26.09.20 — 31.01.21
DUVIDA PRESS
apresentada por Ricardo Nicolau presented by Ricardo Nicolau
CASA DA CERCA
— Centro de Arte Contemporânea Contemporary Art Centre
A dúvida perpétua é uma das principais forças de Pedro Barateiro. Os seus famigerados atrasos, que suspeito serem conhecidos de praticamente todos os curadores, galeristas e instituições que com ele já trabalharam, são uma forma de garantir que os seus projectos nunca se cristalizam prematuramente, que pode mudar de ideias até ao penúltimo minuto. Que outros precisem de produzir, instalar e comunicar as suas exposições é outro problema. Que o façam – é um exercício a que todas as demasiado profissionais instituições talvez se devessem dedicar – na dúvida de que aquilo que Ricardo Nicolau lhes foi originalmente indicado pelo artista como as obras alguma vez venha a ser apresentado!
SEM ACENTO AGUDO
Até agora falámos de dúvida com acento agudo, e de como um aparente defeito, a indecisão crónica, pode ser afinal premeditado, benéfico e operativo. Sem acento, a palavra passa a ser uma espécie de interjeição, ou de interpelação. Falta-lhe, porém, o acento exclamativo da imposição, talvez porque o trabalho de Pedro Barateiro nunca determine, decrete ou fixe. Duvida Press é o nome que o artista deu a um projecto que vem confirmar e expandir a expressão que há uns anos ajudou a definir a prática de muitos artistas, entre eles o próprio: “O artista como editor“. Que Barateiro baralhe e volte a dar materiais e imagens alheias é facto que já foi explorado em muitos textos sobre o seu trabalho; que imagens e palavras, ditas e escritas, suas e de outros, nele convirjam ao ponto de estarmos perante um artistaque-escreve (e que faz da escrita um meio artístico), é assunto que também já foi escalpelizado; que o acto de escrever, e de ler ou dar a ler aquilo que escreve, lhe sirva para explorar inquietações sociais e políticas – que escapam sempre, lá está, a determinações ou decretos –, também já deve ter sido analisado… Mas a relação de Pedro Barateiro com o objecto livro tem em Duvida Press um pretexto para ser ampla e profundamente explorada por alguém (deixo a sugestão). Entre os muitos livros que Barateiro já produziu contam-se publicações que acompanharam exposições individuais e livros que se autonomizam da sua produção de esculturas, pinturas, desenhos ou vídeos. Em todos se destaca, quer isso esteja ou não anunciado, o seu trabalho enquanto editor: porque convida quem sobre ele (ou sobre outro
tema) escreva; porque selecciona textos já existentes; porque articula palavras e imagens (que não têm de ser, e muitas vezes não são mesmo, fotografias das suas obras); porque define assuntos a tratar, temáticas a explorar, certezas das quais duvidar. Oficialmente ou não, de maneira mais ou menos informal, Pedro Barateiro sempre foi um editor, e um editor da dúvida. Retire-se o acento à palavra e ficamos com o nome do projecto editorial que se “materializa” em títulos, autores, desenho de capas. Autores e títulos são inventados? Parece, mas fica a dúvida, tal é hoje necessária imaginação para engendrar nomes que não existam. De qualquer forma, títulos e imagens relacionam-se directamente com os assuntos explorados pelo trabalho de Barateiro. “Imaginação colonizada”, por exemplo, é título que convoca passados que definem o presente (a fotografia na capa não deixa grandes dúvidas), mas também a nossa situação actual enquanto reféns de indústrias pós-capitalistas de produção e circulação de imagens; “A responsabilidade da ficção” dirige-se a todos quantos produzam textos e imagens (de caminho desligando a criatividade da inconsciência) e ao nome “O amor dos homens maus” – fórmula que reúne de forma particularmente feliz dois sentimentos aparentemente contraditórios – junta-se uma imagem que, convocando trocas comerciais e passados colonialistas, amplia o sentido das palavras. Não consigo deixar de lembrarme de uma entrevista a Tilda Swinton em que, a propósito da personagem de uma inescrupulosa advogada corporativa que em 2007 lhe valeu o Óscar de melhor actriz secundária, dizia: “Sabem qual é o problema dos maus? É acreditarem que são bons.“ A propósito das capas da Duvida Press, Barateiro escreveu-me que tem alguma relutância em materializálas. As três que referi podem manusear-se (uma faz inclusive parte de uma escultura), mas muitíssimas há que nunca saíram dos ecrãs. Todas esperam nesse lugar de dúvida perpétua e premeditada, todas podem ou não ganhar presença física, e podem inclusive – sonho de qualquer editor – ser publicadas em forma de catálogo por uma “editora a sério“. Duvida?
NO ACUTE ACCENT Ricardo Nicolau
Perpetual doubt is one of Pedro Barateiro’s main drives. His notorious delays and postponements, which I suspect are known to almost all curators, gallerist owners and institutions who have dealt with him, are a way to guarantee that his projects never crystalize prematurely, that he is free to change his mind until the minute before the last. That others need to produce, set up and communicate their shows is another problem. They should do it — it is an exercise all those too professional institutions should commit to — in doubt, not knowing if the artist will ever present the works he said he would! Until now we have talked about dúvida [doubt] with acute accent and described how an apparent weakness, chronic indecision, can ultimately come out as something premeditated, beneficial and operational. Without the accent1 , the word becomes a kind of interjection, or an interpellation. However, it lacks the exclamative accent of imposition, maybe because the work of Pedro Barateiro never determines, decrees or settles. Duvida Press is the name the artist gave to a project that confirms and expands the phrase that, years ago, helped to establish the practice of many artists, including his own: “Artist as Publisher“. That he shuffles and deals back the materials and images of others is well known and has been explored in many texts about his work. That images and words, voiced or written, by him and others, converge in him to the point that we have a writing-artist (who uses writing as an artistic medium) is a well dissected subject matter. That he uses the act of writing, of reading or giving to read what one has written to explore social and political concerns — which always escape decrees or determinations — has also already been analysed. But Pedro Barateiro’s relationship with the book as object can still be amply and deeply explored in Duvida Press (if you can take a cue). Among the many books published by Barateiro, we have books that accompanied solo shows and books that are autonomous from his production of sculptures, paintings, drawings or videos. Announced or not, his work as an editor stands out in all of them: because he invites people to write about himself (and other topics), because he selects existing texts, because he articulates texts and images (which do not have to be, and are often not, photographs of his works), because
he decides what subjects will be explored, the issues to delve into, the certainties about which to doubt. Officially or not, and always somewhat informally, Barateiro has always been an editor and a publisher of doubt [dúvida]. Remove the accent [duvida] and we get the name for a publishing project that is “materialized” in titles, authors, covers. Are those made-up authors and titles? It seems like that, but the doubt remains, given all the imagination required to create new names today. Nevertheless, titles and images are directly related to the issues explored in Barateiro’s work. Imaginação colonisada [Colonised imagination], for example, is a title that evokes a time that defines our present (the photo on the cover leaves little space for doubt), but also our contemporary condition as hostages of post-capitalist industries of image production and circulation. A responsabilidade da ficção [The Responsibility of Fiction] talks to all that produce texts and images (disconnecting from the creativity of consciousness). The title O amor dos homens maus [The Love of Bad Men] – that brings together two seemingly contradictory emotions – is accompanied by an image that, evoking commercial trade and colonial pasts, expands the meaning of words. This brings to mind the words by Tilda Swinton, who, in an interview about a character she played, an unscrupulous corporate lawyer, and for which she won the best supporting female actor Academy Award, said: “You know, the problem of bad people is that they think they’re good.“ Concerning the covers for Duvida Press, Barateiro told me that he is often reluctant to materialise them. The three covers I mentioned can be handled (one is even part of a sculpture), but many of them have only really existed in a screen. All those covers are waiting in a place of premeditated and perpetual doubt: they might or might not become tangible and can even — the dream of any publisher — be published in the form of catalogue by some “real publishing house“. Do you have any doubts?
1) Translator’s Note: In the Portuguese language, dúvida (doubt) is a noun and duvida is the third person singular present form of the verb duvidar (to doubt).
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