e x p o s i ç ã o
David de Almeida e Inês Almeida 11 Fevereiro a 18 Março 2017 Galeria Municipal do Montijo
DAVID DE ALMEIDA (São Pedro do Sul, 1945 – Lisboa, 2014) Artista plástico cuja obra se estendeu à Gravura, Pintura, à Escultura e à Arte Pública.
Com bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian, especializou-se na feitura manual de papel nos Moinhos do Vale do Lagat, em França; cursou holografia no Goldsmith College, em Londres e estagiou com Stanley Hayter no Atelier 17, em Paris. David de Almeida é considerado uma referência na Gravura contemporânea europeia, tendo a sua obra sido premiada nacional e internacionalmente. O metal foi sempre uma constante na sua obra, quer nas matrizes de gravura com que iniciou o seu percurso artístico, quer na sua utilização como elemento associado à pintura. www.daviddealmeida.org
INÊS ALMEIDA (Lisboa, 1977) Professora da disciplina de Projecto e Tecnologias de Ourivesaria e Gravura do curso de Produção Artística, na Escola Artística António Arroio, em Lisboa, desde 2004. Mestre de Ensino em Artes Visuais, pelo Instituto da Educação (2014) e licenciada em em Design, pelo IADE (2009); Curso Artes Aplicadas com especialização em Joalharia na Escola Massana Centre d’Art i Disseny, vinculada à Universidade Autónoma de Barcelona (2000); Curso Técnico Profissional de Ourivesaria e Metais de Arte na Escola Secundaria Artística António Arroio (1995). Na década de 1990 foi assistente do artista plástico David de Almeida, na edição de gravuras e na realização de obra pública. Expõe desde 1995 em Portugal, Espanha, Polónia, Holanda e Alemanha. A sua obra já premiada está referenciada em diversas bibliografias internacionais como a “Jewelbook - International Annual of Contemporary Jewel Art 12/13” ou “Anillos: 500 Creaciones Artísticas de todo el Mundo” de Nicolas Estrada. www.inesalmeida.net
Inês Almeida Colar - “ As perspectivas da verdade”, Alpaca, latão, prata, vidro, coral, 40x22x10 mm, 2016
Foi na Escola de Arte Decorativas de António Arroyo que iniciou o seu percurso com a frequência do curso de Gravador Litógrafo (1963/65) tendo mais tarde leccionado nesta mesma instituição (1978/84). Continuou a sua formação na Gravura - Cooperativa de Gravadores Portugueses, sob a orientação de Maria Gabriel.
“AS MÃOS”
Embora se situem em disciplinas artísticas distintas, existe uma matéria comum entre as pequenas peças de joalharia de Inês Almeida (1977) e os trabalhos de pintura, gravura e escultura de seu pai, David de Almeida (1945-2014), que é perceptível mesmo a um olhar mais distraído. Esta matéria comum é forjada por múltiplos aspectos que passam pela aprendizagem realizada na Escola Artística António Arroio, por cumplicidades feitas de referências simbólicas a universos literários, pelo especial interesse que ambos revelam sobre a paisagem natural e habitada e pelos legados culturais de diferentes latitudes geográficas e temporais e, finalmente, pelo domínio de saberes artesanais e técnicas artísticas, onde a gravura se revela nas suas variantes. Matéria comum nas obras de Inês e de David de Almeida é ainda a combinação de práticas ancestrais de moldagem, numa contaminação de técnicas oficinais comuns à gravura e à ourivesaria, com uma forte componente experimental que lhes permite explorar as potencialidades plásticas do metal, seja ele ferro, cobre, zinco, aço, alpaca ou prata. Esta escolha do metal enquanto material de criação artística é uma herança familiar que tem a sua origem em S. Pedro do Sul, na oficina de ferreiro do pai de David de Almeida. Foi na oficina paterna que o artista, ainda criança, observou e aprendeu o saber artesanal de transformação do metal que mais tarde aprofundou, aplicando-o à gravura cuja diversidade de técnicas e materiais explorou ao longo da sua prática artística. E foi este saber fazer manual, em que as mãos funcionam como ferramentas criadoras, que Inês Almeida observou e aprendeu com seu pai, ao ajudá-lo na preparação de alguns trabalhos, e que agora materializa nas suas peças. O papel – que fabricava – e o pó de pedra foram os materiais que David de Almeida mais privilegiou, explorando admiravelmente as componentes plásticas das texturas várias a que foi juntando cor, misturando-os com outros materiais. Eles permiti
David de Almeida S/ título, acrílico e ferro sobre pasta de papel e serapilheira, 100x200 cm, 2004
ram ao artista ser, na mesma obra, pintor, gravador e escultor. O metal, primeiro material de aprendizagem oficinal, esteve igualmente sempre presente nos seus trabalhos. De início de forma aparentemente menos perceptível, “escondido” nas matrizes em cobre tornadas telas, preparadas com sucessivas camadas de tinta que se sobrepunham e sobre as quais David de Almeida desenhava, gravando na superfície as formas que o inspiravam. A partir da década de 1990, o artista tornou visível a presença do metal, incorporando na composição pequenas placas-fragmentos de aço ou ferro, que deixou assim de ser apenas o suporte discreto da criação para se tornar num dos elementos principais do desenvolvimento formal da obra. O modo como, ao longo das diversas fases do seu trabalho, David de Almeida relacionou e soube combinar esteticamente materiais de natureza tão distinta como o papel, a madeira, o metal, o tecido, faz com que as suas obras nos proponham diferentes níveis de leitura e nos apelem tanto ao sentido do tacto. Olhamos e queremos fechar os olhos e “ver” apenas com os dedos o que a superfície nos pode revelar: as formas frias do metal, os riscos gravados, a aspereza da serapilheira, a suavidade ou a rugosidade cálida do papel, percepcionando apenas pelo toque como se cruzam, se sobrepõem ou se interpenetram. Do mesmo modo, as pequenas peças de joalharia de Inês Almeida também não são apenas simples adornos para colocar na lapela de um casaco, ou trazer num fio penduradas ao peito. Também elas permitem a quem as vê e as usa distintos níveis de fruição, onde se convocam mais do que um dos sentidos. E essa é também matéria comum entre a obra de Inês Almeida e a de seu pai. A preferência pela pequena dimensão, os materiais escolhidos para a sua composição – o metal, geralmente a prata e a alpaca, a madeira, o vidro em contas ou em pequenas lentes – e a forma como os trabalha e combina, conferem aos trabalhos de Inês Almeida um carácter intimista que os afastam de uma concepção mais tradicional de “jóia”.
Inês Almeida Pin - “A mão“, Alpaca, latão oxidado, prata, vidro, 30x20x7 mm, 2015
David de Almeida S/ título, acrílico e ferro sobre pasta de papel e serapilheira, 100x100 cm, 2003
As peças de Inês Almeida concedem-nos um prazer lúdico, de jogo, brincadeira e experimentação: simples dispositivos mecânicos descobrem/escondem ou fazem mover pequenas figuras; algumas são “habitadas” por personagens de estórias cujo enredo só a criadora conhece, mas que desafiam quem as vê e as usa a imaginar as suas próprias estórias; outras ainda, pendentes em forma de caixas-relicários guardam corações e gotas que pequenas lupas aumentam e por vezes distorcem. A palavra é outro elemento compositivo que Inês Almeida utiliza com frequência, através de pequenos fragmentos de textos de autores que fazem parte dos seus referentes literários, alguns dos quais, como José Saramago, partilha com seu pai, David de Almeida. Nas primeiras peças emprega o papel como suporte do texto e depois passa a gravá-lo no metal, num fazer técnico que a gravura também utiliza. Ao trabalhar o metal, especialmente a alpaca, Inês Almeida explora igualmente as marcas que a passagem do tempo deixa visíveis, fazendo da oxidação um atributo estético. Esta exposição, ao colocar em diálogo algumas das obras da vasta produção artística de David de Almeida e peças de joalharia de sua filha Inês Almeida, permite-nos não só descobrir o saber fazer da matéria comum que os une, mas também celebrar o trabalho de dois criadores com um percurso estético muito singular. Ana Barata Janeiro 2017
David de Almeida S/ título, pintura e ferro sobre papel, 50x50 cm, 2013
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