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Revista Editada pelo CORECON/DF e SINDECON/DF - ANO I1 - nº 09 - JAN/MAR DE 2002

EDITORIAL .............................................................................................................................................. 4

ENTREVISTA ALDO LUIZ MENDES ...................................................................................................... 5

ARTIGOS IRMA CAVALCANTE SÁTIRO KARLA DE LIMA ROCHA MARIA DA GRAÇA OHANA PINTO MÍRIAM F. S. CHAVES FERREIRA VALÉRIA MARIA RODRIGUES FECHINE A mulher trabalhadora no palco: Os bastidores do mercado de trabalho do Distrito Federal ................................................ 9

LUCIANO FAZIO Da proposta de alteração da poupança ............................................................................. 34

JOSÉ ROBERTO NOVAES DE ALMEIDA Por uma Política Anti-Preconceito .................................................................................... 44

REINALDO GONÇALVES Índice de Desempenho Presidencial: cem anos de economia brasileira ........................... 47

CECI VIEIRA JURUÁ James Tobin: Prêmio Nobel de Economia 1981 ................................................................ 57

Revista de conjuntura

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EXPEDIENTE

EDITORIAL

Órgão Oficial do CORECON-DF e SINDECON-DF Diretor Responsável: Roberto Bocaccio Piscitelli Conselho Editorial: Roberto Bocaccio Piscitelli, Carlito Roberto Zanetti, Dércio Garcia Munhoz, José Luiz Pagnussat, e Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo. Jornalista Responsável: Alessandra Cardoso - Reg. 4389 Editoração Eletrônica: OM Comunicação/Jornalismo (0xx61) 425-1090 Tiragem: 4000 Periodicidade: Trimestral As matérias assinadas não refletem, necessariamente, a posição das entidades. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte. CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO – DF Presidente: Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Vice-Presidente: Roberto Bocaccio Piscitelli Conselheiros Efetivos: Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo, Roberto Bocaccio Piscitelli, Newton Ferreira da Silva Marques, Mônica Beraldo Fabrício da Silva, José Luiz Pagnussat, Maria Cristina de Araújo, Humberto Vendelino Richter, André Luiz Ferro de Oliveira e Irma Cavalcante Sátiro. Conselheiros Suplentes: Maurício Barata de Paula Pinto, Bento de Matos Félix, Max Leno de Almeida, Jusçanio Umbelino de Souza, José Ribeiro Machado Neto, Francisco das Chagas Pereira, Ronalde Silva Lins, Miguel Rendy e Iliana Alves Canoff. Equipe do CORECON: Iraídes Godinho de Sales Ribeiro, Ismar Marques Teixeira, Michele Cantuária Soares, Jamildo Cezário Gomes e Angeilton Francisco Lima Faleiro. End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 – Brasília –DF Tels: (061) 223-1429 / 223-0919 / 225-9242 e 226-1219 Fax: (061) 322-1176 E-mail: corecondf@corecondf.org.br Site: www.cofecondf.org.br Horário de Funcionamento: das 8:00 as 18:45 horas (sem intervalo) SINDICATO DOS ECONOMISTAS DO DF End: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 203 CEP 70300-907 – Brasília –DF Tel.: (061) 225-5482 Fax: (061) 322-1176 E-mail: sindecon-df@fenecon.org.br Site: www.fenecon.org.br Horário de Funcionamento: das 8:00 as 18:00 horas Diretoria Efetiva: Presidente: Iliana Alves Canoff 1º Vice-Presidente: Vago 2º Vice-Presidente: Otávio de Carvalho Franco Secretário: José Nilson Gomes de Souza Tesoureiro: Gilberto Gatti Suplentes da Diretoria: Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Eugênio de Oliveira Fraga Marcos Cardoso Bularmarqui Victor José Hohl José Honório Accarini Conselho Fiscal: Miguel Rendy Maria Cristina de Araújo Luiz Guaraci David Suplentes do Conselho Fiscal: Marcus Vinicíus da Costa Villarim Humberto Vendelino Richter Geraldo Andrade da Silva Delegado Represent. Junto à Federação Roberto Bocaccio Piscitelli Delegados Suplentes: Mônica Beraldo Fabrício da Silva Irma Cavalcante Sátiro

O CORECON e o SINDECON, sintonizados com as dúvidas e questionamentos decorrentes da introdução do Sistema de Pagamentos Brasileiro, convidaram o Dr. Aldo Luiz Mendes, Diretor de Finanças do Banco do Brasil e ex-Presidente do CORECON, para oferecer uma visão dessas modificações. Ele é o nosso entrevistado, e também participou de um debate realizado em parceria com a Associação Comercial do Distrito Federal, que será objeto de matéria a ser divulgada na próxima edição do Jornal dos Economistas. Sobre o assunto há ainda muitas controvérsias sobre os custos que as empresas suportariam com as mudanças e os possíveis impactos em relação às tarifas. Continuaremos a discussão. Cinco técnicas da PED-DF nos brindam com um alentado estudo sobre a situação da mulher trabalhadora. Ela vai deixando de ser coadjuvante, ainda que não receba o mesmo tratamento dos homens. A elevação da taxa de desemprego no Distrito Federal, particularmente a dos chefes de família, desencadeou um processo de procura por trabalho que, paradoxalmente, vem aumentando o desemprego. Na década de 90, a melhoria na distribuição dos rendimentos do trabalho não se deu por um aumento de renda dos pobres, e sim em virtude de uma perda menos acentuada que a das faixas mais altas de rendimentos. O salário mínimo, ao final de 1.999, tinha poder aquisitivo próximo de ¼ do que possuía à época de sua instituição, em julho de 1.940. Luciano Fazio, técnico do DIEESE demonstra com propriedade o engodo de que pode revestir-se a proposta de modificação nas regras da caderneta de poupança: seus rendimentos seriam aumentados, não estariam mais isentos e os mutuários dos financiamentos para aquisição da casa própria poderiam deduzir os juros pagos nas prestações. Apenas uma minoria de mutuários se beneficiaria da dedução (que existiu durante muito tempo), mas o alívio não compensaria o aumento dos juros devidos. Mais uma vez a União seria a grande beneficiária, com o aumento líquido da arrecadação. Evidenciando a preocupação que nossas entidades manifestam no que concerne à redução das desigualdades e da discriminação, o Prof. José Roberto Novaes de Almeida escreve um novo instigante artigo. Apoiando-se numa pesquisa realizada por Twine, chama a atenção para o fato de que a definição brasileira de racismo é limitada, já que considera apenas práticas de exclusão nas áreas social e sexual, e não as disparidades nas áreas sócio-econômica, semiótica, educacional e política. O Prof. Reinaldo Gonçalves, do Conselho Federal de Economia, desenvolve o estudo de um índice de desempenho presidencial. Conclui que o desenvolvimento econômico de longo prazo depende, em medida não-desprezível, de uma herança, que pode ser generosa e trágica. Os leitores poderão verificar os critério que foram utilizados para essa análise, bem como as “notas” dos presidentes destes 100 anos de História Republicana. Finalmente, não poderíamos deixar de fazer um registro – e uma homenagem póstuma – ao Prêmio Nobel de Economia de 1.981, James Tobin. Ele ficou mais conhecido pela chamada “taxa Tobin”, que seria cobrada sobre as transações nos mercados de câmbio. Esse tributo, além de seu caráter regulatório, de desestímulo às transações de natureza essencialmente especulativo, contribuiria para a formação de um grande fundo mundial de ajuda aos países periféricos, asfixiados por uma dívida externa crescente, impagável e seriamente questionável. Isto é um pouco do que gostaríamos de oferecer à reflexão e como contribuição aos nossos associados e demais demais leitores. Revista de conjuntura

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ENTREVISTA

Novo Sistema de Pagamentos Brasileiro Entrevista: Alessandra Cardoso Colaboração: Newton Marques

A partir de abril, o Brasil passará por uma mudança profunda em seu sistema financeiro, com a implantação do novo Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB). A novidade pode reduzir o risco de o correntista surpreender-se com quebras de bancos. Com o SPB, todo o Sistema Financeiro Nacional estará, eletronicamente, sob a vista permanente do Banco Central. A mudança principal do SPB será a criação de um sistema eletrônico de transferência de recursos em tempo real. As instituições financeiras deverão operar com caixa positivo no BC durante todo o dia, diferentemente do modo atual, em que depósitos e retiradas são efetuados apenas ao fim do período. De acordo com o Diretor de Finanças do Banco do Brasil,

Aldo Luiz Mendes, o novo Sistema visa trazer mais segurança ao Sistema Financeiro Nacional. “O novo sistema será muito melhor e mais seguro para o País como um todo, porque acaba a possibilidade de um banco falir e deixar uma

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conta enorme a ser paga pelo Banco Central e pelo contribuinte”, afirma Aldo. Em entrevista à Revista de Conjuntura, o diretor do BB explica o que é o novo Sistema e seu impacto sobre os bancos, as empresas e os consumidores.

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Conjuntura - O que é o SPB? Aldo - É um novo sistema, que vai permitir que as operações entre bancos e Banco Central se tornem on line. Na comparação com a pessoa física, é

“Nenhum banco vai poder sacar a descoberto contra sua conta no BC. O governo se torna então imune ao risco de uma falência bancária”.

como se fosse a passagem do cheque para os cartões magnéticos, por meio dos quais você pode movimentar sua conta corrente em tempo real sem a necessidade de emitir cheques, que vão para compensação. Com o novo Sistema de Pagamentos, os bancos, em sua relação entre eles e o Banco Central, vão estar realizando transferências de recursos instantaneamente, sem precisar fazer a compensação desses valores no dia seguinte. Conjuntura - Qual será o principal impacto desta mudança na forma de pagamento entre os bancos? Aldo - O impacto se dá em vários níveis. Em nível macro, o novo sistema será muito melhor e mais seguro para o País como um todo, porque acaba com a possibilidade de um banco falir e deixar uma conta enorme a ser paga pelo Banco Central. Até agora, se um banco entrar em default, os pagamentos que ele tenha para fazer no dia e não puder honrar, por insuficiência de caixa, serão honrados pelo BC. Como o foram no passado recente. O próprio BC estima que, nos últimos dez ou doze anos, gastou algo em torno de R$ 12 bilhões com essa conta. Isto deixará de existir. Nenhum banco vai poder sacar a descoberto contra sua conta no BC. O governo se torna então imune ao risco de uma falência bancária. Em nível micro, para as pessoas e para as empresas, também haverá a facilidade de fazer transferências de recursos imediatamente. Uma empresa que movimenta uma grande quantidade de recursos, ao longo do dia, não precisará ficar emitindo cheques e esperar que estes cheques sejam

compensados. Tanto nos pagamentos que ela tem a fazer, como nos que tem a receber, não precisará esperar o dia seguinte. A transferência de recursos poderá ser feita imediatamente. E para o cidadão comum também será benéfico, pois a pessoa que vende um carro ou uma casa também não precisará receber um cheque: poderá receber o dinheiro diretamente em sua conta bancária, sem risco. Então, a meu ver, facilita a vida de todos: governo, empresas e pessoas. Conjuntura - Haverá mais alguma vantagem para a população como um todo? Aldo - As grandes vantagens são essas que acabei de citar. Enquanto contribuinte, o cidadão estará muito mais seguro, porque uma falência bancária não será mais paga pelos impostos. Enquanto consumidores, terão um sistema mais ágil e mais seguro de transferência de recursos, tanto para pagamentos como para recebimentos. Conjuntura - Em relação aos custos do SPB, quem vai arcar com a conta? Aldo - Hoje existe um custo enorme, que é arcado pelo sistema bancário, para fazer as alterações tecnológicas necessárias. A tendência é de que para o consumidor tudo permaneça como está. Ele não deve pagar mais para ter um serviço melhor. Hoje já se paga uma tarifa para transferências de recursos que vão acontecer no dia seguinte. Quando o Sistema entrar em funcionamento, a tarifa deverá ser a mesma, porém será oferecido um serviço muito melhor. Então, acho que, no frigir dos ovos, é vantajoso também para o consumidor, que

“O SPB está voltado para6 a melhoria dos serviços Revista de conjuntura

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“Ele acaba com a possibilidade, que existia antes, de bancos quebrarem e gerarem um rombo enorme a ser coberto pelos cofres do Tesouro e pelo contribuinte, em última análise”. não pagará mais por um serviço mais rápido e seguro. Conjuntura - O senhor acha que procedem as críticas de que o País tem um sistema bancário de Primeiro Mundo, mas que não atende aos interesses da maioria da população? Aldo - Olha, que o sistema bancário brasileiro é de Primeiro Mundo, não resta dúvida. Agora, dizer que não atende ao interesse da maioria da população é uma avaliação difícil, porque a maioria da população está hoje, infelizmente, com um nível de renda tão baixo que, para esse segmento, não ter um banco prestador de serviços não faz diferença. Uma outra discussão é se o acesso ao crédito deveria seguir um modelo mais voltado para o interesse social, como, por exemplo, a implantação do micro crédito e outras ações de cunho governamental. O SPB está voltado para a melhoria dos serviços bancários e não para o crédito propriamente dito.

Aldo - Mais uma vez, é preciso separarmos crédito e serviços bancários em geral. A questão do acesso ao crédito tem uma lógica, serviço bancário tem outra. São duas coisas distintas que não devem ser misturadas. É bom ter sempre em mente que o Sistema de Pagamentos Brasileiro é um avanço muito grande. Ele acaba com a possibilidade, que existia antes, de bancos quebrarem e gerarem um rombo enorme a ser coberto pelos cofres do Tesouro e pelo contribuinte, em última análise. O SPB não deve ser encarado apenas como um facilitador de pagamentos para as pessoas e empresas. Isso é uma mera conseqüência. O motivo principal do SPB é evitar que bancos possam sacar a descoberto em sua reserva bancária. Por outro lado, o acesso ao crédito independe da existência ou não de um SPB; depende, antes de mais nada, de uma política voltada para encontrar formas de ampliação, democratização e, sobretudo, barateamento do crédito.

Conjuntura - Não é contraditório ter grande parte dos setores da economia sem acesso ao crédito bancário e, ao mesmo tempo, ter um novo SPB funcionando?

Conjuntura - Qual o papel do Banco Central no funcionamento do novo Sistema? Aldo - O papel do BC é crucial. Foi ele que engendrou,

que idealizou o Sistema, e é ele o responsável por garantir que os bancos cumpram o que tem de ser feito. O BC tem o papel que lhe cabe: fazer com que os bancos estejam efetivamente preparados para se adequarem às novas regras e, ao mesmo tempo, garantir, no momento delicado da transição do velho para o novo sistema, a liquidez necessária às instituições financeiras. Conjuntura - Existe alguma outra alternativa para o SPB? Aldo - A alternativa é o que existe hoje, que é muito pior, um sistema em que os bancos têm, junto ao BC, uma linha de crédito ilimitada e sem o aporte de garantias, o que significa que qualquer banco, em tese, pode emitir “cheques sem fundos”. Na alternativa anterior, qualquer banco poderia fazer pagamentos ao longo do dia sem um acompanhamento. Então, por hipótese, um determinado banco poderia gastar muito, sem receber um centavo, gerando, no final do dia, uma conta negativa. É como se você emitisse um cheque sem fundos e, na hora da compensação, ele fosse devolvido. Quem fica com o prejuízo? Quem recebeu o cheque, é claro.

??????????????????????????????????????????????????.” bancários e não para o crédito propriamente dito”. 7 Revista de conjuntura

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“A alternativa ao novo SPB é a que existe hoje, com um risco enorme para o Tesouro, para Nação e para o BC”. Daqui para a frente, haverá um monitoramento on line de cada centavo que cada banco tem no BC. A alternativa ao novo SPB é a que existe hoje, com um risco enorme para o Tesouro, para Nação e para o BC. Conjuntura - A Fiesp informou recentemente, em jornais, que o custo da implantação deste SPB será repassado aos preços, e que a indústria perderá em torno de R$ 1,3 bilhão a cada mês. Até que ponto isto é prejudicial, ou não, para os consumidores e para a economia em geral? Aldo - Acho que esse cálculo de R$ 1,3 bi tem de ser melhor demonstrado. Não acredito nisso e não vejo como as indústrias vão ter custos e serem impactadas negativamente com o SPB. Os bancos, sim, estão tendo custos,

• • • • • • • • • • •

principalmente na área tecnológica. E estes custos não serão recuperados, pois não haverá aumento de tarifas. Quando o primeiro banco anunciou o seu preço, já veio um segundo, e um terceiro, dizendo que vão fazer mais barato. Então, haverá uma competição entre bancos, que tende a manter a tarifa igual à atual ou mais barata. As empresas, no entanto, não terão acréscimos de custo. Por isso, eu acho que esse número da Fiesp deve ser repensado. Se as empresas vão poder controlar seu caixa de forma mais eficiente, elas poderão tirar proveito financeiro disto. Se eu tinha um recurso que só entraria amanhã e entrou hoje, eu vou ganhar um dia de aplicação. Então, na verdade, as empresas terão um ganho com o novo Sistema, e não uma perda. Elas terão uma admi-

nistração de caixa mais eficiente, e isso poderá refletir-se até em preços mais baixos. Conjuntura - O SPB é uma exigência Sistema Bancário Internacional? Aldo - Não. Acho que não existe esse negócio. Existe uma recomendação do Banco de Compensações Internacionais, que tem uma visão de administração de riscos, e que sugere requerimentos mínimos de capitais para os bancos operarem. É uma espécie de Banco Central mundial. Ele não é uma instituição financeira e não é Sistema Financeiro Internacional. Eles fazem sempre recomendações em nível prudencial, e esta é mais uma recomendação nessa linha, que o Banco Central resolveu seguir. Na minha opinião, acertadamente.

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A R T I G O

A

MULHER

TRABALHADORA

NO

PALCO

Os bastidores do mercado de trabalho do Distrito Federal

“Os homens perderam e as mulheres ainda não ganharam”. Domenico De Masi

Irma Cavalcante Sátiro* Karla de Lima Rocha** Maria da Graça Ohana Pinto*** Míriam F. S. Chaves Ferreira**** Valéria Maria Rodrigues Fechine***** Introdução As mulheres trabalhadoras estão no palco e, aparentemente, em posição privilegiada. Ao se colocar os holofotes deste grande cenário real sobre as mulheres, pode-se concluir que o mercado de trabalho foi favorável ao sexo feminino? O presente artigo pretende mostrar os bastidores desse desempenho, entre 1992 e 20011 , e apontar, sem necessariamente ter a pretensão de desvendar, os principais elementos que conduziram as mulheres a essa posição de destaque: o seu

crescimento ocupacional. Algumas perguntas são inevitáveis: quais os motivos que as colocaram em realce? O que aconteceu com os homens? Por que passaram a dividir os papéis principais com as coadjuvantes ? A importância dos papéis muda de acordo com o cenário ? Na tentativa de responder às perguntas, descortinando as diferenças existentes entre homens e mulheres no mercado de trabalho, sempre que possível, as informações coletadas pela Pesquisa de Emprego e Desemprego do Distrito Federal (PED-DF)2 ,

serão desagregadas por Grupos de Regiões Administrativas3 , estratificados segundo a renda média de cada um. Assim, o Grupo de renda mais alta é o que possui a menor taxa de desemprego total do Distrito Federal. A renda média real dos ocupados, nesse Grupo, é quatro vezes maior que a do Grupo de renda média real mais baixa, que é detentor da mais alta taxa de desemprego do Distrito Federal. No Grupo de renda intermediária, a população ocupada recebe praticamente a metade do que recebem os ocupados do Grupo

1 Médias Anuais 2 A PED-DF é uma pesquisa domiciliar mensal, implantada em dezembro de 1991, realizada em parceria com o DIEESE, Fundação Seade de São Paulo e Secretaria de Trabalho e Direitos Humanos do Governo do Distrito Federal, em uma amostra de aproximadamente 2.500 domicílios, desde dezembro de 1991, distribuídos nas áreas urbanas das atuais 19 Regiões Administrativas do Distrito Federal. A metodologia da PED foi criada pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos (DIEESE), órgão criado e financiado pelo movimento sindical brasileiro, e Fundação SEADE, pertencente à Secretaria de Planejamento do Governo do Estado de São Paulo. A coleta de dados é feita por uma equipe de entrevistadores treinados por especialistas nessa metodologia ,utilizando um questionário padronizado para as cinco Regiões Metropolitanas (São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador e Recife) onde essa pesquisa é executada em convênio com os governos estaduais. As entrevistas são feitas com todos os moradores do domicílio que possuem 10 anos ou mais de idade, sendo estes os informantes da pesquisa, e não os estabelecimentos onde trabalham 3 Grupo de Regiões Administrativas de renda mais alta (Brasília, Lago Sul e Lago Norte); Grupo de Regiões Administrativas de renda intermediária (Gama, Taguatinga, Sobradinho, Planaltina, Núcleo Bandeirante, Guará, Cruzeiro, Candangolândia e Riacho Fundo); Grupo de Regiões Administrativas de renda mais baixa (Brazlândia, Ceilândia, Samambaia, Paranoá, São Sebastião, Santa Maria e Recanto das Emas).

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de renda mais alta e o dobro do que recebem os ocupados do Grupo de renda mais baixa. A taxa de desemprego total do Grupo de renda intermediária é a que mais se aproxima da taxa de desemprego total do Distrito Federal, embora inferior. Nesses três cenários enfocarse-ão os postos de trabalho ocupados pelas mulheres, em que setores de atividade econômica foram mais beneficiadas pelo crescimento ocupacional, que remuneração recebem pelo trabalho que realizam, qual a qualidade dessas ocupações e em que Grupos foram mais atingidas pelo desemprego. Alguns elementos dessa narrativa podem ser adiantados. Ao contrário do que se supõe, a série histórica da PED-DF revela que o setor privado sempre empregou mais assalariados do que o setor público. Embora ambos tenham mostrado crescimento ocupacional entre 1992 e 2001,

fizeram-no em intensidade diferenciada, a ponto de a ampliação do setor privado ter sido mais de cinco vezes maior que a observada no setor público, cuja retração já foi objeto de análise em artigo anterior (OHANA & LENO, 2000). Acrescenta-se que, nesse período, ocorreu o aumento significativo de trabalhadores pagos pelo setor privado na Administração Pública. A especificidade do mercado de trabalho do Distrito Federal é que, tanto no setor privado quanto no setor público, esse aumento foi devido ao crescimento do número de mulheres que ocuparam os novos postos de trabalho, sendo que no setor público houve, inclusive, diminuição do contingente masculino ocupado. Do ponto de vista do trabalho formal, as melhores posições ocupadas pelas mulheres na estrutura ocupacional são as de assalariadas com carteira

ÍNDICE DE CRESCIMENTO DE PESSOAS ECONOMICAMENTE ATIVAS (PEA), POR SEXO - DF - MÉDIAS ANUAIS-1992 A 2001 Total

Homens

Mulheres

140 130 120 % 110 100 90 80

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

Fonte: PED-DF (Convênio STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

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de trabalho assinada no setor privado e de assalariadas no setor público. Todavia, nas duas situações as mulheres ganham menos que os homens, ainda que mantenham relações de trabalho que garantam seus direitos trabalhistas. Aumento do Ingresso das Mulheres no Mercado de Trabalho No Brasil, 41,4% da População Economicamente Ativa (PEA) é representado pelas mulheres, conforme mostra a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada pelo IBGE. Elas superaram os homens em escolaridade, ocupam cada vez mais postos de trabalho e, de forma crescente, vêm assumindo a chefia familiar (Boletim Especial DIEESE, março de 2002). De acordo com a PED-DF, o movimento do mercado de trabalho do Distrito Federal, entre 1992 e 2001, possibilitou a entrada de 168,1 mil pessoas na População Economicamente Ativa (54,9 mil eram homens e 113,2 mil mulheres). Do contingente masculino, 31,0 mil conseguiram trabalho (56,5%) e os 23,9 mil restantes não conseguiram (43,5%). Do contingente feminino, 69,8 mil conseguiram ocupação (61,7%) e 43,4 mil agregaram-se ao contingente de desempregados (38,3%). Verificou-se que a PEA feminina cresceu aproximadamente três vezes mais que a dos homens (34,1% e 13,2%, respectivamente), embora a PEA masculina seja, estruturalmente, maior que a feminina.


Estruturalmente, a taxa de participação feminina4 é inferior à taxa registrada para os homens. No entanto, entre 1992 e 2001, a referida taxa apresentou um crescimento significativo, enquanto a masculina apresentou decréscimo.

O crescimento de 13,7% dessa taxa de participação feminina, no período analisado, indica que 113,2 mil mulheres ingressaram no mercado de trabalho. Frente às demais regiões pesquisadas pela PED, esta taxa no Distrito Fede-

ral, em 2001 (56,6%) foi superior a todas as demais (54,8% em Salvador, 53,8% em São Paulo, 50,1% em Belo Horizonte, 49,6% em Porto Alegre e 44,1% em Recife) (Boletim Especial DIEESE, março de 2002).

1 - Estimativa da população economicamente ativa (PEA), ocupados, e taxa de participação-DF 1992/2001 (médias anuais) (em mil) INDICADORES

1992

2001

VARIAÇÃO (%)

PEA (TOTAL)

747,4

915,5

22,5

HOMENS

415,9

470,8

13,2

MULHERES

331,5

444,7

34,1

OCUPADOS (TOTAL)

631,2

732,0

16,0

HOMENS

358,9

389,9

8,6

MULHERES

272,3

342,1

25,6

DESEMPREGADOS (TOTAL)

116,2

183,5

57,9

HOMENS

57,0

80,9

41,9

MULHERES

59,2

102,6

73,3

TAXA DE PARTICIPAÇÃO (%)

60,0

63,0

5,0

HOMENS

71,6

70,5

-1,5

MULHERES

49,8

56,6

13,7

Fonte: PED-DF (Convênio STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

Desagregando os dados da PED-DF por Grupos de Regiões Administrativas, observou-se que, em 2001, o maior número de mulheres se concentrava no Grupo de renda intermediária (198,4 mil), correspondendo a 44,6% da PEA feminina do Distrito Federal. O aumento da participação feminina no mercado de trabalho pode ser explicado pelo crescente número de mulheres, tanto ocupadas quanto desempregadas,

que passaram a ocupar a posição de chefes de família (56,1 mil, em 1992 e 89,9 mil, em 2001), pelo ingresso de cônjuges e filhos para complementar a renda familiar, ou mesmo pela busca de sua realização profissional, ainda que esse último caso deva ocorrer mais freqüentemente, nos Grupos de Regiões Administrativas de renda intermediária e alta. A população do Distrito Federal é composta em sua grande maioria por imigrantes5 , donde

se deduz que os imigrantes na PEA continuam sendo maioria, mesmo tendo diminuído sua participação, entre 1992 e 2001 (de 79,7% para 67,9%). Essa diminuição ocorreu porque aumentou a participação na PEA das pessoas nascidas no DF, passando de 20,3%, em 1992, para 32,1%, em 2001. Do total da PEA feminina, em 1992, 81% era representado por mulheres imigrantes. Em 2001, a sua participação na PEA feminina diminuiu para

4 Taxa de Participação é o indicador que mede o ingresso das pessoas de 10 anos e mais no mercado de trabalho (PIA). 5 A PED considera imigrantes todas as pessoas não nascidas no DF.

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68,3%. No período de 1992 a 2001, as mulheres nascidas no Distrito Federal ampliaram sua participação no mercado de trabalho. Em 1992, elas constituíam apenas 19,0% da PEA feminina, aumentando para 31,7%, em 2001. O crescimento regis-

trado entre as mulheres nascidas no DF foi quase dez vezes maior (123,4%) do que o verificado para as imigrantes (13,1%), entre 1992 e 2001. A desagregação por Grupos de Regiões Administrativas revelou que entre 1992 e 2001, o contingente de

mulheres imigrantes na PEA cresceu tanto no Grupo de renda intermediária (5,8%), quanto no Grupo de renda mais baixa (34,6%). No Grupo de renda mais alta houve redução de 1,6% desse contingente, nesse mesmo período.

Estimativa do número de pessoas economicamente ativas (PEA), nascidas e não nascidas no DF Médias anuais - 1992 e 2001 1992

2001

141,0

Mulheres nascidas no DF 63,1

152,8

Homens nascidos no DF 88,7

303,7

Mulheres imigrantes 268,4

317,9

Homens imigrantes

327,2 0

50

100

150

200

250

300

350

Fonte: PED-DF (Convênio STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

Crescimento da População Ocupada e Aumento do Número de Trabalhadoras Ao constatar-se, na Tabela 1, que a população ocupada6 residente no Distrito Federal cresceu

16,0%, entre 1992 e 2001, estão sendo consideradas todas as posições da estrutura ocupacional, distribuídas em todos os setores de atividade econômica. Em 1992, 4,4% do total de ocupados estavam alocados na Indústria,

decrescendo para 3,5%, em 2001. Na Construção Civil, em 1992, havia 5,6% de ocupados, diminuindo para 3,8%, em 2001. No setor Serviços, encontravamse 52,4% do total de ocupados, em 1992, aumentando para

6 O contingente de ocupados pesquisados pela PED inclui os trabalhadores assalariados do setor privado (com e sem carteira de trabalho assinada), assalariados do setor público (estatutários e não estatutários) e os trabalhadores não assalariados. Nessa última categoria encontram-se os trabalhadores por conta- própria ou autônomos (que trabalham para uma empresa ou pessoa, para mais de uma empresa e para a população em geral), empregadores, profissionais universitários autônomos, donos de negócio familiar, empregados domésticos (mensalistas , diaristas e aqueles que só recebem em espécie ou benefício) e trabalhadores familiares sem remuneração.

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55,7%, em 2001, enquanto que o Comércio, em 1992, possuía 15,2% da população ocupada e 14,8% em 2001. Na Administração Pública, registrava-se 21,0%, em 1992, passando para 21,3%, em 2001. Ressalte-se que nesse setor o aumento do número de trabalhadores pagos pelo setor privado expandiu-se de 9,8 mil, em 1992, para 23,8 mil, em 2001 (crescimento relativo de 142,1%). Essa informação indica que a mão-de-obra terceirizada correspondia a 7,4% do total de ocupados nesse setor, em 1992, duplicando sua participação para 15,3%, em 2001. A ampliação de 631,2 mil ocupados para 732,0 mil representou um saldo positivo de 100,8 mil novas ocupações, no período de 1992 a 2001. Faz-se necessário esclarecer aqui o significado de saldo ocupacional , seja ele positivo ou negativo. Não raro as pessoas contabilizam apenas o número de postos de trabalho gerados em um determinado período, sem completar a informação com a quantidade de postos eliminados (ambas as informações são medidas mensalmente pela PED-DF), esquecendo-se de que nesse mesmo período a criação dessas novas ocupações pode ter sido acompanhada de um número maior de postos suprimidos, o que resultaria em saldo negativo. O crescimento ocupacional ocorreu de maneira diferenciada nos três Grupos de Regiões Administrativas do Distrito Federal, assim como na distribuição por faixa etária e sexo. Verificou-se no Distrito Federal que as mulheres ocupadas concentram-se nas faixas etárias de 25 a 39 anos

“O crescimento ocupacional ocorreu

de maneira diferenciada nos três Grupos de Regiões Administrativas do Distrito Federal, assim como na distribuição por faixa etária e sexo”. (45,7%) e 40 a 55 anos (27,1%), em 2001. Entretanto, a variação, entre 1992 e 2001, favoreceu mais as mulheres nas faixas etárias de 40 a 55 anos (60,3%), 56 a 64 anos (49,2%), 25 a 39 anos (24,5%) e de 18 a 24 anos (10,9%). Nesta última, as mulheres conquistaram mais postos de trabalho que os homens, considerando-se que estes apresentaram variação negativa (-2,3%). O crescimento da ocupação entre as mulheres acima de 40 anos conduz a algumas questões: estaria a experiência sendo mais valorizada ou seria mais lucrativo para os empregadores contratarem mulheres mais maduras, com menor probabilidade de engravidarem, ou com filhos já crescidos, remunerando-as com salários mais baixos que os salários pagos aos homens? Uma outra interrogação surge ao constatar-se que a presença de mulheres ocupadas com 65 anos ou mais, ainda que pequena, também aumentou. Estaria esse fato associado à elevação da taxa de desemprego no Distrito Federal, forçando as mulheres mais velhas a ingressarem no mercado de trabalho para contribuir na geração da renda familiar? A importância dos números absolutos é Revista de conjuntura

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minimizada ao refletir-se sobre o significado social da persistência dessas trabalhadoras na condição de ocupadas. Merece destaque a retração ocupacional das crianças e adolescentes de 10 a 15 anos nos três Grupos de Regiões Administrativas, o que parece positivo. Verificou-se diminuição do trabalho feminino e masculino nessa faixa etária (-69,0% e –75,3%, respectivamente), a partir da trajetória decrescente desse segmento na participação do contingente de ocupados do Distrito Federal, desde 1995, o que pode ser atribuído aos programas de governo que desestimularam a permanência de crianças e adolescentes no trabalho, privilegiando a sua atividade escolar. Os jovens de 16 a 17 anos, tanto do sexo masculino quanto do feminino, mostraram igualmente participação decrescente na ocupação (-40,4% e –36,5%, respectivamente), não pelas razóes citadas no parágrafo anterior, e sim porque perderam seus postos de trabalho. Ver-se-á adiante que, infelizmente, engrossaram as fileiras dos desempregados no Grupo de renda mais baixa. A diferenciação dos papéis desempenhados por homens e

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mulheres começa a se delinear ao desagregar-se essas informações por Grupos de Regiões Administrativas, os cenários aqui considerados. Chama a atenção o fato de, justamente no Grupo de renda mais alta, a conquista da maioria dos postos de trabalho ter sido feita pelos homens (crescimento relativo de 28,8%), dos 18 aos 64 anos, e não pelas mulheres (crescimento relativo de 10,0%). Estas só conseguiram mais trabalho que os homens na faixa etária de 40 a 55 anos. No Grupo de renda intermediária as mulheres aparecem em destaque ao conseguirem ocupar quase a totalidade dos novos postos de trabalho criados (crescimento relativo de 21,5%), frente à estabilidade alcançada pelos homens (1,1%). Estes só se destacam nas faixas etárias acima de 40 anos, e mesmo assim mostrando crescimentos ocupacionais relativos inferiores aos das mulheres. Exatamente no Grupo de renda mais baixa as mulheres conseguiram conquistar mais postos de trabalho (45,4%) que os homens (9,4%), em todas as faixas etárias, inclusive entre 16 e 17 anos. Essa revelação aponta para

as desigualdades de inserção das mulheres no mercado de trabalho, que serão mostradas adiante. Entretanto, antes de passar ao próximo item abordar-se-á a participação dos imigrantes entre a população ocupada. Em 1992, essa participação era de 78,8% do total de trabalhadores, diminuindo para 60,7%, em 2001, o que significa que aumentou a participação de pessoas ocupadas nascidas no Distrito Federal, embora os imigrantes ainda constituam maioria. Em 2001, as maiores parcelas dos imigrantes bem sucedidos, por não terem ficado em situação de desemprego, pertenciam ao sexo masculino, eram chefes de família e possuíam o primeiro grau incompleto e o segundo grau completo. Quanto ao tempo de residência no Distrito Federal, os imigrantes mais antigos, ou seja, com mais de 31 anos de residência, constituíam a maioria dos ocupados, o que, de certa forma, não causou nenhuma surpresa. A grande descoberta foi saber que o segundo maior contingente de imigrantes ocupados era composto por imigrantes recentes (com menos de 5 anos de residência). A

“Exatamente no Grupo de renda mais

baixa as mulheres conseguiram conquistar mais postos de trabalho (45,4%) que os homens (9,4%), em todas as faixas etárias, inclusive entre 16 e 17 anos”. Revista de conjuntura

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maioria das mulheres imigrantes ocupadas residiam no Grupo de renda intermediária. Quanto ao último local de residência dos imigrantes ocupados, verificou-se que, ao longo do período 1992/2001, praticamente não houve alteração dos Estados de procedência. Dados de dezembro de 2001 revelam que , seguindo uma ordem decrescente de importância, os cinco primeiros foram os seguintes: Minas Gerais, Goiás (onde se localiza a maioria das cidades do Entorno do Distrito Federal), Piauí, Maranhão e Bahia. Desigualdade de Inserção no Mercado de Trabalho Apesar dos avanços constatados na inserção da mulher em algumas atividades relacionadas ao universo de trabalho masculino, a participação feminina no mercado de trabalho tem sido, historicamente, restrita a alguns setores, particularmente no emprego doméstico, que, no mundo do trabalho feminino, é bastante significativo desde o século passado, quando chegava a concentrar cerca de um quinto das mulheres trabalhadoras. Na América Latina, em 1998, o emprego doméstico ocupava 16% da força de trabalho feminina, e continuou a registrar uma tendência de crescimento nos anos subseqüentes (BRUSCHINI & LOMBARDI, 2000). Em 1999, a PNAD registrou que o maior percentual das mulheres ocupadas (43,9%) era de assalariadas, e 17,2% exerciam serviços domésticos. A prestação de serviços (29,4%) aparecia como principal ocupação desempenhada pelas mulheres no mercado de trabalho, seguida pelas


atividades agrícolas (20,4%), sociais (17,4%) e, finalmente, as atividades comerciais (13,5%). Apenas 8,4% estavam empregadas na indústria de transformação. (Boletim Especial do DIEESE, março de 2002) No Distrito Federal, configura-se esta tendência, ao verificarse que o maior contingente de mulheres ocupadas, em 2001, situava-se no setor terciário da economia, onde predomina o setor Serviços, incluindo os Serviços Domésticos. Em seguida, os setores que mais concentraram a população trabalhadora feminina foram a Administração Pública e o Comércio. Embora o setor Serviços ocupasse o maior número de mulheres (226,4 mil), em 2001, o crescimento relativo mais significativo ocorreu na Administração Pública (32,9%), entre 1992 e 2001, seguido do Comércio, com um crescimento de 22,3%. Em todos esses setores o crescimento relativo dos homens foi inferior ao das mulheres. No mesmo período, a Indústria, apesar de contar com um pequeno número de mulheres empregadas no setor (7,8 mil), apresentou importante mudança, com um aumento de 14,7% na participação feminina, enquanto que os homens registraram um decréscimo de 13,0%. Tais dados podem significar um quadro possível de substituição gradativa de homens por mulheres no parque industrial relacionado às inovações tecnológicas, que modificaram a estrutura produtiva nos últimos anos.

“Ao analisar-se o total de

empregadores no Distrito Federal, verifica-se que a participação das mulheres ampliou-se significativamente no período entre 1992 e 2001, passando de 5,2 mil empregadoras para 10,2 mil”. A desagregação dos dados da PED-DF por Grupos de Regiões Administrativas revelou que os setores que mais ocuparam as mulheres dos Grupos de renda mais alta e renda intermediária foram os Serviços e a Administração Pública. No Grupo de renda mais alta, a participação das mulheres no setor Serviços foi de 61,1% e na Administração Pública, 30,1%, em 2001. No Grupo de renda intermediária, a participação das mulheres ocupadas no setor Serviços foi de 66,2% e na Administração Pública, de 18,2%, nesse mesmo ano. No Grupo de renda mais baixa, destacam-se os setores Serviços e Comércio, que ocuparam 69,4% e 16,8% do total de mulheres ocupadas, respectivamente, no ano de 2001. Ao analisar-se o total de empregadores no Distrito Federal, verifica-se que a participação das mulheres ampliou-se significativamente no período entre 1992 e

2001, passando de 5,2 mil empregadoras para 10,2 mil, equivalente a um crescimento de 96,2%, concentrando seu contingente no Grupo de renda intermediária. Destaca-se que o número de mulheres autônomas cresceu 8,7% no mesmo período, aumentando de 28,7 mil para 31,2 mil, enquanto o número de homens trabalhando por conta própria registrou uma pequena variação negativa (0,7%). No Grupo 3, o número de mulheres autônomas cresceu 21,6%. Em 1992, havia 11,6 mil mulheres nesse segmento, e em 2001, 14,1 mil 7 . Entre os profissionais universitários autonômos verificou-se expansão de 337,5% do contingente de mulheres no período de 1992 a 2001, enquanto o número de homens cresceu 200,0%. O total de pessoas nessa categoria correspondia, em 2001, a 8,3 mil, estando concentrados no Grupo de renda mais alta.

7 A PED define como empregadores os trabalhadores que possuem pelo menos 1 empregado permanente e como trabalhadores autônomos, ou por conta própria, aqueles que não possuem empregados permanentes (trabalham no máximo com algum membro da família ou com empregados eventuais) e trabalham para o público ou para empresas.

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Tanto a expansão das mulheres na Indústria de Transformação como nas posições de empregadoras e autônomas, demonstram o avanço da força de

trabalho feminina em reduto profissional tipicamente masculino. Apesar da retração ocupacional observada na Construção Civil entre 1992 e 2001 para

homens e mulheres (cerca de 22,0%), é importante ressaltar a participação do sexo feminino nesse setor (4,3% do total desses trabalhadores em 2001)

Estimativa do número de ocupados por sexo e posição na ocupação Média anual - 2001 Homens

Empregadores

Mulheres

10,2 24,5 31,2

Autônomos

61,0 42,7

Comércio

65,5 60,6

Administração Pública

95,1 226,4

Serviços

Indústria

0,0

181,0 7,8 18,0 50,0

100,0

150,0

200,0

250,0

Fonte: PED-DF (Convênio STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

Entretanto, confirmando a tendência de nicho ocupacional feminino, o emprego doméstico apresenta-se como o segundo setor mais expressivo em número de mulheres alocadas (68,9 mil), concentrando cerca de 20% do total de mulheres ocupadas em 2001, embora tenha sofrido uma leve redução de 2,8%, entre 1992 e 2001. Vale ressaltar a precariedade que caracteriza o emprego doméstico: longas jornadas de trabalho, reduzida proteção legal, baixa escolaridade, baixos salários e, tradicionalmente, classificado como não-especializado.

As altas taxas de ocupação da mão-de-obra feminina em situação de trabalho vulnerável8 também evidenciam as tendências de divisão social e de gênero no mercado de trabalho. No Distrito Federal, a participação das mulheres diminuiu de 37,1%, em 2000, para 35,3%. Em 2001, 29,1% da população ocupada no DF estava em situação de trabalho vulnerável, ou seja, em inserções frágeis no mercado de trabalho. Para essa diminuição contribuíram as retrações ocupacionais observadas entre as mulheres donas de negócio fa-

miliar (-9,1%) e entre as trabalhadoras familiares sem remuneração salarial (64,9%) (Boletim Especial DIEESE, março de 2002.) Conclui-se que, apesar de avançar em funções consideradas de domínio exclusivamente masculino, o trabalho feminino ainda se concentra em empregos e profissões que remetem à divisão histórica dos papéis entre homens e mulheres, reproduzida no mercado de trabalho. Converge para ofícios considerados tipicamente femininos: empregadas domésticas, professoras, enfermeiras, auxiliares de enfermagem, traba-

8 A PED define como trabalho vulnerável o dos assalariados sem carteira de trabalho assinada, os autônomos que trabalham para o público, os trabalhadores familiares não remunerados e os empregados domésticos.

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lhadoras agrícolas e balconistas no comércio são posições que ainda parecem predestinadas à mulher e que por si só reforçam a discriminação de gênero e conseqüente discriminação ocupacional dirigida à força de trabalho feminina. A desigualdade de inserção das mulheres no mercado de trabalho pode ser observada, sobretudo, pelos menores salários percebidos pela mão-deobra feminina. Qualidade(?) do Trabalho da Mulher A associação da renda obtida por homens e mulheres com o mesmo grau de escolaridade e carteira assinada pelo empregador, em 2001, permite constatar, com alguma precisão, a diferenciação praticada no mercado de trabalho brasileiro em relação ao trabalho das mulheres. Segundo o Boletim Especial DIEESE/março de 2002, sobre a Situação das Trabalhadoras Brasileiras, “o aumento da escolaridade das mulheres não garante igualdade de remuneração no mercado de trabalho e nem mesmo diminuição na mesma proporção do crescimento da instru-

ção”. A análise das informações da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), segundo a mesma fonte, permite verificar que “a desigualdade na remuneração é mais acentuada entre os trabalhadores com carteira assinada que têm nível superior. Enquanto 52,8% dos homens com este grau de instrução recebem mais de dez salários mínimos, apenas 30,1% das mulheres atingem este patamar salarial. A maioria das mulheres (58,5%) que possui nível médio recebe até três salários mínimos mensais, enquanto 45,0% dos homens nesta faixa de instrução recebem de três até dez mínimos. Entre os analfabetos, o percentual de mulheres que ganham até três salários mínimos (79,6%) é superior ao dos homens (75,4%)”. Em relação ao grau de escolaridade, segundo a PED-DF, deve-se ressaltar que, do total de ocupados, apenas 18,9% possui o curso superior completo. Nesse segmento existia praticamente o mesmo número de mulheres e de homens (cerca de 69,0 mil pessoas em 2001), embora entre 1992 e 2001 as mulheres tenham apresentado crescimento relativo (64,0%) superior ao dos homens

(53,6%). Seria este um indicador de valorização do trabalho realizado pelas mulheres? Sim, não fosse a enorme diferença de renda existente entre ambos, considerando-se que a remuneração feminina é estruturalmente inferior à dos homens em cerca de 35,0%, não apenas no DF, como também nas demais regiões onde a PED é realizada (Boletim Especial DIEESE, março de 2002). Segundo a PED-DF, o trabalho assalariado com carteira assinada no setor privado, indicador de qualidade do emprego, cresceu 32,9%, entre 1992 e 2001, com as mulheres conquistando mais postos de trabalho, considerando-se que seu índice de crescimento foi três vezes maior (58,9 %) que o dos homens (18,7%). Em números absolutos, o contingente de mulheres assalariadas com carteira assinada ampliou-se de 60,4 mil em 1992 para 96,0 mil em 2001, embora o número de homens assalariados com carteira assinada seja estruturalmente superior ao das mulheres, tendo aumentado de 110,7 mil em 1992 para 131,4 mil em 2001. Os dados da Tabela 2 escondem a verdadeira realidade

2 - Rendimento médio real no Distrito Federal (1) Médias anuais - 1992, 2000 e 2001 Posição na ocupação Ocupados Assalariados Setor Privado Com Carteira Sem Carteira Setor Público Autônomos

Rendimento médio (em Real) 1992 2000 2001* 951 1.109 612 684 336 1.648 576

1.048 1.158 637 677 480 1.829 589

1.102 1.202 638 672 502 1.968 657

Fonte: PED-DF (Convênio: STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP) (1) Valores em reais a preços de Mio de 2001, atualizados pelo IPCR-SDE/GDF *Valores de Janeiro a Maio de 2001 (últimos dados disponíveis)

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Variação % 92/00 92/01 10,2 4,4 4,1 -1,0 42,9 11 2,3

15,9 8,4 0,2 -1,8 49,4 19,4 14,1


“Levanta-se a hipótese de que esse

movimento de retração do emprego masculino no setor público houvesse desencadeado a oferta de mão-deobra feminina no setor privado”. verificada nos Grupos de Regiões Administrativas e ocultam as razões do aumento do rendimento médio real do setor público entre 1992 e 2001, justamente quando se completam sete anos sem reajustes de salários no setor público federal. Tentar-se-á descortinar esses bastidores recorrendo-se novamente à desagregação dos dados por Grupos de Regiões Administrativas. No período em análise, o maior crescimento ocupacional relativo (72,6%) ocorreu no Grupo de renda mais baixa, onde o número de mulheres assalariadas com registro em carteira no setor privado aumentou de 22,3 mil para 38,5 mil. Constatou-se que a grande mudança de patamar desse segmento ocorreu a partir de 1999, fato que pode estar associado à retração ocupacional ocorrida no setor público da Região, principalmente masculina, entre 1992 e 2001 (-1,6%). Levanta-se a hipótese de que esse movimento de retração do emprego masculino no setor público houvesse desencadeado a oferta de mãode-obra feminina no setor priva-

do. O fato de esse fenômeno ter sido mais intenso no Grupo de renda mais baixa, pressupõe que os empregos oferecidos não exigissem alto grau de escolaridade (os maiores crescimentos relativos ocorreram entre as mulheres que possuíam o 2º grau completo e o 2º grau incompleto (141,4% e 89,5% respectivamente) e pudessem, assim, ser remunerados com salários mais baixos. A média salarial das mulheres com registro em carteira nesse Grupo de Regiões Administrativas em 2001 (a preços de maio de 2001) era inferior à dos homens em quase 24,0% (R$375,00 e R$493,00, respectivamente). Onde o assalariamento de mulheres com registro em carteira cresceu relativamente menos, no período em análise, foi no Grupo de renda intermediária. Ressalte-se que esse Grupo possui a maior população economicamente ativa do Distrito Federal e, portanto, mesmo que o crescimento relativo tenha sido o menor, o contingente de mulheres assalariadas com registro em carteira ampliou-se de 29,6 mil

para 44,1 mil. Nesse grupo, também, observou-se retração ocupacional masculina no setor público9 (-3,9%). A diferença entre o salário médio pago às mulheres desse segmento em relação ao dos homens era de 30,0% em 2001 (R$590,00 e R$843,00, respectivamente). Embora, entre 1992 e 2001, o segundo maior crescimento relativo do emprego assalariado feminino com carteira assinada no setor privado (55,8%) tenha ocorrido no Grupo de renda mais alta, esse Grupo apresenta o menor contingente na PEA do Distrito Federal. Em números absolutos, as assalariadas com registro em carteira apresentaram crescimento de 8,6 mil para 13,4 mil, tendo sido o único Grupo a não apresentar decréscimo do assalariamento masculino no setor público. Esse comportamento diferenciado em relação aos demais Grupos pode estar relacionado às maiores oportunidades de acesso a um grau de escolaridade superior aos dos Grupos de renda mais baixa e de renda intermediária (verificou-se que o maior número de ocupados está concentrado entre os que possuem curso superior completo), o que poderia garantir a ocupação de empregos que exijam esse grau de instrução no setor público. O fato de esse Grupo ser privilegiado em termos salariais mostra que, ainda assim, a diferença entre o salário médio pago às mulheres e aos homens era de 7,0%, em 2001 (R$1.356,00 e R$ 1.453,00, respectivamente)

9 Na PED a Administração Pública inclui apenas a Administração Direta, tanto do GDF quanto do Governo Federal. O Setor Público abrange todas as atividades que não são executadas pelo Setor Privado, inclusive as da Administração Pública.

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Indice de crescimento de assalariados com carteira assinada no setor privado, por sexo - DF Médias anuais - 1992 a 2001 Homens

Mulheres

Base: Média de 1992

170 150 130 110 90 70 50 1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

Fonte: PED-DF (Convênio: STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

Algumas hipóteses podem ser levantadas para explicar o crescimento da participação das mulheres no setor público: o crescimento de empregos públicos nos ramos da Educação e Saúde, tradicionalmente caracterizados por uma predominância de profissionais do sexo feminino. Apesar da retração

ocupacional do setor público ao longo do período 1992/2001, esses dois ramos dos Serviços expandiram-se 34,2% e 27,2% respectivamente, em relação à média de 1992. Outra explicação, vinculada a fontes oficiais e não à PEDDF, pode estar associada ao fato de a maioria dos concursos públi-

cos realizados exigirem apenas o segundo grau completo, oferecendo salários relativamente mais baixos. Esse é o nível de instrução que mais concentra as pessoas ocupadas no Distrito Federal, detendo 29,3% do total de mulheres ocupadas, e 26,1% do total de homens ocupados, em 2001.

Indice de crescimento de assalariados no setor público, por sexo - DF Médias anuais - 1992 a 2001 Homens

Mulheres

125 120 115 110 105 100 95 90 85 80 1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

Fonte: PED-DF (Convênio: STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

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2000

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Quanto aos rendimentos do trabalho principal, verificou-se, em 2001, que, dentre as seis regiões pesquisadas pela PED, a menor diferença entre os rendimentos de mulheres e homens, independentemente do setor de atividade econômica, da posição na ocupação e

do grau de escolaridade, ocorreu na região metropolitana de Porto Alegre (30,9%), o que a coloca em posição privilegiada em relação às demais, ainda que essa se constitua em uma enorme diferença. No Distrito Federal as mulheres recebiam em média R$844,00, en-

quanto os homens recebiam R$1.276,00, equivalendo a uma diferença de 33,9%. A situação mais grave desse indicador observou-se em Belo Horizonte, onde as mulheres recebiam 38,1% menos que os homens (Boletim Especial DIEESE, março de 2002).

3 - Rendimento médio real dos ocupados no trabalho principal, segundo regiões metropolitans - 2001 Regiões Metropolitanas

Mulheres

Belo Horizonte Distrito Federal(1) Porto Alegre Recife Salvador São Paulo

482 844 564 389 442 665

Homens

Rendimento das mulheres em relação aos homens (%)

779 1.276 816 590 682 1.037

61,9 66,1 69,1 65,9 64,8 64,1

Fonte: Boletim DIEESE “A Situação das Trabalhadoras Brasileiras”, ed. especial de março de 2002 Nota: (1) Média anual de janeiro de 2001 a preços de maio de 2001, atualizados pelo IPCR-SDE/GDF Obs: Inflatores utilizados: ICV-DIEESE/SP; IPCA/BH/PEAD; IPC-DESCON/FUNDAJ/PE; IPC-SEI/BA

Conforme se observou anteriormente, o setor privado cresceu mais que o público e remunera bem menos os seus empregados, sendo a renda do setor público a grande responsável pela dinamização da economia do Distrito Federal. No ano de 2001, a renda média dos assalariados do setor público era de R$1.967,00, quase três vezes maior que a do setor privado, R$672,00. Em média, a diferença dos salários pagos às assalariadas do setor privado, em geral, com ou sem carteira de trabalho assinada, era 20,0% inferior à recebida pelos assalariados desse setor. Os dados obtidos pela PED-DF revelam que, em 2001, no setor público, mesmo no Grupo de renda mais alta, as mulheres recebiam 25,0% menos que os homens (R$2.532,00 e R$3.360,00, respec-

tivamente). No Grupo de renda intermediária essa diferença era de 26,0% (R$1.503,00 e R$ 2.032,00, respectivamente) e finalmente, no Grupo de renda mais baixa, as mulheres assalariadas recebiam R$951,00, enquanto os homens assalariados recebiam R$1.208,00, resultando numa diferença de 21,3%. As diferenças de remuneração entre homens e mulheres assalariados do setor público são insuficientes para explicar o ganho real de 19,4% obtido por esse setor entre 1992 e 2001. Deve-se enfatizar que os funcionários menos qualificados e com salários mais baixos foram estimulados a saírem da Administração Pública, sendo substituídos por um número maior de funcionários do setor privado contratados por salários mais baixos ainda, incluindo-se aqui as

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mulheres. Ao mesmo tempo, a Administração Pública seguiu contratando profissionais do setor privado com altos salários, o que acabou mascarando um falso aumento real para os funcionários públicos federais residentes no Distrito Federal, que ficaram sete anos sem reajuste salarial. Precariedade do Trabalho da Mulher O que se pode denominar de indicador de não-qualidade do emprego, ou melhor, de precariedade das relações de trabalho, entre 1992 e 2001, foi o aumento do trabalho assalariado sem registro em carteira no setor privado. Novamente as mulheres contribuíram para essa ampliação, ao mostrarem crescimento relativo quase quatro vezes maior (85,7%) que o


dos homens (22,0%) nesse período. O contingente de mulheres nessa condição, em 1992, era de

14,0 mil e, em 2001, foi de 26,0 mil. O número de homens, estruturalmente superior ao de mulhe-

res nessa relação de trabalho, era de 32,8 mil, em 1992, e de 40,0 mil, em 2001.

Indice de crescimento de assalariados com carteira assinada no setor privado, por sexo - DF Médias anuais - 1992 a 2001 Homens

Mulheres 210 190 170 150 130 110 90 70 50

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

Fonte: PED-DF (Convênio: STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

Associando-se essa condição à baixa remuneração de homens e mulheres nessa situação, em 2001 (R$502,00), verifica-se mais uma vez que as mulheres continuavam recebendo menos que os homens ao comparar-se a remuneração paga a estes (R$566,00) e às mulheres (R$400,00), ou seja, os salários pagos às mulheres eram 29,3% inferiores aos dos homens. Desagregando-se essa informação por Grupos de Regiões Administrativas verificou-se que o Grupo de renda intermediária concentra o maior contingente de assalariadas sem carteira de trabalho assinada, tendo apresentado, entre 1992 e 2001, crescimento relativo dez vezes maior (76,8%) que o dos homens (7,4%), com a expansão de 6,9

mil para 12,2 mil mulheres nessa situação. Quanto à diferença na remuneração salarial de homens e mulheres, constatou-se que as mulheres recebiam, em média, 24,6% menos que os homens em 2001 (R$390,00 e R$517,00 , respectivamente). No Grupo de renda mais baixa, o número de mulheres assalariadas sem registro em carteira aumentou três vezes mais (71,4%) que o dos homens (21,1%), ao crescer de 5,6 mil para 9,6 mil. Neste Grupo, o salário pago às mulheres nessa relação de trabalho era 39,0% inferior ao dos homens na mesma situação (R$257,00 e R$421,00, respectivamente). Embora o Grupo de renda mais alta tenha apresentado, entre 1992 e 2001, o maior crescimenRevista de conjuntura

21

to relativo de mulheres assalariadas sem registro em carteira (173,3%), assim como o de homens (155,6%), trata-se do Grupo com o menor contingente de assalariados nessa situação: 8,7 mil, dos quais 4,6 mil pertenciam ao sexo masculino e 4,1 mil ao sexo feminino. Talvez esse comportamento mereça um estudo especial para explicar mais profundamente a estrutura ocupacional do Grupo, porque pode estar associado aos empregos temporários de jovens. Por se tratar do Grupo de renda mais alta, seria previsível a não-existência de grandes diferenças de remuneração entre homens e mulheres. No entanto, verificou-se que as assalariadas sem registro em carteira recebem quase a metade (57,6%) dos salários pagos aos homens

jan/mar de 2002


(R$777,00 e R$1.349,00, respectivamente). Uma das hipóteses levantadas para explicar essa diferença exorbitante é a de que os salários das empregadas domésticas que moram na residência dos patrões poderiam estar contribuindo para esse resultado. Os rendimentos médios das mulheres empregadoras e autônomas também são menores que os dos homens. No caso das empregadoras, observou-se que, em 2001, estas retiravam em média R$1.869,00 e os empregadores, R$2.426,00, revelando uma diferença de 33%. Entre as mulheres que trabalhavam como autônomas, verificou-se que estas retiravam, em média, mensalmente, 44% menos que os autônomos do sexo masculino em 2001 (R$430,00 e R$765,00, respectivamente). O emprego doméstico na PED é captado para mensalistas, diaristas e pessoas que realizam trabalhos domésticos em troca de benefícios (resquícios do trabalho escravo). Portanto, a vulnerabilidade dessas relações de trabalho constitui-se em uma das razões para não estarem incluídas entre as dos trabalhadores assalariados do setor privado. Entre 1992 e 2001 o emprego doméstico mostrou pequena redução de 0,7%, determinada pela redução do nú-

mero de diaristas (-16,7%). A presença de empregadas domésticas residentes no Distrito Federal que não recebem salário em troca do trabalho que realizam é a condição limite do trabalho vulnerável. Ainda que, quantitativamente, o número de trabalhadoras com esta especificação seja, felizmente, muito pequeno - portanto, considerado inconsistente, do ponto de vista estatístico -, é socialmente inaceitável. “Existem situações adversas que se mantêm inalteradas: a secretária do lar tem ainda traços das mucamas de ontem. Cada vez mais as relações de trabalho no informal ou mesmo parcialmente formalizado provocam um brutal desamparo na vida do trabalhador. No que tange ao tipo de serviço, observamos que a maior parte das empregadas “fazem de tudo” e que pelo menos três quartos dentre elas trabalham seis dias por semana. O que evidencia que esse trabalho absorve integralmente o seu tempo, limitando as compensações com atividades extras.”(GIRARD e THEODORO, 2001). O emprego doméstico em 2001 era composto por 62,9 mil mensalistas, 10,0 mil diaristas e uma parte residual de empregados que recebiam em espécie ou

“Existem situações adversas que se

mantêm inalteradas: a secretária do lar tem ainda traços das mucamas de ontem”. Revista de conjuntura

22

jan/mar de 2002

benefício, totalizando 73,3 mil trabalhadores, constituídos de 94% de mulheres. Verificou-se que a maioria das mensalistas residiam nos Grupos de renda intermediária e de renda mais baixa, e que a maioria das diaristas residiam no Grupo de renda mais baixa. Entre 1992 e 2001 observou-se melhoria do ponto de vista das garantias trabalhistas dessa categoria, com a duplicação do contingente de mensalistas com carteira assinada pelo empregador ( 98,5% ), ao passarem de 13,0 mil para 25,8 mil , número equivalente a 40,9% do total de mensalistas. As trabalhadoras domésticas, além de estarem posicionadas mais fragilmente na estrutura ocupacional, estão mais expostas ao risco de trabalharem acima de 44 horas semanais, principalmente se residirem na casa dos patrões. Em 2001 os rendimentos auferidos pelas empregadas domésticas em geral situava-se em R$242,00. Até mesmo nesse segmento, as mulheres ganham 18,2% menos do que os homens (R$296,00). Na nossa sociedade, o trabalho doméstico na própria família, ou seja, no domínio do privado, é praticamente desconsiderado e ocultado enquanto produção social. No entanto, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE (PNAD) detectou um aumento expressivo no contingente de mulheres ativas quando passou a incluir aquelas ocupadas nos afazeres domésticos. Enquanto o conceito de trabalho não incluir o trabalho doméstico como forma não monetarizada de participação na produção social não será possível ter uma percep-


ção mais profunda da extensão do trabalho da mulher. Outro indicador que mede a precariedade do trabalho , se associado à renda, é a jornada média semanal de trabalho. Deve-se ressaltar que a jornada média semanal considerada no presente artigo refere-se à destinada ao trabalho principal. Embora a PED capte o número de horas despendidas nos trabalhos adicionais, ou trabalho secundário, essas informações não são objeto de análise neste estudo. A PED considera apenas a jornada contratual, não considerando o tempo de deslocamento para o trabalho e do trabalho para a residência. A PED também não considera como trabalho os afazeres domésticos realizados pelas mulheres em suas residências. A mensuração dessa importante informação vem sendo objeto de pesquisas especiais e, com certeza, contribuirá para explicar o aumento do índice de doenças e mortes prematuras de mulheres em idade produtiva, o aumento de distúrbios mentais pelo excesso de trabalho e pela diminuição do tempo destinado à convivência familiar e ao cuidado com os filhos. A jornada média de trabalho semanal dos trabalhadores do Distrito Federal no trabalho principal será aqui analisada em apenas uma de suas desagregações, aquela que evidencia o contingente de trabalhadores que trabalham acima da jornada considerada legal, qual seja, acima de 44 horas. Destaque-se que, em 2001, 35,3% da população ocupada do DF trabalhava acima da jornada legal, equivalendo a 259,7 mil trabalhadores. Desse

“Quanto mais alto o desemprego dos

homens chefes de família, mais pressionados ficam os demais membros, principalmente os cônjuges, a disputarem, sozinhos ou com seus filhos, uma ocupação no mercado de trabalho”. total, 39,8% eram mulheres. Esse indicador assume relevância contundente ao se constatar que, entre 1992 e 2001, o crescimento relativo de mulheres trabalhando acima da jornada legal foi de 18,7%, enquanto o dos homens foi de 10,0%. Na desagregação por Grupos de Regiões Administrativas verificou-se que, entre 1992 e 2001, foi justamente no Grupo de renda mais baixa que ocorreu a maior expansão desse segmento (46,5%), alcançando 41,9 mil trabalhadoras, indicando o enorme esforço físico para conseguir o necessário à sua sobrevivência ou a de suas famílias. No Grupo de renda intermediária o crescimento relativo do contingente de mulheres nessa situação foi de 19,8%, embora em números absolutos o número de mulheres trabalhando acima da jornada legal supere o das que residiam no Grupo de Regiões de renda mais baixa (45,3 mil). A caracterização do trabalho realizado pela população feminina ocupada e as condições de sub-remuneração a que as mulheres vêm historicamente submetendo-se no mercado de trabalho Revista de conjuntura

23

do DF estão intimamente relacionadas à expansão do desemprego entre os chefes de família do sexo masculino e à injusta distribuição de renda no Distrito Federal. Não obstante a renda média dos ocupados do Distrito Federal (a mais alta de todas as regiões pesquisadas pela PED), em maio de 2001, tenha sido de R$1.081,00, deve-se salientar que 50% da população ocupada recebia até R$505,00. Quanto mais alto o desemprego dos homens chefes de família, mais pressionados ficam os demais membros, principalmente os cônjuges, a disputarem, sozinhos ou com seus filhos, uma ocupação no mercado de trabalho, contribuindo para a elevação da taxa de desemprego local. Este quadro vem sendo agravado pelo crescimento do número de mulheres responsáveis pelo sustento familiar, o que significa que seu ingresso no mercado de trabalho não é mais secundário, apenas para complementar a renda, mas fundamental para a sua sobrevivência e a de sua família. Entre 1992 e 2001, o número de mulheres chefes de família ocupadas aumentou de 50,0 mil para

jan/mar de 2002


76,6 mil (crescimento relativo de 53,2%), enquanto o número de homens chefes de família aumentou de 245,5 mil para 268,9mil (crescimento relativo de 9,5%). Assim, em 1992, de cada 100 chefes de família ocupados, 17 eram do sexo feminino, aumentando para 22, em 2001. Esse aumento foi generalizado para os três Grupos de Regiões Administrativas e acompanha a distribuição do desemprego no Distrito Federal. Entre 1992 e 2001, no Grupo de renda mais baixa, onde a taxa de desemprego é mais alta, houve o maior crescimento relativo de mulheres chefes de família

ocupadas (60,2%), seguido do Grupo de renda intermediária (52,6%) e do Grupo de renda mais alta (45,9%). Elevação do desemprego no DF atinge homens e mulheres O aumento do número de mulheres no mercado de trabalho não significa que essas estejam encontrando ocupação. Verificase que, estruturalmente, o número de mulheres desempregadas sempre foi maior que o de homens. Entre 1992 e 2001, o crescimento relativo do número de mulheres desempregadas foi quase duas

vezes maior (73,3%) que o crescimento observado para os homens (41,9%). Em 1992, a participação das mulheres no contingente de desempregados era de 50,9% e, em 2001, era de 55,9%. Nesse período, mais 43,4 mil mulheres se encontravam desempregadas, totalizando 102,6 mil mulheres em situação de desemprego. A taxa de desemprego total feminina10 , em 2001, foi de 23,1%, sendo a terceira maior dentre as regiões pesquisadas pela PED. (Boletim Especial DIEESE, março de 2002) O maior número de mulheres desempregadas, em 2001, encon-

4 - Taxas de desemprego, segundo sexo, nas regiões pesquisadas pela PED - 2000/2001 2000

Regiões Homens Salvador Recife Distrito Federal(1) São Paulo Porto Alegre Belo Horizonte

Mulheres

24,1 18,2 17,2 15,0 14,2 16,1

29,3 23,9 22,2 20,9 19,6 19,9

2001 Homens Mulheres 25,0 17,8 17,2 14,9 12,3 16,2

30,2 25,3 23,1 20,8 18,2 20,8

Fonte: Boletim Especial DIEESE, março de 2002

trava-se no Grupo de renda mais baixa (53,2 mil). Esse Grupo apresentou o maior crescimento relativo (98,5%) desse contingente, no período de 1992 a 2001, e a maior taxa de desemprego total feminina (31,9%), em 2001. No

Grupo de renda intermediária, esse indicador foi de 20,3%, seguido pelo Grupo de renda mais alta (9,1%), nesse mesmo ano. A dificuldade para encontrar trabalho pode ser evidenciada pelos obstáculos impostos às mulheres

pelos empregadores na hora da contratação, principalmente devido à possibilidade de estas engravidarem, assim como pela necessidade de darem assistência aos filhos e aos idosos, dentre outros fatores

10 A taxa de desemprego total é obtida dividindo-se o número de pessoas desempregadas pela População Economicamente Ativa (total de ocupados e desempregados) vezes 100. A taxa de desemprego total feminina é obtida dividindo-se o número de mulheres desempregadas pelo número de mulheres na PEA. Idem para os demais atributos pessoais.

Revista de conjuntura

24

jan/mar de 2002


Taxa de desemprego total e por sexo - DF - Médias anuais - 1992 a 2001 Total

Mulheres

Homens

30 25

Em %

20 15 10 5 0 1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

Fonte: PED-DF (Convênio: STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

A análise da taxa de desemprego por tipo revela que a taxa de desemprego aberto11 das mulheres sempre foi maior que a dos homens. Em números absolutos, as mulheres em situação de desemprego aberto expandiuse de 40,3 mil, em 1992, para 69,6 mil, em 2001 (crescimento relativo de 72,7%). Ao contrário do desemprego aberto, o desemprego oculto pelo trabalho precário12 é maior para os homens do que para as mulheres, visto que os homens, por serem maioria na posição de chefes de família, ou seja, responsáveis pelo sustento da família, são forçados a realizarem qualquer tipo de trabalho, mesmo de forma irregular. Em números absolutos, havia 6,3 mil mulheres nessa situação, em 1992, crescendo para 11,6 mil, em 2001 (crescimento relativo de 84,1%). Entre

os homens esse número passou de 15,7 mil, em 1992, para 23,0 mil, em 2001 (crescimento relativo de 46,5%). A taxa de desemprego oculto pelo desalento, estruturalmente, é maior para as mulheres do que para os homens. Esse tipo de desemprego inclui as pessoas que procuraram trabalho nos últimos 12 meses, mas desistiram de pro-

curar nos últimos 30 dias por desestímulos do mercado de trabalho ou por circunstâncias fortuitas (falta de dinheiro para o transporte, problemas de saúde etc.). O número de mulheres desalentadas cresceu de 12,6 mil, em 1992, para 21,4 mil, em 2001 (crescimento relativo de 69,8%). As mulheres do Grupo de renda mais baixa foram as mais afeta-

“Ao contrário do desemprego

aberto, o desemprego oculto pelo trabalho precário12 é maior para os homens do que para as mulheres”.

11 A PED define como em situação de Desemprego Aberto as pessoas que procuraram trabalho de maneira efetiva nos 30 dias anteriores ao da entrevista e não exerceram nenhum trabalho nos últimos 7 dias. 12 A PED define como em situação de Desemprego Oculto pelo Trabalho Precário as pessoas que realizam de forma irregular, sem previsibilidade, algum trabalho remunerado (ou não remunerado, em ajuda a negócio de parentes) e que procuraram efetivamente trabalho nos 30 dias anteriores ao da entrevista ou nos últimos 12 meses.

Revista de conjuntura

25

jan/mar de 2002


das pelo desemprego, tanto aberto quanto oculto. O número de mulheres em situação de desem-

prego aberto nesse Grupo aumentou 490,0%, passando de 6,0 mil, em 1992, para 35,4 mil, em

2001. No desemprego oculto, o aumento foi de 102,3% no período citado.

5 - Taxas de desemprego por tipo, segundo sexo - DF - (Médias anuais) Taxas de desemprego

1992

Total Homens Mulheres Aberto Homens Mulheres

15,5 13,7 17,8 10,1 8,4 12,1 2,9 3,8 1,9 2,5

Oculto pelo trabalho Homens Mulheres Oculto pelo desalento Homens Mulheres

2001

1,5 3,8

(em mil)

Variação (%)

20,1 17,2 23,1 12,8 10,1 15,7

29,7 25,5 29,8 26,7 20,2 29,8

3,8 4,9 2,6 3,5 2,2 4,8

31,0 28,9 36,6 40,0 46,7 26,3

Fonte: PED-DF (Convênio: STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

No Distrito Federal, a maioria das mulheres desempregadas é jovem. Essa situação evidencia a crescente necessidade de experiência exigida pelos empregadores. Em relação ao total de mulheres desempregadas, em 2001, 40,0% concentravam-se na faixa etária de 18 a 24 anos, enquanto se encontravam 37,7% na faixa etária de 40 a 55 anos. Destaca-se que o maior crescimento foi observado na faixa etária de 40 a 55 anos (123,1%), entre 1992 e 2001, o que evidencia a dificuldade de encontrar trabalho nessa faixa. Embora, quantitativamente, haja um número pequeno de pessoas com mais de 64 anos procurando trabalho,

deve-se ressaltar a importância social desse fato, considerandose que a esperança de vida ao nascer dos brasileiros é de 65 anos e que, portanto, seria desejável que a sociedade pudesse oferecer às pessoas idosas condições mínimas de sobrevivência que lhes permitissem parar de procurar trabalho. Nos Grupos de renda intermediária e de renda mais

baixa, as mulheres desempregadas concentravam-se na faixa etária de 18 a 24 anos e de 25 a 39 anos, em 2001. Porém, observou-se que, no Grupo de renda mais baixa, o desemprego atingiu os jovens de 16 a 17 anos, particularmente as mulheres (60,0%). O contingente de pessoas que estavam à procura de trabalho pela primeira vez no Distrito Federal, ou seja, sem experiência anterior de trabalho ( 31,7 mil ), é constituído estruturalmente de uma maioria feminina. Entre 1992 e 2001, o crescimento relativo do número de mulheres nessa categoria foi de 23,8%, ao ampliar-se de 15,1 mil para 18,7 mil.

“No Distrito Federal, a maioria das mulheres desempregadas é jovem”

Revista de conjuntura

26

jan/mar de 2002


6 - Estimativa dos desempregados por faixa etária - DF - 1992/2001 (Médias anuais) Faixa Etária

2001

1992 Homens Mulheres

Total de desempregados

Homens

Mulheres

57,0

59,2

80,9

102,6

10 a 15

*

*

*

*

16 a 17

6,0

5,3

6,9

18 a 24

21,8

24,0

25 a 39

16,8

40 a 55

VARIAÇÃO (%) Homens Mulheres 41,9

73,3

7,4

15,0

39,6

33,3

41,0

52,8

70,8

21,0

24,4

38,7

45,2

80,0

5,6

5,2

10,6

11,6

89,3

123,1

56 a 65

*

*

*

*

Mais de 65

*

*

*

*

Fonte: Boletim Especial DIEESE, março de 2002 * A amostra não permite a desagregação (os números são inferiores a 4,0 mil casos

Visto por outro ângulo, o aumento de desempregados com experiência anterior de trabalho entre 1992 e 2001 (66,4%) revela as dificuldades de reinserção no mercado de trabalho. De um total de 151,0 mil desempregados em 2001, com experiência anterior, 55,6% eram mulheres. O Grupo de renda mais baixa concentrava o maior contingente de mulheres desempregadas com experiência anterior de trabalho, tendo apresentado o maior crescimento relativo no período em análise (117,6%).Curiosamente, o Grupo de renda mais alta também demonstrou que sua população de desempregados com experiência anterior vive essa mesma dificuldade , ao apresentar elevado crescimento relativo nesse período (90,0%). Obter uma nova colocação no mercado de trabalho está sendo tão difícil para os desempregados com baixo grau de escolaridade como para os que possuem um grau mais elevado de instrução.

Em 1992, o número de mulheres chefes de família desempregadas era de 6,1 mil, ampliando-se para 13,3 mil, em 2001, ou seja, mais 7,2 mil mulheres passaram a ocupar a posição de chefe de família não encontrando trabalho nesse período. O número de chefes de família do sexo masculino desempregados sempre foi maior que o de mulheres. No entanto, em 1992, de cada 100 chefes de família desempregados, 23 eram mulheres e, em 2001, essa proporção aumentou para 31. O crescimento relativo das mulheres chefes de família desempregadas, nesse período (118,0%), foi mais de duas vezes superior ao dos homens (48,5%). A ampliação do contingente de chefes de família desempregados, nesse período, foi generalizada para todos os Grupos de Regiões Administrativas, tendo sido mais intensa no Grupo de renda mais baixa (153,3%).No grupo de renda mais alta, os desempregados Revista de conjuntura

27

com experiência anterior de trabalho também enfrentaram dificuldades em conseguir um novo emprego ( 82,5%), o que evidencia a existência de um mercado de trabalho cada vez mais refratário à criação de novos empregos. O tempo médio de procura por trabalho no Distrito Federal é bastante alto, uma vez que 54,1% dos desempregados despende mais de seis meses nessa busca. Para as mulheres, a situação é ainda mais grave. Talvez por falta de estímulos do mercado de trabalho, o tempo despendido nos afazeres domésticos ou até por motivos pessoais, as mulheres permanecem mais tempo desempregadas do que os homens. Do total de mulheres desempregadas, 29,6% procuraram trabalho por mais de um ano, em 2001. Entre 1992 e 2001, o número de mulheres que se encontravam nessa situação aumentou 210,2%, tendo o Grupo de renda mais baixa apresentado o maior crescimento relativo (654,5%), o que pode estar associado ao baixo grau de escolari-

jan/mar de 2002


dade das desempregadas desse Grupo. Para os homens, o aumento foi de 238,8%, embora eles figurem em número menor do que as mulheres.

Em dezembro de 2001, o tempo médio de procura por trabalho, sem encontrá-lo, foi aproximadamente de 1 ano e 3 meses. No período de 1992 a

2001, o total de homens e mulheres com procura de trabalho superior a um ano, ampliou-se de 16,5 mil para 53,1 mil (crescimento relativo de 221,8%).

7 - Estimativa dos desempregados segundo o grau de escolaridade, por sexo - DF - 1992/2001 (Médias anuais) Grau de escolaridade Total de desempregados

1992 Homens Mulheres

2001 Homens

Mulheres

VARIAÇÃO (%) Homens Mulheres

57

59,2

80,9

102,6

41,9

73,3

33,9

25,8

35,0

31,5

3,2

22,1

1º Grau completo

6,4

8,0

10,9

12,7

70,3

58,8

2º Grau incompleto

5,7

12,5

14,8

31,5

159,6

152

2º Grau completo

4,8

6,8

12,1

16,1

152,1

136,8

*

*

5,3

9,2

*

*

*

*

1º Grau incoimpleto

Curso superior (completo e incompleto) Analfabetos

Fonte: PED-DF (Convênio: STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

Apesar de a mulher superar o homem em anos de escolaridade, a sua taxa de desemprego ainda é superior à taxa dos homens. Do total de mulheres desempregadas, em 2001, observou-se que a maior concentração ocorre entre as que possuem o 1° grau incompleto ( 61,4% ). O grau de escolaridade que apresentou maior crescimento relativo de mulheres desempregadas foi entre as que possuíam o 2° grau completo (152,0%). Dados

da média de 2001 revelam que, do total de 14,5 mil pessoas desempregadas com curso superior completo e incompleto, 9,2 mil eram mulheres. Os dados do desemprego em dezembro de 2001 revelam que, do total de desempregados (174,8 mil ), 52,4% são imigrantes, provenientes principalmente dos Estados de Goiás, Piauí, Minas Gerais, Bahia e Maranhão. Tanto em 1992 (38,8 mil), quanto em 2001 (54,6 mil),

“Apesar de a mulher superar o

homem em anos de escolaridade, a sua taxa de desemprego ainda é superior à taxa dos homens”. Revista de conjuntura

28

jan/mar de 2002

o contingente de mulheres desempregadas imigrantes foi maior do que o de homens (35,8 mil e 41,5 mil, respectivamente). Do contingente de mulheres desempregadas em 1992 (59,2 mil), 65,5% eram imigrantes. Em 2001, as mulheres desempregadas não nascidas no Distrito Federal representavam 53,2% do total de mulheres desempregadas. Entre as principais constatações, destaca-se que o crescimento do desemprego entre as mulheres nascidas no Distrito Federal (135,3%) foi mais de três vezes maior que o registrado para as mulheres imigrantes (40,7%), no período de 1992 a 2001. Em 2001, a participação das mulheres imigrantes no mercado de trabalho local foi mais intensa entre aquelas com tempo de residência inferior a 5 anos (10,8 mil) e na faixa etária de 25 a 39 anos (24,1 mil). Na desagregação por Grupos de Regiões Admi-


8 - Estimativa do número de desempregados, por sexo, segundo a posição na família e nascimento DF - 1992/2001 - (Médias anuais) Indicadores

2001

1992 Homens Mulheres

Chefes de família Desempregados Nascidos no DF Desempregados não nascidos no DF

Homens

Mulheres

VARIAÇÃO (%) Homens Mulheres

19,8

6,1

29,4

13,3

48,5

118,0

21,1

20,4

39,4

48,0

86,7

135,3

35,8

38,8

41,5

54,6

15,9

40,7

Fonte: PED-DF (Convênio: STDH/DF, DIEESE e Fundação SEADE/SP)

nistrativas, ressalta-se que o maior número de mulheres e homens imigrantes desempregados concentravam-se no Grupo de renda mais baixa (30,6 mil e 25,0 mil, respectivamente0), em 2001. A situação das mulheres negras no mercado de trabalho “Uma das esferas em que se distingue com mais clareza a eficiência do mecanismo de segregação por cor ou etnia na sociedade brasileira, assim como seu modo sutil de operar, é a do mercado de trabalho. Mas, se a seleção por cor frequentemente pre-

pondera sobre quaisquer outros critérios no mercado de trabalho, o que acontece quando a ela se somam outras modalidades seletivas sabidamente também discriminantes, como é o caso da segregação por sexo?” (GARCIA, 2000) Segundo o Boletim Especial DIEESE de nov/2001, é bastante acentuada a participação da população negra no mercado de trabalho do Distrito Federal. Dados de 2001 registraram esse indicador em 64,1%, representando a mais alta participação dentre as regiões pesquisadas pela PED, à frente de São Paulo (63,5%) e de Salvador

(61,5%). Neste contingente, as mulheres negras inseridas nesse espaço social também estão sobre-representadas no Distrito Federal, com um percentual de 57,3%, taxa esta mais expressiva do que a registrada para as mulheres não-negras (54,5%). A referida taxa também é a mais elevada em relação às demais regiões, inclusive Salvador (55,4%) e São Paulo (55,1%). Entretanto, esses indicadores não asseguram uma igualdade de inserção. Todas as regiões registraram maiores taxas de desemprego para a população negra. A mais alta taxa de desempre-

9 - Taxas de desemprego, por sexo e cor regiões metropolitanas do Brasil - 2001 Não-negra

Negra

Regiões Metropolitanas Total

(em %)

Mulheres

Homens

Total

Mulheres

Homens

Belo Horizonte

19,5

21,8

17,5

16,1

18,7

16,1

Distrito Federal

22,7

26,1

19,7

16,8

20,4

13,3

Porto Alegre

23,5

26,4

20,9

14,1

17,6

11,5

Recife

22,1

26,9

18,4

19,8

23,5

16,4

Salvador

28,4

31,2

25,9

18,9

24,3

14,2

São Paulo

21,6

25,3

18,4

15,3

18,1

13,0

Fonte: Boletim DIEESE “A Situação das Trabalhadoras Brasileiras”, ed. especial de março de 2002 Obs: (a) Dados com base na média do período de janeiro a junho de 2001 (b) negros inclui pretos e pardos. Não-negros inclui brancos e amarelos

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go da população negra encontrase em Salvador (28,4%). Nessa região, 31,2% das mulheres negras estavam desempregadas, enquanto 25,9% dos homens negros encontravam-se nessa situação, em 2001. Já em relação à população não-negra, registrou-se uma taxa de desemprego de 24,3% para as mulheres e 14,2% para os homens. O Distrito Federal, cuja taxa

de desemprego da população negra foi a terceira maior registrada (22,7%) em 2001, dentre as regiões pesquisadas, também apresentou um índice mais acentuado de desemprego para as mulheres negras (26,1%) do que para as mulheres não-negras (20,4%), ou para os homens negros (19,7%). Tais dados são conclusivos quando se afirma que, tradicionalmente,

as taxas de desemprego são mais acentuadas para as mulheres negras, comprovando a discriminação racial e de gênero dirigidas, particularmente, a essas trabalhadoras. Os baixos salários recebidos agravam a situação de desigualdade, determinando a discriminação social, diretamente relacionada à situação de pobreza que atinge a maioria da população negra brasileira

Taxa de desemprego, por sexo e cor - DF - 2001 Negros

Não-negros

30 25

Em %

20 15 10 5 0 Mulheres

Homens

Fonte: Boletim DIEESE. “20 de Novembro - Dia Nacional da Consciência Negra”, ed. especial de novembro de 2001.

Assim, se a remuneração das mulheres é sempre mais baixa do que a obtida pelos homens, as mulheres negras têm o pior rendimento do mercado de trabalho. Pesquisa do IBGE confirma que a renda média das mulheres negras é menos da metade da renda das mulheres não-negras, situando-as na parte mais baixa da pirâmide sócio-econômica.

Dados de 2001 mostram o rendimento médio nas regiões pesquisadas pela PED, por sexo e cor, registrando esta alarmante realidade. Em todas as regiões verifica-se que os salários das mulheres negras são os mais baixos do mercado de trabalho. O DF apresenta o maior rendimento médio auferido pela população negra ocupada assa-

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30

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lariada (R$879,00). Ainda assim, registra o desnível existente entre sexo e cor. As mulheres negras ganham R$694,00, enquanto os homens negros ganham R$1.037,00 e as mulheres não-negras, R$1.062,00. Recife tem o menor rendimento dos assalariados negros: R$263,00 para as mulheres e R$417,00 para os homens


Rendimento médio mensal dos ocupados, por sexo e cor - DF1 e Recife - 2001 Distrito Federal

Recife

1.800

Em R$- janeiro a junho/2001

1.600 1.400 1.200 1.000 800 600 400 200 0 Mulher branca

Homem branco

Mulher negra

Homem negro

Fonte: Boletim DIEESE. “20 de Novembro - Dia Nacional da Consciência Negra”, ed. especial de novembro de 2001. 1 Valores em Reais de maio de 2001

Em termos do índice denominado rendimento-hora médio mensal dos ocupados, dados da PED de 1999, comprovou-se, igualmente, que os índices referentes às mulheres negras são os mais baixos do mercado, tomando-se como base os rendimentos dos homens não-negros. No DF, as mulheres trabalhadoras negras recebem 66,7% do rendimento hora médio mensal auferido pelos homens não-negros, enquanto em Salvador, elas recebem apenas 49,4% ( DIEESE. A Situação do Trabalho no Brasil. São Paulo,2001 ). A posição na ocupação também caracteriza a desigualdade étnica sofrida por estas trabalhadoras, que se encontram, em sua maioria, inseridas nas funções de trabalho menos valorizadas e de menor remuneração, como é o caso do emprego doméstico e

de outras também denominadas como trabalho vulnerável. Dentre as regiões pesquisadas, o Distrito Federal apresenta o menor índice (32,6%) de trabalhadores negros em situação de vulnerabilidade, sendo de índice de 40,4% o das mulheres negras nessa situação, maior que o dos homens negros (26,3%), frente ao dos trabalhadores não-negros (23,7%) e ao das mulheres nãonegras (27,3%) Conclusão Não se poderia deixar de concluir esse artigo sem lembrar que a mulher subiu ao palco dirigida pela dinâmica de um mercado de trabalho que retirou de cena centenas de atores principais, homens e mulheres que ficaram em situação de desemprego nos últimos 10 anos, ou mantiveram seus empregos, poRevista de conjuntura

31

rém continuaram mais pobres, ou foram forçados a realizar trabalhos em situação de extrema precariedade, tanto do ponto de vista da remuneração quanto da própria relação de trabalho. O congelamento dos salários dos servidores públicos federais, por sete anos, atingiu em cheio aqueles que residem no Distrito Federal, obrigando-os a criarem novas estratégias de sobrevivência familiar, que incluíam o ingresso dos demais membros da família no mercado de trabalho, não importando se na condição de assalariados ou não assalariados. Surgem então as novas trabalhadoras autônomas, as novas empregadoras, as novas assalariadas do setor privado, com ou sem carteira assinada pelo empregador, que também foi afetado pela crise da falta de dinheiro em circulação, passando a oferecer salários mais baixos que os anteriores.

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As empregadas domésticas “migram” para os postos de trabalho assalariados com carteira assinada, multiplicados pelas empresas de conservação e limpeza contratadas pelo setor público, enquanto este estimula, com os Planos de Demissão Voluntária, a troca do emprego público pela abertura de negócios novos, sujeitos ao alto risco de “quebrarem” antes de completar um ano de funcionamento. As donas de negócio familiar e trabalhadoras familiares sem remuneração passam a procurar empregos que as retirem da condição de trabalhadoras vulneráveis e as transformem em assalariadas sub-remuneradas. Criamse frentes de trabalho e políticas passivas de emprego, que desestimulam o ingresso de jovens no mercado de trabalho. A substituição dos atores principais, retirando suas oportunidades de trabalho, demitindo-os com a justificativa da reestruturação produtiva, conseqüência do avanço tecnológico, têm alteradas suas identidades de chefes de família, de pais ou mães responsáveis economicamente pelo sustento da família, e cedem passagem para quem era coadjuvante até aquele momento: mulheres e filhas dedicadas somente aos afazeres domésticos e aos estudos. A elevação da taxa de desemprego do Distrito Federal, particularmente a dos chefes de família, desencadeou um processo de procura por trabalho que vem aumentando o desemprego no Distrito Federal, ainda que se formulem projetos de criação de empregos, ou que estes efetivamente sejam gerados.

A criação de novos postos de trabalho, por mais precários que sejam, funciona como um poder de atração, principalmente sobre os imigrantes do Entorno próximo ou do Nordeste, que passam a residir no Distrito Federal com a esperança de encontrar, desde o emprego doméstico que os remunere com um salário superior ao mínimo, até a chance de serem aprovados num concurso público destinado principalmente ao nível médio. A busca pela terra, no caso um lote para morar, funciona como motivo de atração, confirmando as teorias sociais sobre as migrações internas, que afirmam que são classes sociais que migram, e não indivíduos Como fatores de expulsão, constata-se que não é por coincidência que ocupados e desempregados do Distrito Federal tenham vindo da Bahia, cuja região metropolitana possui a taxa de desemprego mais alta das regiões pesquisadas pela PED, ou de Minas Gerais, sendo a região metropolitana de Belo Horizonte a que registra os salários mais baixos dessas regiões pesquisadas. Finalmente, os imigrantes de Goiás, onde se localiza a maioria dos Municípios do Entorno próximo, ultrapassam apenas divisas virtuais para trabalharem no Distrito Federal. Nesse ponto reside um dos maiores problemas para a análise do mercado de trabalho do Distrito Federal: não se tem conhecimento de quantos postos de trabalho são gerados no DF e ocupados pelos moradores da região do Entorno. Espera-se que um dia se resolva essa importante lacuna. Pela proximidade do Entorno, as mulheres in-

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gressam no mercado de trabalho do Distrito Federal, sem dificuldades de deslocamento espacial, ocupando parte dos postos de trabalho aqui existentes. Em relação aos rendimentos, conclui-se que “os anos 90 não foram bons para os trabalhadores do ponto de vista dos rendimentos. A instabilidade econômica, que caracterizou esse período, teve fortes impactos sobre o mercado de trabalho, com conseqüências negativas sobre as remunerações. Verificou-se uma piora na distribuição funcional da renda (...) e uma perda no poder aquisitivo dos ocupados e assalariados. Apesar da melhora na distribuição dos rendimentos do trabalho observada no período, esta não se deu através de um aumento de renda dos pobres, mas sim de uma perda menos acentuada que a das faixas mais altas de rendimentos. A recuperação do salário mínimo verificada na segunda metade da década, principalmente devido à queda das taxas de inflação, foi tênue, incapaz de compensar a forte corrosão sofrida na fase de aceleração inflacionária anterior. Vale relembrar que o salário mínimo chega ao final de 1999 valendo 2/3 do que valia em 1989 e com poder aquisitivo próximo de ¼ do que possuía na época de sua instituição em julho de 1940. Merece ainda ser destacado o processo atual de flexibilização espúria das relações de trabalho, que ganha espaço nos anos 90 e que se desdobra em formas de contratação precárias e na maior autonomia das empresas para usar e remunerar a força de trabalho. Fruto da instabilidade que cerca as economias capitalistas, esse cenário de deterioração das condições de


trabalho é agravado pelas políticas econômicas implementadas ao longo da década no País, que resultaram na estagnação da renda por habitante e na perda de renda para o conjunto de trabalhadores” (DIEESE. A Situação do Trabalho no Brasil. São Paulo,2001).

Finalmente, dois grandes temas mereceriam estudos especiais: as possíveis conseqüências de alterações da CLT, que agravarão o quadro de desigualdades existentes entre homens e mulheres no mundo do trabalho. A revisão do artigo 618 da CLT poderá

retirar direitos trabalhistas, inclusive os conquistados há mais de meio século pela mulher trabalhadora. O outro seria o aumento do processo de terceirização do setor público e suas conseqüências para os trabalhadores e trabalhadoras do Distrito Federal.

Bibliografia BOLETIM Especial DIEESE. A Situação das Trabalhadoras Brasileiras. São Paulo: DIEESE, mar, de 2002. BOLETIM Especial DIEESE. 20 de Novembro, Dia Nacional da Consciência Negra. São Paulo: DIEESE, nov. de 2001. BRUSCHINI, Cristina; LOMBARDI, Maria Rosa. A Dupla Face do Trabalho Feminino no Brasil: o Emprego Doméstico e as Novas Ocupações. In: Informe PED Mulher – Mulher e Trabalho, Informações Estatísticas, Porto Alegre, 2000. BRUSCHINI, Maria Cristina A.; ROSEMBERG, Fúlvia (Org.). Trabalhadoras do Brasil. Fundação Carlos Chagas. São Paulo, Brasiliense, 1982. DIEESE. A Situação do Trabalho no Brasil. São Paulo, DIEESE, 2001. GARCIA, Lúcia. A inserção da Mulher no Mercado de Trabalho da RMPA: Uma Nota Introdutória. In: Informe PED Mulher – Mulher e Trabalho, Informações Estatísticas, Porto Alegre, 2000. GIRARD, Christiane e THEODORO, Mário. Violência no Informal: o trabalho doméstico e o comércio de Rua. In Violência e Trabalho no Brasil. José Fernando da Silva, Ricardo Barbosa de Lima e Sadi dal Rosso (organizadores) . Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH), Editora UFG, Goiânia, 2001. Pesquisa de Emprego e Desemprego no Distrito Federal. Convênio DIEESE, Fundação SEADE/SP e Secretaria de Trabalho e Direitos Humanos do DF ( STDH). Médias Anuais, 1992 a 2001 (mimeo). Brasília, DF OHANA, Maria da Graça e LENO, Max. Evolução do Mercado de Trabalho no Distrito Federal - 1992/1999. In Revista de Conjuntura, CORECON/DF e SINDECON/DF, Ano I – número 2 ABRIL/JUN de 2000.Brasília,DF

* Irma Cavalcante Sátiro Economista da PED-DF, Membro do Corecon-DF e Sindecon-DF ** Karla de Lima Rocha Economista da PED-DF *** Maria da Graça Ohana Pinto Mestre em Sociologia, Coordenadora Técnica da PED-DF pelo DIEESE **** Míriam F. S. Chaves Ferreira Estatístico da PED-DF ***** Valéria Maria Rodrigues Fechine Mestre em Estatística, Coordenadora Técnica da PED-DF

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A R T I G O

Da proposta de alteração da poupança Luciano Fazio *

1 - Introdução Diante da queda de participação da poupança no total de depósitos bancários, em janeiro de 2002 o presidente do Banco Central (BACEN), Armínio Fraga, sugeriu mudanças nas regras da caderneta de poupança, a mais popular das aplicações financeiras no País. Não foi apresentada uma proposta acabada, mas apenas linhas gerais de alteração: (a) rendimentos maiores, comparáveis com os dos fundos de investimento, visando aumentar a oferta de crédito imobiliário;

(b)fim da isenção do pagamento do Imposto de Renda (IR) sobre os ganhos financeiros; e (c) os mutuários de novos planos de financiamento habitacional poderiam deduzir os juros pagos nas prestações na declaração de ajuste anual do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). Apesar do considerável crescimento dos depósitos totais no Sistema Financeiro Nacional (SFN), de R$ 238,2 bilhões para R$ 452,9 bilhões, entre 1998 e 2000 (cerca de 90%), os de poupança ficaram

estacionados por volta de R$ 110 bilhões no período, e a participação deles sobre o total, de 45% em 1998, baixou para menos de 25% em 2000. Pelo contrário, os depósitos em fundos tiveram um crescimento espetacular no período, representando, hoje, 46% do total (ver Tabela 1). Entre os depósitos de poupança, distinguem-se os ligados ao Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), destinados aos financiamentos imobiliários, que respondem atualmente por cerca de 82% do total, e os da Poupança Rural,

Tabela 1 - Depósitos no Sistema Financeiro Nacional (1998-2000) (em R$ bilhões) 1998 Tipo a Vista de Poupança a Prazo em Fundos: FAF, FIF, FRF Total

Valor

1999

Part. %

2000

Valor

Part. %

Valor

Variação %

Part. %

99/98

00/99

29,5

12,8

36,7

9,60

45,4

10,02

24,41

23,71

107,4

45,09

110,7

28,97

111,7

24,66

3,05

0,90

93,9

39,42

91,6

23,97

87,6

19,34

-2,45

-4,37

7,4

3,11

143,1

37,45

208,2

45,97

1.833,78

45,49

238,2

100,00

382,1

100,00

452,9

100,00

60,40

18,53

Fonte: BACEN

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dirigidos a financiamentos agropecuários, responsáveis pelos 18% restantes. A diminuição do volume dos depósitos do SBPE fica mais evidente, caso considerem-se os valores em poder aquisitivo constante (ver Gráfico 1). 2- Caderneta de Poupança: breves explicações A poupança é uma aplicação financeira a que o cliente tem acesso mesmo sem ser titular de uma conta corrente bancária. Ela paga um rendimento de 0,5% ao mês (ou 6,17% ao ano), sendo ainda corrigida mo-

“A poupança é uma aplicação

financeira a que o cliente tem acesso mesmo sem ser titular de uma conta corrente bancária”. netariamente através da Taxa Referencial (TR)1 . A correção da caderneta varia a cada dia, de acordo com a quantidade de dias úteis no mês e a oscilação da TR no período. A remuneração da poupança é creditada mensalmente, para pessoa física

ou pessoa jurídica sem fins lucrativos; já para as empresas, o crédito é trimestral. Essas regras são estabelecidas por lei2 e, portanto, alterações das mesmas não decorrem de resoluções do Banco Central, mas cabem ao Congresso Nacional.

Gráfico 1 Saldos da Poupança do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (Saldo de 01.08.94=100 e valores de poder aquisitivo constante, deflacionados pelo IGP-DI) 180 dez-98 170 jun-99 160

jun-98 dez-97

150

dez-99 jun-00

140

jun-97 dez-00

130 dez-96

120 dez-95

120 100

jun-01 dez-01

ago-94

jun-96

jun-95

dez-94 90

Fontes: Banco Central e Fundação Getúlio Vargas (FGV) 1 Essa taxa, além de ser utilizada para a correção monetária da poupança, atualiza monetariamente também as contas dos financiamentos habitacionais do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), bem como o saldo das contas vinculadas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Desde abril de 1999, a TR passou a valer 65% da Taxa Básica Financeira (TBF, resultado da média de emissões de certificados de depósitos bancários em determinado período) líquida, ou seja, descontado do seu cálculo o Imposto de Renda. O novo cálculo - que leva em consideração todos os dias do mês, inclusive os não-úteis - foi posto em prática para diminuir a instabilidade da TR e as flutuações entre a remuneração da caderneta de poupança e a dos depósitos a prazo (CDB e RDB). 2 Lei 8.177, de 01 de março de 1991, artigo 12.

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Tabela 2 - Distribuição de Saldos e de Depositantes da Caderneta de Poupança N.º Cadernetas (em mil) 22.942

Faixa de Valor até R$ 100,00

% 48,84

Valor (R$ milhões) 422

% 0,37

de R$ 100,01 a R$ 500,00

8.859

18,86

2.182

1,93

de R$ 500,01 a R$ 1.000,00

3.758

8,00

2.673

2,37

de R$ 1.000,01 a R$ 5.000,00

7.085

15,08

16.417

14,55

de R$ 5.000,01 a R$ 10.000,00

1.965

4,18

13.734

12,17

de R$ 10.000,01 a R$ 20.000,00

1.245

2,65

17.279

15,32

de R$ 20.000,01 a R$ 30.000,00

458

0,98

11.075

9,82

Mais de R$ 30.000,00

658

1,40

49.039

43,47

46.970

100,00

112.821

100,00

Total

Fonte: BACEN e Assoc. Bras. de Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (ABECIP) Dados de junho 2001.

Quanto ao valor mínimo de aplicação, ele é definido pelos bancos. No entanto, quase a metade dos 47 milhões de cadernetas tem saldo não superior a R$ 100,00 (ver Tabela 2), caracterizando essa aplicação como de fácil acesso à população. A abertura de uma caderneta pode ser feita em qualquer dia do mês; porém, as contas abertas nos dias 29, 30 e 31 começam a

valorizar a partir do dia 1º do mês seguinte. A remuneração é mensal e incide sobre o menor saldo aplicado no mês. Ou seja, se o investidor sacar parte da aplicação antes do aniversário do depósito, perde os rendimentos sobre o que foi sacado. Os depósitos em poupança são garantidos pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC) em até R$ 20 mil de um mesmo

aplicador em cada instituição financeira. Na Caixa Econômica Federal (CEF), há garantia, pela União, sobre o total dos depósitos 3 . Para pessoas físicas e jurídicas não-tributadas, os ganhos financeiros são isentos de Imposto de Renda (IR). Pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real têm de pagar IR apenas no ato da declaração de rendimentos.

Quadro 1 - Direcionamento das aplicações da poupança do SBPE %

Observações

Financiamento imobiliário

65

Encaixe BACEN

15

No mínimo 80% dessa parcela, ou 52% do total, devem ser aplicados em operações do SFH a uma taxa máxima de TR mais 12% ao ano. O restante (13% do total) pode ser aplicado em operações a taxa de mercado, desde que, no mínimo, a metade em operações de financiamentos imobiliário. Nos financiamentos imobiliários podem ser incluídos também os títulos do Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS) que os bancos mantêm em suas carteiras4 . Pelo contrário, os novos títulos CVS, obtidos mediante a troca dos créditos junto ao FCVS (Lei n.º 10.150, de 21.12.2000), não podem ser considerados como financiamentos habitacionais. Trata-se de recolhimentos junto ao BACEN, como depósito compulsório.

Disponibilidades e faixa livre

20

Essa parcela pode ser aplicada livremente pelos bancos, possibilitando maiores retornos financeiros.

Destinação

Fonte: Banco Central, Resolução n.º 2.706, de 30.03.2000 3 Decreto-lei n.º 759, art.2º, letra “a”. 4 Os desequilíbrios do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), originados principalmente pela concessão de subsídios para os mutuários não acompanhada por desagravos correspondentes nas obrigações do SFH, foram onerando cada vez mais o Fundo de Compensações de Variações Salariais (FCVS), criado em 1967 com objetivo de compensar os eventuais saldos devedores residuais de financiamentos em que a obrigação do mutuário era apenas a de pagar o número total das prestações. Os contratos assinados após 1993 deixaram de ter esse tipo de cobertura.

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A aplicação pelos bancos dos depósitos de poupança não é livre, mas subordinada a normativos da autoridade monetária. As atuais regras sobre o direcionamento dos recursos de poupança pelos integrantes do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) constam no Quadro 1.

3 - A Situação Atual do Direcionamento dos Recursos da Poupança É difundida a opinião pela qual os bancos não estariam aplicando em habitação todos os recursos exigidos pelos normativos vigentes. No entanto, conforme audito-

ria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU)5 , não há irregularidades perante o BACEN, pois as instituições financeiras, com R$ 90,3 bilhões em depósitos de poupança, excedem o nível mínimo de direcionamento de 65% em financiamentos habitacionais em R$ 22,7 bilhões, ou seja, o

Tabela 3 - Posição das Aplicações dos Agentes Financeiros dentro do SFH (maio de 2001) Em R$ milhões CEF

Outras Instituições

Total do Mercado

Depósitos em Poupança pelo SBPE*

30.324

60.003

90.327

Aplicações Habitacionais

49.320

44.365

93.685

• Imóveis Residenciais

15.917

14.228

30.145

• Financiamento à produção

0

2.851

2.851

• Letras hipotecárias adquiridas

0

2.828

2.828

3.744

283

4.027

832

554

1.386

28.814

20.512

49.126

13

3.109

3.122

9.999

2.215

12.214

• Operações c/ repasse e financiam.

0

145

145

• Operações de fundos e programas

0

8

8

9.999

2.062

12.061

Total líquido das operações

39.321

42.150

81.471

Exigibilidade 65%

19.711

39.002

58.713

Excesso de aplicações

19.610

3.148

22.758

• Crédito da dívida FCVS novada (estoques) • Imóveis habitacionais não alienados • Crédito junto ao FCVS • Outros Deduções

• Letras hipotecárias emitidas Exigibilidades

Fonte: Caixa Econômica Federal, em Diário Oficial da União, 12.11.2001, p. 66 * Os depósitos da poupança rural não estão incluídos.

mercado está “superaplicado”, com base em dados de maio 2001 (ver Tabela 3). Essa “superaplicação” explica-se pelo elevado volume (R$ 49 bilhões) de créditos junto ao FCVS em poder dos bancos. Em outras palavras, eles ficaram com

o ônus dos resíduos do saldo devedor dos contratos habitacionais amparados pelo Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional (PES/CP), pois esses contratos previam uma proteção ao mutuário, impedindo corrigir as prestações acima dos reajustes

salariais, inviabilizando, na grande maioria dos casos, a quitação da dívida com o pagamento da última prestação. Esses saldos residuais constituíram-se em créditos junto ao FCVS e asseguraram às instituições financeiras o cumprimento da exigência

5 Ver Diário Oficial da União, 12.11.2001, seção 1, páginas 64 a 67.

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“Assim, a superaplicação do mercado

está terminando, se já não terminou. E, ainda, podem-se fazer previsões quanto à oferta futura de crédito habitacional pelo sistema financeiro”. de direcionamento dos recursos da poupança. Neste estudo, não interessa apenas analisar a regularidade do comportamento dos bancos, mas também a capacidade do Sistema Financeiro da Habitação em garantir recursos para novos financiamentos habitacionais. Os créditos junto ao FCVS configuramse como “pendências” de contratos antigos, sendo uma saída para as dificuldades no pagamento das prestações, que beneficiou os mutuários. (Em geral, os salários dos titulares dos contratos cresciam a taxas inferiores às das prestações da casa própria.) Por outro lado, essa solução, além de onerar a União, também reduziu os recursos disponibilizados pelo sistema financeiro para novos financiamentos. De fato, pela Tabela 3, em maio de 2001, o montante aplicado em imóveis residenciais representava cerca da metade do exigido pela Resolução nº 2.786, do BACEN, confirmando a percepção da opinião pública quanto à escassez de novos financiamentos. Por quanto tempo ainda essas “pendências” continuarão redu-

zindo o volume de novas aplicações em imóveis residenciais ? Em setembro de 1996, o Governo Federal, através da MP nº 1.520, deu um tratamento aos compromissos do FCVS, permitindo que fossem objeto de novação, ou seja, fossem convertidos em uma outra obrigação que extinguisse a primeira dívida. Dessa forma, foi facultada a troca dos créditos junto ao FCVS por novos títulos federais, que, no entanto, não podem mais ser considerados como passíveis de direcionamento a financiamentos habitacionais. O citado relatório do TCU informa quanto ao andamento dessa troca e estima prazos para a solução dessas “pendências”. Em particular, afirma: “(...) uma vez que esses créditos vêm sendo homologados e novados pelo Governo Federal em cerca de R$ 10 bilhões ao ano, provavelmente, já no final de 2001, as folgas hoje existentes serão absorvidas pelos títulos CVS, o que obrigará os agentes a redirecionarem suas captações em cadernetas de poupança para financiamentos em habitação”

Assim, a superaplicação do mercado está terminando, se já não terminou. E, ainda, podemse fazer previsões quanto à oferta futura de crédito habitacional pelo sistema financeiro. Mesmo que o volume de captação de poupança se mantenha constante em termos nominais, a absorção das “pendências” do FCVS pelo novos títulos CVS, a um ritmo de R$ 10 bilhões ao ano, deve assegurar disponibilidades adicionais anuais da mesma ordem de grandeza para novos financiamentos habitacionais. 3.1 - O FCVS “virtual”. Quanto à capacidade de o SFH prover recursos para o crédito imobiliário, deve ser lembrado que, entre 1995 e 1996, por ocasião da construção do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (PROER), o BACEN, os bancos em dificuldade e outras instituições financeiras definiram arranjos que subtraem até hoje recursos da poupança da destinação habitacional obrigatória. Em particular, o jornal “O Valor Econômico” 6 divulgou que: “(...) no caso dos bancos privados, quase todo o FCVS, que ajuda a cumprir o direcionamento dos recursos de poupança, é ‘virtual’.”, informando que, em agosto de 2001, 88% dos R$ 16,56 bilhões aceitos pelo BACEN como aplicação obrigatória de bancos privados em habitação não estavam na carteira dos mesmos, já tendo sido vendidos aos Bancos Nacional, Econômico e Mercantil de

6 Izaguirre, Mônica. “Habitação perde recurso barato”, em “O Valor Econômico”, 07.03.2001, e “Herança do Proer limita crédito”, no mesmo jornal, em 12.11.2001.

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Pernambuco, quando eles foram socorridos pelo PROER7 . E, ainda, explicou que: “Como a operação era de interesse do governo, o BACEN permitiu que, mesmo depois de vendidos, os créditos continuassem a integrar o mapa de aplicações habitacionais obrigatórias de seus antigos donos”. A justificativa do então presidente do BACEN, Gustavo Loyola, é que “não dava para exigir dos bancos a recomposição das carteiras imobiliárias de uma hora para outra”, confessando, porém, que “a idéia original era fazer disso uma situação provisória”. Não foi isso que aconteceu. Em março de 2001, o diretor de normas do BACEN, Sérgio Darcy, admitiu que “não há sequer um cronograma para que os créditos habitacionais vendidos saiam do ‘mapa quatro’ de quem os vendeu”. Assim, essa solução provisória e emergencial foi prorrogada por prazo indeterminado, mesmo após o fim da crise bancária, apesar de ela reduzir o volume de crédito habitacional ofertado pelo Sistema, em cerca de R$ 14,5 bilhões. Significativamente, não há menção a essa situação pelo BACEN, nem mesmo na

hora em que a própria Instituição sugere medidas para aumentar a oferta de recursos para financiamentos habitacionais. Os bancos que venderam créditos FCVS aos socorridos pelo PROER fizeram um ótimo negócio, pois, além do valor recebido pela venda, que se traduziu diretamente em lucro, sendo que esses ativos já tinham sido provisionados, obtiveram também a permissão de aplicar até hoje boa parte de sua captação em poupança, recurso dos mais baratos, sem os vínculos do direcionamento para a habitação, podendo obter maiores retornos. Infelizmente, não são disponíveis informações mais atualizadas com relação à posição das aplicações dos agentes financeiros do SFH, após a reestruturação patrimonial da Caixa Econômica Federal8 . No âmbito desse Programa, a CEF realizou, dentre outras operações, a cessão da totalidade da carteira de crédito imobiliário com cobertura e de parte da carteira sem cobertura do Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS) para a Empresa Gestora de Ativos (EMGEA), pelo valor contábil de R$ 26,6 bilhões, líquido de provisões. Em 30.06.2001, os financia-

mentos imobiliários da carteira de crédito da CEF totalizavam R$ 12,1 bilhões, contra os R$ 50,6 bilhões aplicados nessa modalidade em 30.06.20009 . Mesmo assim, em novembro de 2001, o diretor financeiro da Instituição, Valdery Albuquerque, declarou que o banco continuava cumprindo as normas de direcionamento ao crédito habitacional10 . 4 - A Rentabilidade da Poupança A poupança, ao contrário da maioria de aplicações de renda fixa, tem uma remuneração definida por lei (0,5% ao mês), sem maiores relações com a taxa básica de juros (taxa Selic). No país com a taxa real de juros mais elevada do mundo, freqüentemente avalia-se essa remuneração como insuficiente, tendo por base uma comparação com outras opções de aplicação disponíveis no mercado (ver Tabela 4). Entretanto, hoje, um rendimento real de 6% ao ano, livre de impostos, é muito superior aos juros pagos pelos bancos centrais da maioria dos países industrializados. A título de exemplo, nos Estados Unidos, a taxa básica está

Tabela 4 - Rendimento Anual de Aplicações Financeiras Selecionadas Ano 1999 2000 2001**

Poupança 12,25% 8,39% 7,84%

CDB-PRÉ (30 dias) 21,50% 14,07% 13,20%

Overnight (Selic)* 26,12% 17,59% 17,35%

CDI Over* 25,65% 17,47% 17,29%

* Média do período ** Até novembro 2001 Fonte: “Conjuntura Econômica” , janeiro de 2002 7 Segundo o diário “O Valor Econômico”, os bancos que venderam FCVS nessa oportunidade foram pelo menos sete: Bradesco, Itaú, Unibanco, Nossa Caixa, BCN, Safra e Real. 8 Programa de Fortalecimento das Instituições Financeiras Federais, MP nº 2.155, de 22-06-2001. 9 Ver Nota Explicativa n.º 7, item “a”, das demonstrações contábeis de 30.06.2001. 10 “O Valor Econômico”, 12.11.2001, página C1.

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atualmente fixada em 1,75% ao ano, sem direito à correção monetária. Na Europa, ela está em 3,25% ao ano. Não cabe alegar que essa diferença de remuneração decorreria do risco, pois, no caso da poupança, a União garante 100% do depósito, se este for efetuado na CEF. O fato é que, nos países centrais, os juros são fixados em função do quadro nacional, podendo até ser inferiores à taxa de inflação, se o cenário for de estagnação ou de recessão.

Qualquer proposta de acréscimo da remuneração das cadernetas de poupança implica em impactos nos bancos e para os tomadores finais dos financiamentos habitacionais. Em 1994, ainda em tempos de inflação elevada e de indexação da economia, a ABECIP calculava o custo de captação da poupança desconsiderando a correção monetária (ou seja, a TR), chegando ao valor de 9,51% ao ano (ver Tabela 5),

sendo que a média ponderada da taxa nominal dos financiamentos habitacionais, no âmbito do SFH, encontra-se em 9,16% ao ano, também em moeda de pode aquisitivo constante. Assim, supondo que o valor da referida média ponderada esteja atualizado, justifica-se a garantia da Resolução n.º 2.706, do BACEN, aos bancos, de uma aplicação livre de 20% dos recursos captados, assegurando dessa forma o

Tabela 5 - Demonstrativo de Custos Médios dos Agentes Financeiros Especificação de Custos

% anuais

Custo Financeiro (remuneração do depósito)

6,17%

Contribuição ao Fundo de Garantia de Depósitos e Letras Imobiliárias: 0,07% a.m.

0,84%

Custos Operacionais

2,50%

Custo Total de Captação

9,51%

Fonte: ABECIP, “O Sistema Financeiro da Habitação em seus 30 anos de existência - Realizações, Entraves e Novas Proposições”, abril de 1994, vol. 1, fl. 025.

interesse na caderneta de poupança por parte dos agentes financeiros privados. A atual sugestão do BACEN, de aproximar a remuneração da poupança à dos fundos de investimento, é ainda muito genérica, não podendo ser objeto de avaliação precisa. Entretanto, em 2001, esses fundos pagaram ao aplicador rendimentos por volta de 17% ao ano, contra os 8,59% da poupança. No caso hipotético em que a poupança chegue a igualar o rendimento desses fundos, a elevação dos custos financeiros dos bancos deve provocar um crescimento muito expressi-

vo nos juros das prestações da casa própria. Nessas hipotéticas condições, talvez haveria um incremento nos recursos disponíveis por parte dos bancos, mas, por outro lado, com boa probabilidade, ocorreria uma significativa contração na demanda por financiamentos. De fato, conforme declarações à imprensa do assessor técnico da Associação Brasileira de Entidades de Crédito Imobiliário e de Poupança (ABECIP), Sr. José Pereira, o problema do crédito habitacional não seria de oferta, mas de demanda: “Faltam

tomadores interessados com capacidade de pagamento” 11 . 5 - A Dedução dos Juros da Casa Própria na Declaração de IR do Mutuário O BACEN sugere a cobrança do Imposto de Renda sobre os ganhos da caderneta de poupança (alíquota de 20%), bem como a possibilidade de o mutuário lançar os juros pagos nas prestações da casa própria como dedução na declaração de ajuste anual do IRPF. A dedução teria caráter compensatório, aliviando o aumento das prestações provocado pela maior remuneração da poupança.

11 Izaguirre, Mônica. “Habitação perde recursos barato”, em “O Valor Econômico”, 12.11.2001, página C1

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Em que pese os termos ainda genéricos da discussão, está claro que a adoção das sugestões do BACEN implicaria em um aumento de arrecadação por parte da União. De fato, a partir da implementação das mudanças, haveria a imediata cobrança do IR sobre os ganhos de todas as cadernetas de poupança, ao passo que a possibilidade de deduções dos juros pagos pelos mutuários valeria apenas para os novos contratos, cujo estoque ficaria limitado nos primeiros anos com relação à captação total da poupança. Não haveria redução de arrecadação por parte da União, contudo, mesmo na hipótese não realista de que os recursos direcionados para novos contratos de financiamento imobiliário residencial atingissem 65% da captação de poupança, e que todos os mutuários tivessem rendimentos mensais acima de R$ 2.115,00, podendo usufruir efetivamente da maior dedução possível na declaração anual de ajuste do IRPF. Se não, vejamos. Suponha-se que os depósitos totais de poupança no País sejam de R$ 100 bilhões e que, uma vez adotadas as alterações do tipo sugerido pelo BACEN, os juros pagos pelos mutuários da casa própria passem para 19% ao ano. Calculadora na mão, os juros pagos pelos mutuários alcançariam R$

“Em que pese os termos ainda

genéricos da discussão, está claro que a adoção das sugestões do BACEN implicaria em um aumento de arrecadação por parte da União”. 12,35 bilhões, e a dedução máxima do IRPF dos mutuários seria limitada pelo teto de R$ 3,396 bilhões (27,5% de R$ 12,35 bilhões). Ainda, na hipótese de que os rendimentos da poupança fossem para 17% ao ano, a arrecadação garantida à União seria exatamente de 20% desses ganhos (R$ 3,4 bilhões). Na mesma linha, a coluna do jornalista Celso Pinto estima que a União aumentaria sua arrecadação em cerca R$ 1,5 bilhão ao ano12 . Quanto aos mutuários, os impactos da proposta do BACEN são diferenciados, pois eles não são contemplados da mesma forma pela compensação sugerida. Em particular, a maioria dos empregados do País é isenta do pagamento de IR, pois seus rendimentos mensais não superam R$ 1.058,00, ou 5,88 salários mínimos13 . Assim, os trabalhadores sofreriam

o ônus do aumento da remuneração da poupança, mas, na sua maioria, não seriam beneficiados pela medida compensatória em questão. Os cidadãos com menores rendimentos seriam, portanto, os maiores perdedores e, em geral, o acesso ao financiamento da casa própria ficaria prejudicado, quando não inviabilizado. Quanto aos mutuários com rendimentos incluídos na faixa mais elevada da tabela do IRPF, eles também não têm ganhos com a proposta do BACEN, pois a compensação ficaria sempre inferior ao ônus do aumento dos juros nas prestações. Uma simulação apresentada a seguir justifica essa afirmação, mesmo tendo escolhido um aumento de taxa de juros de apenas 50%, ainda insuficiente para aproximar a rentabilidade da poupança à dos fundos de inves-

12 Pinto, Celso. “O desmonte do SFH gera controvérsias”, em “Folha de S.Paulo”, 31.01.2002. 13 Conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra por Domicílios (PNAD) de 1999, do IBGE, o rendimento médio mensal dos empregados é de 3,7 salários mínimos. Nas três categorias que compõem o contingente dos empregados, o rendimento médio situouse em 4,1 salários mínimos para os empregados com carteira de trabalho assinada, 6,0 salários mínimos para os militares e estatutários e, apenas, 2,1 salários mínimos para os empregados não registrados.

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timento. A simulação compara valor das prestações, montante de juros e redução do valor do IR para mutuários da maior faixa de rendimentos na situação atual, e numa situação hipotética, com as mudanças do tipo sugerido pelo BACEN em vigor. Considera-se primeiramente um mutuário que, pelas regras atuais, tenha recebido um financiamento de R$ 50.000,00 a uma taxa de juros de 12% ao ano, a ser pago em 120 meses pela Tabela Price14 , uma das modalidades utilizadas nos fi-

nanciamentos habitacionais da CEF (Caso 1). Sucessivamente, considera-se a mesma situação, na hipótese em que: (a) os juros tenham crescido para 18% ao ano e (b) na declaração do IRPF se deduzam os juros pagos para a casa própria (Caso 2). Pela especificidade da modalidade de amortização escolhida, a prestação é constante, mas a parcela de juros nela embutidos decresce mês a mês. Assim, no presente cálculo, opta-se por considerar o total dos juros pagos pelo mutuário ao longo dos 120

meses e o total da redução do IRPF, também ao longo de todo o período. Supõe-se, ainda, que a primeira prestação seja paga pelo mutuário no mês de janeiro. A Tabela 6 apresenta o resultado dos cálculos. Nas hipóteses definidas, um aumento de 50% da taxa de juros implicaria em um acréscimo de 61% nos juros pagos pelo mutuário ao longo dos 10 anos. Os juros adicionais pagos no Caso 2, - cerca de R$ 22 mil -, são muito superiores à compensação máxima possível, que é de R$ 15.980,56.

Tabela 6 - Comparação entre as Regras Atuais e uma Hipótese de Mudança Caso 1

Caso 2

Variação

R$ 717,35

R$ 900,93

25,59%

R$ 36.082,57

R$ 58.111,12

61,05%

Valor da prestação Total dos juros pagos nos 120 meses Redução máxima do IR (alíquota de 27,5%)

6 - Considerações Finais A sugestão do BACEN de alterar as regras da poupança, com destaque para o aumento da remuneração, requer mais debate por parte da sociedade. Em particular, ela não foi suficientemente justificada no tocante a seu principal objetivo, de proporcionar um efetivo aumento dos financiamentos imobiliários. Em particular, o diagnóstico divulgado pela imprensa e atribuído ao BACEN,

R$ 15.980,56

desconsidera elementos importantes, que colocam dúvidas quanto à urgência e à oportunidade de alterações nesse momento. A saber: 1º. existe uma tendência de crescimento de novos financiamentos habitacionais, mesmo na hipótese de um comportamento estável da captação de poupança pelo SBPE, em conseqüência da solução gradativa das “pendências” de contratos antigos do SFH (os

direitos dos agentes financeiros contra o Fundo de Compensação de Variações Salariais, decorrentes dos resíduos do saldo devedor após o pagamento da última prestação pelo mutuário). A estimativa do TCU é que cerca de R$ 10 bilhões ao ano de títulos do FCVS vêm sendo trocados por novos títulos públicos CVS. Esses últimos, entretanto, não podem ser considerados como financiamentos ha-

14 Pela Tabela Price, que é um caso específico da modalidade de amortização conhecida como Sistema Francês, o mutuário se obriga a pagar o principal mais os juros em prestações iguais entre si e periódicas, a uma taxa de juros em termos nominais anuais, mas pagos mensalmente.

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bitacionais para o fim do cumprimento da Resolução n.º 2.706, do BACEN (direcionamento da captação de poupança), o que implica na necessidade da concessão de novos créditos habitacionais pelos bancos; 2º. pode-se garantir um aporte adicional de recursos, da ordem R$ 14,5 bilhões, para o crédito imobiliário, caso o BACEN resolva o problema do FCVS “virtual”, retirando a permissão para que vários bancos mantenham no mapa das aplicações habitacionais os créditos junto ao FCVS, mesmo após têlos vendido a instituições socorridas pelo PROER; 3º. uma maior remuneração da poupança poderia aumentar a oferta de recursos para financiamentos imobiliários, mas, por outro lado, deve reprimir a demanda de crédito em função do excessivo ônus financeiro sobre o mutuário. Nesse sentido, a medida seria pouco eficaz para solucionar o problema habitacional do País; 4º. quando se fala em ‘funding’ para o crédito imobiliário, não se pode esquecer que, além da captação da caderneta de poupança, há também a poupança compulsória, constituída pelos depósitos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), que atualmente destina mais de R$ 40 bilhões para financiamentos habitacionais. Esse Fundo, consti-

tuído por depósitos dos trabalhadores, é regido por regras de correção monetária e de remuneração historicamente relacionadas às da caderneta de poupança, mas que prevêem uma rentabilidade de apenas 3% ao ano para a grande maioria das contas vinculadas16 . Assim, parece difícil alterar apenas as regras da caderneta de poupança e não as do FGTS, reservando mais um tratamento discriminatório aos trabalhadores, freqüentemente chamados a pagar sozinhos a conta das políticas públicas. Possíveis alterações do FGTS implicariam, no entanto, em um encarecimento adicional dos recursos do credito imobiliário, principalmente no segmento de habitação popular, que poderiam ficar inviabilizados; 5º. a possibilidade de o mutuário deduzir os juros pagos para o financiamento da casa própria na declaração anual do Imposto de Renda compensa apenas parcialmente o maior ônus financeiro nos contratos, pois a maioria dos trabalhadores brasileiros, isenta do IRPF, não seria contemplada pela

compensação. Uma minoria conseguiria a dedução, mas simulações revelam que o alívio no IRPF seria provavelmente inferior ao aumento do montante de juros a pagar. O maior beneficiário da medida seria mesmo a União, que aumentaria a arrecadação, tributando os ganhos da poupança. Cabe, ainda, uma observação de caráter mais geral. A proposta do BACEN visando aumentar os rendimentos da poupança vai na contramão da expectativa da sociedade quanto à redução da taxa de juros no País. Há uma outra opção para se obter maior oferta de crédito imobiliário: uma diminuição dos rendimentos das demais aplicações financeiras, via redução da taxa básica dos juros, o que, por conseqüência, tornaria a poupança mais atrativa. Aproximar a rentabilidade da poupança à dos fundos de investimento, acabando com a taxa de juros definida por lei, inclusive, está em contradição com a preocupação dos constituintes, de estabelecer um teto para os juros reais no País (artigo 192 da Carta Magna). A lógica que parece prevalecer na proposta do BACEN é a das leis de mercado, cada vez com menos restrições.

* Luciano Fazio Técnico do DIEESE - Subseção ANABB. Texto elaborado com as informações disponíveis na imprensa até 31.01.2002.

16 Lei nº 8.036, de 11.05.1990

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A R T I G O

Por uma Política Anti-Preconceito José Roberto Novaes de Almeida* Introdução Há dois princípios básicos de ética que devem orientar a formulação das políticas de igualdade entre os cidadãos, assinala Dworkin. O Princípio da Importância da Igualdade preceitua que a vida de todos os seres humanos deve ser agradável e exitosa, de modo que todos possam atingir o máximo de seus potenciais; enfim, que a vida possa ser bem gozada e não desperdiçada. O segundo, é o Princípio da Responsabilidade Específica, que preceitua que cabe ao indivíduo fazer suas próprias escolhas, independentemente do juízo de terceiros, dado seu meio cultural e os recursos físicos de que dispõe. Ambos os princípios éticos são violados diariamente no Brasil. Os negros brasileiros têm suas vidas desperdiçadas a todo o momento por restrições a suas potencialidades, e têm suas escolhas limitadas pelo juízo negativo da sociedade sobre sua própria existência. Sofrem discriminação, e tudo que fazem é escrutinado com lente microscópica à procura de erros. A discriminação racial do passado era expressa em leis

até 1888, e - o que é mais grave - sempre o foi nos costumes brasileiros. Os hábitos e costumes anti-cor e anti-raça não foram inibidos de modo claro, dado à ausência tanto de reações da sociedade, quanto da inexistência e funcionamento efetivo de leis punitivas da discriminação racial. É óbvio que a Lei n° 7.716, de 5.1.89, conhecida como Lei Sarney, é apenas pro forma, já que raramente pune alguém. Temos hoje um estranho país, em que os cargos de poder, de prestígio, de riqueza estão reservados aos brancos, e isso parece não incomodar a maior parte dos brasileiros,que parecem ter um conceito de racismo arcaico, limitando-o ao social e ao sexual. Creio que esta é a principal conclusão da pesquisa de Twine sobre racismo, derivada de um trabalho de campo de 10 meses em uma pequena cidade fluminense em 1992-94, o que lhe permitiu concluir que a definição brasileira de racismo é limitada, já que considera apenas “práticas de exclusão nas áreas social e sexual”, e não considera disparidades nas “áreas sócio-econômica, semiótica, educacional e políti-

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ca”, conforme mostra em Twine (1998, 63). Não devemos reinventar a roda O programa estadunidense Affirmative Action, com mais de trinta anos de funcionamento, tem sido objeto de avaliações detalhadas. É certo que a visão predominante é que o programa tem sido um sucesso, tanto na área econômica, quanto na área educacional, conforme examino adiante. O impacto econômico do Affirmative Action foi, de início, objeto de considerações negativas, baseadas estritamente em condições teóricas. Afinal, a produtividade da mão-de-obra inevitavelmente iria reduzir-se se os empregadores tivessem que selecionar mão-de-obra com base em critérios que não os de eficiência econômica. No entanto, programa semelhante não tinha precedente na história econômica mundial, e sabe-se das dificuldades em transpor conclusões de modelos econômicos unicausais para outros multi-causuais, de modo que o parecer definitivo dos economistas somente poderia ser dado após anos de funcionamento efetivo do programa, quando se dispu-


sesse de dados empíricos que possibilitassem análises sujeitas à crítica da profissão. Com efeito, há numerosos fatores não-econômicos, de natureza política e social, que têm impacto na economia e que devem ser levados em conta quando se avalia economicamente o resultado de políticas públicas. Entre eles, por exemplo, as perdas econômicas provocadas por distúrbios raciais, perda da qualidade em governança pela exclusão de parte significante da população e risco de aparecimento de ideologias baseadas em superioridade racial, que podem redundar em fortes perdas econômicas pelo aparecimento de apartheids ou sistema de castas que reduzam a mobilidade da mão-deobra. Na verdade, a questão da existência de competência da mão-de-obra é realmente crucial para o desenvolvimento econômico, como observou Keynes em 1944: “em última análise a prosperidade econômica depende não de quão geniais algumas poucas pessoas são, mas na capacidade em se produzir pessoas competentes em todas as áreas da vida”. Estudos e pesquisas econômicas sobre o Affirmative Action divergem em muitos aspectos, e estávamos precisando de um trabalho que fizesse uma revisão cuidadosa do que já foi publicado; e muito já foi publicado. Somente agora, Holzer e Neumark (2000, p. 559) nos trouxeram a palavra definitiva sobre o assunto, e concluíram com segurança e o itálico é do original – que “o programa oferece redistribuição significativa para as mulheres e minorias com relativamente reduzida perda em eficiência”. Em educação, o Affirmative Action permitiu que um maior número de negros ascendessem

a universidades de elite comparado a situações anteriores. Os debates e os estudos sobre a matéria foram exaustivos, e creio que o veredicto final somente foi dado recentemente pelos exreitores das universidades de Princeton e Harvard, W.G. Bowen e D. Bok, em seu já clássico The Shape of the River: Long-Term Consequences of Considering Race in College and University Admissions (1998) onde concluíram que “as universidades de elite americanas foram extraordinariamente bem sucedidas quando utilizaram critérios de admissão baseados em raça para o avanço de objetivos educacionais que são importantes para todos”. Só a jabuticaba é unicamente brasileira Um programa de valorização do negro brasileiro pode começar em várias áreas, mas creio que a maior parte dos economistas concordariam comigo que não há política mais segura para reduzir disparidades econômicas do que a educacional. Os programas de seguro social e políticas de bemestar têm uma desvantagem intrínseca em relação aos educacionais, já que não aumentam o capital da população de maneira permanente. O dado crucial para o desenvolvimento hoje é o número de anos de educação em boas escolas; o resto é conversa fiada. É claro que sei das limitações de se utilizar experiências alheias em terreno próprio. A ausência de estudos equivalentes no Brasil

ao The Shape of the River decorre da ausência de uma política anti-discriminatória e antipreconceituosa no Brasil, e do desprezo acintoso por qualquer discussão racial. O Brasil finge que é um paraíso racial e que não tem problemas de raças. Que é um país em que todos são brancos ou, se não brancos, que podem comportar-se como se brancos fossem. Temos de utilizar o que existe, mesmo sabendo das diferenças entre países e tempos históricos. Sabemos, no entanto, que os modernos trabalhos históricos indicam que a escravidão brasileira foi mais brutal que nos EUA, e duvido que, na prática, a discriminação racial pós-escravidão brasileira tenha sido mais “suave”; a nossa é apenas mais sutil. Não vou deter-me no assunto, mas gostaria de enfatizar que os americanos criaram um sistema de ensino médio público e gratuito para negros ainda no século XIX – quer dizer, nas regiões mais pobres do país –, que nunca tivemos. A análise econômica brasileira sobre o negro brasileiro está apenas começando a ser feita, mas os dados das sete Pesquisas Nacionais de Amostragem Domiciliar realizadas na década de 90, como mostra Henriques (2001), são contundentes e permitem ao autor concluir com precisão que, “com referência à década de 90, vemos que existiram avanços positivos nas condições de vida da população brasileira, mas esses avanços não se traduziram em reduções na desigualdade racial” (p. 47). O

“O Brasil finge que é um paraíso racial e que não tem problemas de raças”. Revista de conjuntura

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Brasil, na verdade, é um país conservador em políticas públicas, e é um país retardatário no mundo, no que diz respeito a práticas anti-raciais. No Brasil as escolas públicas gratuitas de ensino médio eram até há pouco tempo reservadas para os filhos dos ricos, da classe média ou para alguns pobres especialmente bem-dotados. Vejase o exemplo do Colégio Pedro II, no Rio, e das poucas escolas públicas de ensino médio, existentes quase sempre somente nas capitais estaduais - e portanto para as elites estaduais - , em que a admissão sempre se fazia por um vestibular competitivo, já que propositalmente jamais eram dados recursos para que a totalidade dos interessados ingressassem na escola, o que eliminava sempre os mais pobres, quer dizer, os negros. Somente agora, nos últimos 20 anos, com o sorteio de vagas para a primeira série da escola primária, é que o Pedro II “morenizou-se”, no feliz dizer de um seu antigo diretor. A violência oficial brasileira contra o negro é clara. Do ponto

de vista penal a escravidão brasileira foi muito mais cruel que a americana; diversos estudos mostram que, para crimes semelhantes, as penas eram bem mais pesadas no Brasil que nos EUA. E não devemos pensar que isto é para inglês ver, que o aparelho de coação português e brasileiro- imperial era apenas retórico. Era brutal mesmo, como os exemplos práticos de rebelião negra, abundantes no Brasil, mostram, como os estudos sobre a violência da polícia do Rio de Janeiro no Império mostram. E é claro que a maior violência é a sobrevida da escravidão no Brasil por mais de 30 anos em relação aos EUA. É fácil verificar se uma sociedade está funcionando bem: basta examinar se suas políticas públicas não são egoístas; o egoismo, como observa Blackburn (2001, p. 29), é uma das maiores ameaças à boa ética. Uma política pública beneficiando os negros seria anti-egoísta e ética. Não seria difícil desenhar um Programa Anti-preconceito para estimular o ingresso de

maior número de negros nas universidades públicas. Em primeiro lugar estipular-se-ia uma nota mínima para cada curso, de modo a ter-se certeza de que um padrão mínimo seria atingido por todos os entrantes. Afinal, com uma relação média de 10 candidatos por vaga em muitas universidades federais, poder-se-ia multiplicar por 4 o número de vagas das escolas e ainda se deixariam 5 dos dez candidatos fora da universidade pública. Muita gente muito boa fica fora da universidade pública. Os primeiros 90% das vagas seriam atribuídos em cada curso, aos candidatos de maior nota, independentemente de qualquer outro critério; as vagas equivalentes aos 10% adicionais seriam indicadas para alunos negros exclusivamente. Não há melhor lugar de se tentar a nova política que na Universidade de Brasília, um universidade afinada com o País, uma das melhores do País, uma universidade que pode arriscar-se, como as universidades de elite americanas arriscaram.

Bibliografia

Blackburn, Simon. 2001. Being Good – a short introducion to ethics. Oxford: Oxford Univ. Press. Bowen, W.G. e D. Bok. 1998. The Shape of the River: Long-Term Consequences of Considering Race in College and University Admissions. New Heaven: Princeton Univ. Press. Dworkin, Ronald. 2000. The Theory and Practise of Equality. Cambridge, MA, EUA: Harvard Univ. Press. Henriques, Ricardo. 2001. “Desigualdade Racial no Brasil: Evolução das Condições de Vida na Década de 90”. Texto Para Discussão N° 807. Rio de Janeiro: IPEA. Holzer J. e D. Neumark. 2000. “Assessing Affirmative Action”. Journal of Economic Literature XXXVIII (3), set. Keynes, J.M. 1944. Como mencionado por I.G. Patel e citado por A. Candavarker em “A Fresh Look at Keynes – Robert Skidelsky’s Trilogy” (Finance and Development, dez. 2001, p.63). Twine, France Winddance. 1998. The Maintenance of White Supremacy in Brazil. New Brunswick, NJ, EUA: Rudgers Univ. Press.

* José Roberto Novaes de Almeida Professor do Departamento de Economia da UnB.

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A R T I G O

ÍNDICE

DE

DESEMPENHO PRESIDENCIAL

Cem anos de economia brasileira Reinaldo Gonçalves* Introdução Quem foi o melhor presidente do Brasil? O estancieiro Getúlio Vargas foi melhor presidente do que o “empreiteiro” Rodrigues Alves? O “salvacionista” Hermes da Fonseca foi melhor presidente do que o “desenvolvimentista” Juscelino Kubitschek? Os generais do “Brasil potência” foram melhores presidentes do que os oligarcas da República Velha? Perguntas como essas decorrem da curiosidade ou da necessidade do conhecimento mais profundo a respeito da História do Brasil. Essas perguntas traduzem o interesse do cidadão no passado e no presente, bem como a sua preocupação com o futuro. No caso de analistas, há o interesse concreto em saber que estratégias e políticas têm melhores resultados econômicos. O exame do desempenho de presidentes da República não é a preocupação com personalidades individuais dos Chefes de Estado, ainda que se reconheça que, sem dúvida alguma, a ação

individual pode ser importante. Não se trata de exagerar ou negligenciar a atuação de atores políticos que, na função de Chefe de Estado, influenciam a formulação e a execução de estraté-

gias e políticas econômicas. A ação dos indivíduos pode ser importante e é determinada pela sua objetividade (interesses que defendem), subjetividade “concentrada” (valores, normas morais, ideologias e ideais) e subjetividade “dispersa” (ânsia de glória ou poder, idiossincrasia, vaidade, ira, inveja, crueldade, pusilanimidade, generosidade, compaixão, coragem, honra etc.). Diferenças nessas variáveis podem distinguir um chefe de Estado de um estadista. Esse, porém, não é o foco deste estudo. Aqui, o exame do desempenho presidencial limita-se a fazer uma ponte entre a economia e a política. Isto é, por meio de um exercício matemático (cálculo do índice de desempenho presidencial) procura-se fazer uma análise preliminar sob a ótica da Economia Política. Assim, propomos unicamente um estudo introdutório sobre a aplicação do índice de desempenho presidencial. Em trabalho recente, procedeu-se à análise da

“O exame do desempenho de presidentes da República não é a preocupação com personalidades individuais dos Chefes de Estado, ainda que se reconheça que, sem dúvida alguma, a ação individual pode ser importante”. Revista de conjuntura

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“A história moderna do Brasil tem

períodos especiais que afetam os resultados econômicos, visto que são precedidos por rupturas”. economia brasileira atual e suas perspectivas, com base nas taxas de crescimento econômico observadas durante os mandatos dos Chefes de Estado, de Pedro II até os dias atuais (Gonçalves, 2001). O objetivo era uma análise comparativa de desempenho econômico. Esse procedimento recebeu três críticas. A primeira é que os dados do século XIX são pouco confiáveis e, portanto, a maior robustez dos índices de evolução do PIB só se verifica a partir de 1901. A segunda crítica chama a atenção para o fato de que no conjunto dos piores resultados há três presidentes que governaram o Brasil na década de 90 do século XIX, isto é, após a ruptura institucional causada pela Abolição e proclamação da República. A história moderna do Brasil tem períodos especiais que afetam os resultados econômicos, visto que são precedidos por rupturas (e.g., a Regência, 1831-40, e o pós-proclamação da República, 1890-98). A terceira crítica refere-se ao uso da taxa de crescimento econômico (PIB) como o único indicador de desempenho econômico. Todas essas críticas são corretas. Em resposta às críticas procuramos, então, desenvolver uma metodologia própria que desse uma indicação mais precisa a respeito do desempenho da economia brasileira durante o mandato de cada um dos presidentes da

República a partir de 1901. O resultado metodológico foi a criação de um índice de desempenho presidencial na esfera econômica, que inclui os seguintes componentes: crescimento econômico (medido pela variação real do PIB); desenvolvimento econômico ou redução do subdesenvolvimento pelo encurtamento da distância entre o Brasil e o mundo desenvolvido (medido pela diferença entre o crescimento do Brasil e o dos Estados Unidos); inflação (medida pelo deflator do PIB); fragilidade financeira do Estado (tendo como indicador a relação entre a dívida mobiliária federal e o PIB); e vulnerabilidade externa (tendo como indicador a relação entre a dívida externa e o valor das exportações). Para cada presidente, essas variáveis foram calculadas e parametrizadas na forma de índices e, por fim, foi calculado um indicador abrangente de desempenho econômico (IDP, índice de desempenho presidencial), como a média desses cinco índices. Para uma discussão mais detalhada, ver Gonçalves (2002.a) e a nota metodológica no final desse artigo. 1. Dados anuais e período de mandato Os dados disponíveis para todas as variáveis são anuais. As eleições para presidente da República no Brasil têm ocorrido, de modo geral, em novembro, sendo

Revista de conjuntura

48

jan/mar de 2002

a posse no início do ano seguinte. Isso significa que há uma grande coincidência dos mandatos com o início e o fim de cada ano em um terço dos casos. Em outro terço dos casos, a diferença é de dois ou três meses, isto é, os mandatos começaram ou terminaram (ou foram interrompidos) até março ou depois de setembro. Nesses casos o arredondamento significa incluir ou excluir um número máximo de três meses. Por exemplo, Ernesto Geisel iniciou seu mandato em março de 1974 e concluiu em março de 1979. Consideramos, então, os anos do período 197478 como os da presidência de Geisel para fins da análise estatística baseada em dados anuais. O último terço inclui uma heterogeneidade de casos. Isso exigiu tomar decisões, caso a caso, quanto à definição dos períodos para cada presidência. Na realidade, há um conjunto de quatro casos que envolvem oito presidências. O primeiro caso que exigiu arbitragem foi decorrente da morte de Afonso Pena em junho de 1909, que fez com que o vicepresidente Nilo Peçanha assumisse o cargo. Os mandatos foram os seguintes: Afonso Pena (de 11/1906 a 6/1909) e Nilo Peçanha (de 6/1909 a 11/1910). Para fins da análise estatística, consideramos para Afonso Pena o período 1907-08 com peso 2 e 1909 com peso 1. Para Nilo Peçanha consideramos o ano de 1909 com peso 1 e 1910 com peso 2. O segundo caso trata de um ajuste em decorrência da morte do presidente eleito em novembro de 1918 (Rodrigues Alves) e do mandato do vice-presidente Delfim Moreira (de 11/1918 a 7/ 1919). Delfim Moreira assumiu, mas já preparando as eleições presidenciais. Epitácio Pessoa venceu


as eleições, iniciou seu governo em julho de 1919 e concluiu em novembro de 1922. Houve, assim, a exclusão de Delfim Moreira e, para Epitácio Pessoa, consideramos todo o período 1919-22. O terceiro caso envolveu o suicídio de Getúlio Vargas e a posse de Café Filho em agosto de 1954. Na nossa análise estatística com dados anuais, consideramos para Getúlio Vargas no seu segundo mandato o período 195154. Portanto, os dados para a presidência Café Filho restringiram-se ao ano de 1955. O último caso refere-se à renúncia de Jânio Quadros em agosto de 1961. Consideramos para Jânio Quadros o ano de 1961. Quanto a João Goulart, os dados referem-se ao período 1962-63 tendo em vista o golpe militar de março de 1964. Foram excluídas, ainda, as presidências com períodos inferiores a três meses: José Linhares (de 29/10/1945 a 31/1/ 1946); Nereu de Oliveira Ramos (de 11/11/1955 a 31/1/1956); e Pascoal Ranieri Mazzilli (de 1/4/ 1964 a 15/4/1964). Com os procedimentos acima, ficamos com um conjunto de 24 presidentes do Brasil no século XX. Para Campos Sales (11/1898 a 11/1902) consideraram-se somente os dados para o período 190102 em decorrência da falta de continuidade das séries estatísticas. E para Getúlio Vargas trabalhou-se com a taxa média de todos anos dos seus dois períodos de governo. Deve-se destacar que os únicos casos em que realizamos ajustes (médias ponderadas e não médias aritméticas simples) foram os de Afonso Pena e Nilo Peçanha. 2. IDP: Resultados empíricos Os dados da Tabela 1 (ver página 50) apresentam as variáveis

básicas usadas no cálculo do IDP. As fontes de dados são aquelas que apresentam os indicadores mais robustos (Gonçalves, 2002.a). Naturalmente, há deficiências nas séries estatísticas. Não cabe, aqui, um exame detalhado dos inúmeros problemas que existem com as séries econômicas brasileiras (inclusive as mais recentes). Há publicações especializadas, que apresentam uma análise criteriosa desses problemas (IBGE, 1990). As principais fontes de dados foram Abreu et al (1990), ANDIMA (1994), Goldsmith (1986) e IBGE (1990). Essa última, faz uma seleção das melhores fontes e das melhores séries estatísticas da história econômica brasileira. Não resta dúvida de que devemos ter extrema cautela no uso de qualquer indicador econômico no Brasil quando se toma uma perspectiva secular. Levando em conta essa observação, partimos para a parametrização das variáveis básicas por meio do cálculo dos índices correspondentes. Na Tabela 2 (ver página 51) são apresentados esses índices, bem como a sua média (o índice de desempenho presidencial). O índice de crescimento econômico mais elevado (100,0) é o de Garrastazu Médici, em cujo governo a economia brasileira teve a sua maior taxa de cresci-

mento médio anual (11,9%). O menor índice é o de Collor de Mello (zero), pois no seu governo houve não somente a menor taxa de crescimento da história econômica brasileira (-1,3%), como foi o único governante que esteve associado a uma queda absoluta do PIB durante o seu mandato. O índice de alcance (catch up), que é medido pela diferença entre o crescimento econômico do Brasil e o dos Estados Unidos, tem o seu valor máximo com Eurico Dutra. Esse é o único governante que se beneficia de uma queda do PIB dos Estados Unidos, isto é, Dutra é o único caso de uma extraordinária “velocidade de alcance” como resultado do elevado crescimento econômico brasileiro (7,6%), bem como da variação negativa da renda nos Estados Unidos (-1,8%). Assim, Dutra logrou reduzir significativamente a distância entre o Brasil e os países desenvolvidos (tendo os EUA como referência central), ou seja, reduziu o subdesenvolvimento do País. Naturalmente, a conjuntura do pós-Segunda Guerra Mundial foi determinante desse fenômeno. Porém, como analisado em outro contexto, há uma autonomia relativa (mesmo em uma economia altamente dependente como a brasileira) que permite ao País uma trajetória de desempenho desconectada, em certa medida,

“O índice de crescimento econômico

mais elevado (100,0) é o de Garrastazu Médici, em cujo governo a economia brasileira teve a sua maior taxa de crescimento médio anual (11,9%)”. Revista de conjuntura

49

jan/mar de 2002


Tabela 1 Indicadores macroeconômicos: Um século de desempenho da economia brasileira (média no período de mandato presidencial)

Presidente e período Manuel Ferraz de Campos Sales 11/1898 a 11/1902 Francisco de Paula Rodrigues Alves 11/1902 a 11/1906 Afonso Augusto Moreira Pena 11/1906 a 6/1909 Nilo Procópio Peçanha 6/1909 a 11/1910 Hermes Rodrigues da Fonseca 11/1910 a 11/1914 Venceslau Brás Pereira Gomes 11/1914 a 11/1918 Epitácio da Silva Pessoa 7/1919 a 11/1922 Artur da Silva Bernardes 11/1922 a 11/1926 Washington Luís Pereira de Souza 11/1926 a 10/1930 Getúlio Dornelles Vargas 11/1930 a 10/1945; 1/1951 a 8/1954 Eurico Gaspar Dutra 1/1946 a 1/1951 João Café Filho 8/1954 a 11/1955 Juscelino Kubitschek de Oliveira 1/1956 a 1/1961 Jânio da Silva Quadros 1/1961 a 8/1961 João Belchior Goulart 9/1961 a 4/1964 Humberto de Alencar Castello Branco 4/1964 a 3/1967 Arthur da Costa e Silva 3/1967 a 8/1969 Emílio Garrastazu Médici 10/1969 a 3/1974 Ernesto Geisel 3/1974 a 3/1979 João Baptista de Oliveira Figueiredo 3/1979 a 3/1985 José Sarney 3/1985 a 3/1990 Fernando Collor de Mello 3/1990 a 9/1992 Itamar Cautiero Franco 9/1992 a 1/1995 Fernando Henrique Cardoso 1/1995 a 12/2002

PIB Brasil variação real (%)

PIB Brasil – PIB EUA variação real (%)

Inflação Brasil (%)

Dívida pública federal/ PIB

Dívida externa/ Exportação

7,0

0,8

-16,2

14,5

1,6

4,8

-0,8

1,8

13,6

1,8

1,1

1,3

2,7

11,3

2,0

5,2

0,5

2,3

11,6

2,0

3,6

2,5

-3,7

13,0

2,4

2,2

-3,6

12,8

12,8

2,7

7,5

6,7

5,4

12,0

1,9

3,8

-2,5

10,4

10,9

2,1

5,3

5,5

4,5

10,1

3,0

4,8

-0,6

8,8

7,7

2,9

7,6

9,4

9,4

4,8

0,5

8,8

3,2

11,8

1,3

1,0

8,1

5,9

21,8

0,7

1,5

8,6

6,1

34,7

0,3

2,0

3,6

-1,7

64,3

0,2

2,3

4,2

-2,1

62,0

0,6

2,4

7,8

4,4

24,4

2,3

2,0

11,9

8,2

21,3

5,1

2,2

6,7

3,8

38,7

6,6

2,7

2,5

0,1

113,5

6,1

3,2

4,4

1,3

507,3

11,7

3,7

-1,3

-1,9

1374,2

5,7

3,0

5,4

2,0

2118,2

10,1

2,9

2,4

-1,1

20,2

31,0

3,5

Fontes e notas: Reinaldo Gonçalves, “Índice de Desempenho Presidencial: Notas Técnicas”, 2002, mimeo.

Revista de conjuntura

50

jan/mar de 2002


Tabela 2 Índice de desempenho presidencial segundo os seus componentes (índices do melhor para o pior desempenho, melhor =100) Presidente/Componentes

Crescimento econômico

Alcance

Inflação

Fragilidade financeira

Vulnerabilidade externa

Índice de desempenho presidencial IDP

Campos Sales

62,9

33,8

100,0

53,6

65,6

74,6

Rodrigues Alves

46,2

21,8

92,3

56,5

59,4

65,2

Afonso Pena

18,2

37,7

87,0

64,0

53,1

61,4

Nilo Peçanha

49,2

31,5

89,1

63,0

53,1

67,6

Hermes da Fonseca

37,1

46,9

100,0

58,4

40,6

66,9

Venceslau Brás

26,5

0

66,7

59,1

31,3

43,4

Epitácio Pessoa

66,7

79,2

78,0

61,7

56,3

80,8

Artur Bernardes

38,6

8,5

69,4

65,3

50,0

54,8

Washington Luís

50,0

70,0

80,4

67,9

21,9

68,5

Getúlio Vargas

46,2

23,1

71,6

75,6

25,0

57,1

Eurico Dutra

67,4

100,0

70,7

85,1

100,0

100,0

Café Filho

76,5

52,3

67,8

96,4

84,4

89,2

Juscelino Kubitschek

71,2

73,1

59,8

98,4

68,8

87,7

Jânio Quadros

75,0

74,6

53,7

99,7

53,1

84,1

João Goulart

37,1

14,6

45,6

100,0

43,8

57,0

Castello Branco

41,7

11,5

46,1

98,7

40,6

56,4

Costa e Silva

68,9

61,5

58,3

93,2

53,1

79,2

100,0

90,8

60,1

84,1

46,9

90,2

Ernesto Geisel

60,6

56,9

52,3

79,2

31,3

66,2

João Figueiredo

28,8

28,5

38,2

80,8

15,6

45,3

José Sarney

43,2

37,7

18,7

62,7

0

38,3

0

13,1

5,6

82,1

21,9

29,0

Itamar Franco

50,8

43,1

0

67,9

25,0

44,1

Fernando Henrique

28,0

19,2

60,8

0

6,3

27,0

Garrastazu Médici

Collor de Mello

do cenário internacional (Gonçalves, 2002.b). Por outro lado, há inúmeros presidentes que fracassaram, visto que nos seus mandatos houve aumento da distância entre o Brasil e o mundo desenvolvido (a referência é sempre a locomotiva norte-americana). Isto é, temos o efeito-alcance negativo. Por

exemplo, no governo Venceslau Brás (1914-18) o retrocesso foi bastante significativo, tendo em vista que a economia brasileira cresceu a uma taxa média anual relativamente baixa (2,2%), enquanto a economia dos Estados Unidos cresceu a uma taxa média anual elevada (5,8%). Pelos padrões históricos de ambos os paí-

ses, o Brasil “andou para trás”. Mais uma vez, a conjuntura internacional aparece como uma variável explicativa do desempenho da economia brasileira. O efeito-alcance é útil para desmontar a argumentação simplória, que costuma justificar o fraco desempenho da economia brasileira como resultado do desempenho

Fontes e notas: Reinaldo Gonçalves, “Índice de Desempenho Presidencial: Notas Técnicas”, 2002, mimeo.

Revista de conjuntura

51

jan/mar de 2002


ruim da economia internacional. Por um lado, é verdade que, quando a economia mundial se expande, ceteris paribus, há uma tendência ao afrouxamento das restrições de balanço de pagamentos e, portanto, surgem mais oportunidades de crescimento econômico para o Brasil. Por outro, a aceleração do crescimento da economia mundial exige que a economia brasileira tenha taxas mais elevadas de crescimento para que ocorra o desenvolvimento (isto é, para que haja o encurtamento da distância entre o País e o mundo desenvolvido). Nesse sentido, o contraste entre os resultados dos governos de Eurico Dutra e Venceslau Brás é importante. O “vagão” Brasil se aproximou mais da “locomotiva” Estados Unidos precisamente quando a “locomotiva” descarrilou. E o vagão brasileiro ficou “para trás” quando a locomotiva norte-americana acelerou a sua velocidade. No século XX há outro contraste histórico relevante: a década de 30 (quando a locomotiva descarrilou e o vagão se acelerou) e a década de 90 (particularmente na Segunda metade dessa década, quando a locomotiva se acelerou e o vagão descarrilou) (Gonçalves, 2002.b). Isso quer dizer que devemos ter muito cuidado na generalização de argumentos, destituídos de conteúdo histórico, que envolvem o desempenho da economia brasileira e a situação econômica internacional. No século XX a inflação brasileira parece ter mudado de pata-

mar em momentos importantes da história econômica do País. De modo geral, nas quatro primeiras décadas do século passado a inflação oscilou em torno de 5%. Nas duas décadas seguintes (1940-60), a taxa média anual de inflação teria sido da ordem 15%, sendo que, ao longo dos anos, houve aumento das pressões inflacionárias (IBGE, 1990, p. 150). Do final da década de 60 até o final da década seguinte as pressões inflacionárias foram mantidas relativamente sob controle. No final dos anos 70 iniciou-se uma longa trajetória de extraordinárias pressões inflacionárias, que atingiriam o seu auge com o processo hiperinflacionário em 1993-94. A partir de 1995, observou-se a volta de uma relativa estabilidade do nível geral de preços comparativamente à experiência das últimas quatro décadas do século XX. No início do século passado verifica-se a ocorrência de momentos de deflação. No final do governo Campos Sales houve queda significativa do nível geral de preços. Considerando-se a taxa negativa de inflação no governo Hermes da Fonseca, o índice de inflação atingiu seu valor máximo nesses dois mandatos, pois, quanto menor a inflação, maior o índice usado para medir o efeito (positivo) da inflação sobre o desempenho presidencial. Os índices mais baixos do efeito-inflação ocorrem no período hiperinflacio-

“No século XX a inflação brasileira

parece ter mudado de patamar em momentos importantes da história econômica do País”. Revista de conjuntura

52

jan/mar de 2002

nário do início dos anos 90. O indicador de fragilidade financeira utilizado é a relação entre a dívida mobiliária federal e o PIB. Quanto maior essa relação, menor o índice. Isto é, o índice igual a zero expressa a pior situação financeira do Estado, enquanto o índice igual a 100 reflete a melhor situação financeira do Estado. Essa relação atingiu o seu valor médio mais baixo no governo João Goulart (daí, o índice máximo desse presidente). Na realidade, nesse governo verifica-se o “vale” de uma tendência secular de redução do endividamento do setor público, que vem desde o inicio do século XX. A partir de então, observa-se uma certa tendência de aumento do endividamento do setor público, que cresce exponencialmente no final do século XX, quando o País experimenta recordes históricos de déficit público, carga tributária e dívida pública (Gonçalves e Pomar, 2002). O resultado é que a maior fragilidade financeira da história brasileira (e, portanto, o mais baixo índice) ocorre no final do século. A vulnerabilidade externa do País é medida pela relação entre a dívida externa e a exportação. Da mesma forma que no caso anterior, o índice máximo (100) expressa a situação mais favorável (de menor endividamento externo). A dívida externa é um problema de grande importância, principalmente, nos primeiros anos da República Velha. A renegociação da dívida externa durante o governo Vargas proporcionará um fôlego significativo — em termos da restrição do balanço de pagamentos — por um longo período (Gonçalves e Pomar, 2000). A dívida externa retorna como uma restrição mais significativa nos anos 60. Mas é a partir da segunda metade dos anos 70


e, mais especialmente, a partir de início dos anos 80 que a dívida externa torna-se uma restrição fundamental ao desenvolvimento econômico brasileiro. O resultado desse processo é que o índice mais elevado (isto é, menor vulnerabilidade externa) é o de Eurico Dutra. O mais baixo índice (a pior relação dívida externa/exportação) é de José Sarney, que, inclusive, é responsável por uma moratória “passiva” (por falta absoluta de reservas internacionais). A média aritmética dos índices discutidos acima (crescimento, alcance, inflação, fragilidade financeira e vulnerabilidade externa) em cada mandato é o índice de desempenho presidencial. O mais elevado IDP é o de Eurico Dutra (100,0), seguido de Garrastazu Médici (90,2), Café Filho (89,2) e Juscelino Kubitschek (87,7), somente para destacar os quatro primeiros “maratonistas”. Na Tabela 3 (ver página 54) pode-se notar que Dutra é o primeiro colocado somente nos índices de alcance e vulnerabilidade externa. Isto significa que para ser “maratonista” não é necessário ser o primeiro colocado em relação a todos os indicadores. Juscelino Kubitschek, por exemplo, posiciona-se relativamente bem em quatro dos cinco índices, mas jamais alcança o nível máximo em qualquer um dos índices. Na Tabela 4 (ver página 55) o IDP é apresentado em ordem decrescente, o que permite a identificação clara dos “maratonistas” e dos “lanterninhas”. 3. Conclusão O IDP é um instrumento criado com o propósito de auxiliar no entendimento da dinâmica de desenvolvimento econômico de longo prazo do Brasil. Conforme mencionado, o objetivo é a análise

“O IDP é um instrumento criado com

o propósito de auxiliar no entendimento da dinâmica de desenvolvimento econômico de longo prazo do Brasil”. econômica comparativa com uma dimensão histórica. O IDP pode ser útil na identificação das diferentes estratégias e políticas que determinaram o desempenho da economia brasileira em cada mandato presidencial. Tendo em vista a significativa centralização do poder nas mãos do Executivo federal e, mais especificamente, do presidente da República, a periodização com base em mandatos presidenciais (comum nos estudos da formação política brasileira; Bello, 1976; Skidmore, 1967) pode ser útil na análise da história econômica do País, quando se utiliza como eixo analítico o índice de desempenho presidencial. Para ilustrar o ponto acima, podemos concluir nossa análise apresentando o argumento de que o desenvolvimento econômico de longo prazo depende, em medida não-desprezível, de uma “herança”. Essa herança pode ser generosa ou trágica. Isto é, governantes herdam equilíbrios de fluxo e de estoque que podem servir de base para o desempenho econômico extraordinário (herança generosa) ou, então, desequilíbrios que provocarão desempenho medíocre (herança trágica). No caso de uma herança generosa, o desenvolvimento econômico pode fluir sem maiores atropelos, visto que restrições fundamentais foram levantadas ou controladas. Revista de conjuntura

53

Dentre essas restrições, pode-se destacar o nível de produto potencial, pressões inflacionárias, capacitação tecnológica, financiamento, situação das finanças públicas e endividamento externo. Parte dessas restrições são capturadas pelo nosso índice de desempenho presidencial. A herança generosa reduz, então, os riscos e as incertezas críticas que o País enfrentará no futuro. No que se refere à herança generosa, o destaque evidente fica por conta do governo Vargas (mais precisamente o primeiro governo, de 1930 a 1945). Quando observamos a ordenação dos presidentes segundo o IDP (Tabela 4), constatamos que, entre os cinco primeiros “maratonistas”, encontramos quatro herdeiros de Vargas. Isto é, no quarto de século que se seguiu ao término do primeiro governo Vargas foram criadas condições favoráveis para o desenvolvimento de longo prazo (com a redução des restrições fundamentais, como a dívida pública e dívida externa). Assim, Eurico Dutra, Café Filho e Juscelino Kubitschek “correram no vácuo” de Vargas. Tecnicamente, na perspectiva de desenvolvimento de longo prazo a herança generosa de Vargas expressou-se na expansão do produto potencial, na redução dos desequilíbrios de estoque relativos às finanças públicas e às

jan/mar de 2002


Tabela 3 Índice de desempenho presidencial segundo a ordem de classificação (ordem do melhor para o pior, melhor =1 , pior = 24) Presidente / Efeito

Alcance

Inflação

8

14

1

23

4

8

13,5

18

3

22

5

13

Afonso Pena

23

13

5

16

8,5

14

Nilo Peçanha

12

15

4

17

8,5

10

18,5

10

2

21

14,5

11

Venceslau Brás

22

24

12

20

16,5

21

Epitácio Pessoa

7

3

7

19

6

6

Artur Bernardes

17

23

10

15

11

18

Washington Luís

11

6

6

13,5

20,5

9

13,5

17

8

12

18,5

15

Eurico Dutra

6

1

9

7

1

1

Café Filho

2

9

11

5

2

3

Juscelino Kubitschek

4

5

15

4

3

4

Jânio Quadros

3

4

17

2

8,5

5

18,5

20

20

1

13

16

16

22

19

3

14,5

17

Costa e Silva

5

7

16

6

8,5

7

Garrastazu Médici

1

2

14

8

12

2

Ernesto Geisel

9

8

18

11

16,5

12

João Figueiredo

20

16

21

10

22

19

José Sarney

15

12

22

18

24

22

Collor de Mello

24

21

23

9

20,5

23

Itamar Franco

10

11

24

13,5

18,5

20

Fernando Henrique

21

19

13

24

23

24

Campos Sales Rodrigues Alves

Hermes da Fonseca

Getúlio Vargas

João Goulart Castello Branco

Crescimento econômico

contas externas (dívida externa), e na formação de expectativas favoráveis quanto ao futuro do País. A herança trágica, por outro lado, envolve uma legado negativo que é determinante da trajetória do País. Essa trajetória é marcada pela desestabilização macroeconômica, desmonte do aparelho produtivo, esgarçamento do tecido social,

Fragilidade Vulnerabilidade financeira externa

crescente tensão política, degradação institucional e perda de governança. Acumulam-se incertezas críticas e riscos na medida em que se agravam restrições fundamentais ao desenvolvimento econômico (como, por exemplo, as dívidas interna e externa). O cálculo do IDP mostra que estamos, atualmente, com uma

herança trágica, que faz com que o futuro do Brasil (e não somente da economia brasileira) seja marcado por fortes incertezas críticas e riscos elevados. Nota metodológica A metodologia básica usada no cálculo do Índice de Desempenho

Fontes e notas: Reinaldo Gonçalves, “Índice de Desempenho Presidencial: Notas Técnicas”, 2002, mimeo.

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Índice de desempenho presidencial IDP


Presidencial (IDP) é similar à utilizada no cálculo do índice de desenvolvimento humano (IDH) do PNUD (PNUD, 1999, 159-161). O IDP é uma média simples de cinco outros índices, que expressam o desempenho de variáveis ou indicadores macroeconômicos: crescimento, alcance, inflação, fragilidade financeira e vulnerabilidade externa. Valores crescentes de todos os índices significam um desempenho superior. O índice de crescimento refere-se ao crescimento real do Produto Interno Bruto brasileiro. O índice de alcance (catch up) é a diferença entre o crescimento econômico brasileiro e o crescimento real do PIB do país-locomotiva da economia mundial no século XX (Estados Unidos). Visto que o conceito de desenvolvimento é um conceito relativo, o efeito alcance expressa o encurtamento da distância entre o Brasil e os Estados Unidos, isto é, a velocidade com que o Brasil se torna menos subdesenvolvido ou mais desenvolvido. Os índices de crescimento e de alcance são calculados com base na seguinte fórmula: Índice = [(X – X mínimo)/(X máximo – X mínimo)] x 100

Sendo X o valor da variável para cada presidente, X máximo o maior valor da variável e X mínimo o menor valor da variável. Esta fórmula mostra que, quanto mais elevados são os indicadores de crescimento econômico brasileiro e maiores as diferenças entre o crescimento econômico do Brasil e o dos Estados Unidos, mais altos são os índices de crescimento e de alcance, respectivamente. Isto é, melhor é o desempenho presidencial. Por exemplo, no caso do índice de crescimento econômico do

Tabela 4 Índice de Desempenho Presidencial segundo a ordem decrescente de classificação (ordem do melhor para o pior, melhor =1 , pior = 24) Presidente / Ordem

IDP

Ordem

Eurico Dutra

100,0

1

Garrastazu Médici

90,2

2

Café Filho

89,2

3

Juscelino Kubitschek

87,7

4

Jânio Quadros

84,1

5

Epitácio Pessoa

80,8

6

Costa e Silva

79,2

7

Campos Sales

74,6

8

Washington Luís

68,5

9

Nilo Peçanha

67,6

10

Hermes da Fonseca

66,9

11

Ernesto Geisel

66,2

12

Rodrigues Alves

65,2

13

Afonso Pena

61,4

14

Getúlio Vargas

57,1

15

João Goulart

57,0

16

Castello Branco

56,4

17

Artur Bernardes

54,8

18

João Figueiredo

45,3

19

Itamar Franco

44,1

20

Venceslau Brás

43,4

21

José Sarney

38,3

22

Collor de Mello

29,0

23

Fernando Henrique

27,0

24

Fontes e notas: Reinaldo Gonçalves, “Índice de Desempenho Presidencial: Notas Técnicas”, 2002, mimeo. Nota: A ordem média corresponde à ordenação do coeficiente médio do número de ordem das variáveis.

presidente Juscelino Kubitschek o cálculo foi o seguinte:

Garrastazu Médici (11,9%); e a menor foi no governo Collor de Mello (-1,3%).

Índice (JK) = {[8,1 - (-1,3)]/[11,9-(-1,3)]} x 100 Índice (JK) = (9,4/13,2) x 100 = 71,2

A taxa média anual de crescimento real do PIB durante o governo Juscelino Kubitschek foi de 8,1%; a maior taxa de crescimento econômico foi no governo Revista de conjuntura

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O índice de inflação é calculado com base na hipótese de “retornos decrescentes” para a inflação. Na medida em que aumenta a taxa de inflação, há uma tendência para se criar mecanismos de proteção. Correção monetária ou in-

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dexação tendem a acelerar-se com o avanço do processo inflacionário. Isso quer dizer que uma inflação de 100% ao ano não significa um desconforto para a sociedade equivalente a 10 vezes o desconforto provocado por uma inflação de 10%. O mesmo ocorre com uma inflação de 1000%, que não tende a provocar um desconforto equivalente a 10 vezes uma inflação de 100%. Para capturar esse fenômeno utilizou-se a seguinte fórmula para o cálculo de índice de inflação: Índice de inflação = [1- (log X/log X máximo)] x 100

As duas exceções referem-se aos mandatos de Campos Sales (dois últimos anos) e de Hermes da Fonseca, que tiveram taxas médias de inflação negativa (deflação). Nesses casos, visto que o numerador do índice é o logaritmo da taxa de inflação, supusemos log X = 0, isto é, as deflações observadas

tiveram a equivalência a uma inflação de 1%. O índice de fragilidade financeira expressa a situação das finanças públicas. O indicador usado foi a relação entre a dívida mobiliária federal e o PIB. Essa relação expressa o nível de endividamento do Estado. O pressuposto central é que o aumento do endividamento implica em desempenho cada vez mais negativo das contas públicas e, portanto, tende a se tornar uma restrição ao crescimento econômico no curto prazo e, principalmente, no longo prazo (Gonçalves e Pomar, 2002). O índice de vulnerabilidade externa foi medido pela relação entre a dívida externa total e a exportação de bens. O pressuposto é o mesmo: maior endividamento externo tende a se tornar uma crescente restrição ao progresso econômico em decorrência de uma série de fatores como

o comprometimento das divisas estrangeiras, a pressão sobre as políticas monetária, fiscal, cambial, a concentração de renda, e a formação negativa de expectativa de investidores internacionais (Gonçalves e Pomar, 2000). Os índices de fragilidade financeira e de vulnerabilidade externa foram calculados com a seguinte fórmula: Índice = [(X máximo – X)/(X máximo – X mínimo)] x 100

Essa fórmula mostra que quanto menores são os indicadores de endividamento (interno e externo), maiores são os índices correspondentes. Isto é, melhor é o desempenho presidencial. Em síntese, o Índice de Desempenho Presidencial (IDP) é uma média simples dos 5 índices: crescimento, alcance, inflação, fragilidade financeira e vulnerabilidade externa.

Bibliografia Abreu, M. et al (1990), A Ordem do Progresso. Cem Anos de Política Econômica Republicana, 1889-1989, Rio de Janeiro, Ed. Campus. ANDIMA (1994), Dívida Pública. Séries Históricas, Rio de Janeiro, Associação Nacional de Instituições do Mercado Aberto. Bello, J. M. (1976), História da República, São Paulo, Cia. Editora Nacional, 7ª edição. Goldsmith, R. W. (1986), Brasil 1850-1984. Desenvolvimento Financeiro sob um Século de Inflação, São Paulo, Ed. Harper & Row do Brasil Ltda. Gonçalves, R. (2001), “Desestabilização, crescimento medíocre e desigualdade”, Jornal dos Economistas, CoreconRJ, dezembro, p. 3-5. Gonçalves, R. (2002.a), , “Índice de Desempenho Presidencial: Notas Técnicas”, IE-UFRJ, mimeo. Gonçalves, R. (2002.b), Vagão descarrilhado. O Brasil e o futuro da economia global, Rio de Janeiro, Ed. Record. Gonçalves, R. e Pomar, V. (2000), O Brasil Endividado, São Paulo, Ed. Fundação Perseu Abramo. Gonçalves, R. e Pomar, V. (2002), A armadilha da dívida, São Paulo, Ed. Fundação Perseu Abramo. IBGE (1990), Estatísticas Históricas do Brasil, Rio de Janeiro, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2ª edição. PNUD (1999), Relatório do Desenvolvimento Humano, 1999, Lisboa, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Skidmore, T. E. (1967), Politics in Brazil, 1930-1964, Londres, Oxford University Press.

* Reinaldo Gonçalves Professor titular da UFRJ. Os dados primários, a metodologia e os testes estatísticos são analisados em detalhes no trabalho “Índice de desempenho presidencial: Nota Técnica”, que pode ser solicitado diretamente ao autor no endereço rgoncalves@alternex.com.br. 1

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A R T I G O

James Tobin: Prêmio Nobel de Economia 1981 Ceci Vieira Juruá*

James Tobin recebeu o prêmio Nobel de Economia em 1981, em momento que coincide com a arrancada inicial de políticas e instituições facilitadoras da globalização financeira. Foi o décimo economista estadunidense e o segundo da Universidade de Yale a receber um Nobel de Economia, mas foi o primeiro laureado por análises dedicadas aos mercados financeiros e às relações entre esses mercados e as variáveis macroeconômicas. Aprofundou-se Tobin no que hoje conhecemos como teoria das carteiras, com estudos voltados para a tomada de decisões sobre aplicações financeiras e para os critérios de escolha entre títulos financeiros e ativos reais. Diferentemente dos modelos keinesianos daquela época, Tobin considerou que as relações entre finanças e economia deveriam incluir, além da moeda, todos os outros ativos circulando nos mercados. Sobre os investimentos financeiros, ele observou que a melhor aplicação es-

taria sempre condicionada a uma distribuição dos títulos entre ativos de renda variável sujeitos a um elevado grau de risco, e ativos de renda fixa, formulação que ficou conhecida como o teorema da separação. Outra contribuição de James Tobin, que permanece ainda hoje nos manuais de Economia, foi a razão Q, relação entre o valor de mercado do capital instalado e o custo de reposição desse capital. Segundo Tobin, medidas de política econômica que favoreçam uma razão Q superior a 1 aumentam a expectativa de lucros correntes e esperados, e estimulam o investimento. G. Mankiw aponta dois exemplos de elevação da razão Q - a redução do imposto de renda sobre lucros e o aumento do preço das ações -, considerando-se que o custo de reposição do capital instalado, denominador da razão Q, é bastante estável [G.Mankw, Macroeconomia, pg. 354]. Dentre os aportes significativos de James Tobin, uma vem Revista de conjuntura

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recebendo maior destaque ultimamente: é a proposta de criação de um imposto específico sobre transações nos mercados de câmbio, o Imposto Tobin. Tratase de uma sugestão feita por ele em 1978, a partir da observação de que a imensa maioria de operações com divisas vinculava-se a eventos de caráter especulativo, divorciados das necessidades da economia real. Com uma alíquota bastante reduzida, de 0,1 %, Tobin imaginava que esse imposto poderia funcionar como um instrumento de regulação dos mercados de câmbio, desestimulando a especulação, sem agravar drasticamente o custo de conversões cambiais essenciais ao comércio internacional. Nos últimos cinco anos, o Imposto Tobin vem encontrando uma ampla acolhida nos segmentos sociais contrários à globalização neoliberal, não apenas em razão de seu caráter regulatório, como também por estar vinculado a uma proposta de formação

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“A dimensão do consenso que se vem

formando em torno do Imposto Tobin adquiriu conotação real com o apoio que lhe foi transmitido, explicitamente, pelo Presidente de Cuba, Fidel Castro”. de um fundo de ajuda aos países periféricos, que se encontram literalmente asfixiados por uma dívida externa crescente, impagável e imoral. Sob a bandeira do Imposto Tobin, constituiu-se na França a Associação pela Tributação das Transações Financeiras e de Apoio ao Cidadão-ATTAC, que coloca este imposto como um marco simbólico na luta contra o grande capital especulativo internacional, um símbolo que pode funcionar como catalisador de uma grande frente internacional na luta por uma outra sociedade- humana, fraterna e solidária. Nos países desenvolvidos – e especificamente nos ambientes de militância contra a ditadura do grande capital –, o controle dos movimentos de capitais de curto prazo e o Imposto Tobin são vistos como portadores de uma mensagem de repúdio à especulação financeira. Nos países periféricos é bem menor a adesão a um imposto do tipo sugerido por Tobin, por razões que vão da desconfiança em sua eficácia para disciplinar os fluxos financeiros entre países ricos e pobres, à dificuldade de acre-

ditar na viabilidade de um fundo destinado à redução da pobreza universal, principalmente se ele for gerido por instituições internacionais. Apesar disso, o Imposto Tobin é um tema sempre presente nos debates realizados por ocasião do Fórum Social Mundial de Porto Alegre e, para os membros da Associação Attac, ele traz embutida a vontade de redistribuição social planetária, podendo até ser visto como um imposto mundial de solidariedade ! Os participantes da Conferência de Monterrey, realizada em março de 2002, pronunciaram-se igualmente a favor de um imposto sobre transações financeiras destinado a gerar recursos para o desenvolvimento econômico, mas também como um instrumento para promover a estabilização do sistema financeiro internacional. A dimensão do consenso que se vem formando em torno do Imposto Tobin adquiriu conotação real com o apoio que lhe foi transmitido, explicitamente, pelo Presi-

Revista de conjuntura

dente de Cuba, Fidel Castro, em pronunciamento feito na abertura da Conferência de Monterrey: “Lo que hace falta para un verdadero desarrollo económico y social sostenible es muchas veces más de lo que se afirma. Medidas como las sugeridas por el recién fallecido James Tobin para frenar el torrente incontenible de la especulación monetaria, aunque no era su idea ayudar al desarrollo, serían hoy tal vez las únicas capaces de generar fondos suficientes que, en manos de los organismos de Naciones Unidas y no de funestas instituciones como el FMI, podrían suministrar ayuda directa al desarrollo con la participación democrática de todos, sin el sacrificio de la independencia y la soberanía de los pueblos. El proyecto de consenso que se nos impone por los amos del mundo en esta conferencia, es el de que nos resignemos con una limosna humillante, condicionada e injerencista.” [Fidel Castro en Monterrey, em 21 de março de 2002] Por esta J. Tobin não esperava, certamente! As palavras de Fidel Castro constituem uma significativa homenagem póstuma a James Tobin, que morreu há pouco, em 2002, e sinalizam as dificuldades políticas que podem encontrar todos os que estão envolvidos na construção de um outro mundo – mais solidário e mais fraterno nestes tempos em que o keynesianismo gera saudades, respeito e homenagens.

* Ceci Vieira Juruá Economista, consultora em “Finanças Públicas” e em “Planejamento de Transportes”.

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Quem tem informação tem poder Revista de Conjuntura, o melhor panorama sobre tudo que anda acontecendo.


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