Mascotes Quer mesmo saber dessa história? Saco… vamos lá então. Não é como se fosse difícil para mim relatá-la: ela é fresca na minha cabeça, como se fosse ontem. Mas já faz uns bons anos, e eu sei disso. Não estou mais saindo com Lucas, e eu sei disso. Não consigo superar as imagens daquele dia, e eu também sei disso. Mas é... É essa a história: Eu estava nessa boate com Lucas Lucas, , um cara que conheci em um aplicativo de relacionamentos. Já era a quarta vez que saíamos. Ele era um sujeito bacana, bacana, com uma família legal. Ainda era estranho pensar que eu vinha
Responsavel
Rafael Zorzal
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Mascotes Quer mesmo saber dessa história? Saco… vamos lá então. Não é como se fosse difícil para mim relatá-la: ela é fresca na minha cabeça, como se fosse ontem. Mas já faz uns bons anos, e eu sei disso. Não estou mais saindo com Lucas, e eu sei disso. Não consigo superar as imagens daquele dia, e eu também sei disso. Mas é... É essa a história: Eu estava nessa boate com Lucas, Lucas um cara que conheci em um aplicativo de relacionamentos. Já era a quarta vez que saíamos. Ele era um sujeito bacana, bacana com uma família legal. Ainda era estranho pensar que eu vinha
Nome: Lucas Idade: 35 anos Nasc.: 07/10/201* Funcao: desconhecido Local: Rua **, n. 50. Bairro **.
da última geração “legal” de nascença desde… bem, vocês sabem do que eu estou falando. Lucas era mais velho, ele tinha trinta e cinco e era um baita de um fanfarrão – eu com meus vinte e quatro não era ninguém – mas eu até gostava disso nele. Ele via a vida de outro modo: era criança quando tudo começou. Sua mãe havia morrido de câncer um tempo antes de tudo parar... e ele não sabia se ficava mal por isso. Ela continuaria com câncer, apesar de continuar viva… para sempre. Então, estávamos na boate. Lucas dançava loucamente e eu só observava e ria. Aquilo não era para mim. Minha cabeça fugia para outros lugares: o controle de natalidade; meu pai sem emprego. Não precisava mais comer, mas não comer… era bem difícil. E tudo estava difícil naqueles tempos. Não que hoje em dia tenha melhorado alguma
coisa, muito pelo contrário, mas… enfim. Não gosto nem de pensar. Após as danças e bebedeiras, resolvemos sair. Eu me despedi de Lucas dando um selinho. Ele queria ir lá para casa, mas falei que não era um momento ideal. Eu estava cansada e só queria relaxar. Ele entendeu, e me acompanhou até meu carro. Ao chegar lá, nós nos beijamos um pouco até que entrei no carro. Lembro até hoje o “tchauzinho, Nanda” que ele me disse. Seria a última coisa que eu ouviria dele. No carro, sintonizei meu celular com o rádio. A internet estava um pouco lenta, então demorou um pouco. E isso mudou tudo. Esse tempo ocioso me permitiu olhar na esquina e ver Lucas colocando seus fones de ouvido enquanto um carro – lembro bem, um Uno bem antigo – o atropelou. Lucas voou na parede, e pude ver, mesmo que de longe, que uma de suas
pernas havia sido fraturada: eu podia até ver o osso! Sua calça branca estava agora de tom
vinho enquanto uma ponta branca saia de dentro do rasgo. Eu o ouvi gritar.
O carro parou. Dele, saiu
um homem que aparentava ter
mais de cem anos de idade. Ele estava sem camisa, e a luz do poste atravessava um buraco
bem no meio de sua barriga. Era bizarro de se ver. Era amedrontador! O tal velho
agarrou Lucas e o jogou no
banco de trás do Uno. Depois, partiu.
Eu queria ter feito algo,
eu deveria ter feito algo. Gritado, ter atropelado o
velho… sei lá. Mas eu congelei. Eu travei e… saco… eu só
não consegui. Uma crise de
ansiedade me acometeu. A cena
mais bizarra – até aquele momento – que eu já tinha presenciado. Então… Eu consegui me mover. Peguei o celular e liguei para a polícia, enquanto eu seguia aquele carro. Era difícil prestar atenção em tudo. No Uno, no telefone com a operadora que mal me respondia… ela me perguntou a placa do veículo sequestrador, e eu disse que ele não tinha. A maldita me acusou de trote! Eu tentei ficar na linha mais um tempo, mas fui desconectada. Resolvi continuar a seguir o carro. Chegamos a uma casa num bairro mais ao leste da cidade. Uma casa velha em um lote aparentemente abandonado. Parei meu carro na rua lateral, e vi o velho entrar na casa, depois de estacionar. Eu liguei para a polícia novamente, e dessa vez, um operador decente me atendeu.
Ele me deu instruções para esperar, que uma viatura iria para lá. E eu o fiz. Eu esperei. Esperei e esperei muito. Tive um princípio de crise de pânico. Não podíamos mais morrer, mas não é como se nosso inconsciente soubesse disso. E se ele atingisse a cabeça de Lucas com algo? E se Lucas virasse seu brinquedinho? Eu tinha que fazer alguma coisa. E nada da polícia chegar! Resolvi entrar na casa. Tremendo dos pés a cabeça, eu vou até a porta da frente. E… chegando lá… um cheiro horrível. Um cheiro podre, de morte. Eu olhei atrás de um arbusto, de onde vinha o odor, e encontrei um pastor alemão em decomposição. Eu vomitei. Que situação horrorosa. Não gosto nem de lembrar. Eu culpo Deus por ter dado a imortalidade aos humanos e não aos outros animais. E culpo Deus mais
ainda por ter deixado outros animais na mão de humanos tão vis e cruéis como aquele velho. Mas o que mais me deixou com medo foi ver marcas de mordidas bem pequenas na pele do pastor alemão tosado. Quem havia feito aquilo? Ou melhor, o quê? A porta da frente estava aberta só por uma fresta. Eu a empurrei devagar. A casa do lado de dentro era um lixão. Comida podre espalhada por todos os lados, tudo sujo e cheirando a podre. Era realmente a casa de alguém psicopata, do nível mais insano possível, que não se importava com nada nem ninguém e que não tinha com o que se importar. Foi então que eu ouvi gritos. Gritos e barulhos estranhos, vindo do andar debaixo da casa. Nesse momento eu congelei, pois o velho monstruoso com buraco na barriga passou pelo corredor ao meu lado. Eu corri na ponta dos pés e entrei em um
quarto. E, no quarto, os gritos estavam ainda mais altos. E eu reconhecia aqueles gritos. Era Lucas! Ele clamava por socorro. E os barulhos estranhos, eu… eu não sabia o que significava. Até ir ao closet do quarto, no qual encontrei a cena mais aterrorizante que eu havia visto na minha vida. Eu tenho vontade de vomitar só de lembrar. Eu fui andando enquanto tentava não me mijar de pavor. Fui andando até a porta do closet, tremendo. Acho que Lucas percebeu que tinha alguém ali, e por isso parou de gritar, com medo de talvez for o velho. Mas ele ainda gemia. Eu só tinha que descobrir o porquê. E tal motivo foi claro quando eu abri a porta. Três criaturas, nem sei se posso dizer que eram humanas. Estavam presas por coleiras. Talvez tivessem a minha idade, talvez um pouco mais ou um
pouco menos. Estavam nuas, com as costelas visíveis, cadavéricas, cheias de feridas. Devia ter anos que elas não se alimentavam. Comer não era mais importante para nós, mas ficar sem comer poderia te levar à loucura! E aparentemente foi o que aconteceu com... aquelas criaturas. Eram muito magras. Em uma faltava cabelo na cabeça, e as feridas eram claras. Na outra faltava um olho! E a terceira tinha uma ferida horrível aberta na barriga, em que parte do intestino pulava para fora, já um tanto decomposto, escuro e putrefato. Mas seu intestino não importava para seu instinto. Elas se comportavam tal qual animais. Animais famintos. E o aperitivo havia chegado: Lucas! Elas o devoravam! Ele gemia de dor enquanto era perfurado a mordidas por aquelas criaturas.
Elas lambiam o osso exposto e, prendendo ele com a boca, aumentavam ainda mais aquele ferimento. A barriga de Lucas estava aberta agora, e elas se regozijavam e devoravam seu intestino grosso como se ele fosse um macarrão. No momento em que eu abri a porta, elas voaram no pescoço de Lucas e começaram a mordê-lo. Ele apenas desejava a morte! Uma morte que nunca viria, pois não era mais possível. Quando me viu, Lucas tornou a gritar, ao que as criaturas pararam. Elas voaram em mim, mas as correntes as impediram de me alcançar. Rosnavam feito cães, tal qual o pastor alemão que elas devoraram provavelmente algumas semanas ou meses antes. E, enquanto elas rosnavam, eu vi Lucas ali, todo ferido. Travei novamente. Tive outro ataque de ansiedade e pânico, e não sabia o que fazer. E foi nesse momento, onde eu já estava no inferno,
que tudo desandou de vez, quando o velho veio até aquele closet imundo. “Minhas mascotes!” Urrou o velho sem dentes de modo quase incompreensível. “Não machuque minhas mascotes!” Ele voou sobre mim com algo que lembrava um picador de gelo e o enfiou no meu peito. Eu gritei de dor e ele, então, arrancou o picador, preparando um próximo golpe. A adrenalina me atingiu por completo. Eu empurrei o velho, que caiu no próprio picador. O objeto pontudo atravessava sua garganta. Ele pegou, arrancou o picador, tentou dizer algo e não conseguiu, provavelmente por suas cordas vocais terem sido danificadas. Ele correu até mim e eu corri até Lucas. Estava tudo perdido. Eu estava encurralado entre
as mascotes do velho; Lucas estava radicalmente ferido, sequelas que ele levaria pelo resto de sua existência infinda; e aquele velho maníaco, que provavelmente iria fazer coisas horríveis comigo também. Eu queria ter vivido nos tempos em que a morte era uma opção simples. A maldição da imortalidade é algo terrível e complexo. E, naquele momento, eu só queria uma bala em meu cérebro para acabar com tudo isso. E uma bala foi disparada! Mas não em mim. Acertou a cabeça do tal velho maníaco. Ele morreu na hora. Sua longa e miserável vida tinha acabado, enfim. Era a polícia. Chegou atrasada, mas ainda sim, chegou. Os agentes mandaram todos levantarem as mãos, e as criaturas apenas se encolheram em um canto, assustadas com o tiro.
De repente, um dos policiais reconheceu uma delas! Era alguém que desapareceu já fazia uns quinze anos. Com muita dificuldade e entre suspiros, Lucas, ainda preso, pediu para colocarem uma bala em sua cabeça também. Claro que os policiais não acataram e o mandaram para um hospital. E eu, para fazer um depoimento. No fim da história, nunca mais vi Lucas. Apenas relatos nos jornais que ele nunca mais fora o mesmo. Sequelas e mais sequelas, mal falava e não conseguia andar direito mais. Para sempre em uma cadeira de rodas. Não duvido que ele tenha se matado do único jeito possível se matar hoje em dia... Eu teria feito o mesmo: imortalidade não é só para quem quer. Infelizmente, agora é para todos nós. Mas me lembrar desse caso, faz eu não querer isso para mim. Pois é.
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