
enquanto treinador, acumula
da fundação.
ainda os títulos de Campeão
Femininos – Desporto Escolar
As receitas são suficientes para cobrir os custos?
(Guarda), durante três anos
Têm de ser… É preciso um grande
letivos consecutivos, de Vice-
exercício de gestão financeira
campeão de Voleibol Minis
para, com pouco, fazer muito…
Femininos– Desporto Escolar
No FVC temos uma mentalidade
(Coimbra) em 2004/2005 e
muito assertiva e consciente. Não
2005/2006 e o de Vice-campeão
damos “o passo maior do que a
Nacional de Gira-Volei 8-10 anos
perna” e cada investimento é
Feminino, em 2015.
ponderado do ponto de vista
Regional de Futebol Iniciados
orçamental, para não haver excessos. As despesas prendemse essencialmente com o pagamento de inscrições de atletas na Federação Portuguesa de Voleibol, o pagamento das arbitragens à Associação de Voleibol de Coimbra, os encargos inerentes às deslocações para todo o país, o aluguer do pavilhão para os treinos e para os jogos em casa, bem como a aquisição de material desportivo necessário.
sócia
36 | MAIO 2020
Enquanto houver atletas, técnicos,
"A nível nacional, dos cerca de 10 000 praticantes, em 2000, passámos para quase 50 000, em 2020. Estes números são bem elucidativos da crescente evolução do voleibol em Portugal."
Por dentro do clube
Palmarés
Fundação :
Época 2016/2017
22 de julho de 2016
Número de atletas :
Campeão Regional de Minis Femininos (AVC) 50
Campeão Regional de Minis Masculinos (AVC) Campeão Regional de Gira-Volei (08-10 anos) Masculinos (AVC)
Escalões:
Campeão Regional de Gira + Masculinos (16-18 anos) (AVC)
Petinguinhas/Minis A: 08-10 anos
Campeão Regional de Kinder Cup Infantis Masculinos (AVC)
Iniciados Femininos: 14 anos
Iniciados Masculinos: 14 anos
Época 2017/2018
Seniores Masculinos: + de 18 anos
Campeão Regional de Minis Femininos (AVC)
Gira + (Femininos): + de 16 anos
Campeão Regional de Minis Masculinos (AVC)
Campeão Regional de Gira + Masculinos (16-18 anos) (AVC)
Campeão Regional de Kinder Cup Infantis Masculinos (AVC)
Campeonatos inscritos na época 2019/2020
Campeão Regional de Kinder Cup Juniores Masculinos (AVC) 3.
º
Lugar Sub 14 Masculinos, na Etapa da Figueira da Foz, do
Petinguinhas/Minis A
Circuito Nacional de Gira-Praia (FPV)
Campeonato Regional de Minis
Circuito Regional de Gira-Volei
Época 2018/2019
Campeão Regional de Kinder Cup Infantis Femininos (AVC)
Iniciados Femininos
Campeão Regional de Kinder Cup Infantis Masculinos (AVC)
Torneio de Abertura (AVC)
Campeão Regional de Kinder Cup Juniores Masculinos (AVC)
Campeonato Reg. Iniciados (AVC)
Vice-campeão Nacional de Kinder Cup Infantis Masculinos (AVC)
Torneio António Cipriano (AVC)
Época 2019/2020
Iniciados Masculinos
A COVID-19 fez antecipar o encerramento da época, mas, em março,
Campeonato Inter-regional de
o FVC tinha já garantidos os títulos de Campeão Regional de Gira-
Iniciados (AVL)
Volei 08-10 anos Femininos e Gira + Masculinos (+ de 23 anos) (AVC)
Campeonato Nacional de Iniciados (FPV)
Estava ainda a disputar as seguintes competições:
- Torneio António Cipriano, Iniciados Femininos (AVC)
Gira + Femininos
- Campeonato Nacional de Iniciados Masculinos (FPV)
Circuito Gira-Volei e Gira + (AVC)
- Campeonato da Amizade, Seniores Masculinos.
Seniores Masculinos
AVC - Associação Voleibol de Coimbra
Campeonato da Amizade
AVL - Associação Voleibol de Lisboa
[disputado por 11 equipas de
FPV - Federação Portuguesa de Voleibol
Figueira da Foz, Coimbra, Aveiro e Viseu]
Entrevista de
Ricardo Santos
Fotografias cedidas pelo FVC
sócia
37 | MAIO 2020
DOSSIER
40
VISÕES
PARA A DÉCADA M O V I M E N T O
A S S O C I A T I V O
sócia
38 | MAIO 2020
VISÕES PARA A DÉCADA Como estaremos em 2030? Como lá chegaremos? Que oportunidades e desafios se colocam à sociedade e ao movimento associativo em particular? 40 personalidades nacionais e locais, com e sem ligações às coletividades, revelam-nos a sua visão para a década. Exercícios de livre pensamento que ajudam a compreender as dinâmicas do associativismo e revelam, de forma holística, uma sociedade ansiosa por se reencontrar com os valores maternos do humanismo e da fraternidade. Um dossier para reler em 2030, porque o futuro começa agora.
VISÕES TEMÁTICAS UM ANDAMENTO PARA O MOVIMENTO FILARMÓNICO Afonso Alves
VISÕES DE SOCIEDADE A DÉCADA PÓS COVID-19 António Matos (Padre) Clementina Henriques
Helena Baptista
Daniel Santos
Renata Oliveira
Fernando Lopes Manuel Castelo Branco
UM CENÁRIO PARA O TEATRO AMADOR Deolindo L. Pessoa João Miguel Amorim José Teles Ricardo Santos
UMA VISÃO SOBRE O FOLCLORE Daniel Calado Café Adriana Maia
Nuno Gonçalves Rodrigo Batata
A IMPORTÂNCIA DO GREGARISMO António Tavares Bruno Paixão João Pereira
AS NOVAS FORMAS DE LAZER E DE ASSOCIATIVISMO António Carraco dos Reis
UMA VISÃO SOBRE O DESPORTO ASSOCIATIVO Ana Lúcia Rolo Horácio Antunes Rui Feijão
António Jorge Lé Daniel Azenha Mafalda Azevedo
OPORTUNIDADES E DESAFIOS DO MOVIMENTO ASSOCIATIVO António Agostinho Guida Cândido Francisco Relva Pereira Lídio Lopes Nuno Lopes Sérgio Pratas
AS RELAÇÕES ENTRE O ESTADO CENTRAL O E MAP Augusto Flor Raquel Ferreira
AS MULHERES NO MOVIMENTO ASSOCIATIVO Silvina Queiroz Teresa Machado
O ASSOCIATIVISMO NO CONCELHO DA FIGUEIRA DA FOZ Carlos Tenreiro José Augusto Marques Rosa Batista Sansão Coelho
sócia
39 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
A DÉCADA PÓS COVID-19
VISÕES PARA A DÉCADA
COLETIVIDADES: PRESENTE E FUTURO P A D R E
A N T Ó N I O
M A T O S
1 - O concelho da Figueira da Foz deve ser o que
2 - Para o futuro - não sei!
no País tem mais Coletividades. Nada será como antes. A vida mudou A freguesia de Tavarede tem cinco.
radicalmente. Temos que nos habituar a viver assim!
A Coletividade é um enriquecimento para o Povo. Nos meus princípios de pároco de Tavarede
As Coletividades continuarão a ser valiosas.
comparei-as a
Porém, terão que funcionar de outro modo.
« pequenas
universidades
»
no meio
de nós.
Qual? Não sei!!! Ainda estamos em mudança, e não sabemos, onde é que tudo vai parar.
Nelas se aprendeu a ler e escrever; prendeu-se a aceitar os outros como eles são; nelas se aprendeu
Creio que na altura própria será escolhido o
a viver.
melhor caminho!
Com um leque variado de atividades: teatro, música, desporto, costura, revistas, etc, trouxeram a cultura ao Povo. E a cultura é a maior riqueza do Povo!
As grandes individualidades,(fazendo certamente o seu melhor) estão sempre longe!
O grande elo de ligação entre as pessoas é sem dúvida nenhuma feito pelas Coletividades.
Elas estão próximas. O Papa Francisco fala muito
"
As Coletividades continuarão a ser valiosas. Porém, terão que funcionar de outro modo. Qual? Não sei!!! Ainda estamos em mudança, e não sabemos, onde é que tudo vai parar
da proximidade, como um valor fundamental! Estar próximo…estar ali…estar junto de….viver de mãos dadas.
Em 46 anos que fui pároco de Tavarede creio que nunca faltei a qualquer Sessão Solene.
Por ela eu media o
« pulsar »
da Coletividade e ao
mesmo tempo era um enriquecimento para mim próprio.
Foi o que constatei até agora nas Coletividades.
sócia
40 | MAIO 2020
Pároco
Diocese de Coimbra
40
VISÕES DE SOCIEDADE
A DÉCADA PÓS COVID-19
VISÕES PARA A DÉCADA
ASSOCIATIVISMO: QUE REALIDADE POST PANDEMIA? C L E M E N T I N A
R O D R I G U E S
Nestes dias de isolamento social, o espaço público,
Que aprendizagem é possível retirar do seu
e consequentemente as sociabilidades, as
trabalho, nomeadamente quanto às relações de
dinâmicas relacionais e de interacção, o trabalho
vizinhança? Houve novos laços criados? E de que
associativo, tem sido substituído pelas redes
tipo? Com que públicos? Com que eficácia?
sociais digitais. Claro que apenas para os
Algumas destas redes cívicas navegam em
utilizadores com competências adequadas. Tempo
« territórios »
de mudança relacional!
locais, com algum elitismo sendo vistos com
próximos da actuação dos poderes
alguma desconfiança. Como vão os poderes Sente-se um certo receio de que este
locais rendibilizar esta energia colaborativa de
confinamento enfraqueça os laços que ligam os
proximidade e disseminá-la? O que vai mudar a
membros da comunidade associativa o que deixa
partir daqui? As redes digitais vão reforçar ou
antever um agravamento das condições sociais, em
esvaziar os laços de vizinhança presencial? Ou
geral, e deixe mais fragilizados os grupos sociais
ficará tudo como dantes? E as relações entre
de risco, nomeadamente os mais isolados, bem
protagonistas cívicos e institucionais, vão alterar-
como as instituições que vêm os seus públicos
se? Este é, a meu ver, um dos grandes desafios
menos assíduos.
com que nos deparamos e daí dependerá a eficácia e grande parte da eficiência do MAP.
Porém, esta pandemia, também revela, com evidência forte, uma enorme energia cívica e de
A realidade emergente induz um nível de
voluntariado, com o surgimento de diferentes
dificuldades tremendo para as nossas
movimentos cívicos, de cidade e de bairro, em
organizações, quer ao nível da sustentabilidade
resposta a necessidades, diferenciadas,
financeira e orgânica, quer quanto à sua
emergentes. É preciso dar-lhe consistência,
representação e afirmação. Fortalece-se a
agregá-los e torná-los eficazes, pois colocam-se
necessidade de mais criatividade para respostas a
dúvidas sobre a robustez e sustentabilidade destas
situações de risco, devidamente identificadas.
novas respostas e sobre os efeitos nas redes
Emergem desafios onde o papel da mulher,
tradicionais de vizinhança.
ancorado na sua capacidade de resiliência e inovação, sensibilidade para enfrentar novos
Lembrar um indicador intrínseco ao Movimento
desafios, praticas diversificadas inerentes ao seu
Associativo Popular (MAP) (continua a ser?) o facto
saber fazer, estar e ser, se fortificam.
de, particularmente nas regiões mais isoladas, as suas organizações serem os únicos promotores de
Estes são, creio, alguns dos desafios, substantivos,
bens de produção e consumo cultural e de lazer
dos quais depende, em grande medida, a
a nível local. Esta nova realidade, induz claros
sustentabilidade e eficácia do MAP, no futuro
constrangimentos a estas práticas.
próximo. Podemos sair mais fortes se soubermos reverter as dificuldades em oportunidades.
Com efeito o confinamento é o principio essencial à segurança. Como se desenvolvem então as sociabilidades? Como se estimula a inclusão? Que novas práticas e com que protagonistas (individuais e colectivos) de base digital emergiram desta crise nomeadamente no MAP? Como se avaliam estes colectivos quanto à sua natureza, motivações e resultados? Quais os impactos?
"
A realidade emergente induz um nível de dificuldades tremendo para as nossas organizações, quer ao nível da sustentabilidade financeira e orgânica, quer quanto à sua representação e afirmação
Socióloga e Assessora da Direção da
Confederação Portuguesa das Colectividades
sócia
41 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
A DÉCADA PÓS COVID-19
VISÕES PARA A DÉCADA
AS ASSOCIAÇÕES VÃO CONTINUAR A CRIAR O FUTURO. BASTA SONHAR D A N I E L
S A N T O S
A única caraterística que podemos atribuir ao
dominados pelo medo do que possa vir a ser, já
futuro é ser completamente desconhecido. Por
que, como entidade coletiva, poderemos e
mais visionários que consigamos ser, só por um
deveremos influenciar, até ao ponto em que é
milagroso acaso conseguiremos imaginar o que
possível, aquilo que há-de vir.
virá ocorrer para além do nosso tempo, sobretudo quando temos perante nós a tarefa de tentar
De outra perspetiva, em concreto, no caso aqui da
vislumbrar um horizonte longínquo.
nossa terra, a Figueira da Foz, a evolução demográfica plasmada no relatório do processo
O que podemos fazer, e essa é a nossa tarefa
de revisão do Plano Diretor Municipal (PDM) já
atual, é analisar as lições do passado e, com esse
não nos era favorável, atendendo às projeções
conhecimento, tentar projetar o futuro,
que apontam para 2031 que o número de
influenciando-o, tanto quanto cabe a cada um.
habitantes descerá aos níveis dos anos cinquenta
Raramente surge um George Orwell (1984) ou um
do século passado. Assunto, aliás, já antes
Aldous Huxley (Admirável Mundo Novo) distópicos,
tratado no Plano Estratégico onde se definiu
suficientemente premonitórios. E, se algum mais
como pontos fracos o decréscimo populacional e
surgir, ninguém pode assegurar hoje que acertou
o exagerado número de habitações que a gestão
com o caminho do futuro.
territorial permitiu, com consequências negativas para todos nós!
Quanto melhores formos hoje, individualmente e em sociedade, maior é a probabilidade de termos
Lições aprendidas e conclusões percebidas,
direito a um futuro à nossa medida, ou, como disse
conduzem à probabilidade de melhores soluções,
Agostinho da Silva, “os que nada entenderam do
razão pela qual, cada um de nós, em telereuniões
passado nada podem sonhar para o futuro”. Um
ou de outra forma, ajudará a sociedade a
melhor futuro dependerá do nosso caráter, tal
encontrar os melhores caminhos que nos
como o definiu o filósofo espanhol Ortega y
conduzirão ao melhor futuro possível.
Gasset, quando em “A Rebelião das massas” conclui: “É, pois, falso dizer que na vida decidem
Parafraseando Peter Drucker, “não podemos
as circunstâncias. Pelo contrário: as circunstâncias
prever o futuro, mas podemos criá-lo”. As
são o dilema, sempre novo, ante o qual temos de
Coletividades que ora celebramos (181 cá pelo
nos decidir. Mas quem decide é o nosso caráter”.
concelho), plenas de saber acumulado e
Quem imaginaria, há seis meses atrás, que o
criatividade, são fonte inesgotável de informação
momento que vivemos hoje é de confinamento e de
que, hoje, em muito podem contribuir para sonhar
preocupação permanente, de dependência
e criar as soluções de futuro definidas na bissetriz
eminente do comportamento dos serviços de
ponderada dos interesses da comunidade.
saúde, de decisões diárias do Governo, eventualmente de fome e de carências para muitos?
Quem poderá então imaginar o que poderá sobrevir, quando se fala já em segunda e terceira fase da pandemia? E o que poderá surgir mais que não consigamos controlar?
Mas não, não poderemos descansar, ficando à
"
A evolução demográfica (...) não nos era favorável, atendendo às projeções que apontam para 2031 que o número de habitantes descerá aos níveis dos anos cinquenta do século passado
espera do que não sabemos que virá, nem
Engenheiro Civil e Ex-vice-presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz
sócia
42 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
A DÉCADA PÓS COVID-19
VISÕES PARA A DÉCADA
REPOR O PARADIGMA, VIVER O ASSOCIATIVISMO F E R N A N D O
L O P E S
Em dia de festa do associativismo e das
Não devemos esquecer que são as coletividades
coletividades importa partilhar convosco algumas
que nos fazem reconhecer como grupo, com o
visões e propostas para analisar, partilhar e
sentimento de pertença e com uma história
incrementar em conjunto, onde se possam
pessoal e social indissociável. É o movimento
encontrar respostas para aquilo que alguns
associativo que nos traz as memórias das gentes,
designam por crise do associativismo.
devendo continuar a preservar a identidade do espaço, onde todos nós nos possamos rever como
Hoje, mais do que nunca, com esta nova realidade
família. Esse é o seu maior desafio, o seu maior
de um confinamento necessário, de um isolamento
desígnio e a sua verdadeira realidade para os
social imperioso, por causa de uma pandemia, foi
próximos anos.
notória a presença do associativismo e das coletividades, enaltecendo os seus pilares
Devemos continuar a exigir do poder central e
fundadores, através de múltiplas iniciativas em prol
autárquicos apoios para que essa mudança seja
da ajuda do outro.
uma realidade, pois só assim os dirigentes associativos poderão continuar a sua senda
Contudo, é impossível escapar à realidade social
abnegada e altruísta, na realização de atividades
em que estamos inseridos e que tem vindo a alterar
e ações que visam preservar a história das gentes,
os seus objetivos de sociedade, trocando
a sua cultura e a sua identidade e, mostrar ao
paulatinamente, a solidariedade pelo egoísmo, a
poder político que é pelo associativismo que se
partilha pelo solipsismo, o voluntariado pelo
chega de forma mais incisiva aos que mais
narcisismo, o outro pelo eu. Esta realidade
precisam. Há que manter a exigência pelo
verifica-se pela postura das pessoas que aos
respeito e pelo reconhecimento por todos aqueles
poucos foram criando uma vivência de aquisição
que de forma séria e desinteressada trabalham
de bens fúteis, do usufruto vertiginoso da ascensão
para todos nós e dão da sua vida particular muito
social, do desejo vaidoso da ostentação social,
do seu espaço pessoal. Neste dia de
deixando para trás o elemento mais valioso, que
comemoração do Dia Nacional das Coletividades,
nos torna seres socias – o outro.
resta dizer com muita energia e veemência: Vivam os dirigentes associativos! Vivam as
Com esta nova vivência humana há que reconhecer que o que está mal não é o associativismo em si, ou as coletividades em particular, mas sim o paradigma social vigente. O associativismo não tem que se adaptar a ele, antes pelo contrário deve ser resistente e resiliente. Deve pautar a sua postura na consciencialização da sociedade para se encontrar consigo mesmo, isto é, voltar a entender-se como um todo, onde a partilha, a solidariedade e o voluntariado são os valores que devem ser ensinados aos jovens, praticados pelos adultos e dado como herança pelos mais velhos.
Coletividades! Viva o Associativismo!
"
É o movimento associativo que nos traz as memórias das gentes, devendo continuar a preservar a identidade do espaço, onde todos nós nos possamos rever como família. Esse é o seu maior desafio, o seu maior desígnio e a sua verdadeira realidade para os próximos anos
Doutor em filosofia, docente do ensino secundário e autarca
sócia
43 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
A DÉCADA PÓS COVID-19
VISÕES
PARA A DÉCADA
O VÍRUS DO INDIVIDUALISMO M A N U E L
C A S T E L O
B R A N C O
O Covid-19, em termos de saúde pública, revelou-
e de vivência, comunitárias até então dominantes:
se um vírus particularmente adequado aos
sindicatos, partidos, igrejas, colectividades de
correntes tempos de híper-individualismo de que
bairro, clubes populares, associações culturais,
fala Gilles Lipovetsky.
tudo foi sendo levado no elevar da maré narcísico-individualista dos tempos neoliberais.
A pandemia surge no preciso momento do alegado triunfo, nos planos económico, político e
Não espanta, pois, a adesão bovina a práticas
social, do neoliberalismo de matriz chicago-
como a do “distanciamento social” como
hayekiano tornado ideologia única a partir do
instrumento privilegiado do real, singular, pessoal
início dos anos 80 do século XX, com a ascensão
e intransmissível medo da doença e da
de Reagan e de Thatcher nos Estados
morte.
Unidos e em Inglaterra. Na verdade, a suave aceitação da autoritária Thatcherismo e reaganismo que se constituíram
instituição de “confinamentos” e de “distâncias
como vanguarda do movimento de crítica e de
sociais” é o resultado lógico de décadas de
desconstrução do Estado Social, colocando termo
políticas públicas e de práticas privadas de
ao consenso keynesiano do pósguerra, pela
distância humano-existencial e de apartheid
apologia do Estado mínimo, das privatizações, das
económico-social: condomínios fechados, guetos,
desregulações e da eficiência dos mercados
subúrbios de habitação social, favelas, campos de
“eficientes” auto-regulados.
refugiados são o retrato urbanoespacial daquilo a que o filósofo Byung Chul Han define como “a
As consequências do híper-individualismo
exclusão do Outro”.
neoliberal são bem conhecidas: no plano antropológico, a prescrição da redução radical da
Nesta precisa medida o Covid-19, ao ser pretexto
provisão pública de direitos económicos, culturais
e fundamento de políticas públicas de medo do
e sociais – pela atribuição, financiada pelo
outro e de evitamento social é, por excelência, um
imposto progressivo, de prestações e benefícios
agente patogénico individualista de altíssimo
sociais como os subsídios de doença e de
contágio, anunciando a continuação do nada
desemprego, a criação de redes públicas
admirável mundo novo
de saúde e de educação, a edificação de
do neoliberalismo.
relevantes infraestruturas públicas, entre outros –
"
redundou na desqualificação humana e social dos losers económico-sociais, vistos como parasitas sem direito à cidade.
No plano comunitário, o culto da “personalização” híper-moderna, consequência colateral da explosão individualista-radical de Maio de 68, levou ao declínio e dissolução progressivos das entidades de enquadramento,
A suave aceitação da autoritária instituição de “confinamentos” e de “distâncias sociais” é o resultado lógico de décadas de políticas públicas e de práticas privadas de distância humanoexistencial
Docente Universitário
Coimbra Business School
sócio
44 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
A DÉCADA PÓS COVID-19
VISÕES PARA A DÉCADA
CONFIANÇA N U N O
G O N Ç A L V E S
O módico de boas maneiras exige começar por
No binómio necessidade/resposta, certas
agradecer o convite e exarar a honra que constitui
correntes defendem que o associativismo é um
para mim participar nesta edificante publicação,
valor em si mesmo, um instituto indelével que por
felicitando os seus promotores.
essa índole tem de se adaptar aos tempos. Outras defendem que é um movimento de instituições em
Qualquer exercício de opinião prospetiva, assente
resposta às necessidades das pessoas e
na história e no “estado da arte”, configura tão
naturalmente assumirá uma posição dependente
somente uma perceção do futuro que é facilmente
da qualidade e versatilidade dessas mesmas
mutável pelas consequências do imponderável.
respostas. Sejam válidas em separado ou em
Sabemos do impacto do COVID-19 até agora,
simbiose, estas teorias são orientações
especulamos sobre as suas reais consequências,
interpretativas de uma preciosa realidade que
mas ambicionamos uma década pós COVID e não
julgo se manterá, ainda que com mutações e
uma década a par do COVID. Não obstante, seja
adaptações. Advém da alma das pessoas e do
qual o cenário, nada ficará igual e o dito regresso
âmago coletivo criado nas raízes da história, da
à normalidade não terá a mesma configuração.
magia das estórias que aproximam os povos genuinamente distintos ou da sã rivalidade que os
O contexto a que o COVID nos obrigou, enraizou
inspira. Advém dos ímpares e humildes sucessos a
uma consciência coletiva de maior dimensão face
que nos apropriamos passando a fazer deles parte
à finitude Humana que compulsa o significado da
integrante, das idiossincrasias da Figueira da Foz
vida com a nossa natureza gregária. Parece
e da dimensão telúrica que gera inteligibilidade
paradoxal que encontremos essa significação em
da importância holística do nosso concelho. Sem
confinamento, ainda que obrigatório ou
vitupério, importa exaltar a Figueira da Foz por ter
recomendado, quando a harmonia e paz interiores
o associativismo no seu código genético como
também se enraízam na satisfação da necessidade
alma do simbolismo coletivo.
da partilha e aceitação. Mas é desta aparente paradoxalidade que podemos sustentar uma
Estas, aliadas à capacidade de superar os
enorme oportunidade para o preenchimento do
desafios, são razões firmadas para ter esperança
objeto das Coletividades. Este “novo tempo” exara
numa década auspiciosa. Garantir o cumprimento
uma intensa alma, ávida de ter completude social,
de objetivos de sustentabilidade financeira e
de partilha e de respeitabilidade biunívoca nos
ambiental; a cabal gestão dos sócios; gerir o
desígnios do preenchimento do Ser. Assim
património imaterial e imobiliário. Capacidade de
acredito, mas vou mais longe, assim o quero crer!
inovação e reinvenção, defesa do voluntariado, honrar as tradições. Capacidade para cativar
Mesmo que assim não fosse, a história dita que as
jovens gerações e criar sinergias supra
Coletividades detêm uma força peculiar. Vários
associações gerando eficiência. Quem o fizer,
acontecimentos assolaram a sociedade: desde
incorrerá na senda da prosperidade. Vivam as
crises económicas até à tempestade Leslie. Porém,
Coletividades!
nenhuma destas colocou populações, governos, entidades públicas e privadas nesta nova provação. Mas todas criaram vicissitudes e desafios às Coletividades que foram, com dedicação, invariavelmente superados afirmando novos ou antigos valores. Senão vejamos, representam o reduto da lembrança de realizações individuais e coletivas excecionais na fita do tempo, marcando épocas distintas com nobres preocupações sociais. Em bom rigor, têm esse
"
Este “novo tempo” exara uma intensa alma, ávida de ter completude social, de partilha e de respeitabilidade biunívoca nos desígnios do preenchimento do Ser
direito de amarrar a história e de a fazer lembrar.
Gestor e autarca
sócia
45 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
A DÉCADA PÓS COVID-19
VISÕES PARA A DÉCADA
O ASSOCIATIVISMO IRÁ PRECISAR DE UM VENTILADOR? R O D R I G O
B A T A T A
Uma pandemia de caraterísticas únicas provocada
A meu ver, a próxima década será um período de
por um vírus sui generis atirou o mundo para um
transição e convergência do associativismo com
confinamento que parece não ter fim e que
as novas tecnologias, pois já percebemos que é
impede a sociedade ser isso mesmo, uma
possível participar ativamente numa reunião sem
sociedade.
estar fisicamente presente, ou que é possível fazer um teatro ou dar um concerto para uma
O novo Coronavírus, taxonomicamente designado
plateia online e, deste modo chegar àqueles que
por SARS-CoV2, responsável pela doença Covid-19
têm dificuldades de mobilização, contribuindo
consegue ser altamente imprevisível e heterogéneo
assim para uma sociedade mais inclusiva.
quanto à gravidade do quadro clínico desenvolvido pelos indivíduos infetados. Se, por um lado, uma
A relação social é o grande pilar do
fração destes indivíduos são assintomáticos ou
associativismo, mas estou convicto que esta crise
apresentam sintomatologia ligeira, há uma fração
não terá um impacto a longo prazo neste setor,
menor que irá necessitar de ventilação e suporte
pois a comunidade científica internacional dá-nos
diferenciado em regime de internamento e em
boas perspetivas de desenvolvimento de uma
última instância em Cuidados Intensivos.
vacina eficaz, bem como a crescente imunidade de grupo dada pelos indivíduos expostos ao vírus.
Analogamente, é evidente na sociedade atual, a
Ainda assim, o uso de máscaras nas atividades, o
heterogeneidade do “estado de saúde” de alguns
uso sistemático de soluções antissépticas e a
setores da nossa sociedade e o associativismo
alteração da configuração das plateias das
claramente já apresentava “sinais de dificuldade
associações que realizam espetáculos serão uma
respiratória” muito antes do aparecimento deste
realidade num futuro imediato.
vírus. Enquanto sociedade, chegaremos a 2030 com um A forte dinâmica, o espírito de solidariedade e
paradigma laboral diferente, mais direcionado
adesão que caracterizavam os tempos dourados
para o teletrabalho nos setores onde a presença
destes movimentos sociais nos pós 25 de Abril de
física é dispensável. No que diz respeito ao
1974 foram esmorecendo com a modernização
associativismo não precisará de ventilador, já que
tecnológica da sociedade, tornando-a mais
todos percebemos que socialização digital nunca
individual, egoísta e competitiva. Estes espaços
poderá substituir integralmente a relação social
que outrora eram importantes focos de
presencial, condição necessária e fundamental
socialização, de partilha e de conhecimento foram
para a existência do mesmo.
progressivamente perdendo o protagonismo na sociedade moderna.
As crises fazem parte da nossa existência e é certo que os danos colaterais são incomensuráveis, mas são também nestes períodos de adversidade que o conhecimento, a ciência e as adaptações ocorrem a um ritmo consideravelmente superior e, a hora do associativismo se reinventar chegou ou corre o risco de ficar eternamente confinado num modelo ultrapassado.
"
A hora do associativismo se reinventar chegou ou corre o risco de ficar eternamente confinado num modelo ultrapassado
Médico
Centro Hospitalar entre Douro e Vouga
sócia
04 | MAIO 2020 46
40
VISÕES DE SOCIEDADE
A IMPORTÂNCIA DO GREGARISMO
VISÕES PARA A DÉCADA
O ASSOCIATIVISMO E A AGENDA 2030 DA O.N.U. A N T Ó N I O
T A V A R E S
«Compartilhar conhecimentos e atividades tornou-se o gesto fundador de qualquer projeto de ação coletiva. Não há mais política pública sem co-construção, não há mais projeto associativo sem alianças, não há mais estratégia económica sem ecossistema!» - Yannick Blanc
Não partilho, como muitos, uma visão hiperoptimista do futuro,
É neste cenário que terá de se desenvolver o movimento
pelo menos aquela que nos vê como uma espécie de deuses
associativo, que, lembremos, é a resposta dos pobres e
que decidem o destino de tudo, por via dos avanços da
desfavorecidos baseada no princípio de que a união faz a
ciência e da tecnologia, das redes digitais, da inteligência
força. Os grandes objetivos deste movimento estão traçados
artificial e das maravilhas a que tudo isto se associa.
na Agenda 2030 da ONU, a qual exige uma nova gramática da acção colectiva. Esta acção prende-se, na esfera do
No entanto, se quisermos pintar um quadro realista do mundo,
associativismo, não só com a satisfação do interesse dos seus
ele não nos parecerá muito agradável. Uma plutocracia
membros, mas também concebendo a sua actuação como
pretensamente iluminada tomou conta do nosso destino,
utilidade colectiva. Os desafios devem ser, entre outros, a
impôs uma narrativa nacionalista e isolacionista e provocou a
acção climática, a formação cívica, o trabalho colaborativo e
anomia e a desideologização do exercício do poder.
a solidariedade, a educação para o consumo, a formação
Assistimos, desta feita, à desregulação dos mercados, à
digital, a mediação, a revalorização do saber e da
corrupção, ao declínio dos direitos e garantias e ao
experiência dos mais velhos, a prática da tolerância, o
exorbitante custo da justiça. Em causa tem estado a
desenvolvimento do espírito crítico e a responsabilidade
desvalorização do contrato social - medida no desinteresse
cívica.
manifestado pela res pública e pela abstenção -, a escassa protecção social dos que dela mecessitam e a distribuição do
As associações deverão, assim, pensar uma nova estrutura e
rendimento feita a níveis indigentes. Pela primeira vez, nos
uma nova organização que seja adequada aos desafios
EUA, em 2018 e desde há 70 anos, os bilionários pagaram
citados; deverão definir objectivos estratégicos, traçar acções
menos impostos do que os trabalhadores, como o atestam
concretas num território definido, democratizar o seu
Zucman e Saez. Da mesma forma, no país citado, 1% dos mais
funcionamento e os processos de decisão, formar e possuir
ricos detêm 20% da riqueza e 50% dos mais pobres ficam
quadros, partilhar e articular o pensamento e a acção e,
apenas com 12% do rendimento. A perseguição dos ganhos
sobretudo, exercer o direito de pronúncia sobre o território, a
perdeu o sentido da ética e da honradez e tornou-se num
paisagem, o património e a vida colectiva, junto dos
largo conjunto de negociatas, operado por obscuros mafiosos
agentes do poder.
sem escrúpulos, em conúbio com alguns estados e muitos políticos.
Ernesto Sabato, escritor argentino, e Cioran, filosofo romeno, denunciaram de forma lúcida, no final do século passado, a
Esta situação impede a tomada de decisões de forma
tecnolatria, o individualismo e a atrofia do espírito e, já
democrática e transparente, desvaloriza a mobilidade social e
numa hora derradeira das suas vidas, deixaram para a
o mérito e retira dignidade aos sectores mais frágeis da
posteridade uma aposta no ressurgimento de valores
população. Juntemos à descrição uma sociedade envelhecida
que ainda podem restaurar um sentido de comunidade;
nos países desenvolvidos e uma perda constante de
da mesma forma pensou Rilke, que acreditou na
crescimento populacional; juntemos as migrações, os conflitos,
capacidade humana de mudar as coisas e estabelecer
as alterações climáticas, os padrões de vida desajustados em
com elas uma relação de pertença que une a tudo e a
que uns morrem de fartura e outros de miséria, o carácter
todos para além do alcance da razão. Trata-se da
predador dos recursos, subjacente à constante busca de um
relação gregária, base do movimento associativo e
desenfreado crescimento económico em que o défice de
estratégia indispensável para a nossa sobrevivência.
sustentabilidade se tornou assustador.
Docente do ensino secundário, escritor e ex-vicepresidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz
sócia
47 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
A IMPORTÂNCIA DO GREGARISMO
VISÕES PARA A DÉCADA
O SUBSTANTIVO SINGULAR COM SIGNIFICADO PLURAL B R U N O
P A I X Ã O
O que mais temo é que, no futuro, tenhamos sido
Dir-me-ão que sou um pessimista inveterado, o
passado – como um rumor de recordações profusas
que admito. Desde muito novo observei que um
que se aconchegam nas lembranças. Daqui a dez
safanão fazia tombar o baralho de cartas em
anos, daqui a muitos amanhãs, teremos sossegado
cima da mesa, e que uma sequência de novos
as ameaças? Teremos vencidos os receios? Ter-
safanões as espalhou cada vez mais, em vez de as
nos-emos conseguido reinventar?
repor no sítio original. Mas confio também, com fé, na mudança e na integridade das pessoas.
É sobretudo diante dos riscos e dos perigos que
Confio na sua solidariedade e na capacidade de
vamos tomando conta da nossa fragilidade. Mas é,
agregação, de se juntarem a outros, de se
também, perante as angústias que nos cercamos
associarem.
de solidariedade. As ameaças tendem a unir-nos. Imaginemo-nos na fímbria do mar, onde as ondas
Eis que chegamos ao princípio de tudo. A vontade
rebentam sobre os nossos pés com a força
de estarmos juntos e de partilharmos
longânime de toda aquela torrente líquida que
solidariamente o presente, para honrarmos o
sopra do universo. Olhamo-nos mutuamente em
passado e assim conseguirmos chegar ao futuro.
toda a extensão do cordão de gente. Dirigimos
Uma das formas mais nobres de o fazermos
palavras benevolentes a cuidar uns dos outros:
encontra-se na associação. E daqui pode resultar
“Está fria, não está?
um dos modelos mais belos da cidadania.
»,
“Não avance muito que a
ondulação vem forte”. E ficamos focados nos dois
Associação é um substantivo que se escreve no
polos, no mar e em nós. “Nós”. Não há “eu” nem
singular mas que tem um significado plural.
“tu”. Temos a sensação de que somos insignificantes diante da força do mar. O mar e a
O associativismo foi, antes mesmo de ser
força. Se pontapearmos o mar provocamos nele
reconhecido, um dos modelos fundadores da
alguma reação? Eis a definição de força.
civilização. E é, hoje, um motivo de aproximação de pessoas, de junção de causas, de apoio, de
Na voragem da criação, o ser humano tem vindo a
instrução, de recreio e de reconciliação connosco
superar-se a si e ao seu meio. Ecos das revoluções
próprios.
tecnológica e digital têm chegado tão depressa quanto o seu impacto. E ambas estão ligadas às duas maiores preocupações que enfrentamos: a sobrevivência biológica e a sobrevivência social. A primeira está à vista com as pandemias que nos têm assolado, com intervalos de tempo cada vez mais diminutos e com uma força que não estamos em condições de domar. A segunda, de natureza social, tem vindo a afastar as pessoas do seu foco de dignidade e de sobrevivência. Isto porque as máquinas têm substituído as pessoas: passámos a comprar online, dispensando trabalhadores;
"
Eis que chegamos ao princípio de tudo. A vontade de estarmos juntos e de partilharmos solidariamente o presente, para honrarmos o passado e assim conseguirmos chegar ao futuro
passámos a ser nós próprios a abastecer o carro nos postos de combustível, dispensando trabalhadores; passámos a construir computadores através de robôs, dispensando trabalhadores; e esta roda não para de girar
Diretor Regional de Coimbra da
Fundação INATEL
sócia
48 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
A IMPORTÂNCIA DO GREGARISMO
VISÕES PARA A DÉCADA
ASSOCIATIVISMO: UM CAMINHO PARA NÓS E PARA OS OUTROS J O Ã O
P E R E I R A
Como humanos somos gregários, mas
Qual seria o impacto criativo numa família se pais
desenvolvemos um equilíbrio que se balanceia
e filhos participassem em diversas associações?
entre liberdade, segurança, sociedade e
Qual seria o impacto no tecido social e na
individualidade numa caminhada permanente.
inovação?
Temos uma língua e bandeira, celebramos juntos o nascimento, fazemos juntos o funeral. Criamos
Somos desafiados a pensar a cidadania, ecologia,
instituições, espaços, estruturas, ritos e rituais.
biotecnologia, debates, intervenção pública,
Porém, somos únicos, construídos na dignidade da
cooperação inter-geracional em associações que
diferença de pessoas e sociedades.
pensam a vida de forma transversal e capacitam os seus membros a fazer escolhas, encorajando-os
A participação em associações formais e informais,
a envolver-se no dia a dia, contribuindo para o
faz-nos saborear as nossas potencialidades,
bem da sociedade de forma global e exercitando
desenvolvendo as diversas dimensões que nos
a fraternidade.
habitam. São múltiplos os temas que nos desafiam. Uma associação recreativa, desportiva, social e
A participação, em associações, faz-nos agentes
cultural, de pais, de moradores, uma tertúlia de
dinâmicos e conscientes. Cidadãos ativos,
debates, voluntariado, respondem a necessidades
voluntários, habituados a gerir tempo, projectos,
diferentes.
receitas e custos, bem comum, solidariedade e fraternidade, são um tesouro para a sociedade.
Em Portugal, por razões diversas, metade da população não participa em associações, e são
O que me impede de avançar e escolher ou criar
poucos os que participam em mais de cinco, temos
uma associação? Até lá exercite aquela pequena
uma grande capacidade de crescimento. Cada
escolha de ir a uma exposição, um concerto,
interesse de vida pode ser acolhido numa
participar num debate ou conferência. São estas
associação.
escolhas que nos vão construindo como pessoas e sociedade. A participação motiva-nos e, ao
As associações são espaços de construção e
mesmo tempo, encoraja e desafia, as associações.
pertença e ultrapassam o interesse dos seus
Assim se cria a teia social e comunitária e o
membros. Às vezes são o único olhar fino para
prazer de viver cada dia.
realidades que necessitam de intervenção, o espaço de integração para quem perdeu outras redes de suporte e a ajuda a recentrar o sentido da vida.
As empresas valorizam os candidatos com atividades associativas. Exercitam comunicação, persistência, resiliência, criatividade e empreendedorismo.
É estimulante criar e cuidar de uma associação, estar unidos numa causa a que voluntariamente nos dedicamos. Nela caminhamos para os outros e
"
É estimulante criar e cuidar de uma associação, estar unidos numa causa a que voluntariamente nos dedicamos. Nela caminhamos para os outros e para nós desenvolvendo aptidões diversas
para nós desenvolvendo aptidões diversas. A vida associativa é um desafio a viver a multiplicidade de sensibilidades e interrogações. Revela-se o aroma da vida que se faz palavra narrada, poesia,
Pastor e Activista
política, filosofia, ciência, música, dança, pintura,
Igreja Evangélica Presbiteriana de Portugal Diálogos ComSentidos
espiritualidade…
sócia
49 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
AS NOVAS FORMAS DE LAZER E DE ASSOCIATIVISMO
VISÕES PARA A DÉCADA
SIMBIOSES SEM PARASITISMOS A N T Ó N I O
C A R R A C O
D O S
R E I S
Associare, do Latim, conduz-nos até à ideia de
Estou plenamente convicto de que cabe a mim e a
unir, reunir, juntar…
ti zelarmos pelos nossos ideais, vontades, prosperidade e alegria. Simultaneamente, é da
A associação de pessoas, o trabalho e a vida em
escassez que surge a nossa interdependência,
equipa, veem a sua história diluída com a da
assim sou levado a acreditar que a associação de
Humanidade. Por muito que tudo aconteça mais
recursos, humanos e não, manter-se-á viva, com
depressa, creio ser prudente zelar para que
conteúdo, e necessária. Quanto à forma, essa
depressa não se torne depressa demais.
sempre foi definida pelos limites (o véu) da existência do objeto, e pela sua preservação.
A tecnologia faz uma releitura do conceito místico de egrégora: que independentemente do espaço,
Brindemos juntos, ao associativismo. Brindemos
ou do tempo, traduz uma união intelectual, mental
com a consciência de que tanto a Luz, como o
ou espiritual - se quiserem - de pessoas em torno
solo, como a videira, como o trabalho, o engenho,
de uma ideia, convicção ou vontade comuns.
o tempo, o véu do copo e as pessoas possibilitam esse brinde. Já que cada um, sem cada outro,
Aos guardiões das egrégoras pode caber a
gerará qualquer outra coisa que não um brinde.
responsabilidade de manter o véu entre o que é de César e o que é seu; aos mais jovens, usar a vista fresca para remendar os buraquinhos que as traças de César têm vindo a fazer, fazem e, por instinto ou necessidade, talvez continuem.
Manter e nutrir a simbiose e evitar parasitismos.
O futuro, como um acumular sucessivo de agoras, não será diferente da intenção e força colocadas em cada um deles. Serão os ansiãos do futuro mais independentes e autossuficientes? Não creio… Os jovens? Talvez ainda menos… E os Césares?
"
Manter e nutrir a simbiose e evitar parasitismos. O futuro, como um acumular sucessivo de agoras, não será diferente da intenção e força colocadas em cada um deles
Poderão as dinâmicas associativas vir a digitalizarse cada vez mais? Talvez… Será isso novo? Talvez não. Perderemos eficiência com isso? Duvido muito. E essência? Tampouco.
Enquanto o Estado e os Mercados (que não deixam de ser associações) não garantirem uma resposta plena a todas as nossas carências, será necessária a proatividade e ação paralelas da Sociedade Civil. Sem esquecer que o associativismo existe além das folhas de cálculo e antes das identidades jurídicas. Está-se, a meu ver, em associativismo, sempre que duas ou mais pessoas casam esforços em prol de qualquer conquista.
sócia
50 | MAIO 2020
Ativista
Diálogo intercultural e inter-religioso MURAL - ACM Diálogos ComSentidos
40
VISÕES DE SOCIEDADE
AS NOVAS FORMAS DE LAZER E DE ASSOCIATIVISMO
VISÕES PARA A DÉCADA
REGRESSO AO PASSADO A N T Ó N I O
J O R G E
L É
Estamos epicamente na Internet. Todos temos
Regressar!
facebook! Vamos querer saborear tanto a ternura da Brilhante.
ingenuidade, a frescura da simplicidade, o sorriso franco de um amigo. No rol de conversas
“Postamos” fotos de batatas fritas,
fantásticas, onde somos, cada um, protagonistas
trabalhamos on-line nos vários suportes, os mesmos
de opinião, ao vivo, olhos nos olhos dos que
que inundam os ecrãs pejados de dedadas da
conhecemos, dos que se cruzam connosco na rua,
gordura das tais batatas rijas e frias, porque
os mesmos que vivem uma rua ao lado… que
estivemos a “teclar” e nem almoçámos de jeito.
surgem quando de algo necessitamos… que
Cheios de colesterol, sentados ao pé de uma
vão ao nosso funeral.
nova app, e a acarinhar um cão cheio de pêlos, eis-nos rodeados por máquinas multifunções que,
Este é o princípio de uma nova era, aquela que
ao carregar nas teclas, até deitam fumo e que
desde sempre perseguiu o homem. Vamos voltar a
rebentam antes do prazo da garantia.
dar importância ao grupo, vamos querer associar-nos.
Surpreendente! O colorido de um rancho folclórico, a formatura Mas como surgiu um inesperado e maldito vírus,
musical de uma filarmónica, as tábuas de um
não sei quando acontecerá uma desmagnetização
velho palco, um abraço de um par de dança, tudo
global. E depois?
isto fará tamanhos encantos à vida. Voltamos às coisas físicas, as que estão off-line.
Temos de perceber a criação terrena: o ser humano é um animal de grupo, o nosso cérebro
Mas em 2030 estes pedaços de luxo terão preço.
precisa de estímulos físicos. Em 2030 já estaremos
Serão vintage, são vinil de 75 rotações… porque
fartos (e marrecos) da imaginação, da fantasia, do
pensámos sempre (e ainda pensamos!) que o
virtual, de sermos espectadores dos outros,
futuro é algo tão sensacional, tecnologicamente
danados com os likes que a toda a hora nos
avançado, ainda melhor que um bolo de bacalhau
exigem.
e um copo de tinto entre amigos… e não é. A não ser que seja zurrapa!
Depois de ultrapassarmos uma longa e penosa crise financeira mundial, entre desemprego e miséria, com repetições de vírus e bactérias, fungos e bacilos, sozinhos e tristes, mas sábios de todas das matérias e arrogantes em todas as direcções, vamos querer ser menos hábeis no inglês, menos malcriados para os vizinhos, mas ainda perdidos à procura do rumo… sempre obrigados a lavar as mãos até aparecem, em fundo desmaiado, as cábulas da escola primária…
Fartos de “fugir” do nosso semelhante,
"
Fartos de “fugir” do nosso semelhante, desalentados pelo fracasso das carreiras de sonho prometidas desde a infância, entre ambições traçadas em corpos esculturais que a linha da elegância moderna impõe... e vamos querer mudar
desalentados pelo fracasso das carreiras de sonho prometidas desde a infância, entre ambições traçadas em corpos esculturais que a linha da elegância moderna impõe... e vamos querer mudar.
Casino Figueira Jornal "O Figueirense"
Diretor Artístico do Diretor do
sócia
51 | MAIO 2020
40 VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
AS NOVAS FORMAS DE LAZER E DE ASSOCIATIVISMO
PARA A DÉCADA
O PAPEL DAS ASSOCIAÇÕES DE ESTUDANTES NA SOCIEDADE E OS SEUS DESAFIOS NA PRÓXIMA DÉCADA D A N I E L
A Z E N H A
A composição de um artigo sobre “As novas formas
O afastamento dos dirigentes, e das pessoas
de lazer e de associativismo”, seria certamente
envolvidas em projetos associativos, será um dos
escrita de outra forma e com outro pensamento,
maiores problemas das estruturas. Este fator
não fosse o momento completamente excecional
levará ao enfraquecimento natural e
que o mundo vive hoje devido à crise pandémica
consequentemente a um aumento da debilidade,
da Covid-19.
que resultará na maior dificuldade em ultrapassar
Não é de análise simples perceber quais serão as
momentos sem atividade ou até mesmo a não
repercussões exatas no futuro, e qual será o
existência de dirigentes que garantam a
impacto na sociedade, na economia e na política
renovação de quadros. Não há dúvida que este
depois desta pandemia. Certo é que nenhuma
fator é aquele que deve ser visto com maior
pessoa ou setor voltará a ser igual depois de viver
atenção. Nenhuma estrutura sobrevive sem
esta realidade.
recursos humanos. A este problema acresce o
O associativismo não será exceção. Por isso, numa
facto do período de atividade das associações de
análise ao futuro do associativismo na próxima
estudantes coincidirem com o calendário letivo,
década não podemos esquecer este fenómeno da
que reforça um potencial afastamento dos seus
Covid-19, que irá condicionar o desenvolvimento
dirigentes, num período em que as instituições de
das associações e levará à imposição de vários
ensino estão encerradas.
desafios, tanto aos seus dirigentes, ao
O financiamento será, a par do afastamento dos
funcionamento das próprias associações, ao seu
dirigentes, o maior desafio que as estruturas
modelo de financiamento e à responsabilidade
associativas terão no futuro. A redução dos
social que desempenham, na identificação e
rendimentos que surgem com a diminuição o
resolução dos problemas que surgem na
número de pagantes, assim como a redução do
comunidade.
financiamento que advém do patrocínio de várias
Em matéria de associativismo, destaco o papel de
entidades será algo tanto expectável como de
extrema relevância das associações de estudantes
catastrófico para a maioria das associações. As
na nossa sociedade. Na maioria dos casos, as
dificuldades financeiras terão de ser
associações de estudantes são aquelas que mais
acompanhadas por um enorme sentido de
vertentes abrangem, tendo na sua génese a
responsabilidade da parte dos dirigentes, que
responsabilidade de promover atividades
terão a missão de garantiro equilíbrio entre a
desportivas, culturais, de índole política e até
promoção de atividades para os seus associados
mesmo de cariz solidária, com um enorme impacto
e a estabilidade financeira.
na garantia de condições mínimas à vida.
Todos nós temos presente a importância do
Pela importância que estas têm revelado, julgo que
associativismo, do seu papel na sociedade ena
a primeira análise a ter em conta para que se
vida de cada pessoa. As associações são espaços
consiga idealizar o desenvolvimento nestes
de intervenção política e social, de reivindicação,
próximos 10 anos é a da identificação dos desafios
de promoção cultural, desportiva e recreativa. E
resultantes da pandemia que vivemos hoje e que
por isso esta matéria requer uma especial atenção
trará sérias dificuldades às associações de
dos nossos governantes, garantindo assim uma
estudantes.
resposta para que as associações, e em especial
Na minha opinião, acredito que entre muitos, dois
as associações de estudantes mantenham a sua
serão os principais desafios que as associações de
missão.
estudantes terão - o afastamento das pessoas envolvidas e o financiamento disponível.
Presidente da Direção Geral
Associação Académica de Coimbra
sócia
52 | MAIO 2020
40
VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
AS NOVAS FORMAS DE LAZER E DE ASSOCIATIVISMO
PARA A DÉCADA
O ASSOCIATIVISMO EM PORTUGAL: UMA MARCA DE FUTURO M A F A L D A
A Z E V E D O
Em Portugal, o associativismo começou a afirmarse a partir de meados do século XIX, quase sempre associado a organizações de natureza profissional. Já durante o Estado Novo, assistimos a uma massificação das associações de caráter cultural, recorrentemente, manietadas pelo regime de então. Porém, as associações culturais assumiram-se, em muitos casos, como uma expressão de liberdade e de oposição ao próprio regime.
Ademais, importa recordar que nesta época, a cultura e o lazer estavam reservados apenas a uma pequena elite urbana. Deste modo, o associativismo assumia-se como um instrumento da maior relevância no acesso das massas ao lazer.
Na construção da nossa democracia, o associativismo passaria a ser a expressão organizada da sociedade civil, constituindo-se como um importante veículo no exercício da cidadania. De facto, é notória a correlação entre a participação política e o envolvimento na vida associativa, como aliás, são evidência os países onde elevadas taxas de participação política estão entrosadas com notáveis culturas associativas.
No entanto, nos últimos anos, o associativismo português tem vindo a esmorecer e a envelhecer. Com a precarização das relações laborais, as novas gerações não têm tanta disponibilidade para se dedicaram à causa pública.
Paralelamente, temos assistido ao surgimento de novas formas de participação cívica. A comodidade das redes sociais arroga-se como um substituto ao tradicional modus operandi das coletividades. Portanto, afigura-se da maior relevância que as associações olhem para o
"
Afigura-se da maior relevância que as associações olhem para o espaço digital como um aliado
essencial para manter um contacto permanente com amigos e conhecidos. Neste sentido, cabe às coletividades, fazerem os necessários esforços para promover também, através da via digital, o contacto entre os seus associados e a atratividade para renovarem os seus quadros. Contudo, as coletividades têm a vantagem de já terem uma “identidade”, o que no digital é um valor difícil de alcançar.
Para além disso, esta pandemia acentuou as desigualdades sociais e, por isso, urge garantir o acesso universal à internet para mitigar as mesmas. Se em 1969, as coletividades disponibilizavam o principal meio de comunicação da época- a televisão-, nos nossos dias, têm de garantir a melhor conexão à internet da sua localidade.
Evidentemente, esta só será uma realidade possível com um programa nacional que ofereça às coletividades, redes de internet semelhantes àquelas que os serviços prioritários usufruem. Efetivamente, as coletividades foram essenciais para preservar a identidade cultural das comunidades onde se inserem. Não obstante, hoje têm de ser também o espelho da sociedade global em que vivemos. Consequentemente, a promoção de intercâmbios culturais é um enorme atrativo, para as novas gerações.
Assim, o associativismo deve abraçar as novas formas de interação, para voltar a ter a relevância de outrora.
espaço digital como um aliado. Antigamente, o fomentar das relações sociais passava pelo encontro no café da coletividade. Hoje, para as novas gerações, as redes socais são um eixo
Estudante do Ensino Superior e Presidente da CPC da
Juventude Socialista/Figueira da Foz
sócia
53 | MAIO 2020
40 VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
OPORTUNIDADES E DESAFIOS DO MOVIMENTO ASSOCIATIVO
PARA A DÉCADA
OPORTUNIDADES E DESAFIOS DO MOVIMENTO ASSOCIATIVO 2020-2030 A N T Ó N I O
A G O S T I N H O
A receita para 2020/30 é simples: convívio e
Apesar deste cenário, as estatísticas demonstram
partilha de ideias.
que, desde o 25 de Abril de 1974, “o número de colectividades tem vindo constantemente a
Numa altura de crise geral no concelho, o
aumentar, mantendo um balanço positivo entre as
movimento associativo não foge à regra. O
associações que são criadas e as que
associativismo vive dias difíceis e a inversão dessa
desaparecem”. Os dados da Confederação
tendência não parece estar para breve.
Portuguesa das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto confirmam, ao apontarem para
A participação em associações permitiu aos
a existência em todo o território nacional, de
portugueses resistirem ao Estado Novo e preparou-
quase 7 mil associações com um total de um
os para os desafios que surgiram na administração
milhão de associados, e de 18 mil clubes e
pública no pós-25 de Abril de 1974. Foi nas
colectividades, com mais de três milhões de
colectividades que muitos democratas se juntaram
associados.
e resistiram ao período de falta de liberdade e democracia que marcou todo o tempo de vigência
A história das Colectividades do Concelho da
do Estado Novo.
Figueira da Foz resultou de contextos únicos e dificilmente reproduzíveis. Para 2020/2030 os
Recordo um episódio que se passou numa acção
desafios serão novos e motivadores. Não se
cultural na Fontela em 1937. Joaquim Namorado e
podem é construir realidades e modelos
Carlos Oliveira vieram realizar uma sessão, num
associativos artificiais: não poderão aparecer sem
Clube modesto, perante gente modesta.
ter em conta o conhecimento do passado e a
Aconteceu apenas uma conversa. Segundo
valorização da história e da cultura associativa
Joaquim Namorado, que foi da boca de quem ouvi
que faz parte do tempo que passou. As soluções
este relato, na assistência estavam amigos. E
só serão exequíveis e os caminhos só serão válidos
estava a PIDE, que a seguir à ida dos oradores de
e eficazes se tiverem em atenção e assentarem
comboio para Coimbra, "atazanou o corpo e a
num processo evolutivo que incorpore as novas
alma aos directores da Colectividade".
realidades. Os agentes da mudança só podem ser, no essencial, aqueles que integram o próprio
A resistência à ditadura, passou pela acção de
movimento associativo e não os que, do exterior, o
promoção da cultura pelo movimento associativo.
procuram controlar, para se aproveitarem para
Muitos homens e mulheres tiveram na banda de
promoção pessoal ou política.
música, no grupo de teatro, no grupo coral ou no clube desportivo a sua escola cívica e de
O futuro do associativismo passa pela receita de
cidadania. Alguns deles, com a conquista da
sempre, adaptada aos tempos de hoje, com a
liberdade, ocuparam funções públicas na
nova realidade que nos convida a ficar em casa:
sociedade democrática.
conseguir continuar a ser um espaço de convívio e de partilha de ideias.
Actualmente, as pessoas participam menos na vida das colectividades. Na Figueira, a maioria da população não pertence a nenhuma colectiviadade, movimento ou grupo de cidadãos.
Blogger
Outra Margem
sócia
54 | MAIO 2020
"
Os agentes da mudança só podem ser, no essencial, aqueles que integram o próprio movimento associativo e não os que, do exterior, o procuram controlar, para se aproveitarem para promoção pessoal ou política
40
VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
OPORTUNIDADES E DESAFIOS DO MOVIMENTO ASSOCIATIVO
PARA A DÉCADA
A DEFESA DA GASTRONOMIA TRADICIONAL NO MOVIMENTO ASSOCIATIVO G U I D A
C Â N D I D O
Apetece iniciar esta reflexão com uma interpelação: onde cabe a salvaguarda da gastronomia tradicional no movimento associativo? Esta questão alude a outra: o que se entende por cozinha tradicional? Qualquer afirmação convicta de originalidade e pertença de diversos pratos associados ao que se infere por tradicional, deverá ser alvo de interrogação e
"
A existência das tradições está irremediavelmente ligada ao pressuposto antropológico da nossa finitude, relacionado com a permanente busca de vínculos e conhecimento entre gerações.
validação da sua interpretação. No mais, a questão basilar assenta na definição do próprio
multidisciplinar ancorado no conceito de
termo tradicional. A palavra tradição, e tudo o
identidade individual, familiar, comunitária, local,
que ela encerra, decorre essencialmente da
regional e nacional. Trata-se de um método de
propagação de um uso, durante um longo ciclo,
construção de uma identidade coletiva que
constituindo um património que insiste em viver na
acompanha ações políticas, económicas e
memória coletiva e que se revela em normas
culturais.
sociais atuais, ainda que muitas vezes com um caráter pontual. São práticas culturais, populares,
O município da Figueira da Foz editou em 2015
religiosas, familiares e, inevitavelmente,
(com reedição revista, melhorada e acrescentada
gastronómicas. A existência das tradições está
em 2019) o seu receituário tradicional, numa obra
irremediavelmente ligada ao pressuposto
que levou como título principal “A Nossa Mesa”.
antropológico da nossa finitude, relacionado com
Nessa ocasião, as diversas coletividades do
a permanente busca de vínculos e conhecimento
concelho contribuíram de forma inequívoca e
entre gerações. As tradições que mantemos, as
inestimável para a recolha do que se entende
questões alimentares relacionadas com as
serem o seu património gastronómico, a sua
festividades e os ciclos da vida são um repositório
identidade e matriz no domínio da comensalidade.
de saberes, crenças, hábitos e costumes que
Lembro, igualmente, o evento anual “Feira das
importa analisar e salvaguardar. Constituem
Freguesias”, que responde ao desígnio de
hábitos que perpetuam lembranças e recordam a
promover e divulgar as singularidades culinárias
necessidade de preservar valores e
do território. Neste particular, é terminantemente
conhecimentos. A transmissão oral ou escrita de
elementar que se percorra o caminho da fixação
usos e costumes culinários com práticas
do receituário tradicional em prole da sua
conservadas por ação da memória, adquirem um
manutenção, pese embora a sedução de
valor ritual e simbólico. De resto, evoco o
percursos condescendentes. Porquanto,
reconhecimento oficial do Património Cultural
regressando à questão inicial: qual o papel que o
Imaterial da Humanidade estabelecido pela
movimento associativo pretende, nos anos
UNESCO, em 2003, e por diplomas legais em
vindouros, exercer nesta salvaguarda do
diversos países, para garantir a preservação e a
património gastronómico do território?
proteção dos patrimónios culturais intangíveis em todo o mundo, visando deste modo aumentar a consciência da sua importância. A construção do património gastronómico é um processo
Investigadora do Centro Est. Clássicos e Humanísticos
Universidade de Coimbra
sócia
55 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
OPORTUNIDADES E DESAFIOS DO MOVIMENTO ASSOCIATIVO
VISÕES
PARA A DÉCADA
OPORTUNIDADES E DESAFIOS F R A N C I S C O
R E L V A
P E R E I R A
Captação da juventude, sustentabilidade das
Assistimos hoje a uma nova vaga de responsáveis
associações, nova visão de apoios,
políticos que possuem também uma “nova”
responsabilidades diretivas e fiscais, novos modelos
estratégia sobre esse fenómeno social. Estes
festivos são ideias que, tendo em vista a
perceberam claramente a força destas
elasticidade temporal para uma década, me
organizações, visto que é através delas e das
surgiram ao explorar o desafio que me foi colocado.
pessoas que as constituem que se estabelecem inter-
De facto, todos estes itens são uma constante “dor
relações e tomadas de decisões tanto ao nível
de cabeça” para quem comanda os destinos de uma
económico como social, cultural e desportivo.
qualquer associação. A estes associam-se os muitos
Noutra perspetiva, a contribuição dos sócios, apesar
voluntários que com a sua boa vontade, e sobretudo
de ser sempre um garante financeiro, atualmente
orgulho em representar a sua terra através desse
não é suficiente para fazer face às despesas
estatuto associativo, teimam em levar para a frente
correntes, tornando-se fundamental o apoio do
a sua nobre causa de manter a tradição que muitas
poder local. Adivinha-se para a década um melhor e
vezes é de há muitos anos e umbilicalmente familiar.
maior empenhamento das autarquias na
Porém, tenho dúvidas perante as realidades com que
sustentabilidade das associações. Outro caminho
diariamente convivemos. Dentro de casa, e
que se deve seguir será o mecenato. Essas
comodamente, estamos ligados ao mundo através da
cooperações trazem também responsabilidades
internet, a qual nos permite aceder ao que nós
acrescidas ao movimento associativo, tornando-o
desejamos sem sair do sofá, abstendo-nos de tudo o
mais comprometido e credível.
que nos rodeia, não se tendo, nem se adquirindo
Por último, foco-me nos festejos, expressos na
nenhuma outra responsabilidade. Daí que me
espontaneidade e intensidade com que uma
interrogo: será que daqui a uns anos ainda teremos a
população vive e convive durante alguns dias.
juventude em massa nas associações?
Também se retira da análise a essas festividades a
O desígnio que temos pela frente, poderá em
qualidade de vida dessa mesma comunidade. A
algumas regiões do país ser mais forte do que
adaptação a novos conceitos, inovações, critérios e
noutras, mas ainda assim poderão existir alavancas
diversões será mais uma etapa desafiante para os
que possam promover e despertar consciências que
próximos anos. Não tenhamos dúvidas de que as
contrariem essa tendência de abandono e
regras irão mudar.
desinteresse pela cultura popular e, sobretudo, pelo
Enquanto nos preparamos para os novos modelos
amor que se adquire às “nossas” coletividades. O
festivos, podemos deixar uma reflexão final relativa
destino que estes nossos tempos nos reservam é uma
ao futuro do associativismo. Espera-se que seja
incógnita…
risonho. Poderá e deverá trazer uma nova lufada de
Se hoje já nos deparamos com dificuldades em os
ar fresco a esta causa. Tenho esperança em dias
“apanhar” a década que temos pela frente será
melhores, assim haja um maior empenhamento das
crucial para que os jovens sejam motivados e
entidades ligadas aos diversos sectores para
incentivados a vestir a camisola associativa nas suas
apoiarem, não com bonitas palavras e frases, mas
múltiplas vertentes.
sim com projetos, ideias e sobretudo com desafios
Por outro lado, os dirigentes deparam-se no
que possam mexer com as dinâmicas das
quotidiano com burocracias e um sem número de
associações. O próprio Estado de direito - executivo,
documentação que diariamente exigem respostas,
legislativo e judicial – terá de experimentar um maior
tanto no âmbito meramente institucional como
envolvimento, apoio e diálogo, assumindo as suas
também no domínio da fiscalidade. Se por um lado
responsabilidades no domínio social, desportivo e
será um bom indício da multiplicidade orgânica que
cultural.
prolifera para a sociedade, cultura e desporto, por
Por último, torna-se cada vez mais eficaz que o
outro, temos de ter a consciência de que os
Marketing esteja presente e ao serviço das
diretores são voluntários, e que apenas dispõem de
coletividades, bem como a comunicação social, a
um tempo para se poderem sentar à secretária da
qual muitas vezes anda desatenta à dinâmica e às
sua coletividade e cumprir os seus compromissos.
acções desenvolvidas nas associações.
No entanto, esse amadorismo vai mexendo com as
O meu abraço fraternal a todos os que lutaram e
estruturas do poder local, o qual, começa a ter outro
militam no mundo do associativismo.
olhar e uma outra visão sobre o associativismo.
Maestro
Sociedade Musical Santanense
sócio
56 | MAIO 2020
40 VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
OPORTUNIDADES E DESAFIOS DO MOVIMENTO ASSOCIATIVO
PARA A DÉCADA
UM NOVO TEMPO, DEPOIS DE TANTOS NOVOS TEMPOS L Í D I O
L O P E S
O movimento associativo, através das
Muito mais do que o Estado, os seus tentáculos
coletividades que estão no terreno a desenvolver
descentralizados, as vontades políticas de
atividades culturais, recreativas, desportivas,
momento, os humores circunstanciais, dado que
humanitárias e de instrução, é, indiscutivelmente,
todos esses, nunca conseguiram e, por isso, não
um dos mais importantes pilares em que se tem
vão conseguir, bloquear, encaminhar, condicionar
suportado o poder local e mesmo o nacional, no
a vida do que o povo quer para si próprio e para a
sentido de conferir uma consistente melhoria das
sua capacidade de inovar, de se juntar em torno
condições de vida das populações, satisfazendo
de projetos comunitários, que sublinham a história
algumas das suas mais elementares necessidades.
e a tradição, mas também o presente,
Tantas vezes, quase sempre, as coletividades
proporcionando atividades desportivas,
substituem o Estado, mesmo em situações que,
recreativas e culturais e o futuro, com a
constitucionalmente, seria por
divulgação e a promoção das novas tecnologias e
inteiro uma sua responsabilidade.
do mesmo fazer de antes, no novo mundo que se desenha no estirador, de uma era digital que nos
Desde a sua origem, nos formatos mais
impõe, exige e proporciona novas encruzilhadas
normalizados e que cumprem o formalismo legal de
de decisão, num caminho a passos demonstrados
instituição com regras estatutárias estabelecidas,
para o insondável terreno da inteligência
este universo, que emana diretamente da matriz
artificial.
cultural das populações que lhe dão sentido e a quem servem na dimensão dessa vontade, já viveu,
Contar-se-á, sempre, com a iniciativa do esforço
assistiu e participou em inúmeras, tantas,
coletivo, numa ação decidida, conhecedora, de
alterações na evolução ou involução das
proximidade, assumindo-se como polo de inclusão
sociedades e de tudo o que lhe diz respeito, como
e de prevenção de comportamentos desviantes,
esteve sempre presente nos momentos mais
na mobilização dos jovens e dos menos jovens,
difíceis, guerras, fome, epidemias e pandemias,
para bons projetos. Como cada vez mais se devem
tão terríveis como a que vivemos neste tempo que
esbater os muros dos quintais do individualismo e
nos é oferecido e que, por vezes, tiveram efeitos
da competição injustificada, construídos com
muito piores, por todas as razões e em todos os
base num bairrismo bacoco, sem lugar num mundo
fatores de abordagem.
de partilha e apoio, de subsidiariedade, de tolerância, de complementaridade e de
Se o associativismo é o produto de uma resposta a
solidariedade. Creio e desejo, que a dimensão do
uma necessidade das populações, que se assumem
conceito de Humanidade, com todas as suas
como protagonista principal, ativo e participativo
variáveis, vantagens e virtudes, se afirme
na gestão das necessárias soluções às suas
vincadamente no futuro, no mundo associativo, a
necessidades, que mais ninguém lhe resolve e
construção de todos nós, do que somos e
persistiu, resistindo, sempre por vontade do seu
queremos para todos nós.
criador, as mesmas populações que lhe configuram o seu ADN e lhe fornecem os necessários anticorpos para resistir à erosão resultante da intempérie dos tempos de conflito, de individualismo exacerbado, de mau trato institucional e de falta de apoios financeiros, é fácil prever que a próxima década deste extraordinário movimento associativo, será, sobreviverá e terá a afirmação de força que a sociedade que lhe dá vida e sentido quiser.
"
Cada vez mais se devem esbater os muros dos quintais do individualismo e da competição injustificada
Presidente da Direção
Bombeiros Voluntários da Figueira da Foz
sócia
57 | MAIO 2020
40 VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
OPORTUNIDADES E DESAFIOS DO MOVIMENTO ASSOCIATIVO
PARA A DÉCADA
“O ASSOCIATIVISMO É UMA NETWORKING QUE NOS DEFENDE DAS ADVERSIDADES” N U N O
L O P E S
Caros Leitores, é um verdadeiro exercício mental
Dito isto, o nosso futuro vai depender das
tentar prever a próxima década quando o nosso
escolhas que fizermos agora.
ritmo de vida é ajustado a cada 15 dias, fruto da actual crise sanitária. Mas como gosto de bons
Estes últimos tempos têm sido difíceis mas
desafios, enuncio-vos a minha percepção sobre
simultaneamente de grande esperança porque
como serão os próximos 10 anos e as
temos assistido a uma sociedade solidária, com
“oportunidades e desafios do movimento
grande espírito de sobrevivência, capaz de se
associativo”.
ajustar às adversidades e de se unir em torno de uma causa maior.
Em primeira análise teremos em 2030 a geração Millennium com idades próximas dos 50 anos, será
É aqui que renasce a importância do comércio
ela juntamente com a geração Z a grande maioria
local e das colectividades que nas últimas
da força de trabalho. Desta forma é importante
décadas têm vindo a perder fulgor. O futuro e
começarmos desde já a ouvir e compreender os
sobrevivência do comércio presencial passará
seu valores e prioridades para projectarmos como
cada vez mais por proporcionar uma boa
será o futuro. Atendendo às características destas
“experiência” em vez da simples venda e as
gerações, prevejo que haverá uma maior
colectividades terão que ser atractivas. A
consciencialização para a importância da
proximidade ao consumidor será uma
reciclagem e protecção do meio ambiente.
oportunidade para o comércio local e o associativismo verá a sua importância reforçada
A IA (Inteligência Artificial) actuará como uma
pela capacidade de rapidamente se organizar e
ferramenta sofisticada para análise de
desenvolver trabalho em prol da comunidade.
informações que nos facilitarão a tomada de decisão, e influenciará a escolha dos produtos ou
Deveremos continuar a fomentar na próxima
até mesmo os processos e modelos de negócio,
década o espírito de união, de partilha do
dando origem a novos empregos e eliminando
conhecimento, de cultura, de altruísmo, para que
muitos outros.
nos momentos difíceis como os que atravessamos, as colectividades e as associações assumam o
Na próxima década continuaremos a assistir a um
papel estratégico e de grande relevo através da
aumento exponencial da obtenção da energia
sua rede humana já criada, capaz de nos preparar
eléctrica com recurso às energias renováveis em
melhor e defender das adversidades da vida.
detrimento dos combustíveis fosseis. A grande
Juntos seremos sempre mais fortes.
maioria dos carros vendidos pela indústria automóvel serão eléctricos e alguns deles autómatos. Drones farão a fiscalização rodoviária e entrega de mercadorias e o ecommerce fará parte do nosso quotidiano, logo seremos cada vez mais cidadãos do mundo.
As alterações climáticas e a possibilidade de novos surtos pandémicos estarão nas mentes das sociedades e serão um foco de preocupação e instabilidade pelo seu forte impacto socioeconómico.
"
O associativismo verá a sua importância reforçada pela capacidade de rapidamente se organizar e desenvolver trabalho em prol da comunidade
Presidente da Direção
Associação Comercial e Industrial Figueira da Foz
sócia
58 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
OPORTUNIDADES E DESAFIOS DO MOVIMENTO ASSOCIATIVO
VISÕES PARA A DÉCADA
O FUTURO DAS COLETIVIDADES DE CULTURA, RECREIO E DESPORTO S É R G I O
P R A T A S
Como serão as coletividades daqui a 10 anos? Ou
Aqui chegados, pode dizer-se que o futuro das
20 anos? E daqui a 50 anos? Que papel (e
coletividades surge estreitamente imbricado com
funções sociais) assumirão no futuro? Serão em
o futuro do país. As coletividades têm (e podem
maior número? Serão mais democráticas? Como
ter ainda mais) um papel importante no
será a cooperação com as autarquias? E com os
aprofundamento da democracia em Portugal.
serviços governamentais?
E o que é que sabemos sobre o contexto interno
Não é fácil dar resposta a tais perguntas. Sem
das coletividades? Sabemos que têm pontos
bola de cristal, a análise do futuro é sempre um
fortes: são a maior rede social do país – e a
exercício complexo. E discutível. Apesar disso, há
entidade coletiva mais próxima das pessoas; são
dois aspetos relativos ao futuro das coletividades
uma escola de cidadania e um exemplo de
que se podem desde já referenciar:
democracia; e são particularmente resilientes. Mas têm também alguns pontos fracos: por
a) As coletividades não vivem isoladas das
exemplo, a frágil coesão e interligação internas; o
comunidades onde estão inseridas. E não vivem
conservadorismo; ou a fraca participação de
desligadas da realidade nacional e internacional
jovens e de mulheres em funções dirigentes.
(contexto político, económico, social e cultural). A consciência dessa realidade coloca alguns b) Mas isso não significa que o futuro seja
desafios importantes. Para participarem na
ditado apenas pelo que vem de fora – pelo
construção de uma democracia avançada – ou de
contexto externo. A vontade dos associados e dos
alta intensidade – é fundamental que as
dirigentes, a sua visão, o seu querer e o seu
coletividades não se coloquem apenas numa
trabalho são também uma variável fundamental.
posição de amortecedor de problemas. Devem assumir cada vez mais um papel ativo e
E isso conduz-nos a uma primeira conclusão. O
consciente na transformação da sociedade – e na
futuro das coletividades será talhado (em grande
construção de uma sociedade mais justa. E
medida) pela relação dialética entre essas duas
precisam também de estar próximas e unidas –
realidades: o contexto externo e a realidade
trabalhando em parceria e no fortalecimento das
interna.
suas estruturas representativas. Só assim terão a força suficiente para serem obreiras do seu futuro
E o que é que sabemos sobre o contexto externo?
– e do futuro do país.
Entre muitas outras coisas, sabemos o que dispõe a Constituição Portuguesa. A nossa Constituição aponta um caminho claro: “A República Portuguesa é um Estado de direito democrático (…) visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento
º
da democracia participativa” (artigo 2. ). E reconhece o papel das coletividades na construção dessa mesma democracia: competelhes colaborar com o Estado e outras entidades na promoção do acesso por todos quer à cultura, quer ao desporto (artigos 73.
º
º
e 79. ); e compete-
"
O futuro das coletividades será talhado (em grande medida) pela relação dialética entre essas duas realidades: o contexto externo e a realidade interna
lhes também intervir ativamente na vida
º
administrativa local (artigo 263. ).
Diretor da Revista Análise Associativa Vice-presidente da Direção da
CPCCRD
sócia
59 | MAIO 2020
40
VISÕES DE SOCIEDADE
AS RELAÇÕES ENTRE O ESTADO CENTRAL E O MAP
VISÕES PARA A DÉCADA
PROSPECTIVA DAS RELAÇÕES ENTRE O ESTADO CENTRAL E O MAP A U G U S T O
F L O R
A iniciativa da Associação de Colectividades da
Seria um exercício meramente especulativo mas, é
Figueira da Foz merece-me o maior respeito e
possível estabelecer cenários com base nos
aplauso. Numa situação como a que vivemos
métodos e técnicas das ciências sociais e da
(Covid-19) comemorar o Dia Nacional das
experiência adquirida. Por outras palavras, se
Colectividades com a edição online da “Sócia” é
trabalharmos para que sejam reunidas certas
um passo da maior importância. Desejo os maiores
condições, podemos atingir certos objectivos.
êxitos sobretudo porque acredito que valerá mais
Relação causa / efeito.
pela substância que pela circunstância.
Sempre pautámos a nossa acção pelos interesses
Desafiado a reflectir sobre o futuro do MAP –
do MAP, identificando problemas internos e
Movimento Associativo Popular para a década
externos. Percebemos que muitos dos problemas
20/30, traz-me à memória a experiência dos meus
existentes no associativismo são endógenos os
50 anos de dedicação ao associativismo popular
seja, têm causas internas e como tal teremos que
de cultura, recreio e desporto (1970/2020). O que
ser nós a evitá-los ou resolve-los. Por outro lado,
vi, senti e vivi.
há problemas exógenos, ou seja, são problemas
gerais da sociedade que se reflectem no
Foi a Guerra Colonial (1961/1974) durante a
associativismo e, por isso, só terão solução no
ditadura que mobilizou e arrastou milhares de
associativismo quando forem solucionados na
jovens que eram Dirigentes Associativos. Foi a
sociedade.
Liberdade conquistada com o 25 de Abril de 1974
que levou milhares de Dirigentes Associativos para
Para cada problema, apresentamos uma solução. O
os Sindicatos, Partidos Políticos e Autarquias por
princípio é o da cooperação sem excluir a
serem experientes, reconhecidos e prestigiados. O
possibilidade de conflito institucional se
associativismo resistiu.
necessário. É essencial informar, mobilizar e dar
expressão à vontade dos Dirigentes Associativos
Foram as dificuldades de salários em atraso,
que, com a sua intervenção constituem verdadeiros
mudanças na natureza das relações de trabalho
agentes de transformação social. É desta forma
como a precariedade, as deslocações dos locais
que estabelecemos relações com o poder central.
de trabalho e a desregulação de horários de
Temos tido vitórias e derrotas e assim continuará a
trabalho, considerando que, sociologicamente,
ser.
mais de 86% dos Dirigentes Associativos são
trabalhadores por conte de outrem. E agora, uma
O funcionamento democrático do Associativismo
Pandemia que nos obriga a encerrar instalações, a
Popular, o contributo que damos para a qualidade
suspender as actividades associativas e a
da nossa democracia representativa, os valores
reinventar o futuro. O associativismo resiste.
como a transparência, solidariedade, trabalho colectivo, são o suporte da confiança que temos
Foram as muitas lutas que travámos que permitiram
porque fomos, somos e seremos parte de uma
hoje termos um conjunto de leis específicas para o
sociedade que, sem nós, seria mais pobre, menos
MAP bem como a inclusão no Conselho Económico
consciente, menos feliz e menos realizada.
e Social, Conselho Nacional do Desporto e
Conselho Nacional da Economia Social onde
O futuro está nas nossas mãos como está o
apresentamos as nossas propostas e representamos
presente e esteve o passado. A margem de erro
o MAP por inteiro. Não devemos nada a ninguém! É
aumenta se desistirmos. Importa por isso, arregaçar
um direito adquirido por dezenas de anos de luta
as mangas porque, uma década passa num
insistente e coerente. O associativismo continua a
instante.
resistir.
Até um dia destes, em 2030!
Como estaremos em 2030 não será possível, de
Antropólogo e Presidente da Direção da
todo, adivinhar.
Confederação Portuguesa das Colectividades
sócia
60 | MAIO 2020
40 VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
AS RELAÇÕES ENTRE O ESTADO CENTRAL E O MAP
PARA A DÉCADA
O VALOR PATRIMONIAL DO MOVIMENTO ASSOCIATIVO NA SOCIEDADE PORTUGUESA R A Q U E L
F E R R E I R A
º
O Movimento Associativo Popular está alicerçado
Com a resolução n.
em valores fundamentais, como a solidariedade, a
Republica recomendou ao Governo a adoção de
130/2019, a Assembleia da
fraternidade, a cidadania e no trabalho voluntário
medidas de valorização do movimento associativo
de largas gerações de pessoas que dão o melhor
popular, nomeadamente,a consulta do movimento
do seu tempo e de si próprias. Este trabalho de
associativo popular para a definição de políticas
proximidade é um exemplo de persistência,
nas áreas da cultura, desporto e ação social;
dedicação e de referência na edificação dos
a criação de um programa de simplificação do
valores humanos da solidariedade e da partilha.
licenciamento, bem como, a realização de um estudo que vise a adoção de medidas,
Um relatório do Instituto Nacional de Estatística
relacionadas com a remuneração e com a
de julho de 2019, diz-nos que, de acordo com a
redução dos encargos.
distribuição dos principais indicadores segundo a classificação Internacional de Organizações Sem
A maioria das associações suporta com os seus
Fins Lucrativos e do Terceiro Setor, em 2016, o
próprios meios as tarefas que realizam. Muitas
Valor Acrescentado Bruto (VAB) da Economia
obtêm parte dos seus recursos financeiros por via
Social representou 3,0% do VAB da
de subsídios, apoios ou comparticipações com
economia,tendo aumentado 14,6%, em termos
origem no sector público.
nominais, face a 2013. Este crescimento foi superior ao observado no conjunto da economia
No que respeita ao financiamento estatal, apesar
(8,3%), no mesmo período.
das diferenças existentes entre os apoios autárquicos e o poder central, este último mais
Ainda numa análise por grupos de entidades da
expressivo em termos orçamentais, são as
Economia Social, as Associações com fins
autarquias que continuam a ser a principal fonte
altruísticos evidenciavam-se em número de
de recursos das associações. Pois, a intervenção
entidades (92,9%), VAB (60,1%),Remunerações
direta do Estado abrange apenas um número
(61,9%) e Emprego remunerado (64,6%).
muito limitado de instituições.
Se fosse considerado o enorme volume de
Não tenho dúvidas acerca do impacto das
trabalho voluntário que é feito por mulheres e
associações na vida das pessoas, por isso,
homens nas associações - caso fosse remunerado
estamos todas e todos convocadas/os a prestar
- não teríamos dúvidas que este assumiria uma
mais atenção ao trabalho que as coletividades de
dimensão muito considerável, em termos
cultura, recreio e desporto têm vindo a
económicos.
desenvolver ao longo do tempo na sociedade portuguesa, constituindo um genuíno património
As principais adversidades das associações prendem-se sobretudo com um fraco reconhecimento do trabalho desenvolvido e com recursos financeiros insuficientes,necessitando assim, de um quadro de apoio institucional mais apropriado à realidade associativa do país.
nacional de valor social incalculável.
"
Estamos todas e todos convocadas/os a prestar mais atenção ao trabalho que as coletividades de cultura, recreio e desporto têm vindo a desenvolver
Advogada e Deputada à Assembleia da República (PS)
sócia
61 | MAIO 2020
40 VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
AS MULHERES NO MOVIMENTO ASSOCIATIVO
PARA A DÉCADA
O QUE FUNCIONA SEM A PARTICIPAÇÃO FEMININA? S I L V I N A
Q U E I R O Z
Maio, flores e festa, a Primavera convidando à
As colectividades são espaços de discussão
celebração. Nebulosa por ora mas não roubando
política sobre a sociedade, os seus problemas,
a alegria de construir juntos. Dia 31 é dia festivo:
avanços e recuos e a participação das mulheres
aniversário da Federação das Colectividades.
conferirá pensamento integral, favorecerá a
Alegro-me com a data, envio parabéns e votos de
criação artística, trará empatia. Vejo-as com a
sucesso, nomeadamente para a década que vem.
sua energia inata promovendo “oficinas” e
De coração agradeço o convite para contribuir
formações para discussão e resolução de
para a comemoração, corporizada na revista
questões candentes e transversais, nomeadamente
“Sócia” que agora nasce, com um forte acento no
na difícil articulação do trabalho com a vida
feminino: “As mulheres e o associativismo”.
familiar e o papel socializante de que não vão abdicar. Não precisam de quotas que as
O tema é-me caríssimo. De miúda, acompanhando
alpendurem a qualquer tipo de responsabilidade.
o meu padrinho à Colectividade, contrariando a
Querem só o respeito que lhes é devido, o
vontade da esposa: as colectividades, as
reconhecimento das capacidades criativas e de
associações, tinham uma aura de “má fama” -
resiliência como já claramente visível no
jogatanas e copos. Injusto! Esta visão contribuía
movimento associativo. Querem vencer entraves,
para o afastamento das mulheres, só convocadas
resquícios do pensamento troglodita que as
a tarefas “menores”: limpar, cozinhar e organizar
menorizou.
festinhas, sob a tutela masculina. A Federação é a herdeira da Confederação Nem sócias podiam ser, nalguns casos por
Portuguesa de 1924 e esta a sequela da primeira
imposição dos próprios Estatutos! Foram-no mais
colectividade do País, nascida em 1722 sob a
tarde, com o consentimento escrito do pai ou do
égide de Pombal. Três séculos de história que
marido e com o cartão anexo aos deles! Era o
importa honrar. Urge um digno estatuto do
padrão, crendo todos que nem podia ser outro!
dirigente benévolo, homem ou mulher, permitindo
Mas devagarinho aconteceram mudanças,
liberdade para dedicação a esta vital “causa
conquistadas pelas mulheres a pulso. E após o 25
pública”. E o apoio grato das autarquias que têm
de Abril deu-se o boom: a entrada franca, a bem
no movimento associativo de massas um aliado
do movimento associativo popular, de longe
sempre atento.
espaço privilegiado não só de convívio mas também foco de cultura e alfobre de contestação ao regime, bilhetes trocados à mesa das cartas, olhares cruzados, saídas furtivas para conversas num canto escuro, em cautela máxima. As colectividades cedo ultrapassaram o patamar do lazer, imprescindível entre gente de vida árdua. Foram e são autênticas escolas de vida. Aí se aprendeu a ler e a escrever, muitos aprendemos a discorrer sobre o Mundo. Confusão ainda existe entre acto político e partidário, ajudando à manutenção de reacções obscurantistas.
"
A participação das mulheres conferirá pensamento integral, favorecerá a criação artística, trará empatia
Docente do ensino básico aposentada e deputada municipal
sócia
62 | MAIO 2020
40 VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
AS MULHERES NO MOVIMENTO ASSOCIATIVO
PARA A DÉCADA
VALORIZAR O COLETIVO NA INDIVIDUALIDADE DO SER T E R E S A
M A C H A D O
Nunca fui dirigente associativa, conheço o
O trabalho que se avizinha nos anos vindouros
incomensurável e valioso universo do
urge ser concretizado em uníssono, como a
associativismo, por isso não posso deixar de
Associação de Coletividades tão bem tem sabido
confessar a extrema admiração que tenho pelos
fazer desde os primórdios da sua fundação.
homens e mulheres que o protagonizam, e que abnegadamente e diariamente lhe dão corpo,
Para definir o vosso voluntarismo e inexcedível
alma e vida.
espírito de missão só conheço duas simples palavras, PARABÉNS e OBRIGADA.
O Concelho da Figueira da Foz é particularmente rico em Colectividades que dinamizam as mais diversas actividades desportivas, recreativas, culturais e sociais. Da vasta panóplia de acções que alavancam no meio em que se inserem, será que poderemos elencá-las, ou distingui-las por ordem de prioridades? No meu entender não, importa acima de tudo procurar a resposta certa para o cidadão, que procura no espaço físico e de pertença imaterial, a plenitude das suas aptidões e dos seus desejos.
Se atentarmos na sinonímia casa/ família
"
A mulher dirigente associativa imprime o expoente máximo do seu género. Um olhar mais atento, cuidador, intuitivo afetivo e sensível. À especificidade do feminino alia-se uma ancestral capacidade de concretização de actividades
facilmente a associaremos a colectividade/lar. Como noutras áreas de intervenção, a mulher dirigente associativa imprime o expoente máximo do seu género. Um olhar mais atento, cuidador, intuitivo afetivo e sensível. À especificidade do feminino alia-se uma ancestral capacidade de concretização de actividades, com especial enfoque nas ligadas às manualidades e gastronomia, propiciadoras de um salutar e são convívio tão enraizado no nosso ”modus vivendi ”.
Se até aqui as Colectividades sempre se souberam organizar de forma a dar respostas a necessidades de intervenção no património material e pessoal de todos, hoje, esta agilidade e pertinência interventiva terá que equacionar a intervenção social, trabalhando em parceria com IPSS e outras entidades locais, de forma a colmatar as carências económicas, que irão agravar-se na encruzilhada dos tempos que atravessamos e que, seguramente, obrigarão as Colectividades e restantes entidades civis e autárquicas a olhar, vendo, as novas realidades que emergem a um ritmo alucinante.
Docente do ensino básico e Presidente do
Rotary Club da Figueira da Foz
sócia
63 | MAIO 2020
40 VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
O ASSOCIATIVISMO NO CONCELHO DA FIGUEIRA DA FOZ
PARA A DÉCADA
UMA DÉCADA DEPOIS C A R L O S
T E N R E I R O
Desafiado, confesso-me sem capacidade nem
Assumido e garantido esse modelo de
atrevimento para ler o futuro, reconhecendo,
desenvolvimento económico e sustentado do
contudo, que 2030 é já aqui ao lado, mais tendo
concelho, o resto advirá por acréscimo, pois
em conta, o ritmo desenfreado como se
quanto ao mais, a Figueira da Foz afirma-se por si
esfumaram as duas primeiras décadas do século
só, graças às suas excelentes condições naturais,
XXI.
as quais, conferem uma invejável qualidade de vida e de atractividade, determinantes para a
As associações têm assumido, ao longo dos
captação de mais investimento e consequente
tempos, um papel preponderante em substituir e
criação de emprego, de forma a poder fixar com
complementar o Estado no apoio social, nas suas
êxito as nossas gerações mais novas que hoje em
várias vertentes, e mais notório tem sido esse
dia, infelizmente, são obrigadas a viver fora da
préstimo em momentos de crise, como aquele que
sua terra natal à procura de trabalho.
se vive actualmente, o que não invalida que a sua grande maioria esteja a passar por momentos
Se assim for, em 2030, com a actual questão
extremamente difíceis, devido não só aos parcos
pandémica há muito debelada, maximizado o
apoios que recebem, mas também, em razão dos
potencial do porto de mar, concretizado o
novos tempos que muito alteraram o modo de vida
aeroporto internacional na zona centro do país e
em sociedade, cada vez mais individualista e
a governação local confiada a verdadeiros
menos comunitário.
figueirenses, a Figueira da Foz será, sem dúvida, um dos melhores locais para se investir e viver e,
Se é um facto que o associativismo surge e
contará, seguramente, com um movimento
sobressai com maior enfase nos momentos de
associativo mais pujante do que nunca.
míngua, também é verdade que são os períodos económicos mais favoráveis que marcam o seu crescimento e fortalecimento, como nos tem ensinado, aliás, a história do nosso concelho, onde o movimento associativo figueirense ganhou grande expressão na dobragem entre os séculos XIX e XX, numa época que foi de apogeu no desenvolvimento económico local. Pela inegável importância que detém para a sociedade em geral, compete a todos nós, sobretudo aos agentes políticos e económicos, o dever e a tarefa de estimular e promover o associativismo, criando condições de progresso de forma a garantir o devido apoio.
Não me canso de insistir que a Figueira da Foz detém um enorme potencial de desenvolvimento,
"
Maximizado o potencial do porto de mar, concretizado o aeroporto internacional na zona centro do país e a governação local confiada a verdadeiros figueirenses, a Figueira da Foz será, sem dúvida, um dos melhores locais para se investir e viver e, contará, seguramente, com um movimento associativo mais pujante do que nunca
contando com uma mola estratégica e decisiva na criação de riqueza para o concelho, assente na existência dum porto de mar(onde urge assegurar um maior calado e uma barra desassoreada) articulando-o com uma plataforma de mobilidade intermodal (ferrovia/rodovia) destinada a servir um interland carente de escoamento, geograficamente balizado entre as grandes áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto e que se estende pela vizinha Espanha.
Advogado, dirigente associativo e vereador não executivo da Câmara Municipal da Figueira da Foz
sócia
04 | MAIO 2020 64
40 VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
O ASSOCIATIVISMO NO CONCELHO DA FIGUEIRA DA FOZ
PARA A DÉCADA
O SER HUMANO É SOCIALIZÁVEL POR NATUREZA! J O S É
A U G U S T O
M A R Q U E S
As coletividades, independentemente da sua
É claro que nestes 46 anos a tentação de
localização,citadina ou rural, tiveram, e poderão
politização das coletividades esteve quase
vir a ter, porque presentemente não têm, apesar
sempre presente. Se nos primeiros tempos da
do “não têm” parecer excessivo, uma importância
democracia foram as coletividades que ganharam
decisiva na formação cívica, cultural e desportiva
com essa influência, o futuro, por paradoxal que
de uma franja significativa da nossa população.
pareça, passa por uma maior autonomia
relativamente aos diversos poderes, sob pena de
Logo que a novidade digital, ainda criança, passe
algumas se extinguirem se não forem capazes
a ser encarada como uma ferramenta para nos
de o fazer.
facilitar a existência e não como um fim para nos individualizar, sendo o ser humano socializável por
Sendo, há muito, a falta de dirigentes, dignos
natureza, voltaremos a reencontrar-nos com uma
desse nome, um dos principais problemas na
maior necessidade de vida em comum.
manutenção das associações, contrariando
algumas tendências, que apontam no sentido de
Sob pena de evocarmos mais um truísmo, as
criar regimes de exceção para os dirigentes
coletividades do futuro serão o resultado do
associativos como incentivo ao seu recrutamento,
presente. Importa por isso recuperar alguns dos
seguindo um pouco a linha do que os políticos
valores que nos trouxeram do século XIX ao século
foram fazendo para si, parece-nos que a aposta
XXI, reenquadrando-os e dando-lhes o significado
que urge fazer, passa pela dignificação dos que
que os padrões de vida exigem em cada
servem a causa associativa no presente,
momento.
enaltecendo a sua entrega generosa a esta nobre
causa e não pela criação de vantagens materiais.
Não é por acaso que as bandas filarmónicas são das poucas instituições que resistiram de forma
Só respeitando e incentivando os melhores, pelas
ininterrupta às vicissitudes dos tempos, sempre
suas reais capacidades e vocação para o
que a matriz fundadora se manteve.
dirigismo e não por alinhamentos conjunturais de
interesse duvidoso, voltaremos a ter pessoas
As nossas associações surgiram, por regra, fruto
capazes de guindar as nossas associações aos
da necessidade de afirmação de uma
patamares de importância que tiveram no
determinada comunidade e normalmente em
desenvolvimento de atividades verdadeiramente
momentos de marcado desenvolvimento social e
importantes na formação cívica, cultural e
económico dos meios onde se inserem. Sendo a
desportiva do nosso povo.
necessidade de afirmação algo intrínseco em todos os povos, o aparecimento ou
Em cima dos erros do presente, que são notórios,
rejuvenescimento das coletividades, só pode ser
saibamosconstruir um futuro melhor. E sim, as
uma realidade.
coletividades, se quisermos e soubermos, despindo
uma parte das pequenas invejas que caracterizam
Com o advento do poder democrático municipal -
cada vez mais a sociedade e vestindo a
nuns casos por mero aproveitamento político,
humildade que rareia, terão um futuro risonho.
noutros com o genuíno interesse no desenvolvimento concelhio - ganharam condições materiais que nunca, até então, tinham conhecido. Significa que, fruto do caminho percorrido nos últimos anos, não é possível falar de associativismo, no presente ou no futuro, sem falar de política associativa dos municípios ou até do país.
Fed. Filarmónicas Distrito Coimbra Casa do Povo de Quiaios
Vice-presidente
Presidente da Direção
sócia
65 | MAIO 2020
40 VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
O ASSOCIATIVISMO NO CONCELHO DA FIGUEIRA DA FOZ
PARA A DÉCADA
UM TEMPO NOVO, A MESMA PAIXÃO COM ESPERANÇA E CORAGEM VAMOS À LUTA R O S A
B A P T I S T A
Abril chegou-nos com a certeza de que o mundo
Este é o tempo real para sermos mais amigos e
se vai revelar muito diferente, depois de um
companheiros, e de poder desfrutar deste lindo
intruso vir aprisionar a vida de todos nós, numa
sentimento que se chama: amor, carinho,
guerra sem fim à vista.
companheirismo, fidelidade, solidariedade e gratidão. Sofremos por nós e pelos que nos são
Este inimigo sem rosto e sem armas tem afetado
próximos mas sem podermos estar perto para dar
todos os aspetos da nossa vida em tempo real, o
um abraço, que tanto nos reconforta.
que coloca o Movimento Associativo, numa situação invulgar e nada familiar.
O associativismo no concelho da Figueira da Foz representa um património histórico, cultural e
Como pessoas em permanente Ação, estamos
social considerável.
constantemente ocupados em diferentes atividades, circulando livremente, encontrando-
Escrevo esta reflexão, com o sentimento de
nos publicamente, gerando dinâmicas
pertença a um grupo de milhares de dirigentes
diversificadas e estendendo mãos solidárias.
associativos que, em momentos particularmente difíceis, não deixa de dizer Presente, mais que
Por isso, este é um período muito difícil para
não seja, pelos sinais que dá na comunidade em
aqueles, que como nós, estão sempre a aprender,
que se insere de que, depois da tormenta,
crescendo e servindo juntos, as nossas
estaremos cá deste lado para, amarrados na
comunidades.
Esperança, ajudarmos a reerguer um mundo mais humano e mais solidário.
Em muitos aspetos, este também pode ser o momento de fazermos a diferença. O desalento bateu-nos à porta, mas em terreno associativo, sabemos renascer das cinzas e reinventar-nos.
Não percamos a oportunidade de ser úteis e servir sempre. Os caminhos que vamos traçar nos próximos tempos não se adivinham fáceis.
Não serão rápidos, nem fáceis de percorrer.
"
Este também pode ser o momento de fazermos a diferença. O desalento bateu-nos à porta, mas em terreno associativo, sabemos renascer das cinzas e reinventarnos
Esta pandemia que nos invadiu, vai definir a era moderna da mesma forma que a Segunda Guerra Mundial moldou gerações anteriores.
Presidente da Direção do
GIS
Presidente do Conselho Fiscal da
sócia
66 | MAIO 2020
CPCCRD
40
VISÕES
VISÕES DE SOCIEDADE
O ASSOCIATIVISMO NO CONCELHO DA FIGUEIRA DA FOZ
PARA A DÉCADA
UMA TERCEIRA VAGA NO ASSOCIATIVISMO FIGUEIRENSE S A N S Ã O
C O E L H O
Na recente pandemia originada pelo coronavírus
cheias de galhardetes permutados com instituições
(covid-19) muitos foram aqueles que ficaram em casa
afins, pendem das paredes fotos amarelecidas pelo
em regime de teletrabalho. Porém não há um
tempo de vetustos dirigentes destas INCRÍVEIS
normativo jurídico para este tipo de laboração e não
associações. Os seus dirigentes dedicam-se às
questionamos quem pagou a internet ou a energia
coletividades com uma entrega quase voluptuosa e
consumida em casa pelos trabalhadores. Muitos
admiro todos os que estão neste caminho. Porém,
destes mostraram satisfação por conseguirem
estes TODOS QUE ADMIRO não são capazes de
continuar a realizar as suas tarefas em teletrabalho
relatar a realidade nua e crua da diminuição de
e até socializaram, entre aspas, com os seus
associados, da questionável falta de participação
companheiros quando tomavam o café virtual. Foi
das populações nas nossas coletividades e da
inesperado, mas a adaptação foi rápida, embora ao
extrema dificuldade em nos adaptarmos aos novos
fim de algum tempo muitos sentissem saudades do
DESEJOS DOS NOVOS PÚBLICOS e à ÉPOCA DO
normal ambiente do escritório. Em relação aos
TELETRABALHO e, talvez, de uma espécie de TELE-
jovens e às crianças que já passavam muito tempo
ASSOCIATIVISMO. É reconhecidíssimo o esforço
em casa, tendo deixado, há muito e de um modo
hercúleo dos dirigentes para realizarem uma ou
geral de frequentar a rua, estas também se
outra atividade que encha o olho e passe nos média
adaptaram ao ensino online e via televisão, mas
- tal como é feita de suor e lágrimas a dedicação
terão começado cedo a sentir falta dos colegas e do
diária destes dirigentes para não entregarem, por
frenesim do ambiente escolar. Soube que algumas
falta de financiamento, as chaves da sede…porque
que diariamente estavam agarradas aos jogos de
esta sede tem MEMÓRIAS de pessoas, muitas
computador - talvez por estarem cheias de ecrã
familiares, de vidas, das convivialidades de antanho,
escolar – abandonaram, na pandemia, os jogos.
de factos que nos orgulham e ajudam a desenhar a
Estas são imagens recentes da Figueira, de Portugal
nossa identidade/POVO.
e do mundo. Obviamente reportamos profissionais em atividades específicas: setores terciários. Não
Talvez o que esteja a acontecer nas nossas VIDAS
aconteceu assim com o movimento associativo que
ATUAIS nos leve a encarar frontalmente o PORQUÊ
não pôde recorrer ao teletrabalho; aliás o humor
da falta de associados e de participação
circulou pela Net e no Whatsapp com bonecos como
destes (e isto ainda tem honrosas exceções), de
aquele do comandante do avião em teletrabalho a
como conseguir que o Estado olhe para as
saudar os passageiros desejando-lhes um bom voo.
COLETIVIDADES como parte de um eficaz Terceiro
Imagina-se o pavor!
Setor. Urge desenvolver os objetivos de grupo com homens SOLIDÁRIOS e jamais SOLITÁRIOS, por isso
Não contávamos com a chegada do covid-19.
estamos em ASSOCIATIVISMO e acredito que vamos
Alterou, abruptamente, modos de vida e deu um
entrar efetivamente numa Terceira Vaga de
forte rombo na economia. No entanto floriu o
Associativismo com a Figueira a atingir um ponto
teletrabalho que já existia em diversas modalidades
alto neste âmbito em 2030. O covid-19 veio mostrar
como a telemedicina ou a teleassistência. Mudaram-
que temos de nos adaptar às circunstâncias das
se regras de jogo. Mudou (um pouco) a sociedade. E
sociedades, ao NOVO REAL e aos novos interesses
é do social, da socialização, que nasce o movimento
dos cidadãos deixando de ser apenas um museu com
associativo com diversas roupagens e a tocar
um passado escrito nas paredes. A vitalidade cívica
dezenas de áreas. Sociedade, Solidariedade,
tem de se mostrar e os figueirenses precisam de
Exercício sublime de Democracia assim tem sido o
estar mais em interligação, em contacto de
Movimento Associativo Figueirense permitindo
proximidade que até pode ser pela net, pelo Skype
Escolas de Música, Filarmónicas, Teatro, Preservação
ou pelo Zoom, em grupos de defesa do ambiente, de
de Tradições, Clubes de Xadrez e de Sueca, Grupos
turismo, lazer, Direitos do Homem…ou uma Secção de
de Bailado e Sapateado, Folclore, Defesa do
Youtubers. Sem prejuízo de um passado
Património. As sedes das nossas coletividades estão
teimosamente glorioso.
Jornalista e radialista aposentado Presidente da Direção da
Dez de Agosto
sócia
67 | MAIO 2020
40
VISÕES
VISÕES TEMÁTICAS
UM ANDAMENTO PARA O MOVIMENTO FILARMÓNICO
PARA A DÉCADA
UM CENÁRIO, DOIS CENÁRIOS... QUE CENÁRIO? A F O N S O
A L V E S
CENÁRIO I
Com pensamento positivo, devemos olhar para
O público recebeu com aplausos os músicos que
as bandas de música como organismos vivos,
ocupavam o seu lugar no palco. O maestro
individuais, em constante mudança. Mas que
percorreu com o olhar os instrumentistas. Tinham
mudança?
preparado o reportório para as romarias, sendo
Sei que as duas visões descritas serão reais. As
hoje a sua apresentação. No programa constava
instituições não são algo abstrato, as
uma marcha de concerto, duas aberturas, uma
instituições são as pessoas que lá estão, em
seleção de música ligeira, uma rapsódia popular
dado momento, e essas mesmas pessoas serão
e uma marcha retirada das cadernetas de rua.
as responsáveis por um dos cenários descritos.
Um dos ouvintes, pai de um jovem
Nos últimos anos assistimos a tentativas de
instrumentista, sorria. Chegara a ter dúvidas que
diversificação da atividade das bandas. No
o rapaz seguisse os passos do tio, também
entanto, salvo raras e apreciadas excepções, os
músico, porque na banda não existia
apoios não são os desejados, nem imagino que
propriamente uma escola de música e os poucos
venham a ser. As bandas de música continuam a
jovens que lá iniciavam o seu percurso musical
ter um caminho sinuoso a percorrer e seria bom
não se sentiam motivados.
que não o fizessem individualmente. Será bem-
Naquela noite de sábado, 4 de Maio de 2030, a
vindo, durante a próxima década, um movimento
banda fez-se ouvir.
associativo com raízes fortes, congregador das vontades e interesses das instituições, dando
CENÁRIO II
voz aos anseios filarmónicos. Mas desenganem-
O público recebeu com aplausos os músicos que
se, há todo um trabalho que é imperativo fazer
ocupavam o seu lugar no palco. O maestro
dentro de portas, ninguém o fará por ninguém.
observou os numerosos instrumentistas. Sentia-
Penso que durante a próxima década, também
se satisfeito pelo trabalho realizado e confiante
devido à crescente escassez de serviços
na prestação dos seus músicos, principalmente
populares, as bandas de música irão procurar
porque a banda nos últimos anos soubera
novos mercados; é importante não resumir a
reinventar-se. Hoje prometia um concerto
atividade da banda apenas às romarias.
multidisciplinar que iria incluir vozes,
Também o ensino será melhor estruturado,
coreografias e projeção de imagem.
valendo a pena investir em monitores com
Um dos ouvintes, pai de um dos mais jovens
formação. A preocupação em definir e
instrumentistas, sorria. O jovem tinha iniciado os
consolidar os quadros efetivos parece acentuar-
seus estudos na escola de música há cerca de
se, havendo indicadores de que na próxima
três anos, adquirindo conhecimentos
década assistiremos, na sua maioria, a um
proporcionados por competentes monitores.
aumento das potencialidades das bandas de
Tinha participado na banda juvenil, a qual, para
música.
além de ser um agente motivador para a
É frequente ouvirmos dizer que nada será como
aprendizagem, servia de trampolim para a
antes. Não sei se nada será como antes, o que
banda sénior.
sei é que podemos tentar que tudo venha a ser
Naquela noite de sábado, 9 de Março de 2030,
melhor que antes. Obviamente espero que
a banda fez-se ouvir.
caminhemos com passo certo e seguro e que em 2030 o primeiro cenário descrito não se
CONCLUSÃO
verifique.
Se há certezas quanto ao futuro filarmónico, uma delas é que nada é garantido. Esta premissa provou ultimamente a sua veracidade.
sócia
68 | MAIO 2020
Maestro e Compositor
40
VISÕES
VISÕES TEMÁTICAS
UM ANDAMENTO PARA O MOVIMENTO FILARMÓNICO
PARA A DÉCADA
FILARMONIA: DAS PARTICULARIDADES ÀS OPORTUNIDADES H E L E N A
B A P T I S T A
São tantas, mas tantas, as filarmónicas que ecoam de cima a baixo deste jardim. Em cada uma inscreve-se a história de todas as outras, e ao longo de mais de duas centenas de anos, assim se têm mantido, de pé. E de pé, todas têm deixado, de forma inequívoca, uma marca irrepetível na cultura, na educação e na identidade dos que as integram e dos que as rodeiam.
"
O maior desafio que a próxima década colocará a cada filarmónica será sem dúvida a descoberta e assimilação das suas idiossincrasias, a compreensão e aceitação dos sons que as caracterizam e que as distinguem
Do lado musical, todo aquele que fica de fora do coreto se apercebe das transformações significativas ao nível da formação e especialização pelas quais as filarmónicas têm passado, pelo menos de há 30 anos a esta parte. Esta evolução tem permitido não só uma maior amplitude na escolha de repertórios, como a possibilidade de presentear o público com uma qualidade menos questionável. Do mesmo modo, também aquele reconhecerá o papel que as filarmónicas sempre tiveram na democratização do acesso à Música e do Ensino Musical. A par do que se ouve, também o que se vê, sejam as fardas mais aprumadas ou os instrumentos mais reluzentes debaixo do sol, sejam os rostos menos marcados pelo tempo ou o traço cada vez mais feminino que sobressai nas filas, tudo tem contribuído para a alteração das representações sociais das filarmónicas na comunidade. Do lado associativo, e sem dúvida aquele que tem mantido a sua verticalidade, serão certamente os que ficam dentro do coreto quem melhor poderá testemunhar o valor inestimável destas instituições enquanto instrumento de formação de carácter. Nenhuma outra organização, permitirá incluir debaixo de uma mesma batuta os que estão a dar os primeiros passos e os que já percorreram um longo caminho na vida, nem os que conseguem soar melhor e os que não conseguem soar ainda tão
Não obstante o que na sua essência parece ser comum, o maior desafio que a próxima década colocará a cada filarmónica será sem dúvida a descoberta e assimilação das suas idiossincrasias, a compreensão e aceitação dos sons que as caracterizam e que as distinguem. Neste tempo de globalização, de partilha do vivido e do sentido, sem limite e sem filtro, em que parece tão difícil não ceder à mera replicação do que se entende ser o sucesso do outro, cabe a cada filarmónica perceber as suas especificidades, as suas formas únicas de inspirar e expirar. Devidamente enquadrada nos seu contexto e com as suas gentes, cabe a cada filarmónica transformar essas mesmas particularidades em oportunidades. Apenas assumindo esta singularidade será possível ainda responder com sucesso a um desafio maior. O desafio de se conhecerem verdadeiramente umas às outras, de se estimarem verdadeiramente umas às outras, de se associarem verdadeiramente umas às outras, e de em uníssono, defenderem verdadeiramente o que ninguém melhor defenderá: a filarmonia. E assim continuarem a ser tantas, mas tantas, as filarmónicas que ecoam de cima a baixo deste jardim...
bem. Nenhuma organização, terá tão profundamente gravado no seu estandarte o sentido da socialização, da coesão, do sentido de pertença, da participação cívica, da
Presidente da Direção
solidariedade e da abnegação.
Federação Filarmónicas do Distrito de Coimbra
sócia
69 | MAIO 2020
40
VISÕES
VISÕES TEMÁTICAS
UM ANDAMENTO PARA O MOVIMENTO FILARMÓNICO
PARA A DÉCADA
APOLOGIA AO DIÁLOGO R E N A T A
O L I V E I R A
Antes de partilhar a minha reflexão sobre o
cria barreiras ao crescimento do contexto
futuro das filarmónicas, sublinho que esta é uma
filarmónico português como um todo. Seremos
reflexão pessoal, fundamentada na experiência
verdadeiramente uma pequena parte do que
enquanto jovem instrumentista filarmónica de
podemos ser, se mantivermos a nossa
1998 a 2014 e na experiência enquanto
mentalidade feudalista.
maestrina, ainda jovem, de 2012 até ao
Encontra-se ainda alguma resistência quando se
presente, com toda a subjetividade que a
tenta abrir diálogo neste sentido. Felizmente,
mesma subentende.
encontramos também cada vez mais colegas
Dito isto, acredito que a próxima década será
que entendem e sentem a falta que este tipo de
marcada pelo enraizar das mudanças que já
organizações faz no nosso país, presentes em
estão em andamento nos últimos anos. Podemos
grande parte dos países com tradição de banda
resumir tais mudanças a três áreas gerais: o
e que são fundamentais para a criação de uma
aumento do nível e qualidade de formação dos
estrutura nacional de suporte, desenvolvimento
maestros e escolas de música; a reinvenção
e defesa das nossas bandas.
artística/musical das bandas, exigida pelo
Resumindo, acredito que todos os fatores acima
decréscimo no número de romarias e/ou no
mencionados têm um papel importante no futuro
valor de contratação das mesmas; e o diálogo
das bandas filarmónicas. Acredito que o futuro
necessário entre maestros e instituições.
está cheio de potencial positivo e que há, cada
Não havendo espaço, neste contexto, para
vez mais, intervenientes capazes e motivados, a
escrever sobre cada uma delas de forma mais
lutar pelo bom crescimento do tesouro que são
aprofundada, falo sobre a que me parece de
as bandas filarmónicas em Portugal.
mudança difícil, mas crucial: o diálogo.
O tipo ou grau de mudança neste futuro próximo
É sobre ele que encontro mudanças menos
depende da resposta que escolhermos dar a
profundas do que, acredito, seria ideal para o
esta questão, com que finalizo: vamos
nosso contexto. O bairrismo, tão natural,
finalmente crescer dialogando abertamente ou
tradicional e importante na construção da
vamos continuar a crescer dentro do conforto
identidade de grupo, pode ser também um fator
que o nosso individualismo permite?
castrador no que respeita ao crescimento das bandas filarmónicas como um todo. O amor à farda e à casa que nos formou é de uma enorme riqueza e em momento algum irei defender o contrário. Refiro-me antes a situações, por exemplo, de associações que se recusam a colaborar com outras por motivos históricos, mais ou menos antigos, ou maestros que não partilham informação com outros colegas com receio de perder algum tipo de vantagem imaginária. Refiro-me claramente à não
"
Vamos finalmente crescer dialogando abertamente ou vamos continuar a crescer dentro do conforto que o nosso individualismo permite?
existência de uma Associação Portuguesa de Bandas ou de uma Associação Portuguesa de Maestros de Banda. Esta resistência em unir esforços, organizar ideias e potenciais, apenas
sócia
70 | MAIO 2020
Maestrina da Filarmónica da
Sociedade Artística e Musical Carvalhense
40
VISÕES TEMÁTICAS
UM CENÁRIO PARA O TEATRO AMADOR
VISÕES
PARA A DÉCADA
UMA VISÃO DO TEATRO NO BAIXO MONDEGO D E O L I N D O
L .
P E S S O A
Ao esboçar uma perspectiva do teatro para a
ou em técnicas criadas a partir do mesmo por
próxima década, não posso deixar de referir que
Vsevolod Meyerhold (1874-1940) e Jerzy
sempre considerei que o Baixo Mondego teve
Grotowski (1933-1999). Nesta época também
uma actividade teatral importante ao longo dos
foram determinantes os conceitos próprios de
tempos, embora muitas vezes possa ter estado
Antonin Artaud (1896-1948) e Bertolt Brecht
em desacordo com a tendência dominante da
(1898-1956), bem como os “jogos teatrais” de
mesma, por razões diversas.
Viola Spolin (1906-1994) e o “teatro do oprimido”
Quando me iniciei na prática teatral
de Augusto Boal (1931-2009).
predominavam as operetas na região e em
No Baixo Mondego a prática teatral também se
muitas colectividades resumiam-se aos
foi alterando, embora em ritmos bem distintos
Pastoris
»,
« Autos
salvo algumas raras excepções. A
nos vários grupos. Os
« Autos
Pastoris
»
deixaram
representação naturalista dominava na região,
de ser a única actividade em muitos e as
propunha-se aos espectadores como sendo a
operetas perderam a sua predominância, bem
própria realidade, porém outros conceitos
como a estética naturalista, novas experiências
também introduzidos por André Antoine (1858-
foram realizadas e rompidos alguns
1943) eram depreciados, atitude que ainda hoje
preconceitos sobre a prática teatral.
persiste nalguns grupos.
Numa visão de futuro creio que os grupos de
Se a divulgação da estética naturalista explodiu
teatro devem manter uma ligação estreita com
em Portugal com o movimento republicano e a
a comunidade em que estão inseridos, mas tal
implantação da república em 1910, a critica do
não deve limitar a montagem de novos textos, o
naturalismo e a implantação de novas correntes
experimentar de novas metodologias, a busca
foi bastante limitada com o golpe de 28 de
de novos espaços e novas relações com os
Maio de 1926 e toda a perseguição e censura a
espectadores, mas sobretudo apostar na
novas ideias que se seguiu.
formação dos seus elementos e na captação de
Mas o que tem isto a ver com uma visão para o
novos públicos.
teatro na próxima década? É uma questão que
Como lá chegar? Não há uma receita infalível,
se pode colocar com toda a legitimidade. Uma
cada grupo terá que definir o seu caminho em
das primeiras frases que li em relação ao teatro
função das condições de que dispõe. Talvez
e que retenho na memória foi
arriscar e tentar o intercâmbio das produções,
velho e é novo por isso
«o mesmo » .
novo nasce do
Fiel a este princípio e reconhecendo toda a evolução registada na prática teatral da região, creio que o futuro depende muito da postura assumida pelos elementos que integram os grupos de teatro. Hoje tudo no mundo acontece a uma velocidade muito maior do que no passado e o acesso à informação é cada vez mais célere. Assim, nos anos 60 e 70 muitos se iniciaram na prática teatral com o “sistema” de Constantin Stanislavski (1863-1938) e discípulos,
as coproduções, ou outras ideias novas.
"
Cada grupo terá que definir o seu caminho em função das condições de que dispõe. Talvez arriscar e tentar o intercâmbio das produções, as coproduções, ou outras ideias novas
Médico, ator e encenador
Centro de Iniciação Teatral Ester de Carvalho (CITEC)
sócia
71 | MAIO 2020
40
VISÕES
VISÕES TEMÁTICAS
UM CENÁRIO PARA O TEATRO AMADOR
PARA A DÉCADA
A ARTE VIVA J O Ã O
M I G U E L
A M O R I M
Como é que uma arte que vive das pessoas e
companhias de Commedia dell’Arte invadem a
para as pessoas, pode resistir a uma praga que
europa e no séc. XVIII nasce o melodrama,
nos faz recear a proximidade?
influenciado pela Revolução Francesa e
De facto seria fácil sermos dominados pelo
industrial. O homem evoluí, a arte transforma-
medo e acreditar que é o princípio do fim. Não
se. No séc. XIX o teatro de Booth em Nova
façamos para já juízos apriorísticos.
Iorque utiliza o primeiro elevador hidráulico,
Se analisarmos o homem enquanto ser social e
surge o advento da iluminação a gás e em 1881 o
coletivo, entenderemos que o teatro é algo
Savoy Theatre de Londres é o primeiro a utilizar
intrínseco à sua evolução, que avança e se
a luz elétrica. Em pleno séc. XX durante o cerco
transforma na mesma medida.
a Sarajevo, onde as pessoas podiam ser mortas
Se começarmos pela sua génese, nos tempos
se saíssem de casa, dezenas de peças foram
primitivos, encontramos um homem selvagem
estreadas.
com a necessidade de entender e dominar os
Como é que podemos conceber, depois de
elementos que o rodeiam. Ao procurar a solução
tantos percalços e transformações ao longo de
no seu âmago descobre que é a arte, uma forma
toda a existência humana, que uma arte tão
primitiva de teatro dançado, de danças
rica, tão diferenciada, tão dinâmica, poderá
miméticas, a solução para conquistar e superar
padecer às mãos de uma pandemia? Não nos
os seus medos. Foi nesse momento que se
esqueçamos que o teatro se adaptou, evoluiu e
iniciou uma colaboração indissociável que
renasceu em diversas ocasiões. O teatro vive
permanece até aos dias de hoje.
para o homem, tal como o homem vive para ele,
O pensamento avançou e a arte evoluiu,
são indissociáveis. Se um dia sucumbirem será
atingindo um estágio superior na Grécia Antiga,
sempre às mãos um do outro.
o berço do Teatro Ocidental. Surge o ditirambo,
Ninguém conseguirá afirmar com certeza o que
mais tarde as famosas tragédias e comédias
será o Teatro daqui a 20 ou 30 anos, mas
gregas, Aristófanes cria a peça satírica. Em
analisando todo o seu percurso é fácil acreditar
Roma o Teatro evolui e surge a pantomima. Com
que enquanto houver um respirar, a Arte Viva irá
o advento do Cristianismo é considerado um
sobreviver.
ritual pagão e as suas representações são extintas, mas paradoxalmente renasce na idade média às mãos de quem o extinguiu, a Igreja Católica. Surgem as peças religiosas nas igrejas e as peças profanas nas praças. O teatro tornase no veículo primordial da propagação das mensagens bíblicas. No séc. XVI as peças religiosas começam em declínio, mas mesmo antes disso o teatro começa a surgir de outras formas, com outros nomes. Nos inícios do séc. XV, em Portugal, nasce Gil Vicente e com ele a
"
Não nos esqueçamos que o teatro se adaptou, evoluiu e renasceu em diversas ocasiões. O teatro vive para o homem, tal como o homem vive para ele, são indissociáveis. Se um dia sucumbirem será sempre às mãos um do outro
dramaturgia. Ao mesmo tempo surgem as trupes teatrais, o chamado teatro “elisabetano”, em Inglaterra. Nesse mesmo género no séc. XVI surgem nomes como Shakespeare, ou o seu
Ator, encenador e Presidente da Direção da
sócio Richard Burbage. No séc. XVII as
Sociedade de Instrução Tavaredense (SIT)
sócia
72 | MAIO 2020
40
VISÕES
VISÕES TEMÁTICAS
UM CENÁRIO PARA O TEATRO AMADOR
PARA A DÉCADA
UM CENÁRIO PARA O TEATRO DE AMADORES J O S É
T E L E S
Escrever sobre uma década, fazer futurologia, é sempre complicado e difícil. Escrever, hoje, em plena pandemia a do Covid19, associada à crise económica que a mesma provoca, a pensar no futuro, torna-se ainda mais complicado e difícil. As Associações, de Teatro de Amadores e as em que no seu seio albergam secções de Teatro, saberão reinventar-se e em consequência reinventar o Teatro. Falamos de estruturas que vivem, sobrevivem, fruto da acção de dirigentes, e elencos artísticos e técnicos, voluntários e benévolos, que em todas as situações sempre encontraram soluções, para as crises do passado. Esta é a certeza e a esperança. Esperança no futuro, nunca nos faltou, os homens e as mulheres do teatro, têm sido ao longo das várias crises históricas a vanguarda de um futuro novo e melhor, assim foi assim o será. A actual crise traz-nos novos desafios, só possíveis de ultrapassar com um melhor e maior apoio. Torna-se cada vez mais premente o cumprimento dos direitos consagrados na Constituição da República Portuguesa em que define quatro garantias fundamentais do associativismo popular (liberdade de associação; participação no processo de democratização da cultura e do desporto; discriminação positiva; e participação das populações na vida administrativa local), que continuam esquecidas ou por concretizar. Neste quadro resulta claro que o Estado deve assumir um outro papel no desenho e promoção das políticas públicas para estas áreas – da cultura, do desporto e do lazer. E fica também evidente a necessidade de uma profunda reforma do quadro legal e institucional aplicável ao associativismo popular. Continuaremos a exigir o cumprimento da
"
Os homens e as mulheres do teatro, têm sido ao longo das várias crises históricas a vanguarda de um futuro novo e melhor, assim foi assim o será
Fica aqui o registo de um texto de Ildefonso Valério, encenador e dramaturgo, escrito em 1999 no contexto de uma outra crise, no entanto de novo actual. “A capacidade de resistência da arte é notável! E particularmente, do teatro. Em condições adversas quase que é capaz de fazer milagres para sobreviver. Se houvesse milagres, é claro. Nos dias de hoje, pôr de pé um espectáculo de teatro com todo trabalho que isso exige (se houver preocupação de qualidade, evidentemente) em regime de puro amadorismo, é quase um acto de heroísmo. Só se explica pela sua enorme capacidade de resistência. Ou será antes teimosia? Miguel Torga, pouco antes de morrer, afirmou numa entrevista que os tempos vão maus para a cultura. É uma afirmação que não se pode, em consciência, desmentir. Mas pior que constatar esse facto, é que aqueles que deviam defender a cultura com unhas e dentes, por vezes não o fazem. E isso é uma má avaliação dos tempos que vamos vivendo. E um erro histórico. Perante o desencanto e a desorientação ideológica que corre pelo mundo, se deixarmos as artes e a cultura se degradarem, tudo vai ser decerto, mais negro e mais doloroso num futuro mais ou menos próximo. Na história da humanidade, os abismos andaram sempre de mãos dadas com a incultura”.
Constituição, e assim no futuro o Teatro será de certeza melhor, cumprindo o seu papel de
Ator, encenador e Presidente da Direção
democratização da cultura.
Federação Portuguesa de Teatro
sócia
73 | MAIO 2020
40
VISÕES
VISÕES TEMÁTICAS
UM CENÁRIO PARA O TEATRO AMADOR
PARA A DÉCADA
AUTENTICIDADE R I C A R D O
S A N T O S
Sem o deslumbramento do conhecimento inicial, esse momento ínfimo de criação, de um mundo novo que fermenta e alenta as novas manhãs, o teatro não fará sentido. O espetador cada vez mais exigente, progénie da (feliz e desassossegada) literacia cultural, reclama arte, entendida como a expressão das emoções, bela e inquieta. Já não quererá, a não ser em dimensões de fé ou de tradição comunitária, o
"
E é este o desafio do teatro na próxima década: recuperar um público, ávido de sentir, que se inquiete, que se conforte, que se ria, com a autenticidade de um beijo ou de uma morte em palco
teatro engraçado que se faz da mera carolice (naturalmente meritória) de uns poucos. Aliás, esta dimensão meramente recreativa do teatro, naturalmente laudável, praticada por alguns grupos de teatro da região, e que ganhou força a partir da década de oitenta do século passado, é (triste) resultado do desinvestimento
amador e o teatro amador deve-lhe esse esforço. Porque, afinal, a única diferença entre o teatro de amadores e o teatro de profissionais é o dinheiro. A paixão, a entrega, a genuinidade, a criatividade, a sedução, essas, têm de ser as mesmas.
sistémico na cultura, da hegemonia da televisão e da aposta num modelo educativo que privilegia o empinanço ao pensamento crítico. Convém aqui lembrar que na Figueira da Foz, em muitas das coletividades espalhadas pelo concelho, já se representaram os mais clássicos e eruditos dos dramaturgos. A avidez do conhecimento dessas mulheres e homens do teatro de então, muitos dos quais sem qualquer formação académica, aliada a técnicas e
Não falo no teatro de conceito mais experimental, ainda que seja absolutamente necessário explorar novas formas de experienciar os palcos e a relação com o público, mas tão somente de produções teatrais assentes em bons textos, clássicos ou contemporâneos, que possam servir o entretenimento sem descurar a inquietação dos sentidos.
soluções vanguardistas de grande impacto cénico, fruto da entrega de mestres e aprendizes de vários ofícios, respondiam pelos assinaláveis êxitos dos grupos de teatro amador.
Aos encenadores exige-se que leiam teatro, que leiam muito. Aos dirigentes que invistam no suporte técnico dos espetáculos. Aos amadores que amem. E ao público que nunca deixe a alma em casa.
Recuperar a essência do teatro é uma provocação inadiável. “Dar a sentir” e não
Em 2030, encontrar-nos-emos no teatro.
apenas “dar a ver”.
A formação dos agentes tem de ser a aposta. Até porque, sabemos, a qualidade traz público. E é este o desafio do teatro na próxima década: recuperar um público, ávido de sentir, que se inquiete, que se conforte, que se ria, com a
Ator e encenador
autenticidade de um beijo ou de uma morte em
Sócio fundador do
palco. O público quer a verdade do teatro
sócia
74 | MAIO 2020
Pateo das Galinhas - Grupo Experimental de Teatro da Figueira da Foz
40
VISÕES
VISÕES TEMÁTICAS
UMA VISÃO SOBRE O FOLCLORE
PARA A DÉCADA
O FOLCLORE E O SEU FUTURO A D R I A N A
M A I A
Folclore, uma das artes representativas dos nossos antepassados, uma revivência dos trajes, das danças, das músicas, dos modos, dos hábitos, dos nossos pais, avós e bisavós.
Nos tempos que correm, é muito difícil manter o Folclore vivo! Os jovens de hoje, não se interessam pelas nossas tradições e costumes, acham que é ‘mau aspeto’ e ‘foleiro’! Mas será culpa deles?? Certamente que não! Tudo nos é incutido desde pequenos. Se os pais, esses sim, que na maioria dos casos ainda vivenciaram algumas das tradições, junto dos seus avós e de seus pais, tivessem orgulho das suas raízes,
"
Não se consegue manter um grupo sem componentes e muito menos sem apoios dos nossos governantes. Ninguém dá valor ao trabalho que se faz nos Ranchos Folclóricos, ao suor de todos que ainda resistem e continuam sem receber algum tipo de remuneração
teriam todo o orgulho em dar continuidade e fariam com que seus filhos aprendessem e gostassem do que é a alma de ser português. Hoje dá-se mais valor e importância à cultura e às tradições dos outros países, tal como o samba, que lamentavelmente passou a fazer parte dos nossos hábitos e que até chegam a ter mais ajudas e suporte para se manterem.
Como diretora do Rancho das Cantarinhas de Buarcos e já com cerca de 28 anos como componente do mesmo, vejo e sinto muito sinceramente, um futuro muito negro para o folclore! Não se consegue manter um grupo sem componentes e muito menos sem apoios dos nossos governantes. Ninguém dá valor ao trabalho que se faz nos Ranchos Folclóricos, ao suor de todos que ainda resistem e continuam sem receber algum tipo de remuneração, e que continuam porque dá prazer e nos enche de orgulho dançar, cantar e tocar, ainda, por esses palcos fora! O Folclore está em desuso e até me atrevo a dizer que está em vias de extinção. A continuar assim, muitos Ranchos acabarão por não resistir e irão mesmo extinguir-se, o que é de lamentar!
Temos de ser persistentes e tudo fazer para que o Folclore não acabe! Dirigente associativa
Viva o Folclore Português!
sócia
75 | MAIO 2020
Rancho das Cantarinhas de Buarcos
40
VISÕES TEMÁTICAS
UMA VISÃO SOBRE O FOLCLORE
VISÕES
PARA A DÉCADA
A AFIRMAÇÃO DAS IDENTIDADES LOCAIS NA ATUALIDADE D A N I E L
C A L A D O
C A F É
O folclore e a etnografia ocupam um lugar de
tecido social de uma comunidade, pois é comum
destaque no movimento associativo português
a todos e todos se reveem equitativamente na
assumindo um papel importante no processo de
sua essência.
desenvolvimento social local. É um dos setores
A UNESCO desempenha um papel de grande
mais expressivos das associações culturais,
relevo na afirmação do património cultural
estimando-se o envolvimento aproximado de
estabelecendo mecanismos da valorização e
100,000 portugueses. Torna-se evidente que se
promoção das culturas das comunidades,
trata de um campo cultural de inegável impacto
regiões, países, atribuindo-lhes o selo de
junto dos portugueses.
“comum a toda a humanidade” despertando a
Portugal é um caso isolado quanto ao folclore
sociedade para as questões da cultura
dado o trajeto histórico-político e a localização
tradicional e popular nacional, despoletando
geográfica nacional contribuindo para preservar
candidaturas de muitos aspetos da tradição
a cultura das populações, mantendo quase
popular a Património Cultural da Humanidade,
intactos, no mundo maioritariamente rural do
contribuindo para um rejuvenescimento nos
país, muitos dos modos de vida ancestrais,
participantes, cada vez mais qualificados, nos
memórias, práticas sociais e elementos
grupos de folclore, aprendendo os princípios de
patrimoniais até ao 25 de abril. O país
tolerância e aceitação fraterna entre todos e
funcionou como “cápsula do tempo” trazendo
dos valores e memórias coletivas enquanto
até ao último quartel do século XX muito do seu
fatores contributivos para o desenvolvimento
ADN enquanto gente lusa, conservando a
civilizacional da humanidade.
tradição e o seu património identitário.
Transpor esses princípios para uma prática
Será esta presença na memória de muitos
social salutar e participada, explorar os
cidadãos de um modo de vida salutar,
elementos constituintes da nossa matriz
partilhado em comunidade, revestido de
identitária local a favor de uma participação
sentimento e de uma mundivisão tão diversa da
democrática das comunidades locais é
sociedade de informação pós-moderna,
contribuir para esse processo de crescimento
descaracterizada, que leva muitos portugueses
enquanto civilização que procura uma
a reverem-se nas tradições, na dança, no canto,
coexistência humana fraterna, duradoira,
no trajar tão próprio de um país que possui
consciente e inclusiva.
traços identitários marcados e tão interessantes
O reconhecimento da FFP enquanto ONG pela
no contexto mundial. Somos, de facto, um caso
UNESCO foi uma conquista no reconhecimento
de estudo no campo da antropologia social das
do valor que o nosso património cultural assume
comunidades. A composição da tipologia dos
hoje assim como o esforço de tantas gerações
folcloristas portugueses contempla um espetro
de portugueses no processo de estudo,
amplo e variado de cidadãos quanto ao género,
salvaguarda e divulgação do nosso património
extrato social, idade e formação académica
cultural.
tornando este setor associativo no mais
Este será um dos caminhos da valorização deste
abrangente, heterogéneo e inclusivo do
precioso campo da nossa identidade que
movimento associativo português juntando, no
constitui uma pérola mundial no conjunto das
mesmo projeto comunitário, todos os setores da
tradições populares da humanidade.
comunidade local. Tal apenas se torna possível por se trabalhar um elemento de grande poder mobilizador: a identidade local. Este é um fator
Presidente da Direção da
determinante, homogeneizador, aglutinador do
Federação do Folclore Português (FFP)
sócio
76 | MAIO 2020
40
VISÕES TEMÁTICAS
UMA VISÃO SOBRE O DESPORTO ASSOCIATIVO
VISÕES
PARA A DÉCADA
O ASSOCIATIVISMO E O DESPORTO A N A
L Ú C I A
R O L O
O Associativismo é um instrumento que permite satisfazer necessidades coletivas ou alcançar objetivos comuns com base numa organização voluntária de pessoas. Sendo o associativismo desportivo um dos seus pilares, uma vez que são, praticamente, os Clubes e/ou Associações os responsáveis pelo desenvolvimento da prática desportiva.
A participação associativa ajuda a desenvolver muitas capacidades, para além da nossa vida comum, sendo uma forma de crescimento enquanto pessoa. No entanto é cada vez mais
"
todos devemos fazer um esforço e empenhar-nos nesta causa nobre que é o Associativismo e mais concretamente o Associativismo Desportivo e incentivar os nossos jovens à prática desportiva como forma de hábito saudável em todos os aspetos.
difícil encontrar pessoas disponíveis para abraçar esta causa, devido às nossas próprias vidas e também por se tratar de um “trabalho” intenso, por vezes desgastante e incompreendido…
Também o próprio desporto está a sofrer uma mudança, entre desporto e/ou prestação de serviços. Continuamos a ter os atletas que praticam desporto com gosto e afinco, mas cada vez mais existem os atletas que praticam desporto como ocupação de tempos livres ou simplesmente para terem alguma atividade física.
Todas estas mudanças deixam-nos a pensar se é isto que queremos e qual será o nosso futuro?
Penso que todos devemos fazer um esforço e empenhar-nos nesta causa nobre que é o Associativismo e mais concretamente o Associativismo Desportivo e incentivar os nossos jovens à prática desportiva como forma de
Presidente da Direção
hábito saudável em todos os aspetos.
Ginásio Clube Figueirense
sócia
77 | MAIO 2020
40
VISÕES TEMÁTICAS
UMA VISÃO SOBRE O DESPORTO ASSOCIATIVO
VISÕES
PARA A DÉCADA
O DESPORTO ASSOCIATIVO H O R Á C I O
A N T U N E S
O Associativismo sempre foi um ato natural nas
têm hoje um papel determinante de definição das
nossas aldeias, vilas e cidades.
prioridades para a sua ação em prol do bem estar,
Desde tempos distantes todos temos exemplos, bem
progresso e condição de vida das populações, onde
visíveis, das ligações humanas, sociais, comerciais,
o turismo, a cultura e o desporto se assumem cada
industriais, educativas, culturais, musicais e
vez mais como pontos fundamentais das atividades
desportivas.
das câmaras e juntas de freguesia.
O homem desde muito cedo teve necessidade de se
Os pelouros da cultura, turismo e desporto passaram
juntar, de se associar e consoante as finalidades e
a ter importância crescente apoiando a atividade
objetivos reunir-se para os concretizar.
das coletividades.
Temos hoje de forma muito forte um associativismo
Assim, a dinamização da prática do Desporto, numa
bem vivo em muitos dos nossos centros habitacionais
perspetiva de ocupação de tempos, livre, de
e por via disso poderemos dizer que temos no nosso
desporto amador, passou a ter um lugar cada vez
distrito concelhos riquíssimos em associativismo
mais importante na atividade dos eleitos locais.
social, cultura e desportivo, fundamentalmente.
Os pelouros da cultura, turismo ou desporto
Não posso deixar de mencionar associações ou
passaram a pelouros de maior importância e
coletividades centenárias que sempre se dedicaram
dinamismo não só construindo parques e
à música, ao teatro, à instrução, ao
equipamentos desportivos e fomentando também a
recreio e também ao desporto.
prática do desporto.
O Concelho da Figueira da Foz é, certamente, um
Os índices de participação desportiva da população
dos mais ricos não só a nível distrital, mas também a
estão ainda muito longe de ser satisfatórios.
nível nacional.
Não poderemos esquecer que a situação desportiva
Felizmente estive em muitas dessas agremiações e
tem de ser analisada em conjunto com os restantes
com elas troquei momentos muito exaltantes e
setores da sociedade e que sobre ela tem um
enriquecedores de grande valor artístico e cultural.
enorme peso a situação económica do país.
Essas associações continuam bem vivas e a trabalhar
As autarquias serão decisivas para podemos
prosseguindo os seus objetivos e seguindo os seus
melhorar os nossos índices de participação
estatutos relembrando e enaltecendo muitos dos
desportiva da população e, bem assim, no
seus antecessores que deixaram obra valiosa durante
desenvolvimento progressivo dos nossos clubes
a sua passagem de participantes interessados ou
desportivos.
dirigentes devotados.
Tem sido nossa preocupação estabelecer relações,
O caminho percorrido é já longo, mas gente nova
não apenas com os clubes, mas, também com as
aparecerá para prosseguir o desempenho das suas
escolas e, fundamentalmente, com as autarquias.
atividades e o desenvolvimento da sua coletividade
Muito se progrediu já, ao nível das infraestruturas
porque o associativismo cultural, recreativo,
desportivas, campos de futebol, pavilhões, relvados
educativo ou desportivo há-de continuar sempre
sintéticos, mas é preciso também melhorar os
forte e lutando continuamente para fazer mais e
espaços de treino e os balneários tendo em vista o
melhor.
universo de atletas e os requisitos necessários e,
Os dias de hoje não são muito animadores.
obrigatórios, dos índices de salubridade e saúde
A sociedade vive mais os seus ambientes restritos e
pública.
familiares, acentuados agora por esta coisa nova do
Os clubes, por si só, não têm condições económicas
confinamento.
e dependem, cada vez mais, das autarquias locais e
Mas dias melhores virão, certamente.
estas vão respondendo sempre com prontidão, mas
As associações, os seus sócios, os seus empenhados
nem sempre conseguindo dar cobertura a todos os
dirigentes continuarão a trabalhar para chamar o
pedidos e solicitações.
povo, os cidadãos que ao seu lado vivem e vão de
Estou certo e esperançado que todos, em conjunto,
novo levá-los ao convívio e associá-los aos seus
conseguiremos continuar o espírito associativo dos
objetivos de fortalecer o seu associativismo.
que nos antecederam e projetar novos caminhos
As autarquias terão também uma palavra a dizer
para melhorar os índices de participação desportiva
porque a Constituição da República Portuguesa
dos nossos jovens.
afirma que todos terão direito à educação, à
Contamos com todos, dirigentes, atletas, familiares e
cultura, ao desporto, que incumbe ao Estado, em
eleitos locais para que o nosso associativismo
colaboração com as escolas, as associações e as
desportivo seja cada vez mais forte, empreendedor e
coletividades sem esquecer que as autarquias locais
dinâmico.
Presidente da Direção da
sócia
78 | MAIO 2020
Associação de Futebol de Coimbra
40
VISÕES
VISÕES TEMÁTICAS
UMA VISÃO SOBRE O DESPORTO ASSOCIATIVO
PARA A DÉCADA
TUDO BONS RAPAZES R U I
F E I J Ã O
O Desporto, enquanto prática organizada,
falta de tempo, esse precioso momento do qual
implica procedimentos que necessitam do
não abdicamos?? Não me parece. Acredito que
envolvimento de gente, muita gente. É esta
haja aqui também uma certa descrença no
gente que, com enorme determinação e de uma
trabalho em equipa. E é aqui, no trabalho em
forma entusiasta e desinteressada, procura
equipa, que está a chave para o nosso sucesso,
encontrar soluções para fazer despertar as
pelo compromisso, pelo espírito competitivo, de
populações envolventes ao seu âmbito de
equipa ganhadora, motivada para o trabalho e
intervenção, e as motivar para a dinamização
desta forma fazer a diferença.
de projetos de carácter desportivo. Envolvem-se
É urgente nos darmos mais aos outros. Não nos
os sócios, os filhos destes, os seus familiares e
esqueçamos que o Homem é um ser
amigos e outros que, na procura do conforto
eminentemente social, daí a importância de
emocional, bem-estar físico e convívio social,
vermos cumprida esta premissa. É urgente
aceitam o repto. Mas, rapidamente se constata
mudarmos a nossa forma de estar na vida. É
que as pessoas que a associação conseguiu
urgente pensarmos em grande e no que o nosso
cativar são manifestamente insuficientes face
pequeno contributo pode fazer para
às exigências do desporto, seja federado ou,
engrandecer espaços de cultura desportiva. É
meramente recreativo.
urgente ajudarmos a ajudar. O desporto
Precisamos de gente que lidere projetos, que
associativo só consegue singrar se houver o
planeie, que coordene, e que, de uma forma
envolvimento das pessoas, se nos unirmos num
exemplar, indique os caminhos a seguir. Mas,
só pensamento de grande determinação, e
mais importante que tudo o que se referiu
altruísmo. Não basta acreditar na mudança.
anteriormente, as associações precisam de
Temos de fazer mais, além de acreditarmos.
gente que arregace as mangas e que trabalhe,
Temos de dar um passo em frente e,
que faça acontecer. Esta é maior dificuldade
trabalhando como uma equipa coesa, motivada
que o desporto associativo tem de enfrentar. Os
e determinada, podemos efetivamente fazer a
projetos desportivos podem ser ambiciosos,
diferença. Este é o caminho, o único caminho.
podem ser mobilizadores, mas com as
Arregacemos as mangas!
dificuldades inerentes à sustentabilidade económica dos mesmos, por escassez de receitas, há que reinventar soluções efetivas para mobilizar as pessoas e gerar proveitos. O desporto associativo depara-se com enormes desafios. Diria mesmo que serão tanto maiores quanto a nossa dificuldade em mudar comportamentos sociais. Estes desafios assentam, essencialmente, na incapacidade que o ser humano manifesta, nos dias que passam a voar, em se dar ao outro. Deixamos de ter
"
O desporto associativo só consegue singrar se houver o envolvimento das pessoas, se nos unirmos num só pensamento de grande determinação e altruísmo
tempo para o darmos aos outros, demonstrando um egoísmo desajustado ao progresso das instituições. Deixámos de nos envolver na dinâmica interna das associações. Será pela
sócia
79 | MAIO 2020
Professor de Educação Física e Treinador de Futsal
Clube Recreativo Instrução Alhadense (CRIA)
GRANDE ENTREVISTA
VEREADOR
MIGUEL PEREIRA "Mantenho o desejo de fazer da Figueira a capital do tecido associativo"
sรณcia
80 | MAIO 2020
MIGUEL PEREIRA Considera-se uma "
pessoa desassossegada ",
habituado a liderar equipas. Agregar e motivar são conceitos
de uso diário e não tem pejo de afirmar que o associativismo no concelho poderia ter "
outro peso político ".
A entrevista, feita por videoconferência a 8 de maio, é naturalmente pautada pelos efeitos da COVID-19. As incertezas do desconfinamento não impediram, contudo, Miguel Pereira de desvendar as suas propostas para o novo Regulamento Municipal de Apoio à Atividade Regular, que deverá entrar em vigor já em 2021. Questionámos sobre os apoios às coletividades. Sobre o Leslie, a cultura e as sessões solenes. Sobre o Sítio das Artes e as Festas da Cidade. O vereador que, no final do mandato, gostaria de ser recordado como um
companheiro de armas ", gama ". "
não tem dúvidas quanto às potencialidades do pelouro: "
Recuemos a outubro de 2017. Lembra-se da sua primeira reação quando soube que o Dr. João Ataíde lhe ia confiar o pelouro das coletividades?
é uma moto topo de
estendido o convite para liderar a
trabalho meritório de conjugação
associação de comerciantes de
e de agregação das diversas
Montemor-o-Velho. A associação
coletividades. Achei que poderia
não tinha fundos e acabámos por
ser mais uma peça para fazer
desenvolver uma série de
essa interligação e ajudar a
A primeira reação foi de desafio.
iniciativas, desde a organização
estabelecer algumas regras. A
Abracei o pelouro sabendo que o
do Santo António, à emissão de
minha principal missão é a de
concelho da Figueira da Foz tem a
rifas, entre outros eventos, para
juntar todas as partes para que
quantidade de coletividades que
arranjar sustento. Nesse momento,
todos, em conjunto, possamos
tem, que era uma tarefa árdua.
percebi o quão difícil era estar no
pensar o associativismo. Tem sido
Com alguma preocupação, mas
associativismo, o quão difícil era
essa a estratégia até hoje.
essencialmente como um grande
conseguir ter receitas para se
desafio. O desafio do contacto
poder fazer algo em prol da
com as pessoas, com as
comunidade. A partir desse
associações, na expetativa de
momento, acabei por me integrar
A pergunta é inevitável: há coletividades a mais no concelho da Figueira da Foz?
poder colocar ao serviço das
em órgãos sociais de algumas
Não, não há coletividades a mais.
coletividades uma parte da minha
associações, como o Grupo
Diria que há coletividades que
experiência associativa.
Juvenil de São Tomé e a
precisam de uma especialização
Associação Cultural, Recreativa e
maior. Isto é, muitas vezes o
Desportiva de Ferreira-a-Nova.
grande problema dos órgãos
Estive também ligado a uma
sociais é terem demasiadas
Apenas na qualidade de dirigente
associação em Liceia [concelho
expetativas e depois, no terreno,
associativo. O meu primeiro
de Montemor-o-Velho] e ao
verificam que é difícil fazer tudo.
contacto com o associativismo
CACTO [Centro de Assistência e
As coletividades, seja a nível
reporta a 2001. Nesse ano, vivia em
Cultura] no Tojeiro. Acabei por
nacional ou na Figueira da Foz,
Montemor-o-Velho, e, em termos
ganhar o bichinho do
são muitas vezes a única ligação
profissionais, fui confrontado com
associativismo.
social e cultural que existe nas
À data, que tipo de relação mantinha com o associativismo?
o desafio de assegurar o primeiro
pequenas povoações. A Figueira
do tecido associativo mais ligado
Depois de se inteirar da pasta, a realidade associativa que encontrou surpreendeu-o?
ao comércio e à indústria. As
Muitíssimo. Há duas situações que
não, não há. Há efetivamente
cheias de 2001 trouxeram a
me surpreenderam imenso.
necessidade de as integrar em
Montemor-o-Velho uma carga de
Primeiro, não tinha a noção da
objetivos comuns.
problemas. Ficou tudo submerso e,
imensidão e diversidade de
depois, foi necessário reabilitar o
associações que existiam e não
pequeno comércio do concelho. O
tinha a noção da quantidade de
IAPMEI, na altura, foi exemplar.
produtos culturais que, no seu
Através da minha ligação
todo, o associativismo da Figueira
profissional, tivemos de, no prazo
conseguia realizar. Foi mais um
de uma semana, colocar dinheiro
desafio, mais um salto em frente.
na bolsa das pessoas que
Se até essa altura andava de
precisavam. Foi preciso aprovar
triciclo, agora tinha uma mota
empréstimos, falar com as
topo de gama. Segunda situação:
sociedades de garantia mútua,
a tomada de consciência de que
com as pessoas e desenhar um
não existia um pensamento
plano de fácil agilização. Depois
coletivo. Passei a trabalhar mais
desse enorme desafio, felizmente
com a Associação das
superado com sucesso, foi-me
Colectividades e percebi que
plano de mitigação de risco e o primeiro plano de desenvolvimento
tem 220 povoações, logo até 220 coletividades é um número aceitável. Portanto, a resposta é
"A Figueira tem 220 povoações, logo até 220 coletividades é um número aceitável."
esta entidade estava a fazer um
sócia
81 | MAIO 2020
Entretanto optou por ficar a meio tempo. Considerando os pelouros que tem, é o tempo suficiente?
resiliência e motivação. Permitiria que as normas e a estratégia fossem pensadas em conjunto. Considero que hoje, em termos de
É insuficientemente o tempo
vereação, tentamos fazer esse
suficiente. Por vezes, é difícil e
diálogo, mas ainda existe alguma,
penitencio-me porque devia
por assim dizer, desagregação
telefonar mais [aos dirigentes
entre os diversos pelouros.
associativos], mas continuo a
Estamos a falar de ritmos
exercer a minha atividade
diferentes, serviços diferentes,
profissional. Qualquer indivíduo
que funcionam de formas
que aceite um cargo público
diferentes. Sou apologista da
nunca poderá ter a veleidade de
estrutura e defendo que o
conseguir fazer tudo, de
associativismo deveria estar sob
conseguir controlar tudo. Quando
um grande pelouro, até porque, se
conseguimos reunir equipas e
assim fosse, teria, no nosso
manter um diálogo constante com
concelho e em termos
as pessoas e com as instituições,
transversais, outro peso político.
tudo se torna muito mais fácil. É
E depois temos de ter a
Relativamente ao Sítio das Artes, que a Câmara Municipal protocolou com o IEFP, já há solução para as associações ali instaladas e que vão ter de abandonar o espaço?
capacidade de aceitar.
Essa matéria está a ser
Felizmente, os inputs por parte
acompanhada pela Senhora Vice-
das associações e das pessoas
presidente, que tem o pelouro do
que estão no associativismo há
património e que já apresentou
muitos anos têm contribuído de
algumas soluções às entidades.
forma decisiva para este processo
Não há espaços municipais. O
de aprendizagem. Temos bons
caminho poderá passar pela
líderes associativos que me
integração de algumas
facilitam o contacto com o
associações em espaços de
associativismo. O diálogo tem
outras associações, que têm muita
sido profícuo e a mensagem
área disponível. Em caso de
passa com alguma facilidade, sem
reintegração, a Câmara Municipal
ruídos na comunicação.
está disponível para financiar
um processo de aprendizagem permanente. Temos de fazer alguma tábua rasa daquilo que conhecemos e das formatações que adquirimos ao longo da vida.
Há quem defenda que a ação cultural e desportiva, por um lado, e a relevância da dimensão identitária das coletividades para o setor do turismo, por outro, justificariam que os pelouros da cultura, do desporto e do turismo fossem entregues a um mesmo vereador. Concorda com esta visão? Concordo. Respondo com uma frase: “o todo é mais do que a mera soma das partes”. Podemos ter todos os componentes de um motor e não nos servirem para nada, porque não estão interligados ou porque não estão à maneira de funcionar. Esses pelouros, em conjunto, funcionariam de uma forma mais eficiente. E eficiência para as coletividades, muitas vezes, traduz-se na sua capacidade de
sócia
82 | MAIO 2020
essa ação com um subsídio de reintegração ou subsídio de renda, conforme lhe queiram chamar. Considero que esta agregação trará pessoas a muitos edifícios que, neste momento, estão praticamente vazios. Há associações que diminuíram a atividade e esta situação pode ser uma lufada de ar fresco e, ao mesmo tempo, soluciona o problema da falta de espaços municipais.
"O associativismo deveria estar sob um grande pelouro, até porque (...) teria outro peso político"
Miguel Pereira: bancário, empresário agrícola e político
Apoio às coletividades: "continua a ser nefastamente pouco"
Instituto Politécnico de Leiria, e,
Sabemos que o desporto tem um orçamento e um vereador próprio, pelo que, em relação ao associativismo cultural, que verba tem para gerir?
mais tarde, a Licenciatura em
Neste momento, existem as verbas
justiça nas coletividades que têm
Gestão no ISCAC. É desde 1996
diretamente afetas à atividade
mais alguma dimensão. Se a
funcionário bancário, tendo
regular, que estão caraterizadas
média dos
desempenhado as mais diversas
em termos de regulamento, mas
significativamente baixa para 50%
funções na área técnica e
também gravitam muitos
das coletividades, para as
comercial. Empreendedor, iniciou
protocolos efetuados com as mais
restantes 50%, face à sua
uma atividade agrícola, em 2008,
diversas instituições que não
atividade normal, é um valor justo.
focada em produtos hortícolas
estão aí plasmados, isto é, muitos
Temos a plena consciência,
emergentes
deles não estão sob o pelouro das
conforme já referi, de que as
orientados para o mercado
coletividades. Foram sendo feitos
coletividades também têm um
internacional. É, desde 2016,
ao longo dos anos, um pouco
papel social importante. São o
Diretor do Sindicato dos
enviesados – protocolos que não
primeiro local de desenvolvimento
Bancários do Centro. Integrou os
contesto, nem questiono –, mas
da consciência coletiva e evitam
órgãos sociais de associações
que está na altura de os reunir
o isolamento. É bom que as
comerciais, desportivas, culturais
num único bolo, num único
pessoas conversem, que estejam
e recreativas. Militante do Partido
regulamento, que seja
juntas, que joguem jogos
Socialista, foi membro da
absolutamente transparente para
recreativos e que criem hábitos
Assembleia de Freguesia de
todos. O bolo que existe para as
que têm a ver com a própria
Ferreira-a-Nova, deputado
coletividades, neste ano, em
natureza humana. O que quero
municipal e eleito vereador da
termos de apoio regular, é de
sublinhar é que os valores
Natural da Figueira da Foz, 46 anos, casado e pai de dois filhos. Frequentou a Licenciatura de Gestão Comercial e Marketing, no
e diferenciados,
identificadas e hierarquizadas. Ou seja, rapidamente os
€ 75.000,00 se transformam em € 150.000,00. Atualmente, esta é
a
única forma de colocar alguma
€ 1.070,00
é
Câmara Municipal da Figueira da
€ 75.000,00.
Foz, na sequência das eleições
de somar mais
autárquicas de 2017, no Executivo
protocolo com as filarmónicas,
coletividades que apresentam
liderado por João Ataíde,
mais
uma maior atividade. Portanto,
entretanto falecido. Atualmente,
coros e mais alguns protocolos, o
diretamente a média está bem
sob a presidência de Carlos
que somado resultará numa verba
feita, mas indiretamente não.
Monteiro, mantém competências
na ordem dos
Reconheço, ainda assim, que
delegadas nos pelouros das
entanto, como já expliquei, esta
continua a ser nefastamente
Coletividades e Serviço
verba não está toda sob a tutela
pouco o valor que é atribuído às
Veterinário Municipal e coadjuva
do pelouro das coletividades.
coletividades. Tenho a expetativa
o presidente nas áreas da Proteção Civil, Bombeiros e Gabinete Técnico Florestal.
A este valor teremos
€ 50.000,00
€ 10.000,00
do
repartidos um pouco mais pelas
do protocolo com
€ 250.000,00.
apresentados acabam por ser
No
De acordo com o orçamento municipal para 2020 e conforme já referiu, o montante global para o apoio regular é de cerca de € 75.000,00 para um universo, em média, de 70 candidaturas. Esta equação resulta num valor médio de € 1.070,00 por coletividade/ano. Que comentário lhe merece este número?
de poder aumentar o pacote atual em mais 50% a 70%, já em 2021. Se no próximo ano refizer os cálculos, considerando todos os valores que referi, espero que a
€ 1.070,00, € 1.500,00.
média já não seja de mas, sim, de
Vamos então alterar a média com os mesmos valores? Não, não é verdade…
Convém referir, complementando a minha resposta anterior, que aos
€ 75.000,00
do apoio regular
se juntam, a título de exemplo, mais
€ 30.000,00
de apoio em
transporte anual, mais a
€ 7.000,00
internacionais, mais
€ 5.000,00
€ 6.000,00
de apoio a viagens
€ 4.000,00
a
de apoio a edições e
ainda cerca de
€
25.000,00 por
ano para pequenas obras de
"Tenho a expetativa de poder aumentar o pacote atual em mais 50% a 70% já no próximo ano"
máxima urgência, devidamente
sócia
83 | MAIO 2020
Se vamos integrar, no apoio regular os protocolos avulsos, o valor é o mesmo, apenas distribuído de forma diferente…
Será uma aposta que o Executivo definirá anualmente…
Não, não vamos integrar. O meu
redistribuído, com a garantia de
grande objetivo é que a atividade
que os valores que, neste
regular tenha a mesma dotação
momento, estão protocolados
que têm as IPSS e que tem o
estão devidamente
desporto, ou seja
salvaguardados.
€
120.000,00
por ano como pacote base. Todos
Exatamente. Existirá um valor global que depois poderá ser
inseridos com os valores atuais e
Quando é que o novo regulamento estará pronto?
irão somar a este mesmo valor.
Antes do final do ano, para
Em termos de planeamento do
iniciarmos 2021 com o novo
novo regulamento, vamos ter
regulamento. O objetivo é durante
diversas áreas de cabimentação,
o mês de maio submetermos o
às quais todos os anos vai ser
documento à apreciação da
atribuído um valor. Vamos ter os
Associação das Colectividades e
os outros protocolos serão
€ 50.000,00 para as filarmónicas, os € 10.000,00 para os coros, os € 30.000,00 do apoio aos transportes e, onde estão
€ 75.000,00 hoje, nós teremos € 120.000,00, ou, pelo menos, € 110.000,00. Gostaria também
das coletividades para que se possam pronunciar. Após recebermos as indicações, que iremos, tanto quanto possível, tentar plasmar no regulamento, iremos levar o documento à
junho, já gostaria que o
que está nos
documento estivesse em discussão
subir para
pública, o que acontecerá
15.000,00. O objetivo é conseguir
durante 30 dias. No final desse
que no próximo ano - que vai ser
período, recolhidas as propostas
um ano extremamente difícil -,
que, entretanto, nos chegarem,
tenhamos mais entre
apresentaremos a versão final em
a
€ 45.000,00,
€ 40.000,00
em termos globais,
"Outra possibilidade que se abre com o novo regulamento é podermos, no início de cada ano, definir qual vai ser a nossa aposta cultural"
reunião de Câmara e, no final de
que o apoio para obras urgentes,
€ 5.000,00, pudesse os € 10.000,00/ €
"O objetivo é conseguir que no próximo ano tenhamos mais entre €40.000,00 a €45.000,00, em termos globais, de dinheiro novo para as coletividades"
reunião de Câmara para depois
de dinheiro novo paras as
ser submetida à Assembleia
coletividades. Com uma ressalva:
Municipal. O ideal era que o
provavelmente as coletividades
regulamento fosse aprovado na
que mantiverem a sua atividade
sessão de setembro. Não sendo
social, com aquilo que eu
possível, na pior das hipóteses, irá
considero a política da porta
à Assembleia de dezembro.
aberta, da solidariedade, irão manter valores muito similares aos anos anteriores. As coletividades que têm uma atividade mais abrangente irão ser altamente beneficiadas em relação à média referida. Outra possibilidade que se abre com o novo regulamento é podermos, no início de cada ano, definir qual vai ser a nossa aposta cultural. Se for no teatro, que com o presente regulamento, em termos de pontuação, deverá ter um apoio que anda entre os
€ 7.000,00
a
€ 8.000,00,
o reforço
será na dotação do teatro. Se for na etnografia, o reforço será na dotação da etnografia…
sócia
84 | MAIO 2020
"O meu grande objetivo é que a atividade regular tenha a mesma dotação que têm as IPSS e que tem o desporto, ou seja € 120.000,00 por ano"
Do Leslie à COVID-19: "são muitas dores" e muitos "azares" Relativamente ao Leslie, qual é o ponto da situação do pagamento às coletividades?
os apoios atribuídos são os apoios
(Risos) São dores a mais e eu que
justos. Passados 1 ano e 3 meses,
o diga enquanto vereador. Não
ainda existiram tentativas de
tem sido fácil. E ainda se
É diverso. Todas as coletividades
[coletividades que tentaram]
esqueceu de um pormenor: antes
que atempadamente
meter processos do Leslie, que
do Leslie, foram os incêndios.
apresentaram faturas já
foram travadas. Evoco aqui o meu
Foram incêndios, foi o Leslie e
receberam. Das 32 coletividades
Presidente da Câmara à época, o
agora a COVID-19. Isto faz-me
que pediram apoio há 30% com
Dr. João Ataíde, que me deu toda
pensar muito sobre a minha
processos completamente
a liberdade, que me apresentou
posição enquanto eleito: se não
encerrados. Acredito que durante
todos os Secretários de Estado
serei eu que terei trazido todos
os próximos meses haverá mais
responsáveis, para que
estes azares.
30% que também verão os seus
conseguíssemos em tempo útil
processos encerrados. Ainda hoje
avançar com o processo. A
[8 de maio], despachei mais uma
própria CCDRC, quando há cerca
proposta de seguro. É importante
de 8 ou 9 meses, veio fazer
referir que este processo do Leslie
algumas vistorias no pressuposto
Quando vão ser pagas as verbas do apoio regular e que foram antecipadas por causa da COVID-19?
veio colmatar uma falha que
de que os processos não estavam
Os cabimentos estão feitos, o
existia no passado e que se
organizados, concluiu que os
despacho está feito, as verbas já
prende com a obrigatoriedade da
processos estavam devidamente
deveriam ter sido pagas. Estamos
edificação ter seguro. Não
organizados, não tendo feito
apenas dependentes das questões
poderemos voltar a correr o risco
qualquer tipo de reparo. É este o
burocráticas.
que tínhamos. Estruturámos as
pequeno orgulho que posso tirar
coletividades a esse nível. Depois
deste desafio. Motiva-me saber
30% a 40% dos processos que
que fizemos as coisas bem feitas.
ficaram por fechar nesta fase
Já há coletividades que estão neste momento com algumas dificuldades de subsistência. O Município está disponível para reforçar os apoios em situações limite?
perante construções
Qual foi ou será o montante total financiado às coletividades que recorreram ao apoio municipal? € 880.000,00 de apoio direto. A
completamente desorganizadas,
Câmara Municipal irá ser
avaliação que teremos de efetuar,
que foram apoiadas com dinheiros
ressarcida de uma parte, mas
caso a caso, para que, em
públicos - algumas há muitos anos
ainda não há uma perspetiva de
situações limite devidamente
e outras há menos anos - e sobre
quando é que isso vai acontecer.
identificadas, possamos vir a
as quais não havia a garantia de
A nossa grande preocupação foi
fazer um apoio extra. A minha
que a edificação estivesse
assegurar às coletividades os
filosofia sempre foi e sempre será:
legalizada. O pressuposto
meios financeiros suficientes e
em vez de dar o peixe, dar uma
principal dos processos do Leslie
justos para rapidamente
cana e ensinar a pescar. A
foi o de que todos os apoios
resolverem a sua situação. Os
proposta que está em cima da
financeiros com dinheiros públicos
danos reportados até
mesa para o turismo vai no
tinham que ser para edificações
foram assumidos, no imediato e
sentido de intensificar, durante
legais. Nas coletividades em que
por completo, pela Câmara, que
este ano, a animação de rua, com
os montantes foram mais
nem sequer os comunicou ao
o reforço do trabalho das
elevados, sendo que algumas até
Estado Central. Durante as
coletividades nessas ações,
ultrapassaram os cem mil euros,
negociações e naquele momento
pagando a Câmara o justo valor
existiram também dificuldades
crítico nós, tínhamos uma certeza:
por esses serviços. São as duas
dessas associações em conseguir
se pedíssemos mais de meio
medidas que, no imediato, estão
arranjar empresas que dessem
milhão de euros ao Estado
preconcebidas. Não podemos
resposta em tempo útil. Em termos
Central, a resposta seria não.
avançar com nada de muito mais
prendem-se com licenciamentos que não existiam. Coletividades que tiveram que instruir processos de legalização, porque estávamos
de Câmara Municipal, o processo está transparente. As regras foram definidas à partida. O pelouro das Coletividades, aquando do Leslie, fez um levantamento em tempo recorde, preciso e objetivo, que também nos salvaguarda a todos de que
€ 5.000,00
E depois do LESLIE, veio a COVID-19. Na mensagem de Páscoa que enviou às coletividades, citou Pessoa: “Quem quer passar além do Bojador / Tem que passar além da dor”. Não são dores a mais?
Está e até já falei com o Senhor Presidente sobre o tema. É uma
concreto, porque estamos a aguardar a regulamentação sobre as atividades que se poderão realizar. Penso que a partir do dia 18 [de maio] estaremos em condições de concretizar melhor estas propostas.
sócia
85 | MAIO 2020
"O modelo de comunicação das coletividades tem de ser muito melhorado" As coletividades queixam-se que não têm lugar no CAE. Como reage?
se sistematicamente uma série de
Há no concelho cultura de primeira e cultura de segunda?
grande desafio político. Colocam-
conjeturas, uns falam no Coliseu,
Não considero que exista cultura
Estrategicamente, o CAE acaba
outros no Anel das Artes, entre
de primeira e de segunda. Há
por ter uma gestão autónoma. O
outras opções, mas o que é
neste concelho cultura que é mais
espaço passou a ser minimamente
necessário é um verdadeiro Sítio
evidenciada, mais publicitada, do
rentabilizado, isto é, não dá lucro,
das Artes na Figueira da Foz. Um
que outra. O modelo de
mas também não acarreta uma
equipamento com um espaço
comunicação das coletividades
despesa substancialmente
similar ao CAE que consiga
tem de ser muito melhorado e a
elevada para o Município.
concentrar toda uma série de
Câmara Municipal aceita esse
Felizmente, o CAE tem recebido
coletividades em espaços
desafio. As coletividades têm de
ao longo dos últimos anos muitos
multidisciplinares, com uso
se organizar: não podem marcar
espetáculos que só são possíveis
permanente, para demonstrar o
duas ou três peças de teatro para
de ver em Lisboa, no Porto e na
que se faz no concelho. Não digo
o mesmo dia. Têm de apostar na
Figueira da Foz, o que também
que seja fácil ou para fazer no
itinerância e levá-las a mais
contribui para a taxa de
imediato. Não vale a pena estar
locais. Se conseguirmos organizar
ocupação constante. Se me
com demagogia. É uma ideia que
esse mapa de atividades e
disserem que precisamos de uma
neste mandato é impossível
divulgá-las convenientemente,
segunda sala com a mesma
concretizar, mas gostaria de
passaremos a não ter esse
dimensão, diria que sim e a partir
deixar feito nesta área um
conceito de cultura de primeira e
daí resolveríamos o problema. A
trabalho sustentável para que o
de segunda. É uma situação que
Figueira da Foz precisa de mais
meu sucessor pudesse agarrar no
requer uma formatação diferente
um espaço com capacidade igual
projeto.
e um diálogo permanente entre
ou superior ao CAE. Esse é um
coletividades.
"É necessário um verdadeiro Sítio das Artes na Figueira da Foz. Um equipamento com um espaço similar ao CAE que consiga concentrar toda uma série de coletividades"
sócio sócia
04 || MAIO 86 MAIO 2020 2020
Há dirigentes que acusam o pelouro de priorizar determinados projetos em detrimento de outros. Como reage? Desconheço as situações
Não sabemos se vão fazer o
concretas a que se refere, mas
investimento e depois acabam por
como é natural nem todas as
vender meia dúzia de refeições
A ACCFF fez no passado dia 5 de maio 19 anos. Desde que tomou posse como vereador tem dito publicamente que considera esta estrutura um parceiro do Município. Entende que há espaço para aprofundar essa parceria?
respostas são positivas. O
por dia… A partir do dia 18 [de
Há muito espaço para aprofundar
vereador das coletividades do
maio], acreditamos já ter outros
esta parceria. Desde o primeiro
Município da Figueira da Foz não
dados que sustentem uma tomada
instante, assumi que à Câmara
tem dado só "sins" às
de decisão.
Municipal exige-se dar inputs, dar
coletividades. Também tem dado
na própria Feira das Freguesias, nós não sabemos se as coletividades vão ser ressarcidas do hercúleo trabalho que vão ter para que possam ir às tasquinhas.
caminhos e ajudar a definir a
Orquestrae, mas provavelmente
14 freguesias, uma intensa dinâmica associativa e, em particular nos últimos anos, tão poucas marchas populares de São João. Como é que o vereador do pelouro entende esta circunstância?
tínhamos feito nove ou dez “mini
Entendo que já não é uma
tecido associativo, vai dar-se mal.
orquestraes”… A aposta é em
questão monetária. Tem a ver com
Faço um paralelismo com outra
produtos únicos. Posso revelar que
toda esta dinâmica de que há
realidade: qualquer diretor
depois do evento
pouco falámos de que é
comercial que queira vender um
necessário trazer mais pessoas
determinado produto sem ter
chegaram à mesa dos vereadores
para as coletividades e mais
todos os comerciais alinhados
outras iniciativas que queriam
motivação. Existem coletividades
com a estratégia e a fazer parte
replicar o evento e até com
que, entretanto, desistiram de ir
integrante desta, não será
menos enfoque. Há aqui um
às marchas. Portanto, vai ter de
certamente bem sucedido. E a
trabalho que tem de ser
existir um trabalho de muita
Associação das Colectividades é
respeitado por cada um dos
proximidade para que essas
a âncora dessa sustentabilidade,
interlocutores. O papel do
mesmas coletividades possam,
que tem de ter um papel
vereador neste capítulo é também
num futuro próximo, voltar a
relevante e maior em toda a
respeitar a propriedade
participar. O modelo tem de ficar
atividade. A Câmara Municipal
intelectual e respeitar a
bem assente. Muitas vezes a
precisa constantemente deste
capacidade que cada uma das
questão das classificações, quem
apoio, porque a Associação faz
associações tem de inovar.
ganhava e quem ficava em
um papel de ligação que o
segundo, criou também alguma
Município não tem capacidade de
desmotivação. Antes de
efetuar. Os serviços da Câmara
avançarmos, temos de definir
abrem às 8h30 e fecham às 17h30
regras de participação, que
e, como sabemos, o
provavelmente vão ter que ser
associativismo não se faz neste
alteradas. Não vou avançar com
horário. O associativismo faz-se
nenhuma ideia. As regras vão ter
já depois de cada um dos
de ser repensados por toda a
intervenientes ter deixado as suas
gente e com a própria
profissões. É no final [da jornada
A decisão final ainda não foi
participação das coletividades
laboral] que vão trabalhar em prol
tomada. Há necessidade de
para que não possam depois dizer
da comunidade. Há muitos mais
perceber a regulamentação
que não foram envolvidas. No
motivos, mas só este é o
relativa às aglomerações de
fundo é isto: chamar as
suficiente para ter na Associação
pessoas. Vão existir regras e
coletividades e, em conjunto,
das Colectividades um pilar de
vamos ter que quantificar e
definir regras aceites por todos.
apoio fundamental.
ponderar o quanto é que custa a
Só a partir daí é que
imposição dessas regras e quais
apaziguaremos a situação.
"nãos" e tem-nos justificado. A filosofia que tento transpor é que as coletividades em conjunto têm de apresentar produtos agregadores, diferenciadores e continuados. Nós fizemos o
ComVida
»
« República
[da Dez de Agosto]
Falemos um pouco das Festas da Cidade, também por aquilo que representam para a dinâmica associativa e para o incremento das receitas. A Feira das Freguesias foi cancelada em 2020 ou apenas adiada?
estratégia. É às forças vivas da sociedade que compete implementar essa mesma estratégia e desenvolvê-la. Qualquer que seja o vereador das coletividades, se quiser impor uma ideia sem a participação do
vão ser as grandes mais-valias para cada uma das instituições. Só depois tomaremos uma decisão. Temos também aqui uma abertura para, no caso de virem a ser necessários alguns apoios extraordinários, se não se investir
"As coletividades em conjunto têm de apresentar produtos agregadores, diferenciadores e continuados"
num lado podermos estar em condições de distribuir essas verbas de outra forma. Pensando
sócia
87 | MAIO 2020
Orquestrae "é para continuar" com "um modelo ainda mais inovador" Focando-nos nas políticas para o associativismo, o projeto Orquestrae é uma marca deste Executivo. É para continuar?
Que outros projetos tem para apoiar a dinâmica associativa?
É para continuar. Existiu uma
Capital Europeia da Gastronomia,
primeira fase do projeto e depois
em 2021. O grande objetivo é
foram abertos dois ou três
concebermos produtos próprios,
Orquestrae fora do próprio
genuínos, mostrando a
âmbito, isto é, levou-se o
capacidade que temos em cada
Orquestrae às freguesias. O
uma das áreas do associativismo.
Executivo quis, depois, dar a
Ainda temos tempo. Este trabalho
hipótese às restantes filarmónicas
era para ser simulado este ano,
para que cada uma delas pudesse
mas nestas condições [devido à
desenvolver projetos idênticos na
COVID-19] não haverá simulações.
sua comunidade. Estávamos a
Em 2021, será sem rede, mas
perspetivar estas ações durante
tenho a confiança de que vai
esta fase em que fomos
correr bem, porque sabemos quem
apanhados pela COVID. Podemos
são os interlocutores, conhecemos
ter mais algum Orquestrae nessa
as pessoas que estão no terreno.
base para encerrar esta primeira
Para mostrarmos todas estas
fase, mas não sei se iremos ter a
áreas, toda esta riqueza cultural,
possibilidade de dar as mesmas
vamos isoladamente treinar
condições que já demos às
algumas áreas, como a dança, o
filarmónicas que replicaram o
canto ou o teatro, para podermos
espetáculo na sua freguesia.
criar algo de dimensão mais
Entretanto, o pelouro das
abrangente, mais fora da caixa.
Coletividades fez, juntamente
Esta será a prioridade, mas temos
com as filarmónicas, uma análise
também a plena noção de que os
intrínseca dos objetivos iniciais e
ranchos folclóricos estão com
quantificámos com cada uma das
alguma dificuldade ou que o
filarmónicas as que tinham
teatro precisa de mais apoio.
atingindo mais e menos objetivos.
Logo que possível, seja
Tivemos essa massa crítica. Se
presencialmente ou por video-
tínhamos ou não atingido o
conferência, iremos discutir estas
objetivo e, quando não atingimos,
áreas temáticas uma a uma com
questionar por que razão não
as coletividades e perceber onde
atingimos. Nessa base, já estamos
podemos intervir.
Tínhamos, e continuamos a ter, muitas perspetivas em relação à
"Temos muitas perspetivas em relação à Capital Europeia da Gastronomia, em 2021" "Vamos treinar algumas áreas (...) para criar algo de dimensão mais abrangente, mais fora da caixa"
a perspetivar o Orquestrae do próximo ano com um modelo ainda mais inovador e desafiante. Vamos preparar mais um grande Orquestrae. Ideias não faltam.
)zoF ad arieugiF EAC( ohnidoG leinaD ed aifargotoF
sócia
88 | MAIO 2020
"Temos plena noção de que os ranchos folclóricos estão com alguma dificuldade ou que o teatro precisa de mais apoio."
O desassossego de quem deseja fazer da Figueira a capital do tecido associativo As sessões solenes fazem parte da tradição associativa local. No contexto da sociedade atual, ainda fazem sentido?
que repensar o conteúdo. As
Há precisamente um ano, no aniversário da Associação das Colectividades, confessou publicamente que gostava de fazer da Figueira “a capital do tecido associativo". Mantém esse desejo?
sessões solenes deveriam ser um
Mantenho claramente. Já fiz um
que gostaria que as coletividades
bocadinho mais curtas, mais
apanhado sobre a grande maioria
me recordassem.
objetivas e realmente mais
das situações: temos excelentes
solenes. Que seja um momento
dirigentes associativos, temos
relativamente curto para que
excelentes instituições, temos a
possa ser estabelecida essa
Associação das Colectividades
Gostaria de renovar o mandato e continuar com o pelouro após as eleições do próximo ano?
mesma solenidade. Depois,
que funciona como pilar de toda
(Silêncio) Primeira pergunta,
acrescentar-lhe a outra
a estrutura associativa, temos
primeira resposta: gostaria.
componente, após a sessão, tipo
espaços, ou seja, temos tudo. E,
Segunda resposta: é necessário
fórum, de perguntar às pessoas
mais, temos aquilo que nos
ter motivação para o efeito. Em
presentes o que é que associação
diferencia: temos muita vontade e
termos pessoais, eu utilizo muita a
pode fazer mais pela comunidade
muito empenho. A pergunta que
expressão do “desassossego
e o que é que a comunidade pode
eu deixo é: o que é que falta?
constante”. Sou uma pessoa
Fazem sempre muito sentido. Embora, possivelmente, tenhamos
fazer mais pela associação. É o
quatro anos no exercício da sua função, deixar de ser vereador – podem não me chamar companheiro –, mas se não sentir esse companheirismo é porque fiz muita coisa errada. Portanto, era como um companheiro de armas
desassossegada, no sentido de
errado, mas que poderia trazer
Como é que gostaria que os dirigentes associativos recordassem o seu mandato?
outro envolvimento, captar outras
Como um companheiro. Se,
porque, como já referi, continuo a
pessoas com ideias inovadoras e
depois do meu mandato, eu for a
desempenhar a minha atividade
até novos elementos para os
uma associação e me tratarem
profissional, e, já o disse, o tempo
órgãos sociais.
por companheiro, sentirei que fiz
é insuficientemente suficiente.
o meu papel e o meu trabalho,
Poder aceitar ou não o próximo
porque sabemos que as
desafio vai depender em grande
coletividades essencialmente
parte da minha capacidade física
vivem do fator humano. Se as
e da minha capacidade de
É verdade. Mas, objetivamente, as
relações não perdurarem, se
resiliência.
sessões solenes acabam por ter
quando este vereador, que esteve
modelo que defendo, naturalmente passível de estar
Esse momento de opinião não será próprio das assembleias gerais?
tentar melhorar, tentar motivar, tentar agregar. Esta está a ser uma experiência muito dura,
mais público do que as assembleias gerais. O públicoalvo cresce exponencialmente.
Entrevista de
Ricardo Santos Pedro Agostinho Cruz
Fotografias de
"Gostaria que as coletividades me recordassem como um companheiro de armas"
sócia
89 | MAIO 2020
IN MEMORIAM
ANTÓNIO INÁCIO n. Coimbra, 1955 - m. Figueira da Foz, 2003
António Maximino Marques Inácio
nasceu, em
Coimbra, em maio de 1955.
destinos do GIS, mas com o foco numa dinâmica associativa que envolvesse todos os parceiros do concelho da Figueira da Foz.
Pessoa bastante exigente e íntegra, foi um dedicado trabalhador da empresa LITOCAR,
Iniciou, então, a dinamização de diversos fóruns,
destacando-se pela singular facilidade em fazer
com o apoio de outros dirigentes locais, algumas
amigos.
empresas e da Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto
Passava as férias em Buarcos, lugar onde decidiu
(CPCCRD), sempre em associações de diferentes
fixar residência em 1996, aqui vivendo rodeado de
freguesias e com distintos oradores.
verdadeiros amigos, que depressa cativou e envolveu.
Estava lançada a semente para a criação da Associação das Colectividades do Concelho da
A 8 de dezembro de 1994, fez-se sócio do Grupo
Figueira da Foz. A fundação data de 5 de maio de
Instrução e Sport (GIS) e, logo em janeiro de 1995,
2001 e o GIS é unanimemente consagrado como
integrou a direção. Dois anos depois, mais
sócio fundador número um, reconhecendo o papel
propriamente a 4 de abril de 1997, foi eleito
fulcral do seu Presidente, que viria a ocupar umas
Presidente da coletividade, cargo que ocupou até
das vice-presidências dos primeiros órgãos sociais
31 de janeiro de 2003. Nesse período, António
eleitos daquela estrutura associativa.
Inácio rapidamente fez a diferença, explorando dinâmicas inovadoras, como a criação de um grupo
Integrou ainda, durante quatro anos, os órgãos
de escoteiros, a dinamização de jogos tradicionais
sociais da própria CPCCRD, defendendo sempre
de praia, exposições de artesanato local,
uma dimensão global e integradora do movimento
demonstrações de pesca de arrasto (arte), entre
associativo.
outras iniciativas que ainda hoje permanecem na memória e fazem a história da instituição.
Homem com grande visão de futuro, partiu cedo de mais, em janeiro de 2003, com apenas 47 anos de
António Inácio cedo demonstrou ter uma visão do
idade, tendo deixado um vasto e reconhecido
associativismo muito mais ampla e abrangente do
legado associativo.
que era expectável, não se limitando a gerir os [Com a colaboração de
sócia
90 | MAIO 2020
Rosa Baptista ]
CAMPANHA DE NOVAS FILIADAS A Associação das Colectividades do Concelho da Figueira da Foz (ACCFF), enquanto estrutura descentralizada da Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto (CPCCRD), associou-se à campanha nacional para a angariação de novas filiadas.
Até 31 de dezembro, todas as associações, clubes e coletividades que se queiram juntar à família do movimento associativo popular terão um desconto de 50% na quota anual de 2020.
Fazer parte da CPCCRD/ACCFF é ter acesso, a todo o momento, a legislação e informação sobre o setor, a manuais de boas práticas em diversas áreas de interesse associativo, a apoio jurídico e contabilístico, a vantagens comerciais em diversas empresas para associados e instituições e a formação especializada em temas de superior relevância para a gestão diária da associação.
Unidos somos mais fortes. Junte-se a nós.
FICHA TÉCNICA
sócia
de todas as coletividades.
Ricardo Santos Frederica Jordão
Direção e Redação Apoio à redação Apoio à edição
António Rafael, Fátima Trigo , Fernando Gonçalves, João Carronda e Celeste Miguéis Colaboração especial Frederica Jordão/Pó de Saber Grafismo Ricardo Santos Apoio à composição gráfica António Carraco dos Reis Revisão de texto Lígia Bugalho Propriedade Associação das Colectividades do Concelho da Figueira da Foz (ACCFF) Contactos
Praceta Doutor Marcos Viana, n.º 5, R/ch 3080-090 Figueira da Foz accffoz@sapo.pt | 936 860 131 | 962 920 832 Nota: Alguns artigos não seguem as alterações introduzidas pelo Acordo Ortográfico de 1990.
sócia sócia
| MAIO 2020 9191 | MAIO 2020
VALORIZAR Será possível imaginar a nossa vida coletiva sem identidade, sem desporto, sem dança, sem música, sem teatro?
É este o mote da campanha que a ACCFF vai lançar este verão, nas redes sociais, numa ação de valorização do movimento associativo.
Depois da suspensão forçada da atividade associativa por força da pandemia da COVID-
é o momento certo " para " despertar na população a consciência de que, de facto e comprovadamente, o movimento associativo nos faz falta ", destacou o Vice19, este "
presidente da Direção, Ricardo Santos.
VALORIZA O MOVIMENTO ASSOCIATIVO.