Capítulo
1
1. Os Problemas de Engenharia “Se tiver solução, então não é problema. Se não tiver solução, também não é problema”. Ditado oriental
1.1.
Introdução aos Problemas de Engenharia O que significa a palavra problema? O que caracteriza o seu significado? O que eles
têm em comum?
Quais são as suas características?
O que são os problemas de
engenharia? Existem várias definições, sendo algumas delas as seguintes:
“Um problema é uma questão não resolvida e que pode ser objeto de discussão, em qualquer área do conhecimento”. “Um problema é qualquer questão que dá margem à hesitação ou perplexidade, por ser difícil de explicar ou de resolver”.
Você deve ter percebido pela leitura do módulo DESCOBRINDO A ENGENHARIA: A PROFISSÃO que a engenharia é essencialmente o estudo de problemas e das suas soluções. Isso torna o estudo do seu significado por demais importante, levando a uma análise precisa do que esse termo significa no âmbito da engenharia. O surgimento de um problema acontece quando há a necessidade de transformar a ordem dos elementos naturais ou artificiais de um estado ou fase, para outro. Um estado ou fase de um determinado objeto abstrato ou real pode ser definido como sendo a característica ou comportamento num determinado instante de tempo.
Por exemplo, se
pensar agora na xícara de café que está aqui ao meu lado, em cima da escrivaninha e ao lado do teclado do computador, pode-se definir o estado presente desse sistema. À medida que o café vai sendo consumida, a massa total do sistema xícara/café vai diminuindo e, portanto, há uma mudança de estado. Mudança de estado acontece também quando o café vai esfriando e quando a xícara é elevada até a boca, assim como no retorno para o nível da escrivaninha.
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Um problema pode ser a transmissão de dados entre dois pontos, entre os quais existe uma montanha de 1 000 metros de altura, assim como pode ser a construção de uma estrada que atravesse a Cordilheira dos Andes ou os Alpes.
O problema pode envolver
transformações reversivas ou não, como é o caso do aquecimento da água de chimarrão, que depois de aquecida pode novamente voltar ao seu estado inicial, diferente do carvão do braseiro que uma vez queimado produz um estado irreversível de transformação em CO, CO2 e outros compostos. Apesar dos estados serem sempre transitórios, podemos definir alguns estados intermediários como sendo “constantes” para efeitos práticos. Podemos abstrair a solução do problema como sendo uma “caixa preta” que transforma um sistema num estado inicial EI1 num estado final desejado EF2. A Figura 1-1 mostra um esquema da transformação. Quanto maior for a transformação ou quanto mais rápida, maior a energia e os recursos necessários para a solução do problema e, portanto, maior a necessidade de otimização, o que irremediavelmente força ao estudo por demais aprofundado do problema. EI
EF Processo (Solução)
Figura 1-1 – Esquema da passagem de um sistema de um estado E para um estado S
Os recursos naturais nos fornecem os estados iniciais, cabendo aos engenheiros, pelo uso da sua inteligência e motivados pelos seus desejos objetivos ou subjetivos, implementar processos e soluções que sejam economicamente viáveis. Muitos processos de mudança de estado são efetuados pela própria natureza.
Os engenheiros se aproveitam
dessas através de técnicas de controle das grandes forças da natureza para uso em benefício da humanidade. Exemplo disso é o aproveitamento da força dos rios para a transformação de energia mecânica originada pela diferença de energia potencial de grandes quantidades de água, em energia elétrica, assim como o aproveitamento das gorduras saturadas retiradas das oleaginosas para a fabricação da margarina. O trabalho do engenheiro está na implementação dos processos necessários para efetuar a transformação. A característica marcante dos problemas de engenharia é a grande quantidade de soluções possíveis.
À medida que a complexidade do problema aumenta,
aumentam também as alternativas de solução (assim também como a probabilidade de alguma coisa dar errado).
A Figura 1-2 mostra exemplos de estados finais conseguidos
pelos processos de engenharia a partir de estados iniciais. Existem várias formas de solução para os problemas. Por exemplo, existem várias formas de suprimir a dor de cabeça de uma pessoa, através de vários tipos de
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EI: Estado de entrada (ou inicial). EF: Estado de Saída (ou final). Descobrindo a Engenharia: O Método
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medicamentos, através de massagem ou até cortando a cabeça fora!
Existem soluções
conhecidas e soluções a conhecer, daí a grande utilidade dos engenheiros, que são treinados para acharem e construírem as soluções mais adequadas.
As soluções mais adequadas
nem sempre são as melhores soluções. A decisão3 por um determinado tipo de solução deve ser baseada nos critérios econômicos, ambientais e nos princípios morais e éticos. Se não houver meios alternativos de alcançar um resultado esperado, o problema em si não existirá. De outra forma, se houver várias soluções possíveis com pontos positivos e negativos equivalentes, o problema estará criado, já que será necessário decidir qual a melhor forma de realizar a transformação desejada. A escolha de uma das alternativas de solução deve ser baseada em determinados critérios4.
Esses critérios são estabelecidos
pelas necessidades, pela legislação vigente e pelos princípios éticos e morais. Um critério é aquilo que serve como base para comparação, julgamento ou apreciação. Tomando como exemplo uma fábrica de panelas, os critérios devem levar em consideração a toxicidade dos materiais e o custo envolvido. Uma pessoa poderá escolher as panelas de alumínio pelo seu baixo custo apesar da sua comprovada toxicidade, no lugar de uma panela de vidro, ferro ou inox de elevado custo. A transformação de um sistema de um estado inicial para um estado final diferente ocorre à custa de transformação de algum tipo de energia.
Para esquentar a água do
chimarrão, deve-se queimar gás natural ou deve-se passar uma corrente elétrica através de uma resistência que por sua vez começa a esquentar. Para poder falar ao telefone celular, necessita-se de uma bateria carregada. Alguém tem que pagar a conta da transformação! Todos os processos de transformação são imperfeitos e sempre existem perdas. Estritamente falando, não existem processos realmente reversíveis. sempre serão imperfeitas e passíveis de contestação.
Por isso as soluções
As imperfeições e outras
características dos sistemas físicos reais e dos sistemas sociais e legais geram restrições na aplicabilidade
das
soluções,
o
que
na
engenharia
denominamos
de
fatores
condicionantes5. Resumindo, somente existirá um problema[8] quando houver o desejo de efetuar uma mudança no estado das coisas, no caso em que houver mais de um meio possível de efetuar essa transformação e quando essas alternativas apresentarem vantagens e desvantagens difíceis de serem avaliadas entre si.
Decisão: do latim decisione. Significados: resolução, determinação, deliberação. Sentença, julgamento. Desembaraço; disposição; coragem. 4 Critério: Do grego kritérion pelo latim criteriu. Significa aquilo que serve de base para comparação, julgamento ou apreciação. Princípio que permite distinguir o erro da verdade. Caráter, norma ou modelo que serve para apreciação de um objeto (coisa, idéia ou acontecimento). 5 Fator condicionante: Imposição resultante de circunstancias ou de decisão prévia, que deve ser observada na solução de um problema. Restrição. 3
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Pessoa querendo se comunicar com outra
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Pessoa conversando Telefonia Celular
Nação pobre, ignorante e endividada
Nação rica e generosa Ações de melhoria na Educação
Grãos de Soja
Margarina e óleo. Processo termoquímico
Massa de água se deslocando num rio
Energia elétrica para força e iluminação Usina hidrelétrica
Estudante de engenharia querendo ir à universidade
Estudante de engenharia na sala de aula Veículo e sistema viário
Pessoa com dor de cabeça
Pessoa sem dor de cabeça Analgésico
Figura 1-2 – Estado final conseguido através de processos de engenharia.
1.2.
Exemplos de Solução de Problemas de Engenharia “O conhecimento ou reconhecimento do problema é a metade da solução”. A seguir, são comentados alguns casos reais de problemas de engenharia que podem
servir de exemplo das atividades normais da atividade dos engenheiros.
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1 .2 .1 . Um Sistema de Diagnóstico de Doenças da Audição SURGIMENTO DO PROBLEMA O dirigente de uma empresa fabricante de equipamentos eletrônicos considera de grande potencial comercial, um aparelho computadorizado para o diagnóstico de doenças no ouvido interno que funciona pela medição das emissões Oto-acústicas induzidas e que foi idealizado por um dos seus engenheiros.
É um produto sem similar no país e o
equipamento importado tem custo proibitivo para o seu uso em pequenos hospitais privados ou em hospitais públicos de poucos recursos. Nos países mais desenvolvidos esse aparelho tem uso obrigatório por força de lei em todas as crianças recém nascidas, já que é a única forma de detectar problemas de audição e que só podem ser resolvidos com tratamentos especiais desde o início. Nos países menos desenvolvidos, em geral, nem se fala do assunto, já que não há recursos suficientes desses estados para equipar com o mínimo necessário e quem diria com esse tipo de equipamento considerado de “luxo” pelo seu elevado custo. Esse equipamento facilitará de sobremaneira o diagnóstico precoce de algumas doenças graves do ouvido interno.
A enfermeira, fonoaudiólogo ou o próprio médico
examinará o paciente e inserirá nele alguns dados como idade, peso, sexo e outras informações relevantes. O equipamento consta de um pequeno alto-falante e um microfone receptor.
O ouvido do paciente será excitado por um pequeno pulso de som e
imediatamente o microfone incorporado captará esse som. Um sistema eletrônico converte os sinais em informação capaz de ser processada por um microcontrolador digital. Vários dados serão levantados em questões de segundos, e o sistema mostrará através de um display os resultados preliminares, através de um sistema de processamento digital de sinais e uma análise baseada em comparação com levantamentos médicos. Usando como referência um determinado conjunto de sintomas, o sistema indicará, por exemplo, que o paciente apresenta 98% de probabilidade de ter funcionamento normal do ouvido, ou se baixar de 80% se recomendará o download dos dados para um computador pessoal, de forma a utilizar programas mais elaborados de diagnóstico para ver se o problema é da doença X ou Y. Nesse caso o processamento será feito por comparação e pela inserção de um maior número de variáveis, como por exemplo, a cidade de nascimento do paciente, onde pode ser comparado com dados levantados de surdez por motivos A ou B. O engenheiro apresentou um anteprojeto ao seu supervisor, com a estimativa inicial de custos e cronogramas de implementação, incluindo o estudo do fenômeno e os honorários de um médico especialista da área, que ajudaria como médico consultor e que executaria os testes iniciais.
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Para que a direção da empresa possa tomar a decisão de produzir esse aparelho deverá haver certeza que vai obter um retorno financeiro razoável, já que para a concepção e desenvolvimento, deverá haver um investimento significativo de recursos.
Para isso, a
direção deu sinal verde ao engenheiro para que faça uma previsão cuidadosa com respeito às especificações preliminares e pesquisar quais das possíveis entidades financiadoras6 que poderão aportar recursos ao projeto, que por ser de utilidade pública, o projeto se encaixaria dentro das exigências para ser contemplado com recursos a fundo perdido. Além disso, o engenheiro deverá pesquisar quais as exigências da Associação de Vigilância Sanitária para ver as normas e os requisitos mínimos de aceitação que esse tipo de dispositivos deve respeitar, e que tipo de testes certificados deve ser feitos e por quais laboratórios e em que tipo de ser vivo7. A direção solicitou também que o engenheiro faça uma aproximação dos custos de produção, estudos dos valores de produtos concorrentes e um levantamento da existência ou não desse tipo de aparelho nos hospitais da área.
O estudo deverá ser
complementado com um estudo do mercado alvo: hospitais, médicos e fonoaudiólogos, por uma expectativa de venda em unidades de por mês e ano, possibilidade de exportação e estimativa de preço de venda máximo e mínimo, além de comissões e da previsão dos lucros esperados para um, dois e três anos.
O engenheiro não deverá esquecer os custos
relacionados ao marketing e design.
Figura 1-3 – Aparelho proposto pelo engenheiro.
Se houver a decisão de produzir tal equipamento, os membros da direção da empresa procurarão dentre os senadores estaduais, qual deles prega por investimentos no setor da saúde pública, para posteriormente tentar propor a elaboração de um projeto de lei ao respeito das doenças do ouvido e o seu custo para a sociedade e para a própria pessoa doente. Algumas restrições foram estabelecidas ao engenheiro no sentido de que o dispositivo deverá demorar no máximo um minuto para emitir o diagnóstico preliminar, deverá ser fácil de usar por uma enfermeira, ser portátil, ter autonomia de pelo menos uma semana em regime de uso normal de dez vezes por dia. O sistema deverá ter também compatibilidade elétrica para efetuar a descarga dos dados a um computador pessoal e o software deverá ser No Brasil, algumas entidades financiadoras de projetos são o CNPq, FINEP, Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa,, SEBRAE e outras.
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Um colega meu sempre fala brincando que os estagiários de engenharia são os melhores espécimes esse tipo de testes. ☺ Descobrindo a Engenharia: O Método
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compatível com o sistema operacional mais comum do mercado.
Deverá também o
equipamento ser vendido com um carregador de baterias com entrada de 80V a 240V. As dimensões devem ser compactas para poder ser usado com uma mão.
A direção da
empresa deseja ter os relatórios contendo as especificações preliminares e estimativas de custo dentro dos próximos 60 dias, para que o projeto possa entrar no planejamento estratégico da empresa.
SURGIMENTO DA SOLUÇÃO Para o engenheiro o problema está em selecionar a forma mais eficiente de transformar as informações da resposta do ouvido (estado EI) em um conjunto de informações diagnósticas (estado EF) de probabilidades de normalidade ou anormalidade. O sistema ainda deverá se adaptar a vários fatores condicionantes: a ponteira com o microfone e alto-falante deve ser pequena o suficiente para caber no ouvido do paciente; deverá contar com um sistema de segurança para que em caso de falha, o pulso sonoro emitido não possa danificar o tímpano; as dimensões devem ser compactas para ser portátil e a eletrônica deve ser de baixo consumo. Outros fatores condicionantes são as normas e a legislação vigente para esse tipo de aparelho.
O preço do concorrente também é fator
condicionante, já que o produto deve ser mais barato, desde que apresente a mesma funcionalidade. Além disso, a solução deverá ser a melhor que se possa preparar no prazo estipulado de 60 dias. No projeto do sistema o engenheiro aplicará os seus conhecimentos, a sua criatividade, experiência e bom senso para comparar as várias formas de obter os objetivos especificados.
O engenheiro deverá optar por um determinado tipo de solução ou de
preferência por uma solução que seja genérica para as várias formas possíveis de aplicação, por exemplo: para o seu uso nos próprios consultórios médicos e dos fonoaudiólogos, e nos postos de saúde, clinicas e hospitais. Durante o projeto o engenheiro sente a necessidade de tratar com muitas pessoas de diversas atividades.
Conversando com os médicos, enfermeiras e fonoaudiólogos, ele
conhece as preferências dos possíveis usuários, além das características de aplicabilidade nos possíveis pacientes. Conversando com o setor de vendas e marketing, ele conhece a forma de projetar o visual e a funcionalidade da interface.
Conversando com o setor de
produção, ele verifica quais métodos e dispositivos são os que apresentam o menor custo de produção. Ele deverá estar em contato constante com a direção da empresa e com o setor de compras, que efetua os levantamentos das partes do projeto. No final do processo do projeto e depois de ter tomado várias decisões com respeito da forma mais eficiente de implementação, o engenheiro apresentará a proposta para os diretores da empresa acompanhado da estimativa dos custos de produção, os lucros esperados e o fator de risco envolvido.
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1 .2 .2 . Uma Escova de Dente Elétrica Muito Especial SURGIMENTO DO PROBLEMA O departamento de engenharia de uma grande empresa, motivada pelos esforços permanentes da direção para a criação de novos produtos, propôs que uma escova de dente com acionamento elétrico e características únicas que poderia apresentar boas perspectivas comerciais.
Além disso, uma grande indústria de higiene bucal tinha desenvolvido uma
pasta de dentes muito especial, que para atingir a sua máxima eficácia, precisaria de uma escova muito especial, e por isso por causa disso, estava procurando uma empresa parceira para o desenvolvimento de uma nova geração de escovas de dente elétricas. Com o aceite da direção, foi constituída a equipe de engenheiros que iria estudar em detalhe as alternativas mais eficientes de fabricação e as formas mais adequadas de introdução do produto no mercado consumidor. Estudos preliminares apontaram para uma boa aceitação. Além disso, foi comprovado que o produto teria certas vantagens no sentido de melhorar a higiene bucal com relação às escovas elétricas convencionais e as manuais, e ainda, que os custos de produção seriam favoráveis.
Figura 1-4 - A engenharia em ação para ajudar na saúde das pessoas (cortesia da Royal Philips Electronics).
Nessa etapa inicial surgem as típicas perguntas da direção: qual o diferencial do produto? O que o faz tão especial? Qual é a estimativa de retorno financeiro em um e dois anos?
Quanto à empresa deverá gastar no projeto?
Em quanto tempo se amortizará o
custo do projeto? Qual é o fator de risco de investimento?
SURGIMENTO DA SOLUÇÃO Inicialmente os engenheiros começaram estudando as características técnicas que seriam necessárias para o início do projeto. Foram consultados odontologistas e químicos farmacêuticos sobre o assunto. Também foram contatados os responsáveis pela fabricação da nova pasta de dentes, para saber das especificações e os pré-requisitos técnicos. Houve Descobrindo a Engenharia: O Método
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também a procura no banco de patentes para ver qual o campo de ação disponível, assim como também ver se poderia ser mais barato o aluguel de alguma patente, que mesmo com pagamento de royalties8, diminua o custo do projeto total a longo prazo.
Foram
consultadas centenas de papers9 científicos que tratam sobre o mesmo assunto, assim como as normas das associações de vigilância sanitária. Nesta etapa começam a surgir os fatores condicionantes do projeto. Além dos fatores condicionantes anatômicos (ex. a o cabo, cabeça da escova e as cerdas devem ser de tamanho, comprimentos e formas especiais) existem os fatores condicionantes dos materiais a serem empregados e o peso total do produto. Os fatores condicionantes técnicos levantados são os seguintes: a nova pasta de dentes é menos viscosa que as tradicionais, isso permite que possa ser criada uma ação limpadora dinâmica mais eficiente para a limpeza dos dentes e das gengivas.
A pasta
deverá caber no invólucro do cabo da escova, já que ela deve dosada durante a escovação. Deverá haver um conduto com acionamento de transporte de pasta de dentes até a cabeça da escova. O movimento da cabeça da escova deverá ser com vibração em alta velocidade para liquefazer a pasta de dentes especialmente formulada de forma a criar uma ação de limpeza ótima da placa bacteriana.
Figura 1-5 – Fatores condicionantes físicos (cortesia da Royal Philips Electronics e Procter & Gamble)
Os engenheiros decidiram também pela incorporação de um microcontrolador digital de forma a permitir a inclusão de novas funcionalidades que possam ser patenteadas. Incluíram e patentearam as marcas de uma função denominada Smartimer®, que nada mais é que um timer de dois minutos que sinalizam através de um alarme sonoro o tempo ótimo de escovação.
A funcionalidade Quadpacer® que sinaliza a cada 30 segundos com um
alarme sonoro para indicar que chegou a hora de mudar a limpeza para o outro quadrante da boca.
A funcionalidade Easy-Start® que permite um aumento lento incremental na
potência da vibração da escova nos primeiros 14 usos, para acostumar a pessoa com a nova
Royalty. É a importância cobrada pelo proprietário de uma patente de produto, processo de produção, marca ou autor de uma obra, para permitir a sua comercialização, fabricação ou uso. 9 Paper: é um artigo que relata o resultado de uma pesquisa original, publicado em revista especializada, ou incluído nos anais de congresso ou conferência em que tenha sido apresentado. 8
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forma de escovação. Outra característica sugerida foi a inclusão de um sistema de duas velocidades.
Figura 1-6 – Visão final da escova de dentes (cortesia da Royal Philips Electronics e Procter & Gamble)
Outro fator condicionante é a bateria, no que se refere ao espaço físico dentro do cabo e à autonomia da escova. Também foram colocados alguns LED10 indicadores. As cabeças da escova devem ser trocáveis e, portanto os engenheiros tiveram que resolver os problemas de vedação para não sair pasta de dentes pela fenda da junta que fica entre a parte fixa e a intercambiável. A cabeça deve ficar presa com força suficiente para que não escape acidentalmente durante o funcionamento. Entre outros problemas, os engenheiros tiveram que levar em consideração a vedação para evitar a entrada de umidade no circuito eletrônico, assim como a robustez a quedas de até 2 metros de altura em chão de concreto, sem sofrer danos maiores. A escova de dentes deveria vibrar três vezes mais rápido que as escovas elétricas convencionais, e mais de cem vezes mais rápido que as escovas manuais. As cerdas ainda se movimentam de frente para trás e de cima para baixo, impulsionadas por um transdutor piezelétrico especial, e cujo controle é feito por um microcontrolador digital. Apesar de parecer um produto relativamente simples olhando desde fora, a escova de dentes é uma maravilha tecnológica no seu interior.
Um conjunto de fios, componentes
eletrônicos, ímãs, transdutores e um microcomputador controlam o seu funcionamento. Esse último controla desde o preciso movimento da cabeça da escova até a carga das baterias.
Ainda no seu interior existe um ressonador a laser que mantém a precisa
velocidade de vibração necessária para a ação limpadora eficaz do fluido dental.
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LED: Light-Emitter Diode ou Diodo emissor de luz. Descobrindo a Engenharia: O Método
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Figura 1-7 – Detalhe da distribuição do fluido dental
UMA HISTÓRIA DE SUCESSO No ano de 1987, David Giuliani, um empreendedor de sucesso formado em engenharia elétrica, se associou com os professores da Washington University, os doutores David Engel e Roy Martin.
Eles formaram uma nova empresa chamada GEMTech para
promover um dispositivo de higiene dental usando um transdutor piezelétrico multiforme. No ano de 1989 a GEMTech conseguiu financiar o desenvolvimento de um protótipo. Depois de três anos e numerosas tentativas posteriores, se chega à conclusão que a tecnologia proposta não forneceria resultados práticos, resultando no primeiro fracasso da companhia. Na busca por patentes anteriores, eles encontraram uma tecnologia similar que se pensou ser mais apropriada e que poderia funcionar. Assim, a GEMTech tentou se associar com outras empresas para licenciar o novo produto, mas apesar de acharem o produto interessante, não conseguiram nenhuma parceria. Giuliani então conseguiu mais financiamento, desenvolveu um projeto e preparou o lançamento da sua escova sônica.
Em novembro de 1992, a escova Sonicare® foi
apresentada num congresso periodontal na Flórida. O primeiro periodontista que o Giuliane visitou solicitou 36 unidades no ato.
Figura 1-8 – O primeiro protótipo11
No ano de 1995 mais de um terço dos dentistas dos EUA recomendavam a escova de dente Sonicare aos seus pacientes. A GEMTech mudou de nome para Optiva Corporation. Então, em 1997, a revista Inc. Magazine nomeou a Optiva como sendo a empresa privada com o mais rápido crescimento dos EUA baseado no crescimento dos últimos cinco anos. Giuliane visitou a Casa Branca pela segunda vez, para receber o prêmio de Small Business Person of the Year do então vice-presidente estadunidense Al Gore. No mesmo ano, a Optiva lança a primeira campanha publicitária na televisão para o produto Sonicare®.
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Adaptado de http://www.sonicare.com/discover/sonicare_story/our_story.asp. Descobrindo a Engenharia: O Método
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A Optiva começa a atuar no mercado internacional em 1998 e as vendas continuam a crescer. No final do ano, a companhia já contava com mais de 500 funcionários. Em 1999 a Optiva Corporation muda a fábrica para uma nova instalação de mais de 15 000 metros quadrados. Então já contava com mais de 600 empregados. Em outubro de 2 000 a empresa Philips Domestic Appliances and Personal Care (DAP), uma divisão da Royal Philips Electronics adquire a Optiva Corporation. Em janeiro de 2001, a Optiva Corporation muda o seu nome para Philips Oral Healthcare Inc. Com a combinação de recursos da empresa original e a da nova dona, a Philips DAP a empresa soma esforços aumentando de forma impressionante a sua capacidade de desenvolvimento para uma nova geração de escovas dentais elétricas.
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final do ano de 2001, a companhia já produzira dez milhões de escovas, ficando em primeiro lugar de vendas nos EUA. Em 2002 foi lançada uma nova geração de escovas dentais elétricas, a Sonicare Elite alcançando sucesso instantâneo. Mais de 10 000 odontologistas já testaram pessoalmente o produto desde o seu lançamento. No ano de 2003, a nova escova é lançada no mercado consumidor, apresentando níveis máximos de conforto, higiene e de saúde oral.
1 .2 .3 .
Itaipu - A Maior Hidrelétrica do Mundo12
Uma grande obra se faz com muito ferro, concreto, tecnologia avançada e a incessante busca do homem pela conquista do impossível. Foram esses itens, que incluíram a Usina de Itaipu na lista das sete maravilhas do mundo moderno13. A lista, publicada em 1995 pela revista “Popular Mechanics”, dos Estados Unidos, baseou-se numa pesquisa feita pela Associação Norte-Americana de Engenheiros Civis (ASCE) entre engenheiros dos mais diversos países. Segundo a revista, as sete grandes obras de engenharia são “testemunho da capacidade do ser humano do século XX de alcançar seu grandioso destino: a conquista do impossível”. Além de Itaipu, fazem parte da lista: a Ponte Golden Gate (San Francisco, EUA); o Canal do Panamá (Panamá), que liga o Oceano Atlântico ao Pacífico; o Eurotúnel, que une França e Inglaterra sob o Canal da Mancha; os Projetos do Mar do Norte para o Controle das Águas (Holanda); o Edifício Empire State (EUA); e a Torre da Canadian National (Toronto, Canadá). A Usina Hidrelétrica de Itaipu, a maior em operação no mundo,
é um
empreendimento binacional desenvolvido pelo Brasil e pelo Paraguai no Rio Paraná. A potência instalada da Usina é de 12 600 MW, com 18 unidades geradoras de 700 MW cada. A produção recorde de 2000 - 93,4 bilhões de quilowatts-hora (KWh) - foi responsável pelo
Adaptado de Itaipu Binacional. Fonte: www.itaipu.gov.br. Uma curiosidade: ao listar as maravilhas do mundo moderno, a revista “Popular Mechanics” pretendeu que especialistas modernos repetissem o feito do grego Antípater, que no ano 240 antes de Cristo listou as sete maravilhas do mundo antigo: as pirâmides do Egito, os jardins suspensos da Babilônia, o Mausoléu, o Templo de Artêmis e Éfesos, a estátua de Zeus de Fídias, o Colosso de Rodes e o Farol de Alexandria.
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suprimento de 95% da energia elétrica consumida no Paraguai e 24% de toda a demanda do mercado brasileiro.
Figura 1-9 - Brasil e Paraguai se unem em Itaipu (Cortesia de Itaipu Binacional)
SURGIMENTO DO PROBLEMA Estudos técnicos de engenharia na década de 1960 indicavam para uma eventual falta de energia no Brasil a médio e longo prazo, levando em consideração o ritmo de aumento da produtividade e do PIB14. Os investimentos em infra-estrutura são sempre de longo prazo, e por isso, as decisões de investimentos na área devem ser feitos no curto prazo para evitar o desabastecimento e o possível colapso industrial e econômico.
A Usina de
Itaipu é resultado de intensas negociações entre os dois países, que ganharam impulso na década de 60.
SURGIMENTO DA SOLUÇÃO Em 1970, o consórcio formado pelas empresas de engenharia IECO (EUA) e ELC (Itália) venceu a concorrência internacional para a realização dos estudos de viabilidade e para a elaboração do projeto da obra. O início do trabalho se deu em fevereiro de 1971. Em 26 de abril de 1973, Brasil e Paraguai assinaram o Tratado de Itaipu, instrumento legal para o aproveitamento hidrelétrico do Rio Paraná pelos dois países. Em maio de 1974, foi criada a entidade binacional Itaipu, para gerenciar a construção da usina. O início efetivo das obras ocorreu em janeiro do ano seguinte.
O Rio Paraná devia ser desviado O dia 14 de outubro de 1978 foi um grande marco na construção de Itaipu. Nesse dia, foi aberto o canal de desvio do Rio Paraná, que permitiu secar um trecho do leito original do rio para ali ser construída a barragem principal, em concreto.
Acordo de três países Outro marco importante, na área diplomática, foi a assinatura do Acordo Tripartite entre Brasil, Paraguai e Argentina, em 19 de outubro de 1979, para aproveitamento dos
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PIB: Produto Interno Bruto. Descobrindo a Engenharia: O Método
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recursos hidráulicos no trecho do Rio Paraná desde as Sete Quedas até a foz do Rio da Prata. Este acordo estabeleceu os níveis do rio e as variações permitidas para os diferentes empreendimentos hidrelétricos na bacia comum aos três países.
Surge o reservatório Em 13 de outubro de 1982, com a conclusão das obras da barragem de Itaipu, as comportas do canal de desvio foram fechadas e começou a ser formado o reservatório da usina. O Lago de Itaipu, com área de 1 350 km², foi formado em apenas 14 dias. Nesse período, as águas subiram 100 metros e chegaram às comportas do vertedouro às 10 horas do dia 27 de outubro. Durante a formação do reservatório, equipes do setor ambiental de Itaipu percorreram em barcos e lanchas toda a área que seria alagada, salvando centenas de espécies de animais da região, em uma operação conhecida como “Mymba Kuera”, que em tupi-guarani quer dizer “pega-bicho”.
Figura 1-10 – Vista de um condutor (Cortesia de Itaipu Binacional)
A Usina começa a operar No dia 5 maio de 1984, entrou em operação a primeira unidade geradora de Itaipu. As 18 unidades geradoras foram sendo instaladas ao ritmo de duas a três por ano. A 18ª entrou em operação em 9 de abril de 1991. Mas o projeto original de Itaipu foi concebido prevendo a instalação de 20 unidades geradoras. As duas adicionais seriam instaladas quando o aumento de produção da usina fosse conveniente e necessário para atender os interesses do Brasil e do Paraguai. Por isso, em 13 de novembro de 2000, os presidentes do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, e do Paraguai, Luis Gonzáles Macchi, participaram em Itaipu da assinatura do contrato para instalação das duas novas unidades.
Mais duas unidades geradoras em 2005 Descobrindo a Engenharia: O Método
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A fabricação e instalação das unidades estão a cargo do Consórcio Ceitaipu, que venceu uma licitação internacional. O contrato previa a conclusão do comissionamento da unidade em 50 Hz e a de 60 Hz para Maio de 2005. A capacidade instalada de Itaipu passaria, então, de 12 600 para 14 000 MW.
Figura 1-11 - No berço de uma das unidades geradoras (02/2002 - Cortesia de Itaipu Binacional)
Figura 1-12 - Colocação do gerador (Cortesia de Itaipu Binacional)
Produção ano a ano A tabela a seguir mostra a produção anual real de energia da usina nos 18 anos compreendidos entre 1984 e 2002. ANO
Nº. DE UNIDADES INSTALADAS
PRODUÇÃO ANUAL DE ENERGIA (GWh)
1984
0-2
277
1985
2–3
6 327
1986
3-6
21 853
1987
6-9
35 807
1988
9 - 12
38 508
1989
12 - 15
47 230
1990
15 - 16
53 090
1991
16 - 18
57 518
1992
18
52 268
1993
18
59 997
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1994
18
69 394
1995
18
77 212
1996
18
81 654
1997
18
89 237
1998
18
87 845
1999
18
90 001
2000
18
93 428
2001
18
79 307
2002
-
82 914
Total:
-
1 123 657
Conforme mostra esta tabela, Itaipu vem batendo sucessivamente seus próprios recordes (que são mundiais) de geração anual de energia por uma só usina. Já em 1995 o desempenho energético de Itaipu foi 3% superior aos 75 000 GWh/ano previstos no projeto, subindo para 9% em 1996, saltando para 19% em 1997, recuando para 17% em 1998 e ultrapassando a marca dos 20% em 2000. A usina só não havia ultrapassado a marca dos 90 000 GWh/ano já em 97 e 98 devido aos vendavais que provocaram a queda das torres do sistema de transmissão de Furnas, em 2 de novembro de 1997 (10 torres) e em 6 de abril de 1998 (7 torres), paralisando metade da usina, correspondente às unidades 10 a 18, que operam em 60 Hz.
Figura 1-13 – UN 18ª (Cortesia de Itaipu Binacional)
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Figura 1-14 - Roda da turbina da UN 18ª (Cortesia de Itaipu Binacional)
EVOLUÇÃO DA CONSTRUÇÃO15
O leito original do Rio Paraná, com as pedras da ilha de Itaipu16, local escolhido para a construção da barragem principal.
Início das obras do Canal de Desvio do Rio Paraná, para secar o leito original e assim permitir a construção da barragem principal (1975/76).
Depois da escavação de terra e rocha, começa a ser construída a estrutura do Canal de Desvio (1976/77).
Cortesia de Itaipu Binacional. Itaipu: do guarani Itá (pedra) + Ipú (explosão ou barulho). Esse nome da usina foi herdado da ilha que serviu como base para a construção da usina. A ilha de Itaipu possuía pequenas pedras ocas que no descer das águas provocava sons na forma de pequenos estalidos que podiam ser ouvidos da beira do rio – uma maravilha da natureza.
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Abertura do Canal de Desvio - início da explosão de uma das ensecadeiras de concreto em arco.
Explosão das ensecadeiras para permitir a passagem do Rio Paraná pelo Canal de Desvio (1978).
O Rio Paraná começa a passar pelo Canal de Desvio (1978).
Em 1979, tem início o trabalho de drenagem, para secar o leito original do rio.
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Leito original do rio praticamente seco, permitindo o início das obras civis da barragem principal (1979).
Vista parcial da obra à noite - durante o pico da construção, o trabalho de concretagem tomava 24 horas por dia, em turnos ininterruptos.
Obras civis da barragem principal avançam no leito do rio (1980).
A barragem fica pronta, permitindo a formação do reservatório (1982)
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Vista aérea de Itaipu: a gigantesca obra está concluída.
EQUIPAMENTOS INSTALADOS
Casa de Força Casa de Força (18 unidades inclusive áreas de montagem) - m Comprimento
968
Largura
99
Altura
112
Nível de cobertura
148
Nível do piso dos geradores
108
Espaçamento entre unidades
34
Figura 1-15 - Vista transversal da casa de força (Cortesia de Itaipu Binacional) Tomada D’Água Caminho de rolamento (m) Distância entre eixos
10,00
Comprimento total
857,6
Cota do topo dos trilhos
225
Condutos Forçados Quantidade
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Peso de cada conduto (t)
883
Diâmetro interno (m)
10,5
Comprimento desenvolvido (m)
142,2
Descarga nominal (m³ / s)
690
Grades para Tomada D’Água Quantidade Painéis de grade por tomada
18 24 (m) 4,7 x 5,5
Guindastes Limpa-Grades Quantidade
2
Capacidade do gancho (kN)
200
Curso vertical do rastelo (m)
61,5
Capacidade do rastelo (m³ / kN)
2/2,5
Comportas de Serviço (tipo vagão) Quantidade
18
Vão livre (m)
8,2
Altura livre total (m)
19,3
Cota da soleira (m)
177,6
Vazão máxima pela comporta (m³/s)
750
Stop-logs Cota da soleira (m)
177,2
Vão livre (m)
7,5
Altura livre (m)
17,5
Quantidade
7
Pórticos Pórticos Quantidade
2
Capacidade (kN)
1 100/400
Veloc. máx. levant. do gancho 50/60 Hz (m/min.)
4,6/5,5
Veloc. mín. levant. gancho 50/60 Hz (m/min.)
1,7/2,0
Veloc. nominal de translação 50/60 Hz (m/min.)
25/30
Gerador
Figura 1-16 – Gerador (Cortesia de Itaipu Binacional)
Gerador Quantidade
18
Freqüência
60 Hz (9 un.) / 50 Hz (9 un.)
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Potência nominal
I
A
50 / 60 Hz (MVA) 823,6 / 737,0
Tensão nominal (kV) Nº. de pólos
18 50 / 60 Hz 66 / 78
Momento de inércia - GD2 (t.m²) Fator de potência
320 000 50 / 60 Hz 0,85 / 0,95
Peça mais pesada - rotor (t) Peso de cada unidade 50 / 60 Hz (t)
1 760 3 343 / 3 242
Turbina
Figura 1-17 – Turbina (Cortesia de Itaipu Binacional) Turbina Quantidade
18
Tipo
Francis
Potência nominal unitária (MW) Velocidade de projeto - 50 / 60 Hz (rpm) Queda líquida de projeto (m)
715 90,9 /92,3 118,4
Vazão nominal unitária (m³/s)
645
Peça indivisível mais pesada - rotor (t)
296
Peso de cada unidade (t)
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Figura 1-18 - Componentes do sistema de geração (Cortesia de Itaipu Binacional) Banco de Transformadores monofásicos 50 Hz 9 + 2 Unidades Reservas 60 Hz 9 + 2 Unidades Reservas Potencial Nominal de cada Banco 50 / 60 Hz (MVA) 825/768 Nível de Impulso (Fase/Neutro) Tensão Superior (kV) 1 550/110 Tensão Inferior (kV) 125 Tipo de Ligação - Y Peso de cada Transformador (kg) 217 x 103 (50 Hz) 189 x 103 (60 Hz) Resfriamento óleo e água forçados Subestação Isolada a Gás SF6 Tensão Nominal Máxima (kV)
550
Corrente Nominal (A)
4 000
Corrente de Interrupção Nominal (kA)
63
Quantidade de Disjuntores
52
Comprimento de Barramentos Blindados e Isolados a Gás SF6 (m)
7 500
Pressão de SF6 nos Disjuntores (kPa)
620
Quantidade de Chaves Seccionadoras
124
Quantidade de Transformadores de Corrente Quantidade de Transformadores de Potencial
396 24
Quantidade de Pára - raios
126
Massa de Gás SF6 (kg)
108 x 103
Sistema de transmissão transmissão Setor de 50 Hz Itaipu - SE Margem Direita (500 kV).
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Dois circuitos, cada um com cerca de 2 km de extensão. SE Margem Direita - Foz do Iguaçu (500 kV) Dois circuitos, cada um com cerca de 9 km de extensão. Itaipu - SE Foz do Iguaçu (500 kV) Dois circuitos, cada um com 11 km de extensão. Setor de 60 Hz Itaipu - SE Foz do Iguaçu (500 kV). Quatro circuitos, cada um com cerca de 8 km de extensão.
Figura 1-19 - Esquema do sistema de transmissão de energia elétrica de Itaipu (Cortesia de Itaipu Binacional)
COMPARATIVOS No mundo, atualmente, não existe nenhuma hidrelétrica do porte da Usina de Itaipu. Com sua potência instalada de 12 600 MW, está bem à frente da usina classificada em segundo lugar: Guri, na Venezuela, com 10 200 MW. Em terceiro lugar está a usina de Grand Coulee, nos Estados Unidos, com 6 500 MW, e em quarto a de Sayano Shushenskaya, na Rússia, com 6 400 de MW de potência instalada. A maior usina brasileira, Tucuruí, no Pará, tem potência instalada de 4 200 MW.
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Figura 1-20 – Comparação entre as maiores usinas geradoras (Cortesia de Itaipu Binacional)
Números Veja alguns números de Itaipu, que dão uma idéia de sua grandiosidade:
O volume total de concreto utilizado na construção de Itaipu seria suficiente para construir 210 estádios de futebol como o do Maracanã, no Rio de Janeiro. O ferro e aço utilizados permitiriam a construção de 380 Torres Eiffel. A vazão máxima do vertedouro de Itaipu (62,2 mil metros cúbicos por segundo) corresponde a 40 vezes a vazão média das Cataratas do Iguaçu. A vazão de duas turbinas de Itaipu (700 metros cúbicos de água por segundo cada) corresponde a toda a vazão média das Cataratas (1500 metros cúbicos por segundo). A altura da barragem principal (196 metros) equivale à altura de um prédio de 65 andares. O Brasil e o Paraguai teriam que queimar 434 mil barris de petróleo por dia para obter em plantas termelétricas a mesma produção de energia de Itaipu. O volume de escavações de terra e rocha em Itaipu é 8,5 vezes superior ao do Eurotúnel (que liga França e Inglaterra sob o Canal da Mancha) e o volume de concreto é 15 vezes maior.
ITAIPU x Três Gargantas Apesar da grandiosidade da hidrelétrica chinesa de Três Gargantas, que já está funcionando, Itaipu continuará sendo por muitos anos, a maior hidrelétrica do mundo no item mais importante de uma usina desse tipo: produção de energia. Itaipu já superou a marca de 93,4 bilhões de kWh/ano, enquanto que a previsão para Três Gargantas é de produzir 84 bilhões de kWh/ano com suas 26 máquinas de 680 MW cada - 20 MW a menos do que as máquinas de Itaipu, que têm 700 MW cada (veja o quadro comparativo abaixo). Em resumo, embora com potência instalada menor do que Três Gargantas e com oito unidades geradoras a menos, Itaipu tem um rendimento maior do que o especificado no projeto da hidrelétrica chinesa. Esse recorde só será mantido por que a Natureza está do nosso lado. A vazão do Rio Paraná é mais estável do que a do Rio Yang-tse, onde Três Gargantas está sendo construída. Além disso, as águas do "Paranazão" são reguladas pelas dezenas de usinas que existem acima de Itaipu.
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Parâmetros
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Itaipu
Turbinas
Três Gargantas 18 (700MW)
Potência Instalada Produção anual Concreto utilizado Altura Comprimento da barragem
26 (700MW)
12 600 MW
18 200 MW
93,4 bilhões kWh/ano
84,68 bilhões kWh/ano
12,57 milhões m³
27,94 milhões m³
196 metros
181 metros
7 700 metros (concreto, enrocamento e terra)
2 309 metros (só concreto)
Vertedouro: capacidade de vazão Escavações
62 200 m³/s
102 500 m³/s
63,85 milhões m³
113 milhões m³
Lago Extensão Área
Número de pessoas reassentadas
1 .2 .4 .
170 km
600 km
1 350 km²
1 084 km²
40 mil
1,1 milhão
A Ponte-Túnel da Chesapeake Bay
Por mais de 40 anos a Ponte-Túnel da baía de Chesapeake atrai a atenção do mundo
como
sendo
uma
das
grandes
maravilhas da engenharia moderna.
A
Ponte-Túnel provê uma ligação por cima e por baixo das águas da baía de Chesapeake, onde ela encontra o oceano Atlântico. Serve de ligação entre o condado de Northampton e a cidade de Virginia Beach, no estado norte-americano da Virginia, reduzindo o trajeto em 150 km o trajeto entre Virginia Beach e Wilmington. Pouco depois da finalização da obra, em
abril
de
1964,
a
Ponte-Túnel
foi
selecionada como “Uma das Sete Maravilhas da Engenharia do Mundo Moderno” numa competição mundial que incluía os mil maiores projetos do mundo. De ponta a ponta, a Ponte-Túnel mede mais de 28 km e é considerado o
Figura 1-21 – Vista da Ponte-Túnel da Chesapeake Bay. (Cortesia de Bridge and Tunnel Chesapeake Bay District)
maior complexo de ponte-túnel do mundo.
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A construção original desse trecho viário precisou de um projeto de dois túneis préfabricados de 1,5 km, duas pontes, 3 km de elevadas, 4 ilhas artificiais e 10 km de estradas17. Apesar de que os componentes individuais não são os maiores já construídos, a Ponte-Túnel é única no número de diferentes tipos de estrutura. Além disso, a construção foi feita sob severas condições climáticas impostas por furacões e pelo imprevisível oceano Atlântico.
SURGIMENTO DO PROBLEMA O problema surge da necessidade de melhorias de transporte de cargas e passageiros numa região altamente povoada.
A solução de construção de uma única ponte foi
descartada devido a restrições da armada naval norte-americana no risco de guerra e bombardeio. Os engenheiros não poderiam no seu projeto criar uma ponte acima dos dois canais de navegação. O projeto deveria contar com uma passagem subterrânea submarina nesses canais.
SURGIMENTO DA SOLUÇÃO Os túneis foram construídos sob dois dos maiores canais navegáveis do mundo, por exigência da marinha durante na Guerra Fria. A Atlantic Fleet está instalada em Norfolk e a marinha tinha medo de que uma sabotagem numa ponte possa bloquear os canais, isolando a frota do oceano. Essa foi o principal fator condicionante que os engenheiros tiveram que levar em consideração no projeto global, além das fortes correntezas e os constantes furacões.
Figura 1-22 – Localização da Ponte-Túnel da baía de Chesapeake
17
Fonte: www.cbbt..com . Descobrindo a Engenharia: O Método
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Figura 1-23 – Vista de um porta-aviões atravessando o canal (Cortesia de Bridge and Tunnel Chesapeake Bay District)
Figura 1-24 – Vista de duas das quatro ilhas artificiais (Cortesia de Bridge and Tunnel Chesapeake Bay District)
Os engenheiros tiveram que dedicar muita atenção nas formas de construir aquilo que projetaram[8]. Geralmente o método de construção é uma parte do problema. Nesse, como em todos os problemas de engenharia sempre existe uma íntima relação entre as características físicas da estrutura e os métodos de construção. Na construção da PonteTúnel foi necessária a construção de máquinas especiais num total de US$ 14 milhões, elevando o custo total da obra para US$ 140 milhões (10%). A viabilidade econômica depende em grande parte da capacidade do engenheiro de elaborar um projeto que de início minimize os custos de produção satisfazendo ao mesmo tempo os requisitos operacionais, assim como os requisitos econômicos.
1.2.5.
A Falkirk Wheel (Roda Falkirk)
Na Escócia, ligando dois canais que estão desnivelados 35 metros um do outro, a Falkirk Wheel é uma solução inovadora para um antigo problema de transferir pequenos barcos entre esses canais, que da forma tradicional, requereria a construção de 11 exclusas de elevação. Descobrindo a Engenharia: O Método
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A British Waterways, empresa pública do Reino Unido, apresentou uma solução diferente e junto à Morrison-Bachy-Soletanche, Arup Consultants, Butterley Engineering e RMJM, criaram a Falkirk Wheel.
Figura 1-25 - Vista da Falkirk Wheel.
O projeto revolucionário da Falkirk Wheel explora a simplicidade da física utilizando o mínimo de energia para girar uma massa fenomenal de água e aço com graça e elegância. A Falkirk Wheel é capaz de levantar 600 toneladas de água a 35 metros em menos de 4 minutos. A roda é impulsionada por 10 motores hidráulicos que giram duas exclusas, onde podem ser acomodados até quatro embarcações de 20 metros de comprimento de cada vez. Apesar do seu enorme tamanho, cada volta da roda praticamente não “gasta” água e a energia gasta é equivalente a de duas chaleiras com água fervendo.
O PROJETO O conceito original de uma roda agir como elevador de barcos data do século XIX, porém nunca foi seriamente considerada até a solução da Falkirk Wheel em 1994. As empresas Dundee Architechts e Nicoll Russel Studios apresentaram um projeto na forma de uma roda de Ferris (roda gigante usada nos parques de diversões) que foi usado para reservar fundos para o projeto. O desenvolvimento do projeto foi então executado por um consorcio encabeçado pela empreiteira Morrison-Bachy-Solentache. Os engenheiros do consorcio redesenharam os projetos originais da Roda.
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Figura 1-26 - Vista aérea da Falkirk Wheel.
O objetivo principal foi o de criar um elevador de embarcações funcional que possa elevar e abaixar as mesmas de forma rápida e segura, possibilitando a conexão fluvial de dois canais históricos. As idéias e conceitos foram numerosos e variados, desde ovos rolantes até tanques balançantes, gangorras gigantes até trilhos suspensos, incluindo complexas estruturas de contrapesos dinâmicos. O resultado final foi a Falkirk Wheel que com sucesso combina funcionalidade e design, formando uma bela peça de escultura funcional. A forma única da estrutura foi inspirada em várias fontes, tais como: a lança celta de duas pontas, hélices de barcos, a caixa torácica de uma baleia ou as espinhas de peixe. Os arcos sobre o aqueduto também adicionam sensações à estrutura, formada por círculos completos com a reflexão no canal para provocar uma sensação de ser um túnel.
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Figura 1-27 – A Falkirk Wheel foi projetada para dar sensação de harmonia com o meio ambiente.
A CONSTRUÇÃO As várias partes da Roda foram construídas e montadas como um “Lego” gigante no local da empresa Butterley Engineering’s Steelworks. A montagem de 1 200 toneladas de aço foi feita de forma extremamente cuidadosa para alcançar uma exatidão de 10 mm e assegurar o encaixe perfeito das peças.
Figura 1-28 – Montagem da Falkirk Wheel.
No verão de 2001, a estrutura foi desmantelada e transportada em 35 caminhões até Falkirk, colocada no chão, remontada em cinco grandes seções, e finalmente essas foram elevadas por um guindaste para a sua posição final. O total de 600 toneladas de peso das gôndolas cheias de água impõe esforços mecânicos oscilantes enormes na estrutura assim que ela gira sobre a sua espinha dorsal. As juntas de aço soldado podem ser susceptíveis à fadiga induzida por esses esforços constantes e para ainda tornar a estrutura mais robusta, as seções de aço foram aparafusadas entre si. Ao redor de 15 000 parafusos foram ajustados em 45 000 furos, e cada parafuso teve que ser apertado à mão.
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Figura 1-29 - Construção das peças componentes da Falkirk Wheel.
ENGENHARIA Escondido em cada extremidade, atrás do braço perto do aqueduto, existem duas engrenagens de 8 metros às quais estão fixadas uma das extremidades de cada gôndola. Uma terceira engrenagem está colocada no centro e fixada na parte superior do corpo principal. Duas outras engrenagens menores estão colocadas entre os espaços entre as três anteriores com os seus dentes conectando com seus dentes as engrenagens maiores e possibilitando o giro das gôndolas com relação à engrenagem central que é fixa.
Figura 1-30 - Mecanismo de funcionamento da Falkirk Wheel [cortesia de British Waterways].
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As duas gôndolas, que estão fixadas às engrenagens mais externas, irão girar na mesma velocidade, mas em direção oposta à Roda. Devido ao preciso balanceamento das gôndolas e ao seu simples, mas inteligente sistema de engrenagens, pequena é a quantidade de energia necessária para girar a Roda. De fato, o grupo de 10 motores eletrohidráulicos localizados dentro da espinha dorsal da Roda fornece a pequena quantidade de 1,5 kW de potência para poder girá-la.
1.3. Os Critérios Contraditórios na Solução dos Problemas de Engenharia Os problemas para o engenheiro surgem na identificação de alguma necessidade. A partir disso, o objetivo será traçado e os resultados serão projetados.
Na fase inicial, o
problema é definido de forma genérica, por exemplo, um “sistema de células de combustível”, ou mais genericamente, um “sistema de energia mais barato e sem poluição”. Os problemas podem surgir de necessidades inéditas ou de necessidades de competição. Um exemplo desses últimos são as empresas que projetam telefones celulares, onde elas tentam otimizar os seus produtos pela adição de mais serviços, memória, aumento da autonomia, câmaras de vídeo, rádio FM, serviços Web, aplicativos Java®, jogos, etc. Nesse caso, o engenheiro parte de informações dos produtos existentes da concorrência e traça um objetivo que permita melhorar o seu produto com relação ao da concorrência, ou equiparando, ou criando diferenciais, ou reduzindo os custos. Essas decisões são tomadas muitas vezes em conjunto com o presidente da companhia e os clientes. Em geral, as alternativas de solução para atingir os mesmos objetivos são numerosas, de forma que o engenheiro deverá utilizar dos seus conhecimentos adquiridos durante a sua formação e pela sua experiência profissional, usando de todos os seus talentos[8].
Na escolha da melhor solução, o engenheiro deverá confiar no seu senso
comum e no seu julgamento pessoal, já que não poderá demorar demais para tomar a decisão pela solução que acredita ser a mais viável.
Krick[8], comenta que “A arte da
engenharia compreende o engenheiro, para imaginar as soluções, e o discernimento para compará-las”. A maioria dos trabalhos de engenharia é “para ontem”. É normal o engenheiro ser pressionado para efetuar o seu trabalho o mais rápido possível. É comum nas empresas, o pessoal do departamento de vendas venderem um produto que ainda não foi totalmente projetado e nem produzido, se comprometendo com datas de entrega. Isso normalmente resulta em que o engenheiro pode não chegar a ter tempo hábil para conhecer todas as soluções possíveis. Nesses casos, ele terá que tomar decisões baseado na sua experiência e bom senso.
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Não se deve esquecer o fator econômico na solução de problemas de engenharia. Os resultados do trabalho do engenheiro devem ser acessíveis e consumir recursos limitados, além de possibilitar lucros para a companhia na qual ele trabalha.
Os produtos que o
engenheiro desenvolve devem ser baratos, atrativos, práticos, funcionais, robustos, confiáveis e duradouros. Todas essas características geralmente são antagônicas, e é onde o engenheiro deverá analisar quais delas são as mais importantes.
Assim, o engenheiro
deve manter um cuidado permanente com os custos de produção e a viabilidade econômica das soluções criadas. Os engenheiros sempre devem se preocupar com a viabilidade da produção dos seus projetos tanto do ponto de vista técnico quanto econômico-financeiro. Os engenheiros que projetaram a escova de dente elétrica da seção anterior se preocuparam com as características e funcionalidade dos materiais escolhidos de forma a que o seu produto tenha um preço acessível às pessoas e que ainda gere lucros razoáveis para a empresa. O engenheiro deve se preocupar com os vários aspectos do seu projeto e não somente com a concepção de um protótipo, mas deve olhar mais além. Praticamente
todos
os
problemas
de
engenharia
apresentam
objetivos
contraditórios[9]. Por exemplo, um fabricante de automóveis populares quer que os seus veículos tenham o melhor conforto, maior durabilidade, confiabilidade, potência, espaço interno, segurança, qualidade, menor consumo e melhor design. Tudo isso e ainda tem que ser mais barato que um não-popular. Obviamente isso pode parecer loucura, mas essa é a vida do engenheiro.
Assim, ele deverá conciliar os critérios que são contraditórios.
Por
exemplo, para reduzir custos, normalmente na falta de legislação específica como acontece nos países subdesenvolvidos (onde uma vida vale menos), se sacrifica a segurança. Retiramse do projeto os sistemas de segurança, tais como o air-bag18 e do sistema de freios ABS19 no lugar de tirar os “enfeites” do design, tais como as rodas de liga leve, o teto solar e o arcondicionado. Nos países desenvolvidos (onde uma vida vale mais) os itens de segurança são obrigatórios para todos os veículos de passageiros, e nesses casos, para reduzir custos, se sacrificam os itens de design e conforto. Você também poderá verificar que um automóvel popular de baixo custo consome mais combustível que um automóvel não-popular. I.e.20, porque existe uma política de marketing que sutilmente engana o consumidor tentando induzir à idéia de que automóvel popular tem custo menor que os convencionais.
Os
motores dos automóveis convencionais (não-populares) possuem melhor desempenho.
A
qualidade dos automóveis convencionais é melhor porque as suas partes são mais testadas e passam por exames mais rigorosos. Embora as peças sejam mais caras, as peças dos
18 Air-bag: sistema de segurança na forma de bolsa, que se infla numa colisão, com o objetivo de proteger os passageiros de um veículo.. 19 ABS: Anti-blocking Break System ou sistema de freio anti-bloqueante. 20 I.e.: “Id est” do latim, significa “Isto é”.
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automóveis convencionais duram muito mais e existe uma probabilidade bem menor de comprar uma peça com defeito do que nos automóveis populares. Então, somam-se às especificações técnicas contraditórias, o pano de fundo da legislação, as políticas, as normas e os costumes da sociedade em questão. O engenheiro deverá encontrar o equilíbrio satisfatório dentro desse mar de fatores condicionantes. Vários dos critérios podem não ter uma medida comum, que sirva como base para tomar as decisões do projeto, como por exemplo: qual é o peso que a segurança tem no projeto? Qual o peso do design? Qual o peso do custo final? Como medir esses aspectos? Como medir o fator de segurança? As decisões dos engenheiros são dificultadas por esses conflitos e pela subjetividade de alguns tópicos. Talvez surpreenda você que a maioria dos engenheiros pode passar mais tempo tratando com pessoas do que com as máquinas e seus cálculos. Ele usa bastante tempo do seu trabalho para contatar os clientes e fornecedores, dar instruções aos seus subordinados, responder questionamentos, trocar idéias, procurar aprovações e solicitar cooperação.
A capacidade de manter boas relações pessoais com o objetivo de somar
esforços para atingir um objetivo comum é essencial na profissão da Engenharia, e pode ser o diferencial na escolha de um profissional ainda se sobrepondo ao critério técnico. Em geral, os engenheiros passam muito pouco tempo trabalhando com objetos, como o fazem os técnicos mecânicos, químicos e eletricistas. Colocar a “mão na massa” não é uma tarefa comum dos engenheiros, apesar de que a maioria de nós engenheiros gostaria de fazer isso o tempo todo. Imagine um Engenheiro Civil trabalhando na colocação de tijolos nas paredes de um prédio.
Obviamente é mais barato contratar um pedreiro para fazer isso, e
provavelmente, o pedreiro vai fazer o mesmo trabalho mais rápido e mais bem feito. Se o Engenheiro Civil, mesmo assim, quiser participar com as mãos do levantamento das paredes, provavelmente a obra ficará um caos, já que os outros membros da equipe podem chegar a ficar sem coordenação, e a obra extrapolar o seu cronograma, aumentando os seus custos. Analogamente, você pode imaginar um Engenheiro Eletricista ajudando a passar os fios e conectando os motores numa grande fábrica; um Engenheiro Eletrônico montando computadores e instalando softwares; um Engenheiro Químico provocando reações termoquímicas num laboratório; um Engenheiro Mecânico soldando a comporta de uma hidrelétrica ou um Engenheiro Agrícola montando um silo ou uma colheitadeira. Os engenheiros passam mais tempo abstraindo idéias, supervisionando trabalhos, resolvendo problemas e conciliando conflitos. Geralmente são os técnicos que constroem e testam os protótipos idealizados pelos engenheiros, sendo esse último quem trabalha com as informações e cálculos, comunicando-se e supervisionando equipes, mais do que trabalhando com máquinas ou colocando a “mão na massa”. O engenheiro coloca a mão na massa normalmente só nos primeiros três ou quatro anos de trabalho profissional. Assim, é pouco provável que um jovem que goste de montar e desmontar equipamentos, fazer experiências químicas, construir com as próprias mãos, seja mais apto para a engenharia Descobrindo a Engenharia: O Método
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do que outro jovem que goste de atividades mais abstratas. O profissional da Engenharia usa mais do raciocínio que das mãos, sendo treinado para isso. Conheci muitos técnicos brilhantes que não se deram bem na graduação em Engenharia, e muitos jovens sem treinamento técnico algum, que hoje são grandes engenheiros. Algumas pessoas têm a falsa idéia que a graduação em Engenharia é a continuação do curso técnico. Isso não é verdade, já que a continuação do curso técnico é o curso técnico superior21. Tanto na escala macro quanto micro, as obras da Engenharia são sistemas complexos.
Quanto maior na escala Macro ou menor na escala Micro, maior o nível de
complexidade.
Um pequeno circuito integrado pode estar composto de milhões de
transistores interconectados entre si na forma de uma máquina extremamente complexa. A máquina que produz esses circuitos integrados pode ser mais complexa ainda. O projeto de uma usina hidrelétrica pode conter milhares de variáveis relacionadas umas com as outras. Por causa dessa enorme complexidade, típica dos projetos de engenharia e da grande quantidade de conhecimentos necessários, os projetos devem ser feitos por equipes multidisciplinares de engenheiros. Por exemplo, para a fabricação de circuitos integrados são necessários Engenheiros Químicos e de Materiais, além dos Eletrônicos (sem esquecerse dos bacharéis em Física). Quando o sistema é composto de vários subsistemas, cada subsistema pode ser projetado por uma equipe especial de engenheiros, como é o caso das montadoras de automóveis.
Uma equipe projeta os sistemas mecânicos de propulsão
(motor), composta por Engenheiros Mecânicos e Eletrônicos, outra equipe de Engenheiros Mecânicos e de Materiais projeta o sistema do chassi, da tração e suspensão, outra equipe de Engenheiros Químicos, Mecânicos e de Plásticos projetam os revestimentos e pinturas; outra de Engenheiros Eletrônicos e de Plásticos, os painéis; e assim sucessivamente, e no final, os Engenheiros Industriais integram tudo isso num projeto só, constituindo um sistema único. Somado a tudo isso, a função do engenheiro se relaciona com a identificação das necessidades do ser humano[8] e do seu entorno, por exemplo, com a obtenção de novas fontes de energia e formas otimizadas de aproveitamento dos recursos naturais de forma a obter mais com menos, de forma sustentável, com o objetivo de beneficiar a humanidade com as suas obras.
O engenheiro deve se preocupar com a aceitação da sua obra pela
sociedade para a qual trabalha e as suas repercussões futuras, tanto objetivas quanto subjetivas, e as preferências dos usuários.
O trabalho do engenheiro está intimamente
ligado com as necessidades sociais e com a interação das suas obras com a sociedade. É o significado social do trabalho do engenheiro, somado aos aspectos econômicos e financeiros dos problemas, que torna menos técnica a sua função. Mas nem por isso a mesma ficará menos técnica, pelo contrário, a sua função fica mais complicada.
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Também conhecido como tecnólogo. Descobrindo a Engenharia: O Método
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A Abrangência dos Problemas da Engenharia Os problemas de engenharia apresentam tipos de atividade bem variados, atendendo
interesses e capacidades muito diferentes. Para poder ilustrar a abrangência dos problemas da engenharia, pode-se tratar dois problemas hipotéticos. O problema PA consiste no caso de um engenheiro que deve participar na concepção de um sistema que implementa uma interface de um computador com as ondas cerebrais de um eventual usuário. A entrada são as ondas cerebrais e a saída é a movimentação do ponteiro cursor na tela do computador. A solução poderá ser usada por todas as pessoas (clientes) que possuírem um computador pessoal. Neste caso, o cliente é genérico e nãoconhecido, porém se sabe, são pessoas humanas. No caso, não há equipamentos existentes conhecidos e não se sabe ainda como fazer um orçamento. O problema PB consiste no caso de um engenheiro empregado de uma empresa que presta serviços de especificação, instalação e operação de sistemas de energização através de geradores a diesel e de outros sistemas automáticos que possibilitam redução de custos de energia nos horários de ponta de consumo. A solução depende de cada cliente, em geral, são grandes indústrias dos mais variados tipos e requisitos. Neste caso, o engenheiro deve se familiarizar com o tipo de processo envolvido na indústria em questão e somente depois desenhar um sistema adaptado às necessidades do cliente. Os componentes da solução já estão prontos e na sua maioria são fabricados pela empresa do engenheiro e, portanto o orçamento independe de novos desenvolvimentos. Uma vez elaborado o orçamento, é repassado ao cliente para a sua aprovação.
Depois de aceita a proposta, o engenheiro
acompanhará a instalação e os testes iniciais até a posta-em-marcha do sistema, e posteriormente se manterá sempre em contato até que as características de funcionamento sejam consideradas rotineiras. O PA se refere a um sistema eminentemente novo, cuja natureza ainda não é bem conhecida, sendo pequena a experiência anterior que possa direcionar à solução ótima. As incertezas são grandes e é necessário muito esforço mental. Na busca pela solução, muitos dos conhecimentos ainda não são existentes, havendo que conduzir pesquisas para poder atingir o objetivo. O PB está relacionado com a aplicação de componentes e dispositivos já disponíveis para adaptar às necessidades de clientes bem conhecidos. Neste tipo de trabalho os engenheiros têm à disposição um grande acervo de experiência neste tipo de solução em condições semelhantes, sendo este tipo de trabalho relativamente repetitivo. A principal característica do PA é o seu caráter precursor e inovador e a do PB é adquirir conhecimento completo das necessidades de cada cliente em particular.
Nas
tarefas do tipo PA, o engenheiro encontra oportunidades em contribuir com algo novo para a humanidade, enquanto que a oportunidade no PB é de contribuir diretamente para com um
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cliente e de acompanhar os resultados obtidos. Ambos os tipos de problemas podem proporcionar a satisfação ao engenheiro. Os dois problemas citados anteriormente estão nas duas extremidades na vasta abrangência das atividades do engenheiro, como mostra a Figura 1-31.
Figura 1-31 – Abrangência dos problemas de engenharia.
Os projetos de sistemas, tais como um sistema de limpeza bucal sem o uso das mãos, um reator de fusão nuclear, uma estrada à prova de acidentes, uma fábrica de componentes eletrônicos e um software de computador ficam compreendidos dentro da sua vasta abrangência. A solução de cada um desses problemas requer a aplicação do processo da solução que será tratado no próximo capítulo. Em cada caso, há um objetivo declarado e um problema específico a ser resolvido.
1.5.
Conclusões sobre os Problemas de Engenharia O engenheiro antes de tudo é um solucionador de problemas. Assim como se espera
que o médico resolva um problema de doença, ou um advogado um problema de justiça, espera-se do engenheiro, por exemplo, resolver um problema técnico de aumento e otimização da produção de alimentos para eliminar a fome do planeta; se o problema for de poluição, espera-se que o engenheiro resolva isso criando motores de combustão mais sofisticados e com melhor desempenho, catalisadores para os gases do escapamento, formas de propulsão não poluentes, etc. O trabalho do engenheiro parte de uma necessidade ou requisito a ser satisfeito, formulado em termos genéricos inicialmente e depois de uma análise mais apurada resulta numa lista de especificações, dispositivos, estruturas e processos que satisfazem as necessidades de forma econômica. Para chegar a uma solução adequada, dentre as várias existentes, o engenheiro deverá tomar decisões a partir dos seus conhecimentos, do seu talento, da sua experiência e deverá gerar os critérios necessários para arbitrar os conflitos e as contradições. Normalmente o tempo é limitado e não há como analisar em detalhe todas as possíveis soluções a partir de dados incompletos, e às vezes, contraditórios.
Dessa forma, o
engenheiro deverá decidir de acordo com o seu bom senso e julgamento pessoal.
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É bastante comum que uma solução para um problema de engenharia não seja aceita por um cliente por não satisfazer os critérios de ordem econômica ou financeira. Normalmente essas empresas somente aceitam a contratação da solução quando o custo da mesma se encaixa nas suas possibilidades econômicas, visando lucros a curto e médio prazo.
1.6. 1.
Exercícios De forma análoga a análise dos itens 1.2.1 a 1.2.4, escolha uma complexa obra da engenharia moderna analisando o surgimento do problema e o da solução, identificando quais foram os principais fatores condicionantes e quais foram as soluções tomadas para contorná-los.
2.
Reflexionar sobre qual seria a atitude de um engenheiro para resolver um problema no qual não exista uma teoria conhecida na qual se basear.
3.
Selecionar algum dispositivo ou obra de engenharia e analisar os objetivos conflitantes que possam ter forçado uma decisão importante no desenvolvimento do projeto, de acordo com o discutido no item 1.3.
4.
Muitas decisões técnicas são tomadas pelas áreas administrativas das empresas e não, pela área de engenharia como deveria ser. Alguns desastres típicos dessas decisões são os “acidentes” dos ônibus espaciais Challenger e Columbia, onde os engenheiros recomendaram a suspensão da decolagem pela existência de problemas técnicos de alto risco. Reflexionar sobre como você reagiria numa situação dessas.
5.
É comum que o engenheiro tenha tempo limitado e exíguo para apresentar a solução de um determinado problema de engenharia.
Reflexionar sobre as possíveis
conseqüências negativas desse fato. 6.
Na Engenharia é comum o ditado que diz que os “engenheiros trabalham duas vezes o que são pagos, e são cobrados para produzir o triplo”. Reflexione sobre o assunto.
7.
Outro ditado comum diz que: “na engenharia, para ser viável, o projeto da soma de 2 + 2 deve resultar em pouco mais que quatro”. Reflexione sobre o ditado.
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