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Economia

de BrasĂ­lia

Um assunto que a gente conhece como a palma da mĂŁo

Instituto Brasiliense de Estudos da Economia Regional

IBRASE


Revista Editada pelo CORECON/DF e SINDECON/DF - ANO I1 - nº 12 - OUT/DEZ DE 2002

EDITORIAL .............................................................................................................................................. 4

ENTREVISTA

JOÃO PAULO DE ALMEIDA MAGALHÃES .......................................................... 5 ARTIGOS LUIZ FERNANDO VICTOR A Independência do Banco Central e a fixação das taxas de juros .................................... 11

FERNANDO MOUTINHO RAMALHO BITTENCOURT Competência do economista e conflitos interprofissionais ................................................ 15

JOSÉ LUIZ PAGNUSSAT O baixo desempenho dos cursos de economia no Provão 2002 ........................................ 28

NEWTON MARQUES Razões que levaram o Brasil a sofrer recente ataque especulativo com relação ao dólar ... 39

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EXPEDIENTE

EDITORIAL

Órgão Oficial do CORECON-DF e SINDECON-DF Diretor Responsável: Roberto Bocaccio Piscitelli Conselho Editorial: Roberto Bocaccio Piscitelli, Carlito Roberto Zanetti, Dércio Garcia Munhoz, José Luiz Pagnussat, José Roberto Novaes de Almeida, Maurício Barata de Paula Pinto e Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo. Jornalista Responsável: Alessandra Cardoso - Reg. 4389 Editoração Eletrônica: OM Comunicação/Jornalismo (0xx61) 425-1090 Tiragem: 4000 Periodicidade: Trimestral As matérias assinadas não refletem, necessariamente, a posição das entidades. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte. ISSN 1677-0668 CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO – DF Presidente: Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Vice-Presidente: Roberto Bocaccio Piscitelli Conselheiros Efetivos: Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo, Roberto Bocaccio Piscitelli, Newton Ferreira da Silva Marques, Mônica Beraldo Fabrício da Silva, José Luiz Pagnussat, Maria Cristina de Araújo, Humberto Vendelino Richter, André Luiz Ferro de Oliveira e Irma Cavalcante Sátiro. Conselheiros Suplentes: Maurício Barata de Paula Pinto, Bento de Matos Félix, Max Leno de Almeida, Jusçanio Umbelino de Souza, José Ribeiro Machado Neto, Francisco das Chagas Pereira, Ronalde Silva Lins, Miguel Rendy e Iliana Alves Canoff. Equipe do CORECON: Iraídes Godinho de Sales Ribeiro, Ismar Marques Teixeira, Michele Cantuária Soares, Jamildo Cezário Gomes e Angeilton Francisco Lima Faleiro. End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 – Brasília –DF Tels: (061) 223-1429 / 223-0919 / 225-9242 e 226-1219 Fax: (061) 322-1176 E-mail: corecondf@corecondf.org.br Site: www.cofecondf.org.br Horário de Funcionamento: das 8:00 as 18:45 horas (sem intervalo) SINDICATO DOS ECONOMISTAS DO DF End: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 203 CEP 70300-907 – Brasília –DF Tel.: (061) 225-5482 Fax: (061) 322-1176 E-mail: sindecon-df@fenecon.org.br Site: www.fenecon.org.br Horário de Funcionamento: das 8:00 as 18:00 horas Diretoria Efetiva: Presidente: Iliana Alves Canoff 1º Vice-Presidente: Vago 2º Vice-Presidente: Otávio de Carvalho Franco Secretário: José Nilson Gomes de Souza Tesoureiro: Gilberto Gatti Suplentes da Diretoria: Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Eugênio de Oliveira Fraga Marcos Cardoso Bularmarqui Victor José Hohl José Honório Accarini Conselho Fiscal: Miguel Rendy Maria Cristina de Araújo Luiz Guaraci David Suplentes do Conselho Fiscal: Marcus Vinicíus da Costa Villarim Humberto Vendelino Richter Geraldo Andrade da Silva Delegado Represent. Junto à Federação Roberto Bocaccio Piscitelli Delegados Suplentes: Mônica Beraldo Fabrício da Silva Irma Cavalcante Sátiro

Escolhidos os nomes do 1º e 2º escalões e adotadas as primeiras decisões do novo governo, o quadro político e econômico começa a ficar um pouco mais nítido. Aparentemente, o governo foi atropelado pelo agendamento forçado das reformas previdenciária e trabalhista, pautadas pela mídia, sob o impulso dos primeiros dias, e antes que os possíveis atingidos consigam organizar-se de forma consistente. Nesse sentido, a reforma tributária parece ter ficado em segundo plano e há mesmo quem diga que, no caso de mudanças mais profundas na previdência, a questão tributária seria adiada e, talvez, esvaziada. Ocorre que, do modo como o assunto está sendo colocado, com suficiente maniqueísmo e manipulação, os necessários aperfeiçoamentos que se fariam oportunos têm reduzida chance de serem implementados, salvo na hipótese de se produzir um novo rolo compressor no Congresso Nacional. A reforma previdenciária – mais do que a tributária – mexe com todo o mundo. No caso específico dos servidores públicos, atinge em cheio – outra vez – a classe média, assalariada, urbana, que já vem sofrendo há quase dois anos quedas sucessivas no poder de compra de sua remuneração e ainda se vê espremida por uma carga tributária crescente. Qualquer amplo acordo social a respeito deveria começar pela absoluta garantia assecuratória dos direitos adquiridos, inclusive mediante a incorporação às responsabilidades do Estado dos períodos de contribuição transcorridos. Em segundo lugar, é preciso ficar claro que tipo de Estado, qual o perfil da sua burocracia que se deseja para atender às demandas da sociedade, pois, se todos devem ser iguais perante a lei, as relações entre o governo e os servidores públicos tem uma enorme especificidade. O preconceito com que o tema tem sido abordado faz com que, em geral, se confunda direito com privilégio, e se trate o desvio, a distorção, a exceção como se fosse a regra. Outro aspecto a ser considerado é o que decorre das circunstâncias próprias dos acordos que o País firmou, e que lhe impõem restrições de tal ordem que dificilmente haverá soluções fiscais razoáveis para gerar o monumental superávit primário exigido. Apesar de a carga tributária crescer de forma contínua, a compressão de despesas – sobretudo as destinadas aos programas sociais – é cada vez maior, mesmo admitindo-se os incontáveis desperdícios e desvios de recursos. A cautela é até certo ponto de vista justificável, para não “assustar” os mercados nesta fase de transição. Mas não se deve, tampouco, exagerar seu poder, nem superestimar a influência que seus representantes, acostumados a promover movimentos que fazem o dólar e o “risco-Brasil” elevarem-se, as bolsas caírem, os capitais se evadirem. Nossa vulnerabilidade externa ainda nos constrange, é verdade, menos do que antes, todavia; temos reservas confortáveis, um saldo comercial importante, grandes investimentos estrangeiros no País, variados potenciais de recursos. Temos sido muito bons pagadores. Nossa relação com o resto do mundo tem de ser altiva; negociar não é ceder nem impor. Fazer diplomacia é também defender os interesses e comportar-se de modo soberano em todos os fóruns internacionais. Não se deve demonstrar medo nem arrogância. A América Latina tem de assumir o seu papel, e isso passa pelo fortalecimento de nossas instituições e por um amplo processo de cooperação. É preciso retomar a iniciativa para que os programas do novo governo não se desarticulem nem mudem de rumo diante de uma agenda que, longe de constituir o foco, o objeto das mudanças sociais clamadas pela manifestação maciça das urnas, possa nada mais ser do que a manifestação oportunista dos mesmos interesses de sempre, bloqueando as verdadeiras transformações, dispersando esforços e desviando a atenção do que é geral, essencial e inadiável. Revista de conjuntura "

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ENTREVISTA

Política industrial e desenvolvimento brasileiros No momento em que a troca de governo traz expectativas de mudanças nos mais diversos setores da Economia brasileira, o CORECON-DF decidiu convidar o professor da UFRJ e conselheiro do COFECON, João Paulo de Almeida Magalhães, para falar sobre política industrial e desenvolvimento brasileiros. Falando à Revista de Conjuntura, João Paulo faz uma análise do modelo de política industrial adotada pelo atual governo, abordando assuntos como neoliberalismo, crescimento econômico, estratégias de desenvolvimento e perspectivas para o novo governo. Qualquer política industrial para o Brasil deve ser definida no contexto de estratégia global de desenvolvimento. Nesse sentido, devemos começar a verificar as cadeias causais que determinaram duas décadas perdidas na economia brasileira . Entrevista: Alessandra Cardoso Colaboração: José Luiz Pagnussat

Conjuntura - Nas últimas décadas a preocupação dos governantes foi com o curto prazo. O longo prazo era um problema para o mercado resolver. Assim, não temos uma estratégia de desenvolvimento. A Industrialização por Substituição de Importação - ISI - se esgotou no final dos anos 70. Quais as alternativas viáveis para o desenvolvimento brasileiro? João Paulo - As últimas duas décadas da economia brasileira foram marcadas pela visão neoliberal formulada no Consenso de Washington. Nesse período, praticamente não tivemos política econômica, no sentido de ação sistemática do Governo na

condução do desenvolvimento. Os maus resultados obtidos demonstram que tal situação deve ser modificada e, nesse sentido, aspecto importante é uma agressiva política industrial. Em termos de estratégias de desenvolvimento, a literatura especializada tende a preferir o chamado “crescimento para fora” ou baseado no mercado externo. Mesmo sem entrar na controvérsia, é lícito afirmar que, em países de dimensões continentais como o Brasil, crescimento baseado exclusivamente no mercado externo é insuficiente. Políticas de mercado interno são, portanto, igualmente indispensáveis. A discussão deve ser apenas sobre a ênfase a ser concedida a uma e outra.

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Conjuntura - Qual a estratégia de industrialização brasileira? O que a experiência internacional pode ensinar-nos ? João Paulo - Na experiência internacional deve-se distinguir entre o caso dos atuais países de economia madura e os chamados subdesenvolvidos. Todos tiveram política industrial. Os parques manufatureiros de países como Estados Unidos, Alemanha e Japão só têm a importância atual graças à decidida política protecionista levada adiante, essencialmente, através de tarifas aduaneiras. Análises recentes mostram que mesmo a Inglaterra foi protecionista na fase inicial de sua industrialização (inspetores eram nomeados para coibir manufaturas na colônia americana). O protecionismo, diga-se de passagem, ainda não foi abandonado por esses países. Lembrem-se, no caso americano, os obstáculos colocados ao aço brasileiro e a imposição ao Japão de quotas de exportação de veículos para os Estados Unidos. O Japão, aliás, garantiu a recuperação do seu setor manufatureiro, após a última guerra, através de rigoroso protecionismo. No caso dos países subdesenvolvidos, a experiência a ser registrada é dos países do Leste

da Ásia (com relevância especial para Coréia do Sul, Taiwan, Cingapura e Hong Kong). Eles ignoraram amplamente as recomendações do Consenso de Washington, lançando-se em política industrial de amplo espectro, que abrangia não somente medidas protecionistas, como reservas de mercado, crédito subsidiado, isenções fiscais, pesquisa tecnológica, formação de mão-de-obra qualificada e assim por diante. Em suma, o que ensina a experiência é que nenhum país se industrializou pela simples ação das forças do mercado. O Brasil, como economia retardatária, necessita de uma política industrial de largo espectro, na qual a experiência mais bem sucedida, até agora, é a do Leste da Ásia. Conjuntura - O Brasil passou pela onda neoliberal, que reduziu o papel do Estado, que acreditava que, com a estabilidade, o crescimento econômico seria natural, o mercado resolvia tudo e não era necessário política industrial. Após duas décadas de crise, como romper o ciclo de crescimento reduzido e volátil? A indústria brasileira precisa voltar a crescer de forma sustentável. Como?

O Governo brasileiro optou por estratégia de crescimento para fora, levada adiante dentro da visão neoliberal de abstenção do Estado na economia .

João Paulo - Qualquer política industrial para o Brasil deve ser definida no contexto de estratégia global de desenvolvimento. Nesse sentido, devemos começar a verificar as cadeias causais que determinaram duas décadas perdidas na economia brasileira. Nesse período, o Governo brasileiro optou por estratégia de crescimento para fora, levada adiante dentro da visão neoliberal de abstenção do Estado na economia. Como conseqüência, o País se especializou em exportações de “commodities” agrícolas e industriais, setores em que a abundância de recursos naturais lhe proporcionava vantagens comparativas. Sucede que tais setores, além de altamente competitivos, registram lento crescimento no mercado mundial. Donde serem incompatíveis com estratégias de “crescimento para fora”. Dentro da mesma visão neoliberal, o Governo abriu ampla e rapidamente a economia às importações. A idéia era que a concorrência externa levaria as empresas brasileiras a níveis internacionais de concorrência, tornando-as naturalmente exportadoras. O que ocorreu foi a explosão das importações, com lento crescimento das exportações. Ou seja, contrariamente ao previsto, não conseguimos parcela significativa do mercado externo e perdemos importante fatia do mercado interno para o fornecedor estrangeiro. Finalmente, o Governo ignorou que os setores mais dinâmicos do mercado mundial se achavam controlados por filiais de empresas multinacionais, que

Se a nova demanda não for atendida, ela Revista de conjuntura $

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ingressaram no País com objetivo específico de atender ao mercado interno. E os grandes mercados mundiais lhes estavam fechados, por já serem atendidos pelas matrizes. Dentro de sua visão neoliberal, o Governo nada fez para modificar esse estado de coisas. Por esses três motivos fracassou a estratégia neoliberal de “crescimento para fora” Em função desses erros, é possível definir as linhas básicas de política industrial para o Brasil. Em termos de “crescimento para fora”, o Governo deverá, antes de mais nada, lançar programa destinado a criar vantagens comparativas para o Brasil em setores dinâmicos (isto é, de não-commodities) do mercado mundial, através de pesquisa tecnológica, reservas de mercado, formação de mão de obra, crédito favorecido etc. Os ganhos obtidos serão explorados por política industrial de amplo espectro, voltada para vendas nos grandes mercados mundiais. Nesse caso, empresas de capital nacional, adequadamente apoiadas, deverão ter papel fundamental. No que se refere ao “crescimento para dentro”, será necessário programa de substituição de importações, além de investimentos destinados a atender a demanda dos grupos de menor renda. Esse segundo ponto é especialmente importante no âmbito da “economia de consumo de massas”, anunciado pelo novo Governo. Se a nova demanda não for adequadamente atendida, ela será neutralizada pelo aumento de preços.

No que se refere ao crescimento para dentro , será necessário programa de substituição de importações, além de investimentos destinados a atender a demanda dos grupos de menor renda . Conjuntura - A CNI aponta que a retomada do crescimento exige visão estratégica e ações em múltiplas direções, ou seja, uma Política de Desenvolvimento Industrial. O foco é a competitividade. A alternativa é a construção de vantagens comparativas? Como ficam as pequenas indústrias? João Paulo - O fato de a CNI ter absorvido a implicância dos neoliberais com o modelo se substituição de importações não deixa de ser curiosa, dado que a indústria brasileira, e, portanto, ela mesma, a CNI, praticamente inexistiriam se não fosse pela existência desse modelo. O problema da competitividade no âmbito de política industrial, que, por definição, concede vantagens especiais a certos setores, foi amplamente equacionado pelos países asiáticos. Nas atividades voltadas para o mercado externo, são estabelecidas metas de exportação a serem cumpridas como condição para serem mantidas as vantagens concedidas. Nos setores voltados para o mercado interno, a solução consiste em patrocinar várias empresas em cada

setor, de forma a estimular a competitividade. Quanto à substituição de importações, ela se faz necessária por dois motivos. Cumpre, em primeiro lugar, corrigir a distorção de empresas locais (inclusive estrangeiras), que desapareceram ou estagnaram por concorrência externa a que foram submetidas, em condições extremamente desfavoráveis de juros e taxas de câmbio. Em segundo lugar, faz-se necessária à substituição de importações com base em protecionismo educativo. O objetivo deste é proteger a empresa local pelo período necessário para que se torne competitiva, ingressando no mercado mundial ou tornando-se capaz de concorrer com o produto importado. Esse tipo de protecionismo foi adotado em todos os países hoje industrializados. Quanto às médias e pequenas empresas, estudos recentes, baseados, sobretudo, em regiões da Itália, mostram que elas não têm problemas de competitividade se organizadas em conglomerados (“clusters”), onde sistemas de cooperação lhes garantem elevada produtividade. A experiência

será neutralizada pelo aumento de preços . Revista de conjuntura %

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de Taiwan comprova, inclusive, que podem ser a mola principal da política exportadora.

Na insuficiência do mercado, o capital estrangeiro simplesmente expulsou ( crowded out ) o nacional, sem qualquer ganho para o desenvolvimento .

Conjuntura - A retomada do desenvolvimento é um problema de mercado ou de poupança? João Paulo - Até pouco tempo se supunha que nível adequado de poupanças era a condicionante principal de qualquer política bem sucedida de desenvolvimento. Mais recentemente, contudo, verificou-se que não eram maiores poupanças que determinavam crescimento mais rápido do PIB, mas este que ocasionava o aumento de poupanças. Segundo os analistas, as poupanças cresciam com as oportunidades de investimento. Ora, estas nada mais fazem do que traduzir a existência de mercado, que passou, assim, a ser considerado a condicionante principal do sucesso das políticas de desenvolvimento. Outro aspecto da experiência brasileira recente também confirma a primazia do mercado. Nos último quatro ou cinco anos, o capital de risco estrangeiro entrou no Brasil na média anual de 20 bilhões de dólares, permanecendo, todavia, nossa taxa de investimento sobre o PIB em 19%. A explicação simples e direta é que, na insuficiência do mercado, resultante das razões acima expostas, o capital estrangeiro simplesmente expulsou (“crowded out”) o nacional, sem qualquer ganho para o desenvolvimento. Conjuntura - A campanha eleitoral retomou uma discussão sobre o modelo de industrialização voltada para o mercado interno ou voltada para o mercado Revista de conjuntura &

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externo. Até que ponto essa discussão é relevante? Qual a estratégia que o senhor recomendaria para o novo Governo? João Paulo - Eu considero que o debate é relevante, dado que certo número de analistas, inspirados, inclusive, pelo sucesso dos países do Leste Asiático, insistem em que o desenvolvimento baseado nas exportações (“export led”) é o único possível. Ora, o mercado mundial dificilmente seria capaz de absorver o volume de exportações a que seria obrigado um país de dimensão continental, como o Brasil, em crescimento puramente para fora. A par disso, a experiência demonstra que países de dimensão continental não conseguem exportar mais do que 10% a 15% do seu PIB, o que significa estar destinada ao mercado interno a maioria dos investimentos realizados. Por que, então, não orientá-los através de uma política para o mercado interno? Conjuntura - O Governo FHC privatizou, entre outros setores, o siderúrgico, energético e as telecomunicações. A crise de energia mostrou que o modelo não garante o abastecimento. Como viabilizar os investimentos na infra-estrutura nos setores estratégicos? Qual o papel do Estado? João Paulo - Eu tenho sustentado que a privatização brasileira foi prematura, por tentar copiar a experiência européia. Na Europa, a estatização teve raízes ideológicas. Foi desencadeada pelo prestígio da União Soviética e dos partidos de esquerda, logo após a Segunda Guerra Mundial. Ela tomou a forma de desapro-


priação pelos Governos, de empresas de infra-estrutura e dos setores de base. A crise do modelo soviético pôs em cheque a motivação ideológica, com a normal reversão do processo através da política de privatização. No Brasil, a privatização não foi ideológica, mas desenvolvimentista. Ou seja, não houve desapropriação de empresas particulares, mas investimentos públicos em setores de grande importância para a economia nacional e que a iniciativa privada não tinha capacidade financeira para assumir. A privatização deveria, assim, ocorrer em fase mais avançada do nosso desenvolvimento, em que a iniciativa privada nacional dispusesse da poupança requerida para assumi-los. Como isso não foi feito, tornou-se necessário recorrer a artifícios, como os certificados de privatização, aceitação de títulos da dívida pública pelo valor de face (moeda podre), concessão de grandes empréstimos pelo BNDES, aceitação indiscriminada do comprador estrangeiro etc. Isso justifica a seguinte indagação: investidores que somente foram capazes de adquirir empresas do Governo, mediante toda sorte de vantagens, estarão capacitados a mobilizar recursos necessários para atender ao aumento da demanda, sobretudo quando o País voltar a crescer aceleradamente? Não seria demais lembrar que esse tipo de problema já vem se apresentando, em grande escala, na Inglaterra, país rico, onde supostamente as empresas privatizadas não têm dificuldades em mobilizar poupanças. O problema, portanto, existe e resta ver como será resolvido.

Nas condições em que se acha colocada, a ALCA significa a renúncia a algum dia chegarmos ao pleno desenvolvimento . Conjuntura - A carga tributária brasileira se aproxima de 35% do PIB, onera a produção e reduz a competitividade da indústria brasileira. Por outro lado, o novo governo precisa gerar superávit primário para pagar os juros da dívida pública. Qual a reforma tributária necessária e viável para aumentar a competitividade da indústria? A Lei Kandir resolveu o problema das exportações? João Paulo - A carga tributária em si não é problema, dado que é ainda mais elevada em países com bom desempenho exportador, o que não significa negar a vantagem de sua redução. O Brasil deve, sem dúvida, manter superávit primário, para evitar a explosão da dívida publica, mas por que pagar os elevadíssimos juros atuais? Se excluirmos um ou dois países em grave crise conjuntural, nossos juros são os maiores do mundo, inclusive duas vezes mais elevados que os da Argentina. A idéia de que tal situação decorre do “risco Brasil” se acha hoje desmoralizada. A meu ver, nossos altíssimos juros resultam de elevadas dívidas interna e externa vencendo em curtíssimo prazo. Disso se aproveitam nossos credores, para exigir o que bem entendem. A pergunta que ocorre, então, é a seguinte: até quando um país soberano se deixará chantagear pelos credores? Revista de conjuntura '

Em termos de exportações industriais, o importante é fundamentalmente acabar com a tributação em cascata. A par disso, o problema da compensação aos Estados pela renúncia de impostos sobre exportações (Lei Kandir) deve ser resolvido de uma vez por todas. Conjuntura - A ALCA é uma ameaça para o nosso parque industrial? Qual a estratégia que o Brasil deverá adotar nas negociações sobre a ALCA com os EUA? João Paulo - A literatura internacional desaconselha integrações econômicas entre países cuja diferença entre produto por habitante seja superior a 1 por 3. Entre Brasil e Estados Unidos a diferença é de 1 por 7. Esse é um primeiro fato a ser considerado. Segundo seus defensores, a ALCA nos abriria o maior mercado do mundo. Resta, porém, saber qual mercado nos seria aberto. A resposta é simples o de “commodities” agrícolas e industriais. Ou seja, não somente as exportações brasileiras, mas toda nossa economia se especializaria nesse setor, de mercado pouco dinâmico e baixo valor adicionado por trabalhador. Ou seja, nas condições em que se acha colocada, a ALCA significa a renúncia a algum dia chegarmos ao pleno desenvolvimento.

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O Brasil deve considerar o MERCOSUL uma opção política, mais do que econômica, a ser mantida apesar de todas as dificuldades . O preocupante é que, na integração entre desenvolvidos e subdesenvolvidos, estes últimos registram num primeiro momento ganhos importantes, pagos a longo prazo pela aceitação de permanente semidesenvolvimento. A par disso, todos produtores brasileiros de “commodities” se tornam ardorosos defensores da ALCA, para eles, sem dúvida, altamente vantajosa. Não acredito que a solução seja rejeitar liminarmente a ALCA. Solução possível seria o Brasil montar política industrial de grande envergadura e

condicionar a entrada na ALCA à sua aceitação. Se ela for aceita, cessam as objeções ao programa; se for recusada, confirmar-se-ão os temores expressos acima. Conjuntura - O enfraquecimento do MERCOSUL com a crise da Argentina e a instabilidade do câmbio foi marcante. Quais as perspectivas para o MERCOSUL? Quais as possibilidades e vantagens de uma política de industrialização comum para a América Latina? João Paulo - A meu ver o mundo da próxima década não

será globalizado (no sentido de abertura multilateral entre todos os países), mas regionalizado (no sentido da abertura entre países de mesma região). Para não se ver excluído desse processo, o Brasil deve considerar o MERCOSUL uma opção política, mais do que econômica, a ser mantida apesar de todas as dificuldades. Ponto importante é que o acordo deixe de ser simples abertura comercial, tornando-se base de programa conjunto de desenvolvimento, inclusive - e principalmente - com política industrial comum. Este, contudo, tem sua aceitação pelos demais participantes condicionada a um ponto importante. O Brasil deverá propor aos demais membros do Acordo mecanismos destinados a garantir que as atividades mais dinâmicas e de maior valor adicionado por habitante sejam repartidas de forma equânime por todos participantes.

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A R T I G O

A Independência do Banco Central e a fixação das taxas de juros Luiz Fernando Victor * A independência do Banco Central e a fixação da taxa básica de juros da economia do País são tratados, normalmente, na base do “ouvi dizer” ou “li na imprensa”, não só por autoridades e políticos, mas também por iniciados na matéria, buscando justificar a entrega total do poder de formulação, implementação e controle da política monetária aos técnicos da maior instituição do sistema monetário e financeiro. A questão inicial que se coloca é a da independência para o Banco Central. O que desejam os defensores dessa liberdade, em definitivo, é a liberdade de ação das autoridades do Banco Central em relação à sociedade organizada e ao governo federal, fugindo à sua influência e de seus representantes, políticos ou não. A independência almejada se refere, ordinariamente, a duas situações: (1) independência em relação às forças políticas, eventualmente no poder; e (2) independência decisória para os profissionais do setor, que se julgam os conhecedores exclusivos dos conceitos e

ferramental que regem o sistema monetário e financeiro, para que possam formular e implementar sua política, à margem das pressões - consideradas subalternas - da sociedade organizada e do próprio governo. Em qualquer dos casos, a questão é de natureza eminentemente política, já que a escolha e implementação do modelo macroeconômico tem como suporte uma visão e interesses políticos predeterminados. Na verdade, em toda a sua História, o Banco Central brasileiro tem agido de forma não independente, mas isolado do contexto nacional. Como não existem normas definidoras de uma estrutura organizacional e administrativa que contemple a participação efetiva da sociedade organizada em suas decisões, essas decisões são tomadas de forma não estruturada, refletindo tão-somente os interesses e visões de mundo dos grupos eventualmente no poder. O único setor que participa definitivamente na formação dessas decisões é o setor financeiro. Revista de conjuntura

Além do mais, os problemas enfrentados pela fiscalização do Banco Central, como estão presentes quotidianamente em seu processo decisório, acabam contaminando a política monetária, o que a transforma em simples política bancária, na qual os interesses do setor monetário e financeiro superam sempre as questões nacionais, sejam de que natureza forem. Nesse sentido, o processo administrativo (tomada de decisões) acaba restringindo-se às questões de natureza financeiro-bancária, sem considerar os problemas da produção, do emprego, da geração e distribuição da renda nacional, e os da infra-estrutura econômica e social. A falta de uma estrutura organizacional e administrativa que contemple a sociedade organizada restringe as decisões do Banco Central às idéias e ao saber de seus Diretores e de seus quadros de segundo escalão. Nesse sentido, não são atendidas as normas de boas práticas de transparência das políticas monetárias e financeiras, conforme preceituam o

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À exceção do setor financeiro, a

sociedade organizada jamais participou da simples indicação de qualquer diretor do Banco . BIS, FMI, BIRD e outras instituições multilaterais. Segundo essas instituições, tais normas são absolutamente necessárias, pois exigem do Banco Central e das autoridades monetárias que dêem “conhecimento ao público, de forma compreensível, acessível e oportuna, dos objetivos da política, o marco jurídico, institucional e econômico da mesma, as decisões de política e seus fundamentos, os dados e a informação relacionados com as políticas monetárias e financeiras e os termos a que as instituições financeiras devem obedecer”. A simples divulgação das atas do COPOM não atende a esses preceitos. Frise-se que o Banco da Reserva Federal de “Kansas City” vai mais longe, ao afirmar que as autoridades monetárias e o Banco Central devem ter como “propósito fundamental auxiliar o país a atingir seus objetivos econômicos de longo prazo e [tendo por isso que] estar preparados para atender às necessidades da Nação, tais como exigidas pelo povo”. O exemplo mais claro desse isolamento do Banco Central – isolamento desejado e consciente – é a fixação da taxa de juros e de sua tendência, adstritas à Diretoria do Banco e ao seu órgão corporativo, o COPOM. A sociedade organizada jamais interferiu nessa fixação. Os interesses da produção, dos serviços ou das regiões não são considerados.

Ressalte-se também que, à exceção do setor financeiro, a sociedade organizada jamais participou da simples indicação de qualquer diretor do Banco. A sociedade brasileira não tem tratado o assunto com a seriedade e consistência científica que o tema exige. Daí as mazelas a que são expostos todos os brasileiros. A maior parte de seminários acadêmicos e profissionais que tratam do desenvolvimento raramente introduzem uma análise do sistema monetário e financeiro. Em estudo que publiquei sobre a distribuição de agências bancárias no território brasileiro (REVISTA DE CONJUNTURA, CORECON/DF, março de 2001), mostro que, dos 5.590 municípios brasileiros, 2.358 (42%) não possuíam uma só agência bancária, 1.397 (25%) possuíam uma só agência e 613 (11%) possuíam duas agências. E mais: o quociente habitantes/agências mostrava que a média brasileira era de 10.499, enquanto os países mais avançados apresentavam, em anos diferentes, índices bem mais saudáveis, a saber: EUA – 3.890; Reino Unido – 4.157; Canadá – 3.599; Japão – 2.717; França – 2.168; Suíça – 1.545; e Alemanha – 1.401. Essas situações impedem o cumprimento da Carta Magna, quando determina, em seu artigo 192, que “O Sistema Financeiro Nacional será estruturado

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de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade.” Entendo por “desenvolvimento equilibrado” a desconcentração/descentralização territorial, organizacional e setorial das atividades produtivas, da intermediação financeira, do desenvolvimento tecnológico e da administração pública federal, que permitam o aumento da renda nacional, sua melhor distribuição e o pleno emprego, tendo como conseqüência o crescimento econômico e social de forma equilibrada entre as diversas regiões, setores econômicos e a população. O desenvolvimento equilibrado resulta das ações dos governos e das atividades de mercado. Para se ter uma idéia clara do absurdo de se dar constitucionalmente a chamada “independência ao Banco Central brasileiro”, basta analisar a estrutura organizacional e administrativa (processo decisório) das atividades de formulação, implementação, execução e controle do sistema monetário e financeiro dos Estados Unidos. Naquele país as instituições financeiras – à parte o sistema habitacional – se sujeitam às normas de cinco (5) instituições distintas, algumas subdivididas em diversas outras organizações. A primeira delas é o Departamento de Justiça, que pode vetar / rever decisões de qualquer autoridade monetária. O segundo conjunto de instituições são as autoridades monetárias dos Estados: existem 50 agências regulamentadoras estaduais. A terceira é o FDIC – Companhia Federal de Seguro de Depósitos.A quarta é o OCC – Departamento de Controle do Meio Circulante.

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A quinta é o FRS – Sistema Federal de Reservas, conhecido como FED, o Banco Central norte-americano. Sem falar no processo de fiscalização das instituições financeiras. As instituições que nos interessam são as que compõem o FED, pois são elas que exercem a parcela representativa das atividades do Banco Central. São as seguintes as instituições que compõem o FED: 1 – “Board of Governors” – Conselho Superior, composto de sete membros, com mandato de 14 anos, indicados pelo Presidente da República, aprovados no Congresso. Um dos membros do FED é indicado seu presidente, com mandato de quatro anos; 2 – os doze bancos centrais regionais, tendo cada um nove (9) diretores, num total de 108 diretores, distribuídos em três classes – “A”, “B” e “C” –, representativas de setores distintos do distrito controlado pelo Banco Central Regional. Um terço – classe “A” - são pessoas representativas do setor financeiro; um terço – classe “B” –, representativos das classes produtoras; um terço – classe “C” –, representativos de outros setores, incluindo os de notório saber e trabalhadores. Um exemplo claro da representatividade da classe “C” é o Banco Central da Reserva Federal de Boston: um é dirigente executivo do “THE BOSTON GLOBE” (imprensa), um é o Vice-Presidente da AFL-CIO (trabalhadores) e o terceiro é o executivo de uma organização dos serviços de saúde; 3 – o Comitê Federal de Conselheiros, indicados pelo

Presidente da República – 12 membros; 4 – o FOMC – Comitê Federal do Mercado Aberto. Trata-se de um órgão colegiado composto pelos sete membros do “Board” e pelos doze presidentes dos Bancos Centrais Regionais, dos quais somente cinco têm direito a voto em suas decisões. O Presidente do FOMC é o presidente do FED, e seu Vice-Presidente é o Presidente do Banco Central da Reserva Federal de Nova Iorque. Esse colegiado se reúne a cada seis semanas – oito reuniões anuais -, para examinar os doze relatórios emitidos por cada Banco Central Regional, sobre a situação econômica, financeira, social e política de cada uma das áreas de responsabilidade dos bancos centrais regionais. Esses relatórios são examinados pelos quadros do “Board”, surgindo daí um conjunto de proposições a serem examinadas pelo plenário do FOMC. É dentro deste plenário que as decisões mais importantes para o cenário financeiro são formadas, inclusive a fixação da taxa de juros de curto prazo, utilizada pelo mercado. As taxas de juros de longo prazo são fixadas pelo “Board”. É preciso ainda dizer que alguns bancos centrais regionais

possuem escritórios regionais, num total de 25 unidades. Cada unidade tem sete (7) dirigentes, três (3) indicados pelo “BOARD” e quatro (4) pelo Banco Regional da Reserva Federal. Nota-se, portanto, que a fixação da taxa básica de juros nos EUA não é um processo desorganizado, individual, fortuito ou voluntarioso; ele está estruturado nas instituições que exercem as funções de Banco Central. São 93 instituições que podem manifestar-se; quatorze se envolvem diretamente no processo. As falácias divulgadas pelos interessados na independência do Banco Central brasileiro, face ao exposto, são claras: PRIMEIRA FALÁCIA – o FED decide de forma independente do Governo Federal. Não só não decide, como se sujeita à vontade da sociedade organizada e do governo federal; SEGUNDA FALÁCIA – As decisões do FED não são afetadas pelas forças políticas, eventualmente no Poder; TERCEIRA FALÁCIA – As decisões não são estruturadas e dependem, fundamentalmente, do Presidente do FED. O Sr. Greenspan é apresentado como se fosse um pensador transcendental, um mágico extraindo taxa de juros da cartola; QUARTA FALÁCIA – A abertura para a sociedade organizada participar do processo

A fixação da taxa básica de juros

nos EUA não é um processo desorganizado, individual, fortuito ou voluntarioso.

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decisório de elaboração e controle da Política Monetária representará uma retomada do processo inflacionário; QUINTA FALÁCIA – O sistema político brasileiro não é federativo; a nossa História impõe a centralização do Poder; SEXTA FALÁCIA – O brasileiro é pobre, não tendo necessidade de acesso ao crédito; SÉTIMA FALÁCIA – O COPOM exerce no cenário brasileiro o mesmo papel que o FOMC exerce na sociedade norte-americana; OITAVA FALÁCIA – Não se pode incluir os empresários do setor produtivo nas decisões de fixação da taxa de juros básica, pois são os interessados em sua baixa. Na verdade, todo o processo de inclusão da independência do Banco Central no cenário brasileiro tem um só objetivo: afastar o Governo Federal e a sociedade organizada das decisões relativas à Política Monetária. Busca-se dar aos diretores do Banco Central um poder maior que o exercido pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, no que se refere à formulação e implementação da política monetária, sem qualquer possibilidade de revisão ou veto. Joseph Stiglitz – Prêmio Nobel de Economia de 2001 –, em seu livro “GLOBALIZAÇÃO E SEUS MALEFÍCIOS (Ed. FUTURA,2002), ao tratar do FMI e outras instituições internacionais, afirma: “Subordinado aos problemas do FMI e das outras instituições econômicas internacionais está o problema do controle: quem decide o quê e por que fazer. As instituições são controladas não só pelos países industrializados mais ricos do mundo, mas também pelos interesses comerciais e financeiros desses países; as políticas das instituições refle-

tem isso [...] o Fundo não se reporta diretamente nem aos cidadãos que o financiam nem àqueles cuja vida ele afeta. Em vez disso, reporta-se aos ministros da fazenda e aos bancos centrais ... sendo que somente um país, os Estados Unidos, tem poder de veto [...] meio século após sua fundação, ficou claro que o FMI fracassou em sua missão”. Esse é o modelo que buscam implantar no Brasil os defensores de uma independência dependente e monitorada do exterior. O novo governo deveria proceder, através de Grupos de Trabalho centralmente coordenados pelo governo federal, à revisão da missão, estrutura, funcionamento e grau de independência do Banco Central. Os debates deverão incluir toda a sociedade organizada – de forma territorialmente descentralizada –, retirando dos grupos fechados a exclusividade de formulação das orientações da política monetária. Os debates deverão ser organizados utilizando-se de técnicas organizacionais, como as do planejamento estratégico. Dentre os muitos princípios norteadores dos debates, podem ser indicados: 1 – deverá operar-se uma descentralização das atividades organizacionais e administrativas do Banco Central, tomando-se como modelos o “Federal Reserve System” dos EUA, o “BUNDESBANK” da Alemanha e o “BCE” – Banco Central Europeu;

2 – todos os Municípios do País deverão dispor de agências bancárias, e não simples pontos de atendimento secundário; 3 – deverá ser criada na Direção do(s) Banco(s) Central(ais) uma Diretoria destinada exclusivamente às atividades de concessão do microcrédito; 4 – as atividades de fiscalização bancária deverão ser examinadas – inclusive a sua localização organizacional – de forma a impedir que contaminem a política monetária, embora tenham que a ela informar; 5 – devem-se retirar da estrutura do Banco Central atividades que nada têm a ver com suas atividades – como a de consórcios de automóveis –, ao tempo em que outras podem ser incluídas, tais como tíquete refeição, vale-transporte e fundos de pensão; 6 – as instituições financeiras nacionais e estrangeiras devem ser parceiros imprescindíveis na manutenção da estabilidade de preços e na geração de renda e emprego. O potencial dos mercados dos Municípios e da periferia das grandes metrópoles somente será utilizado se contar com a presença das instituições financeiras. Essas são algumas considerações que podem e devem ser debatidas na reestruturação da organização e administração do Banco Central.

* Luiz Fernando Victor Sociólogo, administrador e professor aposentado pela Universidade de Brasília (UnB). Foi também presidente de dois bancos estaduais: BANESTES E BRB.

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A R T I G O

Competência do economista e conflitos interprofissionais Mas é preciso portanto não ignorar que a técnica está ligada a viver. Ligada à atuação direta do homem para reproduzir seus meios de subsistência, para finalmente sobreviver, como ser coletivo, como ser racional em vida social, Portanto, quando desenvolvemos um conhecimento da realidade social, esse conhecimento nos permite aprofundar, aperfeiçoar, dar maior eficácia a nosso comportamento racional. A Ciência Social vai diretamente se prolongar em técnicas.1 Fernando Moutinho Ramalho Bittencourt * 1) Introdução A pesquisa “Perfil do economista brasileiro”, promovida pelo COFECON em 1996, mediante consulta detalhada em mala direta a todos os economistas do País2 , aponta que a profissão espera intensamente das suas entidades ações no sentido de promoção do mercado de trabalho: 62,6 % desejam cursos de reciclagem e especialização, 56,8 % pedem programas de recolocação profissional e fomento ao negócio próprio, enquanto 49,4 % pensam que “as entidades devem atuar no sentido de preservar e ampliar os espaços de trabalho do economista e aperfeiçoar os procedimentos de fiscalização sobre o exercício cotidiano da profissão” . Por outro lado, a realidade do mercado de serviços profissionais

(como assalariado ou não), na qual militam ao menos 63,6 % dos economistas, está marcada por constantes conflitos entre os economistas e os exercentes de outras profissões regulamentadas, e muitas vezes entre os economistas e profissionais sem habilitação específica, todos girando em torno do espaço permitido a cada um. A variedade de objetos do trabalho dos economistas, cada qual com suas características singulares, é tão grande que nega o sentido de um tratamento individualizado a cada um, nestas observações, formulando uma relação exaustiva de cada conflito individual. Ao contrário, entendemos ser mais útil para a discussão do SINCE, cujo objetivo essencial é orientar as ações das entidades do Sistema para maior eficácia no

cumprimento de seus objetivos institucionais, a apresentação de uma estrutura conceitual para a abordagem dos conflitos profissionais. Uma tal estrutura, atualmente ausente da prática dos Conselhos, permitirá que os casos individuais sejam tratados todos sob um procedimento lógico uniforme e com maiores possibilidades de coerência e eficácia. 2) Premissas básicas: conteúdo material e fundamentos axiológicos da regulação das atividades do economista. 2.1) Evolução do saber e da formação profissional na área da Economia Iniciaremos a abordagem conceitual com algumas premissas gerais sobre a formação pro-

1 Furtado, 2001, p. 7 2 Disponível em <www.cofecon.org.br >

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Existe realmente uma linha de fronteira entre os conjuntos de saberes institucionalizados (Economia, Administração, Contabilidade, Direito, Engenharia), que não oferece uma distinção absolutamente inequívoca entre o conteúdo de cada um . fissional em nosso campo de atuação, que, apesar de não demonstradas aqui empiricamente, confiamos em que serão aceitas facilmente como base de raciocínio (inclusive porque a comprovação material variará em função de cada conflito que eventualmente ocorra). A primeira é que existe realmente uma “linha de fronteira” (por vezes conhecida como “área cinzenta”) entre os conjuntos de saberes institucionalizados (ou seja, Economia, Administração, Contabilidade, Direito, Engenharia), linha esta que não oferece uma distinção absolutamente inequívoca entre o conteúdo de cada um. Ou seja, temas existem que são inequivocamente próprios à problemática e ao instrumental de cada ramo do saber (por exemplo, a política monetária para a Economia, as regras de escrituração do balanço para a Contabilidade, os cálculos estruturais para

a Engenharia). Por outro lado, existem pontos que se colocam na interseção dessas disciplinas e não se submetem intelectualmente ao domínio absoluto de quaisquer delas. Em especial, as questões de alocação de recursos internamente às unidades econômicas (empresas, repartições governamentais) estão, em maior ou menor grau, permeadas por todos esses saberes, e tais questões, entendemos poder afirmálo com segurança, estão presentes no trabalho da maior parte dos economistas. Em coerência com esta estruturação do saber, a formação acadêmica tem apresentado cada vez maiores pontos de contato entre as habilidades transmitidas aos alunos. Ao nível de graduação, cada vez são maiores as coincidências substantivas entre os curricula. Na pós-graduação, chegam a existir áreas de conhecimento (como a Teoria Financeira) que sequer são

distinguíveis como parte de uma ou outra disciplina. Naturalmente, essa interpenetração do objeto de estudo e prática profissional é maior em relação às disciplinas tradicionalmente congêneres (Administração, Contabilidade), e mais limitada em relação a outras (Engenharias, Direito), variação essa que, inclusive, é proporcional ao número de conflitos profissionais que se projetam na realidade cotidiana dos economistas e dos Conselhos. Esta ocorrência das áreas cinzentas vem exigindo esforços de reflexão e ações não só entre os economistas, mas junto às demais categorias envolvidas: Assim, em nossa área de interesse direto, são regulamentadas as profissões de Economista, Administrador, Contador, Atuário, Engenheiro e Advogado. Ora, como cada profissão dispõe de prerrogativas,é natural que existam superposições, zonas cinzentas, para não falarmos em atividades para as quais a concretização de seu exercício exclusivo por uma ou mais profissões é extremamente difícil, não obstante serem consideradas prerrogativas. É o que sucede, por exemplo, com aquelas referentes às finanças, organização e contrrole da produção, etc.3 Pois bem, “como exercer privativamente profissão supostamente (e do ponto de vista legal) unidisciplinar numa realidade transdisciplinar”4 ?

3 Koliver, 2001, p. 52. Grifos no original. 4 Mendes, 2001, p. 62

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2.2) A necessária prevalência do interesse público na fiscalização do exercício profissional Identificados como pressupostos principais de legitimidade constitucional da regulamentação profissional a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho justificam restrições à liberdade de trabalho sempre que a lei regulamentadora da profissão busque preservar a vida, a saúde, a liberdade, a honra e a segurança do trabalhador que a exerce ou da coletividade que dela necessita. Estão nesse contexto tanto as leis que regulamentam a profissão para assegurar àqueles que a exercem condições de trabalho seguras e que lhes preservem a saúde, como as leis que estabelecem restrições ou exigem habilitação especial para o exercício da profissão, que lida com a vida, saúde, a liberdade, a honra e a segurança das pessoas em geral. Não é, assim, a exigência de formação acadêmica específica, por si só, que justifica a restrição ao livre exercício da profissão. A restrição só se justifica, neste ponto, quando a formação acadêmica é imprescindível à habilitação profissional, como forma de preservar os valores acima referidos, diretamente ligados ao exercício da profissão. Compete aos Conselhos e Ordens defender a sociedade, pelo ordenamento da profissão, tendo, por função, o controle das atividades profissionais respectivas, zelando pelo privilégio e controlando a ética. Valorizando a profissão, ao impedir que pes-

soas inabilitadas exercitem as atividades profissionais e, ainda, combatendo a falta de ética profissional, atingem os Conselhos e Ordens o seu desiteratum. Os Conselhos e Ordens se organizaram porque a sociedade necessita de um órgão que a defenda, impedindo o mau exercício profissional, não apenas dos leigos inabilitados como dos habilitados sem ética. Tanto uns como os outros lesam a sociedade. Compete aos Conselhos evitar esta lesão. As Ordens e Conselhos não se fizeram para defender a profissão, nem o profissional e nem o interesse das classes respectivas. A defesa da profissão, do profissional, do interesse da classe, cabe por lei (art. 513 da Consolidação das Leis do Trabalho) aos Sindicatos e, quando prevista nos estatutos, às associações de classe5 . Em particular, os pressupostos da validade de qualquer regulamentação profissional já foram alinhados, de forma prática e objetiva, pelo próprio legislador

brasileiro, através das “Recomendações para a elaboração de projetos de lei destinados a regulamentar o exercício de profissões” adotadas em caráter normativo pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados: Em razão da liberdade para o exercício de ofícios ou profissões estabelecida pela Constituição Federal em seu art. 5º, inciso XIII, a elaboração de projetos de lei destinados a regulamentar o exercício profissional deverá atender, cumulativamente, os seguintes requisitos: 1.1 - Imprescindibilidade de que a atividade profissional a ser regulamentada - se exercida por pessoa desprovida da formação e das qualificações adequadas possa oferecer riscos à saúde, ao bem-estar, à segurança ou aos interesses patrimoniais da população; 1.2 - Real necessidade de conhecimentos técnico-científicos

Os Conselhos e Ordens se organizaram

porque a sociedade necessita de um órgão que a defenda, impedindo o mau exercício profissional, não apenas dos leigos inabilitados como dos habilitados sem ética .

5 Estes argumentos têm sido sistemática e brilhantemente defendidos pela ação constante do Dr. Pedro Paulo Pinheiro, como consultor do Conselho Federal de Economia na esfera jurídica.

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para o desenvolvimento da atividade profissional, os quais tornem indispensável a regulamentação; 1.3 - Exigência de ser a atividade exercida exclusivamente por profissionais de nível superior, formados em curso reconhecido pelo Ministério da Educação e do Desporto. Indispensável se torna, ainda, com vistas a resguardar o interesse público, que o projeto de regulamentação não proponha a criação de reserva de mercado para um segmento de determinada profissão, em detrimento de outras com formação idêntica ou equivalente.” 3) A prática habitual da regulação e fiscalização profissional no Brasil: a busca pelo mercado cativo e o beco sem saída do conflito formal Infelizmente, a prática da regulação profissional por parte dos Conselhos respectivos e mesmo do Poder Judiciário, quando acionado nesse contexto, não tem na devida conta essas realidades fundamentais.

As entidades de auto-regulação profissional, no nosso caso os Conselhos, têm uma tensão básica em sua identidade. Por um lado têm de defender o interesse da sociedade como cliente dos serviços da profissão (como já visto acima), pois daí deriva a legitimidade do poder que lhes confere o Estado. Por outra parte, em sua condição de entidades formadas e dirigidas apenas pelo coletivo profissional, sofrem permanente pressão para defenderem o interesse particular, corporativo, dos membros desse coletivo. Isto reflete-se diretamente no assunto de que tratamos, Muitos entes fiscalizadores, quando emitem regulamentos para as respectivas leis de regência, esmeram-se em ampliar o seu conteúdo o mais possível (inclusive indo além da sua redação original), declarando “privativa” de sua profissão toda e qualquer atividade que tenha vinculação direta ou remota com seu objeto de saber, independentemente de sua pertinência ou não a outro ramo. Este processo já foi captado com maestria pelo Prof. Armando Mendes:

Essa ambição de privatividade extrema, no afã de afastar os demais e reservar o mercado de forma cartorial, virá a chocar-se com a inegável realidade da área cinzenta .

No vácuo legal, a competência é assumida manu militari pela respectiva corporação. A corporação, naturalmente, honrando vetustas tradições corporativas, tende a incorporar aos seus domínios o maior cacho possível de exclusividades. Muito especialmente aquelas relacionadas com as que a dinâmica social vai agregando ao bolo. A distraída corporação que só tardiamente busca disciplinar o assunto, claro está, quando age procura tirar o atraso. E a maneira de fazê-lo é juntar à sua própria coleção os últimos lançamentos do mercado - sem esquecer os já consolidados, por suposto. A partir daí, umas e oturas categorias agarram-se ao princípio do uti possidetis, brandem a imprecação Vade retro, Satana! E lançam-se ao campo de batalha para defenestrar de seus nichos, e escalpelá-los, aos usurpadores.6 Inevitavelmente essa ambição de privatividade extrema, no afã de afastar os demais e reservar o mercado de forma cartorial, virá a chocar-se com a inegável realidade da área cinzenta (refletida inclusive e principalmente na própria legislação ordinária das profissões, que acertadamente inclui uma mesma área de saber p.ex., as finanças - em mais de uma profissão). Em conseqüência, a regulamentação da privatividade extrema levará os mesmos entes que a produzem, os Conselhos, a choques absolu-

6 Mendes, 2001, p. 68

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tamente estéreis de uns contra os outros, choques esses absolutamente inaceitáveis do ponto de vista do interesse público que devem defender antes de qualquer coisa. Não são choques meramente doutrinários, mas, ao contrário, amargos conflitos concretos, com autuações mútuas entre profissionais de ramos similares e processos entre Conselhos. Não se trata de uma possibilidade teórica; todos aqueles que realmente militam nos Conselhos já viveram situações angustiosas dessa natureza. Conflitos entre órgãos administrativos distintos e autônomos, cada qual no exercício das suas atribuições públicas, só podem ser dirimidos por consenso ou pela autoridade judicial. E se tais conflitos desembocam no Judiciário, a ausência de uma perspectiva conceitual baseada no interesse da sociedade transparece - tragicamente - nas alegações de cada parte e no raciocínio dos julgadores. Isto porque as posições dos Conselhos que defendem cada um o seu regulamento exclusivista limitam-se a repetir os respectivos textos legais como escudos, insistindo em que são contrários e sobrepõem-se ao da parte oponente. Pois bem, todas as leis de regência das profissões são normas jurídicas plenas, e os seus regulamentos (seja mediante Decreto, seja mediante deliberações normativas dos Conselhos) são, da mesma forma, componentes do ordenamento jurídico com

Todas as leis de regência das

profissões são normas jurídicas plenas, e os seus regulamentos são, da mesma forma, componentes do ordenamento jurídico com presunção de legitimidade . presunção de legitimidade. Naturalmente, pode ocorrer o caso de que tais normas infralegais tenham sido produzidas de forma inválida ou contrária ao ordenamento jurídico que dispôs sobre a forma de sua produção legítima, e esta possibilidade terá de ser avaliada em cada ocorrência de conflitos. Mas é perfeitamente possível - e até mais provável que os regulamentos profissionais de cada profissão tenham sido validamente criados, cumprindo os requisitos de validade de norma jurídica necessários para que pretendam eficácia. Conflito estéril, do ponto de vista do interesse público, dispersando energias desesperadamente necessárias do Estado: Se a tendência atual persistir, porém, sem o surgimento de um eqüidistante controlador externo, é de temer pelo acirramento dos combates cada vez mais girando em torno de delicadas filigranas de amarração legal ou regulamentar de

atrribuições, competências, direitos, funções, prerrogativas, supostamente exclusivas de uma ou outra categoria. A discussão deixará de versar, propriamente, sobre a natureza intrínseca de cada ato (nem sempre fácil de deslindar), e o conseqüente perfil de cada ator (nem sempre fácil de definir), para situar-se na apreciação de formalidades de baixo coturno em registros cartorários (nem sempre fáceis de destrinçar). Transitará dos atos pelos atores (e autores) desembocando no ordálio supostamente ´purificador´ de ... autuações.7 Ora, se duas profissões chegam cada uma com um arsenal de normas válidas disputando a “privatividade” da área comum, estão colocando à Justiça a situação de antinomia jurídica, “aquela situação que se verifica entre duas normas incompatíveis, pertencentes ao mesmo ordenamento e tendo o mesmo âmbito de validade”.8

7 Mendes, 2001. p. 67 8 Bobbio, 1999, p. 88

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É absurdo pensar que a regulação, por

lei posterior de uma nova profissão, venha por si só invalidar os padrões técnico-profissionais de uma profissão anteriormente regulamentada . Se uma tal situação se apresenta, com a dramaticidade descrita, a tendência inegável da deliberação judicial é seguir conforme o hábito e o costume, adotando as regras normais de resolução formal de antinomias: os critérios cronológico (qual norma é posterior), hierárquico (qual norma tem posição superior no ordenamento) e da especialidade (qual norma tem caráter geral e qual refere-se a uma particularidade ou especificidade da realidade social). Prejudicada fica então, por essa inércia formalista do hábito (incentivada e mesmo provocada, insistimos, pelas partes), a sociedade. Porque a decisão da administração (seja ela executiva, seja judicial) neste caso não pode utilizar-se meramente de tais critérios formais, como se de questão meramente formal se tratasse. É absurdo pensar que a regulação, por lei posterior de uma nova profissão, venha por si só invalidar os padrões técnico-profissionais de uma profissão anteriormente regulamentada. (Basta pensar no contra-senso social de prescindir de recursos humanos que custaram a ser formados e treinados, e que vinham atenden-

do à sociedade em seus limites de atuação.) Isto invalida o critério cronológico. De forma absolutamente análoga, se o legislador opta por regular uma questão de prerrogativa da profissão através de lei em sentido formal, ou se opta por delegar à norma infralegal (Decreto, Resolução etc.) o seu detalhamento, está em qualquer caso disciplinando a profissão, emitindo o comando segundo o qual aquela prática profissional deve obedecer a regras específicas. Se o veículo dessas regras concretas é uma lei ou uma norma infralegal prevista numa lei geral sobre a profissão, é uma mera escolha de técnica legislativa que é permitida ao legislador, o que não invalida o ponto fundamental de que este escolheu regulamentar a profissão. Assim, cai por terra também o critério hierárquico, pois se o Legislativo escolheu listar em texto de lei as atribuições de uma profissão e, em relação a outra, optou por delegar essa especificação ao poder regulamentar, nem por isso deixará de ter deliberado por regular a ambas. O critério de especialidade é, talvez, o único que possa ser legítimo em alguns casos,

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uma vez que remete ao conteúdo concreto da atividade regulamentada. Mesmo assim, não permite a solução das questões fundamentais, pois a regulamentação de uma profissão tem em princípio uma vocação de totalidade: quando a lei trata do campo profissional do economista, ou do contador, ou do engenheiro, tem em vista a totalidade das atribuições de sua profissão, tendo as áreas cinzentas o caráter de específicas ou particulares em relação a cada uma das profissões. Prejudicada, então, reiteramos, a sociedade. Um conflito entre órgãos administrativos, cada um - em tese - perseguindo uma finalidade pública de preservar para a coletividade a correta prestação de determinados serviços, vai ser decidido com base em critérios formais, totalmente desvinculados de considerações sobre a natureza mesma desses serviços, e totalmente inconsistentes com a realidade social que expressam as posições contrapostas. Por outro lado, o consenso e a autocomposição do litígio por parte dos entes fiscalizadores, com base em critérios de finalidade pública, é inviabilizado pela ausência desses próprios critérios, o que os faz recorrer à evocação ritual das respectivas normas e de sua suposta prevalência formal sobre as dos demais. 4) A possibilidade administativa e jurídica de critérios de solução baseados no interesse público Tendo em vista a supremacia do Estado de Direito, deve-

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mos então perguntar: existe solução possível para os conflitos profissionais dentro dos critérios interpretativos abrigados pelo ordenamento jurídico nacional? Na pergunta magistral do Prof. Armando Mendes, “como impedir a definitiva e irremediável balcanização de territórios profissionais ?” 9 A resposta que aqui nos atrevemos a propor é definitivamente positiva. E vem acolhida, na verdade imposta, pela primeira norma interpretativa das leis, a Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-lei nº 4657/42). Nela contemplam-se dois comandos simples, que são capazes de solucionar boa parte dos conflitos profissionais se exercitados pelas entidades interessadas: Art. 2° [..] § 2° - A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior. Art. 5° - Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. Aplicando tais dispositivos em nosso caso concreto, em princípio uma lei que estabeleça um novo campo profissional não exclui os demais, salvo se assim explicitamente o definir. Desta forma, se a profissão “A” dispõe de um determinado elenco de atribuições fixado por qualquer norma validamente incorporada ao ordenamento jurídico (seja ou não lei em sentido formal), o

surgimento da nova profissão regulamentada “B”que incorpore algumas das atribuições de “A” tem por efeito tão-somente incluir em sua área profissional essas atribuições, sem excluir “A” das mesmas. Outra não poderia ser a lógica adotada, pois “os fins sociais a que se dirige” a lei são exatamente preservar a prestação de serviços à sociedade, deixando-a em mãos de agentes qualificados. Se o sistema educacional pode criar duas linhas de formação que forneçam a qualificação necessária (“A” e “B”, no nosso exemplo), e o legislador assim o reconhece, há que presumir-se que, ao atribuir a habilitação aos egressos de uma linha (por exemplo, a que teve a profissão regulamentada mais tarde), não a retira da outra regulamentada anteriormente. Supor essa “revogação” automática da habilitação anterior seria violentar a exigência de interpretação segundo os fins sociais da lei e o

bem comum. Não seria concebível que o legislador pretendesse subtrair da sociedade a possibilidade de serviço de profissionais já formados e qualificados, ou reduzir a concorrência naquele serviço específico, ou tratar de forma desigual profissionais que, na matéria específica, atendem aos mesmos requisitos formativos. Muito menos concebível seria que a interpretação administrativa ou judicial da lei o fizesse de moto próprio. Naturalmente, a supremacia da lei permite que uma lei nova revogue permissões anteriores de serviço profissional, e podem existir hipóteses específicas em que isso seja socialmente válido (caso, por exemplo, de profissões anteriormente de nível médio ou fundamental, cujo conteúdo técnico foise aperfeiçoando de tal maneira que passam a ser exigíveis práticas profissionais que somente são acessíveis mediante formação de nível superior). Porém, tais hipóte-

Tendo em vista a supremacia do

Estado de Direito, devemos então perguntar: existe solução possível para os conflitos profissionais dentro dos critérios interpretativos abrigados pelo ordenamento jurídico nacional?

9 Mendes, 2001, p. 67

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ses são altamente restritivas, e têm de estar rigorosamente explicitadas na lei em questão. Não há aí, portanto, matéria interpretativa: a exclusão de anteriores habilitações está taxativa e detalhadamente regulada em lei. O que não é aceitável, em nenhuma hipótese, é que essa exclusão seja presumida pela administração ou pelo juiz, substituindo-se à soberania do legislador. 5) O conceito de atividade inerente De alguma forma, o Conselho Federal de Economia já teve presentes tais considerações ao longo de sua História, quando definiu em suas normas de conteúdo material sobre o campo profissional do economista as atividades não como “privativas”, mas como “inerentes” (basicamente as Resoluções nºs 860/74, 1612/95 e 1620/96). Se adotada tal perspectiva de uma forma generalizada, na redação legislativa e na prática administrativa e jurídica dos Conselhos, grande parte dos conflitos profissionais estaria solucionada. Em sendo “atividades inerentes” a uma profissão aquelas que exijam determinados conhecimentos

adquiridos na formação para essa mesma profissão, serão essas atividades passíveis de serem compartilhadas com profissionais de outras áreas na medida em que assim estabeleça a respectiva legislação específica, mantendo-se as “atividades privativas” e/ou restritas à profissão concernida apenas aquelas para as quais a habilitação profissional seja, inequivocamente, passível de ser obtida tão-somente pelo trajeto acadêmico que conduz aos títulos habilitadores a essa mesma profissão. E tal restrição, repita-se, somente pode existir se a lei explicitamente o definir. Tal mecanismo permitirá ao ordenamento jurídico tratar, de uma forma unificada e pouco suscetível a antinomias e conflitos entre normas, o crescente fenômeno social da convergência entre os campos do saber teórico e aplicado, abrindo amplas áreas de interseção entre os planos de estudos e os programas de pesquisa de áreas próximas entre si. Modernamente, muitas áreas do conhecimento e da técnica - mas não todas, evidentemente - podem ser legitimamente ensinadas e exercitadas por mais de uma linha de forma-

Atividades há, portanto, que não

podem ser desempenhadas por qualquer um; exigem a preparação que a lei quiser fixar para elas, afastando o leigo e o imperito . Revista de conjuntura

ção acadêmica, dado que o respectivo assunto permite sua abordagem por mais de uma perspectiva, sendo em todas elas atendida a sociedade que demanda os serviços correspondentes. Esta condição de convergência, se reconhecida por lei para mais de uma profissão, está contemplada pelo conceito de “atividade inerente” proposto. Por outro lado, exatamente por necessitarem tais atividades de uma formação específica (fato que explica a sua regulamentação em lei), a regulamentação como “atividade inerente” preserva a sociedade do seu exercício por não-habilitados, assegurando sejam prestados os serviços por aqueles a quem a lei especificamente autoriza: aqueles profissionais que tenham expressa autorização na lei que rege a respectiva profissão. Atividades há, portanto, que não podem ser desempenhadas por qualquer um; exigem a preparação que a lei quiser fixar para elas, afastando o leigo e o imperito. Porém, atingida essa preparação pela formação acadêmicoprofissional de diversas denominações profissionais (ex: economistas, administradores ou contadores; médicos, enfermeiros ou fisioterapeutas), não há motivos para que qualquer dessas categorias não possa cumprir a atividade em questão. 6) Conseqüências práticas: o projeto de atualização da Lei nº 1411/51 Em rigorosa coerência com o que se expôs acima, os Conse-

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lhos Federal e Regionais de Economia lançaram-se, a partir do ano de 2001, a uma importantíssima iniciativa em defesa da profissão. Trata-se de anteprojeto oferecido ao Congresso Nacional com a finalidade de atualizar os pontos principais da norma regedora da profissão de economista, a Lei nº 1411/51, hoje já tramitando na Câmara dos Deputados como o Projeto de Lei nº 7166/2002. O texto, que mereceu a melhor receptividade por parte de numerosos parlamentares vinculados à profissão, e que tem excelentes perspectivas de tramitação legislativa, adota integralmente a concepção de convivência de espaços profissionais que viemos de apresentar. Em primeiro lugar, enfeixa exaustivamente no texto da própria lei as tarefas concretas da profissão, como garantia à sociedade de que as restrições da regulamentação têm objeto definido, explicitado ao julgamento do legislador. A enumeração dessas tarefas resultou de um extenso processo de consultas em nível nacional junto aos economistas e entidades representativas da profissão, que puderam aportar ao COFECON o testemunho concreto de quais são os temas e desafios que atualmente estão sob sua responsabilidade nos setores público e privado. As mencionadas tarefas são distribuídas entre as duas categorias descritas: um pequeno núcleo de atividades “privativas”, enumeradas literalmente e em detalhe, e uma área bem mais ampla de atividades “inerentes”, passíveis de serem compartilhadas

com profissões assim autorizadas pela sua própria legislação: “Art. 1-A. A atividade profissional do Economista exercita-se, sob qualquer vinculação, por meio de estudos, análises, projetos, relatórios, pareceres, perícias judiciais e extrajudiciais, avaliações, mediações e arbitragens, laudos, auditorias ou certificados, inclusive por meio de assessoria, consultoria, planejamento, implantação, orientação, supervisão, fiscalização, magistério e assistência de trabalhos relativos às atividades econômicas e financeiras, em empreendimentos públicos, privados ou mistos. § 1º São atividades privativas da profissão de Economista: a) assessoria, consultoria e pesquisa econômico-financeira; b) estudos de mercado e de viabilidade econômico-financeira; c) análise e elaboração de cenários econômicos, planejamento estratégico nas áreas social, econômica e financeira; d) estudo e análise de mercado financeiro e de capitais e derivativos; e) estudo de viabilidade e de mercado relacionado à economia da tecnologia, do conhecimento e da informação, da cultura e do turismo; f) produção e análise de informações estatísticas de natureza econômica e financeira, incluindo contas nacionais e índices de preços; Revista de conjuntura

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g) planejamento, formulação, implementação, acompanhamento e avaliação econômico-financeira de política tributária e finanças públicas; h) assessoria, consultoria, formulação, análise e implementação de política econômica, fiscal, monetária, cambial e creditícia. § 2º São atividades inerentes à profissão de Economista: a) planejamento, formulação, implementação, acompanhamento e avaliação de planos, programas, projetos de natureza econômico-financeira; b) avaliação econômicofinanceira e patrimonial de empresas, avaliação econômica de bens tangíveis e intangíveis; c) perícia judicial e extrajudicial e assistência técnica, mediação e arbitragem, em matéria de natureza econômico-financeira, incluindo cálculos de liquidação; d) análise financeira de investimentos; e) estudo e análise para elaboração de orçamentos públicos e privados e avaliação de seus resultados; f) estudos de mercado, de viabilidade e de impacto, relacionados ao meio ambiente, à ecologia , ao desenvolvimento sustentável e aos recursos naturais; g) auditoria e fiscalização de natureza econômico-financeira; h) formulação, análise e implementação de estratégias empresariais e concorrenciais;

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i) economia e finanças internacionais, relações econômicas internacionais, aduanas e comércio exterior; j) certificação de renda de pessoas físicas e jurídicas e consultoria em finanças pessoais; l) regulação de serviços públicos e defesa da concorrência; m) outras atividades em que se desdobram as alíneas anteriores ou com as quais sejam conexas, assim definidas em Resolução do Conselho Federal de Economia. § 3º. O Conselho Federal de Economia regulamentará o disposto neste artigo, mediante Resoluções que contenham a caracterização detalhada das tarefas concretas em que se desdobra o campo profissional do Economista.”(AC) Em coerência com o princípio fundamental de proteção à sociedade, o projeto explicita ainda ao nível do texto legal o critério de enquadramento da atividade como inerente ou privativa: exclusivamente o conteúdo ocupacional do cargo e as tarefas concretamente desempenhadas pelo profissional. Ficam assim irrelevantes juridicamente outros aspectos formais (denominação, relações contratuais, processos seletivos etc.), que de fato são irrelevantes do ponto de vista da sociedade, pois a ela concerne o exercício concreto dos serviços, seja a que título for. No mesmo dispositivo, um parágrafo específico deixa explícita a intenção do legislador ao lidar com os casos de conflitos

profissionais em atividades inerentes à profissão de economista. De forma simples, os não qualificados e autorizados na forma da lei devem realmente ser excluídos da atividade (sem o que não faria sentido existir uma regulamentação para a profissão). Por outro lado, aqueles cuja legislação específica permita o exercício da atividade são nela acolhidos pela nova lei, sempre que presente a manifestação expressa do órgão fiscalizador da profissão respectiva, no sentido de que a sua lei própria permite o exercício daquela tarefa e o indivíduo ou empresa em questão está regularmente inscrito em seus quadros para fins de controle e disciplina. “Art. 3º. Para o provimento e exercício de cargos ou empregos privativos ou inerentes à profissão de Economista, em qualquer órgão ou entidade pública ou privada, é obrigatória a apresentação do registro e a regularidade do profissional nos Conselhos Regionais de Economia. § 1º Para efeitos de enquadramento de qualquer cargo ou emprego como privativo ou inerente à profissão de Economista, considerar-seão exclusivamente o conteúdo ocupacional do cargo e as atividades concretamente desempenhadas pelo profissional, sendo irrelevantes a denominação. do cargo ou emprego, a legislação ou as disposições contratuais regedoras das relações trabalhistas ou estatutárias do cargo ou emprego, seu cará-

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ter de provimento efetivo ou em comissão, bem como as características dos concursos ou processos seletivos correspondentes. § 2º. Excetuam-se da obrigatoriedade de que trata este artigo, exclusivamente, as atividades inerentes à profissão de Economista que possam ser desempenhadas por profissionais de outras atividades regulamentadas, por disposição expressa da respectiva lei de regência, mediante comprovação, por certidão da entidade de regulamentação respectiva, da regularidade da situação em cada caso individual. § 3º. Os critérios definidos no § 1º deste artigo aplicamse integralmente ao enquadramento da atividade econômica de pessoas jurídicas como privativas ou inerentes à profissão de economista.” 7) Conseqüências práticas: a ação cotidiana dos Conselhos Reginais e Federal de Economia Por melhores que sejam as perspectivas de aprovação do nosso projeto de lei, há que lembrar em primeiro lugar que o prazo para sua tramitação e promulgação é desconhecido, dependendo de imprevisíveis circunstâncias da atividade parlamentar. Assim, não podem os Conselhos de Economia apenas aguardar uma lei atualizada para atuar sobre os inúmeros conflitos interprofissionais que afetam cotidianamente os economistas.

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Pouco há a discutir frente ao simplesmente não-habilitado em profissão regulamentada alguma: neste caso, a simples constatação da exigência legal de qualificação e registro basta para afastar a ocorrência de “conflito profissional” (outra coisa é que sejam lançados outros argumentos contrários, como a falácia da desnecessidade do registro nas leis de carreiras do serviço público; tais divergências de fato terminam por envolver raciocínios análogos aos que aqui apresentamos, mas não são a rigor conflitos ”entre profissões”). Também para o caso de que uma determinada atividade fosse taxativamente declarada em lei como privativa da profissão de economista, não se poderia aplicar o que aqui expomos; todavia, não podemos levantar qualquer exemplo de uma tal menção na nossa legislação (uma coisa é que achemos, por quaisquer legítimas valorações técnicas da matéria de fato que façamos, que tal ou qual serviço é “evidentemente” de economista; outra coisa é que este senso comum de que todos dispomos esteja refletido em alguma norma escrita, o que infelizmente hoje não ocorre). Existe, porém, o terceiro caso, o das atividades inerentes, que cobre uma parcela considerável da profissão (talvez a maior, fora do âmbito estritamente acadêmico), caso em que surge o conflito entre o exercício da atividade por economista e por profissional de ramo regulamentado e, naquele campo particular, fronteiriço ao nosso. Como poderíamos reagir ?

O roteiro conceitual em que se tem baseado a maior parte de nossa ação até o momento é precisamente aquele que, como vimos na Seção 3, consiste na simples repetição da nossa regulamentação profissional contraposta à de outros. Não admira que os resultados sejam parcos quando defrontamo-nos com outros Conselhos em interesses conflitantes, seja porque têm sua regulação em posição jurídico-hierárquica superior àquela onde está a especificação do conteúdo do economista, seja porque as leis que esgrimem sejam mais recentes que a nossa. Resultados infelizes para nossos interesses imediatos (assegurar o correto espaço dos economistas no mundo profissional) e prejudiciais à sociedade, que perde proteção quando dois entes de fiscalização competem entre si e - pior - não equacionam adequadamente suas divergências sequer mediante a intervenção judicial. A estrutura conceitual aqui apresentada, por sua vez, tem por finalidade justamente elevar a eficácia da ação fiscalizadora nessas árduas interseções profissio-

nais, expondo nos atos administrativos (como acórdãos dos Conselhos Regionais) e nas manifestações judiciais (petições e defesas formuladas em favor dos Conselhos pelos respectivos advogados) um raciocínio logicamente coerente, sintonizado com a finalidade social que perseguem todas as leis reguladoras de profissões, e - espera-se - de compreensão e aplicação mais fácil que a simples tecnicalidade de resolução de antinomias em abstrato. Como traduzir este roteiro conceitual em ações práticas ? Permitimo-nos trazer aqui, a modo de exemplo, a transcrição de uma fundamentação de acórdão que vem sendo crescentemente utilizada pelo CORECON/ MG (com o pleno endosso do COFECON, quando o processo sobe até o nível federal em grau de recurso) e que expressa de maneira concisa todo o raciocínio que até aqui construímos, ao indeferir pedido de cancelamento de registro de pessoa física: Ainda nesse sentido, trata-se unicamente de assegurar que o serviço prestado no cargo seja realizado por um profis-

Não podem os Conselhos de Economia

apenas aguardar uma lei atualizada para atuar sobre os inúmeros conflitos interprofissionais que afetam cotidianamente os economistas . Revista de conjuntura

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sional habilitado (o que o requerente comprovadamente é) e sob a disciplina exigida por lei para a profissão (que impõe o registro). Não nos move, evidentemente, uma postura meramente fiscalista consistente em tentar manter, a qualquer custo, o maior número de filiados ao Conselho. O próprio Conselho Federal de Economia já o define claramente: É necessário reafirmar que a fiscalização do exercício profissional não é um ato de cobrança, porém uma ação que se objetiva em termos de uma técnica específica (o saber econômico), de uma ética profissional (a responsabilização pela utilização da técnica econômica para fins indevidos) e de uma responsabilidade social (Anexo à Resolução COFECON 1536/85, Seção III - “Fiscalização das Pessoas Jurídicas, parágrafo 1). A preocupação de atrair filiados e contribuições, exerce-a o CORECON/MG prestando serviços que tragam benefícios e reciprocidade aos filiados (e essa atividade tem sido crescente). O ponto central da proposta pelo indeferimento é o exercício do indeclinável poder-dever de fiscalizar a profissão, em defesa da sociedade. Como exercentes do poder de polícia administrativa por delegação da União, não resta discricionariedade ao Conselho nas decisões sobre regis-

tro ou fiscalização. Não atendidos os pressupostos legais para sua dispensa (no caso, o não-exercício das atividades típicas de economista, a qualquer título), é imposição legal a obrigatoriedade do registro. Assim, e só assim, pode o Conselho desincumbir-se de sua missão legal. Desta maneira, duas situações podem ocorrer – em tese - em que o economista saia dos quadros do CORECON-MG, e ainda assim, esta exigência fundamental continue atendida. Uma delas é a hipótese do profissional optar por transferir para outro CORECON o seu registro, na forma dos arts. 16 a 19 da Resolução 1537/85 COFECON). No entanto, como exerce seu cargo em Belo Horizonte, não vejo como esta hipótese possa aplicar-se ao caso concreto. Outra hipótese é a de que o requerente possua outra qualificação profissional regulamentada, cuja lei específica abranja as atividades efetivamente exercidas pelo profissional no cargo. Neste caso, demonstradas quais as atividades desempenhadas e o registro em outro Conselho profissional, e presente a manifestação desse similar de que as atividades também estão abrangidas pela legislação respectiva, poderia o Conselho deferir o cancelamento, pois a condição fundamental acima exposta estaria atendida.

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Por sua vez, o acórdão respectivo reflete o mesmo raciocínio, ao conter como um de seus itens a deliberação de: ... esclarecer ao requerente que, na hipótese de que detenha outra habilitação profissional regulamentada, o cancelamento do registro poderá ser reexaminado, desde que demonstradas as atividades concretamente exercidas no seu cargo e lotação, e presente manifestação formal do Conselho respectivo quanto ao seu registro profissional e à inserção das atividades exercidas na legislação específica da profissão envolvida; No caso de uma demanda judicial, naturalmente, o desenvolvimento da argumentação teria de ser mais longo e detalhado, podendo utilizar-se de partes mais completas do conteúdo do presente estudo. Oferece-se aqui, porém, uma lógica capaz de estruturar toda uma linha de defesa ou sustentação, inclusive perante a autoridade judiciária. 8) A modo de conclusão A sociedade, destinatária dos serviços das diferentes profissões, aguarda impaciente uma solução para o longo debate. Aos operadores das normas jurídicas pede o consenso para superar o grave impasse repetidamente suscitado entre partes do ordenamento jurídico, porque admitir normas incompatíveis não atinge a validade formal do ordenamento, mas fere a sua justiça:

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que convivem no cotidiano da regulação das profissões, a nossa comunidade de economistas, somos a primeira linha de defesa dessa justiça, tanto pela missão atribuída às entidades que compomos, quanto - principalmente - pelo fato de que seremos os principais beneficiários da clareza na definição de nosso espaço de trabalho. Para administrar um conflito dessa magnitude, há que buscar critérios mais amplos que escapem aos limitados quintais de cada legislação específica; “num quadro de geral loteamento de

quando pode haver indiferentemente a aplicação de uma ou de outra [norma], conforme o livre arbítrio daqueles que são chamados a aplicá-las, são violadas duas exigências fundamentais em que se inspiram ou tendem a inspirar-se os ordenamentos jurídicos: a exigência da certeza (que corresponde ao valor da paz ou da ordem), e a exigência da justiça (que corresponde ao valor da igualdade).10 Mas não se trata de problema restrito à esfera judicial: aqueles

territórios, fazem falta regras gerais de ordenação de profissões afins. O mercado ressentese da ausência de uma espécie de Código de Ética ou de Coexistência, ou de Trânsito interprofissional. Precisa-se de um Pacto de Boa Vizinhança, ou, digamos, de um Meridiano de Tordesilhas ideológico”.11 São esboços de critérios gerais estes que submetemos ao debate profissional, já na forma de ferramentas de trabalho administrativo, com a esperança de que sirvam como oportunidade de pacificação e justiça entre as profissões.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bobbio, 1999 - Bobbio, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Brasília: Ed. UnB, 1999 Furtado, 2001 - Furtado, Celso . O papel político do economista. Cofecon Notícias. Brasília, 4(11), nov/dez 2001. Koliver, 2001 - Koliver, Olívio. A formação e o exercício profissional dos contadores e a multidisciplinaridade. Revista de Contabilidade do CRC/RS, dez/2001 Mendes, 2001 - Mendes, Armando. O economista e o ornitorrinco. Brasília:Coronário Editora Gráfica, 2001.

* Fernando Moutinho Ramalho Bittencourt Analista do Tribunal de Contas da União e Conselheiro do CORECON/MG. Este artigo é uma versão ampliada da exposição apresentada ao XIX Simpósio Nacional dos Conselhos de Economia (Cuiabá, 04/09/2002)

10 Bobbio, 1999, p. 113 11 Mendes, 2001, p. 67

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A R T I G O

O baixo desempenho dos cursos de economia no Provão 2002 José Luiz Pagnussat *

1-Introdução Os cursos de Economia foram, mais uma vez, reprovados no Exame Nacional de Cursos – ENC (Provão). A nota média nacional do Exame 2002 foi 29,7, ficando pouco acima das médias dos anos anteriores: em 2001 foi 26,0; em 2000, 26,2; e em 1999, 28,4. A maior nota individual foi 88,3, de um aluno da UFMS, e a maior nota média nacional de curso foi 56,8, enquanto o pior curso teve a nota 15,4. Nestes quatro anos, participaram do exame 33.327 formandos em Economia, ou seja, são mais de 30 mil economistas colocados no mercado sem uma formação adequada, considerando que menos de 10% dos alunos tiraram nota acima de 50. Os resultados das provas mostram que um grande número dos formandos

não conheciam conceitos introdutórios de Economia, erraram questões sobre inflação, PIB, balanço de pagamentos etc. Participaram do ENC/ 2002 de Economia 190 cursos, três a mais do que em 2001, e 8 160 alunos, um aumento de 5,6% em relação a 2001. A Região Sudeste teve quase metade (49,2%) dos participantes, e a maior parte dos graduandos é oriunda de instituições privadas (61,5%). O ENC foi criado pela Lei nº 9.131, de 24.11.95, está no sétimo ano, vem sendo realizado desde 1996, e a cada ano novas áreas são incluídas. Em 2002 foram avaliadas 24 áreas e 5.031 cursos. Participaram do Exame 361.561 graduandos, ou seja, cerca de 90% do total de graduandos do País. Observa-se que o maior contingente, no ENC/ 2002, foi o de

cursos mantidos por instituições privadas, com 3.106, correspondendo a 61,7% do total e 67,9% dos graduandos presentes. Dos 5.031 cursos avaliados, 3.234 (64,3%) são de universidades. A Região Sudeste tem a maior concentração de cursos em todas as áreas de graduação, com 2.342 (46,6%) e 195.283 graduandos, correspondendo a 54% do total do País. A área com maior número de cursos é Administração, com 614 (12,2%), seguida de Pedagogia (606), Letras (472), Contabilidade (408), Matemática (358) e Direito (298). Quanto ao número de presentes ao ENC/ 2002, em primeiro lugar está Pedagogia, com 64.229 alunos, seguida de Direito, com 59.823, e Administração, com 57.188. O Provão é parte integrante de uma ampla política de avaliação1 dos cursos e das Institui-

1 O Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior foi regulamentado, inicialmente, pelo Decreto nº 2.026, de 10.10.96, revogado pelo Decreto n.º 3.860, de 09.07.01, que atualmente disciplina a avaliação de cursos e instituições de ensino superior.

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ções de Ensino Superior – IES, integra o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior, regulamentado pelo Decreto nº 3.860, de 09.07.01. Esse Sistema inclui: a. Censo da Educação Superior, que se realiza anualmente e envolve todos os cursos e IES do País; b. Exame Nacional de Cursos, que se realiza anualmente, destinando-se a todos os concluintes dos cursos de graduação que forem sendo incorporados ao processo a cada ano; c. Avaliação das Condições de Ensino, que se realiza periodicamente, a cada quatro anos, com a verificação “in loco” por comissão de professores, das dimensões organização didático-pedagógica, corpo docente e instalações dos cursos submetidos ao ENC; d. Avaliação para fins de reconhecimento ou renovação de reconhecimento, que se realiza sempre que necessário e tem as mesmas características da Avaliação das Condições de Ensino; e. Avaliação Institucional, para fins de recredenciamento ou renovação de recredenciamento das IES, que focaliza, no âmbito organizacional, as dimensões organização institucional, corpo docente e instalações. Este ano, além do Provão, foram realizadas as avaliações institucionais para recredenciamento de Centros Universitários e, também, a avaliação das condições de ensino, para renovação do reconhecimento dos cursos, em seis áreas: Administração,

Direito, Engenharia Civil, Engenharia Química, Medicina Veterinária e Odontologia. Em 2003 está programada a verificação das condições de ensino de Economia, quando todos os cursos receberão “visitas” de comissões de professores, que avaliarão a organização didático-pedagógica, o corpo docente e as instalações de cada curso. A seguir são analisados os resultados do Exame Nacional de Cursos de Economia, ressaltando-se o desempenho dos alunos e instituições, com destaque para os cursos de Economia de Brasília. 2. O Desempenho dos Alunos no ENC 2002 2.1. Dados gerais Apesar da melhoria na nota média dos alunos (29,7) no Provão de Economia em 2002, o resultado ainda é preocupante, especialmente se considerarmos

que a prova deste ano foi, relativamente, mais fácil que a dos anos anteriores. O desempenho dos alunos na prova discursiva (24,1) teve uma melhoria significativa em relação aos anos anteriores; entretanto, apesar da evolução positiva, a nota ficou, ainda, inferior à da prova objetiva (33,4). Os resultados não se alteraram muito nas quatro edições do Provão de Economia (1999 a 2002). A média geral ficou abaixo de 30, entre 26,0 (2001) e 29,7 (2002). O melhor desempenho dos alunos foi nas provas de múltipla escolha, onde a média variou entre 31,0 (2000) e 38,1 (1999), e o pior desempenho, nos quatro exames, foi na prova discursiva, com variação na média entre 13,9 (1999) e 24,1 (2002). Nestes quatro anos, nenhum dos 33.327 alunos participantes do Provão tirou nota máxima. A melhor nota média individual obtida foi em 1999 (92,0), en-

Apesar da melhoria na nota média

dos alunos (29,7) no Provão de Economia em 2002, o resultado ainda é preocupante, especialmente se considerarmos que a prova deste ano foi, relativamente, mais fácil que a dos anos anteriores . Revista de conjuntura

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quanto que a nota máxima individual no Provão 2002 foi 88,3. Considerando isoladamente cada prova, o melhor desempenho individual, tanto na prova discursiva (97,5) quanto na prova de múltipla escolha (94,0), foi obtido no Provão 2002. A evolução das notas dos piores alunos, considerando os dados referentes aos percentis dez (P10) e vinte e sete (P27), se manteve relativamente estável entre 1999 e 2002, enquanto que os melhores alunos, percentis setenta e quatro (P74) e noventa (P90), tiveram uma pequena melhoria nas suas notas. No Provão 2002 os 10% de melhores alunos tiraram notas superiores a 46,8 e os 10% de piores alunos tiraram notas inferiores a 15,4. Considerando os quatro exames e todas as

provas, em apenas uma das provas (prova discursiva de 1999) o P10 ficou acima de 50 (53,3). Estes dados ilustram o fraco desempenho da maioria dos alunos no Exame; indicam que mais de 90% dos alunos, em todos os exames, tiraram nota inferior a 50 e, ainda, cerca de 60% dos alunos tiraram nota inferior a 30. Os dados são apresentados na Tabela 1, com estatísticas dos Exames de 1999 a 2002. 2.2. A maioria dos Graduandos são da Região Sudeste e de IES Privadas Conforme dados da Tabela 2, entre os graduandos presentes ao Exame, 49,2% (4.005 alunos) são da Região Sudeste, 18,7% (1.523 alunos) da Região Sul e 16,8% da Região Nordeste. Nes-

tas regiões se concentra, também, a maioria dos cursos de Economia, sendo 84 (44,2%) na Região Sudeste, 45 (23,7%) na Região Sul e 33 (17,4%) na Região Nordeste. Entre 1999 e 2002, houve redução de 5 cursos na Região Sudeste e aumento de 3 cursos na Região Sul e 5 na Região Nordeste. Os dados por categoria administrativa mostram que, entre os graduandos presentes ao ENC/ 2002 de Economia, 61,5% (em 1999, 56,2%) eram das instituições privadas e 26,7% (em 1999, 23,19%), de instituições federais. Em relação aos cursos, as IES privadas participam com 65,8% (125 cursos), revelando um crescimento de 10 cursos em relação a 1999 (115 cursos e 61,50%), enquanto as Federais mantive-

Tabela 1: ENC de Economia: Estatísticas Básicas de Desempenho dos Alunos 1999 a 2002 Estatística

Prova de múltipla escolha 1999

Nº de Alunos

Prova discursiva

Prova geral

2000

2001

2002

1999

2000

2001

2002

1999

2000

2001 2002

9.106 8.224

7.837

8.160

9.106 8.224

7.837

8.160

9.106 8.224 7.837 8.160

Média

38,1

31,0

32,0

33,4

13,9

18,9

17,0

24,1

28,4

26,2

26,0

29,7

Desvio-padrão

12,1

11,2

10,5

11,7

14,2

18,5

16,1

18,3

11,8

12,7

11,4

12,7

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

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P10

23,3

18,3

20,0

20,0

0,0

0,0

0,0

0,0

16,0

13,0

14,2

15,4

P27

30,0

23,3

26,0

26,0

3,8

2,5

3,8

10,0

20,0

17,0

18,2

20,6

Mediana

36,7

28,3

30,0

32,0

10,0

15,0

13,8

22,5

26,0

23,0

23,5

27,6

P74

45,0

36,7

38,0

40,0

18,8

28,8

25,0

36,3

33,5

32,0

31,2

36,5

P90

53,3

46,7

46,0

48,0

32,5

46,3

38,8

48,8

44,0

44,0

41,0

46,8

Nota Máxima

91,7

86,7

80,0

94,0

92,5

96,3

96,3

97,5

92,0

84,5

86,5

88,3

Nota Mínima

Fonte: INEP/MEC, ENC 1999, 2000, 2001 e 2002

Revista de conjuntura !

out/dez de 2002


Tabela 2: Cursos e Graduandos em Economia presentes ao ENC/2002, por região e categoria administrativa Região\ Dep.

Federal

Estadual

Municipal

Alunos Cursos Alunos Cursos

Privada

Alunos Cursos Alunos

Total

Cursos

Alunos Cursos

Norte

211

5

34

1

0

0

162

2

407

8

Nordeste

464

12

261

6

0

0

644

15

1.369

33

Sudeste

760

9

392

7

151

5

2.702

63

4.005

84

Sul

321

5

350

9

48

2

804

29

1.523

45

Centro-Oeste

118

3

27

1

0

0

698

16

843

20

2.178

34

1.064

24

199

7

5.010

125

8.147

190

Brasil

Fonte: DAES/INEP/MEC ENC/2002.

ram o mesmo número de cursos (34). Cabe registrar que houve redução de 8 cursos de instituições municipais. É interessante observar que a maioria dos cursos de Economia do Norte e Nordeste (58,5%) é de instituições públicas, enquanto que, nas demais regiões, predominam as instituições privadas, sendo que na Região Sudeste 75% dos cursos de Economia são de IES privadas. 3. Desempenho das Instituições e os Conceitos dos Cursos 3.1. Classificação dos Cursos A média geral dos cursos, para efeito de atribuição dos conceitos2 , foi 28,5 e o desvio-padrão, 7,2. Considerando esses dados, definiram-se os intervalos para distribuição dos conceitos e classificação dos cursos. A Tabela 3 apresenta o resultado para o Exame 2002.

Em relação a 2000, observase uma redução do número de cursos com conceito “B”, de 35 para 21, e um aumento dos cursos com conceito “D”, de 34 para 41 e com conceito “E”, de 19 para 26 cursos. A distribuição das notas mostra que os 22 cursos com conceito “A” obtiveram nota média acima de 35,7. A melhor nota dos cursos de Economia foi 56,8, seis pontos acima da nota de 2001 (50,8). Os cursos com conceito “B” (21) tiveram nota média entre 32,1 e 35,7. As piores escolas, com conceitos “D” e “E”, tiveram nota média inferior a 24,9. Nesta situação estão 67 cursos de Economia do País, que correm o risco de seus cursos de Economia perderem o reconhecimento pelo MEC. É relevante o crescimento dos cursos com conceito “E”, que passou de 16, em 2001, para 26, em 2002. A pior nota de curso foi 15,4.

3.2. Cursos por Região e Categoria Administrativa Os dados das instituições por categoria administrativa mostram uma queda de desempenho das Universidades Federais (34), com apenas 17 (50%) obtendo conceitos A ou B, contra 22 (64,7%) em 2001. Cresceu, ainda, de 2 para 8 o número de Federais com conceitos D e E. As instituições estaduais mantiveram um bom desempenho,. capitaneadas pelas USPs de São Paulo, Ribeirão Preto e Tabela 3: Número de Cursos por Conceito e Notas do Provão 2002 Conceito

Faixas de Notas

A

acima de 35,7

22

B

35,7 e 32,1

21

C

32,1 e 24,9

75

D

24,9 e 21,3

41

E

abaixo de 21,3

26

Fonte: DAES/INEP/MEC ENC 2002

2 Até 2000 os conceitos eram atribuídos por faixas de percentis: A = acima de 88; B = acima de 70 até 88; C = acima de 30 até 70; D = acima de 12 até 30; E = até 12, inclusive A partir de 2001 foi estabelecido novo critério para atribuição dos conceitos, tendo como parâmetro intervalos em desvios-padrão em torno da média: A = acima de 1 d.p (inclusive) da média geral; B = entre 0,5 (inclusive) e 1 d.p. acima da média geral; C = entre 0,5 d.p abaixo e 0,5 d.p. acima da média geral; D = entre 0,5 (inclusive) e 1 d.p. abaixo da média geral; e E = abaixo de 1 d.p. (inclusive) da média geral.

Revista de conjuntura !

out/dez de 2002

Nº de Cursos


Piracicaba, UNICAMP e UERJ; somaram 5 conceitos A, além de 3 conceitos B. As instituições municipais, conforme mostram os dados da Tabela 4, tiveram fraco desempenho, sendo que nenhuma obteve conceito A ou B. A análise do desempenho das instituições por região revela que os melhores cursos de Economia se concentram no Sudeste, 14 dos 22 cursos com conceito A. A Região Sul teve 5, dois estão no Nordeste, e no Centro-Oeste, apenas a UnB. Quando consideramos as notas médias, por região, categoria administrativa e natureza da instituição, confirmam-se as expectativas de melhor desempenho das universidades federais e da região Sudeste. A média encontrada nas instituições federais foi 35,0, nas estaduais, 32,5, nas municipais, 28,2, e nas privadas, 27,2. As

notas individuais mais altas, pela ordem, foram: instituições federais (88,3), privadas (83,6), estaduais (79,8), enquanto nas IES municipais a nota individual mais elevada foi apenas 54,6. A Região Sudeste teve a melhor média (32,4) e os desempenhos mais altos, seguida das Regiões Sul (28,3), Centro-Oeste (27,1), Nordeste (26,8) e Norte (23,0). A análise dos resultados por organização acadêmica da instituição mostra que a nota média das universidades se destaca: foi 31,5. As demais instituições têm notas mais baixas: centros universitários (26,8), faculdades integradas (24,8) e faculdades, escolas e institutos superiores (26,6). 3.3. Os Cursos Conceito “A” Os dados dos 22 cursos com conceito “A” são apresentados

Tabela 4: Número de cursos, por conceito obtido, por categoria administrativa e por região. Conceitos DA e Região

A

B

C

D

E

DEP. ADMINISTRATIVA Federal

10

7

9

7

1

Estadual

5

3

7

4

5

Municipal

0

0

5

1

1

Privada

7

11

54

29

19

Norte

0

0

2

4

2

Nordeste

2

3

11

11

6

Sudeste

14

12

34

10

9

Sul

5

5

17

11

7

Centro-Oeste

1

1

11

5

2

22

21

75

41

26

REGIÕES

BRASIL Fonte: DAES/INEP/MEC ENC/ 2002. * Cinco cursos ficaram sem conceito (SC)

Revista de conjuntura !

na Tabela 5. Fez-se uma simulação da ordem de classificação dos cursos, utilizando-se como critério a distribuição das médias dos alunos por faixa de desempenho. O grande destaque no ENC 2002 foi a USP/Piracicaba, que teve 100% dos seus alunos acima do P75. Foi o primeiro curso que obteve esse desempenho. A PUC/RJ, que obteve a primeira colocação no ENC/ 2001, se colocou em segundo lugar, garantindo assim a primeira posição – melhor curso de Economia do País -, quando consideramos os 4 anos de Provão. A UNICAMP, que teve o melhor desempenho nos ENC de 1999 e 2000, pelo critério de classificação do P75, se manteve em posição de menor destaque, como ocorreu em 2001. A UnB, que por dois anos (2000 e 2001), ficou em segundo lugar, este ano teve uma queda acentuada, com 17 % dos seus alunos apresentando fraco desempenho. Entre os cursos conceito “A”, 12 são de Universidades Federais, 5 Estaduais e 5 Privadas. Merece destaque o desempenho dos três cursos de Economia da USP, de São Paulo, Ribeirão Preto e Piracicaba , classificados entre os 10 melhores. Entre as escolas privadas, além da PUC/ RJ, os outros destaques foram os cursos do IBMEC de São Paulo e Rio de Janeiro. Pela ordem, 8 cursos tiveram mais de 80% dos seus alunos com notas acima do P75 da distribuição de notas individuais: USP/Piracicaba, PUC/RJ, IBMEC/São Paulo, UFMG, IBMEC/Rio de Janeiro, USP/São Paulo, UFRJ e UFRGS.

out/dez de 2002


Evolução da média (%)

Conceito ENC

Dependência Administrativa

Nome da instituição

N º de graduandos presentes

Tabela 5: ENC Economia 2002 - Classificação dos Cursos com Conceito A % de alunos nos grupos delimitados pelos P25, P50 e P75 da distribuição de notas dos graduandos - Brasil P25 P50 P75 è è è

USP – Piracicaba (SP)

Estadual

15

A

è -7,0

0,0

0,0

0,0

100,0

PUC/RJ - Rio de Janeiro (RJ)

Privada

58

A

è -0,1

0,0

0,0

5,2

94,8

IBMEC – São Paulo (SP)

Privada

13

A

0,0

0,0

7,7

92,3

UFMG - Belo Horizonte (MG)

Federal

89

A

è 0,6

0,0

3,4

10,1

86,5

IBMEC - Rio de Janeiro (RJ)

Privada

51

A

è 9,4

0,0

2,0

13,7

84,3

USP - São Paulo (SP)

Estadual

137

A

è -7,2

3,6

3,6

10,2

82,5

UFRJ - Rio de Janeiro (RJ)

Federal

135

A

è -2,1

8,1

1,5

8,1

82,2

UFRGS - Porto Alegre (RS

Federal

54

A

ì 19,3

5,6

5,6

7,4

81,5

USP – Ribeirão Preto (SP)

Estadual

27

A

è 1,4

3,7

14,8

3,7

77,8

UNICAMP – Campinas (SP)

Estadual

61

A

î -13,1

19,7

1,6

3,3

75,4

UNISINOS - São Leopoldo (RS)

Privada

7

A

è -4,5

0,0

28,6

0,0

71,4

UFV – Viçosa (MG)

Federal

35

A

è 2,1

2,9

11,4

14,3

71,4

UFJF - Juiz de Fora (MG)

Federal

31

A

è 6,9

3,2

6,5

19,4

71,0

Centro Universitário La Salle-Canoas(RS)

Privada

10

A

ì 11,7

10,0

20,0

0,0

70,0

UnB – Brasília (DF)

Federal

47

A

î -13,3

8,5

8,5

14,9

68,1

UERJ - Rio de Janeiro (RJ)

Estadual

81

A

è 3,8

4,9

11,1

19,8

64,2

UFBA – Salvador (BA)

Federal

52

A

è -4,3

7,7

9,6

28,8

53,8

UFU – Uberlândia (MG)

Federal

66

A

è 9,0

0,0

15,2

31,8

53,0

Faculdade Boa Viagem – Recife (PE)

Privada

4

A

0,0

25,0

25,0

50,0

UNIVATES – Lajeado (RS)

Privada

11

A

é 30,4

0,0

27,3

27,3

45,5

UFF – Niterói (RJ)

Federal

208

A

è -4,0

6,3

20,2

29,3

44,2

UFRG – Rio Grande (RS)

Federal

21

A

è 5,4

9,5

4,8

42,9

42,9

Fonte: INEP/MEC - ENC de Economia 2002

Cabe o destaque para dois cursos estreantes no Provão, com conceito A: o IBMEC/São Paulo e a Faculdade Boa Viagem, de Recife/PE, este último, com apenas 4 alunos participando do Exame. Devemos aguardar o próximo ano para ver se mantém o excelente desempenho.

3.4. Os Cursos de Economia de Brasília Os cursos de Economia de Brasília mantiveram a tendência de queda de desempenho no Provão 2002, este ano puxados pela evolução negativa da nota média da UnB (-13,3), UNEB (5,6) e UCB (-5,0). No caso da Revista de conjuntura !!

UnB e Católica, pelo segundo ano consecutivo tiveram queda acentuada nas suas notas. Apesar da queda de desempenho, a UnB foi destaque como a única Universidade do CentroOeste com conceito A e um dos 13 cursos do País com quatro “A” em Economia.

out/dez de 2002


Observa-se que, entre o primeiro

Provão, em 1999, e o Exame de 2002, todos os cursos de Economia de Brasília apresentaram queda de desempenho . A Católica manteve o conceito “C”; entretanto, aproximou-se do conceito “D”, considerando a distribuição das médias dos alunos por faixa de desempenho. A AEUDF se manteve com conceito “C”, mas, com pequena melhoria na média, aproximou-se novamente do conceito “B”, que já havia obtido em 1999 e 2000. O CEUB, apesar de não estar realizando vestibular em Economia, melhorou pelo segundo ano consecutivo o seu desempenho; manteve o conceito “C”, mas está mais próximo do “B”. A CESUBRA teve uma boa estréia no Provão, apesar do conceito “C”, pois colocou 25% dos seus alunos entre os melhores do País. A UPIS teve uma evolução positiva da nota de 2,3%, recuperando-se, parcialmente, da queda de 7,9% na sua nota no ENC 2001. Permanece com conceito “C”, ainda próxima do conceito “D”. A UNEB repetiu o conceito “D” dos ENCs 2000 e 2001, e corre o risco de perda do reconhecimento do curso. Ressalta-se o elevado número de prováveis formandos da UNEB: enquanto a UnB teve 47 prováveis formandos, a UNEB teve 128, em 2002. Se somarmos os três últimos anos (triplo “D”), a UNEB teve 303 prováveis formandos que participaram do Provão.

Observa-se que, entre o primeiro Provão, em 1999, e o Exame de 2002, todos os cursos de Economia de Brasília apresentaram queda de desempenho. Esta queda é ainda mais significativa se considerarmos que a média nacional foi maior este ano. Um dado que preocupa todas as escolas do DF é a queda no índice de inscritos por vaga no vestibular de Economia, que está em apenas 2,6, sendo que a Católica teve menos de um candidato por vaga. A exceção é a UnB, que tem uma procura relativamente elevada: cresceu de 6,4 (em 1999) para 10,7 candidatos por vaga (em 2002). Entre as razões da queda de desempenho dos cursos de Economia de Brasília, no ENC 2002, podemos inferir algumas hipóteses. Primeiro, a falta de motivação dos alunos para responder à prova. Este, certamente, é o caso da UnB, em 2002, que teve 8 alunos entre os piores do País, o que é incompatível com o excelente desempenho dos demais alunos. Ressalta-se, ainda, que, nos primeiros exames, o curso de Economia da UnB se situou entre os três melhores do País. Segundo, alguns erros podem explicar a queda de desempenho dos cursos de Brasília, em especial a substituição de professores experientes,

Revista de conjuntura !"

com muitos anos de sala de aula, mas “horistas”, por jovens professores com maior dedicação ao Curso. Houve, ainda, o caso da Católica, onde o Diretor do Curso de Economia substituiu vários professores, altamente titulados, porque “não queria nenhum petista no Departamento”. A Católica fez ainda alterações equivocadas no Projeto Pedagógico do Curso, como, por exemplo, a eliminação da disciplina Economia Brasileira II, contrariando a determinação legal, prevista no currículo mínimo do curso. O resultado se refletiu nestes dois últimos anos, com o desempenho caindo do conceito “B” para “C” e, neste último exame, aproximando-se do conceito “D”. Terceiro, a falta de definição clara da vocação da maioria dos cursos. Em alguns casos, ainda não há a definição do projeto pedagógico do curso e, em outros, as alterações foram equivocadas, os projetos não são consistentes com a realidade do mercado de trabalho local e com o perfil dos professores e o interesse dos alunos. A discussão sobre a revisão dos projetos pedagógicos precisa ser retomada, com urgência, pelos cursos, considerando que em 2003 serão realizadas as “visitas” para verificação das condições de ensino e que as novas diretrizes curriculares para o curso já estão em fase final de aprovação pela Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, com a revisão de alguns pontos contestados pelas entidades representativas da categoria dos Economistas - do Parecer CES/CNE Nº 0146/2002, de

out/dez de 2002


A

-

40

100.0

0.0

2.5

15.0

82.5

6.4

80

2000

A

4.1

58

100.0

1.7

0.0

5.2

93.1

6.2

80

2001

A

- 4,0

57

100,0

0,0

1,8

5,3

93,0

7,8

80

2002

A

- 13,3

47

97,9

8,5

8,5

14,9

68,1

10,7

59

1999

B

-

62

100.0

6.5

22.6

37.1

33.9

2.4

195

2000

B

- 6.2

56

98.2

19.6

28.8

23.2

30.4

1.7

128

2001

C

0,2

42

100,0

16,7

26,2

31,0

26,2

1,9

189

2002

C

1,6

64

100,0

20,3

18,8

35,9

25,0

1,6

171

1999

C

-

79

98.7

21.5

22.8

39.2

16.5

1.0

177

2000

B

7.4

38

100.0

31.6

13.2

21.1

34.2

1.6

179

2001

C

- 8,3

81

97,5

18,5

32,1

29,6

19,8

1,7

158

2002

C

- 5,0

61

100,0

24,6

36,1

21,3

18,0

0,9

137

1999

C

-

72

100.0

20.8

26.4

37.5

15.3

2.6

62

2000

C

- 2.7

40

100.0

17.5

37.5

32.5

12.5

1.7

79

2001

C

2,5

77

100,0

24,7

27,3

24,7

23,4

2,0

87

2002

C

1,0

85

97,6

17,6

31,8

21,2

29,4

1,3

103

1999

C

-

27

100.0

29.6

37.0

33.3

0.0

2.3

80

2000

C

7.7

39

97.4

15.4

30.8

38.5

15.4

3.4

80

2001

C

- 7,9

61

100,0

29,5

34,4

26,2

9,8

3,1

86

2002

C

2,3

59

100,0

23,7

33,9

28,8

13,6

2,8

90

1999

C

-

54

100.0

27.8

42.6

20.4

9.3

4.1

100

2000

D

- 10.4

81

100.0

38.3

37.0

21.0

3.7

2.7

125

2001

D

4,2

94

100,0

35,1

28,7

26,6

9,6

2,7

125

2002

D

- 5,6

128

100,0

52,3

20,3

14,8

12,5

2,8

131

Cesubra

2002

C

-

12

100,0

16,7

33,3

25,0

25,0

-

-

DF

1999

-

-

334

99.7

18

25

32

25

3,1

694

2000

-

0.0

312

99.4

22

25

22

31

2,9

671

2001

-

- 2,2

412

99,5

22,3

26,0

24,3

27,4

3,2

725

2002

-

- 3,0

456

99,3

28,5

25,2

21,9

24,3

2,7

691

UnB

AEUDF

UCB

CEUB

UPIS

UNEB

ANO

% de Respondentes

1999

IES

Conceito ENC

Número de ingresssos

% de alunos nos grupos delimitados pelos P25, P50 e P75 da distribuição de notas dos graduandos – Brasil

Inscrito/ Vaga Vestibular

N º de graduandos* presentes

Evolução Média da Nota (%)

Tabela 6: Desempenho dos Cursos de Economia do DF no Provão 1999 a 2002

P25 è

P50

P75 ç

Fonte: DAES/INEP/MEC. * Consideram-se apenas os graduandos presentes e os graduados que prestam o Exame pela primeira vez.

Revista de conjuntura !#

out/dez de 2002


As novas diretrizes definem os

conteúdos curriculares que asseguram o perfil comum dos cursos, que caracteriza o economista nacional . 03/04/2002, que estabeleceu as Novas Diretrizes. Hoje as instituições têm maior liberdade para definição dos currículos dos cursos. As novas diretrizes definem os conteúdos curriculares que asseguram o perfil comum dos cursos, que caracteriza o “economista nacional” – formação geral, formação teórico-quantitativa e formação histórica. Mas reservam 50% da carga horária para a diferenciação do curso e o estabelecimento de um perfil específico – ênfase do curso, de livre escolha da instituição. A novas diretrizes valorizam, também, as atividades extra-classe - iniciação científica, monitoria, estágios, participação em atividades de extensão etc. Na visão do CNE, certamente, algumas habilidades e competências, necessárias para o perfil profissiográfico dos economistas poderão ser desenvolvidas fora da sala de aula. Esta possibilidade ainda não foi incorporada aos projetos pedagógicos da maioria dos cursos de Brasília. 4. Perfis dos Alunos e o Ensino de Economia As informações socioeconômicas dos graduandos, levantadas

pelo questionário-pesquisa aplicado aos alunos inscritos no Provão, permitem estabelecer um perfil dos alunos formandos em Economia. A seguir são apresentados alguns aspectos desse perfil e, também, do ensino de Economia no País. Quanto ao perfil dos alunos, o Provão revelou que a maioria é solteira (67,8%) e de brancos (77,3%). São jovens: a faixa etária predominante, em todas as regiões, é até 24 anos (43,3%), seguida daqueles que tinham entre 25 e 29 anos (30,5%), entre 30 e 35 anos ( 13,5%), e acima de 35 anos (12,7). A utilização da Informática teve uma evolução positiva em relação aos dados levantados no ENC 1999. Em 2002, 99,3% dos alunos utilizam microcomputador, sendo que 76,6% diariamente; 98,9% acessam a Internet, sendo que acessam com maior freqüência no trabalho (38,2%), em casa (37,7%) e na instituição de ensino (19,3%). Nas aulas dos cursos de Economia apenas 11,3% utilizaram o laboratório de Informática com bastante freqüência; 21,3% informaram que não foram ministradas aulas com auxílio do laboratório de Informática; 27% fizeram uso do mesmo com pou-

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ca freqüência; e 33% dos estudantes utilizaram o laboratório de Informática raramente. Revela-se, assim, que um grande número de cursos não incorporou esta ferramenta básica para desenvolvimento dos conteúdos das disciplinas quantitativas, como Econometria, Matemática Financeira etc. A renda familiar é baixa: 39% dos alunos tinham renda familiar entre R$ 601,00 e R$ 2.000,00, e 29,4%, entre R$ 2.001,00 e R$ 4.000,00, ou seja, 68% dos alunos tinham renda familiar nestas duas faixas (R$ 601,00 a R$ 4.000,00 ). Na faixa de renda de R$ 4.001,00 a R$ 10.000,00, 18,8%, e acima de R$ 10.000,00, 4,9%. Observa-se uma queda dessa faixa em relação ao ano de 2001, quando os que ultrapassaram a faixa mais alta de renda corresponderam a 5,4%. Observa-se, também, que, nas faixas de renda mais altas, são maiores os índices das Regiões Sudeste e Centro-Oeste, e das instituições privadas. Durante a maior parte do curso os estudantes desempenhavam atividade remunerada, sendo que aproximadamente metade trabalhou em tempo integral (40 horas semanais ou mais) e 15,8% trabalhou entre 20 e 40 horas semanais, enquanto 21,4% não exerceram atividade remunerada. Destacam-se os graduandos da Região Sul, onde 66,1% trabalharam 40 horas ou mais, enquanto que na Região Nordeste apenas 39,9% trabalharam em tempo integral. Manteve-se a participação dos alunos que estudaram todo o ensino médio somente em escola pública (43,6%), e houve

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queda dos que estudaram somente em escola privada, para 38,2%. (em 2001 a participação foi de 40,4%). A maioria dos graduandos lia jornais diariamente (44,6%) ou lia pelo menos duas vezes por semana (21,8%). Quanto ao conhecimento de línguas, 24,7 responderam que liam, falavam e escreviam em língua inglesa e 16,5% apenas liam, enquanto 35,5% responderam que o conhecimento de língua inglesa era praticamente nulo. A grande maioria dos alunos (96,7%), após a conclusão do curso de Economia, pretende continuar estudando, sendo que 36,7% dos formandos pretendem cursar Mestrado e/ou Doutorado na área e 11,5%, em outra área, 34,0%, especialização, e 13,5% pretendem fazer outro curso de graduação. Quanto às características dos cursos de Economia, observa-se que não houve grande alteração em relação aos anos anteriores: a maioria dos alunos respondeu que o currículo é bem elaborado, que os professores apresentam o plano de ensino e que utilizam freqüentemente a biblioteca. Mas predominam as aulas tradicionais, e não desenvolvem atividades acadêmicas além das obrigatórias. Em relação à biblioteca, 78,1% dos alunos responderam que utilizaram a biblioteca de sua instituição de ensino freqüentemente ou com razoável freqüência, e cerca de 20% dos estudantes utilizaram a biblioteca raramente, sendo os valores mais significativos observados na Região Centro-Oeste (23,9%), nos centros universitários (24,8%) e

nas instituições particulares (21,3%). No que se refere à atualização do acervo, 40,1% avaliaram como medianamente atualizado, enquanto 26,3% o avaliaram como atualizado. A maioria dos alunos (59,1%) não se dedicou a nenhuma outra atividade acadêmica durante o curso, além das atividades obrigatórias. Apenas 19% dos concluintes de Economia dedicaram-se a atividades em projetos de pesquisa conduzidos por professores da própria instituição; 8,8% participaram de atividades de extensão promovidas pela própria instituição; e 8,3% tiveram atuação em atividades de iniciação científica ou tecnológica. Não participaram de eventos 14,2% dos concluintes do curso de Economia, e 30,8% declararam não ter participado de atividades extracurriculares oferecidas pela sua instituição, tendo esse percentuais variado de 29,7% (Região Sudeste) a 39% (Região Centro-Oeste). Quanto à Metodologia de Ensino, os graduandos responderam que 73,7% dos docentes apresentaram e discutiram o plano de ensino com os alunos, 37,9% afirmaram que predominaram as aulas meramente expositivas, e

48,9% responderam que a maioria dos professores utilizou predominantemente aulas expositivas, com participação dos alunos. A utilização de trabalhos de grupo, desenvolvidos em sala de aula, foi indicada como atividade predominante por apenas 8,2% dos estudantes. Em relação aos Recursos Didáticos, os graduandos responderam que o material mais utilizado durante o curso, por indicação dos professores, foram, para 39,2% dos graduandos, as cópias de trechos ou capítulos de livros, enquanto que, para 38,9%, foram os livros-texto e/ou manuais. Um dado surpreendente se refere à utilização predominante, em 87,9% dos casos, da prova escrita discursiva, como instrumento de avaliação, pelos professores dos cursos de Economia. Este dado é ainda mais elevado para a Região Sudeste (91,9%) e nas instituições federais (93,7%). Em relação à organização dos cursos, para a elaboração da monografia, é interessante observar que, pela respostas dos formandos, a quase totalidade dos cursos de Economia dispunha de normas de elaboração e apresentação de Monografias (96,2%) e a maioria dos cursos

Apenas 19% dos concluintes de

Economia dedicaram-se a atividades em projetos de pesquisa conduzidos por professores da própria instituição . Revista de conjuntura !%

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(76,1%) dispunha de estrutura de apoio de Informática para o desenvolvimento de monografias, constituída de salas de estudo ou laboratórios com computadores ligados à Internet. Para finalizar este tópico, que a maioria dos formandos (63,5%) avaliava que o curso deveria ter exigido muito ou um pouco mais deles, ao passo que 30,4% entenderam que as exigências feitas foram na medida certa, e somente 5,5% acharam que as exigências foram excessivas, contrariando a idéia, consagrada nos nossos debates, de que o curso de Economia é difícil. 5. Considerações Finais A Política de Avaliação dos Cursos Superiores, implementada pelo MEC, vem cumprindo eficientemente o seu papel de dar transparência para a sociedade sobre a qualidade do ensino de graduação, além de fornecer informações relevantes para as coordenações de cursos implementarem ações que possibilitem à melhoria do ensino. Essa política assume especial importância em razão da expansão da oferta de cursos e vagas no Ensino Superior. Entre 1990 e 2001, o número de cursos de graduação cresceu 158%, passando de 4.712 para 12.155 cursos, sendo que 63,8 % (7.754) dos cursos são mantidos por instituições privadas. A matrícula nesse período cresceu 93,7%, passando de 1.565.056 para 3.030.754, sendo 60% (2.091.529) em IES privadas. Estes dados são mais significati-

vos ainda se considerarmos apenas os novos alunos, que ingressaram no ensino superior em 2001: neste caso 77,2% são de escolas privadas (931.457 do total de 1.206.273). Em síntese, essa expansão ocorre com maior participação de IES privadas e em cursos noturnos, além de haver uma maior interiorização do ensino superior. Esta tendência de “privatização” do ensino superior deverá acentuar-se nos próximos anos, dada a restrição orçamentária pública e o grande número de instituições privadas que surgiu nos últimos anos. Observa-se que, segundo dados do Censo do Ensino Superior de 2001, das 1.391 IES, 86,8% são privadas (1.208). Por outro lado, a importância da avaliação, e em especial do Provão, se reforça, ainda mais em razão da proposta das novas diretrizes curriculares, de flexibilização dos currículos de graduação, possibilitando às Instituições de Ensino Superior implementarem projetos pedagógicos mais inovadores, e permitindo a diversidade nos programas oferecidos pelas diferentes instituições, de forma a melhor atender às necessidades específicas de suas clientelas e às peculiaridades das regiões nas quais se inserem.

Requer, também, maior responsabilidade das IES, docentes, discentes e da sociedade, no objetivo de um ensino de graduação de qualidade e capaz de atender o diferencial na formação acadêmica e profissional, de acordo com as necessidades de desenvolvimento das regiões e do País. O ENC e a avaliação das condições de ensino, que compõem o Sistema de Avaliação da Educação Superior, são, hoje, instrumento de planejamento dos cursos. O banco de dados e informações vêm sendo utilizados, efetivamente, pelos coordenadores e demais responsáveis pelos cursos de graduação, além de já estarem consagrados junto à sociedade, como referência sobre a qualidade dos cursos. Para finalizar, cabe registrar que os dados mostram significativos investimentos, das diversas instituições, na melhoria das condições de ensino: instalações físicas, bibliotecas, materiais didáticos e sobretudo na qualificação do corpo docente. O processo, entretanto, está apenas iniciandose há a necessidade de grandes avanços, especialmente nos projetos pedagógicos e nas práticas de ensino, para a efetiva melhoria da qualidade do ensino.

* José Luiz Pagnussat Conselheiro do CORECON/DF. Professor da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) e da Universidade Católica de Brasília (UCB). Membro da Comissão de Avaliação do Curso de Economia do INEP/MEC.

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A R T I G O

Razões que levaram o Brasil a sofrer recente ataque especulativo com relação ao dólar Newton Marques *

O ataque especulativo cambial que o Brasil está sofrendo desde o início deste semestre teve início com a crise internacional que reduziu tanto os fluxos de capitais estrangeiros, como os movimentos de comércio, principalmente oriundos dos países ricos. Adicionada a isso, houve a moratória da Argentina, que abalou fortemente os níveis de confiança dos mercados financeiros internacionais para com os países emergentes. O Brasil passou a ser considerado pelos credores internacionais e investidores como elevado risco, principalmente pela frágil situação fiscal e externa, ou seja, tem havido crescente elevação da relação entre dívida líquida do setor público e o PIB, bem como entre o déficit em conta corrente do ba-

lanço de pagamentos e o PIB, os quais são considerados como indicadores de performance dos países endividados. Com isso, os credores passaram a fazer exigências draconianas às empresas endividadas em dólares, tais como renovação de empréstimos ou de títulos de 10 anos com base em cláusulas “put”(opção de venda) e “call”(opção de compra) após os 2 anos, podendo serem acionadas mensalmente. Assim, como o mercado está favorável aos credores, eles passam a exigir as cláusulas de opção de venda, e como os devedores não podem dispor desses recursos, têm que “aceitar” sobrepreço (“fees”) de 5% a 10% para que não seja acionado o “put”. Aquelas empresas que têm recursos convertem reais

em dólares e os enviam pela conta CC5 (autorização do BC para residentes enviarem recursos por meio dos bancos para não-residentes), para aproveitar os elevados descontos dos empréstimos e dos títulos de dívida de países emergentes (alguns com desconto de até 40%). Aqui é importante destacar que a atual diretoria do Banco Central do Brasil vem, desde 1999, desmontando todos os controles administrativos (vide Resoluções n°s 2.644, 2.770 e 2.883) sobre a livre movimentação de capitais estrangeiros no País (medidas no sentido de liberalização da conta de capitais, como sugestão do FMI e da banca internacional), o que vulnerabilizou ainda mais a relação de um país emergente com os capitais internacionais1 .

1 Outra vantagem que existe para os devedores é evitar o pagamento de impostos, caso tivessem que enviar pelo mercado cambial oficial.

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No primeiro semestre deste ano, a implantação do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB) foi também outro fator que ajudou a pressionar o mercado cambial, segundo alguns analistas financeiros, porque criou “empoçamentos de liquidez” (havia recursos financeiros, mas os grandes bancos não negociavam suas reservas com receio do risco de crédito), os quais se dirigiram para o mercado cambial. Aliadas a tudo isso, as pesquisas eleitorais passaram a apresentar resultados favoráveis aos candidatos oposicionistas à Presidência, principalmente, aqueles que no passado declaravam apoio à moratória interna e externa, estatização dos bancos e políticas populistas. Assim, tínhamos todos os ingredientes propícios ao aprofundamento da crise cambial que assola o Brasil. Restava, portanto, ao governo tomar medidas de política econômica que evitassem o descontrole das contas públicas e externas. Ao governo interessava vender títulos públicos pre-fixados a prazos longos nos leilões da Secretaria do Tesouro Nacional, mas os credores somente se interessavam em comprar títulos públicos pós-fixados de curtíssimo prazo, pois ainda não estavam confiantes em 2003,

caso o governo oposicionista fosse o vencedor nas eleições presidenciais. Por outro lado, o governo emitia títulos com correção cambial com vistas a fornecer “hedging” (proteção ou cobertura) ao setor privado, no sentido de evitar pressões indesejáveis sobre o mercado cambial. Entretanto, o FMI passou a sugerir que o governo brasileiro reduzisse essas emissões (pois deviam ser tratadas pelo setor privado na BM&F e Cetip), situação essa aliada à proibição da Lei de Responsabilidade Fiscal para que o Banco Central emitisse títulos próprios; o governo criou, para a venda, a LFT de longo prazo (que rende taxa Selic) “casada” com “swap” cambial. Isto quer dizer que havia uma troca de rendimentos entre o público e o Banco Central. Quando a taxa Selic superava a variação cambial, o público pagava ao BC; quando a variação cambial superava a taxa Selic (o que passou a acontecer desde o início deste semestre), o BC pagava ao público. Tivemos, então, algumas peculiaridades no mercado financeiro. Por um lado, essas LFTs de longo prazo tinham elevado deságio, que as tornava desvalorizadas nas negociações do mercado financeiro. Neste sentido, os bancos privados, principal-

Quando a taxa Selic superava a

variação cambial, o público pagava ao BC; quando a variação cambial superava a taxa Selic, o BC pagava ao público . Revista de conjuntura "

mente os estrangeiros, tinham recomendação de suas sedes ou mesmo das autoridades reguladoras dos países-sede para que não tivessem elevada exposição desses papéis. Em função disso, os bancos públicos (Banco do Brasil, Caixa, Banco do Nordeste e Banco da Amazônia) foram obrigados pelo governo a comprar esses títulos e os colocar em seus fundos de investimento. Aí passaram a criar um problema para os administradores desses fundos mútuos, bem como aqueles dos bancos nacionais que também compraram esses papéis, qual seja o de atualizar ou não os seus preços de mercado, fenômeno conhecido como “marcação a mercado”. Os normativos do Banco Central exigiam que assim o fosse, mas, com as elevações das taxas de juros do mercado futuro, o preço de mercado das LFTs desvalorizaria (descontadas pelo método do valor presente) as quotas dos fundos de investimento. Aí então os administradores desses fundos ainda tinham como alternativa a possibilidade de não “marcarem a mercado”, caso admitissem que ficariam definitivamente (ou até o vencimento) com essas LFTs, o que era uma hipótese muito difícil de se concretizar. Os outros bancos concorrentes passaram a pressionar o BC, que teve de rever a sua posição. O resultado foi aquele de que todos se lembram: forte queda do valor das quotas, gerando revolta e insatisfação dos quotistas! Nessa ocasião o BC passou a recomprar esses papéis e a lançar outros títulos de curto prazo, o que provocou uma elevada concentração dos vencimentos (cerca de 50% do total da

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dívida pública mobiliária interna vence até o final de 2003). A utilização do instrumento de política monetária, a taxa básica de juros, em qualquer país capitalista do mundo é importante para evitar o descontrole do equilíbrio interno (inflação) e auxiliar a equilibrar as contas externas2 . No Brasil, infelizmente, durante muito tempo o manejo da taxa de juros real tem sido utilizado com freqüência para equilibrar as contas externas, redundando em custos sociais superiores aos benefícios esperados, contrariando, portanto, os fundamentos da teoria econômica. Uma das explicações reside nos sucessivos equívocos da política macroeconômica, ou até mesmo opções de política adotadas nos últimos anos. Neste caso, não há consenso, mas sim fortes controvérsias entre os economistas. A questão relevante, a meu ver, é que o nosso desequilíbrio macroeconômico é fruto da elevada dependência de dólares para financiamento do déficit externo (conhecido como resultado da conta corrente do balanço de pagamentos). Assim, quanto maior o déficit externo nessa conta (gastos superiores às receitas em dólares nas contas de comércio e de serviços), maior a necessidade de capitais externos para financiá-lo, seja por meio de empréstimos, financiamentos ou investimentos internacionais. A política de estabilidade macroe-

A questão relevante, a meu ver, é que o

nosso desequilíbrio macroeconômico é fruto da elevada dependência de dólares para financiamento do déficit externo . conômica (crescimento econômico auto-sustentado) fica, portanto, refém das previsões e trajetórias dos resultados do balanço de pagamentos. Quando ingressam dólares (mais do que saem), o País fica em situação confortável; caso contrário, em crise. Desde o final do ano passado, tem havido uma retração dos fluxos de capitais internacionais e do próprio movimento comercial de mercadorias e serviços dos principais países do mundo (EUA, Japão e Eurolândia). Aliado a essa conjuntura internacional adversa, tem havido reconhecimento público por parte dos organismos multilaterais de crédito (FMI e Banco Mundial), bem como de importantes economistas americanos, como o Nobel de Economia, Joseph Stiglitz, e o próprio John Williamson (pai do neoliberalismo nos anos 80), de que as políticas econômicas adotadas pelos paises emergentes, com base na globalização, não têm tido o sucesso tão propalado, o que incentiva o crescimento de movimentos de insatisfação popular nos países emergentes3 . Outro fator importante para o

mercado financeiro internacional foi a moratória argentina. Criaram-se, portanto, péssimos cenários para os países endividados e que têm elevada dependência de dólares para financiar os seus crescimentos econômicos. Não obstante tudo isso, a política econômica brasileira vinha sendo conduzida como se esses problemas fossem passageiros. Muitos economistas anunciavam aos quatro ventos que os nossos fundamentos macroeconômicos vinha sendo preservados; logo, a comunidade financeira internacional continuaria a financiar os nossos desequilíbrios das contas públicas e das contas externas. A política monetária garantiria o sucesso do sistema de metas de inflação, e o superávit primário fiscal de 3,75% do PIB era suficiente para atrair os dólares. A administração das dívidas pública e externa, entretanto, não vem convencendo os seus credores nacionais e internacionais. Os principais dados estatísticos publicados pelo Banco Central do Brasil, desde o ano passado, vêm mostrando acelerada deterioração. A administração das dívidas

2 No caso de adoção do regime de taxa de câmbio flutuante, acredita-se que há equilíbrio auto-sustentável. Assim, somente no caso de regime de taxa de câmbio fixa ou de flutuação suja a política monetária assume também neste caso um papel principal. 3 No Brasil, por exemplo, com o crescimento das oposições nas pesquisas eleitorais, algumas autoridades do governo passaram a alardear aos investidores nacionais e internacionais que, caso elegessem o Presidente da Republica Federativa do Brasil, adotariam políticas populistas, declarariam a moratória, estatizariam o sistema financeiro, anulariam as privatizações, criariam a instabilidade econômicofinanceira e retornariam com a inflação, porque não estavam preparados como a candidatura do governo.

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pública e externa, contudo, não vem convencendo os seus credores nacionais e internacionais. Os principais dados estatísticos publicados pelo Banco Central do Brasil, desde o ano passado, vêm mostrando acelerada deterioração. Os últimos dados estatísticos mostram que, em junho de 2002, o estoque da dívida externa brasileira ascendia a US$ 216,4 bilhões, dos quais cerca de 47% são referentes ao setor privado. O perfil desse total da dívida externa mostra-se muito concentrado, com a existência de seus vencimentos em 60% no período compreendido entre junho a dezembro de 2002 até dezembro de 2005. Dessa forma, os credores internacionais passaram a desconfiar de que podiam não ser honrados os compromissos externos, principalmente pelas projeções dos resultados da balança comercial e de serviços, e pela própria trajetória da relação entre o déficit em conta corrente” e o PIB (4,5 % a 5,0 %), e, é claro, levando também em consideração a elevada probabilidade de a oposição ganhar as eleições e “cumprir” tudo o que foi dito por membros da equipe de governo4 . A dívida pública mobiliária atingiu R$ 623 bilhões, dos quais 56% variam pela taxa Selic, e 25% variam pela taxa de câmbio5 . Também há problema com relação ao seu perfil, ou seja, quase 50% dessa dívida vence até o final de 2003. E por que a elevação da taxa básica de juros (taxa Selic), de 18%

para 21%, não reverteu as expectativas pessimistas do mercado? A atual conjuntura econômica brasileira nos mostra que a inflação não é de demanda – mas sim de custos, provocada pela forte e persistente desvalorização do real – e, por outro, o ataque especulativo que está sofrendo o País resulta da política econômica implementada deliberadamente pelas autoridades governamentais, notadamente a atual diretoria colegiada do Banco Central do Brasil, no período pós-1999. A inflação de custos é provocada pela rápida e drástica desvalorização cambial nos últimos dois meses. Com isso, os preços administrados (tarifas de energia, telefone e preços de combustíveis e seus derivados) e as mercadorias (pão, massas e outros derivados de trigo, remédios, material de limpeza, eletroeletrônicos), e até mesmo os produtos de exportação (café, carne, soja, açúcar e manufaturados) que são vendidos no mercado interno sofrem diretamente a influência dessa desvalorização cambial, podendo repassar esses aumentos aos seus preços finais (conhecidos como “passthrough”) caso sejam setores oligopolistas ou monopolistas, tornado inócua (ou a custos elevados ) o aumento da taxa de juros. Com relação aos instrumentos a serem utilizados pelo governo

para minimizar os efeitos desse ataque especulativo, deveriam centrar-se em retornar aos controles administrativos da entrada e saída de recursos externos (“desfazer a liberalização da conta de capitais”), os quais foram eliminados pela atual diretoria do Banco Central do Brasil, sob o comando do Sr. Armínio Fraga, desde 1999. Seria preciso agir sobre a atuação dos bancos, tais como: supervisionar os negócios no mercado interbancário de dólar, confrontando os negócios realizados no mercado cambial; evitar situações críticas, como a atual, onde os bancos ficam com excessiva posição comprada; ressuscitar os depósitos em moeda estrangeira no BC; rever as saídas da CC5, exigindo qualificação, o que hoje não existe; controlar a relação entre o mercado interbancário de dólar e o próprio mercado cambial; checar os “players” que atuam com títulos públicos com correção cambial, derivativos em mercado de câmbio e envio de recursos pela CC5; alterar a metodologia da PTAX (informação oficial sobre a cotação das moedas estrangeiras no Brasil) diariamente, evitando assim que em crises (ou “stress”) os agentes do mercado deixem a autoridade no “corner”.Um exemplo poderia ser a adoção de médias móveis (trimestrais ou semestrais).

* Newton Marques é economista pela UnB, mestre e doutor em Economia pela UFPE e conselheiro do CORECON-DF.

4 Aqui é importante registrar que o Poder Executivo, dada a legislação vigente no País, não tem as facilidades que existiram para os governos anteriores, e até mesmo no atual governo do presidente FHC, para declarar moratórias e reverter privatizações, bem como instituir estatizações, como tem sido tão propalado pelos membros da situação. 5 Se forem consideradas as operações de swap cambial, as participações evoluem para 45% (taxa Selic) e 35% (variação cambial).

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