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rua do hospício

Ao longo de algumas ruas, é possível observar uma justaposição dos diversos momentos históricos pelos quais a Boa Vista passou. Isso ocorre na Rua do Hospício (*), via onde você encontra uma casa térrea de influência eclética ao lado de um edifício modernista com mais de dez andares. Essa característica tão particular se deve, em parte, ao fato da rua em questão ter se expandido à medida em que as áreas alagadas da cidade eram aterradas, o que se deu lentamente. Hoje, essa variedade de edificações acomoda usos bastante importantes para os frequentadores do bairro.

A história da Rua do Hospício tem início com a compra de “um sítio de terras” em 1735, realizada com o intuito de construir um hospício para a residência dos padres esmoleres de Jerusalém. Esse estabelecimento começou a ser edificado no ano seguinte num terreno que, em referências atuais, iria, de norte a sul, da esquina da rua do Riachuelo até o antigo edifício do C.P.O.R, e, de leste a oeste, em direção à rua Gervásio Pires, abrangendo toda a extensão do atual Hospital Militar.

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Inicialmente, a rua era estreita a ponto dos velhos bondes de tração animal passarem com dificuldade por ela. Após sucessivas ações urbanísticas, a rua tomou corpo e se consolidou como uma via de grande importância no bairro. Era ela que, a nível local, conectava as ruas mais antigas do bairro às áreas em expansão da cidade, e que também articulava a Boa Vista à porção norte da cidade do Recife e à Olinda.

(*) visualização no mapa: item 21.

Numa caminhada ao longo da rua do Hospício, é possível perceber a distinção entre os seus trechos, mas aqui destaca-se a porção mais próxima à Rua da Imperatriz. A largura da via, a altura das edificações e a sombra proporcionada pelas árvores presentes nessa parte da rua criam um ambiente mais intimista, e é nela onde possível parar numa lanchonete, ficar numa das mesas dispostas na calçada ou até mesmo cortar o cabelo. De lá, tem-se uma bela vista da Igreja Matriz da Boa Vista e, para os mais atentos, o contato com os trilhos dos bondinhos que por ali passavam.

Rua do Hospício. 2021.

Apesar de existir há mais de dois séculos, esta rua preserva poucas edificações antigas. Uma série de reformas

fez com que alguns marcos físicos do passado dessem lugar a novas construções, e logo a Rua do Hospício se tornou num lugar de grande diversidade arquitetônica. Igualmente importante é a multiplicidade de usos dessa rua. Entre as atividades que marcam a memória dos seus frequentadores, estão: os equipamentos culturais - Cine Veneza e Teatro do Parque, os estabelecimentos hoteleiros - Palace Hotel, Hotel do Parque, Hotel Suíça e Hotel Park 13 de Maio -, e as instituições de ensino e pesquisa - Instituto Arqueológico Histórico e Geográfico Pernambucano e Escola de Engenharia.

Meu pai abriu uma lanchonete na Rua do Hospício. Para mim era uma maravilha porque o Teatro do Parque na época era um espetáculo, era show, tudo, uma maravilha. A primeira frevioca saiu de lá, e adivinha se eu não tava?

Mulher de meia-idade, moradora do bairro da Boa Vista, faz parte do grupo LGBTQIA+

Este é uma importante entidade de fomento à pesquisa na área de ciências sociais, a qual foi fundada em 1862 por intelectuais da Faculdade de Direito, sendo então o mais antigo Instituto Histórico Estadual do Brasil, e o segundo dedicado à história no país, ficando atrás apenas do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Possui um acervo riquíssimo tombado pelo IPHAN, que se tornou referência nacional e internacional. Em sua primeira fase de existência,

(*) visualização no mapa: item 27. o IAHGP (*) funcionava no edifício do Ginásio Pernambucano, mas em 1920 se mudou para o prédio nº 130 da Rua do Hospício, sede doada pelo então governador Manoel Borba. Durante a etapa de entrevistas, o IAHGP foi muito citado como uma referência da Boa Vista, um bem característico e único, além de ser lembrado pelos painéis e documentos relacionados à batalha dos Guararapes, bem como as aulas, eventos, palestras e aulas de campo que promove. Cabe também lembrar que é lá onde está o único documento emitido pelos manifestantes da Revolução Pernambucana, o “Preciso”, onde foi detalhado o plano de ações que seria realizado pelo novo governo independente de Pernambuco.

Eu tou sempre por lá, eu adoro as pessoas e história e conversar; e lá foi o primeiro lugar que eu vi um quadro de um homem negro.

Mulher jovem, ex-moradora do bairro da Boa Vista

A Rua do Hospício abriga imóveis que diferem uns dos outros, seja por suas características físicas ou pelos seus usos, assim como acomoda múltiplas atividades. Essa diversidade de atributos explica o o motivo pelo qual esse endereço atrai tanta gente. Apesar da diferença entre as edificações e os ofícios realizados nas suas imediações, cada uma possui importância histórica e está associada a memórias e afetos dos seus frequentadores.

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