Caderno de estudos Nº 2
I CONGRESSO NACIONAL DO MPA “Aliança Camponesa e Operária por Soberania Alimentar”
São Bernardo – SP – 12 a 16 de outubro de 2015.
Movimento dos Pequenos Agricultores Dezembro de 2014
Apresentação Este caderno que estas tomando em suas mãos, é parte de um conjunto de 2 cadernos que trazem textos de estudos e debates na preparação do I CONGRESSO NACIONAL DO MPA. Estes textos trazem elementos teóricos para a reexão, mas principalmente, o acúmulo do MPA nestes seus 17 anos de construção nacional, de estudos, debates, frutos de seminários temáticos e seminários nacionais realizados nos últimos anos e também de elaborações teóricas, e aplicação prática. A edição destes cadernos busca o fortalecimento da formação e a articulação interna e externa do movimento, rumo ao seu I CONGRESSO NACIONAL. Os dois cadernos serão compostos por oito temas centrais, que são: · Análise da conjuntura brasileira; · Campesinato e Plano Camponês; · Juventude Camponesa; · Mulheres e as relações de gênero; · Educação Camponesa; · Terra e território (água, energia e mineral); · Agroecologia, Soberania Alimentar, Genética; · Organicidade do MPA; Para o estudo e debate sobre estes textos em preparação ao Congresso, orientamos a toda a militância, que sejam organizados grupos de militantes por município ou por comunidade. Que se organizem uma seqüência de encontros, com tempo suciente para aprofundar a discussão a respeito de cada tema. Os grupos de estudo deverão levar em conta os elementos onde há consenso em torno do escrito, os elementos em que há algum tipo de contradições e também sugestões. Estes elementos deverão ser anotados e encaminhados para a coordenação do MPA em cada estado, de modo a que se faça chegar à equipe de síntese do Congresso. Este caderno de estudos deverá chegar também as mãos dos nossos aliados/as estratégicos/as para suas contribuições a m de garantirmos proposições que contemplem os anseios da classe trabalhadora como um todo. Estes aportes dos grupos de estudo e dos aliados/as serão analisados pela equipe de síntese e incorporados ao debate. A coordenação Nacional do MPA irá realizar um Seminário Nacional, por volta do mês de julho, onde consolidará um documento com as principais armações do congresso. Este documento será estruturado em um caderno que deverá voltar para ser debatido nos estados. Assim, o evento congresso será um momento para armações das linhas e posições construídas durante todo o processo de estudos e debates que já está em andamento. Boa leitura, bom estudo, bom debate. Viva o I CONGRESSO NACIONAL DO MPA Viva a Aliança Operária e Camponesa pela Soberania Alimentar! Direção Nacional do MPA
Apresentação O opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os próprios oprimidos. Simone de Beauvoir É chegado o momento do nosso l Congresso Nacional, para nós as mulheres camponesas a história reserva uma das maiores batalhas, a de construir com nossas mãos a libertação da classe camponesa e da classe operária da opressão do agronegócio, dos transgênicos, dos agrotóxicos, da violência contra as mulheres, da criminalização e de tantas outras violências que enfrentamos no nosso dia-a-dia. O Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA completa seus 20 anos de lutas e nasce com uma mensagem clara de que a família camponesa é o centro da organização, é nela que reunimos as unidades fundamentais (crianças, jovens, mulheres e homens) e sob as quais se estruturam nossas reivindicações e nossa luta. Tomamos a denição de construir o Plano Camponês, um projeto de campo e de sociedade onde as pessoas e a natureza sejam o centro e esse projeto é antagônico ao projeto do capital onde o centro é o lucro. Essa decisão trouxe muitas responsabilidades que agora precisamos dar conta como movimento. Não é possível construir o Plano Camponês sem a participação real e visibilizada das mulheres, pois a Soberania Alimentar como eixo central desse projeto só se realiza com uma ampla e massiva participação das mulheres. É por nossas mãos que passa até 80% dos alimentos consumidos pelo povo no mundo. Se olharmos em nossas famílias as mulheres são responsáveis pelos pequenos animais, hortas, legumes, frutas, plantas medicinais, pães, bolos, doces, biscoitos, etc. Além dessa tarefa fundamental da existência camponesa, ela também cuida das crianças, dos idosos, dos doentes. Enm, a mulher organiza a vida da comunidade camponesa em todas as suas dimensões, por isso sem a participação da mulher conscientizada não tem Plano Camponês como projeto de campo e de sociedade. A participação conscientizada se faz pela garantia da participação das mulheres desde a base, pois lugar de mulher é em todo lugar; pela garantia da participação das mulheres nas instâncias do movimento, nas coordenações, nas direções, nos coletivos, nas equipes técnicas, nas equipes de negociação. Essa é uma condição para que o MPA seja de fato um movimento de famílias camponesas no sentido mais amplo da palavra. O processo foi longo até chegarmos até aqui. O primeiro Encontro Nacional em Ronda Alta - RS em 2000 já trazia a questão de gênero como uma questão política da organização, até porque várias mulheres vinham desse debate no movimento sindical. O II Encontro Nacional em Ouro Preto D'oeste-RO realizado em fevereiro de 2003, foi realizada a 1ª Plenária Nacional de camponesas do MPA, éramos 35% no Encontro, tiramos o indicativo da formação especíca e de fazer um trabalho mais sistemático e organizado com as mulheres, até aqui eram 2 mulheres na Direção Nacional. Essa plenária foi importante pra vermos e sentirmos o peso político das mulheres no MPA e que portanto não se podia ignorar. Em novembro de 2003 realizamos o l Encontro Nacional de Gênero do MPA onde participaram um homem e uma mulher de cada Estado. Essa atividade foi importante pra entendermos que seria necessário realizar atividades especícas com as mulheres. Em 2008 realizamos o l Encontro Nacional de Mulheres Camponesas do MPA – O Encontro das 40 como cou conhecido. Foi esse encontro que deslanchou uma participação mais efetiva e dirigente das mulheres no comando das lutas do 8 de março, desencadeou um processo mais continuado de formação política desde os Estados até o Nacional, provocou o debate da paridade nas instancias, as condições para as mulheres participarem das atividades como a ciranda, cuidar com os horários das reuniões pra propiciar a presença das mulheres e apontou que nenhum Estado poderia estar na direção nacional sem a presença de mulheres.
Todo esse debate preparou e perpassou nosso III Encontro Nacional em Vitória da Conquista - BA no ano de 2010, onde tivemos mais de 40% de mulheres e realizamos nossa II Plenária Nacional de mulheres camponesas do MPA. A ampliação da participação dirigente de jovens e mulheres em todas as instâncias do movimento foi um dos compromissos denidos no Encontro. Rearmamos nosso compromisso em enfrentar o tema da violência contra as mulheres, lançando em nosso Encontro a campanha “Basta de violência contra as mulheres” da Via Campesina. De 2010 pra cá, realizamos Escola Feminista, Encontros Estaduais, Escolas Estaduais, Cirandas, Escolas do Asfalto, enfrentamento ao agronegócio e suas transnacionais. Organizamos nosso Coletivo Nacional de Gênero e pela primeira vez em 2015 tivemos nossa primeira equipe nacional de negociação política em Brasília formada somente por mulheres camponesas, assumindo a negociação da pauta nacional do MPA. Foram tempos difíceis, mas foram passos rmes, para chegarmos em 2015 com denição da paridade de gênero em nosso l Congresso Nacional, ou seja, todos os Estados devem levar 50% de mulheres, portanto teremos aproximadamente 2.000 mulheres discutindo os rumos da organização. Essa denição foi tomada na reunião da Coordenação Nacional em dezembro de 2014 realizada em São Bernardo dos Campos-SP. Temos a certeza que nosso Congresso será mais colorido, mais animado e mais organizado, mas isso nos coloca mais responsabilidades que privilégios, pois nos desaa a organizar as músicas, os instrumentos, as poesias, os alimentos, mas principalmente nos impõe o desao do estudo. Estudar para preparar bem e para conduzir bem o Congresso em todas as suas dimensões. Por isso, várias companheiras se desaaram a preparar e elaborar as leituras do tema de gênero nesse ll Caderno de estudos em preparação ao nosso l Congresso Nacional. O 1º texto “As Mulheres no MPA” são das companheiras e militantes do MPA Rosiele Cristiane Ludtke, Maria José da Costa, Saraí Fátima Brixner, Roseli Maria de Souza, Leila Denise Meurer e Letícia Chimini e traz um importante processo histórico da participação das mulheres no MPA. O 2º texto é “Políticas Públicas Sociais e as Mulheres Camponesas: o que temos e o que queremos” da companheira Rose Sousa que traz uma análise das políticas sociais existentes e quais de fato precisamos como mulheres camponesas. O 4º texto é “Soberania Alimentar, uma perspectiva feminista” da companheira Ester Vivas, é um importante elo entre a soberania alimentar e as mulheres; e, o 5º texto é “Mulheres camponesas construindo sonhos no chão do semiárido: PAA e Soberania Alimentar nas mãos das camponesas” das companheiras Maria José da Costa, Sonia Costa, Geovana Sousa e Maria Gonçalves, esse texto traz uma belíssima descrição da participação das mulheres camponesas no Programa de Aquisição de Alimentos no Piauí. Diante de belíssimas e importantes elaborações, só nos resta convidar a todas as mulheres e homens camponeses a estudarem e se prepararem para o debate de gênero no I Congresso Nacional do MPA e oxalá que todo e qualquer oprimido que por ignorância tenha se aliado ao opressor para exercer opressão de gênero se liberte pelo conhecimento. BOM ESTUDO E BOA PREPARAÇÃO! Coletivo Nacional de Gênero
Somos Mulheres Eu senti a força e a dor da bala na face de Iones Sou as marcas da violência de Maria da Penha, Eu sofro e morro todos os dias com as mulheres Me renovo, me refaço Para ser voz das que se calam Para encorajar as sem forças de lutar Para erguer o pulso das que estão atadas Me renasço e me fortaleço E assim seremos risos e não dor Amor e não opressão Paz sem agonia Força e não medo Não seremos mais lágrimas Somos rosas e não espinhos Somos união, força, somos luta... Somos mulheres (Mocinha - PI)
“As Mulheres no MPA” Rosiele Cristiane Ludtke -
Camponesa no RS, Tecnóloga em Agropecuária, Militante do MPA, membro do Coletivo Nacional de Gênero.
Maria José da Costa -
Camponesa no PI, Engenheira Agrônoma, Mestre em Desenvolvimento Territorial da América Latina e Caribe, Militante do MPA, membro do Coletivo Nacional de Gênero.
Saraí Fátima Brixner -
Camponesa no RS, Pedagoga, Militante do MPA, membro do Instituto Cultural Padre Josimo e Produtora do Programa Vida no Sul.
Roseli Maria de Souza -
Camponesa no ES, Militante do MPA, membro do Coletivo Nacional de Comunicação, cursando Serviço Social na UFRJ.
Leila Denise Meurer - Camponesa em RO, Militante do MPA, membro do Coletivo Nacional de Gênero. Letícia Chimini - Assistente Social, Mestre em Desenvolvimento Regional, técnica e militante do MPA desde 2006. Integra a coordenação do Coletivo de Mulheres do MPA/RS.
O Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA desde a sua constituição, no ano de 1996, teve sempre a participação das mulheres em todas suas dimensões. Mas, ao longo de seus anos de luta e resistência, nosso grau de participação foi se modicando. No I Encontro Nacional no RS, por exemplo, no ano de 2000, 1 (uma) mulher fazia parte da Direção Nacional do movimento e contribuía na construção do mesmo. Neste I Encontro Nacional estavam presentes 5 (cinco) Estados e 20% das/dos presentes eram mulheres, que armavam a necessidade de se construir um movimento nacional e composto por famílias. O Movimento, nasceu das trincheiras de lutas por melhores condições de vida e de trabalho no campo. Nestas lutas, o Movimento foi se constituindo a partir das famílias camponesas (de mulheres, homens, jovens, crianças, pessoas idosas). Nós mulheres, estamos presentes no bojo desta família, desta organização de base. O MPA é um movimento que não vive isolado, ele está inserido numa sociedade capitalista e patriarcal, onde a desigualdade de gênero é um fator importante que garante a reprodução do sistema capitalista. Há papéis destinados a cada sexo. Aos homens é destinada a tarefa da produção, do sustento da família, que acontece na esfera pública. A nós mulheres foram destinadas a tarefa do trabalho reprodutivo, realizando os trabalhos domésticos, o cuidado dos lhos e lhas, da produção das “miudezas” na horta, pomar, na criação de pequenos animais, ou seja, o trabalho que é repetido cotidianamente e que é invisibilizado e feito na esfera privada. As mulheres camponesas têm um papel fundamental na reprodução familiar, pois são responsáveis por uma parte signicativa da renda das famílias, e principalmente, daquilo que não é contabilizado como renda, mas que muitas vezes é o que garante a manutenção destas famílias no campo. São elas que fazem a horta, cuidam do pomar, das plantas medicinais, aproveitam os alimentos de forma integral, fazendo agro industrialização caseira: chimias, conservas, doces, pães, o que garante uma alimentação saudável e a soberania alimentar das famílias. No MPA a participação das mulheres também está em movimento e desde o início tivemos participação em níveis diferentes. Na sua constituição, o MPA se apresenta como uma alternativa para as famílias camponesas. Era necessário organizar a base e fazer o debate da organização. Muitas mulheres que já eram lideranças das comunidades, dos sindicatos, de outras organizações sociais ajudaram a fazer este processo de consolidação. Durante todo o processo, o movimento faz lutas para garantir a melhoria de vida das famílias camponesas como crédito subsidiado, moradia, seguro agrícola, preço mínimo de produtos... Nós mulheres participamos das mobilizações, dos debates, de algumas negociações, dos espaços de formação, mas sem expressão. Em sua maioria, dividimos as tarefas – os homens vão para a luta e as mulheres garantem os trabalhos da casa. Ou quando íamos para as lutas, permanecíamos nas tarefas tidas como femininas – fazer a comida, cuidar das crianças, organizar o ambiente, preparar a mística, cuidar da animação e formação. Com o passar do tempo, o movimento se propõe construir um novo modelo de agricultura, onde hajam políticas de valorização do campesinato, de reestruturação da propriedade, de cuidado com o meio ambiente, de reorganização da comunidade rural, com propostas que vão além de políticas compensatória. Esta proposta foi chamada de “Plano Camponês”. Para implantar este plano é necessário que toda a família esteja envolvida. Organizamos um Seminário Nacional de Gênero para entender como acontecem as relações sociais, como a presença da mulher em determinados setores está
relacionada a disputa de poder e a reprodução do sistema patriarcal. Este debate nos levou a reetir que para garantir a presença das mulheres no movimento teremos de assumir mais uma jornada (cuidar da casa, dos/as lhos/as, ir para a roça, ser esposa e ainda militante). Enquanto que o movimento precisa implantar ações concretas que permitam esta participação como cirandas infantis, a metas de equidade na participação entre homens e mulheres. A mudança do modelo de agricultura está casado com a mudança de sociedade e de novas relações de gênero, etnia e geração, com respeito as diferenças camponesas que temos no Brasil, bem como América Latina e no mundo. Queremos construir uma sociedade socialista, que se inspire nas experiências que temos e tivemos pelo mundo, mas que seja essencialmente brasileira. Organizada e pensada a partir da realidade do povo brasileiro, uma verdadeira revolução social. Mudar a sociedade, implica ter um modelo diferenciado de agricultura, mas também, um novo padrão de relações sociais. Em nossa proposta para a sociedade, as mulheres tem uma função central em todos os eixos, pois desde a diversicação, agregação de valor-renda à produção, agro industrialização, a recuperação da cultura, vida de qualidade, enm... as mulheres tem na pratica camponesa do dia-a-dia uma participação fundamental, o que esse modelo capitalista e patriarcal tem feito é invisibilizar esse trabalho das mulheres. Por isso, nós mulheres, assumimos a tarefa de nos organizar como mulheres, camponesas, trabalhadoras e socialistas para fazer as transformações necessárias, a partir de um movimento misto camponês que somos. Temos em especial o 8 de março que é um dia de luta e organização. Para nós, mulheres do MPA, o 8 de março ganha uma outra dimensão: é a oportunidade de nos encontrar, de nos enxergar como mulheres, como lutadoras, como pessoas que sabem o que querem. É o momento de darmos visibilidade as mulheres do campo e da cidade, através das suas diferentes organizações. Também um dia para debater a situação em que nos encontramos enquanto mulheres nesta sociedade machista e patriarcal, e do modelo de sociedade que estamos dispostas a ajudar a construir. Na atualidade o MPA está preocupado com este processo de proporcionar a participação efetiva das mulheres nas instâncias, desde a base, até as instâncias de decisão, como as Direções. Na Direção Nacional do MPA temos um bom número de companheiras atuando, assim como na Coordenação Nacional e Direções Estaduais, Regionais e Municipais. Um elemento importante que garante essa participação é a Ciranda Infantil, onde as crianças têm espaço de aprendizado, brincadeiras, de cultura camponesa, enquanto suas mães e pais participam das atividades do MPA. Nossa Associação Nacional da Agricultura Camponesa (ANAC) tem como presidente uma mulher, o que demonstra capacidade na gestão e administração de uma associação nacional. O Coletivo de Gênero tem como objetivo principal debater essas novas relações, pois não basta transformar as estruturas da sociedade, se também não transformarmos as relações entre as pessoas. São processos que devem andar conjuntamente. E para tanto estamos realizando várias atividades em vários locais do país para realizar este debate, juntamente com o debate do Plano Camponês. Com o decorrer de 2015, esperamos ampliar e efetivar a participação das mulheres em todos os sentidos no nosso Movimento e na sociedade como um todo. Precisamos dar visibilidade ao trabalho invisível das mulheres do campo, onde a estratégia principal seja a produção de alimentos saudáveis, com respeito ao meio ambiente, que este alimento chegue na mesa do trabalhador das cidades. E isso inclui as mais variadas tarefas na nossa organização. Portanto nós mulheres, cuidadoras da vida, temos sim que continuar lutando para melhorar nossas vida no campo, onde ir a mesa de negociações ou preparar uma alimentação saborosa sejam tarefas importantes e que nós estejamos prontas para cumprir. Mulher conscientizada, semente germinada, sociedade transformada! Sem Feminismo, não há Socialismo! Quando uma mulher avança, nenhum homem retrocede! Mulheres e homens conscientes, na luta permanente!
As Políticas Públicas-Sociais e as Mulheres Camponesas: O que temos e o que queremos. Roseli Maria de Souza - Camponesa e militante do Movimento dos Pequenos Agricultores/Via Campesina e estudante da Escola de Serviço Social da UFRJ
1- As origens, as Protoformas das Políticas Sociais no Capitalismo. Por “Questão Social” entendemos “o conjunto de problemas políticos, sociais e econômicos que o surgimento da classe operaria impôs no curso da constituição da sociedade capitalista. Assim a “questão social” esta fundamentalmente vinculada ao conito entre o capital e o trabalho” (Cerqueira lho, 1982 apud Neto, 2011, p. 17). Desde o surgimento do modo de produção capitalista sempre existiu as expressões das questões sociais, sempre existiu desigualdades, o capitalismo sempre produziu riqueza para uma minoria e pobreza para a maioria, isso é da gênese, é próprio desse modelo produtivo, porém, a forma de expressão, a forma como isso se retrata em cada período histórico depende de vários fatores, sócio-políticos, econômicos, avanço do capitalismo, pressão dos trabalhadores, etc. No período inicial do capitalismo mercantil, manufatureira e parte do capitalismo concorrencial se explicava a fome, a pauperização-pobreza em massa que havia dos trabalhadores pela escassez, pela falta de alimentos. Com o desenvolvimento das máquinas, a Revolução Industrial, na segunda metade do século XVIII e primeiras décadas do século XIX, ca evidente para os/as trabalhadores/as que o problema não é a falta de produção, mais sim a concentração. Cada vez mais aumentava a produção e cada vez mais aumentava a pobreza, a desigualdade. Os/as trabalhadores/as começaram a se perguntar porque isso tudo estava acontecendo, e no primeiro momento, identicaram como seus inimigos as máquinas, foi ai que surgiu o movimento do Ludismo (acreditavam que quebrar as máquinas iam resolver os problemas da fome, do desemprego, etc.). Conforme o capitalismo ia se desenvolvendo nessa fase da Revolução Industrial, a concorrência entre si cada vez maior, algumas revoluções burguesas já havia acontecido e concentração, acumulação para os capitalistas e a pobreza para os/as trabalhadores/as evidenciava-se cada vez mais. Nesse período (início do século XIX), com os protestos dos/as operários/as surge a expressão “questão social” para denominar todo o pauperismo generalizado, toda a pobreza, fome, falta de moradia, educação, péssimas condições de trabalho, doenças das mais variadas, etc., que existia. Nesse mesmo período surgiu a palavra, o conceito de Socialismo como outro modelo de sociedade que os/as trabalhadores/as propunham como forma de contrapor o Capitalismo. O ano de 1848 é o divisor de águas. Acontece nesse marco grandes manifestações, revoluções, os/as trabalhadores trazem à tona o caráter antagônico, contrários dos interesse sociais das duas classes fundamentais da época (quem detém a força de trabalho-operários/trabalhadores e os donos dos meios de produçãoburguesia/capitalistas). Os/as trabalhadores/as, que até aqui pertenciam a uma classe (classe em si), passam a se reconhecerem como classe social, passam para uma classe para si, passam a se reconhecerem como sujeitos sociais coletivos. A classe aqui passa a ter compreensão política e mais tarde avança também na compreensão teórica com as contribuições de Marx e de Engels e outros teóricos da perspectiva crítica ao modelo de produção já predominante - Capitalismo. Ao entrar no cenário político como protagonistas, como sujeitos sociais, os/as trabalhadores/as colocam em resolução a “questão social” não apenas na politização e conscientização sobre as expressões da questão social, mais
visualizava a solução em um processo de transformação pela revolução, passam a lutar pelo Socialismo, pela vida digna para todos e todas, viam como necessário mudar o modelo de sociedade que estava crescendo dia-a-dia. Esse também foi um período em que a tradição intelectual do pensamento conservador positivista fez muitas reexões sobre as “questões sociais”. Naturalizam as desigualdades, colocam a pobreza, o passar fome e todas as outras necessidades vitais como se fossem coisas da natureza, uma coisa normal da vida e não consequência do modo de produção, eles combatem as manifestações da “questão social” mais sem tocar nos fundamentos da sociedade capitalista. As ciências sociais se dividiram e foram mais para a esfera moral, não iam para o debate da economia. Durkheim, um dos fundadores dessa corrente de pensamento (pensamento esse que se protagonizou na sociedade capitalista) defendia a coesão e o controle social, daí ele dá o estatuto à Sociologia, era preciso prossionais para mediar os conitos, as expressões das questões sociais. É a naturalização e a psicologização do social. Eles vão convencer a sociedade que as coisas são naturalmente assim, pobreza de um lado, riqueza do outro, como fator natural. A partir de 1848, o estado e a burguesia muda seu posicionamento diante da sociedade, não mais só com polícia, com repressão, eles enfrenta as lutas, as manifestações da massa desenvolvendo estratégia que combina conservadorismo e reformismo, passa a ser coesivo, passa a tratar também como coisa de política, ou seja busca aperfeiçoar os mecanismos de “amaciar” a luta de classes. Já, a partir de 1870, o Capitalismo já passado da sua fase concorrencial para monopolista-imperialista concentra e centraliza tudo, há uma fusão entre capital bancário e industrial formando o capital nanceiro. O Estado passa a ter uma função estrutural e funcional ao capitalismo, passa a intervir não apenas na politica mais também na economia (infraestrutura, credito, etc.), estado passa a ser o “Comitê executivo da burguesia”. Após a II guerra mundial vieram os chamados anos gloriosos, o capital sai fortalecido da guerra, altas tachas de lucro em todos os seus ramos de atuação, no entanto há muitas consequências para os trabalhadores, ele precisa se “humanizar” socialmente, o Estado de Bem Estar Social entra em cena com” bons empregos” e politicas para garantir o consumo, assim foi, mais não por muito tempo, veio a crise de 1973, houve um grande corte de gastos, e é nos gastos sociais que o capital corta através do Estado, garantindo apenas o Estado Mínimo para o povo, ou seja, os bons empregos e preços dos produtos, consequentemente as melhorias para os trabalhadores são minimizadas. As chamadas “protoformas das políticas sociais”, ou seja, as suas primeiras formas, datam de 1881 com Otto Bismarck na Alemanha criando os primeiros “seguros sociais” da história, na tentativa de “unicar” seu povo. Esse fato se deve principalmente a Comuna de Paris em 1871, ou seja, era a antecipação de algumas melhorias para o povo não se organizar “fora da ordem” novamente como na Comuna. No Brasil, de forma muito fragmentada as primeiras políticas sociais vieram com Vargas entre 1930 até início dos anos 60. Ele criou o primeiro sistema de seguro social com objetivo de conter as greves que existiam em função do desenvolvimento desigual que estava acontecendo ( essa desigualdade no desenvolvimento se dava de forma diferenciada tanto em relação aos capitalistas e trabalhadores como também a prioridade diferenciadas em torno das regiões do país, mais incentivo ou menos de acordo com as necessidades do capital, por exemplo o Sul e Sudeste era mais prioridade, tinha mais infraestrutura e investimentos gerais em relação ao nordeste e norte), depois um segundo período de consolidação de algumas políticas sociais foi de 1964 a 1985 com um objetivo de racionalização conservadora e estava em função da ditadura. Com o Ascenso das massas o período seguinte foi de muitas conquistas. A Constituição Federal de 1988 é a mais progressista existente até então (SUS como política universal, educação, Previdência, etc.), mais o neoliberalismo implantado por Collor e consolidado por FHC faz cair a maioria dos direitos sociais conquistados. Vem as políticas de assistência de forma racionalizada, a lantropia, as Ongs assumindo o lugar do Estado, provocando a cooptação, repressão e criminalização dos que não obedecem as ordens dadas nos anos seguintes. Com Lula, e com Dilma, não foi diferente, o Estado continua sua função de garantir as taxas de lucro do capital como a prioridade através da intervenção econômica e política,
seja na exibilização das leis como o código orestal por exemplo, seja na negociação dos dividas do agronegócio, no pagamento das dívidas internas, na infraestrutura – rodovias, portos, aeroportos, etc, empréstimo do dinheiro público-BNDES, entre outros incentivos que o capital direto ou indiretamente recebe. E as políticas sociais compensatórias continuam cada vez mais sendo implantada, porém, há também um reconhecimento da maioria da sociedade de que esses dois governos deu mais “atenção” as políticas públicas, os pobres teve uma fatiazinha maior do bolo do que os governos anteriores. Em suma, as Políticas Sociais desde sua origem vieram para “anestesiar” o povo e o capital sempre teve ganhos com isso, no entanto, elas são fruto da LUTA dos trabalhadores por melhorias, são REIVINDICAÇÕES LEGITIMAS e que Estado e o capital espertamente utiliza, se apropria dessas pautas, dessas demandas para desorganizá-los, burocratiza-los, enganá-los como se fosse uma bondade do Estado ao criar essas políticas. Assim sendo, historicamente coube aos trabalhadores e trabalhadoras criar estratégias e instrumentos de se organizar e manter organizados de acordo com suas necessidades de reivindicações em cada época, em cada período histórico, seja os sindicatos, o partido político, os movimentos sociais, etc.
2- Surgimento do MPA e a luta pelas melhores condições de vida no campo - Políticas Públicas. O MPA surge em 1996 numa crise da pequena agricultura (do campesinato- mas não usávamos esse termo na época) e crise das organizações. Surgiu para construir e propor o Plano Camponês. Nesse momento, fazendo uma comparação, é como se o conjunto da pequena agricultura/campesinato estivesse caído num buraco, e as organizações estavam discutindo como viver melhor no buraco. O povo não queria viver no buraco, por isso surge o MPA, com a tarefa histórica de construir a saída do buraco, superar as condições limitantes políticas e econômicas colocadas para os camponeses e camponesas, isso é o Plano Camponês. O MPA é, portanto um movimento que luta para a construção de uma nova sociedade, e luta por melhorias nas condições de vida das famílias camponesas, bem como pela manutenção e ampliação dos direitos camponeses. Assim desde o acampamento da Seca no RS em 1996, que é o fato que marca o nascimento do MPA, sempre zemos lutas concretas por políticas públicas que favoreçam a agricultura camponesa. Se zermos uma análise das pautas do MPA, desde a primeira pauta, questões como a moradia, educação, crédito e a agroecologia estavam presentes. O que são as políticas públicas? a)Conjunto de ações denidas, desencadeadas pelo Estado no nível federal, estadual e municipal, com vistas ao atendimento a determinados setores da sociedade civil, podendo ser desenvolvidas em parcerias com organizações não governamentais e mais recentemente com a iniciativa privada; b) São fruto da luta dos trabalhadores organizados; c) Cumpre dupla função, ao mesmo tempo em que atende a necessidade concreta dos trabalhadores, tem também o papel de “anestesiar” para não se mobilizarem pela transformação da sociedade. Isso faz com que a ordem social dada – capitalismo, continue se desenvolvendo. As políticas públicas que favorecem a agricultura camponesa só existem por causa da luta concreta, por causa das mobilizações e da organização do campesinato, sem luta não há conquistas. As conquistas podem ser avanços econômicos, políticos ou sociais da agricultura camponesa, mas podem ser também o impedimento do avanço do agronegócio, ou seja, se manter onde e como estamos é também uma conquista, pois a meta do agronegócio e diminuir nós camponeses ainda mais.
Mas por que ocorre isso? Como podemos ver no desenho ao lado, o MPA busca a mudança radical (pela raiz) da atual sociedade e como parte dessa transformação, dessa mudança, constrói a pauta de lutas, faz as lutas concretas e obtém conquistas para a melhoria da vida dos camponeses e camponesas e consequentemente do conjunto dos trabalhadores. Estas conquistas podem ser independentes do Estado, como por exemplo, a realização de feiras livres, a mudança na autoestima das famílias, transição para a agroecologia, etc., mas muitas coisas dependem da relação com o estado/governos, dependem dos recursos públicos, seja a nível nacional, estadual ou municipal/local. O problema é que o Estado tem por função a manutenção da atual sociedade, ou seja, manter as coisas do jeito que estão, é por isso, que por conta própria não há avanços para os camponeses/trabalhadores, somente a luta é que garante conquistas. É importante considerar que o Estado não é só os espaços ocupados por pessoas eleitas pelo voto, é estado também o judiciário, as forças armadas, os funcionários públicos, etc. Assim, quando os governos se veem sem saída pela pressão dos trabalhadores criam políticas públicas que os favorecem (no nosso caso, para a agricultura camponesa) mas criam também um monte de regras e burocracias que impedem que essas políticas virem realidade de forma universalizada, ou então, fazem algumas alterações daquilo que o movimento tinha de proposta que mudam completamente o sentido, por exemplo, o PRONAF tem sido usado para ampliar ainda mais o uso de agrotóxicos e a dependência das multinacionais, quando na verdade deveria ser o contrário. Outro elemento, é que aquelas políticas que não são de interesse do Estado não tem recursos orçamentários sucientes ou então, os órgãos responsáveis pela sua execução estão em condições precárias, sem funcionários, com veículos quebrados, sem infraestrutura, etc., por exemplo, a Conab para executar o PAA-Programa de Aquisição de Alimentos e o Pronaf Agrooresta.
3- Lutas e conquistas das Mulheres, do MPA nas Políticas Públicas. Ao longo da nossa caminhada zemos muitas lutas e obtivemos importantes conquistas para a agricultura camponesa, o quadro abaixo apresenta um resumo sobre algumas das políticas públicas conquistadas através da luta camponesa, as possiblidades que ela proporciona aos camponeses e as camponesas e as diculdades que temos em implementá-las. Nesse processo, sem minimizar, sem diminuir a importância dessas conquistas para os homens, os jovens e as crianças, mais, para as Mulheres elas são de extrema importância, considerando que a maior parte da produção diversicada, da agregação de valor nos produtos, do cuidado com a água, com as pequenas criações, plantas medicinais, saúde, horta, pomar, entre outros, tem sido uma parte do trabalho que as mulheres fazem ( uma parte porque no dia-a-dia elas fazem muito mais que isso, as mulheres sempre vão para além da esfera da reprodução, do autoconsumo, elas tem inuência direto também no trabalho produtivo, na renda familiar), assim como a falta das políticas públicas, as Mulheres são as mais afetadas diretamente, por exemplo, a condição péssima da saúde pública na atuação do pré-natal, preventivo, nas questões previdenciárias dada a nossa condição de segurada especial que cada dia vem sendo mais burocratizado o acesso aos direitossalário maternidade e outros, a falta de água, a falta de energia elétrica que em muitos lugares ainda não tem dicultando e acarretando ainda mais a jornada de trabalho. As mulheres tiveram participação decisiva na consolidação das políticas abaixo citadas:
Política pública
Funcionamento – nalidade
Possibilidades
Problemas
PRONAF / créditos (1997)
* Financiar a produção das famílias camponesas. * Ampliar a produção * Permitir as famílias fazerem investimentos * governo faz as regras e os bancos operacionalizam – as regras e condições tem melhorado em função das lutas.
* Recuperar a estrutura de produção – sistemas camponeses de produção; * transporte para as feiras; * agroindústrias; * etc...
* burocracia dos bancos; * falta de documentação das terras; * falta de informação; * picaretas-consultorias orientando créditos errados.
PRONAF Mulher (2003-2004)
O Pronaf Mulher é uma linha de crédito especico para as mulheres voltados para atividades agrícolas e não agrícolas.
As possibilidades são de melhorar a renda das camponesas.
O pronaf Mulher teve e tem muitos limites na implementação como: falta de documentação pessoal e da propriedade da terra, falta de autonomia das mulheres no âmbito da gestão e comercialização dos produtos, DAPs é familiar mais a maioria não incluía o nome das mulheres como titulares, etc
Habitação Rural (2002 – projeto piloto RS)
* recursos não retornáveis para construção de casas para as famílias camponesas;
* construir casas para as famílias viverem dignamente no campo; * discutir a casa e seu entorno;
* recursos insucientes para fazer um programa massivo; * excesso de burocracia; * entidades interessadas em ganhar dinheiro com o programa fazendo casas de qualquer jeito;
PAA (2003)
O Programa de Aquisição de Alimentos tem duas modalidades: * Compra Direta com Doação Simultânea: entidade apresenta projeto, CONAB compra os alimentos, e a entidade entrega diretamente aos beneciários (creches, asilos, famílias carentes, etc); * Formação de Estoque: entidade apresenta projeto, CONAB compra os alimentos e faz estoques;
* A famílias camponesa tem comércio garantido sabendo por quanto vai vender e para quem entregar sendo um grande incentivo a diversicação; * Melhoria de renda das famílias camponesas; * colocar alimentos de qualidade na mesa de quem precisa; * resgatar na sociedade a valorização da agricultura camponesa; 2013 foi aprovado de 40% das propostas serem em nomes das mulheres.
* burocracias trazem diculdades; * Legislação sanitária é um empecilho para muitos dos produtos; * a CONAB tem diculdade de gente para atender as demandas; * entidades sem compromisso fazendo PAA para beneciar políticos ou pessoas individualmente e politicamente; OBS: Os 40% de propostas em nome das mulheres tiveram muitos limites em função das documentações (terra, DAP, etc).
PNAE (2009)
O Programa Nacional da Alimentação Escolar já existia, e em 2009 conseguimos aprovar que no mínimo 30% dos alimentos sejam comprados da Agricultura familiar. * as prefeituras, governos estaduais e governo federal precisam então obrigatoriamente gastar 30% da verba de alimentação escolar com a agricultura familiar;
* garantia de comercialização da produção camponesa; Incentivo a diversicação; * alimentos de qualidade para as crianças nas escolas;
* burocracia; * falta de interesse das prefeituras e das próprias escolas nos alimentos de qualidade da agricultura camponesa; * Legislação sanitária que impede a venda de muitos produtos; * ter produção organizada para manter constância nas entregas.
Educação do Campo-LDB
* há na legislação uma série de direitos e garantias para a educação do campo, porém os governos sempre se negam a colocar em prática essas leis. * a lei garante a manutenção de todas as escolas do campo, a inclusão de temas de interesse das famílias no estudo das crianças, mudanças no calendário escolar, etc.
* ter uma pedagogia própria e apropriada à realidade camponesa; * ter uma educação que valorize a vida camponesa, e que crie condições de melhorar a vida no campo; * ter acesso a todos os níveis de estudo para o conjunto do campesinato;
* desconhecimento da lei; * valorização extrema da cidade e negação do campo; * falta de professores com capacidade de fazer uma pedagogia diferenciada; Muitas escolas no campo já foram fechadas e a reabertura é um desao.
Previdência (1988) Saúde
A previdência social para os camponeses “Segurado especial” (auxílio maternidade, auxilio doença, aposentadoria, pensão, etc) – é uma conquista muito importante para a população camponesa, e há muitos interessados em acabar com o segurado especial;
* é uma segurança para as famílias camponesas quanto ao futuro, ou em condições adversas; * garante renda para as pessoas que não estão em condições de trabalhar; É um direito conquistado.
* o INSS não tem estrutura e pessoal para atender a demanda da população; * as famílias tem problemas com documentação que comprove a atividade rural; * existem combinados em postos do INSS com advogados e sindicatos para extorquir dinheiro dos camponeses; Para as Mulheres, principalmente, as reformas da previdência é um retrocesso aos direitos já garantidos em lei, onde está para acabar a condição de segurada especial, burocracia excessiva, corte de recursos - o que leva a negação pelos peritos dos auxílios doenças, aumento da idade para aposentadoria, etc.
SUS como direito universal-1988
* através da luta das organizações os medicamentos naturais (toterápicos) foram incluídos no SUS, ou seja, foram reconhecidos. * o SUS se implantado e garantido seu funcionamento é um excelente sistema;
* ter em todas as comunidades postos de atendimento à saúde, com prossionais que conheçam a pliquem a saúde alternativa; * Valorizar, respeitar e utilizar os conhecimentos populares no tratamento da saúde; * romper com o modelo químico de tratamento;
* falta de recursos; * recursos de saúde investidos muito no tratamento e pouco na prevenção; * muito investimento em ambulâncias e transporte e pouco em atendimento; * formação de médicos controlada pelos interesses do mercado; * preconceito contra a saúde alternativa.
Podemos assim dizer que, o Estado Capitalista tem as suas estratégias com as Políticas Sociais-Políticas Públicas que é Manter a Sociedade Capitalista, nós nas organizações temos as nas nossas estratégias que são outras que é Transformar a Sociedade, e as políticas públicas tem função importantíssima na melhoria da vida dos trabalhadores e trabalhadoras, das camponesas em geral. Por isso, é necessário estudar e entender bem cada ação nossa, para não cairmos nos objetivos deles. Importante ressaltar que o capital e o Estado tenta amaciar a luta com políticas públicas, mais em última instancia se necessário eles tem a força, a repressão para garantir seus interesses.
4- Participação das Mulheres nesse contexto todo. Em toda a trajetória das lutas Sociais pelos direitos no geral, desde as protoformas das Políticas Sociais, até os dias de hoje, todas as conquistas, as mulheres sempre estiveram presentes lutando e buscando a melhoria das condições de vida para elas e para seus lhos/as, familiares, etc. Embora que, historicamente a participação das mulheres sempre foi marcada pela invisibilidade que é fruto da Sociedade Patriarcal. No MPA também, desde seu surgimento, as mulheres sempre estiveram presentes em todos os momentos decisivos, nas conquistas, nas lutas, nas formações, na construção orgânica do movimento, seja preocupadas com a Educação que chega aos seus/as lhos/as, como também no processo produtivo, na diversicação, no cuidado com os alimentos saudáveis, na garantia da renda econômica, nos intercâmbios entre organizações e pessoas, entre outros. O dia o8 de março para nós camponesas da Via Campesina, em especial as do MPA, tem sido um marco histórico de luta das mulheres pelos direitos e nós não aceitamos redução de direitos já conquistados, queremos é ampliar ainda mais. Nesse contexto, apresenta-se alguns desaos para que haja melhor participação das companheiras, que passa pela, necessidade do conjunto da sociedade e da organização nas suas diversas instancias proporcionar as condições para que as mulheres se preparem para assumir mais o comando político, para isso, é necessário que elas tenham acesso aos diversos conhecimentos políticos-técnicos, estudo, espaço para ciranda infantil (principalmente em fase de amamentação), ou seja, tudo que permitirá o melhor desenvolvimento do ser humano, que são os espaços de Conhecimento e Socialização, portanto, é necessário que as Mulheres tenham acesso aos espaços de conhecimentos e de socializar esses conhecimentos. Em torno das políticas públicas, queremos que haja uma luta mais focada e conscientizada em torno de algumas pautas que é urgente ser priorizada como: previdência rural( o acesso tem sido cada dia mais restrito, principalmente pelas mulheres, garantia de salário maternidade de 180 dias, não às reformas previdenciárias, etc.), Saúde, Educação, inclusão do nome das mulheres nas documentações(bloco de produtor, escrituras, ITR-CCIR, ...), Moradia, Comercialização dos produtos-PAA, PNAE, Feiras, entre outros. Portanto, há muitos desaos colocados para a transformação social que queremos para superarmos a sociedade capitalista e patriarcal, onde no futuro próximo, estabelecermos um espaço que todas as mulheres e todos os homens terão seus direitos garantidos e a opressão de gênero e de classe serão superadas. Nenhum direito a menos, todos os direitos garantidos já!. “Mulheres- lhas da terra Produzindo sementes Crioulas Alimentando sonhos de libertação”.
Referências bibliográcas: BOSCHETTI, Ivanete. A relação Trabalho-Assistência nas Sociedades capitalistas. In. Assistência Social no Brasil: um direito entre a Originalidade e Conservadorismo. Brasília, 2001. CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. GRANEMANN, Sara. Para uma critica marxista das Políticas Sociais. 2011. IAMAMOTO, Marilda. Serviço Social em tempo de capital fetiche: capital nanceiro, trabalho e questão social. 7 ed. São Paulo: Cortez, 2012. IASI, Mauro L. Democracia de cooptação e o apassivamento da classe trabalhadora In: Salvador, E. e Granemann, S... [et Al.] (orgs.) Financeirização, Fundo público, Política Social: São Paulo: Cortez, 2012. Marx, Karl. O Capital. Critica da Economia politica. Livro I, volume I. Civilização Brasileira, 2012. MPA, Movimento dos Pequenos Agricultores-Brasil, Caderno de estudo I, 2013. Introdução a História Social do Campesinato. Brasília, março 2013. NETTO, José Paulo. Capitalismo Monopolista e Serviço Social. 8 ed. São Paulo: Cortez, 2011. NETTO, José Paulo. Economia Política: uma introdução crítica. 6ª ed. São Paulo: Cortez, 2010. Krauser, Raul Ristow. Estudos sobre o Estado em Gramsci. 2012. Debate da Escola de Formação Feminista do MPA-2013. SITCOVSKY, Marcelo. Particularidades da expansão da Assistência Social no Brasil. In. MOTA, Ana Elizabete (org.). O Mito da Assistência social: ensaio sobre Estado, Política e Sociedade. São Paulo: Cortez Ed., 2008. - Arte do 08 de março + Lema
“Soberania Alimentar, uma perspectiva feminista” Esther Vivas Os sistemas de produção e consumo de alimentos sempre foram socialmente organizados, mas suas formas tem variado historicamente. Nas últimas décadas, sob o impacto das políticas neoliberais, a lógica capitalista se impôs, cada vez mais, na forma na qual se produz e se distribui os alimentos (Bello, 2009)/1. Neste artigo queremos analisar o impacto destas políticas agroindustriais sobre as mulheres e o papel chave que as mulheres camponesas desempenham, tanto nos países do Norte como do Sul, na produção e distribuição dos alimentos. Também analisaremos como uma proposta alternativa ao modelo agrícola dominante deve necessariamente incorporar uma perspectiva feminista, e como os movimentos sociais trabalham nesta direção, a favor da soberania alimentar, incluem esta perspectiva. *Camponesas e invisíveis* Nos países do Sul, as mulheres são as principais produtoras de comida, as encarregadas de trabalhar a terra, manter as sementes, coletar os frutos, conseguir água, cuidar do gado... Entre 60 e 80% da produção de alimentos nestes países recai sobre as mulheres, sendo uns 50% em nível mundial (FAO, 1996). Elas são as principais produtoras de cultivos básicos como o arroz, o trigo e o milho, que alimentam as populações mais empobrecidas do Sul global. Entretanto, apesar de seu papel chave na agricultura e na alimentação, elas são, juntamente com os meninos e meninas, as mais afetadas pela fome. As mulheres camponesas se responsabilizaram, durante séculos, das tarefas domésticas, do cuidado com as pessoas, da alimentação de suas famílias, do cultivo para o autoconsumo e das trocas e comercialização de alguns excedentes de suas hortas, encarregando-se do trabalho reprodutivo, produtivo e comunitário, e ocupando uma esfera privada e invisível. Por outro lado, as principais transações econômicas agrícolas estiveram, tradicionalmente, nas mãos dos homens, nas feiras, com a compra e venda de animais, a comercialização de grandes quantidades de cereais... ocupando a esfera pública camponesa. Esta divisão de papéis, atribui às mulheres o cuidado da casa, da saúde, da educação de suas famílias e outorga aos homens o manejo "técnico" da terra e dos maquinários, e mantém intactos os papéis designados como masculinos e femininos, e que durante séculos, e ainda hoje, perduram em nossas sociedades (Oceransky Losana, 2006). Os dados falam por si só. Segundo dados da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) (1996), em muitos países da África as mulheres representam 70% da mão de obra no campo; se encarregam pelo suprimento de água; são responsáveis por 60-80% da produção dos alimentos para o consumo familiar e para venda; e realizam 100% do processamento dos alimentos, 80% das atividades de armazenamento e transporte da comida e 90% das atividades de preparação da terra. Estas cifras expõem a relevância do papel crucial que as mulheres africanas tem na produção agrícola em pequena escala e na manutenção e subsistência familiar. No entanto, em muitas regiões do Sul global, na América Latina, África subsaariana e sul da Ásia, existe uma "feminização" do trabalho agrícola assalariado, especialmente em setores orientados para a exportação não tradicional (Fraser, 2009). Entre 1994 e 2000, segundo White e Leavy (2003), as mulheres ocuparam 83% dos novos postos de trabalho no setor da exportação agrícola não tradicional. Assim, muitas mulheres conseguiram pela primeira vez um posto de trabalho remunerado, com ganhos econômicos que lhes permitiram um maior poder de tomada de decisões e a possibilidade de participarem em organizações fora do âmbito familiar (Fraser, 2009). Entretanto esta dinâmica vem acompanhada de uma divisão marcada de gêneronos postos de trabalho: nas plantações as mulheres realizam as tarefas não qualicadas, como a seleção e a embalagem, enquanto os homens realizam acolheita e a plantação. Esta incorporação da mulher no âmbito do trabalho remunerado implica em carga
de trabalho dobrada para as mulheres, que continuam cuidando de seus familiares ao mesmo tempo que trabalham para obter recursos nanceiros, na maioria das vezes em empregos precários. Elas contam com condições de trabalho piores que de seus companheiros, recebendo remuneração inferior pelas mesmas tarefas e tendo que trabalhar mais tempo para receber os mesmos salários. Na Índia, por exemplo, o salário médio das mulheres para o trabalho temporário na agricultura é 30% inferior ao dos homens (Banco Mundial, 2007). No Estado espanhol as mulheres cobram 30% a menos, e esta diferença pode chegar a 40% (Oceransky Losana, 2006). *Impacto das políticas neoliberais* A aplicação dos Programas de Ajuste Estrutural (PAE), nos anos 80 e 90, nos países do Sul por parte do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI), para que estes pudessem pagar suas dívidas externas, agravou ainda mais as condições de vida da maior parte da população nestes países, e especialmente as mulheres. As medidas de choque impostas pelos PAE consistiram em forçar que os governos do Sul retirassem as subvenções aos produtos de primeira necessidade como pão, arroz, leite, açúcar...; reduções drásticas no gasto público com educação, saúde, habitação e infraestruturas foram impostas; a desvalorização forçada das moedas nacionais, com o objetivo de baratear produtos destinados à exportação, diminuíram a capacidade de compra da população local; as taxas de juros foram aumentadas com o objetivo de atrair capitais estrangeiros com alta remuneração, gerando uma espiral especulativa, etc. Em resumo, uma série de medidas que mergulharam na pobreza as populações destes países (Vivas, 2008). As políticas de ajustes e as privatizações repercutiram de forma particular sobre as mulheres. Como assinalou Juana Ferrer, responsável pela Comissão Internacional de Gênero da Via Campesina: "Nos processos de privatização dos serviços públicos as mulheres foram as mais afetadas, principalmente nas áreas como a saúde e a educação, visto que as mulheres historicamente se encarregam mais fortemente das responsabilidades familiares. A medida que não temos acesso aos recursos e aos serviços públicos, se torna mais difícil ter uma vida digna para as mulheres" (Via Campesina, 2006: 30). O colapso do campo nos países do Sul e a intensicação da migração para as cidades provocou um processo de "descamponeização" (Bello, 2009), que em muitos países não tomou a forma de um movimento clássico campo-cidade, onde os excamponeses vão para as cidades trabalhar em fábricas como parte do processo de industrialização, mas se deu, como Davis (2006) denomina, um processo de "urbanização desconectada da industrialização", onde os ex-camponeses, empurrados para as cidades, passam a engrossar a periferia das grandes metrópoles (favelas), vivendo da economia informal e congurando o que o autor chama de "proletariado informal". As mulheres são componentes essenciais dos uxos migratórios, nacionais e internacionais, que provocam a desarticulação e o abandono das famílias, da terra e dos processos de produção, uma vez que aumentam a carga familiar e comunitária das mulheres que cam no campo. Na Europa, Estados Unidos, Canadá... as mulheres migrantes acabam assumindo trabalhos que eram realizados pelas mulheres locais anos atrás, reproduzindo uma espiral de opressão, carga e invisibilização dos cuidados com a saúde, e externalizando os custos sociais e econômicos para as comunidades de origem das mulheres migrantes. A incapacidade para resolver a crise atual dos serviços de saúde nos países ocidentais, fruto da incorporação massiva das mulheres no mercado de trabalho, o envelhecimento da população e a não resposta do Estado a estas necessidades, serve como álibi para a importação de milhões de "cuidadoras" dos países do Sul global. Como observa Ezquerra (2010: 39): "[Esta] diáspora cumpre a função de invisibilizar a incompatibilidade existente entre o auge do sistema capitalista e a manutenção da vida no Centro, e aprofunda a crise dos serviços de saúde, entre outras crises, nos países do Sul (...) A 'rede internacional dos cuidados' se converte em um dramático círculo vicioso que garante a sobrevivência do sistema capitalista patriarcal".
*Acesso à terra* O acesso à terra não é um direito garantido para muitas mulheres: em vários países do Sul as leis proíbem este direito e, naqueles países onde existe o acesso legal, as tradições e práticas as impedem. Como explica Fraser (2009: 34): "No Cambodia, por exemplo, mesmo não sendo ilegal que as mulheres possuam terra, a norma cultural dita que não a possuam, e apesar de que elas sejam as responsáveis pela produção agrícola, as mulheres não têm nenhum controle sobre a venda da terra ou a forma que esta se passa aos lhos". Uma situação que se pode extrapolar para muitos outros países. Na Índia, como mostra Chukki Nanjundaswamy da organização camponesa Karnataka State Farmers Association/2 a situação das mulheres em relação ao acesso à terra e aos serviços de saúde é muito difícil: "Socialmente as camponesas indianas quase não têm direitos e são consideradas um adendo dos homens. As camponesas são as mais intocáveis dentro dos intocáveis, no sistema social de castas" (Via Campesina, 2006: 16). Para as mulheres na África, o acesso à terra é ainda mais dramático devido ao aumento das mortes por causa da AIDS. Por um lado, as mulheres tem mais possibilidades de serem infectadas, e por outro, quando um homens de sua família morre, e este tem a titularidade da terra, as mulheres tem muitas diculdades para assumir o controle. Em várias comunidades elas não têm o direito à herança, e por isso, perdem a propriedade da terra e outros bens ao carem viúvas (Jayme et al, 2006). A terra é um ativo muito importante: permite a produção de alimentos, serve como investimento para o futuro e como aval, implica no acesso ao crédito, etc. As diculdades das mulheres em possuírem terras é uma mostra a mais de como o sistema agrícola e patriarcal prejudica principalmente a elas. E quando elas tem a titularidade, se trata, na maioria das vezes, de terras com menor valor ou extensão. Desta forma, as mulheres enfrentam mais diculdades para conseguir créditos, serviços e insumos. Em nível mundial, se estima que as mulheres recebam somente 1% dos empréstimos agrícolas, e mesmo assim não está claro se o controle dos mesmos é exercido por seus companheiros ou familiares (Fraser, 2009). Mas estas práticas não ocorrem somente nos países do Sul global. Na Europa, por exemplo, muitas camponesas padecem de uma inseguridade jurídica total, já que a maioria delas trabalham em áreas familiares onde os direitos administrativos são propriedade exclusiva do titular da área, e as mulheres, apesar de trabalharem nela, não tem direito à apoios, à plantação, à uma cota do leite, etc. Como explica Isabel Vilalba Seivane, secretária de mulheres no Sindicato Labrego Galego na Galícia, os problemas das mulheres no campo, tanto nos países do Sul como nos do Norte, são comuns apesar das diferenças: "As mulheres europeias estão mais centradas nas lutas por seus direitos administrativos na exploração; enquanto em outros lugares as mulheres lutam por mudanças profundas que tem a ver com a reforma agrária, com o acesso à terra e a outros recursos básicos" (Via Campesina, 2006: 26). Nos Estados Unidos, Debra Eschmeyer da National Family Farm Coalition (Coalizão Nacional de Agricultores Familiares) explica como lá também existem práticas que mostram esta desigualdade: "Por exemplo, quando uma camponesa vai sozinha a um banco buscar crédito, é maiscomplicado de obtê-lo do que se fosse um homem" (Via Campesina, 2006: 14). *Agroindústria versus soberania alimentar* O modelo agroindustrial atual se mostrou totalmente incapaz de satisfazer as necessidades alimentares das pessoas e incompatível com o respeito à natureza. Nos encontramos diante de um sistema agrícola e alimentar submetido a uma alta concentração empresarial ao longo de toda a cadeia comercial, sendo monopolizado por um punhado de multinacionais de agronegócios que contam com o apoio de governos e instituições internacionais, que se tornaram cúmplices, quando não em co-beneciários, de um sistema alimentar produtivista, insustentável e privatizado. Um modelo que é utilizado como instrumento imperialista e de controle político, econômico e social por parte das principais potências econômicas do Norte, como Estados Unidos e a União Europeia (assim como de suas multinacionais agroalimentares), em relação aos países do Sul global (Toussaint, 2008; Vivas, 2009).
Como demonstra Desmarais (2007), pode-se entender o sistema alimentar como uma extensa cadeia horizontal que foi se alongando cada vez mais, distanciando a produção do consumo, e favorecendo a apropriação das diferentes etapas da produção pelas empresas agroindustriais e a perda de autonomia dos campesinos frente a estas empresas. A situação de crise alimentar, que explodiu ao longo dos anos 2007 e 2008 com um forte aumento dos preços dos alimentos básicos/3, pôs em destaque a extrema vulnerabilidade do sistema agrícola e alimentar, e deixou para trás a cifra de milhões de pessoas que passam fome, uma em cada seis no mundo, segundo dados da FAO (2009). Mas o problema atual não é a falta de alimentos, e sim a impossibilidade de acessálos. De fato, a produção mundial de cereais triplicou desde os anos 60, enquanto a que população global somente duplicou (GRAIN, 2008). Com estas cifras, podemos armar que se produz comida suciente para alimentar toda a população, mas para os milhões de pessoas dos países do Sul que destinam entre 50 e 60% da renda na compra de alimentos, valor que pode chegar até 80% nos países mais pobres, o aumento do preço da comida torna o acesso a ela impossível. Existem razões de fundo que explicam o porquê da profunda crise alimentar. As políticas neoliberais aplicadas indiscriminadamente no transcorrer dos últimos 30 anos em escala planetária (liberalização comercial ao extremo, pagamento da dívida externa por parte dos países do Sul, a privatização dos serviços e bens públicos...) assim como um modelo de agricultura e alimentação ao serviço de uma lógica capitalista são os principais responsáveis por esta situação, desmontando o modelo de agricultura camponesa que garantiu a segurança alimentar dos povos durante décadas (Holt-Giménez e Patel, 2010). Frente a este modelo agrícola dominante que tem um impacto muito negativo nas pessoas, especialmente nas mulheres, e no meio ambiente, se suscita o paradigma da soberania alimentar. Uma alternativa política que consiste no "direito de cada povo em denir suas próprias políticas agropecuárias e alimentares, proteger e regulamentar a produção agropecuária nacional e o mercado doméstico" (VVAA, 2003: 1). Trata-se de recuperar nosso direito em decidir sobre o que, como e onde se produz o que comemos; que a terra, a água, as sementes estejam nas mãos das e dos camponeses; que sejamos soberanos no que diz respeito a nossa alimentação. Entretanto, se as mulheres representam a metade da mão de obra no campo em escala mundial, uma soberania alimentar que não inclua uma perspectiva feminista estará condenada ao fracasso. A soberania alimentar implica em romper não somente com um modelo agrícola, como também com um sistema patriarcal que oprime e subordina as mulheres. Trata-se de incorporar a perspectiva feminista à soberania alimentar. Como mostra Yoon Geum Soon da associação de mulheres camponesas coreanas KWPA e representante da Via Campesina na Ásia: "O feminismo é um processo que permite conseguir um lugar digno para as mulheres dentro da sociedade, para combater a violência contra as mulheres, e também reivindicar e reclamar nossas terras e salvá-las das mãos de transnacionais e das grandes empresas. O feminismo é a via para que as mulheres camponesas possam ter um papel ativo e digno no seio da sociedade" (Via Campesina, 2006:12). *A Via Campesina* A Via Campesina é o principal movimento internacional de pequenos agricultores e promotor do direito dos povos à soberania alimentar. A Via foi constituída em 1993, na aurora do movimento antiglobalização, e progressivamente se converteu em uma das organizações de referência na crítica da globalização neoliberal. Sua ascensão é a expressão da resistência camponesa ao colapso do mundo rural, provocado pelas políticas neoliberais e a intensicação das mesmas com a criação da Organização Mundial para o Comércio (Antenas e Vivas, 2009a). Desde a sua criação, a Via Campesina congurou uma identidade "camponesa" politizada, ligada à terra, à produção dos alimentos e à defesa da soberania alimentar, construída em oposição ao modelo atual do agronegócio (Desmarais, 2007). A Via encarna um novo tipo de "internacionalismo camponês" (Bello, 2009), que podemos conceituar
como o "componente camponês" do novo internacionalismo das resistências representado pelo movimento antiglobalização (Antenas e Vivas, 2009b). No ano de 1996, coincidindo com a Cúpula Mundial sobre a Alimentação da FAO, em Roma, a Via levantou a proposta da soberania alimentar como uma alternativa política a um sistema agrícola e alimentar profundamente injusto e depredador. Esta demanda não implica em um retorno romântico ao passado, mas se trata de recuperar o conhecimento e as práticas tradicionais e combiná-las com as novas tecnologias e novos saberes (Desmarais, 2007). Nem deve consistir, como assinala McMichael (2006), em um enfoque localista ou uma "misticação do pequeno", mas sim em repensar o sistema alimentar mundial para favorecer formas democráticas de produção e distribuição de alimentos. *Uma perspectiva feminista* Com o tempo, a Via incorporou uma perspectiva feminista, trabalhando para conseguir a igualdade de gênero no seio de suas organizações, assim como estabelecendo alianças com grupos feministas como a rede internacional da Marcha Mundial das Mulheres, entre outros. No seio da Via Campesina, a luta das mulheres se situa em dois níveis. Por um lado, a defesa de seus direitos como mulheres dentro das organizações e na sociedade em geral e, por outro lado, a luta como camponesas, junto a seus companheiros, contra o modelo de agricultura neoliberal (EHNE e La Vía Campesina,2009). Desde a sua constituição, o trabalho feminista na Via Campesina deu passos importantes adiante. Na 1ª Conferência Internacional de Mons (Bélgica), em 1993, todos os coordenadores eleitos eram homens e a situação da mulher camponesa praticamente não recebeu nenhuma menção na declaração nal, embora tenha sido identicada a importância de integrar suas necessidades ao trabalho da Via. Mas esta conferência falhou em estabelecer mecanismos que assegurassem a participação das mulheres em encontros sucessivos. Desta forma, na 2ª Conferência Internacional em Tlaxcala (México), em 1996, a porcentagem de mulheres dentre os participantes foi igual à 1ª Conferência Internacional, uns 20% do total. Para resolver esta questão, foram acordados mecanismos que permitissem uma melhor representação e participação, e se criou um comitê especial de mulheres, que mais adiante seria conhecido como a Comissão de Mulheres da Via Campesina. Esta orientação política facilitou a incorporação de contribuições feministas nas análises da Via. Por exemplo, quando o conceito de soberania alimentar foi apresentado publicamente, coincidindo com a Cúpula Mundial sobre a Alimentação da FAO, em Roma, em 1996, as mulheres contribuíram com demandas próprias, como a necessidade de produzir os alimentos localmente, incluíram a dimensão da saúde humana às "práticas agrícolas sustentáveis", exigiram a redução drástica dos insumos químicos prejudiciais à saúde, e defenderam a promoção ativa da agricultura orgânica. Além disso, e devido ao acesso desigual das mulheres aos recursos produtivos, insistiram que a soberania alimentar não podia ser alcançada sem uma maior participação feminina na denição das políticas camponesas (Desmarais, 2007). Para Francisca Rodríguez da associação campesina ANAMURI, no Chile: "Assumir a realidade e demandas das mulheres rurais tem sido um desao dentro de todos os movimentos camponeses (...) A história deste reconhecimento passou por diversas etapas: da luta interna pelo reconhecimento, da ruptura com as organizações machistas (...) E ao longo destes últimos 20 anos as organizações de mulheres camponesas ganharam identidade (...), nos reconstruímos como mulheres em um meio rural esmagado" (Mugarik Gabe, 2006:254). O trabalho da Comissão de Mulheres permitiu fortalecer o intercâmbio entre mulheres de países diferentes, organizando, por exemplo, encontros especícos de mulheres coincidindo com cúpulas e reuniões internacionais. Entre os anos 1996 e 2000, o trabalho da Comissão focou, principalmente, na América Latina, onde através da formação, do intercâmbio, da discussão e do empoderamento das camponesas, aumentou a participação delas em todos os níveis e atividades da Via. Como destaca Desmarais (2007: 265): "Na maioria dos países, as organizações camponesas e agrícolas estão dominadas por homens. As mulheres da Via Campesina se
negam a aceitar estas posições subordinadas. Mesmo reconhecendo o caminho longo e difícil que têm pela frente, elas aceitam de forma entusiasmada o desao e prometem alcançar um papel de destaque na transformação da Via Campesina como um movimento comprometido com a igualdade de gênero". Em outubro de 2000, exatamente antes da 3ª Conferência Internacional da Via em Bangalore (Índia), se organizou a 1ª Assembleia Internacional das Mulheres Camponesas, que permitiu uma maior participação das mulheres na Conferência. A Assembleia aprovou três grandes objetivos para realizar: a) Garantir a participação de 50% de mulheres em todos os níveis de decisões e nas atividades da Via Campesina. b) Manter e fortalecer a Comissão das Mulheres. c) Garantir que os documentos, os eventos de formação e os discursos da Via Campesina superassem o conteúdo sexista e a linguagem machista (Desmarais, 2007). Desta forma, na 3ª Conferência Internacional, se acordou uma mudança de estrutura que garantiu a equidade de gênero. De acordo com Paul Nicholson da Via Campesina: "[Em Bangalore] decidiu-se pela equidade homem e mulher nos espaços de representação e cargos de nossa organização, e se iniciou um processo interno de reexão sobre o papel das mulheres na luta camponesa (...). Agora a perspectiva de gênero está sendo abordada de maneira séria, não somente no âmbito da paridade nos cargos, como também com um debate profundo sobre as raízes e tentáculos do patriarcado e sobre a violência contra a mulher no mundo rural" (Soberania alimentaria, biodiversidad y culturas, 2010: 8). Esta estratégia forçou as organizações membro da Via Campesina em nível nacional e regional a repensar seu trabalho em uma perspectiva de gênero e incorporar novas ações encaminhadas para fortalecer o papel da mulher (Desmarais, 2007). Assim raticou Josie Riffaud da Confédération Paysanne (Confederação Camponesa) na França ao armar que "a decisão da paridade foi fundamental na Via Campesina, pois possibilitou que na minha organização, a Confédération Paysanne, pudéssemos aplicar também esta medida" (La Vía Campesina, 2006: 15). No âmbito da 4ª Conferência Internacional em São Paulo, em junho de 2004, foi celebrada a 2ª Assembleia Internacional das Mulheres Camponesas, que reuniu mais de uma centena de mulheres de 47 países de todos os continentes. As principais linhas de ação que surgiram do encontro foram tomar medidas contra a violência física e sexual contra as mulheres, tanto no âmbito doméstico como no geopolítico, exigir igualdade de direitos e investir na formação. Como assinalava sua declaração nal: "Exigimos nosso direito a uma vida digna; o respeito a nossos direitos sexuais e reprodutivos; e a aplicação imediata de medidas para erradicar toda forma de violência física, sexual, verbal e psicológica (...) Exigimos que os Estados implementem medidas que garantam nossa autonomia econômica, acesso à terra, à saúde, à educação e a um status social igualitário" (2ª Asamblea Internacional de Mujeres Campesinas, 2004). Em outubro de 2006 foi realizado o Congresso Mundial das Mulheres da Via Campesina em Santiago de Compostela (Espanha), no qual participaram mulheres de organizações agrárias da Ásia, América do Norte, Europa, África, e América Latina, com o objetivo de analisar e debater o que signica a igualdade no campo a partir da perspectiva feminista e estabelecer um plano de ação para conseguí-la. Como mostrava Sergia Galván, do Colectivo Mujer y Salud da República Dominicana, em uma das conferências do Congresso, as mulheres da Via tinham três desaos adiante: a) Avanças na reexão teórica para incorporar a perspectiva camponesa nas análises feministas. b) Continuar trabalhando na autonomia como referência vital para a consolidação do movimento de mulheres camponesas. c) Superar o sentimento de culpa na luta para alcanças maiores espaços de poder frente aos homens (La Vía Campesina, 2006). O Congresso Mundial das Mulheres da Via pôs em destaque a necessidade de fortalecer ainda mais a articulação das mulheres da Via e aprovou a criação de mecanismos para um maior intercâmbio de experiências e planos de lutas especícos. Além disso, observaram-se avanços na redução da discriminação das mulheres, apesar de que ainda havia muito por fazer. Dentre as propostas concretas aprovadas estava articular uma campanha mundial para lutar contra as violências que se exercem sobre as mulheres;
estender os debates a todas as organizações que fazem parte da Via; e trabalhar para que os direitos das mulheres camponesas sejam reconhecidos, exigindo igualdade real no acesso a terra, aos créditos, aos mercados e aos direitos administrativos (La Vía Campesina, 2006). Coincidindo com a 5ª Conferência Internacional da Via Campesina em Maputo, Moçambique, outubro de 2008, foi realizada a 3ª Assembleia Internacional de Mulheres. Nesta se aprovou o lançamento de uma campanha especíca contra a violência contra as mulheres, ao constatar como todas as formas de violência que as mulheres enfrentam na sociedade (violência física, econômica, social, machista, de diferenças de poder, cultural) também estão presentes nas comunidades rurais e nas suas organizações. Entretanto, o trabalho focado em obter maior igualdade de gênero não é fácil. Apesar da paridade formal, as mulheres tem maiores diculdades para viajar e participar de encontros e reuniões. Como mostra Desmarais (2007: 282): "Existem muitas razões para que as mulheres não participem neste nível. Talvez a mais importante é a persistência de ideologias e práticas culturais que perpetuam relações de gênero desiguais e injustas. Por exemplo, a divisão dos trabalhos por gênero signica que as mulheres rurais tem muito menos acesso ao recurso mais precioso, o tempo, para participar como líderes nas organizações agrícolas. Tendo em vista que as mulheres são as principais responsáveis pelo cuidado das crianças e dos idosos (...). A jornada tripla das mulheres - que implica no trabalho reprodutivo, produtivo e comunitário - torna muito menos provável que elas tenham tempo para sessões de formação e aprendizagem para sua capacitação como líderes". Trata-se de uma luta contracorrente e, apesar de algumas vitórias concretas, nos encontramos frente a um combate de longo curso, tanto nas organizações como, mais em geral, no social. *Tecendo alianças* No que diz respeito às alianças, a Via Campesina estabeleceu colaboração com várias organizações e movimentos sociais em nível internacional, regional e nacional. Uma das mais signicativas tem sido o trabalho conjunto, em cada um destes níveis, com a Marcha Mundial das Mulheres, uma das principais redes globais feministas com quem convocaram ações conjuntas, encontros e se tem colaborado em atividades e conferências internacionais, juntamente com outros movimentos sociais, como por exemplo o Fórum Internacional pela Soberania Alimentar, que aconteceu em Mali, em 2007, entre outros. O encontro entre as redes se deu, inicialmente, na estruturação do movimento antiglobalização, ao coincidir com contra cúpulas internacionais, assim como nas atividades do Fórum Social Mundial, e serem ambas, juntamente com outras redes, promotoras da Assembleia de Movimentos Sociais do Fórum Social Mundial. Desta maneira,a incorporação de uma perspectiva feminista no seio da Via e do trabalho camponês, e a favor da soberania alimentar gerou mais pontes de encontro que se intensicaram ao passar do tempo. Assim cou claro no Fórum pela Soberania Alimentar celebrado no início de 2007 em Sélingué, um pequeno povoado rural do sudeste de Mali. Um encontro convocado pelos principais movimentos sociais de escala internacional como a Via Campesina, a Marcha Mundial das Mulheres, o Fórum Mundial dos Povos Pescadores, entre outros, e que permitiu avançar na denição de estratégias conjuntas entre um amplo leque de movimentos sociais (camponeses, pescadores, pastores, consumidores...) a favor da soberania alimentar. As mulheres tiveram um papel central neste encontro, como dinamizadoras, organizadoras e participantes. Elas armaram o mito de Nyéléni, uma mulher camponesa malinense que lutou para rmar-se como mulher em um entorno desfavorável. De fato, o Fórum pela Soberania Alimentar recebeu o nome de Nyéléni em homenagem a esta lenda. Delegadas de países da África, América, Europa, Ásia e Oceania, integrantes de diferentes setores e movimentos sociais, participaram do encontro e indicaram o sistema capitalista e patriarcal como responsável pelas violações dos direitos das mulheres, rearmando seu
compromisso em transformá-lo. A Marcha Mundial das Mulheres, fruto deste trabalho e colaboração, assumiu a demanda da soberania alimentar como um direito inalienável dos povos, e em especial, das mulheres. Miriam Nobre, coordenadora do secretariado internacional da Marcha, participou em outubro de 2006 do Congresso Mundial das Mulheres da Via Campesina com uma intervenção sobre o movimento feminista global. E o 7º Encontro Internacional da Marcha Mundial das Mulheres em Vigo, Espanha, em outubro de 2008, contou com a organização de um fórum e uma feira pela soberania alimentar, mostrando a capacidade de vincular a luta feminista com a luta das mulheres camponesas. Esta colaboração se observa também a partir da dupla militância de algumas mulheres que são membros ativos da Marcha Mundial das Mulheres, e que formam parte das organizações da Via Campesina. Estas experiências permitem estreitar os vínculos e colaborações entre ambas redes e fortaleces a luta feminista como camponesa, visto que ambas se inserem em um combate mais amplo contra o capitalismo e o patriarcado. *Como conclusão* Ao longo das últimas décadas o sistema agrícola e alimentar global tem demonstrado sua total incapacidade para garantir a segurança alimentar das comunidades, visto que atualmente mais de um bilhão de pessoas no mundo passam fome, ao mesmo tempo que demonstrou seu forte impacto no meio ambiente como um modelo agroindustrial quilométrico, intensivo, gerador de mudanças climáticas, que acaba com a agrobiodiversidade, etc. Este sistema se revelou especialmente agressivo com as mulheres. Apesar delas produzirem entre 60 e 80% dos alimentos nos países do Sul global, e uns 50% em todo o mundo, são elas que mais padecem com a fome. Avanças na construção de alternativas ao modelo agrícola e alimentar atual implica em incorporar uma perspectiva de gênero. A alternativa da soberania alimentar ao modelo agroindustrial dominante deve ter um posicionamento feminista de ruptura com a lógica patriarcal e capitalista. A Via Campesina, o principal movimento internacional a favor da soberania alimentar, tem isso muito claro. Trata-se de avançar nesta direção e criar alianças com outros movimentos sociais, em especial com organizações e redes feministas, como a Marcha Mundial das Mulheres. Promover redes e solidariedade entre as mulheres do Norte e Sul, urbanas e rurais, e destas com seus companheiros para, como diz a Via: "Globalizar a luta. Globalizar a esperança". *Bibliografía* 2ª Asamblea Internacional de Mujeres Campesinas (2004) Declaración de la II Asamblea Internacional de Mujeres Campesinas en: http://movimientos.org/cloc/show_text.php3?key=2903 Antentas, JM. y Vivas, E. (2009a) “La Vía Campesina hacia la justicia global” en Ecología Política, nº38, pp. 97-99. Antentas, JM. y Vivas, E. (2009b) “Internacionalismo(s) ayer y hoy” en Viento Sur, nº100, pp. 33-40. Banco Mundial (2007) Informe sobre el desarrollo mundial 2008: agricultura para el desarrollo, Washington DC, Banco Mundial. Bello, W. (2009). The Food Wars. London. Verso. Davis, M. (2006) Planet of slums. Londres. Verso . Desmarais, AA. (2007) La Vía Campesina. La globalización y el poder del campesinado. Madrid. Editorial Popular. EHNE y La Vía Campesina (2009) La Vía Campesina. Las luchas del campesinado en e mundo: http://viacampesina.net/downloads/PDF/viacas.pdf Ezquerra, S. (2010) “La crisis de los cuidados: orígenes, falsas soluciones y posibles oportunidades” en Viento Sur, nº 108, pp. 37-43. FAO (1996) Towards sustainable food security.Women and sustainable food security en: http://www.fao.org/waicent/faoinfo/SUSTDEV/FSdirect/FBdirect/FSP001.htm
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Trecho de Zuleika Alembert: "Sempre que penso nas mulheres, me vem a imagem de um rio enorme e caudaloso que temos que atravessar. Umas apenas molham os pés e desistem, outras nadam até a metade e voltam, temendo que lhe faltem as forças. Mas há aquelas que resolvem alcançar a outra margem custe o que custar. Da travessia, vão largando pedaços de carne, pedaços delas mesmas. E pode parecer aos outros que do lado de lá vai chegar um trapo humano, uma mulher estraçalhada. Mas o que cou pelo caminho é tão somente a pele velha. Na outra margem chega uma nova mulher..." (Zuleika Alambert).
Mulheres Camponesas construindo sonhos no chão do semiárido: PAA e Soberania Alimentar nas mãos das camponesas Organizadoras: Maria José da Costa Geovana Raimunda de Sousa Sônia Maria da Costa Sousa Maria Gonçalves APRESENTAÇÃO Há uma relação direta entre soberania alimentar e as mulheres, pois segundo a organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura - FAO (1996), as mulheres são responsáveis por um percentual que vai de 60 e 80% da produção de alimentos nos países do sul e 50% no mundo inteiro. Portanto as mulheres cuidam da produção tanto para o autoconsumo quanto para a comercialização. As mulheres são parte na produção de alimentos e na conservação de sementes, expressando cuidado com as antigas e as futuras gerações, ou seja, são guardiães da sucessão dos conhecimentos intergeracional. “Elas estão nos processos de resistência nos territórios, contra o agronegócio” (DUARTE, 2012). Diante deste quadro é possível concluir que a realização da soberania alimentar passa pelas mãos das mulheres. Isso dá aos estados nacionais a responsabilidade de garantir às camponesas o acesso a terra, água, crédito, educação, e infraestrutura produtiva que são requisitos indispensáveis ao seu processo de trabalho. Quando tratamos de mulheres do semiárido, essas necessidades são ainda mais visíveis, pois com o curto período de chuvas a produção de ciclos curtos é fundamental para garantia da soberania alimentar das famílias e das comunidades. Portanto os quintais, os pequenos animais, os roçados do entorno são as maiores garantias de disponibilidade de alimentos. É neste cenário que entra o Programa de Aquisição de Alimentos - PAA, como mecanismo de monetarização da produção das camponesas no Brasil. Este trabalho pretende dar luz a participação das mulheres na produção de alimentos e na construção da soberania alimentar das famílias e das comunidades camponesas, destacando a participação das mesmas no PAA e como essa participação têm possibilitado e visibilizado a monetarização da produção feminina camponesa em grupos de famílias organizados pelo Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA em comunidades camponesas do Piauí. 1. Mulheres Camponesas: O tear da Soberania Alimentar A soberania alimentar, os sistemas camponeses de produção, a agroecologia devem ser como feijão e arroz, devem estar em todo canto e recanto, em todo lá e acolá, em todo aqui e ali, passando por tudo e por todos, sem causar susto ou espanto, estando por fora e por dentro, transformando tudo em alimento. É o direito dos povos a denir suas próprias políticas e estratégias sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito a alimentação a toda a população, com base na pequena e média produção, respeitando suas próprias culturas e a diversidade dos modos camponeses produção de comercialização e de gestão, nos quis a mulher desempenha um papel fundamental (MPA, 2013). Não há nada de novo em ver mulheres camponesas assumindo um papel central na produção de alimentos para autoconsumo e para comercialização. Se zermos uma linha do Figura 02 – Cartaz de comemoração dos 10 anos do Plano Camponês. tempo desde as tribos indígenas, veremos que as mulheres se encarregam do suprimento de água, do cultivo cotidiano de autoconsumo e para comercialização, do processamento de praticamente toda a produção familiar, do
cuidado intergeracional das famílias e das comunidades, conformando uma corrente de solidariedade familiar e comunitária importante. Contudo, Vivas (2012), chama atenção para a contradição colocada no estabelecimento dos espaços públicos para os homens e privados para as mulheres, também no processo de produção dos alimentos. [...] encarregando-se do trabalho reprodutivo, produtivo e comunitário, e ocupando uma esfera privada e invisível. Por outro lado, as principais transações econômicas agrícolas estiveram, tradicionalmente, nas mãos dos homens, nas feiras, com a compra e venda de animais, a comercialização de grandes quantidades de cereais, ocupando a esfera pública camponesa. (VIVAS 2012 p.1). Desde que o MPA assumiu o campesinato como identidade política e como sujeito histórico e o Plano Camponês como projeto político desse sujeito histórico, percebe que seria necessário revelar o que há por trás das cortinas da vida familiar camponesa, ou seja, quem são seus membros e que relações estavam sedimentadas nessa família, portanto enxergar a mulher, a juventude e as crianças nesse universo impôs um grande desao para o mesmo, veio também à certeza de que “sem a mulher a luta vai pela metade” e “a argila fundamental de nossa obra é a juventude”. Quando parte do campesinato do Piauí assume o MPA em 2001, Já imprime no mesmo uma cara bem feminina e jovem. As mulheres camponesas estão sempre pensando na família, na comunidade e na sociedade. Todas as lutas históricas realizadas pelas mulheres trazem uma pauta de benefício coletivo: saúde, educação, previdência, alimentos sem veneno, não fechamento das escolas do campo, etc. É o viver bem que motiva as lutas das mulheres, por isso as principais ameaças a esse sonho passa a ser encarado como enfrentamento necessário na luta política. Talvez por isso, as mulheres camponesas abracem mais forte as campanhas contra a violência, contra o uso de agrotóxicos, contra o fechamento de escolas e tantas outras.
“Mulheres: Contra a violência
Contra o capital
Contra o machismo
Figura 03 – Cartaz da Campanha Internacional da Via Campesina – Basta de Violência Contra as Mulheres.
Contra o fascismo neoliberal”.
Considerando que até aqui a história mostra que as mulheres são responsáveis por metade da produção do planeta, chegando em algumas regiões a 80% é imoral a invisibilidade de tamanha participação. Sem contar a violência representada na dependência econômica e nanceira das mulheres em relação aos maridos e companheiros, mesmo em situações em que o seu trabalho assegura o sustento cotidiano da família. Considerando que quando esse trabalho é tido como ajuda ou quando a monetarização do resultado é apropriada pelo marido/companheiro passa a vigorar uma violência econômica e essa violência é sustentada pela lógica do patriarcado, que segundo Machado (2010), é o sistema sustentado na gura do patriarca e estruturalmente as mulheres ocupam posições subalternas, estando sujeitas aos mais variados modos de
dominação pelos homens. É muito expressiva para as mulheres camponesas a independência econômica, pois embora várias camponesas exerçam uma liderança política na comunidade ou em organizações populares e isso lhe assegure um grau de poder na esfera familiar pelo conhecimento adquirido nos espaços políticos e coletivos, o fato de não ter acesso a recursos nanceiros oriundos da produção familiar, as deixa vulneráveis. Por isso ressaltamos a necessidade de políticas públicas que visibilize a participação das mulheres na organização da produção camponesa. 2. Mulheres Camponesas e PAA: rompendo barreiras, construindo espaços. Foi o trabalho das mulheres que deu ao PAA o colorido, a beleza, os cheiros e os sabores que enche as bocas e os olhos de tantos brasileiros e tantas brasileiras de todas as idades e em todos os lugares. Em 2011 dava início uma das maiores secas do nordeste brasileiro. Nos últimos 50 anos, que se arrastou até início de 2014. O nordeste brasileiro enfrenta em 2013 a maior seca dos últimos 50 anos, com mais de 1.400 municípios afetados. A informação foi anunciada nesta segunda-feira (8) pelo Governo brasileiro. A seca deste ano já é pior do que a do ano passado, também recorde (ONU, 2013).
Enquanto os governos apresentavam as velhas fotos de açudes rachados e caveiras de gado morrendo aos montes, as mulheres estavam colhendo as maiores safras de umbus nos centros das caatingas no semiárido brasileiro, em 2011, 2012 e 2013, produzindo muita polpa de umbu para entregar ao PAA. Figura 04 – umbu nativo para preparo de polpas
Foi com essa capacidade de tirar leite de pedra que as camponesas no Piauí aproximaram campo e cidade. Os colégios, as igrejas e as praças se transformaram em espaços de distribuição de alimentos saudáveis. O encontro das mãos que plantam e colhem abraçando as mãos que recebem em um gesto de solidariedade.
Em 2012 foram 9 projetos para a modalidade doação simultânea, beneciando mais de 100 famílias camponesas sendo 62% mulheres (em 2010 93% da participação nos Figura 05 – Entrega de alimentos diretamente ás famílias de Francisco Santos – Piauí na igreja de São Francisco de Assis. contratos eram mulheres e 2011 foram 62%). Essa produção chegou às mãos de mais de sete mil pessoas em 8 municípios. Eram 21 produtos (bolos, doces, polpas, biscoitos, frutas). Em 2014 serão 18 projetos que beneciarão mais de 200 famílias, chegando as mãos de mais de treze mil pessoas em 14 municípios. Em 2011 e 2012 quando a seca foi mais severa, várias famílias camponesas recebiam até R$ 400,00 mensais apenas do PAA, por isso a primeira motivação era a melhoria da condição da família, a renda, a autonomia. Segundo as camponesas, foi na manutenção da família, na melhoria das condições de vida, alimentação e moradia que as mulheres zeram os primeiros investimentos, porém sob a decisão das mulheres. O sentimento da autonomia, do poder de decisão sobre o fruto do seu trabalho é evidente. Todas as mulheres entrevistadas acreditam que só conseguiram acessar o PAA pela luta política do MPA.
Em 2010 foram 26 municípios atendidos com o programa no Piauí na modalidade doação simultânea, isso signica 21% dos municípios atendidos, em 2011 foram 47% dos municípios do estado e em 2012 foram 62% dos municípios participando do PAA na modalidade doação simultânea. Há uma tendência de que a presença do PAA esteja diretamente relacionada a existência de um tecido social organizado. O que deveria sugerir ao estado uma necessidade de apoio institucional para operacionalidade do programa. As entrevistas realizadas apontaram necessidades de melhorias no programa. Das entrevistas realizadas 40% se referiram à burocracia como impedimento de avanço, 70% apontaram a necessidade de investimento em local adequado, já que as cozinhas das casas são pequenas pra continuar fazendo os produtos. 80% das famílias entrevistadas disseram ser necessário o investimento em equipamentos, como fornos, utensílios, fogão, batedeiras, liquidicadores industriais, empacotadeiras, seladoras, etc., todas motivadas pela necessidade de fazer melhor e com menos penosidade o trabalho, além de terem um produto mais apresentável para quem vai receber. Muitas famílias criam e adéquam tecnologias pra ir sanando as diculdades. A família da dona Angelita foi pioneira em fazer forno à lenha com casco de geladeira que possibilitou fazer uma maior quantidade de sequilhos e bolos de uma única vez. Essa tecnologia foi se espalhando por outras comunidades e municípios, cada um adequando a sua necessidade e ao tamanho do seu grupo.
Figura 09 – Forno com casco de geladeira da Serra dos Morros – Francisco Santos.
Meu marido viu um forno na cidade e adaptou com um casco de geladeira, deu certo e ele aprendeu a regular a temperatura certinha, no meu caso meu marido é o dono do forno, é um dos poucos homens que ajuda a fazer tudo do começo ao m. O forno foi uma das coisas mais importantes, tanto que depois nós dois fomos ajudar outras famílias a fazerem os fornos. Precisava ter recurso pra melhorar essas coisas (A. R.).
Figura 10 – Forno a gás em inox – substituição ao forno de casco de geladeira - Serra dos Morros.
Começamos com um forno de casco de geladeira. A dona Angelita e seu Dedé vieram ajudar a construir, isso ajudou a produzir mais, foi importantíssimo. Agora temos um forno a gás que compramos em grupo e ainda estamos devendo. O estado precisa estruturar o campesinato, pois em muitos lugares estamos agonizando. O estado tem feito pouco ainda diante do que precisa e diante do que tem feito pelo agronegócio que é menos produtivo causador de envenenamentos ao meio ambiente e as pessoas (M. K.)
O governo federal através da CONAB/BNDES lançou edital de seleção de projetos de até 50.000,00 para associações e cooperativas que já haviam operado PAA e Programa Nacional de Alimentação Escolar - PNAE para aquisição de equipamentos, o que é muito importante, mas cada entidade só pode concorrer a um projeto, mesmo que essa tenha muitas Cédulas do Produtor Rural em execução. Esse valor se torna insuciente para estruturar as entidades. A elaboração dos projetos é uma diculdade, pois nas comunidades ainda não se tem muitas pessoas com habilidade e experiência para dar conta dessa tarefa e os órgãos públicos que desempenham atividades correlatas com o campo não tem se colocado a disposição dos grupos informais ou formais pra elaboração das propostas, até porque as fontes não asseguram recursos para elaboração do projeto. O volume de recursos das chamadas é pequeno. Projetos como este, não deveriam ser executados em caráter concorrentes, pois é inversamente proporcional a capacidade técnica de elaboração do projeto com a necessidade de investimento em locais e equipamentos. Os investimentos deveriam ser atrelados, ou seja, se as famílias já estão inseridas no programa elas deveriam indicar a necessidade de investimento e serem beneciária de fomento para adequação das condições mínimas, bem como suas organizações. Inclusive esse deveria ser o destino do Brasil Sem Miséria no campo.
O PAA precisa estar ancorado em um projeto político social, como disse uma das camponesas entrevistadas, e precisa se tornar uma política pública, de caráter massivo e inclusivo, continuar como programa de governo e diante dos dados relevantes de pessoas beneciadas pelos circuitos criados pelo PAA, é inaceitável que não haja essa mudança. Portanto, é preciso construir uma empresa pública, estatal, para garantir as estruturas de comercialização, armazenagem e estoques reguladores e estratégicos. Assim como o sistema elétrico nacional e a exploração do petróleo são temas estratégicos e têm fortes empresas estatais (ELETROBRAS E PETROBRAS), o alimento e o abastecimento popular têm que ser tratado como questão estratégica, acima das pressões de mercado, através de uma empresa pública 100% Estatal – CONABRAS. O PAA deverá ser uma Política de Alimentos e Abastecimento popular, com um orçamento que seja condizente com a participação da agricultura camponesa no abastecimento interno do país que hoje é de mais de 70%. Segundo Delgado (2013), é preciso planejar a conversão do PAA em política permanente de estado, Delgado acredita que essa conversão acontecerá no tempo devido. Em um cenário de tantas disputas não se pode creditar ao tempo esse acontecimento, mas as lutas que deverão continuar acontecendo pra garantir que o tempo tenha a intencionalidade necessária. Se escutarmos essas vozes tanto de pesquisadores quanto de camponesas comprometidas com o Brasil forte e soberano em terra, água, alimentos, energia, e biodiversidade, poderemos ter a ousadia de sonhar com uma nação sem miséria. Podemos ter vida longa, E a saúde que queremos, Respeitando e protegendo O meio em que vivemos Vejam o Planeta terra, Que antes não era assim Esta se desequilibrando Apressando o nosso m. E o futuro das orestas, Com tantos desmatamentos? E as usinas só produzindo Mais lixo do que alimentos Para cada quilo de produto Que compramos nos mercados São varias gramas de resíduo, No solo depositado. Os produtos das lavouras, Com tantos venenos fortes, Ao invés de alimentar Estão provocando a morte Até o ar e água, Principais fontes de vida Esta nos últimos suspiros, Cada vez mais poluídas Mais uma vez eu apelo Para a sociedade: Usemos nossos recursos Com responsabilidade. (Martina Ramos)
É pelas mãos das mulheres que o PAA é um território quase livre de agrotóxicos, por isso ele não avança sem a sensibilidade das camponesas. Elas se posicionam primeiro contra os venenos, mesmo que isso seja intuitivo algumas vezes. Mas as camponesas que hoje fazem parte de organizações, movimentos populares tem condenado por opção humana, política e feminina os transgênicos, os agrotóxicos, os desertos verdes, a violência contra as mulheres, e todas as ações do agronegócio, que tem seu efeito primeiro, sentido pelas próprias mulheres.
Bibliograa Consultada: BRASIL – MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME. PAA – 10 anos de Aquisição de Alimentos..Brasília – DF. MDS: Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional; Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação, 2014. CONSELHO NACIONAL DE SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL. Proposições do CONSEA Nacional ao Plano Safra 2010/2011. Acessado em <http://www2.planalto.gov.br/acl_users/credentials_cookie_auth/require_login?came_fro m=http%3A//www2.planalto.gov.br/consea/plenarias/atas/16o-ata >. Acessado em janeiro de 2014. DELGADO, Guilherme. Relatório de Avaliação do PAA - III : Síntese. Brasília, (não publicado), janeiro de 2013 (20 páginas). DUARTE, Lívia. Camponesas para a soberania alimentar. Acessado em <http://www.agroecologia.org.br/index.php/259-camponesas-para-a-soberania alimentar >. Acessado em fevereiro de 2014. LEAL, Marcelo. Contribuição ao debate do Plano Camponês. Disponível em <http://www.mpabrasil.org.br/biblioteca/textos-artigos/contribuicao-ao-debate-doplano-campones-0 >, Acessado em março de 2014. MPA, O campesinato e a agricultura camponesa no Brasil. Caderno de estudo II. Brasília: fevereiro de 2013. NEVES, Delma Pessanha . Agricultura Familiar. CALDART, R., PEREIRA, I. B., ALETEJANO, P., FRIGOTTO, G. (ORGS). Dicionário de Educação do Campo. Rio de Janeiro, São Paulo 2012: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular. NEVES, Delma Pessanha, MEDEIROS, Leonilde Sérvolo de. (Org). Mulheres Camponesas: trabalho produtivo e engajamentos políticos. Niteroi – RJ : Alternativa, 2013. Pg. 6. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E A AGRICULTURA. Manual de Nível Macro. ASEG - Programa de Análise Sócio-Económica e de Gênero. 2003. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Pior seca dos últimos 50 anos no nordeste brasileiro conrma estatísticas da ONU sobre escassez. Disponível em <http://www.onu.org.br/pior-seca-dos-ultimos-50-anos-no-nordeste-brasileiro-conrmaestatisticas-da-onu-sobre-escassez/ >, acessado em 14 de março de 2013. Programa Aquisição de alimentos. PAA: Doação Simultânea/ coordenador Marcelo Leles Romarco de Oliveira- Viçosa, MG: Os autores, 2012. VIA CAMPESINA, As camponesas e os camponeses da Via Campesina dizem: Basta de violência contra as mulheres. Brasília: julho de 2012. Vivas, Esther. Soberania alimentar, uma perspectiva feminista. Disponível em <http://esthervivas.com/portugues/soberania-alimentar-uma-perspectiva-feminista/ >, acessado em 9 de março de 2013.
Soberania Alimentar, Soberania GenĂŠtica e Agroecologia
Soberania Alimentar Valter Israel da Silva Movimento dos Pequenos Agricultores
Vou falar de um conceito Importante e fundamental É a questão principal Que temos que defender O povo precisa ter Manter e disputar Pois soberania alimentar É uma forma de poder
A FAO nas Nações Unidas Fala em segurança Mas isso causa mudança Enorme no resultado Pois ao ser aplicado Este conceito mundial O alimento no nal Pode até ser importado
O mundo produz riquezas Que são mal distribuídas Populações empobrecidas Sofrem com este mal A diferença e brutal Entre a riqueza e a fome A maioria não consome E poucos acumulam capital;
Soberania é diferente Pensa a partir do local O histórico cultural Os hábitos alimentares As técnicas milenares O jeito de preparar De colher e de plantar Aqui encontram seus lugares
É um conceito criado Pela via Campesina Que na luta nos ensina A mantermos rmes na luta E a fazer a disputa Inclusive de conceitos Pois mantendo estes preceitos Venceremos a labuta
Recuperar os costumes Técnicas e sementes O conhecimento das gentes Dos povos e do lugar São formas de enfrentar Os conceitos divergentes E armar denitivamente A Soberania alimentar.
"É o direito dos povos a denir suas próprias políticas e estratégias sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito à alimentação a toda a população, com base na pequena e média produção, respeitando suas próprias culturas e a diversidade dos modos camponeses de produção, de comercialização e de gestão, nos quais, a mulher desempenha um papel fundamental." Via Campesina Internacional O conceito de Soberania Alimentar surgiu em contraponto ao conceito de Segurança Alimentar, que basicamente garante comida para a população, não importa de onde, como é produzida, etc. SOBERANIA ALIMENTAR tem a ver com alimentos saudáveis, com cultura, com hábitos alimentares, com sistemas locais, com respeito ao meio ambiente, etc. Abaixo segue alguns dos principais elementos que envolvem o conceito de soberania alimentar: 1) DIREITO A PRESERVAR OS RECURSOS NATURAIS, PRODUZIR E A SE ALIMENTAR: 1.1) Camponeses: toda família camponesa tem direito a produzir alimentos saudáveis, de acordo com seus costumes, suas tecnologias e conhecimentos, garantindo a manutenção de seus hábitos alimentares. 1.2) Consumidores: toda família consumidora tem direito ao acesso a alimentos saudáveis, diversicados e a preços acessíveis, de forma a manter seus hábitos alimentares, garantindo alimentação equilibrada para a sua família. 1.3) Extrativistas: Acesso aos recursos naturais.
2) COMIDA SÃ E SAUDÁVEL: 2.1) - Sem veneno – rompendo com a dependência das multinacionais, evitando a contaminação do solo, da água, do ar, dos alimentos e da saúde das famílias camponesas e das famílias consumidoras. 2.2) - Com insumos naturais – Utilizando os sub produtos de uma produção para a outra, utilizando adubos verdes e orgânicos, sementes crioulas, defensivos naturais a base de extrato de plantas, etc. 2.3) - Sem exploração – a mão de obra das famílias camponesas realizando trabalho em benecio das próprias famílias camponesas. 2.4) - Com respeito ao meio ambiente – com utilização de mecanização leve, sem veneno, mantendo o solo coberto o maior tempo possível, mantendo as matas ciliares, recuperando e protegendo fontes de água, etc... 2.5) - Diversicada, buscando equilíbrio ambiental – a produção diversicada gera um equilíbrio em relação a pragas e doenças. Esta diversidade nas colheitas gera diversicação no alimentos, riqueza nutritiva, segurança para as famílias, renda em pequenas propriedades e em áreas íngrimis, etc. Esta lógica de produção gera trabalho e renda, garantindo vida digna no campo. 3) CULTURA CAMPONESA: 3.1) - Conhecimentos e tecnologias – As famílias camponesas trazem um grande acumulo de conhecimentos e tecnologias de produção, colheita, secagem, armazenagem, inuência da lua, etc. Estes conhecimentos e tecnologias que fazem parte da cultura camponesa, devem ser respeitados pelas políticas publicas de Soberania Alimentar. 3.2) - Métodos de Secagem e Armazenagem – As famílias camponesas observam as fases da lua para fazer a colheita, secam ao sol, de forma barata e descentralizada, armazenam em tonéis, embalagens pet, tuias, caixões, etc, utilizando cinza, pimenta, entre outros métodos de controle de pragas. 3.3) - Agro indústrias camponesas (familiares e/ou cooperativadas) – É de fundamental importância a agregação de valor a produção camponesa, por isso algum processo de transformação deve ser feito ainda na propriedade ou de forma cooperativada. Temos visto uma legislação que diculta e na maioria dos casos até impede esta industrialização caseira. Esta legislação muitas vezes é imposta pelas grandes empresas e isto é feito em nome da “saúde pública”. 4) SISTEMAS LOCAIS DE PRODUÇÃO, INDUSTRIALIZAÇÃO, CIRCULAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO: 4.1) - Sistemas Camponeses de produção - São sistemas de produção altamente diversicados, tendo como base social as famílias das comunidades camponesas, que integram produção animal e vegetal (agrícola e orestal), que priorizam a produção para o auto consumo e para o mercado local, que preservam os recursos ambientais estratégicos como: água e biodiversidade, combinam plantios anuais com plantios perenes, utilizam ao máximo insumos de origem local, utilizam os subprodutos de uma produção para a outra e pela diversicação buscam a sustentabilidade geral do sistema, buscam a autonomia genética e tecnológica e integram novos conhecimentos e novas técnicas ao conhecimento já existente, sem deixar que eles desintegrem o sistema.( MPA 2007) 4.2) - Produzir para atender a necessidade local – o atual modelo de produção busca o lucro, portanto não está em sua lógica analisar as necessidades locais de alimentos. Os sistemas camponeses de produção, com foco na Soberania Alimentar, devem primar por atender as necessidades locais de alimentos saudáveis e diversicados, o excedente é que vai para o comercio na região, no país e até fora dele. 4.3) – Comercialização: buscar formas organizativas de comercialização, preferencialmente eliminando os atravessadores, garantindo bons preços as famílias camponesas e as famílias consumidoras.
5) NECESSIDADE DE POLÍTICAS PÚBLICAS COMO: 5.1) Reforma agrária: Distribuição das terras, juntamente com políticas de fortalecimento do setor produtivo. Limite do tamanho da propriedade; Proibição de venda de terras para estrangeiros, etc. Expropriação de terras com plantio de entorpecentes e com exploração de trabalho escravo ou situação análoga; 5.2) Política de Estoques reguladores: Onde o Estado Brasileiro compre a produção no período de safra, forme estoques e coloque no mercado no período de entre safra. 5.3) Política de preços Mínimos: Garantindo preço mínimo que cubra os custos de produção e uma margem de renda para as famílias camponesas e limite os preços pagos pelos trabalhadores urbanos. 5.4) Assistência Técnica: Voltada para os sistemas camponeses de produção, incentivando a produção de alimentos, com equipes multidisciplinares, de forma gratuita e capaz de atender a todas as famílias camponesas. 5.5) Créditos subsidiados para a produção de alimentos: Garantindo que as famílias camponesas produzam alimentos, obtenham renda e possam colocar os alimentos no mercado a preços acessíveis para os trabalhadores urbanos. 5.6) Direito dos Agricultores: reconhecimento pelos serviços ambientais prestados, proteção do conhecimento tradicional, repartição de benecio, participação nas decisões sobre a conservação e ao uso sustentável dos recursos to genéticos para a alimentação. 5.7) Legislação: legislação especica para a produção, industrialização e comercialização da produção camponesa, como forma de incentivo a produção de alimentos. 5.8) Educação Camponesa: Voltada a realidade local, contextualizada, que prepare a juventude camponesa para atuar no campo, com orgulho de ser camponesa. 5.9) Mercados Institucionais: Que os governos comprem alimentos para os programas de alimentação escolar, hospitais, asilos e para o sistema prisional diretamente dos camponeses e de suas organizações. 5.10) Nova rota de insumos: Reconhecer, apoiar a estrutura produtiva e organizar a logística de distribuição de insumos naturais, que não agridem ao meio ambiente. 5.11) Programa de transição agroecológica: Reconhecimento e apoio a processos, com uma ampliação gradual de incentivos de acordo com os avanços implementados pelas famílias camponesas no processo de transição; 5.12) Apoio a processos de cooperação: cooperativas, associações, empresas comunitárias, agroindústrias, mercados populares de alimentos... 5.13: Reconhecimento do modo camponês de fazer agricultura: É o único capaz de dar respostas aos principais dilemas da humanidade: Crise alimentar. Crise energética. Crise ambiental. Estas e outras medidas podem resolver o problema da crise dos alimentos, diminuir a pressão nas grandes cidades e garantir condições de vida digna para as famílias trabalhadoras do campo e das cidades. Com estas políticas publicas e esta lógica de produção camponesa poderemos atingir a SOBERANIA ALIMENTAR!
Soberania Genética Gilberto Afonso Schneider e Valter Israel da Silva Movimento dos Pequenos Agricultores - MPA A soberania genética consiste no direito dos camponeses/as, povos originários e comunidades tradicionais em decidir o que vão produzir, de que forma, qual o modelo tecnológico que vão utilizar, garantindo assim a autonomia e independência frente à imposição do agronegócio. A soberania genética passa pelo controle e gestão dos recursos genéticos pelos camponeses/as, povos originários e comunidades tradicionais e suas organizações garantindo, de modo especial, a conservação da alta diversidade de sementes, raças e mudas. Esta gestão em alguns casos pode ser realizada em parceria com as empresas pública de pesquisa. A soberania genética permite o controle do processo de produção, permite a possibilidade de acesso de alimentos em quantidade, diversidade e qualidade e com capacidade nutritiva adequada, e é a garantia da existência dos sistemas camponeses de produção. Portanto, podemos armar que a soberania genética é um dos pilares fundamentais da soberania alimentar. Também podemos armar que a soberania genética é pilar fundamental da Agroecologia. Sem o controle das sementes, raças e mudas não podemos atingir uma agroecologia plena. Além disso, é a garantia da preservação da agrobiodiversidade e dos ecossistemas. A soberania genética permite a armação da identidade, dos valores e da Cultura Camponesa. Dentro das sementes crioulas esta o conhecimento milenar dos camponeses/as e povos originários e comunidades tradicionais. Conceito de sementes crioulas Consideramos como sementes crioulas/nativas não só os grãos, mas também plantas, ores, árvores nativas, frutas, ervas, plantas medicinais, raças e muitas outras. Uma diversidade de espécies que se encontram na natureza e que foram cuidadas, melhoradas e preservadas ao longo do tempo, passando de geração em geração, alimentando os seres humanos e os animais. (Frei Sergio – MPA) Princípios orientadores para um trabalho com sementes 1)Quando tratamos de sementes, estamos falando seres vivos, de todas as formas de reprodução vegetal e animal (sementes, raças e mudas) que garantem a continuidade das espécies; 2)As sementes são fruto do processo histórico de seleção realizado pelos camponeses, são reexo da cultura camponesa, da memória dos nossos antepassados e do modo de vida camponês, portanto são patrimônio dos povos a serviço da humanidade; 3)As sementes são determinantes da qualidade, diversidade e quantidade de alimentos produzidos, portanto têm vinculação direto com a Soberania Alimentar; 4)Os sistemas camponeses de produção são altamente diversicados e buscam a sustentabilidade social e ambiental e só são possíveis com o controle camponês das sementes; 5)A manutenção das sementes está diretamente ligada à conservação da agrobiodiversidade possui a capacidade restauradora do modo de vida camponês e determinam a possibilidade de controle sobre o processo produtivo. 6)As sementes determinam o modelo produtivo adotado. As sementes nativas são adaptadas ao solo, clima de sua região, portanto são determinantes ao enfrentamento do modelo agroquímico; 7)A estratégia do resgate, reprodução, melhoramento e conservação de sementes deve ser baseada em 03 níveis: a) Nível de unidade camponesa de produção (família camponesa), b) Nível comunitário ou associativo (casa de sementes) e c) Nível territorial
(Unidades de Beneciamento de Sementes). Os 03 níveis devem ser complementares. 8)Os conhecimentos camponeses devem se aliar aos demais conhecimentos técnicos e cientícos, qualicando assim os processos, sem a perda da autonomia camponesa. Isto pode se dar através de processos de formação e de assistência técnica, inclusive pelo método campesino a campesino; 9)Temos que diferenciar obrigações de necessidades. As leis são elaboradas para proteger as empresas de sementes e são na maioria das vezes, desnecessárias. Mas se faz necessário seguir alguns princípios e orientações que garantam a qualidade e facilitem a utilização das sementes crioulas por outras famílias camponesas. 10) Os instrumentos jurídicos (associações e cooperativas) devem cumprir com tarefas concretas: dar suporte a processos de produção, beneciamento e comercialização, gerando renda para as famílias camponesas, jamais devem substituir a organização política e social. (Org. por Gilberto Afonso Schneider e Valter Israel da Silva) As vantagens e o papel das sementes crioulas para a agricultura camponesa (síntese do debate) •Semente é a arma mais poderosa para enfrentar o modelo dominante. •Sinônimo de autonomia de insumos, de tomadas de decisões, etc; •Recupera a importância nutricional (qualidade dos alimentos); •Baixo custo (Possibilidade de replantio da mesma semente), maior relação custo benecio; •Base tecnológica adaptada a realidade camponesa (menor dependência de insumos, maior autonomia tecnológica e genética): •Maior renda líquida por área; •Instrumento de armação das identidades e da cultura camponesa (modo de vida, valores, costumes); •Construção de uma ideologia camponesa (losoa de vida); •Geradora de vida, não de mercadoria; •Portadoras de poder político e estratégico; •Maior diversidade de opções (diversas variedades e culturas); •Manutenção da diversidade biológica; •Nos dá maiores condições de controle sobre o processo produtivo; Curso Nacional de sementes do MPA São Miguel do Oeste – SC, 2 a 11 de maio de 2013.
Perguntas para as reexões: 1 – O que entendemos por soberania genética?
2 – Por que devemos ter princípios para orientar nosso trabalho com sementes?
3 – Qual a importância das sementes crioulas? Que experiências concretas temos?
4 – Quais são as vantagens de produzirmos com sementes crioulas?
5 – Sugestões e conclusões do grupo sobre o assunto?
A Agroecologia Raul Ristow Krauser Para muitos a agroecologia é uma ciência que estuda e procura explicar o funcionamento dos agroecossistemas¹, para outros são práticas e técnicas agronômicas e produtivas que permitem produzir alimentos e bras sem agrotóxicos, uma agricultura que não atenta contra o meio ambiente. A agroecologia é um pilar fundamental na construção da soberania alimentar. Considerando estes dois entendimentos, de agroecologia enquanto ciência e enquanto conjunto de técnicas de produção, podemos armar que a agroecologia representa uma base cientica e técnica para qualicar os sistemas camponeses de produção, eliminar o uso de agrotóxicos, superar as cadeias produtivas, construir a soberania alimentar, proporcionar autonomia das famílias camponesas e fazer enfrentamento ao agronegócio. Assim para o MPA a agroecologia tem um signicado produtivo prático, mas também um signicado político e ideológico, fazendo parte da luta de classes no campo e na cidade. Porém, é necessário armar de forma categórica que não dá para ser romântico, ter bonitos discursos que não tem efetividade, pois, temos que considerar que agroecologia, este sistema de produção de alimentos que compreende a soberania alimentar implica em: 1-Trabalhar muito, não há como separar o trabalhar e viver, as duas coisas se misturam. Não existe falar em jornada de trabalho, exige dedicação (colocar o dedo), disposição e vontade de todos os membros das famílias camponesas. 2-Trabalhar bem, ou seja, saber o que faz, pensar no que faz, planejar, conhecer, se organizar. Fazer processos segundo a lógica, observar muito e fazer experiências. No bom idioma camponês é “necessário trabalhar com os braços e com a cabeça”. 3-Ter sorte, sobretudo quando se fala do clima, agricultura é atividade de alto risco, a boa observação pode minimizar os riscos, mas não irá suprimi-los. Além disso, não há receita, há princípios a serem seguidos, princípios que norteiam a organização do processo produtivo, isso porque cada unidade produtiva tem peculiaridades que irão inuenciar no modo de organizar a produção. A agroecologia enquanto sistema de produção tem cinco dimensões: Ambiental, ecológica: Supera a dicotomia entre agricultura e preservação do meio ambiente, as áreas de preservação e produção têm diferenças mínimas, são sistemas de produção de baixo impacto ambiental, que não utilizam produtos químicos, que preservam ao máximo os ecossistemas naturais. Social: Gera equilíbrio social e qualidade de vida, produz alimentos saudáveis fazendo valer verdade a frase que assim diz: “que seu alimento seja teu remédio e teu remédio seja teu alimento”, capaz de gerar uma relação direta entre campo e cidade, valorizando as famílias camponesas e a vida no campo recuperando assim a autoestima. Sistema de produção capaz de envolver a todos e todas e superar as relações desiguais de gênero e geração; Dimensão econômica: Sistema de produção que contempla a lógica econômica camponesa, ou seja, é um sistema de produção em que a circulação se dá de forma simples, não há geração de acúmulo no sentido capitalista, o gasto com insumos é muito pequeno necessitando poucos investimento, a produção é diversicada e não especializada, produzida para o ¹ Conforme Guterres, todo agroecossistema é uma construção social, produto da coevolução dos seres humanos com a natureza... os seres humanos ao articializar os ecossistemas para obter alimentos, domesticando plantas e animais, quebram as secessões e os mecanismos de auto-regulação ecossistêmica, passando assim a depender do homem para se manter, regular-se e renovar-se.
abastecimento à partir do local e a renda gerada é utilizada para garantir a reprodução familiar. A produção agroecológica não é nicho de mercado, pressupõe um novo modelo de relações econômicas, uma nova forma de se relacionar a comunidade humana. Política: Agroecologia antes de tudo é um ato político, não romântico. É político pois na sua concepção e na sua ação prática é radicalmente diferente da lógica do agronegócio, inevitavelmente faz o enfrentamento com o agronegócio, prova que outra forma de produção, circulação e consumo é possível, e que outra sociedade é necessária. Cultural: Modelo de produção que é ligado à terra, que não enxerga a terra como base física da produção, é um cuidar da terra no presente olhando para o futuro é cultivar. Há que se conhecer e respeitar os ciclos da terra e da lua, agricultura é muito mais amplo que produzir, é viver com a terra é viver para a terra. Se soubermos colaborar com a terra ela nos dará o que precisamos. Assim é uma forma de produção que se relaciona diretamente com a identidade camponesa, fortalece as relações comunitárias, resgata a diversidade alimentar, os conhecimentos, a culinária tradicional daquela dada cultura. Implica em um modo de viver. Agroecologia e campesinato: Guterres 2006, assim nos diz: “Eduardo Servilla Guzmán “se atreveria” a denir o campesinato como uma forma de manejar os recursos naturais que permite a reprodução do homem e a natureza (que são um todo), conservando a biodiversidade ecológica e sociocultural. A agroecologia é uma forma de entender e atuar para campesinar a agricultura, a pecuária, o orestamento e o agroextrativismo, a partir de uma consciência intergeneracional (não exploração de crianças e velhos), de classe (não exploração do capital ao trabalho), de espécie (não exploração dos recursos naturais), de gênero (não exploração do homem à mulher), de identidade (não exploração entre etnicidades). Transição Agroecológica: A construção da agroecologia deve ser feito num processo de transição, que terá diferentes tempos dependendo de cada unidade camponesa de produção. A defesa de uma ruptura, uma mudança radical em geral não é feita por quem conhece o dia-a-dia do trabalho no campo, uma ruptura tem impactos que somente com uma política pública dando suporte seja viável fazer. De acordo com o nível de intensicação a transição para a agroecologia poderá ser mais rápida ou mais demorada, mas é importante ter presente que a agroecologia é radicalmente diferente do modelo intensivo de produção. Temos que superar a visão antropocêntrica do mundo, onde tudo gira ao redor do ser humano, temos que construir uma visão holística, onde tudo esta integrado. Trabalhar é viver, viver as ideias, colocá-las em prática, viver uma nova vida. É fundamental que haja uma transição integral, ou seja não é só nas técnicas de produção que devem haver mudanças, mas deve implicar na recuperação da cultura, da identidade, da racionalidade camponesa, implicar em mudança das relações humanas. Isso quer dizer que o processo de transição deve vir da unidade camponesa de produção, mas é preciso que aconteça também nas estruturas, na tecnologia, no modo de organizar, nos consumidores... é todo um conjunto que precisa ser transformado, e que trata-se de uma transformação social. Não há receita para a transição, contudo há alguns princípios que devem orientar o processo da transição agroecológica:
Participação de toda a família: O processo de transição necessita do envolvimento de toda a família nas decisões e no trabalho. Ter o envolvimento direto das mulheres é central para o êxito. Entretanto é necessário que essa construção coletiva da família se dê desde uma perspectiva de novas relações de poder e gênero. A transição deve implicar diretamente na superação do modelo patriarcal. Máximo de diversidade – aproveitar tudo, produzir de tudo: A produção de autoconsumo para as famílias camponesas é algo fundamental, uma família que produz para seu autoconsumo terá uma economia de pelo menos R$ 300,00 por mês. É necessário que se pense e se faça a implementação de processos de integração, por exemplo, é melhor ter mais variedade por que consegue se vender mais perto, por outro lado o pasto que as vacas não consomem as ovelhas consomem, aonde vacas não andam as ovelhas andam, assim temos que compor sistemas de produção APROVEITANDO TODOS OS ESPAÇOS, e possibilidades, assim também é preciso adaptar os equipamentos para que possamos fazer as coisas sem investimentos altos. Investir alto sempre é problema. Ter alto nível de diversicação, descobrir plantas complementares e que se auto defendem, aproveitar todos os espaços – são coisas que permitem atingir um alto nível de produção, sem custos e com qualidade. Pensar a produção de energia é algo que tem que estar colado à transição agroecológica, os sistemas camponeses tinham um bom processo de uxo e utilização de energia temos que recuperar isso e agregar novos elementos, estamos falando da biomassa, dos ventos, das forças naturais. Fortalecimento da identidade camponesa: O processo de transição deve fortalecer a identidade camponesa, isso tem haver com melhorar as condições de vida concreta, com armação da cultura e do modo de vida camponês e com autoestima das famílias camponesas. Valorizar o que está indo bem: No dia-a-dia temos sempre que ver, valorizar e dar ênfase ao que esta dando certo, ao que tem de positivo. Analisar, identicar e propagar processos de mudança que funcionam que dêem resultados concretos que permitam dar o salto. Aquilo que não esta indo bem precisa ser analisado para dar um devido tratamento e superar, mas não deve ser “valorizado”, não se deve dar destaque. O destaque deve ser dado ao positivo. Unir o tradicional com novos elementos: Não negamos a tecnologia, utilizamos a última, tecnologia de ponta desde que sirvam aos sistemas camponeses, que sirvam a gerar soberania alimentar. Essa transição é viável em agricultura de pequena escala (que pelo número de agricultores chega à escala). É uma agricultura que busca no passado conhecimentos, sistemas, agrega a tecnologia e novos conhecimentos. Modelo que esta trazendo gente da cidade para o campo. Abastecimento popular à partir do local: Muitos produtos se perdem no campo, é necessário valorizar estes produtos, desenvolver formas de comercialização e processamento para assim gerar renda e aumentar a utilidade da produção, recuperar sabores e saberes, culturas e equilíbrio ambiental. É preciso que se faça um bom estudo da produção concreta, fazer uma análise econômica da produção, de como é produzido, custos diretos e indiretos de produção, etc. para que se busquem formas mais econômicas de produção e se venda a preços justos para a família camponesa e para a família da cidade. A comercialização deve ir para uma relação entre quem produz e quem consome que vai para além de uma relação de mercado, é um marco de uma nova construção de
relação econômica entre camponeses e trabalhadores da cidade. Uma família camponesa é capaz de manter 30 famílias com alimentos e 30 famílias alimentadas devem gerar renda para uma família camponesa. A relação direta de quem produz agroecológico é algo central. Os agricultores são formadores de consciência quando explicam o processo de produção, como se faz e por que se faz, essa relação direta pode se dar na feira, na venda de cestas, etc. Num processo de venda direta é fundamental o planejamento da produção. As embalagens também devem trazer a proposta da produção ecológica, ou seja não devem ser embalagens descartáveis ou poluentes, é bom que se motive a mudança de hábitos da população da cidade também. A comercialização precisa trazer elementos da relação social, econômica e ambiental. Deve comunicar isso a quem consome, para que aqueles que comprem o produto compreendam que estão incentivando um modo de vida, estão consumindo um produto que tem um processo, tem uma origem denida, ou seja tem uma valor de uso. Diferenciação de preço do produto agrecológico: A questão fundamental é o custo de produção (custo integral – ambiental, econômico e social), e não simplesmente ser mais caro por ser ecológico, o objetivo é produzir alimento para o povo, não para uma elite. As vezes é um pouco mais caro porque o modelo agroindustrial não calcula o custo ambiental e social da produção, aí não tem como concorrer, quando ocorre isso é que se dá uma diferença de preços. A outra coisa é que os preços não seguem a lei de mercado, seguem um valor xo, seja nas cestas seja nas feiras. Certicação: Da forma como esta hoje colocada tem muitos limites, a começar pelo custo, pela relação entre o agricultor e a certicadora, pelo nível de exigência padrão que ignora inclusive a diversidade e multiplicidade da agroecologia. O que realmente vale é o contato direto com o consumidor, é necessário desenvolver uma relação de conança, gerar o que chamamos de acreditação mútua entre as famílias camponesas e as famílias consumidoras. Processo progressivo: Começar com pouco – ir adiante progressivamente. Temos também que considerar que tem tempo para tudo, não temos que ter pressa, cada coisa a seu tempo, melhorias sempre haverá para fazer, o importante é fazer passo a passo. A transição agroecológica, o processo de relação direta com os consumidores aponta para a autossuciência, aponta como uma tendência, um processo em construção, pois não é algo que se faz de um dia ao outro. Devemos caminhar para produzir 100% da cesta básica. “mais importante que a velocidade é a direção” Clarice Lispector. Módulo mínimo de tecnologia: Devemos incorporar a tecnologia, mas aquela que nos serve. Aquela que serve ao fortalecimento dos sistemas camponeses de produção e, além disso, comprar a menor possível que nos atende, não é por que tem um crédito ou uma possibilidade de comprar uma máquina grande que devemos fazer isso. Precisamos conhecer as tecnologias, as que realmente nos servem e a menor possível, o limite é o limite mínimo que dê viabilidade. Temos ainda que analisar a viabilidade concreta de cada processo a ser feito, por vezes pode ser mais econômico e produtivo que se alugue máquinas do que ter máquinas em casa, há que se analisar o custo de oportunidade de cada investimento que se planeja fazer, ou seja, deve ser feito um estudo detalhado da eciência produtiva sob o ponto de vista econômico, social e ambiental; Além disso, temos que considerar que máquinas custam caro e geram despesas, há que se analisar muito bem a necessidade e comprar o menor possível. Temos que dissociar qualidade da quantidade e tamanho dos equipamentos. Uma pequena produção com equipamentos artesanais pode ter muito mais qualidade.
Organização e cooperação: A transição exige um apoio de um processo organizativo, as famílias sozinhas têm muita diculdade, há que ter um apoio constante e disponível. Este apoio deve advir das próprias famílias as mais experientes contribuem com as outras, uma solução encontrada por um pode servir a vários outros, assim a relação entre as famílias é central, o MPA tem muito a contribuir neste sentido, criar estas relações e ampliá-las. Organizar grupos de produção é uma estratégia interessante, pois de forma voluntária as famílias se colocam a disposição à dar mais ênfase a uma produção que tenham mais interesse ou condições, mas não podem ser especialização. Formando o grupo de produção cria-se um processo de cooperação entre estas para equipamentos, agroindústrias, apoio técnico entre outras ações, assim os grupos de produção tornam-se grupos de convívios, grupos de ação política na comunidade. É importante considerar que antes de tudo todos somos consumidores, que, portanto devemos produzir o máximo possível daquilo que consumimos e nos abastecer do que falta com as demais famílias vizinhas. A condição concreta e real coloca a necessidade de processos de trocas entre os camponeses. Não é possível todos terem tudo, então é importante coordenar no grupo que cada um possua diferentes ferramentas e que sejam utilizadas coletivamente, ou ainda, terem equipamentos de uso coletivo. É possível se estabelecer um processo de trocas onde a reciprocidade seja o critério e não um dado valor monetário. Planejamento: No planejamento da transição passamos por quatro fases seja no nível familiar, seja ao nível de grupos: 1-Ideias: fase onde todos opinam se colocam muitas ideias, se busca conhecimento, informações, intercâmbios. Uma vez decidido o que será feito e qual é o objetivo, se passa a segunda fase. 2-Desenvolvimento do plano: se faz um plano, levantamento de dados, estudos, análises; 3-Aplicação: torna-se concreto o plano. 4-Produção – avaliar, monitorar, fazer correções... Depois retorna para a fase das ideias para possíveis adaptações ou mudanças. Se por um lado os processos coletivos têm suas complicações, possibilitam muitas outras coisas gerando viabilidade, há que se enfocar nos pontos positivos e superar o que há de complicado. Tratar os problemas de forma natural, enfrentá-los, dialogar continuamente são caminhos para se resolver as diculdades colocadas. Resgate da genética: Recuperar a genética local, resistente, adaptada com características próprias do lugar é algo imprescindível, para isso devemos recorrer a todas as ferramentas que temos disponíveis. Cada família precisa ter tudo que se pode ter de sementes e raças tradicionais, sempre. É importante combinar os processos de produção de sementes em cada unidade camponesa, cada camponês deve ter o máximo possível de sementes, mas também ter processos mais complexos de resgate e reprodução de sementes, acompanhados, fazendo chas e controles, para que se possa ter sementes para repassar a quem esta começando e oferecer algo alternativo aos transgênicos. Caráter do trabalho: O trabalho é o que diferencia o ser humano dos demais animais, trabalhar é essência humana. O problema é o trabalho alienado, a questão é que o trabalho da agroecologia, da soberania alimentar (que é muito) deixa de ser alienado, torna-se parte de quem produz, gera novas relações e outro nível de consciência nas famílias. É um trabalho que liberta as consciências, assim trabalhar ainda que seja intenso não é exaustivo ou estressante. Esse deve ser o caráter do trabalho na agroecologia.
PODER POPULAR Roteiro para debate
PODER POPULAR - Roteiro para debate “Todo poder nasce do povo e pelo povo deve ser exercido” É uma falsa questão contrapor a ideia de construir o poder popular, conquistar espaços de poder e tomar o poder de Estado. Em geral, quando se arma esse pseudo debate, pode ser a tentativa de esconder a concepção oportunista ou esquerdista que se dizendo pós-moderno, só ajuda a desarmar as organizações populares, na sua luta de transformar pela raiz a estrutura de exploração. O poder no dia-a-dia As pessoas não são diferentes, são únicas: não existem duas pessoas iguais. Esse fato leva as pessoas a se relacionarem. Para haver essa relação cada pessoa precisa armar sua originalidade. Então, só existe o eu porque existe o tu. E só existe o nós porque os dois sujeitos decidiram ou foram obrigados a se juntar ou a disputar. A criança disputa para ser reconhecida e para armar sua identidade. Ela tem necessidade de ser notada e não aceita ser ignorada, colocada à sombra ou menosprezada. Faz parte da luta pela sobrevivência, é uma armação de identidade e de autoestima Quando alguém não se impõe ou não briga por sua dignidade, é tida como covarde. A fraqueza e a ousadia contribuem na formação do caráter das pessoas. Se não é justo bater, também não é justo apanhar. Ninguém é uma ilha. A convivência social é a escola onde as pessoas aprendem a exercício do poder. Numa sociedade, onde cada um age conforme sua ganância, vigora a lei do mais forte, não se reconhece o valor das riquezas individuais e se cria a divisão entre superiores e inferiores. Daí surge a dominação de classe, a discriminação de gênero, o preconceito étnico e geracional e toda forma de intolerância cultural. A pessoa precisa ter poder O poder faz parte da natureza humana. Desde criança, inclusive como forma de armação individual, existe a disputa pelo poder. Só quem tem poder, de forma individual ou coletiva, arma-se e inui no seu destino e no destino da sociedade. O ato de pensar, de agir e de tomar decisões torna as pessoas protagonistas, na sua realização pessoal e histórica. Ao contrário, sentir-se impotente é perder a esperança, é anular-se. Toda pessoa gosta de ter poder e se sente feliz com o poder. Quanto mais nega, mais a pessoa rearma a vontade de ter o poder: ninguém quer ser uma coisa. Quem diz que não quer o poder é porque já tem o poder ou se tornou incompetente para tanto. Consciente ou inconscientemente, as pessoas que “delegam” o seu poder ou renunciam a postos de comando, estão armando seu anseio de ter e de exercer o poder. É justo ter o poder Ter o poder não é um pecado, é uma necessidade e direito de toda pessoa, mesmo sabendo que ele traz desaos. Gente é para brilhar e quanto mais estrelas no céu mais a noite ca iluminada. A pessoa é dada à luz e a luz se coloca no alto para que todos vejam. A grande e revolucionária mensagem é dizer aos oprimidos: você é capaz, levanta, toma teu leito e anda. Estranho não é desejar o poder, estranho é insistir no medo de ter o poder. Estranho é nunca se dizer que todo poder nasce do povo e pelo povo deve ser exercido. Estranho é reduzir a o poder ao mero ritual de eleger representantes, como se alguém pudesse abrir mão de seu poder. Sem falar que a maioria dos eleitos são pessoas comprometidas com quem domina as riquezas, as ideias e os postos de decisão. O que é o poder Todas as relações sociais estão impregnadas e implicam em poder porque o poder consiste na possibilidade de decidir sobre sua própria vida e sobre a vida de outro ser humano. É a capacidade de intervenção, com fatos que obrigam, circunscrevem, proíbem ou impedem. Se uma pessoa puder ela submete todas as outras à sua vontade ou a seu
modo de olhar a vida. Quem exerce o poder, hoje, submete e inferioriza as demais pessoas, impõe fatos, exerce o controle, arroga-se o direito ao castigo e à privação de bens reais e simbólicos. Ou seja, tem força, domina. A partir dessa posição de poder julga, sentencia ou perdoa. E ao fazer isso, acumula mais poder. O poder é entendido como poder, quando se apropria das riquezas excluindo a maioria e se coloca em posição de exercer o poder para domínio, controle e direção da vida da maioria e expropriação de seus bens materiais e simbólicos. Poderosa é a pessoa que possui elementos de poder por sua classe, gênero, riqueza econômica, social ou cultural, nacionalidade, sexo, cor da pele, idade, etc. A posse privada das riquezas, a exclusão social e a dependência dos pobres estruturam o poder, desde sua origem, e permitem sua reprodução. Todos os fatos sociais e culturais são espaços de poder: o trabalho, as atividades vitais, o conhecimento, a sexualidade, os afetos, as qualidades, os bens e posses, o corpo e a subjetividade, o próprio ser humano e suas criações. A classe oprimida tem poder porque o poder sucede no espaço das relações sociais: cada pessoa ao interagir, mesmo que não saiba, exerce poder. O mais débil dos oprimidos, mesmo de forma inconsciente, tem e exerce o poder, quando se torna espaço de opressão do outro que necessita dele para existir. O poder corrompe? No esforço para superar a cultura do silêncio e denunciar a impotência popular, não se pode cair nas tentações do poder. Às vezes, as pessoas têm medo de ter poder porque observam que, na vida cotidiana, um jeito estranho de ter o poder. A história está cheia de exemplos onde o preço para ter mais e ser mais, não tem medida. O poder pode sim corromper. Nas famílias, no governo e até em organizações populares, quem assume um posto de poder tende a fazer de tudo para tirar vantagens dessa posição. Depois, faz tudo para continuar no cargo e, se for preciso, usa jogo sujo, faz alianças escusas, vende a alma, perde a moral e mancha suas convicções. E, como o cargo torna as pessoas poderosas, elas passam a sonhar em “subir mais” e já não conseguem viver como “pacatos cidadãos”. Onde está o poder O poder que nasce do povo se cristaliza nas instituições civis e estatais e no exercício de direção e domínio de um grupo sobre a sociedade. O poder surge nas relações sociais, mas se encontra e se amplia na reprodução dos sujeitos sociais, que se situam no espaço público e no espaço privado. Mas, é no Estado, com suas instituições – o executivo, o parlamento, o judiciário, a burocracia, os impostos... e, sobretudo, no poderio militar, onde se concentra o verdadeiro poder. Alguém já disse que, sem negar a inteligência, a diplomacia e a negociação, o poder reside na boca de um canhão para signicar que ter poder é ter poder de fogo, é ter força. O Estado, que organiza a sociedade, é uma equipe que administra e garante os negócios coletivos da classe dominante. No Brasil, o Estado é propriedade privada da classe rica. Porém, a luta popular entende que o espaço público pode ser um espaço de disputa, se mantiver a clareza do próprio projeto e sua independência política. O objetivo da resistência popular, ao ocupar postos na institucionalidade, é acumular forças, sem perder o horizonte da transformação social. O Novo Poder O poder, como autoarmação das pessoas e das classes se dene pelo positivo e não implica na opressão de ninguém. A esse poder deve aspirar a classe oprimida. Para ela o poder nunca deveria criar a postura de chefe; e os abusos no uso do poder não poderiam justicar o medo de querer o poder. Por isso, seu desao permanente será com+ordenar sem autoritarismo, com+duzir sem manipulação e com+mandar com+partilhando o poder; e certamente, cumprir e fazer cumprir os acertos coletivos, acima das vaidades e caprichos
individuais. Transformar pessoas em sujeitos históricos exige a desmontagem dos mecanismos que reproduzem a dependência, a impotência e a servidão como elementos do poder estruturados em nós. Porque, uma vez submetidas a essas formas de poder, as pessoas exercem o poder de maneira alienada. O novo poder ainda é uma construção: é aspiração com algumas experiências, individuais e coletivas e com alguns elementos desenvolvidos: 1.Desconstruir o Velho Poder Para “desconstruir” o poder que estrutura os oprimidos e “construir” o poder, como instrumento da vida e convivência solidária, é preciso tomar consciência da dependência vital, da impotência aprendida e da escravidão voluntária. 2.A dependência vital O poder, hoje, é opressivo porque concentra poder de classe, poderes nacionais, étnicos e culturais, sexuais, patriarcais. A dependência vital é econômica e como classe social. Mas há outras formas de dependência: social, jurídica, afetiva, erótica, política... É possível substituir uma dependência por outra, como se fosse um mecanismo de reprodução da dependência. 3.A impotência aprendida A impotência é a expropriação da capacidade de poder: a pessoa anula o “eu posso” e desenvolve o “eu posso empoderar os outros”. A impotência aprendida não necessita de um juiz - a pessoa já é a própria polícia de si mesma para autocontrolar-se, auto impedir-se. 4.A servidão voluntária A classe oprimida é construída como servidora, em uma relação de dominação, sujeita ao domínio da elite, é inferiorizada. Esse mecanismo se reproduz inconscientemente, em séculos de história, nas formas de servidão voluntária. Quanto mais autoritárias e mais atrasadas economicamente são as relações de poder, maiores são os traços despóticos desse tipo de servidão. A tomada do Poder A classe trabalhadora precisa conquistar o poder de estado se quiser resgatar a riqueza produzida por suas mãos e construir uma sociedade sem exploração. Só com uma força política é possível conquistar o estado, controlar a produção social e garantir qualidade de vida para os habitantes de uma nação. Para tanto, necessita mobilizar muita gente da classe trabalhadora que se disponha a transformar, pela raiz, as estruturas da sociedade capitalista. A destruição do poder burguês, o controle do aparelho de estado e a vitória do Poder popular, será um longo e difícil caminho. A transformação pela raiz, das estruturas da sociedade capitalista não se limita aos momentos decisivos da luta popular. Passa pela elaboração de um projeto, de uma estratégia de luta pelo poder e da organização de ferramentas para a conquista do poder. Construção do poder popular A tarefa da organização popular é despertar o protagonismo popular. Há diferentes ferramentas para diferentes tarefas e momentos: associações, movimentos, sindicatos, partidos... Elas são partes do povo que se levanta contra a injustiça e contra a opressão e que lutam por objetivos imediatos e históricos. O movimento popular é a justa reação, espontânea ou organizada, pacíca ou violenta, da classe oprimida contra toda forma de injustiça. A reação pode ser contra a exploração econômica, os abusos de poder, a manipulação ideológica ou o preconceito de cor, de sexo, de religião, de idade... O sindicalismo luta para diminuir os efeitos da exploração econômica e vender
melhor sua força de trabalho. O movimento sindical já descobre que têm direitos e que a classe patronal explora a classe trabalhadora. Por isso, se organiza e pressiona para conseguir melhores salários, menores jornadas e melhores condições de vida e de trabalho. Mas, a luta econômica não questiona o jeito como está organizada a sociedade, dividida em classes. Ela serve para juntar, esclarecer, denunciar e combater os efeitos da exploração, mas não ataca a raiz do problema. Ele chega a ensinar o povo a pescar, mas como só busca a conquista dos interesses imediatos, apenas remenda o sistema de exploração. A luta política O povo, em geral, só consegue enxergar a política como um processo eleitoral. Mas, a militância consciente, entende que, na luta popular, é necessário um Instrumento Político que desmascare a exploração capitalistas e proponha a construção da sociedade socialista. O movimento político é formado por pessoas conscientes que descobrem as raízes da exploração e organizam sua ação para transformar a sociedade capitalista. Sem mudar a sociedade, dividida entre explorados e exploradores, o povo vai continuar oprimido. A militância, nascida e metida nos movimentos, aprendeu que além de dar o peixe e matar a fome é preciso ensinar o povo a pescar para sair da dependência e a tomar de volta os rios que viraram propriedade da burguesia. Por isso, cria um instrumento político para fermentar e dirigir, politicamente, o movimento de massa - ajudar o povo a entender a realidade, a se levantar e a transformar a sociedade dividida em classes. O desao constante da militância é potencializar o movimento popular para que tenha a energia de construir uma nova proposta com nova base intelectual, moral e política. A mudança estrutural do capitalismo não se faz só com as pequenas reformas; elas são indispensáveis para acumular força, aprendizados e consciência política de transformação. Construir, conquistar e tomar o poder Não existe contradição entre a construção do Poder Popular e conquista do poder político do Estado, quando a construção do poder popular implica em ocupar e desenvolver territórios e espaços que prepare a classe trabalhadora. O exercício de autoorganização, as soluções para problemas do cotidiano, o processo de qualicação da militância ajuda a impulsionar exemplos pedagógicos e experiências concretas de participação. Existe uma interdependência, entre a conquista do poder de estado e a construção cotidiana do poder popular, quando as duas iniciativas se situam na estratégia de sair do domínio do capital e promover a participação e a soberania popular. O que não se pode é iludir ou perder de vista que a centralidade do poder que sustenta a burguesia está concentrada no poder do Estado. O povo resiste para conquistar a democracia, acumula forças ocupando espaços e territórios mas, historicamente, só venceu quando tomou o Poder de Estado.
Educação Popular é todo o esforço de mobilização, organização e capacitação (política, técnica e cultural) que prepara as classes populares para o exercício do poder que necessariamente deve conquistar. (Paulo Freire)
TERRA E TERRITÓRIO
A situação dos Camponeses no Brasil Os camponesas são o grupo social mais atingido pela pobreza extrema no Brasil, revela estudo divulgado pelo Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas). Entre as famílias consideradas “extremamente pobres”, 36% tinham como fonte de renda, em 2009, a produção agrícola. Segundo o IBGE, censo 2005/2006 nos demonstra que 424 mil estabelecimentos declararam obter mais do que 10 salários mínimos mensais (smm), o que signica dizer que 8,2% dos estabelecimentos geram 85% do Valor Total da Produção (VTPD). Desse total anterior 22 mil estabelecimentos (0,4 % do total) obtém 51,34% do total do VTPD. Ao mesmo tempo, 3,8 milhões de estabelecimentos (72,96 %) do total, com menos de 2 smm obtém 4% do total do VTPD e formam um contingente de camponeses pobres do Brasil. O Censo demonstra ainda que no Brasil 2,32 milhões de assalariados rurais temporários e 2,30 milhões de assalariados rurais permanentes. Que são trabalhadores totalmente desprovidos do acesso a terra ou que possuem pouca terra. Na tabela abaixo podemos ver os números da estrutura fundiária:
Obs. Tabela apresentada pela Ministra de Estado do Meio Ambiente Isabela Teixeira durante a apresentação dos vetos e mudanças no Código Florestal transmitido ao vivo pela TV NBR, no dia 25/05/2012 que pode ser encontrado no link http://www.youtube.com/watch?v=fGxyLbkLvmU Podemos perceber que 65% dos imóveis rurais, o chamado minifúndio, que possui até um módulo scal¹, detêm apenas 9% do total da área, 90% dos imóveis possuem até 4 módulos scais, detêm apenas 24% das terras enquanto 4% dos imóveis, que possuem acima de 10 módulos cais detém 63% da área agricultável. No gráco abaixo vemos esta mesma realidade da concentração das terras em vários países latino americanos.
Org. Por Valter Israel da Silva com base em Ana Lúcia Nunes e no Censo agropecuário Brasileiro
O Gráco nos demonstra que o fenomeno da concentração das terras se repete em todos os países, onde um percentual muito pequeno (1 a 2%) das propriedades controlam ¹Modulo Fiscal: O Instituto Nacional de Colonização e reforma agrária – INCRA dene Modulo Fiscal como Unidade de medida expressa em hectares, xada para cada município, considerando os seguintes fatores: Tipo de exploração predominante no município; Renda obtida com a exploração predominante; Outras explorações existentes no município que, embora não predominantes, sejam signicativas em função da renda ou da área utilizada; Conceito de propriedade familiar.
cerca de 60% das terras. Com relação ao endividamento agrícola, Gerson Teixeira analisou os dados do CENSO e nos apresenta o que segue: “até menos de 10 há: 7.1%. Considerando os 371.608 estabelecimentos nesse grupo, com dívidas, tem-se uma dívida média de R$ 5.1 mil, por estabelecimento; de 1.000 há e mais: 33%. Considerando os 9.374 estabelecimentos nesse grupo, com dívidas, tem-se uma dívida média de R$ 943 mil, por estabelecimento; considerando o valor dos bens nos estabelecimentos, calculado pelo IBGE em R$ 1.2 trilhões, infere-se sobre o confortável grau de solvência médio na agropecuária brasileira; interessante observar que o grau de solvência é idêntico (2.2%) entre os estabelecimentos com menos de 10 hectares e os de 1.000 hectares e mais.” (TEIXEIRA, 2009, pag 6). Outro elemento importante que analisa Teixeira é o aumento do número de propriedade, mas com um volume menor de área. O Movimento dos Pequenos Agricultores também apresenta uma análise do Censo através do gráco que segue:
O Gráco demonstra que com apenas 14% dos créditos e 24% das terra, o campesinato responde por 40% do PIB agrícola, 70% da produção de alimentos e gera 74% dos empregos no campo. Por outro lado, o Agronegócio (grandes propriedades) acessa 86% dos créditos, 76% das terras e responde apenas por 60% do PIB agrícola, produz apenas 40% do alimento que vai pra mesa do povo e gera apenas 26% dos empregos no campo. Este gráco demonstra com muita clareza a viabilidade da pequena propriedade e portanto, a viabilidade da agricultura camponesa focada na produção de alimentos e no abastecimento popular. O Censo do IBGE 2005/2006 apresenta ainda a renda média por há igual a R$ 368,00 na grande propriedade e R$ 667,00 na pequena. Diante destes números o Movimento dos Pequenos Agricultores apresenta uma análise, demonstrando o que seria do Brasil com a realização da reforma agrária, sendo divididas todas as propriedades acima de mil há, (que são 47 mil propriedades) em lotes de 100 há. Segundo o MPA, seriam criados 2.920 mil novos estabelecimentos agrícolas, quase 3 milhões de novas famílias camponesas. Contando que a agricultura camponesa ocupa 15 pessoas a cada 100 há esta reforma agrária geraria 21.000.000 de empregos, ao invés das 2.400.000 criados hoje pelo agronegócio. Contando que a pequena propriedade gera uma renda média de 667,00 por há, geraria um PIB de 99 bilhões, ao invés dos 53 bilhões gerados hoje. (MPA 2010).
Elementos de controle do território: Texto extraído da Cartilha: Plano Camponês, construindo o novo caminho da roça, produzido pelo Movimento dos Pequenos Agricultores no ano de 2007, a partir do Seminário Nacional de produção. •O território camponês é um espaço de vida, espaço de produção e espaço de enfrentamento. O território é estratégico, concreto, nos da governabilidade social e política, unica nossa base social. Lá a gente come, lá a gente vive, lá nossos lhos estudam, lá a gente produz, lá a gente enfrenta o agro negócio, ... •A identidade territorial é uma opção política. •Valorização do local através dos vínculos afetivos: vizinhança, •Administração direta de nossas experiências produtivas; Acompanhamento técnico e político pelo MPA; •Organização de Base; •Comunicação; •Educação ( Escola local voltada para a nossa realidade ); •Soberania Territorial: Agrária, Genética, econômica, hídrica, energética, cultural,... Família tem papel principal na construção da autonomia, Autonomia na produção de proteína (milho é produto estratégico) •Formação de massa, base, militância e de quadros.: capaz de armar a Identidade Social uma Visão de mundo própria do campesinato, que fortaleça a compreensão de que camponês e capitalista são mundos distintos; que trabalhe Valores e princípios coletivos •Armação política do campesinato. •Políticas públicas estruturantes. •Ações coletivas, Metodologias participativas •Valorizar as experiências espontâneas que surgirem na base; •Desenvolver a cooperação nas suas mais variadas formas, mas articuladas através da organicidade política do movimento e tenha instrumentos de gestão econômica que garantam industrialização, acesso a mercado, tecnologias adequadas, acompanhamento técnico. •O controle do território não é só geográco e material, mas, cultural, ideológico, afetivo. •Terra, água,energia e sementes são base material para o controle do território. •Política, ideologia, cultura, religiosidade, símbolos, festividades, são base subjetivas para o controle de território. Elementos Culturais: •Elementos de Revalorização da Cultura: a identidade camponesa expressa pelos Hábitos alimentares, Comidas típicas, Agroindústrias caseiras; Musicalidade camponesa, Recuperação de culturas locais, Religiosidade popular, Danças, Teatro popular, Reisado; nosso jeito de se expressar, o jeito de cuidar da terra; •Elementos contraditórios da questão cultural: Em muitos casos cou a cultura de derrubar e queimar as matas, especialmente em regiões de fronteira agrícola, os impactos da revolução verde ainda permanecem, jovens camponeses com comportamento de agro boys, (MPA 2007)
ORGANICIDADE DO MPA
ROTEIRO PARA DEBATER A ATUALIZAÇÃO ORGÂNICA DO MPA¹ “Se se fala de um movimento social, os verdadeiros dirigentes revolucionários devem não só ser capazes de corrigir os erros existentes em suas ideias, teorias, plano e projetos..., mas ainda, por ocasião da passagem desse processo objetivo determinado de um grau a outro do seu desenvolvimento, se tornar a si próprios e a todos os demais participantes da revolução, capazes de seguir essa passagem no seu conhecimento subjetivo, isto é, chegar a fazer a correspondência das novas tarefas revolucionárias, dos novos planos de trabalho, às novas modicações surgidas na situação. Num período revolucionário, a situação se modica muito rapidamente; se a consciência dos revolucionários não chega a seguir com rapidez tais modicações, eles são impotentes para conduzir a revolução à vitória”. Mao Tse-Tung. I – APRESENTAÇÃO O debate sobre a atualização do modelo orgânico do MPA tomou evidência no último período. Com o objetivo de atualizarmos nossa organicidade frente a realidade da luta de classes e lançarmos o desao da construção do projeto organizativo no Congresso do Movimento, a ser realizado em outubro de 2015, realizamos debates e estudos junto a Direção Nacional, à Coordenação e Nacional, bem como remetemos o debate para as instâncias estaduais as quais produziram rico debate que realimentou as discussões junto a Coordenação Nacional. O texto que temos em mãos é produto dos debates, uma sistematização, e ao mesmo tempo procura provocar reexões sobre questões organizativas ainda não denidas mas que nos desaam a dar repostas práticas e orgânicas. A estudemos com espírito crítico, aberto, e com a criativa generosidade revolucionária característicos das organizações que tomam a centralidade da organização e da luta como mediações fundamentais e denidoras dos trabalhadores e camponeses enquanto classe social portadora de projeto revolucionário de caráter socialista.
II – MUDANÇAS ESTRUTURAIS QUE IMPACTAM A LUTA E AS FORMAS ORGANIZATIVAS DA CLASSE TRABALHADORA EM GERAL E DO MOVIMENTO CAMPONÊS EM PARTICULAR. Derrota das Experiências Socialistas² A derrota das experiências socialistas, de modo especial a União Soviética, abalaram o programa das esquerdas de todo mundo e colocou em crise o movimento comunista internacional. A crise do movimento comunista perpassa aspectos como: i – crise dos esquemas teóricos do processo, da via, e da condução das revoluções; ii – crise na construção de “modelos” de implantação do socialismo em diferentes países e regiões do globo levando a transplantação do modelo soviético; e iii – crise política das organizações de classe no ¹Sistematização feita por Marcelo Leal Teles da Silva e Humberto Palmeira, militantes e membros da Coordenação Nacional do MPA. ²A utilização do termo “Derrota das Experiências Socialistas” não signica criminalizar os processos revolucionário ressaltando seus erros e desvios. O adotamos como forma a dar relevo e envergadura aos desaos dos revolucionários no tempo presente. Consideramos os processos revolucionário tal como Safatle (2012) no qual as revoluções são “um acontecimento verdadeiro não garante a sequência de suas consequências”.
plano internacional decorrente do domínio Stalinista na orientação política e no método de condução das organizações. Ascensão da Hegemonia Neoliberal A derrota das experiências socialistas coincide com a ascensão da hegemonia neoliberal no plano internacional junto as sociedades capitalistas ocidentais. Os impactos se zeram sentir nas mais diversas esferas da vida, no âmbito econômico com a precarização do trabalho, nos processos de privatização e na abertura de mercados¹. Do ponto de vista político houve acentuada diminuição das funções públicas do Estado e um conjunto de derrotas da classe trabalhadora no âmbito internacional. Num mundo unipolar o imperialismo norte americano aumentou substancialmente seu poderio militar. Não menos importante o impacto ideológico do neoliberalismo ascendeu sobre as classes sociais, organizações políticas, intelectuais de esquerda e educou no Brasil duas gerações de jovens. O m da história e apogeu da sociedade capitalista foi vendido como principal bandeira de propaganda política destinada a violar a consciência das massas populares. À juventude foi destinado o projeto de Jovem Mercadoria: seja como Força de Trabalho barata ou como mediador da mercadoria dinheiro e a mercadoria produto – consumidor –, estancando sua rebeldia manifesta em projetos coletivos e utópicos, facilitando sua captura pela indústria cultural, drogas, competição e resignação histórica. Mudança nas Forças Produtivas, Na Base Econômica e no Mundo do Trabalho Ensina-nos Marx que a Força Produtiva do Trabalho se altera segundo múltiplas circunstâncias, tais como “grau médio de destreza dos trabalhadores, o grau de desenvolvimento da ciência e de sua aplicabilidade tecnológica, a organização social do processo de produção, o volume e ecácia dos meios de produção e as condições naturais”². Mudanças nas formas de produção da vida leva a mudanças nas formas de produção da consciência. Em todos esses campos tivemos rápidas e bruscas alterações nos últimos 30 anos: - a substituição do modelo de organização social da produção consequência do esgotamento do taylorismo-fordismo pelo padrão de exibilidade de acumulação de capital; - a massicação da educação tecnológica junto a juventude voltado a ocupação de setores especializados do mercado de trabalho; - a introdução da robótica, da microeletrônica, da biotecnologia e nanotecnologia nos processos de produção industriais e agrícolas; - o aumento da escala das unidades de produção; - a massicação dos meios de comunicação de massas e da informática; Entre outros esses câmbios resultaram numa nova subjetividade do trabalhador, alterando sua forma de ser, não apenas uma nova forma de produzir o objeto mas um novo ser para o objeto. Temos a primeira geração da época moderna que utiliza-se do sexo com o único m de obter prazer. A intensicação da exploração da força de trabalho, a paulatina diminuição dos postos de trabalho pelo aumento da composição orgânica do capital (aumento de máquinas e tecnologias), a alteração da organização social do processo de produção dentro da fábrica possibilitando maior controle sobre os trabalhadores, resulta em novos desaos políticos e organizativos dos trabalhadores assalariados. Os camponeses não caram alheios ao processo de mudança. Darcy Ribeiro dizia que o aumento das populações urbanas tornaria, em certa medida, a diversidade cultural brasileira mais homogênea. Atualmente a distância cultural que separa jovens rurais e urbanos se dissolvem por meio do acesso aos meios de comunicação, da internet e das redes sociais abrindo novas necessidades culturais e novas formas de sociabilidade. Seguimento dos camponeses que compõe a base social do nosso Movimento ascendeu materialmente: construíram casas, adquiriram carros, motocicletas, tratores e ¹Importa aos movimentos camponeses, especialmente, a abertura dos mercados agrícolas colocando a agricultura brasileira em competição com a agricultura de tipo capitalista e subsidiada dos países industrializados. ²Marx, Karl. O Capital: crítica da economia política: Livro I: o processo de produção do capital. São Paulo. Boitempo, 2013.
colocaram seus lhos para estudar. As formas produtivas as quais os camponeses assumiram para ascenderem materialmente os levaram ao aumento das áreas de cultivo, ao aumento da escala e do tempo de trabalho na propriedade. A introdução maléca da agroquímica, dos herbicidas, aqui e acolá pela introdução da mecanização, a não ocupação de todos os membros das famílias pelo minifúndio liberaram parcelas signicativas de jovens para empregos temporários e para o emprego urbano. A composição demográca das famílias camponesas diminuiu, bem como o tempo das famílias para estarem em reuniões e lutas prolongadas. Não obstante um contingente maior de camponeses caram alijados das políticas públicas de inclusão produtiva, com sobrevivência restrita a produção de autoconsumo, a aposentadoria e as políticas sociais de tipo compensatório dos últimos 12 anos. A construção de um projeto camponês para agricultura deve se dar num quadro de lutas por reprodução social do campesinato que correspondam a novas aspirações materiais e culturais. O Surgimento do Agronegócio¹ No nal dos anos 90, passada a inviável experiência do primeiro governo FHC - de acumulação de décits externos crescentes e contínuos, o Brasil vira “bola da vez” da especulação nanceira internacional em 1999 - (crise cambial), o que forçaria o segundo Governo FHC a reorganizar sua política econômica externa, tendo em vista gerar saldos comerciais de divisas a qualquer custo. Aqui começa a reestruturação econômica da economia do agronegócio, diretamente vinculada à expansão mundial das “commodities”². O agronegócio se reestrutura como pacto de economia (riqueza) política (poder) com objetivo de otimizar a extração de renda terra e hegemonizar os sistemas de relações políticas e ideológicas na sociedade brasileira. O bloco hegemônico articula os latifundiários, a grande agroindústria transnacional, a grande mídia, o Estado e o capital nanceiro como vanguarda do pacto de poder. De forma sumária podemos descrever os aparatos políticos e ideológicos que, em movimento, reestruturam o poder do agronegócio como sendo: a – papel determinante do poder de Estado: através da ativação do sistema de crédito público, do mercado de terras, da alteração de legislação; da desativação de agências “guardiãs” da função social da terra (INCRA, IBAMA, FUNAI, MDA, ANVISA); do desmonte de políticas sociais como PAA, PNAE; uso do PRONAF como principal veículo de subordinação da agricultura camponesa às cadeias do agronegócio, e quando necessário apoio militar ao agronegócio. b – monopólio de representação política parlamentar: acentuação da relação orgânica da bancada ruralista com agroindústrias transnacionais e o capital nanceiro através do nanciamento privado de campanha resultando numa ampla bancada no congresso nacional; e da elaboração de leis anticonstitucionais e permissivas ao avanço do agronegócio (Liberação dos Transgênicos, Agrotóxicos, Legalização da Grilagem na Amazônia, Código Florestal entre outras). c – cooptação intelectual e acadêmica: cooptação de intelectuais, partidos e círculos acadêmicos que exercem inuência no debate ideopolítico. d – mídia: construção de uma densa rede nacional de comunicação do agronegócio – canais rurais, agências de notícias e grandes grupos de mídia – em vistas de popularizar o agronegócio como o porta bandeiras do progresso no Brasil. No âmbito internacional soma-se a sistemática pressão do imperialismo através de suas transnacionais das sementes, agrotóxicos, fertilizantes e máquinas agrícolas, bem como através da Organização Mundial do Comércio e suas regras nefastas. O poder do agronegócio, explica-se, portanto, dentro da estrutura que articula sua centralidade na política econômica de Estado que atravessa governos (FHC, Lula e Dilma); ¹Seção construída com base no texto de Guilherme Delgado: O que signica o economia política do agronegócio no Brasil atual (anos 2.000). ²As exportações de produtos primários saltam de 50 bilhões de dólares em 1998/99 para 250 bilhões em 2010/12 (Delgado, G. 2013).
pela sua organização política interna e sua subordinação consentida aos interesses imperialistas. Neo-desenvolvimentismo, Estado e Composição de Classes Neo-desenvolvimentismo, social-desenvolvimentismo, liberal-desenvolvimentismo ou lulopetismo, importante é que os diferentes cientistas políticos coincidem em armar que a ascensão de Lula em 2003 ao governo federal representa uma nova frente de forças políticas e sociais alinhados ao projeto de crescimento econômico combinado com políticas sociais de massa. Mesmo sem formalizar participam da frente trabalhadores assalariados, camponeses, setores médios e burguesia interna. Mesmo secundário diante das forças de mercado, o Estado recupera funções de planejamento e indução dos investimentos. Do ponto de vista pragmático a “formula” deu certo: recuperou o crescimento econômico, beneciou milhões de famílias pobres com inúmeros programas e políticas sociais e do ponto de vista político eleitoral garante o quarto mandato. Uma nova composição de classe surgiu, milhões de jovens foram incorporados ao trabalho assalariado e formam um jovem proletariado. A ascensão material (consumo) não coincidiu com elevação da cidadania, com a participação popular nas grandes decisões da nação. Junho de 2013 representa as fraturas, e não é possível compreendê-lo com visão estreita, política eleitoral. Atomizados pelas décadas de educação neoliberal a juventude vai as ruas, em protesto usa a cidade como arma, e coloca a questão urbana na centralidade da luta classes palco principal de onde as revoluções não se desfará no século XXI. Nenhuma força social conseguiu captar e canalizar as energias dispendidas naquele mês. A direita disputou a juventude pela mídia e ganhou parcelas para o projeto conservador. Em contrapartida a fragmentação das massas de juventude que foram às ruas, crescem em São Paulo o poder de luta e convocação de movimentos como MTST e MPL, e a sensível massicação do Levante Popular da Juventude. A frente neodesenvolvimentista se depara com seus próprios limites: pouco crescimento econômico nos últimos três anos; paulatina desindustrialização; crescimento econômico com base na destruição ambiental; disputa acirrada pela partição da renda do Estado (banca x burguesia interna x programas/políticas sociais); e do ponto de vista político a frente se deteriora: o “centrão” domina, chantageia, e as forças populares encontram-se no ponto de inexão: ou avança nas reformas estruturais e um programa classista para romper o cerco político ou se tornam caudatárias do protagonismo histórico e se deterioram em suas funções de representar a classe e portar projeto transformador. III – CONDIÇÕES PARA SE DEBATER A ATUALIZAÇÃO ORGÂNICA DO MPA O debate sobre as formas organizativas é tema corrente das organizações revolucionárias. As formas organizativas assumidas pelas classes em luta devem corresponder a exigência de cada períodos histórico, não deve se submeter a esquemas doutrinários, receitas válidas para todas as épocas, e muito menos é uma especulação caprichosa de um gênio militante. Somente as formas organizativas que resultam da “invenção” das classes em luta, como produto histórico, conseguem se desfazer das formas organizativas em desuso e corresponder as exigências da luta de classes de cada época. Para fazermos o debate de forma aberta e crítica devemos primeiro nos livrar dos desvios que cortam a possibilidade de um debate criativo para organização, capaz de indicar solução para a questão. Os pressupostos básicos para debatermos são, ao nosso ver, os seguintes: i)Não dogmatizar as formas organizativas: a necessidade de debater a atualização organizativa é tarefa permanente de toda organização revolucionária, de esquerda, não dogmática; ii)Ser sensível a diversidade: considerar os diferentes campesinatos, os diferentes momentos da construção do movimento em cada região e estado, resultado da próprio crescimento do MPA, de suas lutas sociais, e do desenvolvimento desigual e combinado do
capitalismo brasileiro; iii)Combater o oportunismo: o debate deve ser crítico e criativo, e não para forjar a exibilização, a perpétua indenição, para assegurar a falta de aplicação prática. Não nos livrando do primeiro desvio, teremos por consequência a submissão da organização às formas doutrinárias e dogmáticas de encarar o movimento. Ao não compreendermos o segundo desao cairemos num debate abstrato, de puro apelo e apego aos princípios, e não seremos capazes de incorporar de forma crítica os desaos postos pelo movimento da realidade. Se cometermos ambos os erros vamos nos tornar uma organização cansada e seremos ultrapassados pela história. Se manifestarmos incapacidade de discernir a divisa entre o debate criativo sobre a práxis organizativa e a busca de exibilização organizativa que abrigue Gregos e Troianos, teremos por consequência um oportunismo organizativo que impedirá o alcance dos objetivos estratégicos propostos pelo movimento. Por último, fundamentalmente, devemos considerar o debate da organização dentro da quadra histórica das mudanças estruturais que descrevemos acima. IV – LEGADOS DE LÊNIN As lutas espontâneas dos trabalhadores, lutas de caráter econômico e sindical, não os levam a passagem a uma consciência política e revolucionária. O militantes espontaneistas acreditam que as massas populares possuem conhecimento sobre a estrutura e funcionamento do sociedade, dos fatores da conjuntura que os guiam revolucionariamente. É uma verdade que os conhecimento teóricos, políticos revolucionários, se erguem sobre a chão concreto da luta de classes em cada período histórico. Por outro lado, nos ensina a história, que as lutas dos trabalhadores no mundo inteiro, sejam elas no centro ou na periferia do capital, não avançaram por si rumo a compreensão das leis da capitalismo e na sua transformação revolucionária. A política revolucionária, parte das lutas econômicas e aproveita-se dos lampejos de consciência política que ela forja, para eleva-la à consciência revolucionária. Mas somente isto não basta: as lutas econômicas oferecem possibilidades limitadas em dar-lhes caráter político, daí resulta errôneo imaginar que é possível a mesma estrutura organizativa, da luta econômica e social, desenvolver a consciência política. É necessário uma organização que cumpra o papel de ser a vanguarda do desenvolvimento político das massas. Uma organização que funcione com base na unidade, disciplina, centralismo democrático, no trabalho prossional, e que tenha caráter conspirativo, tornando-se uma educadora das massas difundindo através da organização e da agitação e propaganda as ideias socialistas. V – BASES PARA UM NOVO MODELO ORGÂNICO DO MPA As vezes a consciência está à frente do ritmo das lutas, por outro lado, há momentos em que o movimento espontâneo das mobilizações de massa traz dentro de si elementos que estão à frente do processo consciência da militância que participa dela. A exemplo temos as mobilizações que deram origem ao MPA: pensávamos que o problema central era a falta de crédito para agricultura camponesa, mas nascemos em meio a uma seca, uma crise ecológica. A nossa luta estava à frente de nossa consciência, hoje a ecologia, as lutas ecológicas são um traço denidor do nosso movimento. Em alguns aspectos nossa teoria está à frente de nossa prática, inuenciando-a positivamente, desempenhando papel criador a exemplo do Plano Camponês. Em outros, nossa teoria, está defasada, atroada diante realidade prática a exemplo dos desaos organizativos. Surgimos como um movimento de luta econômica, por políticas públicas, mas surgimos com um método diferente: luta de massas; organização de base; direção coletiva; de enfrentamento contra o agronegócio e o Estado. No entanto o ponto que realmente marcou nossa ascensão e nos consolidou foram a conquista de políticas públicas. Nisto fomos pioneiros, inclusive! O movimento sindical centra-se nas pautas corporativas, na mediação entre capital
x trabalho do tipo: preços dos produtos e insumo, direitos entre outras. Essa relação com a base não podemos perder, esse é o risco quando o movimento se institucionaliza. O etapismo não existe, a transição conserva os elementos positivos do período anterior – da síntese anterior – e incorpora os novos elementos provindos da realidade formando uma nova síntese, com novas contradições. Os elementos anteriores, mesmo que conservados, ganham um novo conteúdo, altera-se de qualidade e de signicado, inserese de modo diferente na nova realidade. Todo momento de transformação qualitativa é um momento de crise. Nos momentos de crise a organização depura-se, ltra-se, perde bases, alianças, estruturas e militância, perde força social e política. A crise não é necessariamente superada, a dialética não é positivista. Nada pode assegurar que a crise produzirá uma nova realidade superior. A superação passa pela práxis criativa dos sujeitos que compõe a organização, se superada a crise, inaugura-se um novo período e se estabelece um novo campo de alianças, ampliase bases, militância e se reconstitui força social e política. Classe, Movimento e Organização As classes sociais são maiores que os movimentos e suas formas organizativas. A classe não cabe dentro do movimento, é mais ampla, condensa em suas frações uma dinâmica ampla e complexa. Essa dinâmica, em última análise, determina o ritmo da luta de classes. Isso não dispensa o papel da agitação e propaganda, da formação e do processo organizativo em fermentar e despertar as classes para luta. Mas não podemos cair no voluntarismo sobre a capacidade subjetiva de mobilizar o povo, ou seja, que basta apenas a vontade de uma organização e/ou de uma personalidade para mobilizar a massa. O povo, de acordo com suas experiências concretas, desenvolve processo de aprendizagem próprio, que determina o ritmo das mobilizações e grau de radicalidade das lutas. A exigência é que a organização esteja inserida no meio do povo, desenvolvendo em todas as conjunturas uma estrutura de militantes reconhecida pelo povo, capaz de tornarse a coluna vertebral das mobilizações, de dirigi-la, de apontá-la o caminho e propor as táticas e formas de luta mais adequadas para o momento e aceitas pela massa. As contradições acumuladas no interior das classes geram crises e descontentamentos que estouram repentinamente. Cabe a organização estar atenta as tendências gerais da classe, interpretando a realidade em cada momento, e canalizar essas energias em mobilizações e lutas concretas que permitam ao povo experimentar luta direta, acumular conhecimento e forjar novos militantes. As ações espontâneas das massas não respeitam formalidades. Se a organização, a militância e as lideranças, perdem o ritmo as mobilizações passam por cima e as colocam em marcha de forma independente, como mostram vários levantes populares pela história. Essas mobilizações costumam forjar novas formas organizativas, militantes e lideranças e derrubam as velhas formas, petricadas, de fazer política. O Papel da Organização A organização é o conjunto das mediações – formas organizativas – com a realidade. Quanto maior o conjunto de mediações, ou seja, formas organizativas, desenvolvidas maior é o grau de concreticidade/inserção da organização e mais apta está a interpretar o movimento da realidade, manejá-la e transformá-la. A construção da organização deve ser fruto de ação intencional e não fruto da sorte e do acaso. A Plano de Construção deve selecionar as regiões, territórios, locais estratégicos os quais a organização deve ter presença. Outro aspecto é quanto os sujeitos, todos são importantes: mulheres, crianças, jovens, idosos entre outros. Todavia a organização deve saber determinar em cada período quais são sujeitos e quais formas especícas possuem centralidade para acumular forças. Não determinar os sujeitos em nome de um democratismo – “todos os sujeitos são importantes” – é renunciar a visão política na construção da organização. A luta e a organização são os critérios políticos principal denidor da classe. Não basta sermos numericamente expressivo, cumprirmos função econômica e social para com a sociedade, possuirmos expressão cultural que marca a sociedade brasileira se não
elevarmos os interesses da classe a patamares organizativos que coloque os camponeses como sujeito social e político em nível nacional. Lênin nos ensinou que o proletariado desorganizado é o proletariado desarmado, o ensinamento serve também aos camponeses, portanto, é preciso “armar os camponeses”. VI – NOVO MODELO ORGÂNICO Com base nos elementos expostos anteriormente, apresentamos modelo orgânico composto por três estruturas organizativas que, correspondem, necessárias a enfrentar a construção do nosso projeto estratégico e as lutas camponesas no Brasil. São elas: I – A Organização de Massas; II – A Organização Política; e a III – A Organização Econômica. Juntamente com o novo modelo orgânico devemos revigorar e ampliar os princípios e valores do da prática militante do MPA; retomar a concepção revolucionária de agitação e propaganda como elemento constitutivo do trabalho de massas: “sem agitiprop não há luta de massas, sem luta de massas não há revolução popular”; desenvolver métodos de trabalho e organização política combinados a métodos de trabalho e organização social de massas e processos econômicos; e superar nossa visão estreita e provinciana, regionalista, onde os municípios e estados possuem centralidade organizativa e passarmos a encarar a unidade territorial camponesa – características geográcas, socioeconômica, culturais e relações de poder – tenha centralidade organizativa. Organização de Massas – Construir a Contra hegemonia e o Poder Popular “Esta seção, a Organização de Massas, tinha estatutos liberais e era ampla, populista, aberta a todos os que desejavam a reforma agrária radical”. Clodomir Santos de Moraes, In: História das Ligas Camponesas do Brasil. 1. A diversidade das formas camponesas existentes no Brasil podem gerar formas distintas de organização de massas guiadas por princípios comuns, tais como: constituir organização de base com protagonismo camponês, mecanismos de direção coletiva e luta de massas. 2. Desenvolver formas organizativas capazes de envolver a massa camponesa, difundindo a mensagem do Movimento através da organização e da agitação e propaganda, e ampliar a presença social do MPA. 3. Estrutura orgânica capaz de inserir o movimento nas lutas sociais – “transformar as lutas da sociedade nas nossas lutas e nossas lutas em lutas da sociedade” –. 4. Ocupar e disputar, conforme a orientação tática e organizativa do MPA, os espaços da estrutura social existentes: escolas, feiras, igrejas, clube de mães, associações, times de futebol, conselhos, teatros, meios de comunicação entre outros. 5. Os núcleos políticos municipais e/ou territoriais, os quais pertencem a estrutura política do MPA, devem assumir e tornarem-se ferramentas de trabalho local, no município e ou território camponês especíco. Várias podem ser as formas de organização e trabalho de massas: 1)Frente de trabalho com juventude – as brigadas de juventude; 2)Frente de trabalho com as mulheres; 3)Frente de trabalho na comunicação; 4)Frente de trabalho nas escolas; 5)Frente de trabalho nas igrejas; 6)Frente de trabalho com idosos, “terceira idade”; 7)Frente de trabalho arte e cultura; 8)Frente de trabalho com organizações econômicos do próprio povo: feiras, associações, grupos de trabalho, agroindústria entre outras. 6. A Organização de Massas é local privilegiado da difusão das ideias do MPA, através das ações de agitação e propaganda, dos intercâmbios de experiência e das
trocas técnicas. 7. As lutas locais são preparadas pelo núcleo político e acontece nos organismos de organização de massas ou na união de conjunto de organismos da Organização de Massas. Sobre os Grupos de Bases Desde as primeiras empreitadas de debates sobre a organicidade do MPA, os Grupos de Base sempre tiveram centralidade, tornou-se, inclusive, em determinado momento tema polêmico. É razoável. Vejamos de perto algumas reexões e distinções políticas que se fazem necessária. Vejamos: 1. herdamos da experiência Bolchevique a construção da célula como unidade básica, alicerce, de nossa organização. É sempre importante ressaltar que o projeto Bolchevique era o de um partido e não de um movimento social, sob condições históricas especicas: experiência organizativas dos populistas, o fomento ao terrorismo individual, trabalho artesanal, dispersão das forças, governo de ditadura e necessidade de trabalho clandestino. 2. o projeto organizativo era de nuclear revolucionários, principalmente operários e não famílias camponesas. A célula e a estrutura orgânica era assentada essencialmente em militantes, revolucionários prossionais. 3. as famílias possuem uma composição social mais complexa: diferenças de gênero, geração, diferenças econômicas entre as famílias, relações de parentescos e ideologia heterogênea. 4. a nucleação se dá em torno da construção do partido, das ações com vistas a perspectiva do poder. Os Grupos de Base formados por famílias demandam outros elementos, ações de luta social e econômica, possuem limite imposto pela própria natureza da luta e do movimento, o poder se coloca apenas em germe, os grupos possuem demandas heterogênicas: econômicas, direitos, educação, cultural entre outras. 5. feitas essas considerações passamos a compreender que os Grupos de Base não se transformaram na célula política do MPA. Os G.B, formados por família, são a principal forma organizativa de massa, se organizam e se dissolvem conforme os interesses. Portando não se trata de desfazer-se dos G.B, mas de considera-lo como instrumento de organização de massa. Como exemplo de organização por frente, segue abaixo a sistematização da frente de juventude que resultou no acúmulo das Brigadas da Juventude. As Brigadas se constituem como espaço orgânico da juventude camponesa, cumprindo papel na aliança campo-cidade, na agitação e propaganda a partir de elementos políticos organizativos dirigidos pela Organização Política.
Brigadas de Juventude: Natureza Política, Organizativa e Método de Trabalho¹ Natureza política 1.As brigadas de juventude deve se construir como espaço privilegiado de ação política da juventude do MPA; 2.As brigadas de juventude não são um grupo de agitação e propaganda, é o espaço orgânico da juventude do MPA e camponesa; 3.As brigadas de juventude não se constituem numa instância do MPA, ela deve estar vinculada a orientação política, tática e estratégica, do MPA; 4.As brigadas de juventude devem estar vinculadas estreitamente ao trabalho de base e de massas; ¹Texto construído pelo Coletivo Nacional de Juventude e Formação, 2014.
5.As brigadas de juventude objetiva estrategicamente ajudar a consolidar a aliança campo-cidade por meio das de ações, tais como: •Agitação e propaganda; •Ações de solidariedade de classe em situações de luta (greves, marchas, ocupações, panetagem, piquetes, escrachos, entre outras) e em casos de catástrofes ambientais e climáticas. 6.As brigadas de juventude deve permitir o desenvolvimento do pensamento político tático e estratégico da juventude em torno do Plano Camponês. Para isso deve responder a pergunta: quais são os inimigos do Plano Camponês?! Natureza organizativa 1.As brigadas não são uma instância, é o espaço orgânico de organização e ação da juventude do MPA e da juventude camponesa em geral. 2.As brigadas de juventude estão ligadas diretamente ao coletivo de juventude que, por sua vez, está ligado às instâncias de coordenação e direção do MPA; 3.A tarefa central do coletivo de juventude é formar brigadas de juventude nos diversos níveis de nossa organização: municipal, regional, estadual e nacional; 4.O coletivo de juventude deve formular linhas políticas, métodos de trabalho, apontar lutas, estimular as ações e acompanhar as brigadas de juventude; 5.As brigadas de juventude devem possuir autonomia relativa quanto às ações e métodos de trabalho. Isto SIGNIFICA: •Ações devem estar no quadro da estratégia e da tática do MPA. •As ações devem ser estimuladas pelo corpo do MPA e não podem estar presas a calendário pré-estabelecidos e esperar os uxos lentos do MPA. Neste sentido o MPA deve aceitar que a formação de brigadas de juventude tornar-se-á em um polo de tensão positiva da organização, impelindo-o a lutas segundo o calendário da conjuntura e da oportunidade política. 6.As brigadas de juventude devem ser formadas por jovens da base do MPA, por jovens camponeses que não estão organizados no MPA, por jovens que se simpatizam com a luta social e política transformadora quer estejam nas escolas, cursos técnicos e nas cidades. O grupo deve ter pers de militantes os mais variados possíveis e desenvolver as mais diversas capacidades de ação. 7.Não é grupo de amigos, mas serve a fortalecer os laços de amizade, companheirismo e disciplina. Não é grupo de estudo, mas exige a elevação do estudo preparatório que antecede as ações. Não é um grupo “porra louca” que sai fazendo ações sem preparo e orientação política, menos ainda um grupo que só reúne e nunca faz ações. Método de Trabalho 1.O método de trabalho das brigadas de juventude devem combinar simultaneamente, num mesmo processo, os seguintes elementos: •Teoria revolucionária: preocupar-se com assimilação criativa da teoria socialista. •Tática e estratégia do MPA: o Plano Camponês. •Itinerante: desenvolver alta capacidade de mobilidade, deslocamento, no território (de uma comunidade a outra, de um município a outro, dentro do estado e nacionalmente) e entre seus membros. •Ações táticas: desenvolver ações com regularidades segundo as possibilidades abertas pela conjuntura. 2. As reuniões das brigadas de juventude utiliza o método da análise planejamento ação e avaliação/análise ajuste da linha planejamento ação. 3. Recuperar a agitação e propaganda como elemento chave da teoria da organização revolucionária: •Assimilamos aqui a contribuição do Levante Popular da Juventude que estabelece os seguintes elementos para a agitação e propaganda, quais sejam, a saber:
a)Desaos e pressupostos para agitação e propaganda 1 - fomentar a formação política e ideológica da militância e da base. 2 - fundamental articular agitação e propaganda com a estratégia de trabalho de base. A Agitprop não é um m em si, mas está relacionada com a política mais ampla de cada organização e com sua estratégia e mensagem. 3 - construção do poder popular, pela crítica contra-hegemônica e empoderamento da juventude e da classe trabalhadora. 4 - Construção dos valores socialistas de solidariedade e coletividade, principalmente através do exemplo pedagógico, da disciplina e do compromisso com a vida do povo. “É preciso que a agitação e propaganda esteja vinculada à estratégia, para que não se torne somente um grupo artístico, um apêndice da organização, e sim algo que perpassa a estrutura. A agitação e propaganda é tarefa de toda a organização, e não de um grupo autônomo, com linha política própria. Ela tem que se territorializar, tem que servir para potencializar o trabalho de base, para crescer, para multiplicar o grupo, para fazer articulações” (Sistematização do I Curso Nacional de Agitprop - LPJ). 4.Estimular e construir subjetividade revolucionária, elevar a autoestima da classe, promover e recuperar símbolos revolucionários e a identidade revolucionária da classe. 5.As ações das brigadas podem utilizar-se das mais variadas possibilidades, não possui pauta pré-estabelecida, age de acordo com as necessidades reais do povo, e aproveita as oportunidades políticas que surgem com rapidez. •Aproveitar contradições concretas da vida do povo para fazer lutas: falta de água, estradas, saúde, fechamento de escolas. - de forma especial as brigadas podem fazer várias ações em torno da educação, contra o fechamento de escolas e pela reabertura das escolas rurais. •Aproveitar contradições no seio do bloco dos inimigos, como: agrotóxicos, corrupção e fraude de empresas (exemplo: soda e água oxigenada no leite), fusão de empresas (denunciando a hiprocrisia capitalista da concorrência e livre mercado). Casos de corrupção de políticos da bancada ruralista. Escrachos e tudo mais que a oportunidade oferecer e nossa criatividade política sustentar. •Fazer realizações práticas: reformar escolas, trocar nomes de ruas e escolas e outras entidades que recebem nomes de ditadores por nome lutadores locais e/ou de expressão nacional, reformar estruturas comunitários de esporte, lazer, fazer capacitação em práticas agroecológicas e de convivência com biomas, embelezamento de espaços. 6. Participar e qualicar as mobilizações do MPA: avançar no planejamento das ações, na qualidade da agitação e propaganda entre outras. Papel dos Sindicatos Uma das nossas matrizes organizativas foram os Sindicatos dos Trabalhadores Rurais, os STR´s, nosso surgimento está ligado a crítica do esgotamento de sua funções políticas e organizativas que em determinado momento passou a não corresponder mais as necessidades de luta do campesinato. O MPA surge como uma nova ferramenta de luta para as “novas” necessidades da luta camponesa. Ao longo desses anos é constatável que o MPA em vários estados se construiu tendo como base para sua estruturação alguns STR's, alguns denharam outros se reergueram junto ao trabalho político do MPA, outros cumpriram papel de instrumento legal para garantir o acesso dos direitos aos camponeses. Durante os debates sobre organicidade evidenciou a presença do MPA nos STR's, utilizando-os como mediação para organização de base do MPA em alguns municípios, em outros como principal instrumento de captação de recursos para o movimento em determinadas regionais. A centralidade que achamos importante trazer ao debate é se não seria necessário construirmos uma frente de trabalho sindical, com o objetivo de fazer colocar a estrutura a serviço da construção e fortalecimento do movimento de massas. Se nossa pretensão é a
construção da contra hegemonia, não podemos fugir de pensar qual papel da base sindicalizada e como vamos inuenciar direta e indiretamente na movimentação desta base. Quais pontos devemos pensar para construir uma frente de trabalho sindical? Devemos construí-la?
ORGANIZAÇÃO POLÍTICA - Coluna Vertebral e Garante da Unidade Nacional: Militantes, Dirigentes e Quadros. “Por outro lado, a Organização Política compunha-se de rígidos estatutos, destinados e dirigir, de forma unitária e disciplinada, as atividades das Ligas Camponesas do Brasil, coordenando o trabalho de massas com o trabalho clandestino”. Clodomir Santos de Moraes, In: História das Ligas Camponesas do Brasil. A Organização Política deve funcionar com base na Unidade, Disciplina, no Método Revolucionário de Direção com base no Centralismo Democrático, com sistema de normas, princípios e valores claros, os quais estruturem modelo orgânico que se comunique entre as partes e que faça reproduzir criativamente as linhas do movimento em cada espaço, gerando uma cadeia de comando ascendente – da base as direções - e descendente – das direções as bases -. 1.Construir a estrutura comum que da unidade ao movimento, ou seja, qual é a estrutura elementar que deve existir para se considerar que o MPA exista em determinado município e/ou território. 2.Acumulamos que deve existir em escala municipal e/ou território, no mínimo, um núcleo militante, político, conspirativo. Podemos transformar parte de nossas coordenação municipais nestes núcleos políticos. 3.Temos que debater a composição deste núcleo político: uma percentagem de militantes (30%) que não provenha da base camponesa e que seja incorporada e projetada em setores, tarefas especicas, frentes entre outros. 4.Cada núcleo político, deve estar ligada há um número mínimo de famílias e ou frentes – quantas famílias ou quantas pessoas por frente? – para não termos grupinhos de vanguarda soltos e porra louca. Essas famílias devem estar organizadas conforme as possibilidades: grupos de base, cooperativa, associações, frentes de trabalho especica. 4.1 a rigor, um núcleo de bom funcionamento, deve possuir elementos que desenvolva atividades no âmbito da Organização Política, da Organização de Massas e da Organização Econômica. 5.Construir estrutura de direção política por estado e território. 6.Construir estrutura de comando em nível nacional: Congresso, Coordenação Nacional, Direção Nacional, Seminários, Secretaria entre outros organismos capazes de resolver e dirigir atividades políticas, organizativas e de comunicação. 6.Desenvolver política de formação e projeção de militantes. Preparar cuidadosamente e retomar o deslocamento de militantes como mecanismo de formar e projetar militantes, e de acelerar a nacionalização do Movimento. 7. Os militantes, dirigentes e quadros: coordenam o trabalho de base, as frentes de trabalho especíco, as atividades de comunicação, as atividades de agitiprop, a política de alianças, a auto-sustentação, as secretarias, e o plano de lutas. “Toda a arte de uma organização conspirativa consiste em saber utilizar 'tudo e todos', em dar trabalho a todos e a cada um', conservando ao mesmo tempo a 'direção' de todo o movimento, e isto entenda-se, não pela força do poder, mas pela força da autoridade, por energia, maior experiência, amplidão de cultura, habilidade”. Lênin, Carta a um camarada. 8. A centralidade da Organização Política é agir conforme a tática e a estratégia do MPA e posicionar o movimento na conjuntura.
9.Os organismos que resultarem dos trabalhos das frentes, a exemplo das Brigadas de Juventude, são coordenadas pela Organização Política. 10.Construir instrumentos de comunicação como organizador coletivo. A Organização Política deve centralizar a direção ideológica e política ao mesmo tempo em que descentraliza o máximo de tarefas para os mais diversos órgãos e militantes. É tarefa da Organização Política transformar a força social do Movimento em força de política, considerando ações de luta política composta por 4 estágios: I) construir apoio no meio das massas camponesas; II) construir e massicar formas organizativas das massas camponesas; III) construir grupos de apoio junto a sociedade em geral; IV) impulsionar, estimular e fazer a luta de massas, a luta direta.
ORGANIZAÇÃO ECONÔMICA – ALIMERGIA, Sistemas Camponeses de Produção, Auto-Sustentação “E com relação ao tipo de atribuições, as seções liais ou de organismos do comitê deverão organizar também todos os diversos grupos que servem ao movimento, grupo de estudantes e grupo de secundaristas, assim como grupos de funcionários auxiliares, grupos de transporte, de imprensa, os dedicados a organização de aparelhos, grupos de contra-espionagem, grupos de militares, de fornecimento de armas e aqueles criados para organizar 'empresas nanceiras rentáveis' etc. Lênin, Carta a um camarada. 1. O MPA compreende que solução dos problemas reprodutivos do campesinato exige mudanças estruturais na sociedade e a construção da economia socialista que elimine os entraves para o desenvolvimento da economia camponesa cooperada. 1.1 A função da Organização Econômica é a de estruturar ações que ajudem na resistência camponesa e expressem a proposta política do Movimento na produção, comercialização e abastecimento, que seja exemplar para o conjunto da sociedade. 1.2 Outra função é contribuir para impulsionar o auto sustentação nanceira do Movimento. 2. O Plano Camponês aponta a produção de alimentos sadios e o abastecimento popular como a forma central de construir a aliança campo-cidade. 3. Considerando a nova proposta de organicidade do MPA o Coletivo Nacional de Produção deverá se tornar num organismo, dirigido pela Organização Política, capaz de coordenar e estruturar nacionalmente as ações da Organização Econômica. 3.1 Em função da estratégia do Movimento em cada região e circunstância criar e desenvolver processos produtivos com base em instrumentos como: i – cooperativas territoriais, associações, institutos; ii – grupos de produção; ii – famílias individuais; iii – feiras; iv – mercados populares; v – rede de organizações econômicas do campesinato nos diversos níveis: do munícipio ao nacional. 3.2 Os instrumentos utilizados pela Organização Econômica para organizar a econômica camponesa são de das classes: i – os que são orgânicos ao MPA, ou seja, criados e dirigidos diretamente por nós; e ii – os que não são orgânicos ao MPA, ou seja, instrumentos que fazem parte da estrutura econômica e social e econômica do campesinato para resolver seus problemas reprodutivos mas que não foram criados e não são dirigidos diretamente pelo Movimento. 4. Outro desao é diferenciarmos o papel dos instrumentos jurídicos. Até o momento tratamos de forma simplista, sem diferenciarmos os instrumento jurídico segundo o impacto social e político deste. Exemplo: uma associação e/ou cooperativa que não tem inserção na base com aquelas que se vinculam diretamente com base e com as massas. 4.1 Instrumento = tipo de organização econômica – associação, cooperativa, instituto – coordenado e dirigido pelo nível de coordenação e direção. Estes não se
vinculam diretamente com base. Exemplo: uma cooperativa de ATER pode ser administrada de uma sala distante e o quadro técnico ser absorvido pela organicidade do MPA, o instrumento nem aparece para base, ou aparece marginalmente. Quando este tipo de instrumento da problemas sejam de ordem política e/ou econômica estes são geralmente resolvido pela coordenação e direção. Afetam o movimento por meio de outros reexos – tomam tempo dos dirigentes, requerem recursos para serem resolvidos, e alguns desgastes nas relações políticas -. O problema não atinge diretamente a base em si. 4.2 Instrumentos com inserção direta na base. Os projetos não operam apenas em nível de escritório. Os projetos se vinculam diretamente com a organização da base, com a vida econômica das famílias, com expectativas, conhecimentos, técnicas etc... Trata-las como instrumentos controlados pela direção é insuciente; não ver a vinculação com a base, é não ver as exigências e os desaos que isto traz. A base sente o impacto diretamente –. Trata-las apenas como instrumento é trata-las como algo externo ao MPA. Este novo tipo de organização econômica não é algo externo, ele faz parte de uma síntese que compõem a organicidade do MPA. 5. Elas são instrumentos também, mas o são em uma qualidade nova, traz exigências e desaos novos. Ao contrário dos que pensam que uma esfera econômica prescinde de uma esfera política, o desenvolvimento de uma esfera econômica exige que cada vez mais uma coluna política em todos os níveis da organização para dirigi-la. 6. A Organização Econômica está vincula e é ao mesmo tempo esfera política e de massas. O momento privilegiado destas três é a esfera política que segura em um braço a Organização de Massas e no outro a Organização Econômica. 7. Nossas cooperativas territoriais, projetos econômicos e produtivos, devem ser a expressão de nossa proposta política para o campo. Temos unir discurso com prática, construir uma base material que aproxime das nossas propostas políticas e ideológicas. 7.1 Do ponto de vista prático o Movimento pode criar empresas para ns especícos nanceiros, ou seja, construir empresas dirigidas pela Organização Política para levantar recursos para sustentar o Movimento. 8. A esfera econômica é também esfera de massas. Exemplo: a distribuição de sementes de milho crioulo. Atualmente estruturamos programa de alcance massivo, para além de nossa base. Se não acumulamos mais politicamente é pela razão de não termos organismos de comunicação e agitação e propaganda desenvolvidos. Ousadia, equilíbrio e coragem para decidirmos. Firmeza e unidade nacional para construirmos o nosso novo modelo orgânico. Bom debate!
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