T9797 - Revista do IRB - Separata n° 171_1968

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MINISTfiRIO DA INDOSTRIA E DO COMeRCIO instituto de resseguros do brasil

RESERVAS TECNICAS

A LUZ DO DIREITO

PALESTRA DO SR. RAUL DE SOUSA SILVEIRA, SUPERINTENDENTE DA SUSEP. NA VI CONFERENCIA BRASILEIRA DE SEGUROS PRIVADOS E CAPITALIZACAO — CURITIBA

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Separata da REVISTA DO I.R.B. n' 171 %

RESERVAS TECNICAS A LUZ DO DIREITO

PALESTRA DO SR. RAUL DE SOUSA SILVEIRA. SUPERINTENDENTE DA SUSEP, NA VI CONPERBNCIA DE SEGUROS PRIVADOS E CAPITALIZAQAO — CURITIBA

Quando, em momenfos de ocio, ou recolhido a meditagao, busca o homem a razao de sua existencia ou o porque da dinamica do Universe, nao deixa de sentir a excelsitude de sua presenqa no maravilhoso concerto do cosmo regido pelo proprio Supremo Criador de todas asbelezas. A rigidez das dimensoes fisicas nem sempre Ihe permite, porem, a visao das coisas, cuja plasticidade imprimem rumo ccrto aos eventos que marcarao os dias porvindouros.

Embora marcadamente espiritual, livre em sua individualidade, centro de manifesta^des superiores e construtor de arcaboufos teoricos de admiravel consistencia logica, tcm o homem de render-se ao imprevisivd. E como que buscando um ponto de apoio no torvelinho das galixias espalhadas no infi nite, subordina ao concrctismo das coisas suas preconcepgScs teoricas e rende-sc a realidade. A exemplo do orbe, que gravita em torno do Sol, gravita ele em torno de outros seres, avido de seguran^a e tranquilidade de espirito.

Essa ansia de seguran^a invade a humanidade tdda, cada vez mais unida pela multiplicidade de meios de comunica^ao, mas ainda muito dividida pelas cortinas ideologicas.

A propria corrida as armas nada mais revela que o desejo de seguran^a de todos OS povos. Sao os gigantescos arsenais de guerra a proje^ao materia-

lizada do instinto de sobrevivencia ante a amea^a de uma vontade subjugadora.

O atomo, que pode iluminar milhoes de cidades, tambem pode, em sua reagao em cadeia, varrer da Terra milhoes de vidas.

Com OS recursos da industrializa^ao e da tecnologia, constroi o homem para a vida e tambmn para a morte, e o futuro se constitui numa linha cujo duplo sentido gera inquietagao.

A medida que a humanidade avan^a, vai-se configurando, em progressao geometrica, um desfecho que pode ser tragico ou pleno de benesses, dependendo do comportamento dos lidcres nas mais variadas areas de a^ao. E estes nao podem renunciar a novas perspectivas, nem esquecer, por um momento, sequer, que sao depositarios dessa seguranga, que, vez por outra. parece fugir-lhes de sob os pes.

Qualquer acontecimento no mundo de hoje e partilhado por todos. Define posigoes, pode desatar uma conflagra9ao e lan^ar a humanidade ao caos. Essa mesma forcja que impele os povos para novas etapas traz em seu bojo um potential tremendo de perigos, pois que, interpenetrando-se em todos os campos e refletindo-se na conduta humana, pode apressar a paz, ou anula-la totalmente.

E a inseguran?a atual e a contrapartida da tranqiiilidadc.

Esclarecidas as conexoes entre meios e fins, buscadas as alternativas que o

momento historlco comporta, cstarao langadas as bases para as decisoes e scrao se'guros seus alicerces. porque fundamentados na razao.

Desde as rela?6es entre as grandes potencias, que se munem de acordos e tratados para resguardar direitos e soberanias, ate o mais simples contrato entre pessoas, esta presente o desejo de seguranga.

Enquanto se armam as potencias do «CIube At6mico», tendo, tambem, por escopo a Seguranga, a Conferencia do Desarmamento, em Genebra, de que participam 18 nagoes dos mais variados matizes ideologicos, discute a liquidagao gradual das armas e a maneira de efetuar o cumprimento das clausulas que intentam frear a corrida para o cataclisma universal.

Em todas as suas atividades procura o homem ccrcar-se de garantias, munirse de tranquilidade, caminhar instintiva ou racionalmente em busca do cquilibrio biologico, com base na estabilidade mental, na paz da consciencia, esforgando-se por materializar a essencia indestrutivel que Ihe anima o ser.

Da interpolagao de estimativas c probabilidades podemos visiumbrar o perfil do amanha sem medo da vertigem. As contingencias adversas serao superadas, porque cremos no progresso e no desenvolvimento, sinoninios de paz. E paz e seguranga. e tranquilidade. As nagoes de grande desenvolvimento tern o seguro como uma de suas mais importantes atividades e legitimas instituigoes. Cabe, pois, a classe seguradora papel decisive na felicidade dos povos.

Se nosso Pais, emergente de um lar go periodo de estagnagao, pode hoje ver em todas as diregoes de seu vasto territorio o florescimento de uma nova era, deve-o a empresa privada, que, enfrentando toda a sorte de vicissitudes, pode triunfar, elevando-o da categoria de subdesenvolvido ao porte das nagoes em desenvolvimento.

As mudangas radicals verlficadas na esfera do Governo, de 1964 a esta parte, alinharam objetivos entre a Administragao Federal e a livre iniciativa, fazendo com que as linhas de forga corressem paralelamente no sentido do progresso, numa luta sem tregua contra a inflagao que minava um sem numero de atividades, principalmcnte a seguradora.

Como importante nucleo de polarizagao de recursos, a industria de seguros foi algada, entre as outras areas economicas, a um lugar de relevo, merecendo cuidado especial do Governo da Revolugao.

Revendo a politica federal nesse campo, as autoridades da Republica verificaram que muito pouco se vinha fazendo para impulsionar essa atividade. E langaram as bases de uma agao dinamica, fundada na necessidade de estimular o crescimento das seguradoras, expandindo-lhes o mcrcado e proporcionando-Ihcs meios adequados para um desenvolvimento baseado na leal concorrencia.

Normas dinamicas, que substituiram regras arcaicas, foram postas cm execugap atraves da SUSEP, e sua aplicagao mostram. de pronto, resultados animadores. Tais normas — sujeitas a revisao, sempre que as contin gencias socio-economicas o exijam tem. com seu rigor, o objctivo de manter no mais alto nivel a atividade segu radora e propiciar condigoes que levem a todo o Pais os beneficios da instituigao do seguro, criando nova mentalidade previdenciaria e carreando re cursos para o desenvolvimento por todos desejado.

Muitos aspectos e conceitos dentro da vasta gama de atribuigoes em que se desdbbram os seguros p5em em campos diametralmente opostos os que tem o dever de buscar formulas de aprimoramento dessa institulgao.

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O diaiogo a que o Governo esta sempre disposto, dentro da orienta?ao que tem adotado, e o melhor caminho para o entendJmento miituo e a solu^ao de diividas e controversias, nao raro presentes entre os proprios seguradores.

Uma delas, razao fundamenta] de nossa exposi^ao, e a que se refere as rcservas tecnicas, como regime especial de seguranga e garantia, visto sob o aspecto juridico.

11 — FINALIDADE

A submissao das empresas de seguros a regras especiais, no tocante a constituigao e inversao das reservas tecnicas, e o meio valido de prote^ao aos direitos e interesses dos segurados.

2. Nos termos dos arts. 84 e 85 do Decreto-lei 73, de 21 de novembro de 1966, as Sociedades Seguradoras, para garantia de todas as suas obriga?6es, constituirao reservas tecnicas, fundos especiais e provisoes, alem de re servas e fundos determinados em leis especiais; e os bens garantidores dessas reservas, fundos e provisoes, nao poderao ser alienados. prometidos alienar, ou de qualquer forma gravados, sem previa e expressa autorizagao da Superintendencia de Seguros Privados,sendo nulas, de pleno direito, as alienaCoes realizadas ou gravames constituldos com violagao dessa norma. Se a garantia recair em bem imovel, sera obrigatoriamente inscrita no competente Cartorio do Registro Geral de Imoveis.

3. Para a efetividade das garantias dos segurados, a lei subordina as re servas tecnicas a duas condigoes fun damentals:

a) exatidao dos calculos;

b) aplicagao em bens e valores especificados.

4. As Companhias que operam em seguros privados. neles compreendidos o seguro de vida e o seguro dos ramps elementares, sao obrigadas a constituir, em garantia de suas operagoes, as seguintes reservas tecnicas:

a) reserva de riscos nao expirados:

b) reserva matematica:

c) reserva de seguros vencidos;

d) reserva de sinistros a liquidar;

e) reserva de contingencia:

/) fundo de garantia de retrocessoes.

Ill — CONSTITUigAO

5. A constituigao de tais reservas independe da verificagao de lucros: imp5e-se por forga das responsabilidades contraidas pelas empresas para com os segurados. Sua fungao especifica e garantir essas responsabilidades e indicar, rigorosamente, a parte patrimo nial que se deve reservar para fazer face, durante o curso do contrato de seguro. a cventualidade do risco. Destinam-se a garantir os compromissos potenciais das Seguradoras, medidos pelos riscos cobertos.

6. Tomemos como exempio a reserva-premio, compreendendo a de ris cos nao expirados e a reserva matetica, que se relaciona a compromissos potenciais pela ocorrencia provavel de sinistros apos a data determinada para seu calculo, que, convencionalmente, coincide com a do encerramento do balango contabil das empresas.

7. A constituigao das reservas de riscos nao expirados para os ramos ele mentares e decorrente da obrigatoriedade imposta as empresas seguradoras, como a qualquer sociedade anonima, de levantarem anualmente balangos patrimoniais e contas de lucros e perdas, a fim de que, apurados os resultados de

cada exercicio financeiro, se atribuam dividendos aos acionistas, como remuneragao do capital investido na exploragao da atividade economica do se guro.

. 8. Nao houvesse a imposigao legal do levantamento do balango contabil, a constituigao da reserva de riscos nao expirados careceria de sentido, porquanto o premio recebido, descontadas as despesas dc corretagem e administragao, e do lucro do negocio, atenderia suficientemente ao pagamento dos sinistros. No fim da vigencia da apolice, 0 que ocorreria cm um dado instantc do ano, se tudo se desenvolvesse de acordo com a previsao orientadora do calculo das tarifas de premio, o saldo deveria ser nulo.

9. Evidentemente, tal nao se verifica. Resultando o premio de tarifa do produto da freqiiencia de sinistros pelos valores medios de danos, havera sempre oscilagoes, para mais ou para menos, em torno do valor esperado de danos. Se os riscos segurados fossem homogeneos e de valores nao muito desiguais, as diferengas seriam minimas. Poderia ate, nesse caso, ser raatematicamente previsto um limite de danos fixado, digamos, em 95% da ocorren cia; em raciocinio inverse, havcria 50% de probabilidade de os danos ultrapassarem o limite previsto. Mas isso € tarefa que aos tecnicos compete realizar.

10. Assim, decorrendo a constitui gao anual da reserva-premio de impo sigao legal, e nao coincidindo a emissao de todas as apolices no primeiro dia do ano — caso em que a reserva-premio seria igual a zero — a quota de risco correspondente ao exercicio seguinte sera proporcional ao tempo a decorrer de 31 de dezembro a data do venciniento da apolice. Mediante critSrios simplificativos, o calculo da reserva de riscos nao expirados e realizado com relativa facilidade.

II. Calculada a reserva-premio, deve a empresa seguradora inclui-la em seu balango contabil anual, e, no exer-

cicio seguinte, proceder a reversio de seu montante, recalculando-a com base na produgao desse exercicio.

12. No que se refere ao seguro de vida, dele excluldo o denominado se guro de vida em grupo, a constituigao da reserva de riscos nao expirados nesse caso especifico denominado «reserva matematicas, porque se trata de reserva «sui generiss — e uma necessidade t-ecnica que se impoe em virtude de, por meio das taxas de mortalidade — OS qx dos atuarios — integrantes das charaadas «tabuas de mortalidadc», suporte atunrial das tarifas do seguro de vida, se calcularera, ano a ano, os sobreviventes de determinado grupo hipotetico constituido de cem mil ou um milhao de vidas.

13. O numero de sobreviventes de tal grupo obtem-se pela conjugagao dos elementos do registro civil de obitos e nasciraentos, dos censos demograficos realizados e de metodos estatisticos apropriados.

14. Quando as Companhias de Seguros iniciaram suas operagoes no ramo Vida, o process© operacional obedecia as mesmas regras adotadas nos seguros dos ramos elementares. Emitia-se, cada ano, nova ap6licc, como decorrencia de um novo seguro.

15. fissc sistema de contratagao de seguro sugeria apenas a constituigao da reserva-premio, que, como acabou de ser demonstrado, corresponde a parcela do premio garantidora dos riscos transferidos para outro exercicio, visto que no fim de cada ano de seguro cessava a responsabilidade de ambas as partes, podendo o contrato ser ou nao renovado.

16. Evidentemente, na renovagao ter-se-ia de considerar o estado de saiide do segurado e a idade atingida, que acarretariam, necesshriamnte. a elevagao do premio, consequSncia do enveIhecimento do segurado e do onus administrativo. O premio, desse modo, anualmente determinado, denomina-se

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cpremio de risco», para significar a cobertura somente do sinistro possivel, ou seja, no case, a mortc do segurado.

17. A primeira sociedade de seguros a adotar os pianos de segiiro com premios nivelados foi a companhia inglesa cEquitable Assurance Company*, no aiio de 1762, causando o fate, pela audacia de que se revestia, o espanto das outras scguradoras. Tal aconte\cimento desjDertou, tambem, o interesse dos matematicos, surgindo uma nova ciencia — a chamada «ciencia atuarial* — que se dedica ao estudo das probabilidades de sobrevivencia, a feitura das tabuas de mortalidade e invalidez, a determina^ao dos custps do scguro, pre mios, anuidades, reservas. etc.

18. A introdugao da tecnica do premio nivclado exigiu fossem constituidos ccrtos fundos calculados seguiido OS principios da matematica atuarial, e que nada mais sao que o excess© de premio cobrado nos primeiros anos de vigencia do seguro, capitalizados a determinada taxa de juros. Semelhante processo permite compensar a insuficiencia de premios, o que fatalmente ocorrera quaiido o segurado atlngir certa idade.

19. E e o somatorio das diferen^as positivas verificadas aoo a ano que, capitalizado a mesma taxa de juros que servira de base ao calculo do premio, ira constituir a reserva matematica destinada a atender aos compromissos da seguradora.

20. A principal caracteristica das opera?5es do ramo vida e a contrata^ao do seguro por longos periodos de duragao: 10, 15, 25 anos, ou mesmo dqrante a vida do segurado. Nao raras vezes, motives imprevistos impoem ao segurado o descumprimento dos contratos firmados. Tais quebras de contrato sao prejudiciais as seguradoras, mas estas nao podem recusar ao segurado o direito de reaver parte das importancias pagas a maior para compensar a diferenga de premio que se vcrificaria com o envelhecimento do segurado. Sstc, assim, tern direito a uma parcela da massa acumulada das reservas correspondentes aos contratos em vigor, para a qual contribuira.

21. O direito do segurado na participagao da reserva matematica acumu lada, previsto em lei, ocorre nos casos de cancelamento do contrato, quando o segurado faz jus ao recmbolso do valor de resgate atribuido a sua apolice, tudo cm relagao coin o tempo de vigencia do seguro e dos premios pagos.

IV —APLICAgAO

22. O regime de capitaliza^ao, aplicado ao seguro, determina a acuniula5ao de grandes somas. Nesse parti cular, a questao do emprego das reser vas tecnicas e de grande iraportancia para toda a coletividade seguradora.

23.A especializa?ao das inversoes, por sinal um dos mais relevantes aspectos da atividade seguradora, deve processar-sc nas melhores condi(;5es de seguran^a e rendimentb.

24. Por isso, a lei e recentes medidas governamentais cercam de todos os cuidados a aplica?ao das reservas, determinando as especies de bens em que devem estar representadas, a fim de que a garantia institulda em favor do segu rado nao se transforme em mera ilusao.

25. No Brasit, a aplica^ao dc fun dos das seguradoras somente foi regulamentada no regime republicano, muito embora a primeira sociedade de seguros, depois da Independencia ■— a Sociedade de Segiiros Mutuos Brasileiros — tenha sido fundada ainda no Imperio, autorizada que foi por Decreto de 29 de abril de 1828.

26. O Decreto n' 2,679, de 3 de novembro de 1860, aprovou modelo para o balance das opera?6es das companhias e sociedades anonimas mcrcantis; mas, para estende-lo as opera^oes das companhias de seguro miituo, nccessario foi expedir o Decreto numero 3.189, de 25 de novembro de 1863. Esses diplomas legais nao regularam, no entanto, a aplica^ao de fundos das seguradoras.

27. No governo de Prudente de Morais, a Lei n" 294, de 5 de setembro de 1895, dispondo sobre as companhias estrangeiras de seguro de vida, em fun-

cionamento no Brasil, determinou que o valor correspondente as reservas de todas as apolices vigentes em 1" de Ja neiro de 1894 fosse empregado em bens imoveis, hipotecas sobre propriedades e imoveis, agoes de estradas de ferro, bancos, empresas industrials ou outras estabelecidas no Pais, ou em deposito a prazo de um ano, pelo menos. em estabelecimentos que funcionassem no territorio nacional.

28. O regulamento para a execu?ao dessa Lei fora aprovado pelo Decreto n' 2.153, dc 1" de novembro de 1895, que estabeleceu, ainda, a fiscaliza^ao das companhias pelo Ministerio da Fazenda.

29. Na presidencia de Campos Sa les, quando Ministro da Fazenda Joaquim Murtinho, foi aprovado pelo De creto n- 4.270, de 10 de dezembro de 1901, o Regulamento do funcionamento das companhias de seguros de vida, niaritimos e terrestres, nacionais e es trangeiras. Esse regulamento criou a Superintendencia Geral dos Seguros, iiiiediatamcnte subordinada aquela pas ta c compreendendo a Superintenden cia dos Seguros Terrestres e Maritimos e a dos Seguros de Vida. E regulou, nos arts. 64 e 172, a aplica^ao dos fun dos das seguradoras.

30. Dc cntao para ca, sucederamcinco regulamentos, que trataram dessa aplica<jao ate a expedigao do Decreto-lei n' 2.063, de 7 de mar?o de 1940, que regulou, sob novos moldes, as opera?6es de seguros privados e sua fiscaliza^ao.

31. Mas, ate a publica^ao do Decrcto-Iei n** 73, de 21 dc novembro de 1966, a apIica?ao de fundos ficava, praticamente, restrita a depositos em bancos, titulos da divide publica interna, federal, estadual ou do Distrito Fe deral, a?oes integralizadas, emitidas por Sociedades ou bancos com sede no Brasil, emprestimos sob cau^ao dos aludidos titulos, imoveis urbanos situados no Distrito Federal e nas Capitals ou principais cidades dos Estados e hipo tecas sobre esses imoveis.

32. O Decreto-lei n' 73, ja citado, veio permitir se ampliasse esse campo

de aplicagao, respeitados os crlt^ios garantidores de remuneragao adequada, seguranga e liqiiidez, conforme as diretrizes do Conselho Monetario Nacio nal.

A escolha dos valores que satisfazem esses criterios esta, sem duvida, vinculada a maior ou menor utilidade economica e social de cada aplica^ao. Entretanto, a seguran?a e fundamental e tern primazia sobre os outros crite rios.

33. A remuneracao adequada, e cbviamcnte, esscncial, porque nao se justificam aplicagoes que nao produzam, em media, a taxa de juros efetiva, adotada nos pianos de seguros. A liqiii dez resulta, dc uma parte, da seguranga e do rendimento, que permitem rapida mobilizagao dos fundos, e, de outra, do escalonamento das receitas dc premios e de aplicagoes. em consonancia com as exigibilidades.

34. Indubitavelmente, as condisoes de utilidade economica e social sao muito importantes, mas devem ficar subordinadas a seguran?a, ao rendi mento e a liquidez. Se a seguranga e primordial e deve ser garantida. ate em detrimento do rendimento, da liquidez ou da utilidade, quer economica, quet social, deve-se procurar, quanto a este ultimo criterio, a importancia relativa das aplica?oes, em face da politica financeira do Pais.

35. A seguran^a pode ser formal ou real: formal, quando parece estar, em principio, garantida, se o credor e uma autoridade publica, dotada de perenidadc c de condi?oes que Ihe permitam retirar dos contribuintes os meios indispcnsaveis a satisfa^ao dos com promissos assumidos; real, quando mantem o valor, em poder aquisitivo, do capital e dos juros. A seguran?a for mal tende a esvanecer-se, quando surge a desvaloriza^ao da moeda. Dai, a neccssidade de se procurar a seguranga real.

36. A remuncra^ao adequada impoe cuidadosa sele^ao das aplicaqoes, compensando as que nao podem garantir rendimento alto com as que possuem todos OS caracteristicos capazes de garanti-lo, de modo que a taxa media de

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juros nao fique inferior a taxa adotada nos pianos, pena de desequilibra-los financeiramente. A liquidez assume importancia fundamental nos seguros de reduzido prazo de vigencia.

37. A tendencia inoderna da politica inversionista e prescrvar, alera das garantias de seguranqa, liquidez e rentabilidade, maior utilidadc social. O Estado tem, na verdade, necessidade sempre crescente de dinheiro, e nao e ^-possivel irapedir rccorra as instituisoes que.acumulam grandes capitals para solicita-Ios em forma de empr^timos, dando em troca titulos ou obriga^oes, para resgate a prazos mais ou menos longos.

38. De igual mode, as aplicagoes das reservas desempenham importante papel no desenvolvimento do Pais, concorrendo nao so para aumentar os rccursos naturais e a produgao complementar de cada regiao, mas tambem para ampliar os meios de transportes em todo o territorio nacional, alem de assegurar melhor distribui^ao dos investimentos imobiliarios.

39. Dando cumprimento ao art. 28 do mencionado Decreto-lei n"? 73, fixou o Conselho Monetario Nacional as diversas modalidades de aplica^ao dos fundos das entidades seguradoras privadas, subordinadas aos seguintes itens:

a) obriga$oes reajustaveis do Tesouro Nacional, ou Letcas do Tesouro Nacional;

b) depositos em bancos comcrciais ou de investimentos, ou em Caixas Econdmicas;

c) a^oes, ou debentures conversiveis em a?5es, de sociedades de capital aberto, negociaveis em Bolsas de Valores c cuja cota^ao, nos liltimos tres anos, nao tenha sido inferior a 70% do valor nominal;

d) imoveis urbanos, nao residcnciais, situados no Distrlto Federal e nas Capitals ou principals cidades dos Estados e Territorios;

e) emprestimos com garantia hipotecaria sobre os imoveis ha pouco citados, at6 o maximo de 80% do respec tive valor;

/) direitos resultantes de contratos' de promessa de compra e venda dos imoveis urbanos, nao residenciais, si tuados no Distrito Federal e nas Capi tals e principals cidades brasileiras:

g) participa(;ao em operagoes de financiamento, com corregao monetaria, realizadas pelo Banco Nacional do De senvolvimento Economico.

dO. fisse piano, tornado piiblico pela Resoluqao n» 92, de 1' de julho de 1968, do Banco Central do Brasil, preserva, perfeitamente, a seguranga, a li quidez e a rentabilidade do emprego decapital. Permite, outrossim, aplica^oes de carater financeiro e economico, de grande importancia para o desenvolvi mento do Pais.

41. Do ponto-de-vista economico, o patrimonio das sociedades constitui um todo; e os bens que o formam confundem-se numa massa tinica que responde integralmente pela pagamento das dividas sociais.

42. Motivos de ordem publica induziram, porem, o legislador a criar ga rantias em beneficio de certos credores. Assim e que os credores por indeniza^oes de seguros gozam de condi^ao es pecial em relagao aos bens constitutivos das reservas tecnicas, o que Ihes assegura o direito de serem pagos de seus creditos pelo produto dos bens oferecidos em garantia.

43. Dado, pois, que os bens garantidores das reservas tecnicas se destinam h liquida^ao dos creditos dos segurados e beneficiarios do seguro, a lei declara que eles nao podem ser alienados ou onerados, nem servir a quaisquer outros fins que nao aqueles.

V — O DIREITO

44. Aqui chegamos ao ponto nodal' de nossa palestra.

45. A materia vem sendo objeto de controversias, pois enquanto alguns equiparam aquelas reservas a direitosreais de garantia (hipoteca, cau?ao, penhor, etc.), outros vao ao extremo deentender que a vinculagao referida importa a perda, embora temporaria,, da

^ropriedade oferecida em garantia das reservas tecnicas.

46. Nao se trata de ius nouum. pois o Decreto-lei n' 2.063, de 7 de margo de 1940, que dedicava toda uma sub-segao as reservas de garantia dispunha:

«Art.66 — Os bens garantidorcs das reservas tecnicas nao poderao ser alienados ou onerados, nem servir a quais•quer outros fins que nao os previstos no presente Decreto-lei e serao inscritos no Departamento Nacional de Se guros Privados e Capitaliza^ao, de acordo com instrugoes por este expedidas.

Paragrafo unico. Os bens de que trata este artigo nao poderao ser movimentados sem previa autoriza^ao do Departamento Nacional de Seguros Privados e CapitaIiza?ao, conforme instru?6es e por este expedidas».

O Decreto-lei n"? 73/66, no art. 84, alude a «reservas tecnicas, fundos especiais e provisoes, de conformidade com OS criterios fixados pelo Conselho Nacional de Seguros Privados, alem das reservas e fundos determinados em leis especiais.»

No regime anterior, referia-sc Amilcar Santos (Seguro, 1959, pags. 82 e seguintes) a extrema variedade das re servas legais e estatutarias, mencionando-as minudentemente.

E igual e o regime juridico dos bens garantidorcs de todas essas reservas, fundos c provisoes, como se vc do art. 85 e seu paragrafo unico daquele Decreto-lei.

As reservas tecnicas, cm seu verdadeiro sentido, nao constituem propriamcnte provisao. Ainda no dizer de Amilcar Santos (livro citado, pags. 85 e 86), formam parte integrante e indispensavel do mecanismo do seguro. Alias, Miranda Valvcrde ja havia assinalado a diferen^a entre reservas ou fundos de reserva e provisao ou fundos de previsao, neste passo: «Tambem aos fundos ou contas de reserva nao devem ser equiparados os fundos de previsao*, destinados a ampatar situagoes indecisas ou pendentes, gue

passam de um exerdcto pana oufro. Os fundos de rcserua tem um carater permanente: os fundos de «preuisao*, um carater temporario» (grifo nosso Sociedade por A^oes, Vol. II, paginas 90/91).

Constituem as reservas «garantia especial dos portadores de ap6liccs em vigor*.

Ai, esta, a nosso ver, desvelada a natureza juridica da reserva tecnica, o que, no caso, torna a vinculagao assemelhavel a um direito real de garantia.

Por sua pr6pria natureza e finalidade, o contrato de seguro exige um re gime especial de seguranga e garantia.

Dai a imposi^ao das reservas tecnicas com a seguran^a de bens, o que as afasta das garantias pessoais ou fidejussorias e as aproxima das garantias reais.

Nao se trata de privilegio, inadmissivel entre os direitos reais de garantia, em face do art. 755 do C6digo Civil, mas de garantia real, armada de prelagao, uma de suas caracterlsticas mais conspicuas.

Podemos dizer, em linguagem matematica, que a reserva tecnica tende para a garantia real e isso esta assinalado claramente no act. 85 e seu para grafo unico do Decreto-lei n' 73/66.

A s6 Jeitura dos preceitos ali contidos poe de manifesto que as reservas tec nicas parcnteiara com os direitos reais de garantia.

Ademais, ainda que oferecwse dificuldades a verdadeira qualificasao ju ridica das reservas, o principal seria a identifica^ao dos efeitos da instituicao. como, a outro proposito, observou Escara (Principios de Direito Comercial, tomo IV, n' 715):

«0 essencial aqui e menos procurar uma e.xplica?ao juridica inatacavel do que uma justifica^ao dos efeitos que se concorda em reconhccer na institui^ao*.

Nao nos parece. pois, heterodoxo comparar as reservas tcnicas aos direi tos reais de garantia. —

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O que se nos antolha injuridico e sustentar que ela importa a pcrda temporaria da propriedade.

Como nao produz a reserva tecnica a trunsferincia da propriedade ao titu lar da garantia — e ninguem tera a ousadia de sustentar o contrario — ficaria o direito de propriedade sem sujeiio, incivilidade, data venia, insustentav^. X

Apesar de certas discussoes academicas,.em todo direito, observa Eduardo Espinola, aparece, como elemento mcessicio, um sujeito, o que tern o poder de exerce-lo.

£ impossivel fazer desaparecer a nogao de sujeito na da propria relagao juridica, como pretende Binder, pois o direito supoe seres era relagao, e um deles e exataraente o sujeito, enquanto o outro ou outros ficara adstritos ao cumprimento ou respeito do direito que ao primeiro pertence (v. Vicente Rao, O Dir. e a Vida dos Direitos, vol. 2', n? 56, pag. HI). Veja-se, mais, Dabin (Direito Subjetivo, pags. 109 e 110), e Rao (livro citado), que refuta as variantes da teoria do sujeito-vontade, para concluir:

«.. para nos, e a pessoa a unidade natural e inscindivel de corpo e alma, reconhecida e nao criada pelo direito, como sujeito ou titular de direitos e de deveres. E se, de um lado, nao admitimos possa o homem ser, ao mesmo tempo, sujeito e objeto de direitos s6bre si mesmo, ou sobre a pessoa de outrem, de outro lado cumpre-nos observar que a configuragao do sujeito atrav^s da ideia de liberdade equivale, cm ultima analise, a um conceito extremado de subjetivismo, ou, se assim se preferir, a.uma exaltaglo do eleraento vontade na atividade juridica da

pessoa, regrcdindo-se, destarte, a veIha, primitiva e abandonada doutrina que na vontade ve a linica forga criadora da vida juridica das pessoass.

Na relacSo juridica, forgoso e, pois. que se apresente um titular. Como disse Ferrara (Tratt., I, n" 94, pag. 440), «pois que o direito e autoridade, e necessario antes de tudo que tenha um sujeito ao qual o direito Ihe pertenga, um titular investido do dominio juridico».

Seja-nos licito, ainda, invocar, nestc passo, o_ magisterio de Coviello (Manuale, § 43, pagina 143):

«A existencia de uma pessoa como sujeito e elemcnto necessario para a existencia de um direi to. Se o direito e forga, e poder, nao pode prescindir de um sujei to ativo. Entao nao se da direito sem um sujeito, somente pode darse um direito de cujo sujeito. temporariamente, se ignora a existen cia, como no caso da heranga jacente; — mas, entao, nao e que o direito seja pdvado de sujeito. mas o sujeito e futuro em vez de ser presente (dominum non habet sed habere sperat): — existe um estado provisorio de siispensao da eficacia ativa do direito. enquanto continua a sua eficacia passiva, isto e, o estado de submissao de uma coisa ou de uma pessoa, para que a utilidade que forma o conteudo (disso) nao venha ser dcstruida, mas venha ser conservada em favor do futuro titulars.

Assim, a se aceitar, no caso, o con ceito de perda temporaria da proprie dade, ficaria esta sem titular, o que e, evidentemente, inadmissivel.

Nos direitos reais de garantia nao se da a transferencia da coisa, que, ape-

nas, se torna sujeita, em vinculagao real, ao cumprimento da obrigagao. Se se trata de vlnculo em coisa alheia (veja-se Lacerda de Almeida, Coisas, Vol. II,— pags. 84/85), e evidente nao se tornar compativel com a trans ferencia dessa coisa.

O linico direito de garantia que, no direito romano antigo, comportava a transmissao, era a fiducia. Nesta, como esclarece Girard (Manuel Slementaire de Droit Remain, 6" ed., pag. 779), o devedor transmitia ao credor a pro priedade da coisa que seria restituida quando solvido o debito.

A fiducia, entretanto, nao logrou sobrevlvencia completa no direito moderno, e seria inteiramente ocioso demonstrar que a figura juridica versada nao Ihe guarda os tragos e as caracteristicas.

No caso, nao ocorre, absolutamentc, perda, ainda que temporaria, da pro priedade, senao, apenas, suspensao do exercicio do ius disponendi.

VI — CONCLUSAO

Na pauta o assunto, depois de esforgos de interpretagao e analise, conjugados num «bouquet» de cmogSes juridicas e cspeculagoes tecnicas, acreditamos ter colaborado, modestamente, para o esclarecimento de pontos porventura obscures ou polemicos, e gostariamos de aqui observar que nao basta tornar real a imagem do seguro. fi precise, sobretudo, buscar meios e modos de fazer com que o seguro fortalega, individual e coletivamente,o sentimento de sacrificio e rcsponsabilidade.

Como quer que seja, o seguro ja e, hoje, uma instituigao lastreada cm simbolos de elevada consistencia.

Louve-se, pois, esta VI Conferencia Brasileira de Seguros Privados, cujas

teses darao nova dimensao a politica de seguros e ensejarao outros simpdsios com equacionamento de problemas em que todos — Governo, seguradores e segurados — so terao a lucrar, coIhendo resultados que se traduzirao em valiosas mensagens de incentive e de realizagoes para o progresso de nosso Pais.

E louve-sc, tambem, de mode muito especial, o extraordinario empenho dos organizadorcs deste conclave, ondc, entreaberta, ja, a primeira messe de frutos de uma jornada que se inicia auspiciosamentc, pode ser ouvido o eco de suas calorosas pregagoes, a sombra serapre acolhcdora da hospitalidade da gente paranaense, essa brava gente que deriva de pioneiros e poetas.

Vossas portas se abriram, de par em par, como as do vosso coragao. Esqueccstes per instantes a febre de desenvolvimento que vos acomete, para olhardes por um conclave de cujo seio certamente surgirao medidas uteis e necessarias a coletividade brasileira!

Curitiba ^ uma flor despetalada em homenagen^ a seus visitantes. Antes de ser uma cidade feita para os triunfos da tecnica e da maquina, e centro de cultura c pensamcnto, e colheita de juventude e fe nos destinos da Pdtria admiravel, que acolhe e faz seus todos OS homens do mundol

Renovamos aos curitibanos os agradecimentos de todos os que aqui vieram, a prestigiar este simposio, honrando os forais de sensibilidade dos habitantes deste grande Estado!

E que a flama e o civismo dcsta encantadora «Cidadc Sorriso* possam iluminat, pelos tempos que se atropelarao na distancia, a estrada imensa pela qual 0 Brasil rumar^ para os seus mais Iiicidos e grandiosos destinos!

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