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Revista Editada pelo CORECON/DF e SINDECON/DF - ANO I1 - nº 10 - ABR/JUN DE 2002

EDITORIAL .............................................................................................................................................. 4

ENTREVISTA

LUIZ ANTONIO FAYET ............................................................................................... 5 ARTIGOS LUÍS FERNANDO VICTOR E JOSÉ CARLOS DE ASSIS Cenários de Política Econômica na perspectiva de 2003.................................................... 9

IDALVO TOSCANO MICROCRÉDITO: da iniciativa local ao centralismo estatal .......................................... 24

EINSTEIN LINCOLN BORGES TAQUARY Legimitimidade do Corecon-DF para fiscalizar a Administração Pública ....................... 37

LÍLIAN ARRUDA MARQUES, ANA GEORGINA DA S. DIAS E MAX LENO DE ALMEIDA Análise dos resultados do Censo 2000 para o mercado de trabalho de Brasília .................... 42

MÔNICA BERALDO FABRÍCIO DA SILVA O Economista e a Economia Mineral ................................................................................ 46

Revista de conjuntura !

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EXPEDIENTE Órgão Oficial do CORECON-DF e SINDECON-DF Diretor Responsável: Roberto Bocaccio Piscitelli Conselho Editorial: Roberto Bocaccio Piscitelli, Carlito Roberto Zanetti, Dércio Garcia Munhoz, José Luiz Pagnussat, José Roberto Novaes de Almeida, Maurício Barata de Paula Pinto e Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo. Jornalista Responsável: Alessandra Cardoso - Reg. 4389 Editoração Eletrônica: OM Comunicação/Jornalismo (0xx61) 425-1090 Tiragem: 4000 Periodicidade: Trimestral As matérias assinadas não refletem, necessariamente, a posição das entidades. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte. ISSN 1677-0668 CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO – DF Presidente: Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Vice-Presidente: Roberto Bocaccio Piscitelli Conselheiros Efetivos: Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo, Roberto Bocaccio Piscitelli, Newton Ferreira da Silva Marques, Mônica Beraldo Fabrício da Silva, José Luiz Pagnussat, Maria Cristina de Araújo, Humberto Vendelino Richter, André Luiz Ferro de Oliveira e Irma Cavalcante Sátiro. Conselheiros Suplentes: Maurício Barata de Paula Pinto, Bento de Matos Félix, Max Leno de Almeida, Jusçanio Umbelino de Souza, José Ribeiro Machado Neto, Francisco das Chagas Pereira, Ronalde Silva Lins, Miguel Rendy e Iliana Alves Canoff. Equipe do CORECON: Iraídes Godinho de Sales Ribeiro, Ismar Marques Teixeira, Michele Cantuária Soares, Jamildo Cezário Gomes e Angeilton Francisco Lima Faleiro. End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 – Brasília –DF Tels: (061) 223-1429 / 223-0919 / 225-9242 e 226-1219 Fax: (061) 322-1176 E-mail: corecondf@corecondf.org.br Site: www.cofecondf.org.br Horário de Funcionamento: das 8:00 as 18:45 horas (sem intervalo) SINDICATO DOS ECONOMISTAS DO DF End: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 203 CEP 70300-907 – Brasília –DF Tel.: (061) 225-5482 Fax: (061) 322-1176 E-mail: sindecon-df@fenecon.org.br Site: www.fenecon.org.br Horário de Funcionamento: das 8:00 as 18:00 horas Diretoria Efetiva: Presidente: Iliana Alves Canoff 1º Vice-Presidente: Vago 2º Vice-Presidente: Otávio de Carvalho Franco Secretário: José Nilson Gomes de Souza Tesoureiro: Gilberto Gatti Suplentes da Diretoria: Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Eugênio de Oliveira Fraga Marcos Cardoso Bularmarqui Victor José Hohl José Honório Accarini Conselho Fiscal: Miguel Rendy Maria Cristina de Araújo Luiz Guaraci David Suplentes do Conselho Fiscal: Marcus Vinicíus da Costa Villarim Humberto Vendelino Richter Geraldo Andrade da Silva Delegado Represent. Junto à Federação Roberto Bocaccio Piscitelli Delegados Suplentes: Mônica Beraldo Fabrício da Silva Irma Cavalcante Sátiro

EDITORIAL A ênfase com que as políticas econômicas passaram a ser tratadas por quase todos os governos colocou a nossa Ciência e seus estudiosos na vitrina da mídia e no dia-adia das pessoas. Muitas das idéias geralmente divulgadas passaram a constituir verdadeiros mitos ou dogmas. Nunca minimizamos a importância de pesquisar e discutir estas questões, democratizando o seu debate. Mas muito nos preocupa que perda gradativa do foco principal desse conhecimento, que o objetivo central de nossos estudos esgote a abordagem do problema às questões técnicas, e se desvie de sua maior finalidade, que é o bem-estar do homem, a prosperidade dos povos. O PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – acaba de divulgar o Relatório sobre o Desenvolvimento Humano – 2002. Felizmente, hoje já se utiliza um indicador mais abrangente que a mera renda per capita. O chamado Índice de Desenvolvimento Humano – IDH, além de ajustar o PIB pelo poder de compra do país, leva em conta também aspectos relacionados à saúde (esperança de vida ao nascer) e à educação (taxas de matrícula e de alfabetização de pessoas com 15 anos ou mais). O Brasil é apenas o 73º numa relação de 173. Subiu duas posições. Em compensação, aumentou ainda mais o índice de concentração de renda (Gini), com base em dados de 1998. Só estamos melhores que Serra Leoa, República Centro-Africana e Suazilândia. Não é agradável fazer comparações com outros países, mas é inevitável sucumbirmos à tentação de admitir que não estamos em boas companhias. Mais preocupante ainda é o fato de que esse indicador deve ter piorado. Por exemplo, a taxa de desemprego do primeiro semestre de 2002 – segundo o IBGE, que adota uma metodologia muito menos abrangente que o DIEESE/Fundação SEADE – foi de 7,3%, contra os 6,3% do mesmo período de 2.001. O número de empregos sem carteira cresceu num ritmo muito superior ao dos com careira, o que indica uma tendência à queda do nível salarial e da arrecadação tributária (sempre compensada por mecanismos mais ineficientes e injustos). Mesmo o crescimento da ocupação não é suficiente para absorver o ritmo de pessoas tentando entrar no mercado de trabalho. E isso só será possível à medida que o País volte a crescer consistentemente, gerando empregos numa proporção compatível com esse crescimento, com o uso adequadamente combinado dos fatores de produção disponíveis e do tipo de demanda compatível com a renda desse novo contingente da população que ingressar no mercado de trabalho. Além disso, há 17 meses consecutivos a renda do trabalhador está caindo. A tendência é decrescente desde 1.998. Só na média dos cinco primeiros meses de 2.002, a queda foi de 4,6% em relação ao mesmo período de 2.001. A situação é ainda mais sombria quando se constata que a deterioração é mais acentuada justamente na indústria, que apresenta níveis de remuneração mais elevados que comércio e serviços. Alguma coisa precisa ser feita urgentemente. A participação da renda do trabalho na renda nacional caiu assustadoramente, e, hoje, se aproxima dos 25%. Nenhum país com economia de mercado pode sustentar-se com essa participação. Transferências contínuas de renda do trabalhador continuam ocorrendo para outros segmentos de dentro e de fora do País, inclusive através do governo. Com efeito, ninguém deve esperar milagres, qualquer que seja o novo governo. Até porque as grandes transformações dependem muito mais da sociedade como um todo, nas suas diversas formas de organização. Mas, qualquer que seja esse governo, ele terá de pensar menos em sua própria sobrevivência do que na da própria sociedade brasileira. Se é verdade que a redistribuição de renda e – sobretudo – a da propriedade – é uma tarefa para gerações, sobretudo após 502 anos, nada justifica e escusa a elite dirigente de iniciar esse processo JÁ, antes que todos estejamos mortos.

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ENTREVISTA

Risco-Brasil e perspectivas para 2003 Entrevista: Alessandra Cardoso Colaborou: Roberto Bocaccio Piscitelli

O endividamento externo privado saltou de 61 bilhões de dólares em 1994 para 119 bilhões de dólares em 2001, passando a representar perto de 25% do PIB. A dívida total do setor público evoluiu de R$ 153 bilhões em 94 para R$ 660 bilhões em 2001; parte dela vem sendo dolarizada e continua crescendo. A carga

As contas externas nos últimos três anos têm apresentado

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de uma população que é muito pobre.

IPT

40% e atingindo níveis que desafiam a capacidade contributiva

CPMF TS PIS FG INSS IRPF IR IPVA EC T

IPI

ISS

tributária passou de 23% para 34% do PIB crescendo perto de

ICMS

rombos superiores a 50 bilhões de dólares/ano, requerendo empréstimos e investimentos estrangeiros para se equilibrarem. A política cambial durante todo o período manteve o dólar artificialmente barato, beneficiando as importações e dificultando as exportações de bens e serviços. O Brasil deixou de ganhar no comércio externo, em média, 12,4 bilhões de dólares/ano e passou a perder, em média, 3,3 bilhões de

Segur

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dólares/ano. Os países ricos defendem o livre comércio, mas a cada dia criam mais barreiras nos seus mercados, com sobretaxas e, especialmente, subsídios para os produtos rurais, avaliados em US$ 370 bilhões em 2001. Segundo o economista e consultor de empresas Luiz Antonio Fayet, a situação econômica do Brasil é bastante delicada. A deterioração de alguns agregados de nossas contas nos últimos 7 anos faz com que, a curto prazo, o País apresente elevadíssimo risco, em particular para o dinheiro especulativo , afirma Fayet em entrevista à Revista de Conjuntura.

Revista de conjuntura #

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Conjuntura - Qual a sua opinião sobre os chamados Fundamentos da Dívida Pública? Fayet - É um importante instrumento de política econômicofinanceira, especialmente para equilibrar fluxos de caixa, bem como para apoiar políticas públicas, preferencialmente em investimentos reprodutivos, como ocorreu no governo Geisel, financiando a construção de infra-estrutura econômica. Entretanto, duas cautelas são fundamentais: a proporção em relação ao PIB e o custo da rolagem.

com que, a curto prazo, o País apresente elevadíssimo risco, em particular para o dinheiro especulativo. No entanto, para investimentos produtivos com maturação de mais longo prazo, como o ramo automotivo, o Brasil é a melhor opção no mercado mundial.

Conjuntura - Há razões para os investidores terem receio quanto à situação atual e futura do País? Fayet - Sim.

Conjuntura - Há confiabilidade nas avaliações feitas pelas chamadas agências internacionais de risco? Fayet - Tenho lido um pouco dessas análises. Apesar das notas apropriadas dadas ao Brasil, as indicações de causas mostram que os analistas, de modo geral, pouco conhecem de nossa economia produtiva e de sua alta competitividade natural.

Conjuntura - É justo e razoável classificar o Risco-Brasil como um dos maiores do mundo? Fayet - A deterioração de alguns “agregados” de nossas contas nos últimos 7 anos faz

Conjuntura - Quais as perspectivas de evolução, rolagem e resgate da dívida pública brasileira? Fayet - Sem crescimento econômico e com altos custos, a dí-

vida é impagável. Nos sete anos e meio do governo do Presidente Fernando Henrique, a dívida pública total pagou cerca de 750 bilhões de reais de juros, e continua crescendo, tanto em termos absolutos como em relação ao PIB. Neste período, a carga tributária cresceu perto de 40%, atingindo 34% do PIB, um valor insuportável. Mesmo assim, os recursos gerados não reverteram o crescimento da dívida. Adicionalmente, o fruto das privatizações foi pelo ralo. De qualquer forma, a contenção da corrupção e dos desperdícios é fundamental. Conjuntura - Há viabilidade de algum tipo de renegociação das dívidas externa e interna? Em que condições isto seria factível? Fayet - Mudando o foco da política econômica, sim. O governo, obcecado pela estabilização da moeda, esqueceu o País. Mistificou a estrutura de índices de preços, manipulou câmbio e represou a infla-

Nos sete anos e meio do governo do Presidente FHC, a dívida pública continua crescendo, tanto em termos absolutos como em relação ao PIB .

O governo, obcecado pela estabilização Revista de conjuntura $

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bastou o governo perder a capacidade de cabrestear o câmbio, sua elevação para a faixa de R$ 2,90, já permitiu a melhoria de exportações, empresas e empregos . ção, sem resolvê-la. Com a política de dólar artificialmente barato, nós, que acumulávamos superávits comerciais da ordem de 12,5 bilhões de dólares ao ano, passamos a acumular déficits anuais próximos de 4 bilhões. Somando o que se deixou de ganhar com o que se passou a perder, o total ultrapassa 110 bilhões de dólares em sete anos, ou seja, valor equivalente a seis usinas do tipo Itaipu. Hoje, com as contas externas arrebentadas, demandando mais de 50 bilhões de dólares para o seu fechamento anual (3 Itaipus), atingimos um grau de dependência insuportável. Mas a capacidade de nossa economia para reverter o quadro é fantástica; somos muito competi-

tivos. Vejamos o exemplo: bastou o governo perder a capacidade de cabrestear o câmbio; sua elevação para a faixa de R$ 2,90, embora ainda tecnicamente defasada, já permitiu a melhoria de exportações, empresas e empregos. Vendo a economia crescer, os credores se acalmarão e não hesitarão em rever prazos. Conjuntura - Em que medida e prazos seria possível reduzir as taxas de juros? Fayet - A redução dos juros primários poderia ser acelerada já, pois, no caso brasileiro, eles só têm grande importância para a dívida pública, de vez que as operações mercantis pagam cerca de cinco vezes mais, pois incluem tributos, compulsórios etc.

Conjuntura - Que análise o senhor faz do impacto da crise argentina na economia brasileira? Fayet - Sob o aspecto didático, foi ótima; permitiu criar em muitos brasileiros a percepção de que o controle artificial do câmbio e o descontrole das contas públicas é suicídio. Entretanto, sob o aspecto econômico está sendo muito ruim; afinal, era o mercado para mais de 10% de nossas exportações e o nosso grande parceiro no MERCOSUL. Para o Sul do Brasil a questão foi muito pior, pois as relações econômicas têm proporções ainda maiores. Conjuntura - Que previsões o senhor faria no tratamento da questão Dívida Pública para o próximo governo? Fayet - É uma incógnita. Entretanto, como os candidatos a presidente dizem considerar que só o crescimento econômico poderá diluir os problemas gerados pelo atual governo, poderemos respirar aliviados. Nossa economia é altamente competitiva, pois paga as maiores taxas de juros e uma das maiores cargas fiscais do mundo, sofre com o elevado custo Brasil, luta contra os subsídios e a concorrência desleal dos países ricos, tem suportado taxas de câmbio artificiais com o dólar entre 20 e 30% mais barato do que deveria ser, e, mesmo assim, consegue sobreviver. O Brasil é a melhor fronteira econômica do mundo; basta que os governos parem de atrapalhar.

da moeda, esqueceu o País . Revista de conjuntura %

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A R T I G O

Cenários de Política Econômica na perspectiva de 2003 Luís Fernando Victor * José Carlos de Assis ** I - Objetivo Este estudo tem por escopo examinar a margem de manobra da política macroeconômica brasileira, a partir de 2003, para atingir dois objetivos fundamentais de economia política: a redução da vulnerabilidade externa da economia e a redução progressiva e rápida da taxa de desemprego. Admite-se que a vulnerabilidade externa, tendo em vista especialmente a eventualidade de crises monetárias e financeiras internacionais, limita as possibilidades de crescimento e de geração de emprego, enquanto a alta taxa de desemprego expõe a sociedade a riscos crescentes de natureza social, implicando a queda recorrente da renda do trabalho (vide Argentina). Adotamos como indicador da vulnerabilidade externa da economia o déficit em conta corrente do balanço de pagamentos, associado ao cronograma de amortização da dívida externa pública e

privada, cuja política de controle (taxa de juros básica) tem reflexo na evolução da dívida pública mobiliária interna. Em relação ao emprego, tomamos dois indicadores: a taxa de desemprego absoluto, medida pelo IBGE, usada como mensurador oficial do desemprego, e o que denominamos de taxa de desemprego efetivo, também medida pelo IBGE, e que reúne desocupados absolutos, ocupados sem remuneração, e ocupados com remuneração inferior a um salário mínimo. Nosso foco de atenção são as políticas monetária, creditícia e fiscal, em razão do seu caráter estruturante ou condicionante das demais políticas econômicas, inclusive cambial. As próprias políticas ativas e compensatórias do Governo na área social são limitadas pela política fiscal, assim como políticas de incentivo a áreas prioritárias da economia (ex., exportação) são restringidas pela política de juros. É que, se esta última não Revista de conjuntura '

afeta as empresas exportadoras diretamente envolvidas, por gozarem de crédito favorecido, afeta o conjunto da rede de fornecedores e a eficiência global da economia. Em síntese, as políticas monetária, creditícia e fiscal são aqui consideradas como variáveis de controle, enquanto as demais são consideradas dependentes ou secundárias. II - Caracterização da situação atual da economia (março de 2002) A taxa de crescimento média da economia, entre 1995 e 2001, se limitou a 2,41% . Nesse período, a renda per capita ficou praticamente estagnada (crescimento anual de 1,01% em dólares). O principal reflexo do fraco desempenho da economia foi a gradativa elevação da taxa de desemprego, em ambos os conceitos aqui considerados. A taxa de desemprego aberta, em seis regiões metropolitanas (PME, como % da PEA), passou de

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4,67% em janeiro de 1995 para 7,79% em fevereiro de 2.002. O desemprego efetivo, em fevereiro último, estava em 15,4% - taxa similar à que o Censo de 2000 encontrou para o país inteiro: 15,04%. No que se pode considerar como efeito indireto do alto desemprego, a renda média real do pessoal ocupado teve uma queda acumulada de 10,8% entre 1998 e 2001. A situação externa deteriorouse rapidamente desde o Plano Real, em face de elevados déficits comerciais, e só emitiu sinais de ligeira recuperação nos dois últimos anos. A balança comercial, que no ano de 1994 fechou com um superávit de US$ 10,843 bilhões, depois de acusar déficits sucessivos apresentou um pequeno superávit de US$ 2,6 bilhões em 2001. O déficit em conta corrente, por sua vez, aumentou de US$ 1,312 bilhão em fins de 1994 para US$ 23,5 bilhões em fins de 2001. O financiamento do déficit do balanço de pagamentos só foi possível em função do aumento dos investimentos externos diretos, sendo grande parte deles para privatização de estatais e outra parte para aquisição de empresas brasileiras privadas, isto é, para meras trocas

patrimoniais, sem efeito no aumento do emprego e da renda. Na composição do déficit em conta corrente, destacam-se, ao lado dos juros da dívida externa, as remessas de lucros e dividendos, assim como os serviços de fretes. A progressiva elevação das remessas de dividendos já começa a refletir o efeito da privatização para estrangeiros de estatais da área de serviços, não geradoras de divisas, ao mesmo tempo em que a conta crescente de fretes se deve ao desmantelamento quase completo da marinha mercante brasileira. Isso dá ao desequilíbrio em conta corrente um caráter estrutural e dinâmico, irreversível no marco da economia política atual. O aparente “equilíbrio” externo da economia tem-se sustentado, sobretudo, nas políticas monetária, creditícia e fiscal, de caráter severamente restritivo, que se justificam ora pela intenção de controle da inflação, com refreada do crescimento, ora para atrair crédito externo no sentido de ajudar a fechar o balanço de pagamentos. Entre 1995 e 2001, o crédito interno ao sistema econômico oscilou em torno de 30% do PIB, e caiu no último ano para 27%, situando-se entre os mais

O aparente equilíbrio externo da economia tem-se sustentado nas políticas monetária, creditícia e fiscal, que se justificam ora pela intenção de controle da inflação, ora para atrair crédito externo . Revista de conjuntura

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restritos do mundo. Por sua vez, o resultado primário consolidado do setor público vem sendo mantido num patamar superavitário desde 1998, fechando em 2001 no nível de R$ 43,6 bilhões ( 3,5% do PIB). A dívida mobiliária interna líquida evoluiu de R$ 60 bilhões em dezembro de 1994 para R$ 660,9 bilhões em dezembro último (de 30,3% para 53,3% do PIB) .Como o resultado primário do setor público esteve superavitário na maior parte do período, a decuplicação da dívida pública mobiliária, no correr do período, resultou principalmente da acumulação de juros, sem qualquer relação com o investimento e o gasto público em geral. Em síntese, a combinação das políticas monetária, creditícia e fiscal teve um tremendo efeito contracionista na economia, restringindo o crescimento do produto, favorecendo o aumento do desemprego e a queda da renda do trabalho. A situação atual caracterizase, assim, como de inflação sob controle, crescimento baixo, vulnerabilidade externa elevada, dívida mobiliária crescente, ativos privatizáveis virtualmente esgotados, taxas de juros extremamente altas e grande desemprego. No discurso oficial, contudo, nota-se uma certa euforia, derivada do fato de que a crise argentina, pelo menos no primeiro momento, não “contagiou” os investidores internacionais (e os domésticos) relativamente ao desempenho cambial brasileiro. Ao contrário, a partir de fins de 2001 o câmbio acusou valorização, no que se interpretou, a nosso juízo precipitadamente, como


indicador de solidez dos fundamentos da economia brasileira. III - Pressupostos da política econômica atual É evidente que o fraco desempenho do PIB, o aumento da dívida interna e o elevado desemprego não são resultantes de um propósito explícito do Governo. São resultados inexoráveis de uma política macroeconômica que concentrou todos os seus esforços no controle da inflação e na liquidez externa, mediante aplicação de um modelo de políticas monetária e fiscal extremamente restritivo, seguindo os padrões recomendados pelo FMI, Banco Mundial e Tesouro norteamericano. O baixo crescimento do PIB e o alto desemprego escapam do campo de atenção do modelo, cuja variável visada é principalmente, ao lado da inflação, o financiamento do déficit externo em conta corrente, e cuja variável de controle é a própria restrição fiscal e monetária. No que concerne aos preços, é importante notar que não estamos diante de resultados inevitáveis de qualquer política antiinflacionária. Estamos diante, sim, de resultados perversos de uma específica política antiinflacionária, centrada num excesso de restrição monetária, creditícia e fiscal, e que se traduz por uma radical “financeirização”da economia. A intolerável inflação brasileira da primeira metade dos anos 90 e de períodos anteriores se deveu essencialmente à política comercial “fechada”, junto com a indexação cambial. Uma vez “aberta” a economia e estabilizado o câmbio,

Estamos diante, sim, de resultados perversos de uma específica política antiinflacionária, que se traduz por uma radical financeirização da economia . os preços internos se estabilizaram – como ocorreu em outros países com iguais condicionantes. A “abertura” comercial teve custos para a economia, em especial de empregos, mas esses custos poderiam ter sido suavizados mediante o recurso a políticas monetária e fiscal ativas, geradoras de crescimento e de emprego, sem necessariamente o risco de retomada da inflação de preços. Ao contrário, o Governo radicalizou no seu “fundamentalismo” monetarista e fiscalista, em especial depois da crise do México, no início de 1995. Desde então, a política econômica tem seguido um padrão uniforme, no qual a elevação e sustentação de elevadas taxas de juros tem sido o instrumento fundamental de ação, e a realização de elevados superávits no orçamento primário, um coadjuvante considerado essencial. A isso se deu o nome de política macroeconômica “responsável”. Os principais pressupostos da política econômica atual se enquadram nos parâmetros da economia política neoliberal, adaptados a um país do Terceiro Mundo conformado à alta dependência Revista de conjuntura

de recursos externos. Podem ser sumarizados da forma a seguir. 1. Somos uma economia em parte atrasada e subdesenvolvida, e essa condição não pode ser superada seguindo a estratégia tradicional da liderança ou da ação direta do setor público, porque o setor público, desde a crise da dívida externa, esgotou sua capacidade de financiamento ou tornou-se financeiramente inviável. 2. Disso se segue a necessidade de reestruturação do Estado, da qual o programa de desestatização ou de privatização é o instrumento fundamental, possibilitando a retomada de investimentos em setores básicos e estratégicos sob comando da iniciativa privada. 3. Em face da realidade incontornável da globalização, é fundamental a abertura da economia em todos os níveis, de forma a nos integrarmos à onda de progresso tecnológico internacional no marco do capitalismo liberal. 4. Em face da insuficiência ou fragilidade do capital nacional para promover o desenvolvimento econômico e tecnológi-

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co, inclusive quanto à absorção das empresas desestatizadas, é essencial abrir a economia ao investimento direto estrangeiro. 5. A fim de criar um ambiente favorável ao investimento direto estrangeiro, faz-se mister não só a abertura comercial, mas também a abertura financeira e bancária, para o que se deve assegurar, mediante a desregulamentação do setor, o fluxo nas duas direções do capital aqui investido, mediante uma adequada (alta) taxa de juros básica. 6. A abertura bancária e financeira cria um condicionante para a política monetária, que deve ser respeitado pelo Banco Central (as taxas básicas de juros devem ser monitoradas num nível suficientemente alto para assegurar um prêmio em relação a ativos financeiros externos, sobretudo norte-americanos). 7. A política fiscal deve ser conciliada com a política monetária, de forma a dar aos portadores de títulos públicos brasileiros a segurança real e psicológica de sua liquidez (daí o compromisso de gerar superávit acima de 3% do PIB no orçamento primário). 8. As restrições monetárias e fiscais impedem o crescimento econômico a altas taxas, mas

este, por um lado, é o preço da estabilidade e, de qualquer forma, caracteriza uma situação perfeitamente compatível com a realidade de um crescimento demográfico mais fraco do que o registrado na época do crescimento a altas taxas (7% em média ao ano), conforme assinalou várias vezes o ministro Pedro Malan. 9. Para assegurar coerência interna do setor público em seu conjunto aos ditames do programa neoliberal, Estados e Municípios maiores foram submetidos aos condicionamentos draconianos da reestruturação de suas dívidas e da Lei de Responsabilidade Fiscal, que limitam drasticamente seus gastos com serviços públicos essenciais e com pessoal, e seu recurso a crédito, pelo que, em nome de uma suposta responsabilidade fiscal, se generalizou na Federação o princípio da irresponsabilidade social. A política econômica derivada desse modelo de economia política opera entre limites estreitos, determinados basicamente - insista-se - pela situação externa. Os “operadores” do modelo são a taxa básica de juros e o superávit do orçamento primário, que devem ser ajustados,

O modelo não deixa margem para crescimento elevado do produto, redução do desemprego e aumento da renda do trabalho . Revista de conjuntura

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freqüentemente de forma drástica – como no início de 1995, quando a taxa básica de juros foi elevada a 45% -, toda vez que o déficit em conta corrente ameaça sair do controle. Como o déficit aumenta quando a economia tende a expandir-se, os controles monetário e fiscal são mecanicamente acionados, fixando um patamar rígido para a redução da taxa de juros e um teto baixo para o gasto público. O “modelo” não deixa margem, pois, para crescimento elevado do produto, redução do desemprego e aumento da renda do trabalho. E nem é seu propósito. A variável emprego não entra nas equações e de fato não tem sido considerada sequer no discurso oficial. Este último incorporou a escusa de que o alto desemprego é um fenômeno estrutural mundial, decorrente dos processos de desenvolvimento tecnológico e de ganhos de eficiência nos sistemas produtivos globalizados. Com isso, está-se cristalizando uma economia política de extrema iniqüidade, na qual se aceita moralmente que uma percentagem elevada da população seja excluída do trabalho remunerado enquanto fonte de sobrevivência com dignidade. Ao lado das seqüelas sociais, uma conseqüência econômica de extrema gravidade dessa política é a elevação contínua e rápida da dívida pública interna, sem qualquer relação com o investimento público produtivo ou em serviços. O crescimento da dívida a taxas muito superiores às do crescimento da economia sinaliza a segunda maior vulnerabilidade da economia, ao lado da vulnerabilidade externa.


IV - A insustentabilidade do crescimento da dívida pública

redutores da dívida, destacam-se o superávit primário alcançado (R$ 109,9 bilhões) e as receitas das privatizações (R$ 30,2 bilhões). O gráfico do saldo primário versus dívida líquida do setor público mostra a sua insustentabilidade no tempo, nos termos da política atual, já que, para diminuí-la, será necessário aumentar radicalmente o saldo primário ou reduzir drasticamente as taxas de juros e os encargos cambiais que incidem sobre ela. Do aumento da dívida acumulada no ano de 2001 (R$ 97,7

Desde o início do regime de flutuação cambial, em fevereiro de 1999, até dezembro de 2001, a dívida pública cresceu R$ 176,8 bilhões. As causas do crescimento foram principalmente os juros nominais (R$ 163 bilhões), a valorização do dólar usado como indexador da dívida interna (R$ 102,2 bilhões) e da parcela da dívida pública externa (R$ 9,8 bilhões), e os esqueletos reconhecidos (R$ 41,9 bilhões). Como

bilhões), o pagamento de juros (internos e externos) representou R$ 86,4 bilhões, incluindo-se aqui os efeitos da pressão cambial sobre a parcela da dívida que foi efetivamente paga no período. O reconhecimento de dívidas contraídas no passado (esqueletos) respondeu pelo incremento de R$ 36,7 bilhões, sendo que a mencionada desvalorização do real ao longo de todo o ano sobre o estoque da dívida interna atrelada ao dólar, e sobre o estoque da dívida externa, foi responsável pelo aumento de R$ 35,94 bilhões

Resultado Primário x Dívida Llíquida do Setor Público (valores) 700000 600000 -

R$ Milhões

500000 400000 300000 200000 -

Dez/1994

Dez/1995

Dez/1996

Dez/1997

Dez/1998

Dez/1999

Dez/2000

-

-

-

-

-

-

-

0 -

-

100000 -

Dez/2001

-100000 -

Resultado Primário

A dívida líquida do setor público ( governo central, governos estaduais e municipais e empresas estatais) atingiu em dezembro de 2001 o valor de R$ 660,9 bilhões (53,3% do PIB). A desvalorização do real ao longo do ano, a elevação dos juros básicos (Selic) e o reconhecimento dos esqueletos

Dívida Líquida do Setor Público (saldos) Tatal

(dívidas passadas) foram responsáveis pelo crescimento real da dívida, que representava 49,3% do PIB no início de 2001. A influência da taxa de câmbio sobre o estoque da dívida pode ser medido pela elevada participação de obrigações com correção cambial no total do endividamento públiRevista de conjuntura !

co, que atingiu o ponto máximo de 52,1% em outubro, quando no início do ano representava 39,7%. De outubro a dezembro, no entanto, a apreciação do real reduziu a dívida em R$ 46,24 bilhões, diminuindo para 46,9% a participação da dívida (interna e externa) sensível à variação cambial

abr/jun de 2002


Perfil da Dívida Pública Perfil da Dívida Pública (%)

dez/99 dez/00 jan/01 fev/01 mar/01 abr/01 mai/01 jun/01 jul/01 ago/01 set/01 out/01 nov/01

Dívida/PIB

49,4

49,3

49,0

49,6

50,2

50,4

Total da dívida Pública (a+b)

100,0

100,0

100,0

100,0

100,0

100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

(a) Interna

51,9

51,3

52,8

54,0

54,7

54,5

53,1

78,9

80,2

82,0

81,6

80,5

80,1

79,1

81,0

80,3

79,8

78,8

78,9

78,8

(i) Indexada ao Câmbio

19,4

19,9

20,4

20,8

21,7

22,6

24,1

24,7

24,6

26,5

29,4

31,0

29,5

(ii) Não Indexada ao Câmbio

59,5

60,3

51,5

60,8

58,8

57,5

55,0

56,4

55,7

53,3

49,5

47,9

49,3

(b) Externa

21,1

19,8

18,0

18,4

19,5

19,9

20,9

19,0

19,7

20,2

21,2

21,1

21,2

Dívida Pública Indexada ao Dólar (i) + (b)

40,5

39,7

38,5

39,2

41,2

42,5

45,0

43,6

44,3

46,7

50,5

52,1

50,7

Resultado Primário x Dívida Llíquida do Setor Público (% do PIB) 60 -

50 -

40 -

30 -

20 -

1994

1995

1996

1997

1998

1999

-

-

-

-

-

-

0 -

-

10 -

2000

2001

-10 -

Dívida Líquida do Setor Público (% do PIB)

V - A insustentabilidade da política creditícia Embora mantidas em patamares extremamente elevados nos últimos sete anos, as taxas básicas de juros caracterizam apenas em parte a distorção estrutural do sistema bancário brasileiro. É do lado das aplicações que fica patente a disfunção do crédito no Brasil. Segundo dados oficiais do Banco Central para dezembro de 2001, as taxas cobradas das empresas industriais,

Dívida Líquida do Setor Público (saldos) Tatal

comerciais e de serviços alcançaram, em média, 60% ao ano, enquanto as de diferentes formas de crédito ao consumidor (cheque especial, cartão etc.) atingiram 72%. Além disso, existe uma dispersão acentuada: no crédito pessoal, o custo chegou a 84%, enquanto para o cheque especial atingiu 160% ao ano. Os elevados spreads bancários brasileiros não têm paralelo no mundo. Em dezembro último, eram, em média, de 42%, considerando-se um custo médio de

Revista de conjuntura "

abr/jun de 2002

captação via CDB de 18,56% próximo da taxa do over (19%). Como conseqüência, temos tido elevados coeficientes de inadimplência, o que, paradoxalmente, costuma ser apresentado como causa e não como efeito das altíssimas taxas bancárias. Ainda segundo dados do Banco Central, a inadimplência das operações de crédito com recursos livres continuou registrando, em janeiro, a tendência de crescimento verificada ao longo de 2001. Nas operações com pessoas jurídicas,


o percentual de atrasos cresceu 0,7 p.p., atingindo 6,7%, influenciado, principalmente, pelas operações para capital de giro. No segmento de crédito a pessoas físicas, o incremento dos atrasos foi mais acentuado, resultando em aumento de 0,9 p.p., totalizando 14,6% em janeiro. O custo do crédito é o resultado da taxa básica de juros acrescida do spread bancário. São muitas as variáveis que devem ser consideradas ao se definir o spread de cada operação, bem como cada empréstimo tem características que implicam um processo específico de determinação de preço. Todavia, o spread bancário pode ser dividido em quatro componentes interrelacionados: a) restrições operacionais; b) tributação; c) custos e riscos; e d) lucro dos bancos. Entre as restrições operacionais, no caso brasileiro, está o alto coeficiente de encaixe compulsório sobre depósitos a vista (45%) e a prazo (10%). O compulsório determina a escassez relativa do crédito: quanto mais elevado, menor é a disponibilidade de recursos dos bancos e financeiras para empréstimos ao setor produtivo. O efeito combinado desses quatro fatores é o extravagante custo do crédito ao setor produtivo e, pela mesma lógica, sua extrema escassez. Somos uma economia capitalista caracteristicamente sem crédito. Um levantamento recente divulgado pelo BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento mostra que o crédito ao setor privado como proporção do PIB nos anos 90 foi, em média, de 90% nos países do Sudeste Asiático, de 91% nos países de-

senvolvidos e de 35% na América Latina. No Brasil, segundo os últimos dados do Banco Central, o volume de crédito do sistema financeiro como proporção do PIB é inferior ao próprio indicador já reduzido da América Latina: caiu de 28% em 2000 para 26,8% em dezembro de 2001. O reduzido volume de crédito ao setor produtivo no Brasil constitui um dos fatores centrais explicativos do baixo crescimento do produto nos últimos anos. Indica, por outro lado, uma margem a ser explorada na retomada do crescimento, sem risco de tensões inflacionárias. Uma política coerente de expansão do crédito terá que combinar, necessariamente, de forma invertida em relação à situação atual, os instrumentos básicos de política monetária, a saber: redução do compulsório, queda da taxa de juros Selic e redução dos spreads bancários, a partir dos bancos públicos. É evidente, contudo, que uma tal política não seria viável no contexto da atual vulnerabilidade externa da economia, em face do impacto nas contas externas do próprio crescimento por ela induzido. Isso significa que, como passo prévio

para expandir o crédito e reduzir o seu custo para o setor produtivo, terão que ser aliviadas as restrições externas ao equilíbrio do balanço de pagamentos, seja por força de um considerável aumento de exportações, seja por redução ou substituição de importações, seja por uma queda negociada na conta de serviços. VI- Pressupostos de uma política econômica alternativa Em confronto com os pressupostos acima da economia política atual, uma nova economia política terá de fundamentar-se nos parâmetros a seguir. 1. O atraso sócio-econômico do País se deve, fundamentalmente, a uma estrutura de distribuição de renda e de riqueza historicamente iníqua, que só pode ser superada retomando-se o crescimento econômico a altas taxas, inclusive de produção de bens-salário, sem o que será impossível absorver o desemprego existente, reduzir o subemprego e promover, enfim, o pleno emprego – única condição do mercado de tra-

São muitas as variáveis que devem

ser consideradas ao se definir o spread de cada operação, bem como cada empréstimo tem características que implicam um processo específico de determinação de preço . Revista de conjuntura #

abr/jun de 2002


balho compatível com a cidadania ampliada, e indispensável para o aumento de renda de baixo para cima e para a melhoria de sua distribuição. 2. O desenvolvimento a altas taxas, com base no mercado interno – embora sem necessariamente uma ruptura radical com o externo (comercial), que lhe deve ser complementar -, requer uma política monetária favorável (baixas taxas de juros e alta disponibilidade de crédito) e uma política fiscal ativa (gastos ampliados em investimentos e serviços públicos, inclusive no estímulo às exportações). 3. A condição da mudança na política monetária, creditícia e fiscal, no curto prazo, é a recuperação do controle soberano sobre o sistema financeiro, se possível com suporte internacional, para manter o equilíbrio do balanço de pagamentos (junto a FMI, BIRD, BID e governos dos países industrializados, num novo contexto mundial de cooperação e não de imposição e subordinação). 4. A condição para a recuperação do controle negociado dos fluxos de recursos exter-

nos, no médio prazo, é o lançamento simultâneo de um vigoroso programa de estímulo a exportações e de substituição de importações, assim como de incentivo ao desenvolvimento científico e tecnológico, mobilizando não apenas o setor produtivo nacional mas sobretudo o multinacional aqui instalado, ao lado de um programa consistente de redução do custo-Brasil, em especial o do crédito e o de logística. Em outras palavras, manter e eventualmente acentuar a abertura econômica pelo lado real, ao mesmo tempo em que se renacionalize a economia pelo lado bancário e financeiro. 5. A re-regulamentação do sistema bancário e financeiro, eliminando as arbitragens internacionais com reservas bancárias e poupança interna, possibilitará a institucionalização de um novo regime de financiamento da dívida pública interna, ao mesmo tempo em que permitirá a ampliação do volume de crédito ao sistema produtivo, a taxas de juros razoáveis.

O sistema sugerido deverá ser equacionado pela conciliação da política monetária e fiscal , que estabilize a relação dívida pública interna/PIB, com o superávit no resultado primário . Revista de conjuntura $

abr/jun de 2002

6. O sistema sugerido deverá ser equacionado pela conciliação da política monetária e fiscal, de forma a que num certo horizonte de tempo – digamos, cinco anos – se estabilize a relação dívida pública interna/PIB, com o superávit no resultado primário que for necessário para o equilíbrio das contas públicas internas e externas. 7. Para evitar a recidiva inflacionária, será importante manter a abertura comercial, não obstante casos específicos de proteção à indústria local que possam ser atendidos, em defesa do emprego e da renda internos. 8. A retomada do crescimento a altas taxas garantirá o aumento da poupança interna e, em especial, o incremento da receita pública, que é fundamental para a implementação de uma política de pleno emprego, que dependerá em grande escala da criação de empregos no setor público (educação, saúde, segurança, habitação, assistência social, aceleração da reforma agrária). 9. A reforma agrária deverá ser reconceituada, de forma a reduzir os custos sociais da propriedade da terra transferida e a eliminar sua manipulação como negócio fraudulento público-privado, assim como a assegurar condições de crédito adequadas para os assentados, incluindo-se, no seu escopo, a proteção pública ao pequeno agricultor em geral, como forma de preservar e criar postos de trabalho remunerado para uma parcela da população


que ainda representa cerca de 18% do total. 10.Revogação parcial da Lei de Responsabilidade Fiscal, de forma a possibilitar o endividamento socialmente responsável do setor público e a adequação à realidade social dos gastos de pessoal, e re-reestruturação, vinculada a programas sociais, da dívida de origem monetária dos Estados e Municípios, de forma a rebater os efeitos da política monetária de juros estratosféricos dos anos 94 a 1999. Em face do objetivo político de retomar o crescimento sustentável a altas taxas e promover uma política de pleno emprego, a partir de 2003, consideraremos, à frente, três possíveis cenários: 1) conservador – mantém-se a estrutura da política econômica atual, na expectativa de uma melhoria progressiva dos indicadores econômicos e sociais por força do aumento das exportações e do superávit comercial; 2) gradualista – mediante uma redução gradual da taxa básica de juros, reforçando os objetivos anteriores; 3) reestruturante – mediante uma política de promoção do pleno emprego e de alto crescimento, através de alteração drástica das políticas monetária, creditícia e fiscal. As opções políticas associadas a cada um desses cenários sofrerão influência dos eventos políticos de 2002, em face das eleições gerais e da sucessão presidencial. Isso requer uma avaliação também do “cenário de transição”, sob condução do atual Governo. Nossa hipótese básica, neste caso, é que fatores objetivos e subjetivos tendem a

As opções políticas associadas a

cada um desses cenários sofrerão influência dos eventos políticos de 2002, em face das eleições gerais e da sucessão presidencial . agravar o quadro de vulnerabilidade externa da economia, estreitando ainda mais a margem de manobra do futuro Governo para uma abordagem gradualista da mudança econômica. VII - Cenário de Transição Tudo indica que o Governo manterá o caráter básico da política econômica em 2002, dentro dos parâmetros restritivos estabelecidos pelo acordo com o FMI em seu último ano de vigência, conforme se pode deduzir do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias encaminhado pelo Executivo ao Congresso. Seja pela razão formal do fim do acordo, seja em razão das tendências de intenções de votos que colocam os candidatos de oposição na dianteira, é de se esperar uma pressão financeira sobre o balanço de pagamentos, tanto por restrição de entradas quanto por estímulo à saída de capitais. Nesse contexto, mesmo na hipótese de que não haja nenhuma nova turbulência internacional e que o saldo na balança atinja as metas previstas (US$ 6 bilhões), as restrições externas devem traduzir-se em: I. queda acentuada dos investimentos externos diretos; Revista de conjuntura %

II. estabilização ou nova elevação da taxa básica de juros a partir de seu patamar atual já elevado; III. esforço fiscal adicional para realização de superávit no orçamento primário, em nível igual ou superior ao atual (3,5% do PIB); IV. manutenção das restrições ao crédito de caráter geral; V. manutenção dos estímulos às exportações; VI. eventual imposição de barreiras a importações. Neste cenário, a economia tenderá à estagnação ou a repetir as baixas taxas de crescimento dos últimos anos, com estagnação ou queda da renda per capita, manutenção ou aumento da taxa de desemprego e redução da renda do trabalho. Isso pode sugerir que o Governo venha a recorrer a medidas de caráter eleitoreiro para influir no resultado das eleições, alterando esse cenário. Contudo, a natureza de seus condicionamentos é de tal ordem que qualquer alívio a ser dado passa por um relaxamento nas políticas monetária e fiscal, sendo que tal relaxamento resultará em efeitos econômicos perversos a curto prazo, e efeitos sociais positivos retardados – sendo, pois, contraproducente para influir nas eleições.

abr/jun de 2002


Em 1989, o Governo Sarney, depois

da tentativa fracassada do Plano Verão, viu-se na contingência de adotar como única medida defensiva a declaração da moratória . Ao se levarem em conta os fatores político-eleitorais, é importante notar que o ano de 2002 tem mais semelhanças com o de 1989 do que os de 1994 e 1998. Em 1989, o Governo estava com um baixíssimo nível de credibilidade, devido sobretudo à inflação. Em 2002, a baixa credibilidade do Governo se deve fundamentalmente ao alto desemprego e à estagnação ou queda da renda do trabalho. Em 1989, o Governo Sarney, depois da tentativa fracassada do Plano Verão, viu-se na contingência de adotar como única medida defensiva a declaração da moratória. Em 2002, não se pode descartar de antemão alguma medida de controle de câmbio, a despeito do montante atual de reservas (US$ 37 bilhões), no caso de uma redução drástica dos investimentos combinada com um desempenho insatisfatório das exportações e das importações. Compare-se, por outro lado, a situação atual com os anos eleitorais de 1994 e 1998. Em 94, a baixa credibilidade do Governo no primeiro semestre de inflação descontrolada foi mais do que compensada pelos efeitos do Plano Real no meio do ano. Em 98, o Governo se valeu não apenas da credibilidade ainda grande do

Plano Real, como manteve o real artificialmente valorizado antes das eleições. Em 2002, diante da crise social agravada, não há plano, dentro dos atuais condicionantes, capaz de ter efeito a tempo de influir na credibilidade oficial perante a opinião pública. É que a inflação pode ser reduzida de um golpe (Plano Cruzado, Plano Verão), enquanto o emprego e a renda do trabalho demandam tempo para reagir à política econômica – sobretudo às de fim de governo. Passemos agora aos cenários da economia política brasileira a partir de 2003. VIII - Cenário I Conservador O Presidente eleito, seja da situação, seja da oposição, poderá optar por manter a estrutura básica da economia política atual, na expectativa de que tenha resultados sociais positivos a longo prazo. Neste caso, tendo em vista a herança deixada inclusive pela economia de transição (basicamente, um agravamento da vulnerabilidade externa), deverá operar dentro dos estreitos graus de liberdade, reduzidos, na verdade, ao estímulo às exportações e alguma iniciativa na área tribu-

Revista de conjuntura &

abr/jun de 2002

tária, limitada, contudo, pelo fato de que não existe consenso sobre que política tributária adotar, além do fato de que é uma temeridade, para qualquer Governo, fazer reforma tributária em recessão. A política econômica teria o seguinte perfil essencial: I- esforço redobrado na área de exportações, para reduzir o gargalo principal representado pela vulnerabilidade externa; II- privatização das estatais remanescentes (setor elétrico); III- políticas monetária e creditícia restritivas, com manutenção das taxas de juros em níveis elevados (acima dos atuais); IV- política fiscal restritiva (aumento do superávit no orçamento primário); V- iniciativas na área tributária, sem perda de receita interna. As conseqüências sócio-econômicas de uma tal política seriam, certamente, um agravamento do desemprego e uma baixa adicional da renda do trabalho, aumentando a insatisfação social. Se o Presidente que adotar tal política for oriundo da oposição, acresce-se à insatisfação subjacente um elevado grau de frustração com as eleições, a exemplo do que ocorreu na Argentina com o presidente De La Rúa. No plano econômico, é de se prever um agravamento da vulnerabilidade externa, que levará eventualmente a um novo recurso ao FMI, que exigirá em troca a cristalização do modelo econômico recessivo. IX - Cenário II Gradualista A adoção pelo futuro Presidente de uma abordagem gradualista


para enfrentar os problemas da vulnerabilidade externa e do alto desemprego esbarra em efeitos imprevistos. No plano da política macroeconômica, a redução gradual da taxa básica de juros e do superávit tributário, que seria essencial para dar um sinal favorável aos agentes econômicos no sentido do crescimento, poderá trazer conseqüências adversas para o balanço de pagamentos, sobretudo na ausência de controles sobre o mercado bancário e financeiro. Na realidade, são esses condicionantes que o atual Governo leva em conta para não adotar desde já uma política de incentivo ao crescimento. Se o futuro Governo, contudo, encontrar evidências de que terá a colaboração do mercado financeiro para uma política de crescimento, haverá chance para uma política gradualista, com o seguinte perfil: I. redução gradual da taxa básica de juros; II. redução do compulsório bancário, junto com medidas de indução do sistema bancário a ampliar o crédito ao setor produtivo; III. redução gradual do superávit primário, até o nível correspondente ao serviço da dívida pública externa; IV. aumento no dispêndio público não inflacionário possibilitado pela folga monetária/fiscal; V. forte incentivo às exportações; VI. iniciativa tributária favorável ao setor produtivo, sem perda de receita. O sucesso dessa política depende, como dito, do comportamento do mercado financeiro interno e internacional. É que, com a sinalização da queda da

taxa de juros nominal, e na presença de um mercado financeiro totalmente aberto, a tendência será a fuga de capitais – redução de entradas por empréstimos e aumento de saídas. O fator-chave, nesse cenário, serão os investimentos externos diretos, que não dependem da taxa de juros interna, mas sim da expectativa de desempenho da economia. Acontece que os níveis necessários de ingresso de investimento direto para fechar o déficit em conta corrente podem atingir cifras incompatíveis com o porte da economia, sobretudo na ausência de grandes privatizações. Todo o peso do ajustamento externo, neste caso, recairia sobre o aumento vigoroso e continuado das exportações. Teríamos que nos transformar a curto prazo numa economia estruturalmente superavitária, num nível compatível com o déficit em conta corrente gerado pelos juros, pela remessa de dividendos e (até que haja uma improvável ressurreição da marinha mercante brasileira) dos fretes. Há tantos imponderáveis neste cenário de alta dependência do comportamento do mercado, que o Governo pode se ver for-

çado a voltar a uma opção conservadora, sacrificando as metas políticas e sociais em favor de uma retomada de políticas monetária e fiscal restritivas, com aumento do desemprego e agudização da vulnerabilidade externa. De qualquer modo, dependendo do seu comprometimento com as metas sociais, pode também tomar o caminho de uma opção reestruturante, afetando as próprias bases da economia política brasileira. É o que se indica a seguir. X Cenário Reestruturante Se o mercado não aceitar a estratégia gradualista de redução dos juros, configurando uma situação de crise cambial aguda – ou se o Governo não quiser correr sequer o risco de testar o mercado nesse sentido -, o caminho a seguir terá que ser uma reestruturação cabal das relações financeiras internas e com o resto do mundo, mediante a retomada do controle soberano do mercado bancário e financeiro, através do controle do câmbio e da reestruturação da dívida interna. Note-se que a Argentina fez isso no auge da crise, o que se justifica seja

Com a sinalização da queda da taxa de juros nominal, a tendência será a fuga de capitais redução de entradas por empréstimos e aumento de saídas . Revista de conjuntura '

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feito aqui exatamente para evitar uma crise aguda. Ao lado das razões de cunho social (emprego), existem razões econômicas de peso em favor dessa estratégia. Na perspectiva conservadora, teremos que conviver com altas taxas de desemprego e juros excessivos, provocando brutais transferências de renda na sociedade, até que a economia atinja o superávit estrutural no comércio capaz de dar conta do déficit em conta corrente. Isso pode levar anos ou talvez décadas, sobretudo porque, diante de um crescimento necessariamente lento da economia, o aumento das exportações dependerá cada vez mais de uma redução do consumo interno a partir de um nível já baixo, na ausência de outros estímulos à produção (juros baixos e logística eficiente). A estratégia reestruturante parte do mesmo objetivo econômico – criar um superávit estrutural da balança comercial -, a partir, contudo, de uma virada nas condições macroeconômicas a curto prazo. Isso implicará a reestruturação imediata da dívida interna e o controle do câmbio pelo período necessário a se atingir o necessário superávit estrutural no comércio. Num tal cenário, em que o Governo tomaria do mercado a iniciativa da política econômica, teria que se estabelecer um conjunto de medidas coerentes capaz de ser apreendido claramente, em seu caráter temporário e reestruturante, pela sociedade e, particularmente, pelos empresários. I- reestruturação da dívida mobiliária interna, com seu desatrelamento total do câmbio;

II- controle do câmbio; III- redução acelerada da taxa de juros básica; IV- redução do compulsório e indução, via bancos públicos, à ampliação do crédito, gradativamente, para 80% do PIB; V- utilização da folga monetária/fiscal para a retomada do dispêndio público e do crescimento; VI- reforma tributária estimulante ao setor produtivo; VII- incentivo às exportações, incluindo o entorno do sistema exportador, com ênfase nos produtos de valor agregado; VIII-manutenção da abertura comercial – exceto quanto à proteção de setores específicos, estratégicos para o emprego e a renda internos -, como fator de política antiinflacionária; IX- inclusão do desemprego absoluto e efetivo entre os índices de monitoramento da política monetária pelo Banco Central, a exemplo do que acontece nos Estados Unidos. XI Conclusões O desafio econômico que se coloca ao futuro Governo brasileiro é o de deslocar o eixo da acumulação capitalista do sistema financeiro-especulativo para o sistema produtivo. É uma reestruturação equivalente ao que fez o Governo Roosevelt nos anos 30, com o New Deal, também neste caso sob a pressão social do alto desemprego e da estagnação econômica. A dificuldade política com a qual se defrontará o futuro Governo é que a crise ainda não chegou ao fundo do

Revista de conjuntura

abr/jun de 2002

poço, a ponto de justificar medidas heróicas. Contudo, o exemplo argentino aponta a direção para a qual nos movemos, caso não haja uma reação. Uma estratégia conservadora nos conduz inexoravelmente ao aumento do desemprego e da vulnerabilidade externa. Uma gradualista nos coloca nas mãos do mercado financeiro, que poderá frustrar a intenção de melhorar as condições macroeconômicas para o crescimento. A reestruturante, por sua vez, não está isenta de riscos políticos. A abertura do mercado financeiro terá que ser sacrificada, pelo menos por algum tempo, e isso desagrada os neoliberais com seus interesses imediatistas. Contudo, o confronto com o segmento financeiro pode ser contrabalançado pelo suporte do capital produtivo ao novo programa, que valorizará sobremaneira a produção em lugar da especulação. ANEXO ESTATÍSTICO 1 – Tabela 1 - Evolução do PIB e da Renda Per Capita 2 – Tabela 2 - Evolução da Taxa de Desemprego Absoluta PME/IBGE 3 – Gráfico 1 – Taxa de Desemprego Efetiva PME/IBGE 4 – Gráfico 2 – Maturação da Dívida 5 – Gráfico 3 – Balança Comercial 6 – Gráfico 4 – Operações de Crédito 7 – Gráfico 5 – Participação por Indexador na Dívida Mobiliária.


Tabela 1 - Evolução do PIB e PIB Percapita do Brasil Data

PIB Reais (R$ milhões)

PIB per Capita (US$)*

1995

646

2794

1996

779

2828

1997

871

2881

1998

914

2846

1999

964

2832

2000

1087

2916

2001

1184

2922

Fonte: IBGE * Câmbio médio de 2001

Tabela 2 - Taxa de Desemprego Aberto (em %) 1995 4,67 4,48 4,77 4,67 4,71 4,89 5,18 5,21 5,46 5,35 5,2 4,95

jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez

1996 5,56 6,22 6,73 6,48 6,34 6,28 5,96 5,98 5,63 5,41 4,87 4,25

1997 5,49 5,94 6,34 6,13 6,39 6,8 6,52 6,42 6,13 6,21 5,81 5,53

1998 7,94 8,4 8,93 8,9 8,88 8,71 8,74 8,48 8,25 8,02 7,76 7,13

1999 8,44 8,46 8,92 8,78 8,37 8,4 8,12 8,34 7,964 8,16 8,006 7,106

2000 8,352 8,904 9,029 8,462 8,445 8,123 7,851 7,77 7,333 7,5 6,798 5,577

Fonte: IBGE

Gráfico 1 - Proporção da PEA Deseocupada (em%) 30,00 -

25,00 -

20,00 -

% D A15,00 ○

P E A 10,00 -

1995

1996

1997

1998

1999

Revista de conjuntura

2000

-

-

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-

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-

0,00 -

-

5,00 -

2001

abr/jun de 2002

Recife Salvador BH RJ SP POA Total

2001 6,28 6,408 6,948 7,005 7,552 6,957 6,736 6,801 6,759 7,126 6,993 6,426

2002 7,511 7,791


Gráfico 2 - Maturação da Dívida Pública Federal Prefixada

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Gráfico 5 - Indexador da Dívida Mobiliária (em %) 90 80 70 60 50 40 30 20 -

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* Luís Fernando Victor Professor de Administração e ex-Presidente do BANESTES e BRB. ** José Carlos de Assis jornalista e economista, autor, entre outros livros, de A Chave do Tesouro , Os Mandarins da República e A Quarta Via . Revista de conjuntura

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A R T I G O

MICROCRÉDITO: da iniciativa local ao centralismo estatal Idalvo Toscano* “Gostaria de dizer com toda veemência que a ausência da possibilidade de ter um sistema próprio de crédito para a camada de baixa renda no País é um escândalo”. Prof. Paul Singer 1 Introduçao O Brasil é, realmente, um país extraordinário: os formuladores de suas políticas públicas, incapazes de construir alternativas próprias voltadas para o desenvolvimento socioeconômico do País, importam as mais recentes teorias produzidas por estudiosos das economias avançadas, incorporando-as às suas proposições. Nessa trajetória, perpetuam paradigmas que não guardam a menor aderência com a realidade de vida da maioria da população. O saber “científico” – exercício explícito da dominação – negligencia a “sabedoria” dos excluídos, construída a partir da adversidade de seu cotidiano e posta a prova em suas estratégias de sobrevivência. Assim, divide-se a sociedade brasileira entre os que sabem ensinar e os que não fazem bem o

que fazem, pois lhes faltam a necessária “capacitação para o desenvolvimento”. Proliferam instituições sem fins lucrativos que se dedicam a capacitar gestores, empreendedores, lideranças comunitárias, agentes de desenvolvimento, educadores para o desenvolvimento local etc. O envolvimento da Sociedade Civil na solução dos problemas sociais representa uma estratégia engenhosa que, ao fim e ao cabo, “mistura” e confunde as reais funções e responsabilidades inerentes ao Estado com o direito cidadão de influir e participar como ator central na construção de um espaço de vivência democrático. Visto com os olhos de quem quer ver, há, na realidade, uma delegação de atribuições que, como veremos em seguida, tem como objetivo a ruptura da fronteira entre o “público” e o “privado”, e, na pior das hipóte-

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ses, a “cooptação” de organizações da Sociedade Civil para a esfera pública. O discurso da nova “cultura participativa” dirigido a toda a sociedade, mas particularmente ao setor privado, legitima a ação das “empresas cidadãs”, que, como por milagre, despertam para sua “responsabilidade social” aportando recursos para as atividades das organizações sociais sem fins lucrativos. Contudo, por ser próprio da natureza do capitalismo, tais contribuições voluntárias são regidas pelos princípios da eficácia e eficiência, não só do ponto de vista tributário, mas dos resultados alcançados pelas organizações sociais. O fato de ter contabilizado no balanço anual sua participação em empreendimentos sociais constitui, por si só, um elemento que agrega às “empresas cidadãs” vantagens comparativas em relação às demais no ambiente “participativo” atual. Além disso, esta participação só será empresarialmos básicos, a saber,


maximizar a eficiência financeira – maior quantidade de serviços prestados por unidade de custo – das “entidades sem fins lucrativos”, que passam a substituí-lo por meio de parcerias. Os valores intangíveis gerados por tais serviços, sendo de difícil mensuração, não entram nessa contabilidade financeira. Assim, o Estado Gerencial reduz sua responsabilidade a dois aspectos primordiais: o de facilitador, como já mencionado, dos interesses do mercado globalizado – vale dizer, do capital financeiro globalizado – e o de executor da coercitividade que, se sempre lhe foi inerente, nunca o foi de forma subliminar tão poderosa como atualmente: a concentração do controle das iniciativas e construções sociais. Não há, portanto, um espaço público para as iniciativas autônomas quando a centralidade institucional é exercida por bilhões de dólares “navegando” em milhões de megabits por minuto em toda a “aldeia” global. Banaliza-se, dessa forma, a política em seu sentido mais profundo – a construção das relações humanas, conseqüentemente, sociais –, submetendo-a à virtualidade do capital financeiro global. (Sem tirar nem pôr, é aquilo a que vimos assistindo na construção do que chamamos “modelo brasileiro para o microcrédito” e sobre o qual discorreremos adiante, particularmente no que diz respeito ao futuro das ONG’s microcreditícias que não aderiram ao novo marco legal para o “terceiro setor” – fls. 14 e segs. deste artigo). Desse modo, o único “espaço” para as iniciativas locais reside, como afirma Oliveira 3 , em ir além da lógica da racionalidade

A fragmentação das instituições, é um

fato inconteste: a globalização diluiu a noção do Estado-Nação e fez emergir, a pluralidade e especificidade dos interesses humanos . do Estado, inventando “(...) uma nova forma que não possa ser assimilada pelo adversário global, concentrador e antidemocrático”, subvertendo as regras do jogo vigente. As profundas mudanças ocorridas ao longo dos anos recentes nos obrigam a rever sistematicamente paradigmas com os quais, até então, vimos trabalhando. “A fragmentação das instituições, e em particular do Estado, é um fato inconteste: a globalização diluiu a noção do EstadoNação e fez emergir, com intensidade até então jamais vista, a pluralidade e especificidade dos interesses humanos. (...) No limite, tenderíamos a afirmar ser o “local” (lato sensu) onde assistiremos à desfragmentação da “res publica” e do reencontro com o caminho da democracia participativa, a construção de novas formas de sociabilidade e a legitimação do poder popular em sua forma direta.” 4 Trataremos, neste trabalho, de duas questões básicas: 1) o microcrédito visto como uma ferramenta que transcende a mera oferta de crédito, constituindo uma filosofia de mudança capaz de desencadear mecanismos inovadores voltados a combater, a

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partir de iniciativas locais, a exclusão socioeconômica; e 2) o microcrédito visto como a ampliação da oferta creditícia àqueles que não têm acesso ao sistema financeiro formal, sob o manto da centralidade, controle, regulação e cooptação do Estado. I. Microcrédito e desenvolvimento socioeconômico local As instituições de microcrédito existem no Brasil há muitos anos. Suas primeiras expressões foram as cooperativas de crédito. Em seguida, surgiram as Organizações não Governamentais – ONG’s que, em sua maioria, tinham na oferta de pequenos créditos um de seus objetivos. Não podemos, todavia, prosseguir sem antes deixar registrado o fato de que muitas ONG’s sofreram, em sua trajetória, desvirtuamento da missão que se propunham. Assim, caberia estabelecer democraticamente um conjunto de princípios que balizassem a atuação das mesmas sem, entretanto, “amarrar” iniciativas, monitorar suas atividades e exercer o controle do Estado sobre suas ações. Enfim, precisávamos de uma trilha, não de um trilho, já que o discurso decantado aos quatro ventos

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propugnava a necessidade de descentralizar e desconcentrar as ações sociais do governo, atraindo as ONG’s como parceiras importantes desse projeto. Por outro lado, o setor carecia de um desenho legal mais ajustado à realidade de sua atuação, principalmente na área de microcrédito, reconhecida a importância do setor “publico não estatal” e o constante “chamamento” do governo à sociedade civil, como partícipe da construção de um novo “modelo” de sociedade onde aquela e o Estado, “irrigados por canais de interlocução, aprendem a pensar e agir juntos, constroem plataformas para futuras parcerias e novas interações, conferem visibilidade a iniciativas emergentes e promovem a cidadania ativa”. [Arantes; vide nota 2] Assistimos, assim, ao “abraço” do Estado, manifestando-se como “(...) uma reorientação da política social do Governo Federal, em parceria com a sociedade, deixando de ter um viés compensatório e assistencial, para adotar um viés de indução ao desenvolvimento (...)”.5 (Parece-nos ter faltado mencionar o viés clientelista, “vício” secular do Estado brasileiro; ou estaríamos equivocados?).

Veremos, em seguida, como se intenta alcançar tal objetivo. Por ora, vamo- nos restringir a analisar o microcrédito como importante instrumento de promoção do desenvolvimento local, não sem antes transcrever uma definição que nos parece valiosa: “A palavra crédito tem um significado muito profundo, que atualmente não representa mais o que acontece na realidade nas operações de crédito dos bancos tradicionais. Crédito vem de “credere”, que em latim significa “acreditar”. Conceder crédito a alguma pessoa é, na essência, acreditar nela. (...)” 6 (grifo nosso) Nenhuma outra assertiva poderia melhor refletir nossa compreensão sobre microcrédito. Contudo, nos dias atuais, predomina no comportamento humano o espírito extremamente individualista, em que nossas ações são impulsionadas para a obtenção de “vantagens”, sejam de quais tipos forem. Não sabemos ao certo quando este comportamento, impregnado pelo espírito “bancário”, como diria Paulo Freire, começou a se “instalar” entre nós. É certo, contudo, que o extraordinário desenvolvimento do conhecimento e do processo de

Nos dias atuais, predomina no

comportamento humano o espírito extremamente individualista, em que nossas ações são impulsionadas para a obtenção de vantagens , sejam de quais tipos forem . Revista de conjuntura

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produção de riquezas a que assistimos ao final do último milênio contribuiu fortemente para este estado de coisas. Falamos, com freqüência, que o forte processo de concentração espacial urbana esgarçou os laços comunitários, retirando dos indivíduos o sentido do “nos comunal”7 , a identidade de “ser para o mundo”. Contudo, as mesmas profundas mudanças por que passaram as relações sociais – na essência humana – não foram capazes de subtrair dos indivíduos a capacidade de, ao menor estímulo, reagir positivamente em busca de novas formas de sociabilidade. Não fosse assim, não teríamos um contingente enorme de pessoas que, sob as mais adversas condições, constroem alternativas de sobrevivência e despertam seu enorme poder criativo. (Esses são fatores intangíveis, que, para a ciência constituída, passam desapercebidos. Todavia, não são poucas as experiências a que vimos assistindo mundo afora: a capacidade de reconstituição da teia de relações humanas, fazendo ressurgir valores tais como a solidariedade, a cooperação e o sentido das ações coletivas, valores estes que soam de forma estranha em um mundo pautado pela competitividade e pelo individualismo.) Muhammad Yunus, em “O Banqueiro dos Pobres”, afirma que todas as pessoas são, potencialmente, empreendedoras. Por mais estranho que nos possa parecer tal afirmativa, não podemos deixar de dar-lhe razão. Apenas não podemos restringir o conceito de “empreendedor” ao de comerciante ou produtor; tomemolo em seu sentido mais amplo: “empreendedor”, de raiz etimológica latina imprehendere, diz-se do indivíduo que “delibe-


ra-se a praticar”, “propõe-se”, “tenta uma tarefa laboriosa e difícil” ou “põe em execução” alguma atividade. Assim, indivíduos que assumem responsabilidades coletivas, organizam a comunidade em que vivem, propõem-se a novos desafios ou atuam como lideranças são verdadeiros “empreendedores” sociais. Possibilitar o acesso ao crédito, ao microcrédito mais especificamente, pode significar o surgimento de pequenos empreendimentos financeira e economicamente sustentáveis, mas, por mais bem sucedida individualmente que esta atividade possa ser, seus resultados serão insuficientes para desencadear um processo de mudança local. Entendemos o microcrédito como um instrumento decisivo à promoção do resgate político de uma imensa parcela da população dos países menos desenvolvidos, que vive na informalidade, excluída, portanto, do mercado capitalista tradicional, quer como produtores, quer como trabalhadores e consumidores. “Em muitos países do Terceiro Mundo a imensa maioria da população vive do trabalho autônomo. Não sabendo onde colocar esse fenômeno em sua estrutura analítica, os economistas enquadraram-no numa mesma categoria onde cabe tudo, chamada de “setor informal”, e, simplesmente por não disporem das ferramentas analíticas necessárias para lidar com essa situação, concluíram que ela era indesejável e deveria ser eliminada. É uma falha grave. Em vez de apoiar a criatividade e a energia dos indivíduos criando políticas e instituições que os capacitem e favoreçam sua autonomia, ansiosamente tentamos introduzi-los em compartimentos inventados

Entendemos o microcrédito como

um instrumento decisivo à promoção do resgate político de uma imensa parcela da população dos países menos desenvolvidos, que vive na informalidade . por nós. Mas o setor informal é uma criação dos indivíduos e não de planejadores ou economistas. Nasce da vontade dos indivíduos de estabelecer sua própria ocupação. Quem quer que compreendesse um pouquinho só os homens e a sociedade como um todo teria procurado, entusiasticamente, meios de consolidar essa conquista, de desenvolvê-la, de lhe dar mais eficácia, em vez de sabotar esses agentes econômicos ”.8 (Grifos nossos) Essa formulação de Yunus nos fornece o nexo essencial entre o microcrédito e o desenvolvimento socioeconômico local, objeto de nossas considerações. O microcrédito é um elemento decisivo para impulsionar as atividades econômicas do setor informal, mas não suficiente. Por quê? Porque, no mais das vezes, ele é entendido em seu estrito sentido: ofertar crédito que possa viabilizar o pequeno empreendedor – comerciantes ou pequenos produtores – no que nem sempre logra sucesso. O pequeno comércio local (bairros periféricos, pequenos Municípios ou mesmo microrregiões) é constituído por microempreendedores que

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ofertam produtos a preços mais elevados do que aqueles encontrados nos estabelecimentos situados nos centros urbanos. Assim, as famílias gastam grande parte de sua renda em compras efetuadas em estabelecimentos situados fora do bairro em que residem, fazendo com que as atividades comerciais locais sobrevivam com dificuldade. Este fato impede que os gastos familiares impulsionem as atividades econômicas locais, gerando um círculo vicioso que realimenta as já precárias condições de vida desse segmento da população. Some-se a isso a ausência de políticas ativas de combate à pobreza e à exclusão social. Podemos afirmar que as potencialidades do microcrédito se manifestam mais fortemente em uma comunidade cujos laços de sociabilidade sejam fortes, ou se encontrem em formação, possibilitando a construção de instâncias alternativas à institucionalidade vigente, identificáveis como uma contra-ordem à lógica da macro política hegemônica. São exemplos disso a formação de poupanças comunitárias, de associações de moradores, dos mutirões comunitários, das atividades coleti-

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Sob a ótica de promoção do

desenvolvimento local, o microcrédito deve ter como finalidade fomentar a construção de cadeias produtivas voltadas para a produção de bens-salários . vas voltadas para a melhoria da convivência da população local, da instituição de “clubes de trocas”, da reciclagem de materiais, da criação de moedas locais, dos “bancos populares” etc. Assentado sobre essa base comunitária, o microcrédito representa verdadeiramente uma ferramenta revolucionária, tanto do ponto de vista econômico, como político. Assim, torna-se impossível aceitar políticas de microcrédito de corte universalista e centralizadoras: as experiências mundiais mais bem sucedidas tiveram origem em comunidades carentes, provocando um impacto positivo, não só na melhoria da condição de vida dos indivíduos, mas profundas mudanças nos hábitos socioculturais. Outro aspecto fundamental é que iniciativas locais provocam forte demanda sobre a institucionalidade vigente, atraindo políticas públicas e provocando um efeito demonstração passível de assimilação por outras localidades. Falamos de políticas de renda* (combinada ou não com outras políticas), de habitação, de educação, de saúde, de saneamento e de infra-estrutura urbana, atuando de forma interativa e coordenada, de modo a possibili-

tar o surgimento de um ambiente propício ao desenvolvimento social da comunidade e a estimular as atividades econômicas locais que se destinem à produção de bens essenciais ao consumo das famílias. Sob a ótica de promoção do desenvolvimento local, o microcrédito deve ter como finalidade fomentar a construção de cadeias produtivas voltadas para a produção de bens-salários, atendendo parcela significativa da demanda local. Trata-se, portanto, de trabalhar o binômio “consumo Þ produção”: artesanato, oficinas de confecções populares, criação de entrepostos comerciais, estímulo à formação de cooperativas, incubação de projetos, criação de unidades de produção independentes e especializadas na fabricação de partes de um produto final (“clusters”) de produção, de feiras populares, de compras comunitárias etc., fomentando a economia local, gerando a oferta de um leque de mercadorias de uso corrente a preços compatíveis com o orçamento das famílias, fazendo com que grande parte da renda da comunidade seja gasta nos estabelecimentos locais e, deste modo, produzindo e gerando novos postos de trabalho.

Não se trata, todavia, de propor um desenvolvimento local autóctone, mas de aproveitar as vocações e potencialidades existentes. Essa concepção implica na construção de um modelo produtivo distinto do convencional: este “cria o mercado” para produtos que, muitas vezes, sequer existem. Na realidade, são empresas cujo foco central não está na produção, mas na “criação” de necessidades de consumo. Qual o grande desafio do microcrédito? Inverter essa lógica: o mercado “criando empresas” que atendam às suas necessidades. Ao mesmo tempo, como o “local” não é passível de gerar todos os bens de que a comunidade necessita, torna-se indissociável, nesta ótica, promover o intercâmbio produtivo com outras localidades de vocações e potenciais econômicos distintos, formando uma cadeia cujos elos se interconectam, configurando uma arquitetura semelhante a uma colméia à qual sempre é possível adicionar um novo “favo”, ou seja, uma nova experiência de desenvolvimento local. Evitamos usar o conceito de “rede”, tão em moda nos círculos intelectuais, por entendermos que não reflete adequadamente o sentido do que desejamos transmitir. Preferimos utilizar o “conceito imagem” da colméia, onde cada favo é interligado aos demais, preservando, contudo, sua independência funcional sem descaracterizar o todo. “(...) persiste o fato de que toda rede é, por definição, seletiva (...). No plano econômicosócio-político-cultural, a rede não corrige a desigualdade,

* Enfatizamos políticas de renda, uma vez que parcela expressiva da população, quer na cidade, quer no campo, encontra-se em condições de miséria absoluta; sem mínimas condições de garantir seu sustento básico, o microcrédito torna-se um instrumento estéril na promoção da melhoria das condições de vida desse contingente.

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apenas a desloca. Aceitando-se tal paradigma, o desenvolvimento local não pode ser pensado como contratendência à concentração; pelo contrário, ele pode inserir-se numa estratégia de descentralização que agrave as desigualdades” 1 ] Não há contradição entre esse processo e a mecânica do mercado capitalista formal. A produção de bens populares, ao contrário do que se possa imaginar, não concorre com o segmento do mercado tradicional. Se uma família consegue adquirir os produtos básicos de que necessita a preços compatíveis com sua disponibilidade, sobrará um pouco do seu orçamento a ser destinado à compra de bens não produzidos localmente, havendo, portanto, uma complementaridade entre os dois segmentos. Os produtos do setor capitalista formal trazem consigo muito mais valor agregado – voltados para criar necessidades de consumo –, do que o valor de uso que lhes é intrínseco. Um exemplo simples talvez aclare este ponto tão crucial de nosso argumento: o valor de uso de um sabão é ajudar na limpeza, esteja ele em uma majestosa embalagem ou em um simples saco plástico. Contudo, suas virtudes jamais serão reconhecidas sem que uma estratégia de marketing faça com que o consumidor acredite verdadeiramente na qualidade exclusiva do produto. Recorrendo à lingüística, diríamos que seu “signo” encontra-se na embalagem que o acolhe: na forma desta, em suas cores, nos efeitos gráficos e nas informações que, subliminarmente, conferem veracidade à decantada qualidade de seu conteúdo. Mesmo que aquelas sejam ilusórias, esse sabão, por certo, será reconhecido pelos consumidores

como o melhor de todos os sabões existentes! Este é o grande elemento diferenciador: os bens populares prescindem significativamente desses artifícios, pois sua produção é ditada pelas necessidades objetivas dos consumidores. Um sabão deve servir para uma boa limpeza, não necessitando habitar o imaginário das pessoas com signos que sobrepassem seu real valor de uso. A inversão da lógica do consumo capitalista se traduz em uma verdadeira revolução cultural: a ideologia que sobrevaloriza o objeto de consumo é a ideologia dominante, que não faz diferenciação de classes e se encontra presente, quer nos setores mais abastados, quer nas classes populares. A construção de uma nova ética de consumo só pode surgir a partir de um ambiente solidário e cooperativo, onde consumidores e suas empresas guardem uma relação umbilical focada nas necessidades objetivas, e não na relação destrutiva centrada na acumulação pela acumulação. Esse processo, que trás em seu cerne a construção de cadeias produtivas locais, vai ao encontro da ampliação do mercado de consumo de toda a economia, representando, assim, a democratização do mesmo.

O microcrédito não tem como função oferecer aos mais necessitados uma oportunidade de garantir seu sustento individual, deixando-os entregues às “livres forças do mercado”; a missão primordial do microcrédito é tornar as pessoas que buscam tais recursos partícipes da comunidade em que vivem, já que sua pequena atividade vai depender de sua clientela e de outros microempreendedores. Portanto, já não estamos mais falando de uma atividade particularizada, mas de uma cadeia de empreendedores que só viabilizarão suas atividades se atuarem de forma interativa e cooperativa com a comunidade. A implantação de instituições de microcrédito só será viável se os tomadores de recursos forem, igualmente, capazes de viabilizar seus negócios, e estes só se viabilizarão se atuarem de forma cooperativa e não sob os paradigmas convencionais do mercado: a concorrência acirrada e destituídos de qualquer responsabilidade social. A maior dificuldade em se entender o microcrédito é que nossa cultura, nos dias atuais, está impregnada por uma visão de mundo profundamente financista. Quando se fala em microcrédito, logo se pergunta qual o tamanho da carteira de emprésti-

Os produtos do setor capitalista

formal trazem consigo muito mais valor agregado voltados para criar necessidades de consumo , do que o valor de uso que lhes é intrínseco . Revista de conjuntura

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mos, qual o custo do funding, que indicadores são utilizados para aferir a sustentabilidade do empreendimento etc. Consideramos todas essas questões importantes, mas insuficientes. Deveríamos indagar quais valores intangíveis foram consolidados a partir da ação do microcrédito, quais mudanças culturais ocorreram na comunidade ou qual o grau de felicidade alcançado pelas pessoas, a partir do momento em que alcançaram sua emancipação econômica. (Em “O Banqueiro dos Pobres”, Yunus é pródigo em relatos de casos dessa espécie.) Deveríamos procurar aprender como o pequeno empreendedor administra sua atividade, ao invés de oferecer-lhe cursos de capacitação para isto ou aquilo. Deveríamos abandonar a arrogância de acreditar que podemos ensinar-lhe novas e sofisticadas técnicas para seus negócios, sem ao menos procurar entender como ele os faz. Um ponto, contudo, merece uma maior reflexão. Dissemo-lo na abertura deste trabalho: por que o pobre não pode ter seu próprio sistema de poupança e empréstimo, com o propugna o Prof. Paul Singer? O que faz o pobre com sua pequena poupança: guarda-a debaixo do colchão? Como pode ter acesso a bens de

utilidade doméstica, se lhe falta o comprovante de renda por sobreviver de atividades informais? A resposta nos parece por demais óbvia: para além do nicho atraente de mercado que representa o segmento de baixa renda para as instituições financeiras, uma sistema de poupança e empréstimo gerido e vocacionado para o atendimento das necessidades dos mais pobres constitui um terrível perigo para o establishment, por representar uma real e efetiva autonomia econômica e política. Dito de outro modo, isto representaria a construção de um campo fértil para o surgimento de uma nova institucionalidade, distante, portanto, do controle e manipulação política do Estado. É absolutamente incompatível administrar o microcrédito com a “cabeça” de um financista do sistema formal de crédito, impregnado por uma visão cartesiana e ideológica do crédito: o microcrédito no Brasil, ao contrário do que ocorre em inúmeros outros países, não pode fazer, do ponto de vista financeiro, nada mais que repassar recursos; não cria “moeda” e, portanto, não possui a capacidade de alavancar suas carteiras. Esse é um aspecto tão crucial que nos assusta, não tendo, até

É absolutamente incompatível

administrar o microcrédito com a cabeça de um financista do sistema formal de crédito, impregnado por uma visão cartesiana e ideológica do crédito . Revista de conjuntura !

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onde sabemos, conquistado espaço no debate travado entre as próprias ONG’s microcreditícias. A prática do microcrédito impõe a necessidade de se construir uma tecnologia particularíssima, que não se encontra em manuais e, tampouco, se espelha em experiências bem sucedidas. Cada instituição de microcrédito tem que incorporar ao seu cotidiano as especificidades do meio em que atua. Portanto, é fundamental desenvolver uma metodologia de trabalho solidária para as finanças sociais. “O Grameen Bank sempre olha as pessoas como pessoas, porque esse é o nosso grande pesadelo, quando o banco torna-se grande, uma grande organização, as pessoas desaparecem. O relacionamento entre as pessoas torna-se mecânico. (...) Quando as relações tornam-se mecânicas, quero estar longe. Sou contra qualquer estrutura chamada de escritório. O escritório é uma maneira de criar dificuldades para as pessoas. Os escritórios são criados para esconder a realidade e manipular a informação”. 1 0 II. O modelo brasileiro para o microcrédito O Governo brasileiro optou por tratar o microcrédito em consonância com as diretrizes traçadas pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento e pelo Banco Mundial. Contudo, o fez de forma açodada. Estas instituições multilaterais recomendam, em inúmeros documentos – além de destinarem recursos para tal –, a reestruturação do sistema financeiro como uma condição necessária à saúde e consolidação de suas instituições. A partir destas ações, a ampliação da oferta de


créditos aos mais pobres é observada como uma ação coadjuvante no combate à pobreza. Perguntamos: como considerar consolidado e saudável um Sistema Financeiro composto de 7.300 instituições, sendo que 170 são instituições bancárias, das quais as 50 maiores detêm 96,3% dos ativos totais do sistema? Como considerar funcional, ao desenvolvimento econômico, um sistema financeiro que não atende cerca de 40% dos Municípios brasileiros e onde 70% das pessoas sequer têm acesso a uma conta bancária, chancela pósmoderna da cidadania? Ademais, como considerar saudável o sistema financeiro de um país que pratica uma das maiores taxas de juros e apresenta uma das menores relações Crédito/PIB do mundo: “(...) 28,5%, superando apenas a Argentina (23,7%) e o México (17,7%)”; que, através das contas CC5 (Circular 2.677/96), possibilita a saída de recursos financeiros em Reais, muitas vezes de origens duvidosas, e seu retorno ao País – após “um passeio” por paraísos fiscais – como investimentos em Dólares? 1 1 Contudo, estamos muito distantes de poder afirmar ter sido, a criação desse modelo, uma ação voluntariosa e/ou incompetente. Ao contrário, o script foi desenhado com o brilhantismo de um estrategista. Vejamos. Em 23.03.1999, após debates entre os membros do Conselho da Comunidade Solidária – fórum governamental de interlocução com a Sociedade Civil –, é promulgada a Lei nº 9.790 (Lei das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público OSCIP’s) –, novo marco legal do Terceiro Setor no Brasil. De um modo geral poderíamos considerá-la um estatuto

Esse Estado, que se pretende gerencial, é, coerentemente, impermeável à transparência e ao questionamento de suas ações . legal inovador e necessário. Entretanto, trás em si um pecado capital: ao instituir o “Termo de Parceria” – instrumento que rege as relações entre as OSCIP’s e o Estado, substituto dos anteriores convênios –, o faz facultando ao ente governamental estabelecer ou não critérios públicos e transparentes para a seleção do parceiro não-governamental. Como isto, perpetua - ou possibilita, se assim se preferir - a permanência do clientelismo, tradição histórica do Estado brasileiro. Teria sido este um “detalhe” que passou desapercebido aos legisladores? Vejamos: “No projeto de lei original (Nota: Lei nº 9.790/99), a seleção das organizações para realização do Termo de Parceria teria que ser por meio de concursos de projetos. Não se obteve consenso nessa questão e o concurso de projetos acabou sendo apenas uma possibilidade. A justificativa de gestores públicos e juristas para esse impedimento foi a de que, caso fosse obrigatória a realização de concursos, teria que ser utilizada, necessariamente, a Lei de Licitações (8666/93) – o que inviabilizaria toda a estratégia de ser instrumento flexível e adaptado às especificidades dessa relação. Nesse caso, embora existam os controles a posteriori

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por resultados e punições severas no caso de uso indevido de recursos, garantindo maior eficiência, corre-se o risco de ocorrerem (sic) práticas clientelistas, se o controle social não for efetivo” 1 2 (Grifos nossos.) A autora discorre, com muita propriedade e isenção, sobre a questão suscitada neste artigo. Ficam no ar, contudo, três questões: 1. “não se obteve consenso nessa questão (...)”. Cabe-nos indagar: um consenso se dá a partir de três ou mais entes; teria sido entre os membros do Conselho do Comunidade Solidária, ou em outro fórum distinto? 2. a caneta que eximiu as OSCIP’s das estipulações da Lei da Usura, por meio de Medida Provisória, não poderia ter feito o mesmo para retirar da Lei de Licitações o Concurso de Projetos, preservando a forma originalmente prevista na Lei nº 9790/99 e conferindo à relação Estado e OSCIP’s a necessária transparência? 3. quanto ao “controle social efetivo”, por certo soa bem como figura retórica; na realidade, trata-se de uma ficção. Esse Estado, que se pretende gerencial, é, coerentemente, impermeável à transparência e ao questionamento de suas ações, do mesmo modo como

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qualquer empresa privada é zelosa em relação aos seus “segredos empresariais”. Tal fato não fica somente adstrito ao cidadão comum: no cotidiano de suas ações, tem-se mostrado blindado às solicitações de informações, inclusive àquelas demandadas pelas demais instituições do Poder Republicano. Evidentemente, não estamos afirmando que persista a prática do clientelismo de Estado; contudo, parece-nos lícito afirmar a real possibilidade de isso ocorrer. Cabe-nos perguntar, nestas circunstâncias, quem arca com a responsabilidade daí decorrente? A sociedade, por falta de “controle social efetivo”? Continuemos. Em seguida, a Medida Provisória n° 1.914/99 exime as OSCIP’s das estipulações da Lei da Usura; contudo, não o faz para as ONG’s que não possuam esta qualificação. Assim, deixa, sobre as cabeças das mesmas, a espada de Dâmocles: formalmente as ONG’s microcreditícias estão fora da lei e, portanto, sujeitas às penalidades previstas, igualando-se, neste aspecto, aos agiotas, os quais, por mais paradoxal que possa parecer, raramente são “incomodados” em suas atividades, mesmo quando atuam no cerne de diversas instituições de governo.

Cria-se, em seguida, as Sociedades de Crédito ao Microempreendedor – SCM, instituições supervisionadas pelo Banco Central do Brasil, que têm como objeto social específico oferecer crédito de até US$ 4mil (US$1,00=R$2,50) a microempreendedores, não lhe sendo facultado, todavia, captar recursos populares, faculdade exclusiva dos bancos comerciais. São as SCM’s instituições privadas com fins lucrativos: “Art. 6. É facultada às sociedades de crédito ao microempreendedor a realização das seguintes operações: I - obtenção de repasses e empréstimos originários de: a. instituições financeiras nacionais e estrangeiras; b. entidades nacionais e estrangeiras voltadas para ações de fomento e desenvolvimento, incluídas as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público constituídas na forma da Lei 9.790, de 1999; c. fundos oficiais; Defrontamo-nos, assim, com o processo de financeirização das políticas públicas – entendido o microcrédito como instrumento fundamental das mesmas – e, mais grave, possibilita-se que instituições privadas com fins lucrativos possam alavancar suas

Evidentemente, não estamos

afirmando que persista a prática do clientelismo de Estado; contudo, parece-nos lícito afirmar a real possibilidade de isso ocorrer . Revista de conjuntura !

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carteiras com recursos de instituições sem fins lucrativos – OSCIP’s – e tenham acesso a fundos oficiais! Tudo sob o manto das discussões realizadas no âmbito do Conselho da Comunidade Solidária e suas interlocuções com a “Sociedade Civil”. Mas a arquitetura do sistema brasileiro de microcrédito ainda não estava completamente “desenhada”. Em 05 de março de 2.001, em sua “Quinta Rodada de Interlocução Política”, o Conselho da Comunidade Solidária cria “... quatro Comissões para tratar mais detalhadamente os problemas e as alternativas à expansão do microcrédito no País, cujas propostas foram sugeridas pelos interlocutores da rodada”. (Sobre quais foram os membros participantes dessas comissões, paira o mistério!) Das quatro comissões, a mais importante vem a ser a “Comissão 1 - Marco Legal do Microcrédito” – (ver site http:// www.comunidadesolidaria.org.br). Suas deliberações, acatadas pela autoridade monetária do País – o Banco Central do Brasil que, com galhardia, reafirma seu papel de “banco dos bancos” –, foram aprovadas pelo Conselho Monetário Nacional, que fez editar a Resolução n° 2874, em 26.07.2.001. Reproduzimo-la na íntegra: (...) • Permissão para que uma OSCIP possa controlar SCM, desde que o estatuto da OSCIP não dê poder de gestão a qualquer ente da administração pública. (...); • Permissão para que instituições financeiras e demais autorizadas a funcionar pelo Banco Central possam emprestar as SCM’s (mútuo ou repasse); • Permissão para “terceirização de tecnologia” (SCM atuan-


do em microcrédito em nome de outra Instituição Financeira); (grifo nosso) • Permissão para que os créditos da SCM (direitos sobre empréstimos realizados) possam ser vendidos livremente a outra instituição financeira (cessão de créditos), como forma de se fazer “caixa”. A regra anterior só permitia essa cessão caso a SCM continuasse comprometida com o pagamento daquele crédito cedido; • Supressão do § 3º do art. 1º da Res. 2.627/99, que prevê atuação restrita à região definida em seu estatuto social; • Permissão para a criação de postos de atendimento ao microempreendedor para todas as instituições financeiras que operem com microcrédito; (grifos nosso) • Inclusão das SCM’s na Central de Risco. Embora o assunto não tenha sido discutido no Comitê, o acesso à Central de Risco representa importante instrumento de controle, pois permite que se conheça o grau de endividamento de cada potencial tomador do crédito. O objetivo é evitar o sobre-endividamento, onde um cliente toma recursos de uma entidade para pagar dívida contraída com outra, a exemplo do que ocorreu recentemente na Bolívia. • Permissão da participação de SCM em outras empresas (exceto do ramo financeiro), para sua transformação em outra instituição, a possibilidade de OSCIP’s emprestarem recursos para as SCM’s, permissão às SCM para aplicação de disponibilidades de caixa no mercado financeiro, inclusive em CDB e RDB. (...)”. Resumo da ópera: 1. uma OSCIP – instituição sem fins lucrativos – pode controlar

Submete-se o microcrédito à supervisão e regulamentação do Banco Central que, sabidamente, não dispõe de instrumentos e técnicos em número suficiente para exercer esta atividade de forma efetiva . uma entidade privada com fins lucrativos. Tal disposição é, no mínimo, uma excrescência jurídica face aos objetos sociais distintos das mesmas. Ademais, não nos parece impossível que, ao final de um exercício fiscal, a OSCIP apresente uma expressiva rentabilidade, enquanto a SCM apresente prejuízo, ou vice-versa, ao sabor dos interesses financeiros do momento... 2. por meio das SCM’s, qualquer instituição financeira pode passar a atuar no segmento do microcrédito; 3. as SCM’s (ou suas OSCIP’s controladoras) podem vender suas carteiras de crédito às instituições financeiras; dito de outro modo, podem, por via indireta, ter acesso à captação de recursos do público, afora a possibilidade potencial de “maquiagem” dos balanços contábeis das mesmas; 4. “terceirização de tecnologia” – SCM operando microcrédito em nome de uma Instituição financeira. Notar que as SCM’s têm acesso a fundos oficiais e aqui vislumbramos com nitidez a perfeita identidade entre o “público” e o “privado”. Nem Maquiavel seria capaz de urdir tal estratégia!

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5. estende-se o modelo microcreditício a todo território nacional, ou seja, ao aumentar a capilaridade, centraliza-se o controle da oferta de créditos; 6. submete-se o microcrédito à supervisão e regulamentação do Banco Central que, sabidamente, não dispõe de instrumentos e técnicos em número suficiente para exercer esta atividade de forma efetiva; 7. possibilita que as SCM’s participem de outras empresas não financeiras, como, p. ex., empresas de Factorings e/ou Administradoras de Cartões de Crédito, instituições não financeiras e, portanto, não controladas pelo Banco Central do Brasil; 8. qual instituição de microcrédito sobreviverá ao peso das instituições financeiras que passarão a atuar no setor de microcrédito? 9. o “trade off” financeiro entre “instituições financeiras e não-financeiras”, “privadas e sem fins lucrativos”, abre um leque imenso de possibilidades para que o capital financeiro “navegue” comodamente, e à medida de suas necessidades, entre as mesmas, com todas as conseqüências daí decorrentes: prejuízo em carteira de instituições privadas e

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lucro em instituições sem fins lucrativos; lucro/prejuízo em instituições financeiras e/ou outras empresas das quais participam etc. etc. etc. As demais conseqüências, deixamo-las à reflexão dos leitores. O conjunto de resoluções sobre o microcrédito não deixa margem a dúvidas: o microcrédito passa a ser tão somente uma extensão do Sistema Financeiro Nacional e, consequentemente, portador de todos as distorções que lhe são inerentes. Ademais, visto sob a ótica de um poderoso instrumento de política pública, reafirma a centralidade e o controle do Estado sobre as iniciativas autônomas locais. Silêncio absoluto sobre a vinculação do microcrédito às políticas de desenvolvimento. A “mão invisível” deverá, por certo, suprir esta lacuna, orientando o crédito concedido aos bolsões de pobreza existentes; quanto às políticas públicas desenvolvimentistas, o Estado, sempre atento à questão social, se encarregará de implementálas; não tenhamos dúvida! Temos, assim, o predomínio do Sistema Financeiro e, conseqüentemente, do Estado Gerencial sobre as iniciativas surgidas no âmago do segmento dos socialmente excluídos. O

império do Estado sobre a liberdade, a iniciativa e a construção de políticas locais. “O estatismo é um estadocentrismo. É uma ideologia que confere ao Estado – e não à política exercitada pelos cidadãos – um papel de centralidade social determinante na condução das sociedades, confundindo estatal com público e, destarte, monopolizando a esfera pública, conferindo ao Estado a função de supremo regulador (supostamente imparcial) dos dilemas da ação coletiva e, portanto, dos conflitos sociais e, por último, atribuindo ao Estado a capacidade de ser o único e exclusivo protagonista das mudanças sociais – inclusive a capacidade de promover o desenvolvimento. Não é outro o motivo do “leit motiv” de todos os estatistas ser o controle (sic). É preciso controlar, ordenar (quer dizer, impor uma ordem, a sua ordem), evitar o caos que pode surgir quando a situação escapa do controle. Ora, a política democrática, pela sua própria natureza, escapa do controle. (...). O desespero dos estatistas é essa insegurança, essa incapacidade de prever o desfecho, essa possibilidade de um futuro aberto, que crie novas realidades e não apenas repita o passado”.1 3 (Grifos nossos.)

Visto sob a ótica de um poderoso instrumento de política pública, o microcrédito reafirma a centralidade e o controle do Estado sobre as iniciativas autônomas locais. Revista de conjuntura !"

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Nada a aduzir, principalmente tratando-se de produção teórica do Conselheiro Coordenador do “Comunidade Solidária”, que, melhor que ninguém, conhece de perto e acompanhou todo o processo que culminou com a construção do que nominamos de “Modelo Brasileiro para o Microcrédito”. “O governo, em situações como esta (respondendo à questão de qual a melhor forma de o Estado entrar no processo ajudando o crescimento, sem interferir na cultura do crédito), sempre entra para atrapalhar, e os programas do governo tornam-se terrivelmente corruptos. (...) Por isto é que digo, se o governo envolver-se na área de microcrédito, torna-se atrativo para ele usá-lo para propósitos políticos”.1 4 (Grifo nosso.) Perguntamos: será? III. Conclusão Enfim, a globalização financeira chegou aos pobres! Dizem que o mal do pensamento contra hegemônico é ser bom em criticar, mas incapaz de formular propostas. De fato, no marco estritamente estabelecido pela institucionalidade existente, qualquer proposta teria, necessariamente, que reforçar a iniqüidade vigente. Aos críticos, cabe contestar a imutabilidade dos paradigmas estabelecidos e, portanto, assumir o confronto aberto com a visão mitificadora do “saber técnico” como o “irrefutável campo das possibilidades existentes”, e onde não cabem discussões políticas e/ ou ideológicas. Aceitamos o desafio: sim, uma outra finança é possível. Ao longo desse trabalho, acreditamos ter apresentado um alter-


nativa possível para a promoção de um desenvolvimento socioeconômico mais justo, tendo como ferramenta principal o microcrédito, sob uma concepção que transcende a simples oferta de crédito por intermédio do sistema financeiro tradicional. Fomos além, quando deixamos claro que, como extensão do atual sistema financeiro, o microcrédito jamais servirá como mecanismo de combate à pobreza. Implicitamente – embora sem apresentar o desenho de uma nova ordem financeira global, até por fugir aos nossos propósitos – cremos ter deixado claro que nossa proposta só frutificará a partir da construção de uma nova institucionalidade, mesmo que informal, e ainda que em regime de “desobediência civil”: um combate às claras com a velha ordem financeira global, que, aos poucos, vai sendo colocada em xeque. Reconhecemos, sem dúvida, as dificuldades de implementar com a necessária flexibilidade um projeto como o que defendemos. Contudo, convenhamos, aprende-se a caminhar com os primeiros passos e a mudar de rota caso a trilha perseguida leve a nenhum lugar. Se a globalização trouxe consigo algum benefício (e é certo que o fez), o maior deles foi fazer emergir as especificidades e a pluralidade dos interesses humanos, além de tornar evidente a incapacidade (ou o não interesse) do Estado em contemplá-los. Conseqüentemente, ampliou-se a gama de conflitos e demandas que o “velho terno listrado” – de mangas puídas e colarinho desbotado, inúmeras vezes remendado, reformado e ajustado – da atual “institucionalidade democrática” já não dá mais conta de abarcar.

Mais do que uma consideração de ordem econômica, a dívida social é moralmente inaceitável, e por essa razão tem de ser saldada . Algo parecido como se saíssemos da escuridão para a claridade de um sol de meio-dia: tudo nos parece turvado, mas, aos pouco, as imagens vão-se fixando, e o que de início nos pareciam vultos adquire consistência e materialidade. Assim se passa com os tempos atuais: novas formas representativas estão surgindo e se impondo e, com elas, a produção de soluções para o enfrentamento dos problemas, contempladas a partir da iniciativa dos próprios indivíduos que despertam para o mundo iníquo em que vivem. Por que lhes cercear a criatividade e iniciativa, por que inibi-las, regulamentá-las e controlá-las, no intento de ressuscitar velhas instituições que entraram em curva descendente, como ocorre com o Estado, mesmo sob o pomposo nome de “Estado Gerencial”? Por que, sob o pretexto de desenvolver uma política social, se constrói uma trama que permite a continuidade de um projeto político globalizante e nefasto à população mais desfavorecida do País? “Mais do que uma consideração de ordem econômica, a dívida social é moralmente inaceitável, e por essa razão tem de ser saldada” 1 5 Certo na essência, malévolo nas intenções. O deputado, em

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ano eleitoral, esquece-se do célebre “deixar o bolo crescer, para depois dividir”, que advogava no passado. Não obstante, sejamos generosos e acreditemos na sinceridade de sua afirmativa. Entretanto, não nos parece ser, esta, uma questão moral, mas ética e humanitária: 53 (cinqüenta e três) milhões de brasileiros situam-se abaixo da linha de pobreza e, destes, 23 (vinte e três) vivem em estado de miséria; ou seja, quase um terço da população total do País sobrevive em condições de vida absolutamente precárias! Os postulados neo-liberais estão corretos, diria um fundamentalista do mercado. Se não deram certos, é porque a realidade é “indócil” e as instituições republicanas, impregnadas pelo corporativismo, pela corrupção e flexíveis às pressões políticas, i. é., não se pautaram pelo necessário rigor “técnico”. Contudo, não explicam o fracasso de tais políticas em países cujos “fundamentos” macroeconômicos foram rigidamente obedecidos. Deitam nuvens sobre a verdadeira razão do quadro catastrófico que assola não só o Brasil, mas um terço de toda a população mundial. Com isso, ficam isentos de responsabilidades os experimentalistas do livre mercado e da abertura desregrada das eco-

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nomias emergentes pelas vicissitudes por que vimos passando ao longo de uma década. Os

sucessivos fracassos verificados nos países que seguiram o receituário neo-liberal, ditado

pelas instituições financeiras internacionais, já estão suficientemente expostos.

Bibliografia Singer, Paul – Depoimento à COMISSÃO DE ECONOMIA, INDÚSTRIA E COMÉRCIO – Câmara dos Deputados, Brasília, set/1999. Arantes, P. E. – “Esquerda e Direita no Espelho das ONGs”, in Cadernos ABONG, Nº 27; [São Paulo, Ed. Autores Associados, 2000] Oliveira, F. de – “Aproximações ao enigma: o que quer dizer desenvolvimento local?”, [São Paulo: Pólis. 2001] Toscano, I. – Estudo de Caso: “Conjunto Palmeiras: O “Banco” Palma$: uma Experiência de Economia Solidária” – São Paulo: Instituto Pólis/Fundação Friedrich Ebert Stifung (ILDES); dezembro, 2001. Franco, A. – Depoimento à COMISSÃO DE ECONOMIA, INDÚSTRIA E COMÉRCIO – Câmara dos Deputados, Brasília, set/1999. Silva e Souza, R. A. – “Microcrédito: Conceitos e Filosofia” – SEBRAE [Londrina, PR: 2001] Senett, Richard – “A Corrosão do Caráter”, (Rio de Janeiro/São Paulo: Ed. Record, 2000) Yunus, M. e Jolis, A. – “O Banqueiro dos Pobres”; (São Paulo: Ed. Ática, 2000) pg. 285 e segs. *

Enfatizamos políticas de renda, uma vez que parcela expressiva da população, quer na cidade, quer no campo, encontra-se em condições de miséria absoluta; sem mínimas condições de garantir seu sustento básico, o microcrédito torna-se um instrumento estéril na promoção da melhoria das condições de vida desse contingente.

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Oliveira, F. de – “Aproximações ao enigma: o que quer dizer desenvolvimento local?”, [São Paulo: Pólis. 2001]

Yunus, M. – “Apresentação no Grameen Bank em 10 de junho de 2001”; (Brasília, mimeo: 2001) Simoens, L. A. – “Pela Ética na Gestão do Sistema Financeiro Nacional – A promiscuidade “público-privado”. Com especial menção às contas CC5”; (Brasília, Edições Loyola: 2000) pg. 26 Ferrarezi, E. R. – “O Novo Marco Legal do Terceiro Setor no Brasil”; [Brasília; site: http:// www.comunidadesolidaria.org.br, 2002). Franco, A. de – “A “America’s new war” e o recrudescimento do velho estatismo” ; [Brasília, mimeo: 2001] pg. 3. Yunus, M. – “Apresentação no Grameen Bank em 10 de junho de 2001”; [Brasília, mimeo: 2001] Declaração do Deputado Federal Antônio Delfim Neto ao jornalista Ricardo Mendonça – “O paradoxo da Miséria”, in revista VEJA; edição nº 1735, de 23.01.2002 [São Paulo: Ed. Abril, 2002] pg. 87.

* Idalvo Toscano economista com mestrado em Planejamento Urbano; funcionário licenciado do Banco Central do Brasil. Consultor e pesquisador. E-mail: itoscano2@uol.com.br

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A R T I G O

Legimitimidade do CORECON-DF para fiscalizar a Administração Pública Einstein Lincoln Borges Taquary* A Lei n°. 1.411, de 13 de agosto de 1951, criou a profissão de economista, regulamentada pela Decreto n°. 31.794, de 17 de novembro de 1952, e sofreu alterações pelas Lei n°s. 6.021, de 03 de janeiro de 1974, e 6.537, de 19 de junho de 1978. A competência do Conselho Federal e dos Conselhos Regionais está assim enunciada: A) na Lei n°. 1.411/51: “Art. 10 - São Atribuições dos CORECONs: a) organizar e manter o registro profissional dos economistas; b) fiscalizar a profissão de economista; c) expedir as carteiras profissionais; d) auxiliar o COFECON na

divulgação da técnica e cumprimento do programa1 referido no art. 7°, letra “i”; e) impor penalidades, referidas nesta lei; f) elaborar o seu regimento interno para exame e aprovação pelo COFECON.”; B) no Decreto n°. 31.794/52: Art. 36 - São atribuições dos Conselhos Regionais: “a) organizar e manter o registro profissional do economista; b) fiscalizar o exercício da profissão de economista, dentro das normas baixadas pelo CFEP; d) realizar o programa de atividdes elaborado pelo CFEP no sentido de disseminação da técnica econô-

mica nos diversos setores da economia nacional promovendo estudos e campanha em prol da racionalização econômica do país; e) elaborar o seu regimento interno para exame e aprovação do CFEP; f) aplicar penalidades; g) arrecadar as multas, anuidades, taxas e demais rendimentos, bem como promover a distribuição das cotas previstas nos artigos 31 e 372 .” O exercício da profissão de economista está, quer no Setor Privado ou Público, subordinado ao registro do profissional no Conselho e sob a fiscalização do mesmo, supervisionado pelo COFECON, conforme se infere

1 O programa, que faz menção à letra i , do art. 7°, da Lei n°. 1.411/51, está previsto nas letras a e g, do art. 7° do mesmo Diploma legal, e consiste em: a)contribuir para a formação de sadia mentalidade econômica através da disseminação da técnica econômica nos diversos setores da economica nacional; e g) promover estudos e campanhas em prol da racionalização impostas pelos CORECONs. 2 O art. 31, do Decreto n° 31.794/52 dispõe sobre a constituição das rendas do CFEP, que são: a) 1/5 da renda bruta arrecadada pelos Conselhos Regionais, com exceção das doações; b) doações e legados; c) subvenções do Governo; e d) rendimento patrimonial. O art. 37, do Decreto n° 31.794/52 dispõe sobre as rendas do Conselhos Regionais, que são: a) 4/5 das multas aplicadas; b) 4/5 das anuidades previstas no artigo 17, da Lei n°. 1.411, de 13 de agosto de 1951; c) 4/5 da taxa de registro facultativo de qualquer contrato, parecer ou documento profissional a ser fixado pelo regimento do CFEP; d) doações e legados; e) subvenções dos Governos; e f) rendimento patrimonial.

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dos artigos 12 e 15, do Decreto n°. 31.794/52, que assim dispõem: “ Art. 12 - Para o exercício de cargos técnicos de economia e finanças, na administração pública, autárquica, paraestatal e de economia mista, inclusive bancos de que forem acionistas os GovernosFederal e Estadual, nas empresas sob intervenção ou nas concessionárias de serviço público, é obrigatória a apresentação da carteira profissional a que se refere o artigo 15, da Lei n°. 1.411, de 13 de agosto de 1951. 1° - O disposto neste artigo não prejudica direitos já adquiridos pelos atuais ocupantes efetivos dos referidos cargos. 2° - O provimento dos cargos técnicos de que trata este artigo só poderá ser feito mediante prévia apresentação do diploma de bacharel em Ciências Econômicas ou título de habilitação, mesmo quando dependa de concurso.” “ Art. 15 - O exercício dos cargos e funções de que trata este Capítulo será fiscalizado pelos competentes CREP, sob a supervisão do CFEP, que orientará e disciplinará o exercício da profissão de economista, em todo o território nacional.” Esses diplomas foram, sem dúvida, recepcionados pela atual

Carta Política, que, no inc. XIII do art. 5°, assim dispõe: “ Art. 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;...” A qualificação profissional a que se refere a Constituição Brasileira é a estabelecida por lei ordinária, editada pela União Federal, que detém competência privativa para legislar sobre a organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões (inc. XVI do art. 22, CF/88). A Lei n°. 1.411/52 é genérica, editada para criar e regular as relações jurídicas advindas de atribuições profissionais, tendo alcance geral. Existindo exercício ou exploração de atividades próprias do economista, indispensável se torna seu registro em Conselho Regional de Economia (art. 14, da citada Lei). Essa norma não criou privilégios ou excluiu de sua obrigatoriedade setores públicos ou da vida privada, conforme tem sido o entendimento, inclusive do Poder Judiciário, de acordo com o voto do Ministro Carlos Mário Veloso, verbis:

3 MAS n°. 109.967-PE/7274963, 6a. Turma, do TRF. Unânime, 24-8-88. 4 Revista de Direito Administrativo 77/294.

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“ E não há distinguir, “data venia”, registra o Prof. José Rubens Costa, entre o exercício das atividades privativas dos profissionais liberais no serviço público e a iniciativa privada. Para a prática dos atos profissionais privativos exige-se a devida habilitação ou registro na ordem ou conselho da categoria.”3 Neste sentido, também, manifestou-se o Supremo Tribunal Federal, pelo voto do Ministro Vitor Nunes Leal, conforme se lê de sua transcrição abaixo: “ Não há que se distinguir entre o exercício de função pública e exercício profissional, porque esses dois aspectos do problema estão visceralmente entrelaçados em virtude da legislação federal que exige para o exercício da função técnica de engenheiro, arquiteto ou agrimensor, a habilitação profissional específica e o registro nos Conselhos de Engenharia e Arquitetura.”4 Não se pode olvidar da lição dos Professores Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Luísa Hickel Gamba, Jorge Antonio Maurique e Otávio Roberto Pamplona, no mesmo sentido de que não há distinção na obrigatoriedade de registro nos Conselhos entre os setores público e privado, in verbis: “ A regra geral é que, estando regulamentada a profissão e tendo sido criado o conselho profissional correspon-


dente, a inscrição ou registro nos quadros de profissionais do conselho são obrigatórios para o legítimo exercício da profissão - seja no setor privado, seja no público - como profissional liberal, autônomo ou profissional empregado ou como ocupante de cargo ou emprego público vinculado àquela profissão. A exigência do registro em conselho profissional como condição para o exercício de cargo ou emprego público que tenha funções próprias da profissão regulamentada, apesar de constar expressamente nas diversas leis de criação dos conselhos, nem sempre é observada pela Administração Pública, sendo foco de constantes embates judiciais. Existe também lei especifica - Lei 6.681, de 16.08.1979 - dispondo sobre a inscrição de médicos, cirurgiões-dentistas e farmacêuticos militares nos Conselhos de Medicina, Odontologia e Farmácia. A medida se justifica, tanto para fazer valer o princípio de isonomia, igualando os profissionais da área pública aos do setor privado, como para preservar aqueles valores supremos da coletividade - vida, saúde, liberdade, honra e esperança - sujeitando os profissionais da área pública ao mesmo controle de habilitações, técnica e ética a que

se submetem os profissionais da esfera privada. O descumprimento da exigência deve ser fiscalizado e coibido pelo conselho profissional competente, com os instrumentos e sanções próprios do poder de polícia que lhe foi delegado...”5 Portanto, o Conselho Regional de Economia do Distrito Federal tem legitimidade, na defesa dos interesses do exercício profissional, para propor mandado de segurança, em sua jurisdição, contra ato discriminador da classe que representa. Essa legitimidade promana do poder-dever, que lhe é conferida pelas leis citadas acima, restrigindo-se à política orientadora do Conselho Federal de Economia - COFECON, ao qual cabe supervisionar a ação fiscalizadora dos CORECONs, especificamente no que concerne à limitação de suas jurisdições, como ocorre no caso de concurso público, que são, geralmente, de âmbito nacional e de interesse para todo o sistema COFECON/ CORECONs, não se podendo, por isso, adotar ações isoladas,

para não contrariar determinada política do Sistema. A solução para essa questão é, no meu entender, provocar a manifestação do COFECON quanto à sua orientação no sentido de fiscalizar a Administração Pública direta e indireta, principalmente em Brasília-DF, em que a grande maioria dos profissionais está lotada nos serviços públicos. Quanto à limitação de fiscalizar dos CORECONs, é bom destacar, neste particular, que só existe em razão da supervisão do COFECON, posto que nenhum outro Órgão tem poder para tal, já que é de sua essência, como já dito, a fiscalização da atividade profissional, constituindo embaraço à fiscalização qualquer ato que o impeça de exercer essa sua atividade-fim. Merece, aqui, destaque, o voto do Ministro Euclydes Aguiar, do antigo Tribunal Federal de Recursos, in verbis: “ Na real verdade, seria inócuo o poder de fiscalizar, deferido ao Conselho Impetrado pelo Art. 8°, letra b, da Lei n°. 4.769/65, não pudesse o mesmo requisitar

O descumprimento da exigência deve

ser fiscalizado e coibido pelo conselho profissional competente, com os instrumentos e sanções próprios do poder de polícia que lhe foi delegado... .

5 Pereira, Ricardo Teixeira do Valle et al. Conselhos de Fiscalização Profissional. São Paulo-SP: Ed. Revista dos Tribunais, 2001, pág. 154.

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de quais entidades, públicas ou privadas, os elementos necessários à verificação da habilitação dos contratados para o exercício de funções próprias dos profissionais que correspondem à sua área de atuação. Legítima a requisição, regular foi a aplicação da penalidade, em decorrência da recusa no fornecimento dos documentos, ante a regra do art. 16, letra a, do mencionado diploma legal.”6 Assim, os constantes entraves à fiscalização, pelos setores públicos e privados, na negativa de informações sobre os seus contratados, podem ser solucionados pela aplicação das penalidades previstas na Lei n°. 1.411/51, sem prejuízo do ajuizamento de medida cautelar de exibição de documentos, conforme se lê na v. sentença, proferida pelo MM. Juiz Federal da 5a. Vara, em Recife-PE, nos autos da Medida Cautelar n°. 89.0005475-9, nos seguintes termos: “ ... II - O documento de fls. 69 (Ofício n° 615.000.0/ 212 do INPS) é bem claro quanto à negativa em atender à requisição de documentos formulada pela entidade autora. Diz aquele texto...”por não haver corrrelação dos cargos em comissão com as exigências do CRA, não há necessidade de o INPS fornecer o solicitado”... A negativa está caracterizada, restando a análise da legalidade dessa recusa. Quanto ao estatuto que rege

os funcionários estatutários da Autarquia ré, é público e notório que se trata da lei n°. 1.711/52, sendo desnecessária a exibição por se tratar de texto legal cujo conhecimento se presume até por ficção jurídica. Quanto ao plano de cargos e salários, a relação dos administradores que fazem parte do quadro de funcionários da autarquia, do organograma (se existente) e o regimento interno, além da relação contendo o nome e a formação profissional dos ocupantes dos cargos e funções de chefia, são documentos que podem ser requisitados pela entidade autora, para desempenho das tarefas decorrentes do exercício do poder de polícia em matéria de profissão de administrador, nos termos da lei n°. 4769/65. A recusa na exibição dos documentos, não é lícita, não tendo amparo legal o argumento de que o regimento estaria em fase de operação bem como o organograma, pois, deve ser apresentado o em vigor, embora possa ser alterado ou substituído. O pedido tem amparo do art. 844 do C.P.C como meio necessário ao conjunto probatório de eventual ação a ser proposta pela entidade autora no exercício do Poder de Polícia já mencionado. ISTO POSTO III - Julgo procedente a ação parra condenar a Entidade

6 Apelação Cível em MS n°. 110.727-RJ (7097832).DJU 30.06.88.Relator Min. Euclydes Aguiar.

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requerida a exibir no prazo de 10 (dez) dias os documentos requeridos (com exceção do estatuto - lei n°. 1.711/52) sob pena de não o fazendo haver expedição de mandado de apreensão. Condeno o INPS ao pagamento de honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa. P.R.I Recife, 21 de março de 1990.” Logo, o CORECON-DF dispõe de mecanismos legais para exercer sua função básica, que é a fiscalização profissional, no âmbito público ou privado. Os que defendem a proibição de a Administração Pública sofrer fiscalização, quanto à nomeação de ocupantes de cargos comissionados ou de confiança, sustentam-se no argumento da livre nomeação e exoneração destes cargos, conforme dispõe o inciso II do art. 37, da Constituição Federal atual: “ Art. 37. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Podres da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, também, ao seguinte”: II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista


em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;” Invocam, também, a seu favor, a Lei n°. 5.645, de 10 de dezembro de 1970, que assim dispõe, no inciso I do art. 3°: “ Art. 3°. Segundo a correlação e afinidade, a natureza dos trabalhos ou o nível de conhecimentos aplicados, cada Grupo, abrangendo várias atividades, compreenderá: I - Direção e Assessoramento Superiores: os cargos de direção e assessoramento superiores da administração cujo provimento deva ser regido pelo critério de confiança, segundo estabelecido em regulamento;...” Diante dos diplomas legais acima, concluíram, equivocadamente, que a lei não exige formação acadêmica específica para ocupação de tais cargos, pois ela definiu que o provimento dos mesmos deve basear-se, apenas, no critério de confiança. A interpretação da norma constitucional deve ser sistemática, isto é, o intérprete parte do entendimento de que uma norma não existe isolada, o que o leva a investigar a subordinação da norma a um conjunto de disposições de maior generalização, do qual não pode ou não deve ser dissociada. Assim, não se pode pretender, isoladamente, interpretar os dispositivos constitucionais sem confrontá-los com outros da própria Carta Política. No caso de norma infraconstitucional, há de ser interpretada de acordo com a Constituição como tem

sido observado pelos doutrinadores constitucionalistas (Canotilho, Paulo Bonavides e Gilmar Mendes). Isto não foi observado, para se concluir, equivocadamente, que os ocupantes de cargos comissionados ou de confiança estão isentos de provar a habilitação profissional, para o desempenho de suas funções. Ora, o Legislador Constituinte em momento algum lhes concedeu tal benefício; ao contrário, manteve a exigência de registro profissional, exigindo do ocupante de cargo comissionado ou de confiança o cumprimento da lei regulamentadora da profissão. Chega-se a essa conclusão ao cotejar o conteúdo do inciso I do art. 37, com o Inciso XIII do art. 5°, da atual Carta Política, in verbis: “ Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;” Como se vê, as expressões “qualificações que a lei estabele-

cer” e “os requisitos estabelecidos em lei” não foram usadas de forma inútil pelo Legislador Constituinte, mas, sim, para garantia profissional, constituindo-se em direito e garantia fundamental do indivíduo, que adquire condição para o exercício profissional. De resto, basta observar as manifestações anteriores, para concluir que a exclusão de exigência de registro profissional é resultado de uma interpretação equivocada, indo de encontro às decisões judiciais citadas. Evidente é que o Conselho não pretende interferir na liberdade de escolha do Administrador Público, até porque a exigência recaiu sobre a formação técnica e não sobre a pessoa. Assim, ele pode indicar quem ele quiser para ocupar o cargo (pai, mãe, filhos etc.), desde que tenha habilitação profissional, inerente ao exercício de atividades que são, por lei, privativas de determinadas categorias profissionais. Indiscutível é a legitimidade dos CORECONs para fiscalizar a Administração Pública direta ou indireta, desde o edital de concurso público para provimento de cargos até a nomeação para cargos comissionados ou de confiança, encontrando restrição apenas na política do COFECON, ao qual cabe supervisionar sua ação fiscalizadora, que poderá ser suprida com manifestação escrita da Entidade.

* Einstein Lincoln Borges Taquary é advogado, professor de Ética das Profissões Jurídicas e Sociologia Jurídica nas Faculdades Integradas do Planalto Central-FIPLAC, e mestrando em Direito pela Universidade Católica de Brasília - UCB. Revista de conjuntura "

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A R T I G O

Análise dos resultados do Censo 2000 para o mercado de trabalho de Brasília CENSO CONFIRMA ALTO ÍNDICE DE DESEMPREGO EM BRASÍLIA

Lílian Arruda Marques* Ana Georgina da S. Dias** Max Leno de Almeida*** O IBGE divulgou no último dia 8 de maio os resultados da tabulação avançada do CENSO 2000, e, como já era esperado, os dados reafirmam a gravidade do desemprego no Distrito Federal. Para esta breve análise, vamos deter-nos em alguns resultados do mercado de trabalho apresentados no Censo 2000. Assim, analisaremos os dados de ocupação, de emprego e desemprego, jornada de trabalho, rendimento em salários mínimos, setores de atividade, escolaridade e vínculo ocupacional para o Brasil e para o Distrito Federal. Deste modo, poderemos avaliar a situação do mercado de trabalho no Distrito Federal quando comparado ao Brasil. I Desemprego Segundo dados preliminares do CENSO 2000, o Brasil tem

hoje 11.453.604 de desempregados, o que corresponde a uma taxa de 15,04%. Já o DF tem 167.670 desempregados num universo de 1.029.753 pessoas pertencentes à PEA (População Economicamente Ativa), representando assim uma taxa de desemprego de 16,27%. Vale dizer que o IBGE, ao efetuar os cálculos, leva em conta a taxa de desemprego aberto e, além disso, considera como ocupadas pessoas com jornada inferior a 15 horas semanais bem como as pessoas com trabalho para consumo próprio, o que reforça, ainda mais, o fato de a taxa de desemprego no Distrito Federal se encontrar bem elevada. Algumas das explicações para o baixo dinamismo do mercado de trabalho na abertura de vagas e o aumento do de-

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semprego nos anos 90 estão centradas, sobretudo, nos seguintes fatores: baixo crescimento da economia (cuja variação média do PIB vem sendo de 2,2% a.a.); reestruturação produtiva, que muitas empresas adotaram para se adequar ao contexto da política cambial do período de 1994-1998 (valorização artificial do real), em que os produtos brasileiros, mais caros, tiveram que “competir” com os importados, fazendo com que muitas empresas enxugassem seus quadros de pessoal; aumento da produtividade sem redução da jornada de trabalho e sem repasse aos salários; abertura da economia, que fez com que muitas empresas ineficientes fossem excluídas do mercado; e também as elevadas taxas de juros, que inibiram a retomada do crescimento econômico.


Tabela 1 - Ocupação e Taxa de Desemprego Região

PEA

Brasil Distrito Federal

Ocupados

Desempregados

Tx de Desemprego

76.158.531

64.704.927

11.453.604

15,04

1.029.753

862.183

167.570

16,27

Fonte: Censo 2000 - IBGE (Tabulação Avançada - Subamostra) Elaboração: DIEESE, ER/DF.

II Distribuição de Renda O Brasil, comparado a outros países, tem como característica marcante a forte concentração da renda. No Distrito Federal a situação não é diferente, embora os indicadores sejam um pouco melhores quando comparados aos dados nacionais. Enquanto no

Brasil 21,88% dos ocupados receberam um rendimento de até 1 salário mínimo, em Brasília esse percentual correspondeu a 9,99% no ano de 2000. Observando-se os dados de rendimento até 3 salários mínimos (R$ 453,00 em valores de 2.000), fica ainda mais evidente tal concentração. Enquanto no

Brasil 58,71% dos ocupados receberam até 3 SM, em Brasília essa renda abrangeu 43,15% dos ocupados, constituindo-se assim um valor mais baixo que os dados retratados pela realidade nacional, mas ainda assim revelando a importância que tal tema deva ter na agenda econômica para os próximos anos.

Tabela 2 - Classes de Rendimento Nominal Mensal em Salários mínimos Regiões Brasil

Total

Até 1

Mais de 1 até 2

Mais de 2 até 3

Mais de 3 até 5

Mais de 5 Mais de 10 Sem Mais de 20 até 10 até 20 Rendimento

64.704.927 14.154.455 15.957.174 7.874.534 8.231.215 7.220.471 2.963.358 1.400.406 5.933.117

% do Total

-

21,88

24,66

12,17

12,72

11,16

4,58

2,16

9,17

% Acumulada

-

21,88

46,54

58,71

71,43

82,59

87,17

87,17

96,34

862.183

86.166

193.826

92.011

119.001

171.898

106.492

68.408

17.464

% do Total

-

9,99

22,48

10,67

13,80

19,94

12,35

7,93

2,03

% Acumulada

-

9,99

32,47

43,15

56,95

76,89

89,24

97,17

99,20

Distrito Federal

Fonte: Censo 2000 - IBGE (Tabulação Avançada - Subamostra) Elaboração: DIEESE, ER/DF

III Setores de Atividade No Distrito Federal, além do serviço público (15,35%), o comércio emprega 18,95% dos ocupados. Os trabalhadores em intermediação financeira são 13,94% do total de ocupados e

um outro grupo expressivo de trabalhadores no Distrito Federal é o de trabalhadores domésticos, 8,84% do pessoal ocupado. Já o setor industrial não tem um peso muito grande na geração de empregos no Distrito Federal, uma vez que sua Revista de conjuntura "!

participação no total de ocupados é de aproximadamente 4,9%. O setor que menos emprega no Distrito Federal é a atividade agropecuária com apenas 1,84% dos trabalhadores ocupados contra 17,18% no Brasil inteiro.

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Tabela 03 - Ocupação por Seção de Atividade Seção de Atividade do Trabalho Principal Agricultura, pecuária, silvicultura, exploração florestal e pesca Indústria de Transformação Construção Comércio, reparação de veículos automotores, objetos pessoais e domésticos Alojamento e alimentação Transporte, armazenagem e comunicação Intermediação financeira e atividades imobiliárias, aluguéis e serviços prestados a empresas Administração pública, defesa e seguridade social Educação Saúde e serviços coletivos Outros serviços coletivos, sociais e pessoais Serviços domésticos Outras atividades e atividades não classificadas Total

Distrito Federal Ocupados Participação (%)1

Ocupados

Brasil Participação (%)1

15.840

1,84

11.118.695

17,18

42.866 49.525

4,97 5,74

8.998.200 4.445.873

13,91 6,87

163.419

18,95

11.087.156

17,13

34.811

4,04

2.545.741

3,93

46.656

5,41

3.078.011

4,76

120.229

13,94

4.453.999

6,88

132.339

15,35

3.867.840

5,98

61.180 41.507

7,10 4,81

3.280.849 2.304.332

5,07 3,56

50.413

5,85

2.155.850

3,33

76.184

8,84

5.327.687

8,23

27.214

3,16

2.040.694

3,15

862.183

100,00

64.704.927

100,00

Fonte: Censo 2000 - IBGE (Tabulação Avançada - Subamostra). Elaboração: DIEESE, ER/DF. (1) Participação no total de ocupados.

IV Jornada de Trabalho A maioria dos trabalhadores brasileiros (55,70%) tem uma jornada de trabalho de até 44 horas semanais. Contudo, 26,15% dos trabalhadores têm uma jornada de mais de 49 horas. No Distrito Federal, a situação

dos trabalhadores em relação à jornada de trabalho é um pouco melhor, uma vez que 63,68% do total trabalham até 44 horas semanais e 21,85% trabalham mais de 49 horas. A porcentagem de trabalhadores com até 14 horas de jornada (2,00%), por sua vez, também é menor no DF.

V Ocupação A População Economicamente Ativa (PEA) do Brasil é composta por um contingente de 76.158.531 pessoas; já no Distrito Federal, o contingente de pessoas economicamente ativas é de 1.029.753 pessoas, isto é, 1,35% da PEA brasileira.

Tabela 4 - Jornada de Trabalho Regiões Brasil % do Total % Acumulada Distrito Federal % do Total % Acumulada

Total 64.704.927 862.183 -

Até 14 horas 1.923.007 2,97 2,97 17.238 2.00 2,00

De 15 a 29 horas 5.927.749 9,16 12,13 56.626 6,57 8,57

De 30 a 39 horas 6.453.166 9,97 22,11 111.732 12,96 21,53

De 40 a 44 horas 21.736.838 33,59 55,7 363.436 42,15 63,68

Fonte: Censo 2000 - IBGE (Tabulação Avançada - Subamostra) Elaboração: DIEESE, ER/DF

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De 45 a 49 horas 48 horas ou mais 10.977.473 16.917.744 16,97 26,15 72,67 98,81 113.294 188.427 13,14 21,85 76,82 98,67


A população ocupada do Distrito Federal equivale a 83,73% da sua PEA, enquanto os ocupados no Brasil inteiro são 84,96% da PEA total. Pode-se notar que a proporção de ocupados no Distrito Federal é levemente menor que no Brasil em sua totalidade. O número de ocupados com carteira de trabalho assinada é

muito baixo no Brasil, refletindo a grande informalidade do mercado de trabalho (tabela 5). No Distrito Federal a situação é um pouco melhor, pois, enquanto no Brasil 36,98% dos ocupados têm a carteira de trabalho assinada, no Distrito Federal esse percentual chega a 46,14%. Em relação aos ocupados sem

carteira assinada, a situação brasileira também é pior que a local: enquanto no Brasil 24,31% não possuem a carteira assinada, em Brasília esse percentual cai para 19,54%. Como era de se esperar, a parcela de trabalhadores do setor público no DF (13,69%) é bem maior que a nacional (5,76%).

Tabela 5 - Classes de Rendimento Nominal Mensal em Salários mínimos Regiões

PEA

Ocupados

Com Carteira Militares e Outros sem EmpregaAssinada Func.Públicos Carteira dores Estatutárias Assinada

Conta Própria

Não Produção Remune- p/Consumo rados Próprio

Brasil 76.158.531 64.704.927 23.930.041 3.729.012 15.729.458 1.840.217 14.470.915 2.554.340 1.889.775 % da PEA 84,96 31,42 4,90 20,65 2,42 19,00 3,35 2,48 % Ocupados 36,98 5,76 24,31 2,84 22,36 3,95 2,92 % Ocup. Acum. 36,98 42,75 67,06 69,9 92,26 96,21 99,13 Distrito Federal 1.029.753 862.183 397.815 118.036 168.506 29.295 129.183 5.989 800 % da PEA 83,73 38,63 11,46 16,36 2,84 12,55 0,58 0,08 % Ocupados 46,14 13,69 19,54 3,40 14,98 0,69 0,09 % Ocup. Acum. 46,14 59,83 79,37 82,77 97,76 98,45 98,54 Fonte: Censo 2000 - IBGE (Tabulação Avançada - Subamostra) Elaboração: DIEESE, ER/DF

VI Escolaridade Enquanto o Brasil possui 10,22% da sua população com mais de 10 anos de idade com menos de 1 ano de estudo ou com nenhuma instrução, o Distrito Fe-

deral apresenta apenas 4,07% da sua população nas mesmas condições. A escolaridade no Distrito Federal é notadamente melhor que no Brasil como um todo. A porcentagem de pessoas com mais de 15 anos de estudo no Distrito Fe-

deral (9,24%) é mais que o dobro da porcentagem para o Brasil (4,05%). Da mesma forma, a porcentagem de pessoas com poucos anos de estudo (de 1 a 3) é bem menor no Distrito Federal (12,07%) que no Brasil (21,18%).

Tabela 6 - Pessoas de 10 Anos ou mais de Idade, por Grupo de Anos de Estudo Regiões Brasil % do Total % Acumulada Distrito Federal % do Total % Acumulada

Total(1)

Seminstrução e com menos de 1 ano

De 1 a 3 anos

De 4 a 7 anos

De 8 a 10 anos

De 11 a 14 anos

15 anos ou mais

Não Determinado

136.427.211 13.948.802 28.895.418 38.897.790 20.512.744 20.609.083 5.524.947 487.231 10,22 21,18 28,51 15,04 14,89 4,05 0,36 10,22 31,4 59,92 74,95 89,84 93,89 94,25 1.665.625 67.722 201.002 445.983 312.770 394.315 153.962 11.914 4,07 12,07 26,78 18,78 23,67 9,24 0,71 4,07 16,13 42,91 61,69 85,36 94,6 95,32

Fonte: Censo 2000 - IBGE (Tabulação Avançada - Subamostra) Elaboração: DIEESE, ER/DF (1) Inclusive sem declaração

* Lílian Arruda Marques Supervisora Técnica do DIEESE/DF

** Ana Georgina da S. Dias Economista da subseção do DIEESE/DF na CNTI Revista de conjuntura "#

*** Max Leno de Almeida Conselheiro do CORECON/DF e economista do DIEESE/DF

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A R T I G O

O Economista e a Economia Mineral Mônica Beraldo Fabrício da Silva *

Encontra-se em tramitação na Câmara dos Deputados, desde abril de 2002, uma proposta de Projeto de Lei elaborada pelo Sistema COFECON/ CORECONs para a reformulação da Lei n.º 1.411/51, que regulamenta o exercício profissional dos economistas. A justificativa da proposta se baseia em que a referida Lei, em vigor há mais de 50 anos, precisa adequar-se à realidade atual. Dentre as inserções realizadas nas atividades inerentes à profissão de economista estão “os estudos de mercado, de viabilidade e de impacto, relacionados ao meio ambiente, à ecologia, ao desenvolvimento sustentável e aos recursos naturais”. Temos o setor mineral como um dos ramos de estudos relativos aos recursos naturais, cujos profissionais possuem formações acadêmicas em engenharia de minas, química, economia, geologia, entre outras. Portanto, o setor mineral é notadamente conhecido como uma atividade multidisciplinar. Oportuno definir, segundo o professor Eliezer Braz (1), o que

vem a ser economia mineral: trata da aplicação da teoria econômica à industria mineral. A economia mineral engloba o conhecimento e características do setor mineral, combinados com a correta aplicação da teoria econômica, o que torna o tema notadamente interdisciplinar. Pode-se relacionar a economia mineral a uma análise do mercado de um determinado bem mineral: oferta, demanda, preços, investimentos, exaustão de uma mina, além da importância da atividade mineral para o desenvolvimento econômico de um país, de forma sustentável e harmoniosa com o meio ambiente. Recente enquete realizada pelo Ministério de Minas e Energia em alguns Estados e Municípios brasileiros procurou saber o que a sociedade pensa da mineração. Naqueles Municípios onde existe a atividade mineral, constatou-se que seus habitantes não a apreciam e não conhecem os benefícios dela provenientes. Respostas similares foram dadas pelos próprios empregados das empresas instaladas naqueles Esta-

dos, e atuantes na lavra e no beneficiamento de bens minerais. O desenvolvimento sustentável já vem sendo pensado pelo economista Sachs desde os anos setenta, conforme retratam seus livros e artigos publicados em todo o mundo. O mundo tem repensado a atividade mineral, que para alguns está relacionada somente à degradação do meio ambiente. No início deste ano, o Canadá organizou um fórum de debates, que contou com a presença do Ministério de Minas e Energia do Brasil, onde se revisou o papel da mineração no contexto social e econômico, dentro de critérios de sustentabilidade. Atualmente, pode-se indagar o que o governo e a iniciativa privada têm realizado para conscientizar a população de que o setor mineral é importante e indispensável para o bem da sociedade e para o desenvolvimento do País. No lado governamental, segundo investidores do setor, falta uma política de estímulo à mineração. As reservas minerais brasileiras continuam a atrair os inves-

1 Engenheiro de Minas. Professor da Universidade Federal da Paraíba. Mestre em Economia Mineral pela Colorado School of Mines/EUA. Doutor em Economia Mineral pela

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tidores em pesquisa mineral, mas de forma muito tímida. Desde 1994, com a transformação do DNPM em Autarquia, tanto o governo como o setor mineral têm mencionado que o modelo de gestão da atividade mineral está ultrapassado e ineficiente. A sociedade mineral tem cobrado do Governo Federal uma política de estímulo ao setor de mineração. Os investidores, ao disponibilizarem US$ 180 milhões (previstos para o ano de 2002) em pesquisa mineral, esperam maiores incentivos por parte do Governo, que espera alcançar a cifra de US$ 300 mil em 2005. A mineração é um setor de alto risco; requer, na maioria das vezes, investimentos elevadíssimos, e o retorno esperado vem no médio e longo prazos. O Departamento Nacional de Produção Mineral - DNPM é uma Autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia, que tem como missão gerir os bens minerais do Brasil, em benefício da sociedade. Conforme a legislação pertinente, é um órgão fiscalizador que exerce funções típicas de Estado, pois concede o direito de pesquisa e lavra do solo e subsolo brasileiros, além de arrecadador, pois recolhe dos mineradores a CFEM – Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais. Fazem parte das atividades finalísticas do DNPM trabalhos técnicos relacionados à mineração e à economia mineral. Os estudos econômicos e técnicos, inclusive os relacionados à arrecadação, são desenvolvidos na DIRIN - Diretoria de Desenvolvimento Mineral e Relações Institucionais, onde também são elaboradas publicações que retratam a performance do setor mineral no Brasil e no mundo. Dentre essas

publicações, estão o Balanço Mineral, o Sumário Mineral, o Anuário Mineral, que, através de dados estatísticos e análises econômicas, avalia a situação atual e futura dos principais minerais que compõem a produção mineral brasileira. Oportuno mencionar que o produto da indústria de transformação mineral representou, em 2000, 8,5% do produto interno bruto. Do lado da iniciativa privada, empresários do setor reclamam dos governantes a falta de conhecimento sobre a atividade mineral e sua contribuição para o desenvolvimento socioeconômico do País, além do fato de o Ministério de Minas e Energia estar sem Ministro de Minas há algum tempo. E esse desconhecimento é notório entre os candidatos que irão concorrer ao cargo de Presidente da República nas próximas eleições. Não seria oportuno que as empresas do setor pensassem numa estratégia de marketing, de forma a divulgar a atividade mineral, as ações voltadas para o desenvolvimento sustentável e preservação do meio ambiente, e o benefício que tal atividade proporciona à economia do País e à sociedade ? Não terá chegado a hora de as propagandas de empresas de mineração, que encontramos em revistas especializadas, buscarem outros meios de comunicação, com linguagem mais acessível ? O fato de a mineração não ter sido prioridade do Ministério de Minas e Energia nos últimos anos, não impediu os economistas minerais do governo de atuarem no setor com as seguintes atribuições, de caráter multidisciplinar, respeitadas as devidas competências profissionais: • regular as atividades de mineração, estimulando o uso racional e eficiente dos recursos minerais;

Revista de conjuntura "%

• fiscalizar a pesquisa, a lavra, o beneficiamento, a comercialização e o consumo dos bens minerais, bem como promover a análise crítica dos seus projetos de exploração e de aproveitamento de jazidas; • fiscalizar o controle ambiental, a higiene e a segurança das atividades de mineração, de forma integrada com os demais órgãos competentes; • fiscalizar a arrecadação da compensação financeira sobre a exploração mineral – CFEM, e o recolhimento de taxas e emolumentos decorrentes e inerentes às atividades de pesquisa e lavra de bens minerais; • contribuir com a elaboração de políticas minerárias; • autuar infratores e aplicar sanções cabíveis, em conformidade com a legislação mineral e correlata; • promover o controle estatístico e analisar o desempenho do setor mineral nacional e internacional; • desenvolver pesquisas com vistas à promoção, ao fomento e ao desenvolvimento tecnológico da produção mineral; • coletar, processar, analisar e divulgar os dados geológicos e econômicos da mineração; • assegurar os acordos, os tratados das convenções internacionais das quais o Brasil seja signatário. Fruto do trabalho da equipe multidisciplinar dos servidores do DNPM, dois indicadores econômicos retratam a performance do setor mineral brasileiro: reservas e produção mineral no Brasil e no mundo, e arrecadação da CFEM. O Quadro I mostra a reserva e a produção mineral brasileira de 44 substâncias minerais brasileiras. A falta de políticas públicas e incentivos ao setor e demonstrada pelos crescimentos discretos na

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produção de algumas substâncias, apesar de suas reservas representarem percentuais elevados em relação às ocorrências mundiais. O

Brasil, por exemplo, detém cerca de 2% das reservas mundiais de cobre e 2% das reservas mundiais de potássio. Contudo, o País res-

ponde por apenas 0,2% e 1,4% da produção mundial desses minerais, respectivamente. Os dados são do Sumário Mineral 2001.

Tabela 1 - Reserva e Produção Mineral 2000 (Principais Substâncias) SUBSTÂNCIA MINERAL DISCRIMINAÇÃO ALUMÍNIO BARITA BENTONITA BERÍLIO CAL CARVÃO* CAULIM CHUMBO CIMENTO COBRE CRISOTILA CROMO DIAMANTE(1) DIATOMITA ENXOFRE ESTANHO FELDSPATO FERRO FLUORITA FOSFATO GÁS NATURAL(2) GIPSITA GRAFITA LÍTIO MAGNESITA MANGANÊS MICA NIÓBIO NÍQUEL OURO(3) PETRÓLEO(4) POTÁSSIO (K20) PRATA ROCHAS ORNAMENTAIS SAL TALCO E PIROFILITA TANTALITA (3) TERRAS-RARAS TITÂNIO . Ilmenita . Rutilo TUNGSTÊNIO(3) VANÁDIO VERMICULITA ZINCO ZIRCÔNIO (*) Dados do ano base 95 (1) 106 ct (2) 109 m3 FONTE: Sumário Mineral 2001/DNPM

RESERVA (Medida + Indicada) BRASIL MUNDO PART. (%) 2.500.000 32.140.000 7,8 2.130 490.000 0,4 39.000 500 7.372.000 1.035.261.000 0,7 4.000.000 14.200.000 28,2 950 134.950 0,7 11.833 655.000 1,8 16.325 Abundantes 6.606 7.541.106 0,1 15 1.230 1,2 3.508 Abundantes 52.000 4.047.000 1,3 540 7.910 6,8 79.300 19.200.000 300.000.000 6,5 7.000 380.000 1,8 298.211 36.698.211 0,8 231 149.742 0,2 1.248.720 Abundantes 95.000 454.080 21,0 185 9.542 1,9 180.000 3.480.000 5,2 51.000 5.000.000 1,0 5.000 5.556 90,0 6.000 150.000 4,0 1.800 48.100 3,7 9 1.040 0,8 305.618 16.120.175 1,9 1 420 0,2 24.440.000 Abundantes 178.000 945.000 19,0 64.872 143.392 45,2 109 112.657 0,1 3.457 77 8.500 164 17.700 5.200 1.888 (3) Unidade Tonelada

490.457 173.377 3.200.000 27.164 217.700 431.200 66.188

Unid. 1.000 t

PRODUÇÃO BRASIL MUNDO PART. (%) 13.846 127.746 10,8 55 5.695 1,0 312 10.000 3,1 6.200 117.000 5,3 6.000 4.655.000 0,1 1.735 22.000 7,9 9 2.989 0,3 39.208 1.702.008 2,3 32 12.880 0,2 209 1.938 10,8 276 13.656 2,0 1 115 0,8 10 2.020 0,4 333 57.800 0,6 7 220 3,2 61 8.821 0,7 210.000 1.027.000 20,0 43 4.480 1,0 4.725 139.300 3,4 13 2.403 0,5 1.541 110.000 1,4 71 726 9,7 0,54 14 3,9 280 3.270 8,6 1.424 7.611 18,7 4 302 1,3 31 34 92,4 45 1.230 3,7 52 2.445 2,1 1.271 73.242 1,7 352 25.989 1,4 0,01 18 0,1 2.458 50.176 4,9 6.074 210.000 2,9 450 9.490 4,7 419 1.884 22,2 80.070 -

0,7 0,0 0,3 0,6 8,1 1,2 2,8

123 3 14 0,02 23 100 30

3.938 419 31.500 42 563 8.070 1.059

(4) Reserva unidade 109 barris e produção 103 barris/dias

Revista de conjuntura "&

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3,1 0,8 0,04 0,1 4,1 1,2 2,8


O Quadro II mostra a evolução da arrecadação da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais - CFEM, no período 96/2000. A CFEM, estabelecida pela Constituição de 1988 e instituída pela Lei n.º 7990/89, é devida pela empresas de mineração aos Estados, Municípios e aos Órgãos da União, na proporção de 23%, 65% e 12%, respectivamente, em virtude do aproveitamento econômico dos recursos minerais. Por força da Lei n° 9993/2000, parte dos recursos da CFEM destinados à União compõem o Fundo Nacio-

nal de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, que inclui o setor mineral. A base de cálculo da alíquota da CFEM, que é de 3%, é o faturamento líquido da empresa, resultante da venda do produto mineral, obtido após a última etapa do processo de beneficiamento adotado, antes da sua transformação industrial. Na evolução da arrecadação da CFEM, segundo o DNPM, tem-se verificado um crescimento médio de arrecadação da ordem de 20%. A meta é atingir, em 2004, R$ 204 milhões. Apesar de a

Autarquia DNPM não ter, ainda, um Plano Anual de Capacitação de seus servidores (Decreto n° 2.794/98, que institui a Política Nacional de Capacitação de Servidores Federais da Administração Direta, Autarquias e Fundações), a capacitação contínua sendo realizada pela Diretoria de Desenvolvimento Mineral e Relações Institucionais - DIRIN, tanto para os servidores do governo, como para os agentes arrecadadores dos Estados e Municípios, o que, combinado com a legislação e a fiscalização, tem-se refletido no aumento da arrecadação.

QUADRO II - EVOLUÇÃO DA ARRECADAÇÃO DA CFEM 1996/2000

160.000

135.825

140.000 120.000

107.084

100.000

82.846 80.000

69.804

64.955 60.000 40.000

1996

1997

1998

-

-

-

-

0

-

20.000

1999

2000

Fonte: DNPM/DIRIN, SUMÁRIO MINERAL 2001

Conclusões Alguns pontos importantes podemos destacar desse breve relato sobre o economista e a economia mineral.

1°) Além da vigilância do Sistema COFECON/CORECONs, nos últimos seis anos, nas atividades dos economistas que atuam no setor mineral, principalmente no DNPM, inserimos Revista de conjuntura "'

no anteprojeto de lei novas atividades inerentes aos economistas, buscando a legalização da ampliação dessas atividades, juntamente com outras não menos importantes.

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. O desenvolvimento sustentável e a preservação do meio ambiente estão diretamente relacionados também com a atividade mineral. Muitas empresas de mineração têm obedecido a essa nova ordem social e desenvolvido suas atividades dentro dos critérios de sustentabilidade. A sociedade brasileira, o povo brasileiro e outros setores da economia sabem disso ? · Se o atual modelo de gestão não tem atendido aos interes-

ses do setor, é importante lembrar que qualquer inovação gerencial tem que levar em conta o aproveitamento dos servidores do DNPM, sua experiência e sua dedicação em cumprir a missão da Autarquia. As entidades de classe dos economistas, engenheiros de minas, geólogos, químicos, técnicos em recursos minerais e cartografia, entre outros, estão vigilantes com relação ao assunto. · Alguns indicadores econômicos

apresentados neste artigo retratam a realidade da economia mineral e apontam para a urgente necessidade de políticas públicas voltadas para o setor. · A mineração precisa propagar suas atividades e benefícios, tanto do lado empresarial como governamental. É preciso mostrar e convencer a sociedade de que a atividade mineral resulta em insumos que irão compor o cotidiano das pessoas. Sem esses insumos, voltaremos à Idade da Pedra.

Referências Bibliográficas: a) BRAZ, Eliezer. “Introdução à Economia Mineral”. Balanço Mineral Brasileiro/2001. DNPM/MME. Bsb/DF. b) SACHS, Ignacy. “Caminhos Para o Desenvolvimento Sustentável”. Garamond. Rio de Janeiro/RJ. 2000. c) _____Mineral Commodity Summaries. 2001. USGS/USA. d) _____Brasil Mineral. Revista. Edição maio/junho de 2002. Signus Editora. São Paulo/SP. e)_____Folha de São Paulo. Jornal. 01 a 10 de julho/2002. f)_____Sumário Mineral 2001. DNPM/MME. BSB/DF.

* Mônica Beraldo Fabrício da Silva Conselheira do CORECON/DF. Membro da Diretoria do SINDECON/DF. Economista do DNPM

Revista de conjuntura #

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Quem tem informação tem poder Revista de Conjuntura, o melhor panorama sobre tudo que anda acontecendo.


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