Yume
Kamile Gir達o
— Maldito! Por que fizeste isso? A raiva dele enegrecia o ambiente, enchia-o de ódio e desprezo. Seus olhos vermelho-escarlates fulminavam a fúria, exibiam-na ao mundo, mostrando o que todo o seu corpo sentia. Seus dentes pontudos e afiados pulsavam de seus lábios, prontos para atacar uma presa inexistente – nunca atingiria o seu adversário, aquele que ocasionara a sua raiva descontrolada. Este, o causador da sua desgraça, não se importava com o acesso de ódio que sentia. Que houvessem vários, inúmeros ataques, nada o faria reverter a situação. Politicamente correto. Um nada. — Se eu não fizesse, tu colocarias o mundo em risco! — proferiu sério, firme — Não percebes o mal que causarias? Não podes quebrar a ordem já existente! Nojento. — Pois saibas que correrei por todos os cantos deste mundo à procura do escolhido. — ameaçou o maldito, colérico — E tenhas certeza de que irei encontrá-lo, nem que precise ir ao inferno para buscá-lo! — Tentes, então. Atravessarás séculos, milênios, mas nunca irás desfazer o que já foi lançado. E não ponhas a tua esperança em um ser que, provavelmente, nunca existirá. — Verás, então. Verás. E o revoltado se levantou com dificuldade, saindo da sala assim que conseguiu se manter em pé. Desapareceu desde então, perdendo-se na imensidão dos séculos. Talvez sempre à procura daquele que quebraria a maldição que lhe fora lançada.
Sonho
1. As folhas secas caídas no chão faziam um barulho ensurdecedor quando eram pisadas. Era estranho ainda existirem folhas naquele lugar quando o inverno já estava tão avançado e rigoroso. A neve não parava de cair, e o frio era tão intenso que a garota sentia cada parte do seu corpo congelar. Onde realmente estava? A única coisa que se via era a existência de árvores secas, brancas por causa do acúmulo de neve, e espalhadas por todo lado. O céu estava bastante cinza devido à intensa névoa, e o lugar, deserto. Estava com medo e confusa. O único barulho que ela escutava era o de seu próprio coração, não se ouvia mais nenhum outro ruído. Um súbito desespero se apoderou dela. O que era tudo aquilo, e onde estava a saída? Andar se tornou uma difícil atividade naquele instante. O cansaço, as folhas e a neve no chão a impediam de caminhar direito, fazendo-a tropeçar várias vezes. O frio aumentava, e o fino vestido que a cobria não dava proteção contra o vento. Não dava mais, ela não estava aguentando! Até ali, só havia andado sem rumo e não achara ninguém, nenhuma saída, nada além de árvores. O cansaço chegou ao seu ápice, e a queda foi certa e pesada. Caíra de joelhos no chão. Sua respiração saía difícil, os pulmões congelados, e ela perdera a capacidade de falar. Desejava gritar, pedir ajuda, mas suas cordas vocais não produziam nenhum som, embora se esforçasse para fazê-lo – estava muda. O que fazer? Tinha de sair dali! Foi então que sentiu uma grande mão pousar sobre seus cabelos. Aquilo a assustou, mas o toque era de tal doçura que parte do seu medo desapareceu. A pessoa se abaixou, ficando de joelhos à sua frente para poder a olhar melhor. Ela levantou o rosto molhado e percebeu, estática, um rapaz de cabelos dourados. Não conseguia ver perfeitamente as suas feições, mas ele ainda estava com a mão sob seus cabelos, deslizando-a em direção ao seu rosto. A garota pôde, então, acalmar-se um pouco. Fechou os olhos e sentiu aquele singelo gesto, uma sensação de paz invadindo o seu peito.
Do rosto, a mão do jovem desceu em direção ao braço da mocinha, alcançado a pequena mão dela e segurando-a com força. Levantou-se e, ainda de mão dada com a menina, foi levantando-a em seguida, puxando-a levemente. Ela obedeceu, e eles ficaram frente a frente, somente se observando. Era estranha a sensação de tranquilidade que agora pairava entre os dois. Numa ação inesperada e inconsciente, a jovem se jogou nos braços do rapaz, envolvendo-o com força. Tudo sumiu. Agora só existiam ele e ela, unidos em um doce, longo e caloroso abraço. Somente agora tudo estava bem. — Nadia! Nadia, acorde, meu bem!
Berlim – Alemanha Quando Nadia abriu os olhos, não havia mais floresta, nem neve e nem cabelos dourados. Tudo o que via era apenas o teto com infiltrações e sua mãe, que a observava, aflita por causa do horário. Então, não havia passado de um mero sonho? Suspirou. — Ok, ok, sem repreensões. Já estou indo.