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ISSN 1677-0668 Revista Editada pelo CORECON/DF ANO VII - Nº 26 - ABR/JUN de 2006

ARTIGOS Poupança em conta corrente do Governo: uma nova proposição de política fiscal Alexandre Manoel da Silva Manoel Carlos de Castro Pires

PÁGINA: 09

Prejudicar o Brasil é “Super-Simples”

Para onde vai a América Latina: avanço ou retrocesso

Clair Maria Hickmann

PÁGINA: 13 Homenagem a Ignácio Rangel: lucros, juros e salários na economia brasileira Ceci Vieira Juruá

PÁGINA: 25

As receitas de prestação de serviços dos bancos

DIEESE

PÁGINA: 33 Auditoria como conhecimento econômico Fernando M. R. Bittencourt

PÁGINA: 35

Benício Schmidt, sociólogo e cientista político da Universidade de Brasília (UnB), em entrevista para a Revista de Conjuntura do CORECON/DF, faz uma análise da atual conjuntura político-econômica da América Latina. Veja entrevista

PÁGINAS: 5 a 8



Revista Editada pelo Corecon/DF - ANO VII - nº 26 - ABR/JUN DE 2006

EDITORIAL ..........................................................................................................................................4 ENTREVISTA BENÍCIO SCHMIDT Para onde vai a América Latina: avanço ou retrocesso .......................................................5

ARTIGOS ALEXANDRE MANOEL ANGELO DA SILVA MANOEL CARLOS DE CASTRO PIRES Poupança em conta corrente do Governo: uma nova proposição de política fiscal.....................9 CLAIR MARIA HICKMANN Prejudicar o Brasil é “Super-Simples” ..........................................................................................13 CECI VIEIRA JURUÁ Homenagem a Ignácio Rangel: lucros, juros e salários na economia brasileira ...............25 DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS – DIEESE As receitas de prestação de serviços dos bancos .................................................................33 FERNANDO M. R. BITTENCOURT Auditoria como conhecimento econômico ...........................................................................35

A assinatura da Revista de Conjuntura pode ser efetuada contactando o CORECON-DF. O valor da assinatura é de R$ 70,00 anuais, o que equivale a quatro edições da revista.

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EXPEDIENTE

EDITORIAL

Órgão Oficial do Corecon-DF Editor Responsável: Evilásio Salvador Conselho Editorial: Mônica Beraldo Fabrício da Silva, Evilásio da Silva Salvador, Humberto Vendelino Richter, Maurício Barata de Paula Pinto, Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo, Victor José Hohl, Júlio Miragaya e Aroudo Mota. Jornalista Responsável: Daniela Lima - Reg. DRT/DF: 4926 Redação: Daniela Lima Colaboradora: Rosane Pie Editoração Eletrônica: Ars Ventura Imagem & Comunicação www.arsventura.com.br Tiragem: 4.000 Periodicidade: Trimestral As matérias assinadas por colaboradores não refletem, necessariamente, a posição das entidades. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte. CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO – DF Presidente: Mônica Beraldo Fabrício da Silva Vice-Presidente: Evilásio da Silva Salvador Conselheiros Efetivos: Mônica Beraldo Fabrício da Silva, José Aroudo Mota, Victor José Hohl, Paulo Luiz Figueiredo de Oliveira, Maria Cristina de Araújo, Evilásio da Silva Salvador, José Luiz Pagnussat e Júlio Flávio Gameiro Miragaya. Conselheiros Suplentes: André Nunes, Homero Gustavo Reginaldo Lima, José Luiz Xavier, Jusçanio Umbelino de Souza, Gilson Duarte dos Santos, Mario Sérgio Fernandez Sallorenzo, Junia Rodrigues de Alencar e Ronalde Silva Lins. Equipe do Corecon: Ismar Marques Teixeira, Michele Cantuária Soares, Jamildo Cezário Gomes e Angeilton Francisco Lima Faleiro. End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 – Brasília –DF Tels: (61) 3225-9242 / 3223-1429 3964-8366 / 3964-8368 Fax: (61) 3964-8364 E-mail: corecondf@corecondf.org.br Site: www.corecondf.org.br Horário de Funcionamento: das 8:00 as 18:00 horas (sem intervalo)

A nova edição da Revista de Conjuntura do Corecon-DF traz na sua abertura uma temática relevante para o debate atual da situação política e econômica da América Latina, a entrevista com o sociólogo e cientista político da Universidade de Brasília (UnB) Beneficio Schmidt. O professor destacar o longo caminho que os países da América Latina têm que enfrentar para superar enormes carências de bens públicos e desigualdades sociais. Destaca-se a falta de plena integração das populações aos mercados domésticos. O nosso entrevistado também observa que o atual estágio do Mercosul é agonizante. Muito embora recém ampliado para a entrada da Venezuela, o futuro dependerá, em sua opinião, das eleições presidenciais do Brasil e da Argentina. Um dos temas que deverá permear o debate eleitoral brasileiro é a política fiscal, particularmente o equilíbrio orçamentário. Trazemos nesta edição o artigo dos economistas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Alexandre Silva e Manoel Pires, sugerindo de forma inovadora e viável a alteração na atual política fiscal brasileira. A tese dos autores é a de permuta da meta fiscal baseada em superávit primário por meta baseada na poupança em conta corrente do governo. Conforme explicado no artigo, a adoção do novo conceito implicaria a retirada dos investimentos públicos do cálculo do superávit primário, mostrando-se economicamente mais adequado. O artigo é uma sugestão relevante para o debate das contas públicas brasileiras e possibilidade de “folga” orçamentária para ampliação dos investimentos públicos e a retomada do crescimento econômico vigoroso. Continuando na temática fiscal, neste número trazemos o artigo da auditora-fiscal da Receita Federal Clair Hickmann, que apresenta uma visão crítica sobre o Projeto de Lei Complementar (PLP) 123/2004, conhecido como “Super-Simples”. A autora demonstra que, sob o pretexto de eliminar burocracias e regulamentar a unificação da legislação tributária das três esferas de governo para micro e pequenas empresas, o substitutivo do PLP 123/2004 pode causar sérios danos à arrecadação, ao trabalhador, ao aposentado, aos estados e municípios, ao consumidor, pois extrapola em muito a abragência da matéria proposta. Em artigo que homenageia Ignácio Rangel, a economista Ceci Juruá escreve sobre a atual distribuição de lucros, juros e salários na economia brasileira, mostrando a nova fase de (re)concentração da renda nacional em época de políticas neoliberais. Em defesa rigorosa do papel do Estado na economia e bastante cética em relação àqueles que acreditam que todos os problemas econômicos brasileiros se resumem a alta taxa de juros, a autora mostra a vertiginosa queda dos salários na renda nacional e a enorme taxa de exploração da formação de capital no Brasil. O documento técnico produzido pelo Dieese mostra um dos setores que mais se beneficiou da concentração de renda no país no período recente: o bancário. Pelo texto do Departamento fica clarificado que as receitas de prestação de serviço (tarifas) arrecadadas pelos bancos são as mais lucrativas na margem do sistema. O artigo mostra que se, de um lado, a cobrança de serviços contribui para aumentar o lucro dos bancos, de outro, reduz a renda líquida do cliente. Por fim, a encerra fecha com o profundo estudo do economista e consultor Fernando Bittencourt sobre a auditoria como conhecimento econômico. O artigo apresenta um rigoroso referencial teórico sobre a temática, desnudando a origem da auditoria e situando-a na esfera do debate econômico neoclássico, e a contextualização da auditoria como demanda. Observa o autor o papel do auditor como stakeholder na credibilidade das informações geradas em seu trabalho. Fernando observa que o conhecimento em profundidade da atividade de auditoria permite a fundamentação das posições dos economistas em atividade nesta área de atuação de áspero embate regulatório. Boa leitura a todos(as)!

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ENTREVISTA

Para onde vai a América Latina: avanço ou retrocesso Entrevista: Daniela Lima

Benício Schmidt, sociólogo e cientista político da Universidade de Brasília (UnB), faz uma análise da atual conjuntura político-econômica da América Latina. Ele diz que é difícil fazer previsões corretas, mas acredita que a América Latina está em longa fase de democratização de suas instituições.

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“Em outros casos, como Brasil, Uruguai, Argentina e Chile, cabe assinalar que os processos de integração nacional estão, grosso modo, resolvidos. Tratase, agora, de enfrentar carências de bens públicos e desigualdades insuportáveis”. Conjuntura – Quais os efeitos desse novo cenário da atual conjuntura política e econômica latino-americana que emerge no século XXI ? Benício Schmidt – Os efeitos da conjuntura não estão dados, estão por vir; estão por acontecer. Em um mundo de instabilidades já conhecidas e outras que são fabricadas todos os dias, é difícil fazer previsões corretas. O que sabemos é que a América Latina está em longa fase de democratização de suas instituições, com diferentes significados nacionais. Em alguns casos (Peru, Equador, Bolívia) trata-se de integrar politicamente a maioria indígena, formada por diferentes nações, com seus distintos projetos. Isso não é fácil de nenhum ponto de vista. Economicamente, a dificuldade está na falta de plena integração dessas populações aos mercados nacionais. Não distingo aqui os circuitos formais dos informais, mas sim menciono o mercado

global em si mesmo. As relações de troca não estão, nestes casos, completamente baseadas em categorias mercantis. Obviamente, isso dificulta o sistema de contabilidade geral, o sistema financeiro que pretende organizar os circuitos econômicos nacionais, dificulta também a governabilidade. O correlato jurídico dessa conjuntura é o conflito entre as instituições de Direito Civil e os Códigos de Direito Comunitário, geralmente de caráter tradicional e não-escritos formalmente, mas absolutamente enraizados na história desses povos. As reivindicações, desta forma, não podem ser facilmente “nacionalizáveis”, porque, em essência, não têm muitos traços comuns entre si, dentro das mesmas fronteiras de um mesmo país. Os conflitos são abertos. E, seguramente, tendem a aumentar, a ficar mais intensos. O quadro indica altíssima dificuldade para governar, pois antes de o fazer, os eleitos devem unificar,

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construir um Estado Nacional moderno. O relativo fracasso de presidentes como Alejandro Toledo, presidente do Peru, tem aí seu cerne. Quando o processo de construção de uma Nação se dá concomitantemente ao de construção de um Estado, a crise sistemática é altamente provável. E seus efeitos são duradouros. Assim, em países como os mencionados, a situação de instabilidade deve persistir, independente de eventuais êxitos econômicos, como poderão ser os causados pela crescente produção de petróleo ou de outras commodities com enorme demanda no mercado internacional. Em outros casos, como Brasil, Uruguai, Argentina e Chile, cabe assinalar que os processos de integração nacional estão, grosso modo, resolvidos. Trata-se, agora, de enfrentar carências de bens públicos e desigualdades insuportáveis. Isso estará sempre associado às capacidades de dinamismo econômico e boa gestão política, que são variáveis independentes, apesar da mitologia do automatismo entre polítca e economia. Aqui, a política é o que importa, como vemos no caso óbvio de Brasil e Argentina dos dias atuais. Países que enfrentam circunstâncias econômicas muito difíceis, mas que estão manejando bem politicamente. Conflitos pesados têm sido evitados, administrados; e isso não é pouco para Estados tão dilacerados por crises de confiança e por sociedades profundamente desiguais. Nesses casos, em nossa tosca tipologia de aproximação, as maiores e agudas crises surgirão


pelas circunstâncias do mercado internacional (financeiro e de commodities); por ondas de violência que abrigam, inclusive, interesses do narcotráfico; ou por reivindicações específicas ou corporativas de setores do serviço público. De todas as maneiras, a tendência geral é dada pela expansão de um curioso capitalismo desorganizado, sem pleno controle das elites estratégicas, com reforço de teses atrasadas de integração mundial pela produção de bens primários, mas com efeitos pertinentes sobre a construção de uma extensa sociedade de massas. Esse conceito não tem nada a ver com a eventual “boa qualidade da sociedade”, mas sim com as características de sua estrutura. A América Latina, nesses termos, compõe, hoje, uma emergente sociedade de massas, com muitos indicadores que podem ser ilustrados pelo grau de urbanização, a pressão pelo consumo de bens finais, pela procura de serviços educacionais, pelo uso cotidiano de tecnologia avançada, pelos cuidados com a saúde, e assim por diante. Nesse quadro, muito interessante, é a redefinição do mercado religioso, com novas características que são padronizadas internacionalmente e que propõem intensa mobilização de massas de fiéis, permanentemente.

qüência. No início da década de 1960, o panorama era semelhante. Daí, não esquecendo as mútuas dependências dos fenômenos sociais, o surgimento de poderosas e sangrentas ditaduras, começando pelo Brasil em 1964. Os centros capitalistas hegemônicos, ainda com muito interesse no papel subordinado da América Latina como produtora de produtos primários, aproveitaram-se ou constituíram elites políticas estratégicas nos Estados Unidos e tudo recomeçou. Havendo liberdade, garantias de respeito ao voto e eleições sistemáticas, não há razão para não acontecer o que hoje ocorre. As conseqüências são distintas, dependendo do país, mas a tendência é inevitável. Também é verdade que os interesses do grande capital e das grandes potências já não se traduz mais pela presença da United Fruit Company que, sob o controle da família Dulles, comandava o Departamento de Estado norte-americano e grande parte da região, por meio de

mecanismos de importação de produtos primários. A gravidade das desigualdades sociais, confrontadas com as possibilidades de uma sociedade de massas baseada no consumo e na mobilização social, favorece o surgimento de lideranças como estas, independentemente de suas posturas ideológicas consistentes. Conjuntura – Qual seria o futuro político-econômico e financeiro da América Latina? Na sua visão, haverá avanço ou retrocesso? Benício Schmidt – Garantida a democracia política, o futuro será marcado pela integração interna das diferentes “nações” em cada país, bem como pelo alargamento da participação da América Latina no mercado mundial, seja de mercadorias, seja simbólico, pela sua arte, pela música, pelos esportes, pelas atividades peculiares que supõem, inclusive, a produção de uma ciência e tecnologia mais pertinente às condições de vida da região.

Conjuntura – A que se deve o surgimento de novos governos de centro-esquerda, eleitos pelo povo latino-americano? Benício Schmidt – O alargamento das franquias democráticas, extensão e garantia do voto a todo cidadão, tem essa conse-

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Conjuntura – No caso da Bolívia, uma política antineoliberal, com perspectivas de nacionalização, pelo menos dos recursos estratégicos como petróleo, gás e terras privadas improdutivas, afetará ou não a economia do país? Benício Schmidt – As novas medidas de nacionalização são recorrentes no cenário boliviano. Desde os anos de 1950 e especialmente após a saída da família Patino de seu território, medidas semelhantes de bombásticas nacionalizações de petróleo, gás, bem como outras fontes de produtos minerais, têm sido tomadas. Como políticas complementares de industrialização e formação de recursos humanos aptos à sua exploração não têm sido implementadas, voltam os golpes de Estado, as crises intermináveis. O quadro parece muito semelhante. Só que agora, em novas alianças estratégicas, que podem ser inclusive com Brasil e Argentina, a Bolívia, que já teve forte dependência da Venezuela de Chávez, pode encontrar uma alternativa interessante. Mas, se

tentar repetir o exemplo de Cuba, fracassará inelutavelmente. Conjuntura – A atual crise entre Brasil, Bolívia e Venezuela poderá apontar um caminho para a consolidação do Mercosul ou dificultá-la mais? Benício Schmidt – O Mercosul, no seu atual modelo, agoniza, embora, esteja em vésperas de ser ampliado com a efetiva entrada da Venezuela. O futuro dependerá muito das eleições no Brasil e na Argentina. Não tem havido laços mais fortes, exceção das relações entre Brasil e Argentina, hoje países totalmente integrados pelas relações econômicas e científicas. Há uma cooperação científica entre Brasil e Argentina, que foi fortalecida desde o governo de Fernando Henrique Cardoso e foi aprofundada no atual, de Lula. Essas dimensões não são aparentes, mas são decisivas. Isso tem sido intenso desde que os dois países assinaram tratados em 1990, abrindo mão da carreira nuclear com fins militares. Tem havido

“O Mercosul, no seu atual modelo, agoniza, embora esteja em vésperas de ser ampliado com a efetiva entrada da Venezuela. O futuro dependerá muito das eleições no Brasil e na Argentina”. Revista de conjuntura

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coordenação e entendimento entre Brasil e Argentina, bem como alguma simetria econômica. O que não é o caso dos outros países envolvidos. Mas, a partir de novas eleições presidenciais (Brasil em 2006 e Argentina em 2007), isso deve ser estabilizado e novos canais de integração surgirão. Imediatamente, após as renegociações com a Bolívia, envolvendo a Petrobrás, o Brasil deverá enfrentar a demanda de novos preços da energia produzida em Itaipu, da qual o Paraguai depende totalmente. Conjuntura – Qual a sua interpretação com relação à perda de liderança do presidente Lula na América do Sul? Isto pode trazer complicações para o comércio exterior? Benício Schmidt – Fatos recentes criam essa ilusão. Mais que o Lula, o que está em jogo é o papel do Brasil e sua importância global na região. Não haverá nunca América Latina como identidade regional sem o Brasil. Poderá haver sem Lula, pois não é uma questão de personalidade; a questão é de natureza material e simbólica, envolvendo variáveis que vão muito além de declarações salvacionistas ou populistas. Dos criadores de gado da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai não se ouvem queixas quanto à integração e suas disputas junto a mercados como a Rússia e a União Européia. A expectativa de criação de grandes empreendimentos universitários e científicos regionais é grande e dependerá da clarividência das autoridades políticas e diplomáticas de todos os países da região. O futuro recém começa e o imagino de forma otimista.


ARTIGO

Poupança em Conta Corrente do Governo: uma nova proposição de Política Fiscal Alexandre Manoel Angelo da Silva* Manoel Carlos de Castro Pires* No período anterior à implementação do Plano Real, período marcado por taxas de inflação elevadas, a literatura econômica aplicada aponta que as receitas com senhoriagem são fundamentais para manter a sustentabilidade da dívida pública brasileira. Durante um curto período, após a implementação do Plano Real e o conseqüente declínio das taxas de inflação, as receitas com as privatizações compensaram as receitas originadas nas altas taxas de inflação. Em seguida à substancial diminuição nas receitas oriundas de privatizações e ao início do regime de câmbio flutuante, que elevou a dívida pública brasileira em aproximadamente 18 pontos percentuais do PIB, o governo brasileiro forçosamente iniciou seu ajuste fiscal. A partir disso, nos últimos anos, percebemos uma elevação na rigidez orçamentária e uma conseqüente deterioração no volume de investimento público, o qual diminuiu em prol da obtenção dos maiores níveis de superávits primários. Diante desse arcabouço institucional, vários testes

de sustentabilidade têm sido aplicados para analisar a dívida pública brasileira, os quais, em geral, confirmam sua trajetória sustentável. Entretanto, até mesmo economistas preocupados com a sustentabilidade da dívida pública brasileira sugerem que a política fiscal de maiores superávits primários obtidos por meio da redução do investimento público representa um obstáculo ao crescimento econômico, implicando, pois, a necessidade de equacionar-se a manutenção da vigente austeridade fiscal com o aumento dos investimentos públicos. Nesse sentido, em consonância com economistas reconhecidos como Blanchard & Giavazzi1, propomos uma alteração na atual política fiscal, de modo a manter a austeridade fiscal e elevar o nível de investimento público, ou seja, propomos permutar a meta fiscal baseada em superávit primário por uma meta baseada na poupança em conta corrente do governo. O conceito de poupança em conta corrente do governo consiste na retirada dos investimentos públicos do

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cálculo do superávit primário. Em virtude de não penalizar a elevação do estoque de capital, um dos determinantes do crescimento econômico, o conceito de poupança em conta corrente do governo mostra-se economicamente mais adequado do que o superávit primário. Contudo, uma questão que circunda essa permuta é se a utilização da poupança em conta corrente do governo não significa muito mais um relaxamento fiscal do que propriamente uma mudança de política justificada pela teoria econômica. Assim, em texto para discussão a ser publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), avaliamos essa proposta do ponto de vista da sustentabilidade fiscal, ou seja, analisamos se a alteração da meta de superávit primário pela de poupança em conta corrente do governo implica alteração na trajetória da relação dívida pública/PIB. A fim de estabelecer relações para a construção de cenários, estimamos modelos de vetores auto-regressivos, nos quais os resultados confirmam a intuição

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de que o aumento de investimento público pode contribuir para o aumento do crescimento econômico. Diante dessa relação, estudamos possíveis trajetórias para a razão dívida pública brasileira/PIB tanto em ambiente de meta fiscal baseada em superávit primário quanto em ambiente de meta fiscal baseada na poupança em conta corrente do governo. As simulações dos cenários embasam-se em meta de superávit primário de 4,25% do PIB e em meta de poupança em conta corrente do governo de 7,65% do PIB, que corresponde a uma meta similar a um superávit primário de 4,25% do PIB, pois, no período 1999-2005, a média de investimento público é de 3,40% do PIB. Conforme nossas simulações, à medida que o investimento público aumenta, a taxa de crescimento econômico eleva-se. Em relação à taxa real de

juros, realizamos projeções de acordo com três estados da natureza, baseados em taxas reais de juros de 12%, 11% e 10%. No primeiro estado da natureza (taxa real de juros em 12%), no ambiente de meta fiscal baseada em superávit primário, no horizonte de 10 anos, a razão dívida pública/PIB cresce cerca de 6 pontos percentuais (p.p.) do PIB; no ambiente de meta fiscal baseada na poupança em conta corrente do governo, a razão dívida pública/PIB cresce aproximadamente 7 p.p. do PIB. No segundo estado da natureza (taxa real de juros em 11%), no ambiente de meta fiscal baseada em superávit primário, nos próximos 10 anos, a dívida pública é estável e no ambiente de poupança em conta corrente do governo é praticamente estável, pois há um acréscimo de somente cerca de 0,3 p.p. do PIB. No terceiro estado da natureza (taxa real de juros em 10%), no de-

“Os resultados mostram que a adoção do conceito de poupança em conta corrente do governo não resulta em qualquer alteração substancial na trajetória da razão dívida pública/PIB”.

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correr dos 10 anos seguintes, no ambiente de meta fiscal embasada no superávit primário, a dívida pública cai aproximadamente 5 p.p. do PIB e, em um ambiente de meta fiscal embasada na poupança em conta corrente do governo, a dívida pública decai cerca de 4 p.p. do PIB. Portanto, os resultados mostram que a adoção do conceito de poupança em conta corrente do governo não resulta em qualquer alteração substancial na trajetória da razão dívida pública/PIB. Nos cenários em que a razão dívida pública/PIB é insustentável, ela é tanto com meta de superávit primário quanto com meta de poupança em conta corrente do governo. É válido ressaltar que, apesar de a trajetória da razão dívida pública/PIB ser praticamente igual em ambiente de superávit primário e poupança em conta corrente do governo, nesse último, em virtude de não se penalizar o investimento público, nossas estimações sugerem que a taxa de crescimento econômico eleva-se, aumentando o bem-estar geral. Uma segunda questão referente à adoção da política de poupança em conta corrente do governo refere-se à sua operacionalização, pois existe um forte incentivo para que os gestores públicos contabilizem gastos correntes como investimentos públicos. Não obstante, entendemos que essa janela de oportunidades pode ser exaurida com relativa facilidade. Em primeiro lugar, no Governo Federal, no Ministério da Fazenda, a Secretaria do Tesouro


Nacional (MF/STN) possui uma Coordenação-Geral de Análise Econômico-Fiscal de Projetos de Investimento Público que, entre outras atribuições, dedica-se a avaliar e acompanhar os investimentos realizados por meio de Parceria Público-Privada. Ora, de posse dessa atribuição, nota-se que essa Coordenação é plenamente capaz de avaliar ou diferenciar quais se enquadram como gastos correntes e quais despesas devem ser enquadradas como investimento. Desde que esse arcabouço institucional situa-se dentro do próprio governo federal, um outro possível argumento é que esse órgão tende a sofrer pressões “políticas”. Dessa maneira, o processo de decisão do que é investimento pode não ser suficientemente transparente, de modo a basear-se em critérios exclusivamente econômicos. Duas soluções simples apresentam-se para essa possibilidade: i) incluir na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) penalidades severas para o gestor que propositadamente indicar gasto corrente como investimento; ii)

na LRF, em relação ao acompanhamento e fiscalização da implementação da poupança em corrente do governo, incluir recomendações ao Tribunal de Contas da União (TCU), órgão externo ao poder executivo e responsável pela fiscalização do gasto federal. No que concerne aos governos estaduais e municipais, estruturas similares à Coordenação-Geral instituída no MF/STN podem ser implementadas. Além disso, as fiscalizações externas devem ser atribuídas aos tribunais de contas responsáveis pelos gastos estaduais e muni-

cipais, respectivamente. É claro que a inclusão dos normativos de punições na LRF é válida para todos os entes da federação. Assim sendo, não existem empecilhos práticos nem teóricos que possam comprometer a adoção da meta de poupança em conta corrente do governo como instrumento de política fiscal. Ademais, salienta-se que, além dos possíveis ganhos de crescimento econômico, a implementação desse conceito não sugere qualquer relaxamento na austeridade fiscal perseguida pelos entes da federação brasileira nos últimos anos.

*Alexandre Manoel Angelo da Silva *Manoel Carlos de Castro Pires Economistas do IPEA

Notas 1

Blanchard, O. J. and Giavazzi, F. (2004). “Improving the SGP through a proper accounting of public investment”, Discussion Paper Series, nº 4.220, Centre for Economic Policy Research.

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Quem tem informação tem poder Revista de Conjuntura, o melhor panorama sobre tudo que anda acontecendo.

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ARTIGO

Prejudicar o Brasil é “Super-Simples” Clair Maria Hickmann *

O substitutivo do Projeto de Lei Complementar PLP 123/2004, conhecido como “Super-Simples”, que está tramitando na Câmara dos Deputados, não vem para simplificar a vida dos micro e pequenos empresários. Muito menos para contribuir com o País. Apresentado sob o pretexto de eliminar burocracias e regulamentar a unificação da legislação tributária das três esferas de governo para micro e pequenas empresas, o substitutivo, na verdade, pode causar sérios danos à arrecadação, ao trabalhador, ao aposentado, aos estados e municípios, ao consumidor. O projeto extrapola em muito a abrangência dessa matéria e avança sobre legislação trabalhista, previdenciária e até sobre normas de fiscalização sanitária, ambiental, metrológica, tributária e da segurança do trabalho. Reconhecemos a necessidade de regulamentar o artigo 146 da Constituição, que determina que lei complementar “poderá estabelecer tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de

pequeno porte” com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, mas consideramos essencial a retirada e a modificação de todos os dispositivos do substitutivo do PLP 123/04 que causam prejuízo à população brasileira. É grande a pressão sobre os parlamentares para que o projeto seja aprovado antes das eleições de outubro próximo. Há uma percepção geral de que, em período pré-eleitoral, aumenta bastante a sensibilidade para aprovar projetos que criam benefícios fiscais. É curioso como nesse período ocorre verdadeiro surto de generosidade fiscal. Visando a suscitar esses nobres sentimentos, o PLP 123 é exibido com traje sedutor e nome bonito – “SuperSimples” – para atrair os mais afoitos e menos avisados. Porém, um olhar mais profundo sobre seu conteúdo revela que o projeto pretende fazer caridade com chapéu alheio: cria benefícios para as microempresas e empresas de pequeno porte com a retirada de direitos dos trabalhadores e a fragilização da fiscalização, desprotegendo a sociedade.

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Objetivo inicial do projeto1 O objetivo inicial do projeto era apenas regulamentar o dispositivo constitucional – artigo 146, inciso III, alínea “d” e parágrafo único, inserido pela Emenda 42, de 19.12.20032. Esse dispositivo constitucional autoriza o tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, podendo ser instituído regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Estabelece que o regime será opcional para o contribuinte, podendo criar condições de enquadramento diferenciadas por estado. Define o tipo de recolhimento: será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento. Prescreve também que a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes.

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“O substitutivo do projeto vai muito além e incorpora até outros projetos de lei, de tal sorte que acaba fazendo verdadeiras reformas estruturais – tributária, trabalhista, previdenciária e de administração pública”. Entretanto, o substitutivo do projeto vai muito além e incorpora até outros projetos de lei, de tal sorte que acaba fazendo verdadeiras reformas estruturais – tributária, trabalhista, previdenciária e de administração pública. O que muda na área tributária? Em síntese, o PLP 123 cria um regime de tributação especial para as microempresas e empresas de pequeno porte com receita bruta anual até R$ 2,4 milhões, que consiste, basicamente, em um único recolhimento mensal dos seguintes tributos e contribuições devidos à União, DF, Estados e municípios: o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI, exceto sobre importação), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL),

a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e para o Programa de Integração Social (PIS, exceto sobre importação), a contribuição para a seguridade social sobre a folha de salários, a cargo da Pessoa Jurídica (exceto de algumas atividades econômicas), o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Serviços (ISS). Permanece a incidência do imposto sobre operações financeiras (IOF), do Imposto sobre Importação e Exportação (II e IE), do Imposto Territorial Rural (ITR), do Imposto de Renda sobre Ganhos de Capital e Aplicações Financeiras (IR), da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS parcial), da contribuição para a seguridade social do trabalhador e do sócio da empresa

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do Simples, na qualidade de contribuinte individual, do IR sobre pagamentos ou créditos efetuados a pessoas físicas, do PIS/Cofins e IPI sobre Importações, do ICMS e do ISS em alguns casos especiais, como, por exemplo, na substituição tributária. Não poderão optar pelo regime as instituições financeiras, as sociedades anônimas, a empresa que tenha como sócio outra pessoa jurídica, sócio estrangeiro, que seja filial de sede no exterior, pessoa jurídica resultante de cisão, entre outras vedações. O valor devido mensalmente será um percentual sobre a receita bruta, cuja alíquota varia de 4% a 17,42 % de acordo com o ramo de atividade e a faixa da receita bruta. Há cinco tabelas com 22 faixas de receita: uma para o comércio, com alíquotas que variam de 4% a 11,61%; outra para a indústria, de 4,5% até 12,11%; três tabelas para a prestação de serviços, cuja alíquota varia de 3,13% a 17,42%, dependendo da atividade, sendo uma delas com adicional de alíquota, variável em função do grau de participação do valor da folha de pagamento na receita total. Para determinar a alíquota, deve ser utilizada a receita bruta acumulada no ano-calendário. Porém, para pagamento o contribuinte precisa registrar separadamente as receitas de revenda de mercadorias, de venda de mercadorias industrializadas, de prestação de serviços, de mercadorias sujeitas a substituição tributária e outros casos especiais, tendo em vista a existência de diferentes alíquotas para esse tipo de


operação. Portanto, o regime não será tão “super-simples” como se pretende. E nem poderia ser, porque as operações econômicas são complexas e, conseqüentemente, os tributos que incidem sobre esses fatos econômicos tornam-se também complexos. O produto da arrecadação será partilhado entre União, estados e municípios de acordo com percentuais estabelecidos nos anexos do PLP 123. Em torno de 67% da arrecadação ficará nas mãos da União, mantendo a atual estrutura de repartição do bolo tributário entre as três esferas de governo. A defesa do contribuinte nas esferas administrativa e judiciária O PLP 123/04 estabelece que o Processo Administrativo Fiscal, isto é, a defesa e o recurso do contribuinte na esfera administrativa, será julgado pela administração estadual, segundo o estabelecimento da pessoa jurídica. Porém, as consultas sobre dúvidas e interpretação da legislação tributária serão solucionadas pela Secretaria da Receita Federal. Ainda não está definida qual a lei que regulará o Processo Administrativo Fiscal relativo ao Simples Nacional. Essa tarefa caberá ao Comitê Gestor. Na esfera judiciária, os processos relativos a tributos e contribuições devidos pelas pessoas jurídicas optantes do Simples Nacional serão julgados pela Justiça Federal. O substitutivo do PLP 123/04 estabelece também que a cobrança judicial dos débitos tributários oriundos do Simples Nacional

será efetuada pela ProcuradoriaGeral da União. Tudo indica que a operacionalização dessas atividades será bastante complexa, podendo comprometer ou até inviabilizar o êxito do projeto. Considerando que na seara tributária não há hierarquia entre os entes federados, parece não ter muito sentido a interpretação da legislação ser feita pela União e a aplicação da norma, pelo estado. Essa situação poderá gerar muitos conflitos, prejudicando a arrecadação e a sociedade. Outro aspecto importante para a eficácia e eficiência da Administração Tributária é a integração e o compartilhamento de informações entre os órgãos de fiscalização e cobrança judicial. Atualmente, há essa integração na esfera federal, entre Receita Federal e Procuradoria da Fazenda Nacional, e, na maioria dos estados, entre a Secretaria de Fazenda e a Procuradoria Estadual. É muito pouco provável que tais integração e compartilhamento possam vir a ocorrer, de forma satisfatória, em órgãos de entes federados distintos. Caso o projeto seja aprovado

com o teor atual, a tendência será de a Procuradoria da Fazenda Nacional dar prioridade para a cobrança dos tributos federais, uma vez que já domina a matéria, deixando em segundo plano a cobrança dos débitos das empresas do Simples Nacional. Os prejudicados serão os cofres estaduais e municipais. Esses dispositivos do PLP 123/04 mostram total desconhecimento da importância estratégica da Administração Tributária para a eficácia e eficiência das normas tributárias. Dificulta o combate à sonegação O artigo 33 do substitutivo do PLP 123, cujo relator é o deputado Luiz Carlos Hauly, na sua versão divulgada no dia 23/5/2006 retira da Receita Federal a competência para fiscalizar as empresas optantes do Simples Nacional. O Unafisco Sindical manifestou em diversas oportunidades o equívoco da proposição, pois fragiliza e reduz a atuação do Estado, em nome da “simplificação”, enfraquecendo

“O regime não será tão ‘supersimples’ como se pretende. E nem poderia ser, porque as operações econômicas são complexas e, conseqüentemente, os tributos que incidem sobre esses fatos econômicos tornam-se também complexos”.

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o combate à sonegação de tributos e contribuições. Ao transferir a competência da fiscalização das empresas optantes do Simples nacional para os estados, ficando a União apenas com competência supletiva, o PLP 123 fere frontalmente a Constituição ao não observar a competência dos entes federados, cuja delegação é vedada. O ente que tem competência para instituir o tributo tem também para fiscalizá-lo – vale a regra de quem pode “o mais” também pode “o menos”. Além disso, o PLP deixa de observar o disposto nos artigos 37, inciso XXII, e 146, inciso IV, parágrafo único, que estabelecem a atuação das administrações tributárias da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios de forma integrada e compartilhada. A transferência prevista no PLP impede a atuação imediata do fisco federal quando, por exemplo, for constatada movimentação financeira incompatível com a renda declarada. Facilita também a “lavagem de dinheiro” por empresas “fantasmas e laranjas”. O efetivo combate à sonegação demanda estrutura federal, especialmente em operações realizadas entre pessoas jurídicas localizadas

em diversos entes federados. A retirada de competência da União vai dificultar ou até impedir ações para desbaratar grandes “esquemas” de sonegação, “lavagem de dinheiro”, de contrabando e descaminho, como as operações recentemente realizadas pela Receita Federal e Polícia Federal e amplamente divulgadas pela imprensa. Para o êxito desse tipo de ação fiscal, é fundamental a competência plena do fisco federal, uma vez que envolve diversas empresas, aparentemente pequenas, muitas vezes criadas com o objetivo único de acobertar negócios ilícitos, situadas em diversos estados brasileiros. Para resolver a questão, bastaria o PLP 123 regulamentar a atuação integrada e compartilhada das administrações tributárias federal, estadual e municipal, possibilidade já prevista na Carta Magna. Em nova versão do substitutivo, apresentada no dia 23 de maio de 2006, o relator incluiu um parágrafo no qual estabelece competência para a União fiscalizar quando houver indícios de prática de contrabando, descaminho, sonegação de contribuição previdenciária, ou crime contra a ordem tributária. Observe-se que

“O PLP 123 facilita a criação de empresas ‘laranjas’ e ‘fantasmas’, conhecidas pelas atividades ilícitas que envolvem altas somas de recursos”. Revista de conjuntura

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não foram sequer mencionados indícios de sonegação de impostos e contribuições, apenas os de contribuição previdenciária. E mesmo que tivesse inserido não resolveria o problema, porque o vocábulo dá margem a diversas interpretações e questionamentos jurídicos, dificultando ou até impedindo a fiscalização dentro do prazo decadencial. Vale lembrar que o combate à sonegação é fundamental para garantir a leal concorrência na economia e a efetividade das normas jurídicas. Nunca é demais lembrar que não basta ter legislação tributária adequada para a eficácia do sistema tributário, mas é necessária também uma administração tributária eficiente e aparelhada com instrumentos que permitam a fiscalização do cumprimento das leis. Facilita a criação de empresas “laranjas” e “fantasmas” O PLP 123 facilita a criação de empresas “laranjas” e “fantasmas”, conhecidas pelas atividades ilícitas que envolvem altas somas de recursos. O substitutivo proíbe a exigência de comprovação de propriedade ou contrato de locação do imóvel onde será instalada a sede do estabelecimento no momento de sua abertura e fechamento. A não exigência desse comprovante vai facilitar a proliferação de empresas “laranjas” e “fantasmas” e dificultar a ação do Estado no combate a atividades ilícitas. Recentemente, ainda, as CPIs em andamento no Congresso Nacional defrontaram-se com o problema de empresas “fantasmas” que movimentaram grandes somas de recursos financeiros e


que tinham endereços falsos e inexistentes. Esse é também um problema com o qual as administrações tributárias têm se deparado cada vez mais nos últimos anos. É preciso criar mecanismos para evitar e impedir essa prática e não para facilitar. É verdade que, às vezes, a comprovação de endereço se torna impossível, porque a locação de imóvel depende de a empresa estar constituída legalmente. Enquanto a pessoa jurídica não existir legalmente não há como alugar imóvel em seu nome. Uma solução para o problema poderia ser a comprovação do endereço dos sócios sob condição de apresentação posterior dos documentos em nome da empresa. Contudo, esta situação não justifica o disposto no PLP 123. Desrespeita o bom contribuinte O substitutivo do projeto prevê novo parcelamento de dívidas com o fisco, em até 120 meses, para as empresas do Simples nacional, inclusive para seus titulares e sócios. Não há dúvida de que as micro e pequenas empresas enfrentam dificuldades de toda sorte e que é necessário parcelar suas dívidas tributárias, mas permitir novo benefício para as pessoas jurídicas que já obtiveram esse benefício e não cumpriram o acordo é um verdadeiro prêmio ao sonegador. Essa benevolência desrespeita o bom contribuinte que honra suas obrigações, às vezes com extremo sacrifício, e estimula a concorrência desleal na economia, ferindo o princípio constitucional da isonomia. Além disso, favorece duplamente o contribuinte inadimplente e sonegador: ao não cum-

“Não há dúvida de que as micro e pequenas empresas enfrentam dificuldades de toda sorte e que é necessário parcelar suas dívidas tributárias, mas permitir novo benefício para as pessoas jurídicas que já obtiveram esse benefício e não cumpriram o acordo é um verdadeiro prêmio ao sonegador”. prir com sua obrigação tributária, ele leva vantagem em relação ao bom pagador de tributos, e ainda é privilegiado com parcelamento em longo prazo. A experiência comprova que o parcelamento de longo prazo não resolve o problema. É apenas um paliativo. A origem dessas dificuldades está na política econômica e na elevada carga tributária sobre o consumo. Em 2000, criou-se um refinanciamento com prazo indeterminado – Refis, aprovado pela Lei 9.964, que permitiu à empresa em débito com a Receita Federal, INSS e Procuradoria da Fazenda Nacional parcelar suas dívidas em suaves prestações de, no máximo, 1,5% do valor do faturamento. O programa suspendia também a pretensão punitiva do Estado em face dos crimes tributários. Alegava o governo que o programa obrigaria os devedores a pagar

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em dia os tributos a vencer; que era necessário socorrer a grande massa de empresas atoladas em dívidas fiscais e que a medida incrementaria a arrecadação. Não obstante todos esses benefícios, o resultado do programa foi um fracasso. Com um ativo inicial em torno de R$ 150 bilhões e 129.166 empresas optantes, o programa arrecadou somente R$ 966 milhões em 2005, e mantinha o parcelamento de apenas 25.278 empresas, ou seja, 80% delas foram excluídas por falta de pagamento. O prazo médio dos parcelamentos ficou em 140 anos. O fato de a parcela mensal ser um percentual sobre o faturamento gerou uma série de fraudes com o objetivo de reduzir o valor do faturamento e conseqüentemente o valor da prestação. Serviu de manto protetor para sonegadores de tributos se verem livres de responder pelos crimes tributários cometidos

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“As empresas do Simples são dispensadas de anotar as férias dos empregados nos livros de registro, de afixar em suas dependências o Quadro de Trabalho, de comunicar ao Ministério do Trabalho a concessão de férias coletivas, prejudicando os trabalhadores”. no passado. Devedores contumazes e sonegadores utilizaram o Refis para obter certidão negativa e participar de concorrências públicas em situação mais vantajosa em relação àquela empresa que pagou corretamente seus impostos. Algumas situações escandalosas foram até divulgadas pela imprensa. Segundo o noticiário, um caso em que a esperteza excessiva ganhou notoriedade foi o de uma conhecida “academia de entretenimento”. O dono da sociedade transferiu o grosso das atividades lucrativas da academia para outra empresa, que abocanhou 97% do faturamento, e a academia, a filantrópica, ficou apenas com R$ 25 mil por mês. Sobre esse faturamento, o valor das prestações do Refis ficou em apenas R$ 300 mensais. “Coisa para pagar em 16 séculos - 1.666 anos – que só será quitada no ano 3666.” Em 2003, criou-se novo parcelamento pela Lei 10.684, denominado Paes: o parcelamento em 15 anos para débitos com o fisco,

mesmo que a dívida tivesse sido objeto de parcelamento anterior não integralmente pago ou cancelado por falta de pagamento. Além disso, os devedores foram beneficiados com a redução da multa em 50%. Como se isso não bastasse, brindaram-se ainda os sonegadores que cometeram crime contra a ordem tributária com suspensão da pretensão punitiva do Estado. Caso seja aprovado o dispositivo do PLP 123, será o terceiro programa com esse caráter nos últimos seis anos. E o surto de generosidade fiscal pré-eleitoral chegou também nessa seara. Recentemente o Congresso Nacional aprovou a reabertura do Refis 2000 por meio de uma emenda apresentada pelo deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) à Medida Provisória 280. Felizmente, o presidente Lula vetou o benefício, mas o governo já cogita a possibilidade de criar novo programa. Para respeitar o bom contribuinte e reduzir a impunidade é

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fundamental que esses programas sejam com prazo determinado e razoável. Ademais, é necessário restringir o acesso a esse tipo de benefício para empresas que já o obtiveram e não cumpriram o acordo, bem como para os débitos decorrentes de sonegação fiscal. Caso contrário, será um verdadeiro prêmio ao sonegador. O ideal seria combater as causas do problema. Reduz os direitos trabalhistas O PLP 123/04 fragiliza também a fiscalização trabalhista que examina as condições de segurança e saúde no trabalho do empregado e o cumprimento do pagamento do salário, férias e 13º salário. A medida estimula o descumprimento da lei. Também é prejudicado o cumprimento das normas de segurança e saúde do trabalho. Os acidentes de trabalho poderão aumentar ainda mais, elevando as despesas da Previdência Social com pagamento de benefícios a trabalhadores e a pensionistas. Há ainda outras mudanças que dificultam a inspeção do trabalho, cuja função é proteger o trabalhador: as empresas do Simples são dispensadas de anotar as férias dos empregados nos livros ou fichas de registro, de afixar em suas dependências o Quadro de Trabalho, de comunicar ao Ministério do Trabalho a concessão de férias coletivas, prejudicando os trabalhadores. Em versões anteriores do substitutivo, havia um artigo, suprimido na versão atual, que reduzia o FGTS dos atuais 8% para até 4% para empregados de empresa individual do Simples com receita


bruta anual até R$ 36 mil, mediante acordo ou convenção coletiva. Com isso, haveria duas classes de trabalhadores, uma com menos direitos do que a outra – a primeira e a segunda classe. Seria um desrespeito ao princípio constitucional da igualdade de direitos de todos os trabalhadores e cidadãos, sejam eles empregados de micro, pequenas, médias ou grandes empresas, e cabe ao Estado garantir que esses direitos sejam respeitados. Na visão dos trabalhadores, seria o primeiro passo para a denominada “flexibilização” das leis trabalhistas, que, na verdade, representa a redução dos direitos dos trabalhadores. A medida reduziria também a arrecadação do FGTS e, por conseguinte, a capacidade de investimento do Estado em infra-estrutura urbana, saneamento básico e habitação para população de baixa renda. Coloca em risco a vida e a saúde da população e fragiliza o consumidor O substitutivo do PLP 123/04 afrouxa as fiscalizações trabalhista, metrológica, sanitária, ambiental e de segurança, trazendo prejuízos para toda a população. O projeto é uma franca obstrução ao trabalho da fiscalização. Ele estabelece que essas fiscalizações deverão ter “natureza prioritariamente orientadora” e que, em caso de se constatar alguma irregularidade, apenas na segunda visita poderá ser lavrado auto de infração. As irregularidades encontradas na primeira visita da fiscalização serão objeto de notificação com prazo para sua regularização, o qual será, no mínimo,

de dez dias. O procedimento fragiliza a fiscalização fitossanitária, que examina a qualidade e a validade de alimentos, colocando em risco a saúde e a vida da população. Enfraquece também a fiscalização metrológica, que garante que o consumidor não seja enganado em relação a pesos e medidas de alimentos. Perda de arrecadação para estados mais pobres e municípios Tudo indica que o projeto aumenta a carga tributária para alguns setores da economia e a reduz para outros. Isso pode significar perdas consideráveis de arrecadação para alguns estados, sobretudo os mais pobres. Os municípios podem chegar a perder arrecadação de 6% a 10% no imposto sobre serviços. Os entes federados terão dificuldade de planejar seu desenvolvimento e seu orçamento anual, uma vez que as informações prestadas pelos contribuintes passarão de um período mensal para anual, dificultando qualquer informação estatística.

PLP 123/04 – no caminho da regressividade tributária As mudanças pretendidas pelo projeto do “Super-Simples” seriam, segundo seus defensores, para gerar empregos, reduzir tributos, racionalizar e simplificar o sistema tributário. Há sérias dúvidas se efetivamente vai gerar emprego. Em 1996, à época da aprovação da lei do Simples federal – Lei 9.317/96 –, o argumento era o mesmo, mas não parece ter alcançado o resultado anunciado. Quanto aos aspectos tributários, o resultado pode também não corresponder ao que hoje se anuncia, mas merecem um exame mais acurado. A redução de tributos, a racionalização e a simplificação do sistema tributário são idéias que têm sido repetidas e divulgadas como verdades absolutas e como sendo o principal problema do sistema. Não é incomum, entretanto, que opiniões muito repetidas e disseminadas se revelem, após exame mais detido, como semiverdadeiras ou mesmo falsas. É duvidoso, por exemplo, que o número de impostos seja exage-

“Tudo indica que o projeto aumenta a carga tributária para alguns setores da economia e a reduz para outros. Isso pode significar perdas consideráveis de arrecadação para alguns estados, sobretudo os mais pobres”.

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cação costumam agredir princípios básicos da tributação. A complexidade da estrutura de tributos deve corresponder à complexidade das atividades econômicas tributadas. É o caso da instituição da nãocumulatividade da Cofins, que se tornou mais complexa para atender a um princípio de justiça e às demandas da sociedade. Tudo indica que o problema central seja a elevada carga tributária e o seu entrave para o desenvolvimento econômico sustentado e não o número de impostos e a suposta complexidade do sistema tributário. É preciso, entretanto, examinar a distribuição da carga tributária entre os diversos segmentos sociais para apurar se o peso está sendo distribuído de acordo com a renda de cada classe social.

“Há uma ilusão na divulgação de que o “Super-Simples” vai reduzir o número de tributos. O PLP prevê apenas a centralização do recolhimento em um único documento”. rado. Propagou-se a idéia de que a simplificação tributária pressupõe uma acentuada diminuição dos mais de 50 impostos supostamente existentes. Na realidade, a Constituição prevê apenas 13 impostos, em todos os níveis de governo, um dos quais ainda não foi criado. Para o financiamento da seguridade social, a Constituição prevê ainda a criação de contribuições sobre a folha de salários, a receita ou faturamento, o lucro, movimentação financeira e a receita de concursos e prognósticos. Cerca de 70% do recolhimento é concentrado em um número reduzido de impostos e contribuições. São basicamente três impostos (IR, IPI, ICMS) e quatro contribuições (Cofins/Pis, CSLL, Previdenciária, CPMF).

Há uma ilusão na divulgação de que o “Super-Simples” vai reduzir o número de tributos. O PLP prevê apenas a centralização do recolhimento em um único documento. Estabelece, isso sim, a isenção ou a redução para pequenas taxas e contribuições, mas não reduz o número dos principais impostos e contribuições. Outra meia verdade é a afirmação de que o sistema tributário seja complexo demais. É preciso cautela contra a utilização abusiva dessa tese. Não se pode esquecer que a simplificação tem limites, especialmente em países que já ultrapassaram certo estágio de desenvolvimento e grau de diversificação, como é o caso do Brasil. Propostas extremadas de simplifi-

Distribuição da carga tributária nos últimos dez anos A carga tributária evolui muito nos últimos anos: saltou de 28,97% do PIB para algo em torno de 37,18 %, no período de 1996 a 2005, conforme pode ser observado na tabela 1. O problema é que o aumento da carga não se destinou aos serviços públicos, mas à coibição dos encargos da dívida pública.

Tabela 1 EVOLUÇÃO DA CARGA TRIBUTÁRIA BRUTA (1) – Em % do PIB Ano

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

Carga %

28,97

29,03

29,74

32,15

32,55

33,96

35,61

34,90

35,91

37,18(2)

Fonte: SRF Notas: 1 A Receita Federal trabalha com o conceito de carga tributária bruta, que representa, de forma ampla e no âmbito nacional, a relação entre arrecadação tributária e o PIB. Por tratar-se de conceito bruto, não estão descontadas as restituições ou ressarcimentos. Assim como não considera no cômputo da arrecadação as multas e os juros pagos. 2 Estimado pelo Departamento de Estudos Técnicos do Unafisco Sindical.

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Isso explica, em parte, porque o brasileiro está pagando imposto como em um país desenvolvido e recebendo serviços como os de um país atrasado. O crescimento da carga tributária foi obtido, basicamente, com tributos incidentes sobre o consumo, agravando ainda mais a regressividade do sistema. Essa evolução é decorrente de uma série de mudanças na legislação realizadas a partir de 1995. A crise financeira no Brasil, no final de 1998, levou o governo a lançar um “pacote fiscal” com medidas para aumentar arrecadação e assegurar superávit fiscal. Entre as medidas, destacam-se os aumentos da base de cálculo e de alíquotas de contribuições para a seguridade social, como a Cofins, o PIS, CSLL, CPMF. Além disso, manteve-se congelada a tabela e as deduções do IRPF. Em 2001 foi instituída a CideCombustíveis, Contribuição de

“O crescimento da carga tributária foi obtido, basicamente, com tributos incidentes sobre o consumo, agravando ainda mais a regressividade do sistema”. Intervenção no Domínio Econômico, incidente sobre a importação e a comercialização de combustíveis. No governo Lula, a Lei 10.833/2004, que instituiu a nãocumulatividade, elevou a alíquota da contribuição de 3% para 7,6%. Os efeitos dessas alterações se refletem diretamente no aumento da carga tributária, que saltou de 29,74% para 32,15%, de 1998 a 1999, e para 37,18% em 2005, con-

forme pode ser visto na tabela 1. A tributação sobre o consumo avançou também em relação ao PIB. A tabela 2 mostra que a carga tributária sobre o consumo saltou de 17,24% para 20,79% do PIB. O peso maior vem do ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) de 7,99%, seguido da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) de 4,54%.

Tabela 2 Evolução da Carga Tributária sobre o Consumo em % do PIB Principais Tributos

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

Imposto sobre Importação I.P.I-Total Contribuição p/Seguridade Social/Cofins Entidades Financeiras Demais Empresas Contribuição para o Pis/Pasep Entidades Financeiras Demais Empresas Cide-Combustíveis CPMF Imposto sobre Operações Financeiras Contribuição Previdenciária das Empresas ICMS ISS Total da Carga sobre Consumo

0,54% 1,99% 2,30%

0,59% 1,93% 2,20%

0,72% 1,78% 2,05%

0,81% 1,69% 3,30%

0,77% 1,71% 3,62%

0,76% 1,62% 3,87%

0,59% 1,47% 3,88%

0,52% 1,26% 3,83%

0,52% 1,29% 4,34%

0,47% 1,36% 4,54%

0,00% 0,00% 0,95% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,37%

0,00% 0,00% 0,87% 0,00% 0,00% 0,00% 0,79% 0,43%

0,00% 0,00% 0,83% 0,00% 0,00% 0,00% 0,89% 0,39%

0,00% 0,00% 1,01% 0,00% 0,00% 0,00% 0,82% 0,50%

0,00% 0,00% 0,91% 0,00% 0,00% 0,00% 1,32% 0,28%

0,21% 3,65% 0,95% 0,05% 0,90% 0,00% 1,43% 0,30%

0,27% 3,61% 0,96% 0,06% 0,90% 0,54% 1,51% 0,30%

0,27% 3,55% 1,11% 0,06% 1,06% 0,48% 1,48% 0,29%

0,27% 4,06% 1,10% 0,05% 1,05% 0,43% 1,50% 0,30%

0,35% 4,19% 1,14% 0,06% 1,08% 0,40% 1,51% 0,31%

3,39%

3,17%

3,06%

2,87%

2,80%

2,91%

2,77%

2,30%

2,33%

2,48%

7,15% 0,51% 17,24%

6,84% 0,56% 17,35%

6,66% 0,52% 16,96%

6,97% 0,58% 18,59%

7,47% 7,86% 7,75% 7,73% 0,60% 0,54% 0,55% 0,54% 19,44% 20,25% 20,31% 19,59%

7,83% 0,59% 20,18%

7,99% 0,55% 20,79%

Fonte: SRF, STN, Confaz Elaboração: Departamento de Estudos Técnicos do Unafisco Sindical

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Gráfico 1

Tributos federais sobre o consumo cresceram 110% nos últimos dez anos Na esfera federal, os tributos sobre o consumo foram os que mais cresceram nos últimos dez anos, nada menos que 110%, em termos reais. A arrecadação do conjunto de tributos federais cresceu 101% no mesmo período. O gráfico 1, denominado variação dos tributos federais, mostra que o campeão foi a Cofins, com crescimento de 162%; depois a CPMF, com 142%. Enquanto a arrecadação sobre o patrimônio cresceu apenas 45,44%, em termos reais, o imposto estadual mais importante – o ICMS – registrou um aumento real de 48% nos últimos dez anos (conforme dados do Conselho Nacional de Política Fazendária – Confaz). Vale ressaltar que o PIB (Produto Interno Bruto) cresceu apenas 21% no período em que a arrecadação de tributos federais sobre o consumo subiu 110%. Os dados revelam que os tributos indiretos têm peso muito grande na carga tributária brasilei-

ra, representando cerca de 2/3 do total. E, em geral, esses tributos oneram mais os setores de baixa renda. O impacto sobre a renda das famílias é desigual. Estudo revela que as famílias de baixa renda são proporcionalmente mais oneradas: quem ganha até dois salários mínimos gasta 46% da sua renda familiar com o pagamento de tributos indiretos, enquanto as famílias com renda superior a 30 salários mínimos gastam 16% da sua renda em tributos indiretos, conforme dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) do IBGE, de 2002/2003.3 E a situação vem piorando: em 1996 (POF), esse tipo de gasto familiar representava 26% e 7,3%, respectivamente. A estrutura tributária brasileira está na contramão das experiências internacionais: o Brasil cobra menos tributos sobre a renda e o patrimônio que os países desenvolvidos e extrai a maior parte da sua arrecadação de impostos sobre bens e serviços. Enquanto nos países que integram a OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico)4 a média da carga de tributos indiretos (consumo) é 13,2% do PIB, no Brasil equivale

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a 18,3% do PIB5; por outro lado, a arrecadação de tributos diretos (sobre a renda e o patrimônio) nos países da OCDE é 13,8% do PIB e no Brasil equivale a 9,3%. Essas mudanças provocaram uma enorme extração de renda dos segmentos menos aquinhoados, de modo que é possível dizer que o aumento da carga tributária, nos últimos dez anos, foi preponderantemente suportado pela grande massa de consumidores e trabalhadores. É preciso lembrar que o congelamento da tabela do imposto de renda também vem extraindo renda dos trabalhadores desde 1996. O limite de isenção correspondia a 10,48 salários mínimos em 1995; hoje, equivale a 3,88 salários mínimos. A excessiva tributação sobre o consumo torna o sistema tributário ainda mais regressivo, caminhando na contramão da distribuição de renda e do desenvolvimento econômico. Faz sentido, portanto, a percepção geral de que a atual estrutura tributária representa um entrave para o desenvolvimento econômico. Entretanto, o PLP 123/04 do “Super-Simples” não muda a atual estrutura tributária. A incidência continuará sendo sobre a receita das empresas, ou seja, sobre o consumo. O projeto deveria criar mecanismos para incentivar a tributação sobre a renda, que é um imposto mais justo, principalmente para o empresário. É preciso ainda registrar que enquanto os trabalhadores e consumidores arcaram com o peso maior do aumento da carga tributária, outros segmentos,


principalmente o setor financeiro, foram premiados com diversos benefícios fiscais nesse período. Citemos apenas alguns:

“Em 2005, a União deixou de arrecadar R$ 3,7 bilhões com esse benefício fiscal (juros sobre capital próprio). Esse montante sequer consta do Orçamento público como renúncia fiscal”.

Juros sobre o capital próprio – o privilégio No final do ano de 1995, por meio do artigo 9° da Lei nº 9.249/95, foi criada uma inovação na legislação que possibilita à empresa distribuir juros aos seus sócios ou acionistas, reduzindo com isso sua carga tributária. Trata-se, na verdade, de uma despesa fictícia para reduzir o lucro tributável e pagar menos imposto de renda e contribuição social sobre o lucro. Os principais beneficiados são os bancos e as grandes empresas capitalizadas e lucrativas. Quem paga a conta dessa renúncia fiscal é a sociedade. Em 2005, a União deixou de arrecadar R$ 3,7 bilhões com esse benefício fiscal. Esse montante sequer consta do Orçamento público como renúncia fiscal. O beneficiário desses juros, quando se trata de pessoa física,

paga apenas 15% de imposto de renda, tributado de forma definitiva, sem precisar submeter esse rendimento à tabela progressiva que chega à alíquota de 27,5%. Isso fere frontalmente os princípios constitucionais da isonomia e da capacidade. Este mecanismo permitiu, por exemplo, que os cinco maiores bancos do sistema financeiro nacional – que apresentaram um lucro histórico em 2005 (R$18,8 bilhões) – pagassem, a título de juros sobre capital próprio, aos

seus acionistas um montante de R$ 6 bilhões. O valor distribuído de Juros sobre Capital Próprio proporcionou uma redução nas despesas com encargos tributários desses bancos da ordem de R$ 2,1 bilhões, em 2005. Vale lembrar que os lucros dos bancos têm registrado recordes nos últimos anos: em 2005, o crescimento médio dos lucros foi de 31%, em relação ao ano anterior. Enquanto os impostos sobre o respectivo lucro – IRPJ e CSLL – cresceram apenas 10,3%.

Tabela 3 Benefícios Tributários aos Bancos - Juros sobre Capital Próprio – 2005, em R$ mil Juros Sobre Capital Próprio destinados aos acionistas

Renúncia Tributária da União

1.367.986

465.115

259.917

598.684

203.553

113.750

Bradesco

1.537.000

522.580

292.030

Itaú

1.853.356

630.141

352.138

753.667

256.247

143.197

6.110.693

2.077.636

1.161.032

Bancos

Redução nos encargos tributários dos Bancos

Banco do Brasil Caixa Econ. Federal

Unibanco Total

Fonte: Balanços dos Bancos – Elaboração: Departamento de Estudos Técnicos do Unafisco Sindical Nota: O cálculo da redução nos encargos tributários dos bancos é resultado da seguinte contra: R$ 6.110.693 mil x 0,34 (25% IRPJ + 9% CSLL) = R$ 2.077.636 mil. Enquanto a renúncia tributária do Estado é calculada da seguinte forma: R $ 2.077.636 mil - R$ 916.603,95 (R$ 6.110.693 mil x 0,15 IR fonte) = R$ 1.161.032 mil.

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Outros privilégios tributários do capital Há ainda outros privilégios garantidos aos rendimentos e aos ganhos de capital. De forma geral, os rendimentos decorrentes do capital sofrem uma tributação a alíquota máxima de 22%. Os rendimentos de aplicações financeiras de renda fixa variam de 15% a 22,5%, de acordo com o tempo de aplicação. Os ganhos de capital são tributados em apenas 15%. A renda variável até 31/12/2001 sofreu uma incidência de apenas 10% e, a partir de 2002, de 20%. Os lucros e dividendos distribuídos e as remessas de lucros para o exterior são isentos de Imposto de Renda. Diante dessas reduzidas alíquotas e isenções e diante do disposto na legislação brasileira, o Brasil pode ser considerado um paraíso fiscal. Segundo a lei (artigo 24 da Lei n° 9.430/96), o país que tributa a renda a alíquota inferior a 20% é considerado paraíso fiscal. Em nosso entendimento, trata-se de privilégios, pois nada

justifica o tratamento diferenciado entre rendimentos do trabalho e do capital. O imposto incidente sobre o rendimento do trabalho é submetido a tabela progressiva com alíquota de até 27,5%. Ambas as rendas deveriam estar sujeitas a progressividade. A Constituição autoriza apenas a capacidade econômica como critério para distinguir os iguais dos desiguais, mas não a origem da renda. Conclusão Reconhecemos a necessidade de as microempresas e as empresas de pequeno porte terem um tratamento tributário diferenciado e favorecido com o objetivo de buscar equilíbrio na concorrência, mas entendemos que esse benefício não pode ser feito com a tirada de direitos do trabalhador e com a

fragilização da atuação do Estado no cumprimento de suas funções de garantir e fiscalizar o cumprimento das leis que protegem a sociedade. É essencial, portanto, a modificação dos dispositivos do substitutivo do PLP 123/04 que causam os prejuízos mencionados no presente trabalho. As reclamações sobre a elevada carga tributária e os problemas que as microempresas e empresas de pequeno porte enfrentam para pagar seus tributos, provavelmente não serão resolvidos com a aprovação do PLP 123/04. Em parte, porque a tributação preponderante continuará sendo sobre o consumo, que reduz o poder aquisitivo do consumidor, dificultando o crescimento econômico sustentado; em parte, porque a solução depende de mudanças na política econômica.

*Clair Maria Hickmann

Auditora-Fiscal da Receita Federal Diretora de Estudos Técnicos do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Unafisco Sindical)

Notas A presente análise foi feita com base na versão do substitutivo do PLP 123 de autoria do Deputado Luiz Carlos Hauly, de 23/05/2006. Constituição Federal, art. 146. Cabe à lei complementar: III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003). Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d, também poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, observado que: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003). I - será opcional para o contribuinte; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) II - poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) III - o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) IV - a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) 3 Ver nesse sentido: Maria Helena Zockun (Coord.) “Simplificando o Brasil: propostas de reforma na relação econômica do governo com o setor privado”. São Paulo: Fipe, outubro de 2005. 4 Dados dos países da OCDE disponíveis em http://www.oecd.org/document/60/0,2340,en_2649_201185_34413308_1_1_1_1,00.html 5 Excluindo as receitas previdenciárias. 1 2

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ARTIGO

Homenagem a Ignácio Rangel : lucros, juros e salários na economia brasileira Ceci Vieira Juruá* As políticas neoliberais alimentam entre nós uma nova fase de (re)concentração da Renda Nacional. Este artigo procura chamar a atenção para este processo, recorrente entre nós, e o faz utilizando os dados da Contabilidade Nacional e dos balanços das sociedades anônimas. Para uma reflexão em torno desse tema, precisamos lançar mão de “velhas teorias” e dos antigos mestres que desenvolveram análises lúcidas e competentes a partir de um pensamento descolonizado e liberado das ortodoxias elaboradas nos países centrais. Ignácio Rangel foi um deles e este artigo procura relembrar algumas teses que ele desenvolveu para explicar os movimentos tendenciais da economia brasileira. 1-Registros contábeis da Macroeconomia e dos Balanços empresariais 1.1-A análise da distribuição primária da Renda Nacional, nas Contas Nacionais do Brasil,

registra uma queda, na participação dos rendimentos do trabalho, de um nível superior a 50% para menos do que 40% ao longo da década neoliberal. Sem querer, aqui, fornecer um entendimento global e muito menos definitivo sobre as mudanças ocorridas na distribuição da renda, tarefa que é regularmente desenvolvida pelas universidades e por institutos de pesquisa, permito-me alguns comentários a respeito dos dados da tabela 1. a) A queda na participação dos rendimentos do trabalho está necessariamente vinculada a três fatores principais: aumento do desemprego e da informalidade no mercado de trabalho, desindexação dos salários com perda do poder aquisitivo real, e privatizações seguidas de demissões maciças nos setores de insumos básicos, serviços públicos e infra-estrutura econômica (energia, transportes, telecomunicações). Essa queda na massa global de rendimentos dos trabalhadores só

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Tabela 1

Brasil – Contas Nacionais Relação Entre as Remunerações do Trabalho (RT), o Excedente Operacional Bruto (EOB) e os Impostos sobre a Produção/ Importação. 1991-95 e 1999-2003 R.T

E.O.B

I/Produção

1991

50,7

46,8

2,5 100

1992

52,1

45,5

2,4 100

1993

53,8

42,2

4 100

1994

48,2

46,2

5,6 100

1995

46

48,4

5,5 100

1999

40,3

42,8

16,9 100

2000

39,9

42,7

17,4 100

2001

38,9

42,9

18,2 100

2002

37,8

43,8

18,4 100

2003

37,2

44,9

17,8 100

Fonte: IBGE, Contas Nacionais, conta de distribuição primária da renda (tabela 2), para os anos 1999 a 2003. Sistema de Contas Nacionais Brasil, 1990-19951

não foi maior porque ainda não foram eliminadas nem reduzidas as contribuições sociais destinadas à Seguridade Social que representavam, na primeira metade dos anos 1990, aproximadamente

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“Na Economia Pública, e em outros campos das ciências sociais, qualquer generalização apresenta riscos. É preciso aprofundar a análise para levar em conta as mudanças de metodologia que ocorreram na Contabilidade Nacional, bem como as desigualdades na distribuição do ônus tributário”. ¼ da renda da força de trabalho. b) O excedente operacional bruto (juros, lucros e aluguéis) é um agregado que sinaliza a participação das remunerações do capital na renda. No Brasil, ele tem sido sistematicamente maior do que a parcela devida aos trabalhadores e não é, portanto, um fenômeno novo. Lucros e juros excepcionais, conforme observamos na economia brasileira, estão normalmente associados, entre nós, à acumulação rentista e à forte presença de monopólios e oligopólios transnacionais no sistema produtivo. Nos tempos atuais, o aumento da parcela da renda apropriada pelos proprietários do capital, sob forma de juros e de lucros, apóia-se na multiplicação de Sociedades Anônimas, grandes empresas de capital aberto com ações nas

Bolsas de Valores, e nos Fundos de Investimento, entidades de aplicação dos ativos líquidos das corporações e conglomerados. c) O forte aumento da participação dos impostos sobre a produção e importação, é um fenômeno mais recente, mais contraditório e complexo do que os dois movimentos anteriores. Ideologicamente é um contrasenso, pois o (neo)liberalismo prega com vigor o dogma de que uma redução de impostos é saudável para o conjunto do sistema econômico. Do ponto de vista institucional, também não é fácil entender um aumento tão vigoroso da carga dos tributos indiretos, apesar das privatizações e dos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Na verdade, o aumento registrado no peso relativo dos im-

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postos não está vinculado à folha de pessoal, pois esta representa tão somente 27% das despesas primárias do Governo Central. Nem aos gastos do INSS, que permanecem em modesto patamar inferior a 9% do PIB.2 Este aumento deve-se basicamente à disparada alucinante do montante da dívida pública interna (acumulação rentista). Por meio dos tributos, o Governo amplia sua participação na renda nacional a fim de pagar juros cada vez mais volumosos aos rentistas. Além disso, parece ter ocorrido um aumento de custos nos serviços terceirizados pelo Estado. Na Economia Pública, e em outros campos das ciências sociais, qualquer generalização apresenta riscos. É preciso aprofundar a análise para levar em conta as mudanças de metodologia que ocorreram na Contabilidade Nacional, bem como as desigualdades na distribuição do ônus tributário. Sabemos que a tendência atual de aumento da carga tributária privilegiou os rentistas do lado da despesa (os juros da dívida). Do lado da receita, o aumento ficou concentrado nos impostos e contribuições da União (governo federal) e nos produtos voltados ao atendimento do mercado interno. O generoso leque de isenções e de favores tributários que vem sendo montado, desde a implantação do Plano Real, prioriza apenas o setor exportador. Em termos históricos, portanto, a novidade não é o aumento da carga tributária, novo é o direcionamento da arrecadação tributária para o enriquecimento das oligarquias locais e internacionais.


1.2 - Nos balanços das corporações (tabelas 2 e 3), verificamos que a parte dos trabalhadores no Valor Adicionado (VA) distribuído pelas grandes empresas é mínima. Na tabela 2, utilizamos, primeiro, uma média dos valores relativos a três empresas de distribuição de energia elétrica, duas operadoras de telefonia e uma grande siderúrgica. Em seguida, na tabela 3, apresentamos os dados de uma grande empresa de capital majoritariamente nacional, cujo perfil de distribuição do VA ajusta-se melhor à realidade atual, em razão da metodologia adotada na classificação dos componentes do VA. O Valor Adicionado é um conceito-chave para entender a distribuição de renda, tanto em nível agregado – a Contabilidade Nacional –, quanto no plano particular – os Balanços Empresariais. Nas empresas ou nos conglomerados, o Valor Adicionado Bruto, que exprime em termos financeiros o resultado da atividade produtiva, é obtido deduzindo-se da receita bruta os gastos com aquisição de matérias primas e outros insumos, contratação de serviços e despesas operacionais em geral. Em seguida são deduzidas depreciação e amortização para chegar ao Valor Adicionado Líquido. Após somar a este o resultado líquido de certas operações financeiras, chega-se ao Valor Adicionado a Distribuir, que deve remunerar: • o capital de terceiros, obtido por crédito e empréstimos; • o capital próprio, dos acionistas da empresa; • a força-de-trabalho diretamente empregada, mediante salá-

Brasil – Balanços de algumas Sociedades Anônimas, ano de 2005 Participação no Valor Adicionado a Distribuir das Remunerações do Capital, do Trabalho e de Outros, inclusive Governo Tabela 2

Empresas selecionadas aleatoriamente % no VA a distribuir Empresas

Capital

Trabalho

Outros

Distribuidoras EE

38%

6%

Siderúrgica

36%

10%

55%

Oper.Telefonia

30%

9%

62%

59%

Tabela 3

Distribuição do VA em empresa padrão selecionada Empresa padrão selecionada

Financiadores

Acionistas

Empregados

Governo

Reinvestimento

4%

24%

10%

24%

38%

rios e contribuições sociais; • a infra-estrutura coletiva (ou “capital social”) colocada à disposição da empresa, remuneração devida ao Governo sob a forma de impostos sobre a produção e a comercialização dos bens e serviços produzidos. Há, além disso, um montante que pode ser reservado e permanecer na empresa para colaborar no financiamento de novos investimentos. Este é o papel do reinvestimento que exprime, grosso modo, a poupança empresarial retida. Na empresa que selecionamos como “padrão” a título ilustrativo, há um nível razoável de endividamento que se exprime numericamente nos 4% do VA destinado aos financiadores. A parte distribuída aos acionistas é substancial, 24%, tanto quanto a parcela “social”, os tributos devidos ao Governo. Mas o que fica claro, nas tabelas 2 e 3, é a parte menor

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que cabe aos trabalhadores, apenas 10% do Valor Adicionado distribuído. Os restantes 90% constituem o excedente operacional, no plano empresarial, cuja destinação já apontamos nos parágrafos anteriores. Observamos assim que os resultados financeiros, que aparecem nos balanços empresariais, reiteram e ajudam a perceber os mecanismos que impulsionam a tendência de empobrecimento dos trabalhadores sinalizada pelas contas nacionais. É claro que os resultados obtidos pelas sociedades anônimas não são generalizáveis para o conjunto de milhões de pequenas e médias empresas que integram o sistema produtivo brasileiro. Na maioria das pequenas empresas a realidade é bem distinta – não há lucros, há uma imensa dificuldade de recolher os impostos devidos, e mesmo a folha de pessoal dificilmente é suportada com tranqüilidade. Não há dinheiro fácil (como há nas S/A que obtêm dinheiro emitindo

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ações cuja remuneração vai depender do mercado), não há crédito subsidiado nem isenção de impostos. Quando muito há um regime especial de tributação, o Simples. Nem há possibilidades de aumentar os preços para ter uma certa lucratividade perante consumidores depauperados e perante a brutal concentração de capital que coloca os fornecedores de bens e serviços a reboque da exigência de altos lucros das grandes empresas para as quais eles trabalham. A miopia empresarial e o desconhecimento da realidade que extrapola o seu pequeno mundo fazem com que os pequenos empresários engrossem o coro daqueles que “satanizam o Estado”, o velho bode expiatório. Não percebem o efeito de sucção do excedente econômico realizada pelas grandes empresas. Não conseguem realizar a passagem

da micro para a macroeconomia. Esta é a tarefa que nos cabe neste momento difícil: esclarecer e explicar, debater e persuadir. Só podemos fazê-lo recorrendo à nossa própria história e aos velhos mestres, sobretudo aqueles que, como Ignácio Rangel, Celso Furtado, Florestan Fernandes, Caio Prado Júnior, e tantos outros, desenvolveram uma visão abrangente e de longo prazo da economia brasileira. No pequeno espaço deste artigo, quero apenas destacar uma contribuição de Ignácio Rangel, quando ele vincula as dificuldades de um crescimento econômico vigoroso à pobreza do mercado consumidor interno e às necessidades de um investimento farto, superdimensionado, mas capaz de restabelecer um certo equilíbrio ao sistema econômico que se defronta com dificuldades para aplicar produti-

“A miopia empresarial e o desconhecimento da realidade que extrapola o seu pequeno mundo, faz com que os pequenos empresários engrossem o coro daqueles que ‘satanizam o Estado’, o velho bode expiatório. Não percebem o efeito de succção do excedente econômico realizado pelas grandes empresas”.

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vamente o seu excedente, a mais valia social. 2 - Ignácio Rangel e a propensão a consumir A propensão a consumir é um conceito keynesiano que indica, em um processo de crescimento econômico, o quanto da renda adicional será destinado ao consumo. Na teoria keynesiana, quanto maior a propensão a consumir, maiores serão as expectativas quanto aos efeitos positivos dos investimentos em termos de emprego e de renda. Comentando os enfoques estruturalista e monetarista no debate sobre política monetária, enfoques equivocados para ele, Rangel (1963) esclareceu: “Na raiz de todos esses equívocos vamos encontrar a absurda teoria de que o Brasil é um país de muito elevada propensão a consumir.... Porque a verdade é que o Brasil é um país de baixíssima propensão a consumir – e nem se pode conceber que seja de outro modo, dado o atual esquema de distribuição de sua renda. Assim, é que um país de demanda crônica e necessariamente insuficiente, se apresenta, para quem não possa erguer o chamado ‘véu monetário’, como um país de demanda excessiva”; Na seqüência Rangel explica que “a propensão a consumir pode ser definida como uma função inversa da taxa de exploração.” Sendo elevada a taxa de exploração no sistema econômico brasileiro, há grandes possibilidades, no curto prazo, de se realizar


investimentos vultosos geradores de emprego e de renda, condição essencial, para ele, ao equilíbrio do sistema econômico. “Em resumo, a saúde do sistema econômico brasileiro assenta, não numa razoável taxa de exploração, mas numa enérgica formação de capital, capaz de absorver parcela decisiva da mais valia social”. Como não relacionar, em nossos dias, a arguta observação de Ignácio Rangel ao clamor, quase consensual, pela ampliação da taxa de investimentos públicos e privados? O investimento apresenta-se como um mito, a grande salvação, à esquerda e à direita. À esquerda, garante-se que o fraco nível atual dos investimentos decorre das abusivas taxas de juros. À direita, argumenta-se que o investimento é fraco porque o Estado gasta muito e cobra impostos excessivos. Não estaremos aí perante dois equívocos? Se uma taxa baixa de juros fosse suficiente para induzir novos investimentos, porque o Japão tem suportado, há longos anos, uma forte estagnação de sua economia, mesmo tendo reduzido a zero sua taxa de juros? E se o investimento decorre de impostos excessivos, porque não crescemos em ritmo forte nos anos 1980, quando a carga tributária era de cerca de 2/3 da atual? Dirão eles, à esquerda e à direita, que outros fatores foram determinantes. Se é verdade que há outros fatores que influenciam o ritmo de investimentos e de crescimento da economia, o que é muito estranho é que não seja

“Se uma taxa baixa de juros fosse suficiente para induzir novos investimentos, porque o Japão tem suportado, há longos anos, uma forte estagnação de sua economia, mesmo tendo reduzido a zero sua taxa de juros?” colocada, de forma clara, a questão-chave: –Porque as empresas iriam investir em um mercado que não cresce, que não se expande, um mercado formado por consumidores cuja renda está estagnada? Um mercado que passa por um processo de (re)concentração de renda alimentado por lucros excessivos, por juros abusivos, e por uma carga tributária iníqua e improdutiva canalizada para os rentistas. Quando a pergunta é colocada dessa forma, o rol de problemas é bem distinto daquele apontado pelos neoliberais. Políticas públicas que visam dinamizar o mercado interno não podem se reduzir a benefícios assistenciais e à ampliação dos já fartos incentivos tributários3; elas precisam objetivar o crescimento do

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emprego, o aumento do poder aquisitivo dos salários e da renda dos trabalhadores onde estão localizados 90% da população brasileira. Para identificar de onde podem sair os recursos que dinamizem o poder de consumo dos brasileiros não é preciso muito esforço, basta analisar as contas nacionais e os balanços dos bancos e das grandes empresas nacionais e transnacionais. À esquerda, os equívocos concentram-se no “espírito cristão”, na esperança de que a solidariedade, os programas de combate à fome e uma educação fictícia possam efetivamente produzir uma redistribuição de renda. Vã ilusão! Concede-se com a mão esquerda migalhas do que é distribuído com a mão direita, a mão que assina e autentica os privilégios do capital: juros, lucros e incentivos fiscais.

*Ceci Vieira Juruá

Economista

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Notas As remunerações do trabalho, o excedente operacional bruto e os impostos sobre a produção/importação são os tres componentes do Valor Adicionado Bruto (a preço básico) na economia. Tendo em vista os objetivos desse estudo, deixaram de ser considerados, na tabela acima, os rendimento de autônomos e os subsídios à produção (que constituem, em média, um percentual inferior à 2%, nos últimos anos. Mas que chegaram a representar 80%, em 1982, e sempre mais do que 10% nos outros anos) 2 Giambiagi, Fabio. “Mantega terá que dar um basta no crescimento do gasto.” Jornal Valor, A13, de 3 de abril de 2006. 3 Nos últimos anos foram concedidos inúmeros privilégios tributários ao grande capital. Cálculo da Unafisco Sindical indica que, em 2004, o Governo deixou de arrecadar, via Imposto de Renda (IR), R$ 11 bilhões, graças aos seguintes privilégios tributários: permissão para deduzir do lucro tributável os juros sobre capital próprio (-R$ 3,1 bilhões), isenção de IR para a distribuição de lucros e dividendos (-R$4,9 bilhões) e isenção tributária na remessa de lucros para o exterior (-R$ 3,3 bilhões). Jornal dos Economistas, Corecon-DF, jan/fev 2006. 1

Referências Bibliográficas Balanços empresariais publicados em jornais. IBGE. Contas Nacionais RANGEL Ignácio. A Inflação Brasileira. Ed. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro/1963 (2ª edição).

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Clínica Odontológica Santiago Paiva Ltda SCS Quadra 04, Lote A, Número 49, Sala 502/504 - Edifício Embaixador - Setor Comercial Sul. Fone: (61) 3233-4092, 3223-1936 ou 3223-4469. Vantagens: 10% de desconto sobre a tabela dos valores de referência para procedimentos odontológicos (VRPO) da ABO-DF (Associação Brasiliense de

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Multicópias SCS Qd. 02, Bloco B, Sobrelojas 07 a 15 do Ed. Palácio do Comércio - Setor Comercial Sul, Brasília-DF, CEP 70.318-900 - Fone: (61) 3036-2780. E-MAIL: multi@multicopiasgrafica.com.br. Vantagens: desconto de 15% para pagamento a vista em todos os serviços oferecidos pela empresa.

Theriaga - Farmácia de Manipulação W3 Sul Qd. 507, Bloco B, Lojas 09/10. Cep: 70.351-520. Fone: (61) 3443-4591 e Fax: (61) 3443-7126. Vantagens: compras de R$ 40,00 a R$ 89,00, 6% de desconto; compras de R$ 90,00 a R$ 159,00, 7% de desconto; compras acima de R$ 160,00, 11% de desconto. Obs: descontos não válidos para suplementos e medicamentos industrializados

CONVÊNIOS RENOVADOS (benefícios adicionais) •

Ótica Paulo Santana Ltda SCLS 104, Bloco “C”, loja 01 - Asa Sul. Fone: (61) 3225-3288. Vantagens: 15% nas compras a vista sobre o preço de tabela. Faturamento pelo preço de tabela, com uma entrada mais quatro pagamentos, em 30, 60, 90 e 120 dias, sem acréscimo.

Associação dos Analistas e Profissionais de Investimentos do Mercado de Capitais - APIMEC SHCS CR QD 507 Bloco “C” Loja 21 – 2° Pavimento – Asa Sul – Brasília-DF. Fone: (61) 3443-4003. SITE: www.apimecdf.com.br. E-MAIL: apimecdf@apimecdf.com.br. Vantagens: para os economistas registrados e em dia com suas obrigações, descontos ou valores diferenciados em cursos, nas mesmas condições oferecidas aos próprios associados da entidade promotora.

Revitare – Centro de Estética Avenida W3 Sul, Qd. 516, Bl. “C”, Sl. 29. Fones: (61) 3245-3540 / 9103-3889. Vantagens: 20% de desconto para pagamento a vista nos tratamentos corporais; 10% de desconto para pagamento a vista no tratamento facial; ou, ainda, desconto de 10% para pagamento em até quatro vezes nos tratamentos corporais; avaliação corporal e facial grátis, e a primeira sessão de tratamento corporal grátis.

Instituto Mauá de Pesquisa e Educação Via EPTG CA Vicente Pires, 54, salas 101/132 - Taguatinga-DF. CEP 72.000-995 Fone: (61) 3397-5251. SITE: www.maua.com.br E-MAIL: secretaria@mauadf.com.br. Vantagens: descontos de 20% sobre as mensalidades nos cursos de pósgraduação lato sensu.

CONVÊNIOS RECADASTRADOS •

Editora da UnB Fones: (61) 3226-7312 / 3226-6874. SITE: www.editora.unb.br. E-MAIL: livrariavirtual@editora.unb.br. Vantagens: 15% nas compras a vista em publicações da Editora UnB; 5% nas compras de publicações de terceiros (os descontos não se aplicam a produtos em promoção).

Clínica Pediátrica 0 a 18 SEPS 710/910, Sala 326 - Centro Clínico Via Brasil - Asa Sul. Fone: (61) 3244-9329 ou 3442-8326. Vantagens: 40% de desconto nas consultas de pediatria geral e endocrinologia pediátrica, e 20% de desconto nas consultas de homeopatia pediátrica. Obs: consultas com hora marcada.

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Co n v ê n i o s d e Assistência e outros •

Penna Fernandez, Safe Carneiro & Caldas Pereira Advogados Associados SHIS, QL 14, conjunto 07, casa 12, Lago Sul, Brasília/DF CEP: 71640-075. Fone: (61) 3364-3040 – E-MAIL: caldaspereira@caldaspereira.adv.br. Vantagens: a banca oferece descontos progressivos na assinatura do Plano Corporativo de Assistência Jurídica.

IBEP - Instituto Brasil de Extensão e Pós-Graduação CLSW Qd. 301 Bloco “C”, Sala 61. Cep: 70.673-603. Setor Sudoeste. Fones: (61) 3341-2114 - Fax: (61) 3342-5668. SITE: www.ibepdf.com.br. E-MAIL: atendimento@ibepdf.com.br. Vantagens: preço especial para economistas regularmente registrados no curso de MBA em Empreendedorismo e Projetos Financeiros, que está disponível no site: www.corecondf.org.br/convenios.asp (link para maiores informação no nome do curso) Obs: oportunidade de capacitação profissional. Todos os cursos possuem a disciplina Metodologia do Ensino Superior como opcional - 60h. Valor da matrícula para qualquer curso: R$ 110,00.

Hotel Mar del Plata, Praia Hotel e Victória Palace Hotel Av. Madre Maria Vilac, esq. Rua dos Eucaliptos, Canasvieiras - Florianópolis/SC. CEP 88.054-001. Ligações Nacionais: (48) 266-1949, 9982-0499. SITE: www.mardelplata.com.br e www.vitoriapalacehotel.com.br. E-MAIL: mardelplata@mardelplata.com.br . Vantagens: 20% de desconto no valor da tabela vigente no período de baixa temporada (15 de abril a 15 de dezembro), e desconto de 10% da tabela vigente no período de alta temporada (15 de dezembro a 15 de abril). Hotel Quinta Santa Bárbara Situado à Rua do Bonfim, nº 1, Pirenopólis - Goiás. Fone: (62) 331-1304. Vantagens: 20% para ocupações feitas no período de baixa temporada; 10% para ocupações feitas nos períodos de alta temporada, isto é, fins de semana, férias e feriados (os descontos não se aplicam às diárias de hospedagem em promoção).

Editora Contexto Cadastre-se no SITE: www.editoracontexto.com.br . E-MAIL: contexto@editoracontexto.com.br. Vantagens: 20% de desconto para livros de Economia.

Pousada Camelot Rodovia GO 118, Km 168, entrada da cidade de Alto Paraíso/GO. Fones: (62) 3446-1581 (reservas) e 3446-1449. SITE: www.pousadacamelot.com.br. E-MAIL: pousadacamelot@pousadacamelot.com.br. Vantagens: 15% de desconto nas hospedagens pelo preço de balcão a todo associado, inclusive acompanhado de seus dependentes.

Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) Vantagens: as publicações encontram-se à disposição no Corecon-DF, com 30% de desconto para economistas em dia.

Instituto de Cooperação e Assistência Técnica da Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal – Icat/AEUDF Fone: 3224-2905. SITE: www.aeudf.br . Vantagens: 10% de desconto nos cursos de pós-graduação.

Rede de Drogarias Rosário Fone: (61) 3212 1000. Vantagens: 8% de desconto pela tabela da Drogaria Rosário.

Convênio de cooperação e parceria Corecon-DF / CRA-DF Cooperação e parceria visando à soma de esforços e recursos, com o objetivo de promover a realização de cursos para os associados. Matrículas nas mesmas condições dos associados dos respectivos Conselhos.

Hotel Manhattan Plaza SHN Quadra 02 Bloco “A” - Setor Hoteleiro Norte/Asa Norte. Fone: (61) 3319-3543 e Fax: (61) 3328- 5685 (Manhattan Plaza Hotel) SITE: www.manhattan.com.br. E-MAIL: reservas@manhattan.com.br.

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Vantagens: 54% de desconto de 2ª a 6ª-feiras sobre a tarifa-balcão e 62% de 6ª a 2ª-feiras sobre a tarifa-balcão para os economistas de todo o Brasil registrados e em dia com suas obrigações, bastando para tal benefício apresentar sua carteira profissional. •

Hotel Kubitschek Plaza SHN Quadra 02 Bloco “E” - Setor Hoteleiro Norte/Asa Norte. Fone: (61) 33193543 e Fax: (61) 3328- 9366 (Kubitschek Plaza Hotel). SITE: www.kubitschek.com.br . E-MAIL: reservas@kubitschek.com.br . Vantagens: 54% de desconto de 2ª a 6ª-feiras sobre a tarifa-balcão e 62% de 6ª a 2ª-feiras sobre a tarifa-balcão para os economistas de todo o Brasil registrados e em dia com suas obrigações, bastando para tal benefício apresentar sua carteira profissional.

Hotel Alvorada SHS Quadra 04 Bloco “A” - Setor Hoteleiro Sul/Asa Sul. Fone: 3322-1122. SITE: www.alvoradahotel.com.br. E-MAIL: reservas@alvoradahotel.com.br. Vantagens: 20 % de desconto na alta temporada sobre a tarifa-balcão e 30% de desconto sobre a tarifa-balcão em baixa temporada para os economistas de todo o Brasil registrados e em dia com suas obrigações, bastando para tal benefício apresentar a carteira profissional.

Aracoara Hotel SHN Quadra 05 Bloco “C” - Setor Hoteleiro Norte/Asa Norte. Fone: (61) 34249222 e Fax: (61) 3424-9200 SITE: www.aracoara.com.br. E-MAIL: hotel@aracoara.com.br. Vantagens: 40% de desconto de 2ª a 6ª-feiras sobre a tarifa-balcão e 50% de desconto de 6ª a 2ª-feiras sobre a tarifa-balcão. Essas vantagens são oferecidas aos economistas de todo o Brasil registrados e em dia com suas obrigações, bastando para tal benefício apresentar sua carteira profissional.

Hotel Porto da Ilha Rua Dom Jaime Câmara, 43 - Florianópolis/SC. Fone: (48) 3322-0007. SITE: www.portodailha.com.br. E-MAIL: hotelpi@matrix.com.br. Vantagens: descontos: 25% de segunda a sexta-feiras, e 28% sábado e domingo, sobre o valor da diária, com apresentação da carteira de identidade profissional.

Cambirela Hotel Av. Max Schramm, 2199 - Florianópolis/ SC. Fone: (48) 281-3100. SITE: www.cambirela.com.br . E-MAIL: cambirela@amauri.com.br . Vantagens: desconto: 30% sobre o valor da diária de balcão vigente, com apresentação da carteira de identidade profissional.

Baía Norte Palace Hotel Av. Rubens de Arruda Ramos, 220 - Florianópolis/SC. Fone: (48) 229-3144. SITE: www.baianorte.com.br . E-MAIL: reservas@baianorte.com.br . Vantagens: desconto de 25% sobre o valor da diária, com apresentação da carteira de identidade profissional.

Hotel Coronel Bertaso Av. Getúlio Dorneles Vargas, 52-S - Chapecó/SC. Fone: (49) 322-4444. SITE: www.hotelbertaso.com.br. E-MAIL: reservas@hotelbertaso.com.br . Vantagens: desconto de 20% sobre o valor da diária, com apresentação da carteira de identidade profissional.

Coral Plaza Hotel Rua Felipe Schmidt, 1320 - Florianópolis/SC. Fone: (49) 225.6002. SITE: www.coralplaza.com.br. E-MAIL: coralplaza@westcoral.com.br . Vantagens: desconto de 40% sobre o valor da diária, com apresentação da carteira de identidade profissional.

Hotel Carlton SHS Quadra 05, Bloco “G” - Setor Hoteleiro Sul. Asa Sul. Tel: (61) 3224-8819 e Fax: (61) 3226-8109 (Carlton Hotel Brasília). SITE: www.carltonhotelbrasilia.com.br . E-MAIL: carlton@carltonhotel.com.br . Vantagens: desconto de 50% sobre as tarifas de hospedagem-balcão de 2ª a 5ª-feiras e desconto de 60% sobre as tarifas de hospedagem-balcão de 6ªfeiras a domingos, com a apresentação da carteira de identidade profissional. Observação: sobre todas as tarifas acrescentar 10% de taxa de serviço.

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ARTIGO

As receitas de prestação de serviços dos bancos Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – Dieese Nos últimos anos, a sociedade brasileira tem tomado conhecimento dos excelentes resultados apresentados pelos bancos, instituições que registram sucessivos recordes de lucro a cada exercício contábil1. Esses ganhos têm despertado a atenção, principalmente diante do baixo dinamismo da economia, refletido nas modestas taxas de crescimento econômico. Desde meados dos anos 90, com a estabilização de preços posterior à implantação do Plano Real, o setor financeiro vem expandindo seus ganhos. Desde então, o lucro dos bancos eleva-se a cada ano, enquanto a atividade econômica mantém um desempenho ainda insuficiente para atender às necessidades de expansão do emprego e da renda do trabalhador. Em outras palavras, o lucro dos bancos cresce independentemente de a economia caminhar a passos lentos. Nos anos 80, o setor bancário no Brasil deu início a um intenso ajuste estrutural, com a introdução da automação dos serviços de atendimento ao público. Em meados daquela década, as diretrizes econômicas do Plano Cruzado fizeram com que os bancos iniciassem novas estratégias de atuação para operar num cenário de baixa inflação. No entanto, só a partir do Plano Real esse cenário foi, finalmente, consolidado. Nesse

aspecto, o Plano Real desempenha papel diferenciado em relação aos planos anteriores, na medida em que mantém, a todo custo, a política de estabilidade dos preços. Com isso, os bancos reiniciaram nova fase de adaptação. A queda abrupta dos altos índices de inflação inviabilizou os ganhos com floating. Ou seja, o ambiente inflacionário garantia, por si só, elevadas receitas aos bancos, na medida em que os recursos captados2, praticamente sem remuneração, eram aplicados com taxas de retorno altamente lucrativas. Ameaçados por essa perda, os bancos desenvolveram uma série de novas estratégias com vistas a manter seus lucros. Para isso, diversificaram o mix de produtos e serviços ofertados e, ao mesmo tempo, construíram um eficiente sistema de cobrança de tarifas bancárias, passando a cobrar por serviços até então gratuitos, entre os quais, extratos bancários, emissão de cheque de baixo valor, renovação de cadastro de cheque especial, remessa domiciliar de talão de cheques e manutenção de cartão magnético. Participação das receitas de prestação de serviços no resultado dos bancos No cenário de controle inflacionário, os ganhos arrecadados pela

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cobrança de tarifas bancárias conquistam uma importância maior no resultado dos bancos, em substituição às receitas anteriormente proporcionadas pelos altos índices de inflação. Em 1994, as receitas de prestação de serviço representavam 6,25% no total das receitas do setor bancário, subindo para 12,7% ao final de 20053. Ainda assim, os ganhos decorrentes das elevadas taxas de juros e das operações de crédito são responsáveis pela maior parcela do lucro dos bancos. Um recente estudo4 revela que a partir do conceito de valor adicionado (a contribuição de cada componente na geração da renda da atividade bancária), tanto as operações de crédito como as de tesouraria contribuem com 9% do valor adicionado destinado ao lucro líquido dos bancos. Isto é, do total de R$ 59,1 bilhões e R$ 28,1 bilhões da geração do valor adicionado, apenas R$ 5,5 bilhões e R$ R$ 2,6 bilhões são distribuídos, respectivamente, na forma de lucro líquido. Por outro lado, do total do valor adicionado pela prestação de serviços a parcela destinada ao lucro líquido atinge 12%, ou em termos absolutos, são distribuídos na forma de lucro líquido R$ 4,9 bilhões de um total de valor adicionado de R$ 39,8 bilhões. Segundo o estudo, na prestação de serviços, de cada R$ 1,00 recebido, 22% foram para pagamento

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das despesas de pessoal, 51% para outras despesas estruturais, 15% para tributos e 12% para o lucro. Ou seja, na margem, a prestação de serviços é mais lucrativa aos bancos. As conclusões estão fundamentadas no resultado apresentado por esses bancos no primeiro semestre de 2005. A crescente imposição de cobrança pelos serviços bancários e a política de contenção nos gastos de pessoal contribuíram para aumentar o grau de eficiência dessas instituições, segundo alguns padrões de eficiência definidos pelo mercado financeiro. Em dezembro de 1994, a soma de todas as receitas de prestação de serviços do setor “cobriam” 26,0% do total das despesas de pessoal. Em 2005, a cobertura subiu para 113,9%. A razão para essa mudança é que, entre dezembro de 1994 e dezembro de 2005, o montante das Receitas de Prestação de Serviços aumentou 582,0%, em valores nominais, enquanto as Despesas de Pessoal cresceram 56,5%, diante de uma inflação acumulada de 168,9% segundo o Índice do Custo de Vida (ICV), calculado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – Dieese. O impacto para o cliente Se, de um lado, a cobrança de serviços contribui para aumentar o

lucro dos bancos, de outro, reduz a renda líquida do cliente. A esse respeito, a Fundação Procon/SP realiza mensalmente um levantamento5 dos valores das tarifas bancárias (avulsas e pacotes de serviços) de um conjunto de produtos/serviços básicos utilizados pelos clientes bancários. Para isso, é definido o perfil de um cliente hipotético a partir da utilização de determinados serviços e produtos. No último levantamento, realizado no início de fevereiro, o custo médio mensal de um “pacote/cesta” era de R$ 22,48, contra R$ 18,57, de março de 2005, representando aumento real de 16,4%. Com isso, o custo que correspondia a 7,14% do salário mínimo vigente em março de 2005 sobe para 7,49% em fevereiro de 2006. No entanto, se o cliente faz opção por pagar tarifas avulsas pelos mesmos serviços disponíveis naquele “pacote/cesta”, o custo médio mensal sobe para R$ 28,06, que representa um acréscimo de R$ 5,58 mensais em relação à opção anterior, representando 9,35% do salário mínimo vigente. Segundo a Pesquisa de Emprego e Desemprego, realizada pelo Dieese e a Fundação Seade, em fevereiro de 2006 o rendimento médio real dos assalariados do setor privado, na Região Metropolitana de São Paulo, era de R$ 1.205 na Indústria; R$ 867 no Co-

mércio e R$ 1.079 nos Serviços. Logo, o valor médio de R$ 22,48 do “pacote/cesta” representa respectivamente 1,9%, 2,6% e 2,1% desses rendimentos. No entanto, ao considerar o valor pago em forma de tarifas avulsas, no valor de R$ 28,06, os respectivos percentuais sobem para 2,3%, 3,2% e 2,6%. O valor anual pago pela contratação de um “pacote/cesta” (R$ 269,76) ou em forma de tarifas avulsas (R$ 336,72) supera o valor de uma cesta básica. Diante do impacto destas cobranças, é importante destacar algumas iniciativas com vistas a inibi-las. A categoria bancária, por exemplo, defende a negociação de uma cláusula uniforme sobre a isenção do pagamento de tarifas, capaz de garantir esse direito de forma igualitária a todos os trabalhadores bancários. Mas, por ora, essa questão depende das negociações realizadas em cada banco isoladamente. A proposta de isenção de tarifas também está presente nos editais de licitações de folha de pagamento dos servidores de algumas prefeituras municipais. Registra-se ainda o Projeto de Lei Complementar nº 233/2005, em trâmite no Congresso Nacional, que proíbe a cobrança de tarifas bancárias nas contas funcionais (abertas para recebimento de salários).

Notas Entre 1994 e 2005, o lucro líquido global dos 11 maiores bancos registrou aumento de 1.797% e a rentabilidade patrimonial média saltou de 14,1% para 23,3%. 2 Depósitos à vista, recursos de cobrança e recursos de terceiros em trânsito. 3 Cálculo realizado a partir de dados consolidados no site do Banco Central do Brasil. 4 Estudo sobre a apuração do spread da indústria bancária, elaborado pela Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (FIPECAFI). 5 O levantamento analisa tarifas avulsas e pacotes/cestas (conjunto de serviços oferecidos aos clientes mediante a cobrança de uma tarifa mensal debitada de sua conta corrente) dos 10 maiores bancos. Nesse caso, os valores encontrados não consideram quaisquer indicadores de reciprocidade (saldo médio, poupança, aplicações, empréstimos, seguros etc.) 1

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Auditoria como conhecimento econômico Fernando M. R. Bittencourt *

Não perguntamos ao sonhador por que está sonhando, não requeremos do pensador as razões do seu pensar, mas de um e de outro quereríamos conhecer aonde os levaram, ou levaram eles, o pensamento e o sonho, aquela pequena constelação de brevidades a que costumamos chamar conclusões.1 1 - Introdução Este estudo pretende formular uma abordagem inicial, de um ponto de vista conceitual, da prática da auditoria tal como se veio a configurar na sociedade contemporânea. Seu foco está na auditoria como demanda social, e nos contornos gerais da sua prática, apresentando um marco geral que parte da abstração das principais características da auditoria moderna (“qualquer” auditoria), com a subseqüente menção a um conjunto das suas várias modalidades2. Em seguida, é discutida a

vinculação da auditoria com o conhecimento econômico, apresentando-se por fim a questão da inserção da auditoria no campo profissional do economista. 2 – Em busca do sentido da auditoria A palavra “auditoria” nos dias de hoje tem inúmeros sentidos, praticamente um para cada pessoa e para cada contexto em que é utilizada. No cotidiano social, “auditoria” pode ser freqüentemente associada a “fiscalização”, descoberta de irregularidades e ilícitos. Pede-se uma “auditoria” em resposta a qualquer denúncia ou suspeita (geralmente em matéria econômica ou financeira), qualquer que seja o grau de precisão dessas suspeitas. Em meios empresariais ou técnicos, “auditoria” é entendida mais precisamente como a atividade de verificação contábil, que ocupa a parcela mais visível e numerosa daqueles profissionais que

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se denominam auditores. Nesse ambiente, a tentativa de se obter precisão na definição desse termo faz com que a referência a uma demanda por fiscalização seja amiúde acompanhada de análises baseadas nas normas e padrões da auditoria estritamente contábil (ainda que não se esteja tratando de contabilidade ou demonstrativos financeiros).3 De fato, a denominação e os primeiros passos das atividades que hoje se conhecem por auditoria no mundo ocidental tiveram origem nas verificações de contas financeiras devidas a proprietários privados e aos tesouros reais4. Não trataremos aqui da evolução histórica dessa atividade, que já tem bibliografia extensa e satisfatória5. É suficiente lembrar que essa trajetória da auditoria levou-a, nos dias de hoje, a alcançar espaços muito mais amplos que a mera revisão de documentos contábeis. Basta então constatar agora que a visão convencional da auditoria

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“No caso mais comum da empresa comercial, os registros contábeis têm sido um dos repositórios de informação mais importantes no monitoramento dos contratos, e freqüentemente os direitos e obrigações dos atores são estabelecidos em função dos números contábeis”. (tanto no senso comum quanto no jargão habitual dos negócios) tornou-se incapaz de oferecer um sentido comum para usuários, profissionais e governo. Não se trata apenas de “dar um nome”. A formulação adequada de conceitos a respeito de qualquer objeto de conhecimento é o primeiro passo para abordálo e gerar informação sobre ele, quer no sentido teórico, quer na sua aplicação prática – “para estudar atributos, o pesquisador deve, em primeira instância, reconhecer o objeto, o ser, cujos atributos quer estudar”6. Pois bem, sendo insuficiente recorrer ao registro histórico da auditoria para situá-la contemporaneamente, e sendo ainda menos útil a simples listagem das diferentes práticas atuais (mesmo supondo que essa extensa compilação fosse materialmente possível, o que parece bem pouco sensato), como se pode iniciar a abordagem desse tema? Várias tentativas de aproxi-

mação se fizeram, uma delas, com pretensões generalizantes, situa a auditoria no contexto geral da “teoria da agência”. De forte base microeconômica neoclássica, inicia constatando que a organização da atividade econômica em firmas somente pode ser alcançada mediante contratos entre os indivíduos que aportam algum recurso (capital, força de trabalho, capacidade gerencial, tecnologia) para o empreendimento comum. Tais contratos especificam os direitos específicos de cada parte (acionistas, credores, gerência, trabalhadores) sobre os resultados da firma. Estes contratos, porém, não serão instrumentos eficazes para administrar o conflito de interesses entre cada um dos indivíduos intervenientes caso cada uma das partes não possa saber se eles estão sendo cumpridos pelos demais. Diversos recursos de informação devem então ser mobilizados para o “monitoramento” dos contratos.

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No caso mais comum da empresa comercial, os registros contábeis têm sido um dos repositórios de informação mais importantes no monitoramento dos contratos, e freqüentemente os direitos e obrigações dos atores são estabelecidos em função dos números contábeis. No entanto, os próprios registros e demonstrativos contábeis são também suscetíveis de conflitos de interesses na sua produção, portanto exigem um outro instrumento de verificação para que as partes que não produzem essa informação (essencialmente, para todos os demais que não fazem parte da administração direta da organização) tenham maior confiança em que os números estejam apresentados segundo critérios por eles aceitos7: De fato, dado que muitas das previsões contratuais e legais dirigidas a reduzir os custos de agência referem-se a magnitudes contábeis, [..] e que, em geral, a contabilidade oferece informação indireta sobre o rendimento da gestão, os administradores devem preocupar-se com oferecer antecipadamente credibilidade aos investidores em relação à integridade da informação contábil; e para tal finalidade não lhes resta mais remédio que contratar os serviços de um auditor externo, posto que a informação interna – na medida em que é formulada por quem tem incentivos para retocá-la e inclusive falsificá-la em seu favor – não oferece confiabilidade ou credibilidade.8 Este caso particular (a garantia de alguns contratantes, como credores ou acionistas, frente à


confiabilidade das informações produzidas por outra parte contratante, a gerência da empresa) ilustra a formulação geral feita pela teoria da agência quanto ao papel da auditoria: sempre que há uma relação entre duas partes em que uma delas (o “agente”) deve render contas de suas ações a outra parte (o “principal”), e sempre que esta relação é tão complexa que os principais estão distantes das ações dos agentes e são incapazes de verificá-las pessoal e diretamente, surge a demanda pela auditoria, como forma de defesa dos “principais” contra o moral hazard9 (porque os agentes têm presumivelmente interesses distintos e contrários aos dos principais, e podem agir contra estes últimos) e contra as “assimetrias de informação” (porque os agentes encontramse em posição de maior acesso aos fatos e dados da realidade envolvida, inclusive podendo alcançar o poder de manipular a produção da informação para fazê-la atender aos seus próprios interesses)10. Esta abordagem da auditoria tem seus méritos. Identifica elementos fundamentais a considerar em qualquer situação: a relação de prestação de contas entre partes; o conflito de interesse latente entre os indivíduos envolvidos; o conteúdo essencialmente informacional dessa “economia do controle” em que se vê envolvida a auditoria11. Estes elementos estarão presentes em todos os desenvolvimentos conceituais posteriores, inclusive os que apresentaremos neste trabalho. Em particular, a noção de uma relação de prestação de contas entre partes ganhou noto-

riedade e peso no debate público: mais conhecida como a expresão original accountability, não mais se pode pretender discorrer sobre a governança pública ou empresarial sem tê-la em papel central. Mas não seguiremos por este caminho, apesar de aproveitar suas contribuições. É preciso explicar porquê. Power12 lembra que esta abordagem abstrai completamente o contexto institucional em que estão inseridos os “agentes” e “principais”: diferentes comunidades instituirão diferentes formas de accountability nas quais as próprias categorias de “agente” e “principal” terão atores diferentes (quem serão, por exemplo, os “principais” relevantes numa relação de prestação de contas de uma empresa pública: os acionistas? os contribuintes? os residentes em sua área de atuação? todos os eleitores?). Indo além, deixamos esta

trilha essencialmente porque, à semelhança da economia neoclássica, limita-se a umas quantas hipóteses abstratas que são desdobradas em conclusões dedutivas que estão contidas nas premissas de partida. Ainda que epistemologicamente inatacável, esta visão não leva a lugar algum: “Como no caso de toda teoria dedutiva, não se pode ir mais longe do que indagar se ela tem algum valor explicativo”13. Na insubstituível descrição de Celso Furtado: “Em outras palavras, ignoremos o mundo real e observemos uma caixa vazia. E começava a descrever essa caixa [..]”14. Além do questionável ponto de partida, esta abordagem leva a deduções curiosas como a de que o “mercado” poderia antecipar qualquer risco de manipulação contábil por parte da gerência de uma empresa e descontá-lo no custo do capital fornecido, razão pela qual quem mais “precisaria”

“Esta abordagem da auditoria tem seus méritos. Identifica elementos fundamentais a considerar em qualquer situação: a relação de prestação de contas entre partes; o conflito de interesse latente entre os indivíduos envolvidos; o conteúdo essencialmente informacional dessa ‘economia do controle’ em que se vê envolvida a auditoria”.

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“A auditoria, em particular, reconhecidamente ‘tem sido concebida como uma disciplina em que se prestou uma especial atenção a suas aplicações práticas e ocorreu uma importante exclusão de suas considerações teóricas’”. da auditoria independente seria a própria gerência (e não os investidores e credores)15. Por mais estarrecedor que seja, esse resultado é decorrência inexorável das hipóteses utilizadas16. Dedução perfeita, mas de escassa utilidade fora da caixa vazia da teoria. Mais importante ainda, discutir a auditoria nos termos em que colocamos o problema exige, sobretudo, observar a sua finalidade real, os seus efeitos. Exige fazer a ponte entre teoria e prática, abstraindo da realidade concreta algum quadro teórico de referência para a análise, montar os conceitos dedutivos para com eles acolher a investigação empírica, e jamais esquecer as implicações para a ação. No campo da ação pública, esta não é uma situação inusitada: a evolução da análise de políticas públicas (que tem grandes áreas de interseção com nosso tema principal, como adiante se verá) experimentou contínuas redefinições entre “teoria” e “prática“, “ciência” e “consultoria”, “inputs” e “outputs”, que em muito se assemelham às tentativas de entender “a idéia de auditoria”17. A auditoria, em par-

ticular, reconhecidamente “tem sido concebida como uma disciplina em que se prestou uma especial atenção a suas aplicações práticas e ocorreu uma importante exclusão de suas considerações teóricas”18. 3 – A auditoria como demanda (ou programmatic demand of audit) Para tanto, podemos tentar em primeiro lugar, e brevemente, contextualizar a demanda social pela auditoria: seria possível (mediante generalizações empíricas que certamente terão caráter tentativo e provisório) descrever o que se demanda, o que se vem pedindo à auditoria ? Em seguida, o que se poderia generalizar das práticas daqueles que se têm como auditores em geral e que assim são considerados ? No primeiro ponto, a moderna sociedade ocidental tem vivido, na opinião de alguns autores19, uma “explosão da auditoria”: No fim dos anos 80 e começo dos anos 90, a palavra ´auditoria´ começou a ser usada na

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Inglaterra com freqüência crescente numa ampla variedade de contextos. Além da regulação da contabilidade da empresa privada pela auditoria financeira, práticas de auditoria ambiental, auditoria de desempenho, auditoria de gestão, auditoria forense, auditoria de sistemas de informação, auditorias de propriedade intelectual, auditoria médica e auditoria da tecnologia emergiram e, em graus variados, adquiriram um certo patamar de aceitação e estabilidade institucional. Um número crescente de indivíduos encontrou-se sujeito a novas ou mais intensas exigências de contabilidade e auditoria. Em resumo, uma crescente população de ´auditados´ começou a experimentar uma onda de verificações formalizadas e detalhadas sobre o que eles fazem.20 Esta é a primeira acepção de auditoria que nos importa considerar: a “auditoria como demanda”21. Toda prática social pode ser caracterizada por aspectos programáticos (normativos) e tecnológicos (operacionais). Os elementos programáticos são as idéias a respeito da missão ou finalidade daquela prática, idéias que têm o (crítico) papel de vincular essa prática aos objetivos sociais mais amplos que circulam na esfera política. Nessa visão “programática” da auditoria, são formuladas demandas amplas aos auditores em geral, e de alguma maneira presume-se que a prática deles é capaz de atender a tais demandas. Já a “tecnologia” da auditoria compõe-se das tarefas e rotinas mais ou menos concretas que são levadas a cabo pelos praticantes – amostragens, checklists,


revisões analíticas, etc22. E como “demanda” a auditoria é, supostamente, toda forma de abertura das organizações a um escrutínio externo independente, que se destina a fornecer uma base de recursos de informação para o controle efetivo dessas organizações23 por todos aqueles que tenham direito a exercê-lo24. Assim, a cada percepção de fraude ou problemas em algum ramo de atividade, surge o clamor por “mais auditoria”, reforçando as expectativas sociais em torno de algum agente verificador que, por procedimentos mais ou menos claros, possa “regularizar” ou “moralizar” esse setor. Curiosamente, a constatação de fracassos das auditorias em atender a estas intenções em casos individuais não dá margem a uma quebra na confiança “programática” na auditoria como meio de prevenção de fraudes ou irregularidades, mas tão somente abre espaços para demandas por mudanças ou reformas visando a uma auditoria “melhor” (“Auditores são censurados, conferências são organizadas, artigos são publicados e, com muita freqüência, novas orientações de auditoria são editadas. As coisas então ´acomodam-se´ até a próxima ocorrência.”25). Essa prevalência de expectativas recorrentes quanto a soluções que venham, genericamente, da “auditoria”, pode ser ilustrada exatamente pelo mais estrondoso fracasso de qualquer intenção de controle e prevenção de fraudes no mundo corporativo da época recente: os escândalos contábeis ocorridos no mercado de capitais mundial (especialmente no norte-americano) a partir de 1999.

Diante da constatação de um elenco enciclopédico de fraudes de toda natureza26, a reação coletiva (tanto dos governos quanto dos mecanismos de auto-regulação dos mercados financeiros e capitais, assim como da imprensa e opinião pública em geral) vem no sentido de estabelecer mais e mais rigorosas normas e novos critérios para as práticas de auditoria. A materialização quase simbólica da reação da economia mundial aos episódios de fraude e manipulação corporativa é a lei federal norte-americana Sarbanes-Oxley, logo reproduzida em legislações ao redor do mundo.27 E Sarbanes-Oxley nada mais é que a criação de novas regras e estruturas para a prática da auditoria contábil e da produção da informação contábil que é publicada e auditada28. O apelo programático da “auditoria como solução” é tão impactante, então, que a resposta a um autêntico colapso de todos os mecanismos de controle (regras e auditoria) é exatamente ... mais auditoria! Enfim, nosso objeto de estu-

do não é uma mera especulação teórica: sob essa denominação, existem poderosos interesses e atores sociais. É necessário, portanto, seguir na busca de seus fundamentos. Porém, antes de passar à segunda vertente (a auditoria como “tecnologia”), é legítimo a qualquer observador questionar a plausibilidade de toda esta expectativa social que envolve a auditoria como demanda. Aquilo que a auditoria pode oferecer à sociedade corresponde ao que dela se espera? As respostas disponíveis, a partir da generalização empírica, não são otimistas. Power29 estende o conceito relativamente conhecido do “excesso de expectativas” sobre o parecer do auditor independente das demonstrações contábeis30 para um gap mais amplo entre a auditoria como demanda e as reais capacidades operacionais de sua prática: [..] este nível de atração programática pela idéia de auditoria e o nível da tecnologia de auditoria estão vinculados de uma forma apenas precária. O campo

“O apelo programático da ‘auditoria como solução’ é tão impactante, então, que a resposta a um autêntico colapso de todos os mecanismos de controle (regras e auditoria) é exatamente ... mais auditoria”.

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da auditoria é caracterizado por uma defasagem entre a explosão de demandas e expectativas programáticas quanto à auditoria e as estórias mais ´paroquiais´ que nos são contadas sobre sua capacidade operacional subjacente.31 Então, se não há segurança em afirmar que a demanda formulada à atividade de auditoria em geral é satisfeita, qual o sentido de estudar ou escrever sobre ela? Para quê continuar? O estudo da auditoria como prática, contra viento y marea, surge como necessário exatamente porque existem intensas demandas sociais por verificação e garantia de accountability (melhor dizendo, redução dos riscos inerentes à accountability), e essas demandas não têm ainda uma correspondência na oferta dos auditores em geral. Sendo assim, qualquer análise que busque compreender o quê se produz no trabalho auditorial (ou como se o produz), por mais tentativa que

seja, tem o potencial de contribuir para a aproximação das posições divergentes do usuário da auditoria e do seu produtor – tanto de forma “educativa” (elevar a compreensão do usuário sobre “o modo pelo qual os auditores desenvolveram seu trabalho e a forma pela qual os resultados do mesmo devem ser interpretados”) quanto na vertente de “conteúdo”, buscando “soluções construtivas que tratem de satisfazer às expectativas de seus usuários, sempre que sejam razoáveis”32. Na formulação de Manuel Orta Pérez: [..] Existe uma ampla literatura sobre a prática que estamos seguros que contribuiu para melhorar a qualidade dos trabalhos que efetuam os auditores. Nosso interesse centra-se em definir os aspectos teóricos que sejam capazes de explicar o processo de auditoria.33 Mas como falar de auditoria como conjunto de práticas, se

“O estudo da auditoria como prática, ‘contra viento y marea’, surge porque existem intensas demandas sociais por verificação e garantia de accountability, e essas demandas não têm ainda uma correspondência na oferta dos auditores em geral”. Revista de conjuntura

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já descartamos uma abordagem puramente dedutiva como a da teoria de agência (dela aproveitando apenas as noções teóricas mais gerais)? De onde partir para poder contemplar a realidade da prática e os seus múltiplos contextos institucionais? 4 – Esboço de um marco conceitual provisório Tendo presente o objetivo já enunciado de contribuir para uma conexão entre teoria e prática no campo da auditoria, a solução dos problemas práticos não prescinde do desenvolvimento e utilização dos componentes teóricos da respectiva área de conhecimento.34 Isto se pode obter mediante um marco conceitual próprio que permita, dentro das limitações da teoria: a) descrever a prática existente, b) prescrever a prática futura, c) definir os termos-chave e os conceitos fundamentais35. O instrumento provisório que proporemos parte de uma conceituação de auditoria que é fruto de um longo processo de discussão e consolidação das entidades internacionais que congregam os auditores financeiros e contábeis. Frente à constatação de que os clientes demandam a esse segmento cada vez mais serviços distintos da tradicional verificação das contas anuais, estas organizações tiveram que elaborar um conceito que fosse ao mesmo tempo genérico (para abarcar toda a variedade de demandas advindas da “explosão da auditoria”) e realista (de modo a ser útil para aplicação e orientação dos auditores


em campo). Este duplo objetivo foi alcançado mediante a observação do processo de trabalho das auditorias em suas inúmeras variações, e a identificação dos seus traços ou elementos comuns36. Estes conceitos foram gerados e sistematizados por várias entidades de auditores: a International Federation of Accountants – IFAC (IFAC, 2000) e o American Institute of Certified Public Accountants – AICPA (Silva, 2000), ambos sob a denominação de Assurance Services, bem como a American Accounting Association (Pérez, 1996), esta já denominando precisamente auditoria. Uma versão com um grau maior de generalidade, utilizando-se da teoria geral de sistemas, também é apresentada em obras técnicas doutrinárias (Newton, 2001). Utilizaremos, por seu maior poder descritivo, a definição do IFAC, adaptando sua redação para os objetivos deste trabalho37: • Um serviço ou encargo de auditoria38 é a avaliação por um auditor profissional de um assunto determinado que é responsabilidade de outra pessoa, mediante a utilização de critérios adequados e identificáveis, com o fim de expressar uma conclusão que transmita a um destinatário predeterminado um certo nível de confiabilidade ou segurança acerca do assunto em questão. • Um serviço ou encargo de auditoria realizado por auditores profissionais pretende, portanto, aumentar a credibilidade da informação acerca de um assunto determinado, mediante a avaliação sobre se esse assunto guarda conformidade, em todos os seus aspectos mais significativos, com

“Uma conclusão obtida pelo auditor e transmitida às pessoas definidas nos termos de sua contratação ou encargo”. critérios adequados, melhorando assim a probabilidade de que a informação venha a atender às necessidades de seu usuário ou destinatário. • São elementos imprescindíveis de um serviço ou encargo de auditoria, portanto: a) uma relação tripartite que envolva: I) um auditor profissional; II) uma parte responsável pelo assunto determinado ou pela informação prestada; III) um destinatário predeterminado da informação; OBS: Esta é exatamente a relação de accountability que a teoria de agência destaca. b) um assunto determinado que será objeto da auditoria; OBS: Será sobre esse assunto que o auditor emitirá conclusões; pode revestir-se das mais variadas formas: dados financeiros ou não financeiros (ex: demonstrativos contábeis, indicadores de gestão, relatórios estatísticos), sistemas e processos (ex: mecanismos de controle interno ou governança corporativa), ou condutas (ex: cumprimento de leis e regulamentos). c) critérios adequados (nor-

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mas ou referências usadas como base de medição ou avaliação do objeto de auditoria); OBS: A respeito desses critérios, oferece-se amplo detalhamento adiante. d) um processo de encargo ou contratação; e OBS: Esse processo, que dará forma à missão do auditor, pode ser de iniciativa da parte responsável, do destinatário da informação ou de terceiros (a exemplo dos mandatos legais para auditoria de contas governamentais). e) uma conclusão obtida pelo auditor e transmitida às pessoas definidas nos termos de sua contratação ou encargo. OBS: A conclusão pode referir-se ao assunto objeto da auditoria em geral (ex: uma opinião sobre a prática de gestão em uma empresa), o que configuraria um “encargo de informação direta”, ou a afirmações feitas pela parte responsável acerca do assunto (ex: uma opinião sobre o relatório de gestão apresentado pelos administradores de uma empresa), o que configuraria um “encargo de autenticação” (IFAC, 2000, pp. 120-121).

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“Para que se a avaliação do auditor tenha efeitos significativos na credibilidade da informação que examina, é necessário ainda que o auditor seja independente da parte responsável pelo assunto determinado, no sentido de que não tenha interesses pessoais no resultado das verificações, o que permitirá emitir sua opinião de forma inteiramente imparcial”. • Para que se a avaliação do auditor tenha efeitos significativos na credibilidade da informação que examina, é necessário ainda que o auditor seja independente da parte responsável pelo assunto determinado, no sentido de que não tenha interesses pessoais (não seja parte interessada) no resultado das verificações, o que permitirá emitir sua opinião de forma inteiramente imparcial39. Esta independência significa a inexistência de quaisquer impedimentos pessoais, externos ou organizacionais para opinar imparcialmente em relação à matéria objeto da auditoria e em relação à parte responsável por ela. Pelas mesmas razões, a independência aqui estabelecida é de caráter objetivo, o que implica que também seja considerado um impedimento qualquer fato ou condição que possa levar razoa-

velmente um terceiro interessado a questionar a sua independência (atitude e aparência independentes).40 É necessário atentar, porém, que a independência não é obrigatória perante o destinatário da opinião do auditor: como é este destinatário que demanda a verificação da informação, poderá achar conveniente realizar os exames diretamente por seus empregados ou contratados. Neste caso, o valor da credibilidade da informação ficará restrito a este stakeholder que providenciou a execução do encargo de auditoria, não sendo o mesmo frente a terceiros não envolvidos (ex: uma empresa com uma participação acionária significativa em outra que envie seus próprios funcionários para uma revisão de contas da participada) Por fim, cabe aqui esclarecer

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uma dúvida que pode afetar os praticantes da auditoria que estejam acompanhando este esforço de sistematização: fala-se de examinar, comparar e informar. Nada se diz, no caso, sobre recomendar ou corrigir. Dificilmente um auditor experiente deixará de incluir em suas responsabilidades o trabalho de recomendar as soluções que se lhe apresentem para os problemas identificados no ente auditado. Dificilmente deixará de considerar que seu trabalho não agregará valor se não se aventurar pelo caminho da proposta de aperfeiçoamento (trilha muito mais arriscada que a simples constatação da coincidência ou não com os critérios). Não ignoramos essa posição, e de fato compartilhamos dela. Mas lembramos que o esforço que se faz aqui é no sentido estritamente analítico de identificar traços comuns das diferentes atividades de auditoria. Pretendemos inicialmente entender a auditoria como forma de produção e organização do conhecimento sobre a realidade. O uso posterior desse conhecimento, que pode ocorrer sob diversas formas que adiante veremos (simples divulgação pública; recomendações; negociações com o ente auditado; fixação de sanções), está de momento fora do nosso campo de visão. Isto põe em evidência, então, que a “lente” analítica está focalizada sobre a função de auditoria, não sobre o profissional. É evidente que aquele auditor que levanta as informações, que estabelece e confirma critérios, pode e deve reivindicar um papel relevante na aplicação do conhe-


cimento por ele gerado. A limitação de objeto que aqui estabelecemos não pretende sustentar qualquer restrição do campo de atuação do profissional auditor, mas decorre simplesmente da limitação das possibilidades deste estudo. Reconhecemos que o auditor tem várias missões relevantes, mas neste momento tentamos contribuir com ele em uma delas, a de produzir conhecimento. 5 – Todos os nomes (modalidades e práticas) [..] a palavra, a palavra, e todas as coisas deste mundo, as nomeadas e as não nomeadas, as conhecidas e as secretas, as visíveis e as invisíveis, como um bando de aves que se cansasse de voar e descesse das nuvens, foram pousando pouco a pouco nos seus lugares, preenchendo as ausências e reordenando os sentidos. 41 O marco conceitual aqui delineado, com todas as suas limitações, permite iniciar com razoável segurança o tratamento de uma parte considerável das modalidades e tipologias de auditoria com que nos defrontamos no cotidiano da prática social. Todas, ou quase todas, são verificações, por terceiros independentes, de assuntos de responsabilidade de outros, segundo critérios preestabelecidos e de conhecimento de todas as partes envolvidas, verificações estas informadas aos diferentes stakeholders. Esses assuntos podem ser da mais variada natureza. A vertente

historicamente mais tradicional e conhecida é a auditoria das demonstrações contábeis das entidades e organizações42. Esta modalidade, e apenas ela, é reconhecidamente uma atividade contábil no sentido estrito: trata-se de opinar sobre a contabilidade, a forma como ela é conduzida e registrada. A própria matéria financeira, pública e privada, contém muito mais informação que a simples correção contábil: relatórios e projeções de fluxos financeiros, os cálculos relativos a contratos, os mecanismos de salvaguarda de ativos e gerenciamento de riscos, enfim, a boa gestão financeira em função dos objetivos do usuário da informação: é a auditoria financeira43. Já a verificação da observância de uma extensa coleção de normas e procedimentos legais e regulamentares,

especialmente na área pública, perfaz a auditoria de legalidade ou conformidade44. Na interseção entre os campos financeiro e de legalidade, com grande impacto sócio-econômico, está a auditoria tributária ou de impostos45. A avaliação dos processos organizacionais de gestão de risco, controle e governança é o foco principal da auditoria interna46, operando essencialmente como um serviço de assessoramento interno às organizações. E o universo possivelmente mais amplo que se abre à auditoria pública e privada, porém, é possivelmente a auditoria de natureza operacional47, o exame da ação da entidade ou atividade auditada quanto aos aspectos da economicidade, eficiência e eficácia (como a entidade adquire, protege e utiliza seus recursos, as causas de práticas antieconômicas e ineficientes,

“A própria matéria financeira, pública e privada, contém muito mais informação que a simples correção contábil: relatórios e projeções de fluxos financeiros, os cálculos relativos a contratos, os mecanismos de salvaguarda de ativos e gerenciamento de riscos, enfim, a boa gestão financeira em função dos objetivos do usuário da informação: é a auditoria financeira”.

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o cumprimento de metas previstas) ou ainda para a efetividade de programas e projetos, isto é, em que medida as ações implementadas lograram produzir os efeitos pretendidos. A aplicação do modelo conceitual exposto permite tentar sugerir ainda muitas outras modalidades de verificação, instâncias do mesmo tipo de atividade de auditoria, entre elas variando apenas o assunto de sobre o que se vai opinar, os critérios utilizados e os destinatários da informação. Referimo-nos, por exemplo, às auditorias ambientais48, às auditorias de controle de qualidade49, às auditorias médicas50 e às auditorias de sistemas informatizados51. 6 – Auditoria e ciência econômica Onde fica, então, o economista? Dito de outro modo, em que medida a atividade de auditoria insere-se no conjunto de suas atividades? Alguém mais dogmático adotaria uma perspectiva exclusivamente positivista, e defenderia que compete ao economista elaborar explicações sobre os fenômenos econômicos?

A análise econômica se propõe, como tarefa ordinária, explicar certos fenômenos a partir de outros que são conhecidos. Esses fenômenos são tratados como variáveis toda vez que passíveis de expressão quantitativa sob a forma de grandezas arbitrárias. As relações entre as variáveis têm como fundamento último dados técnicos e o comportamento de agentes econômicos, observados uns e outros em condições que se pretendem perfeitamente definidas. As formas de comportamento dos agentes com que trabalha a análise econômica são estabelecidas a partir de dados empíricos mediante técnicas estatísticas52. Mas aí não se encerra a Economia. Desde os clássicos fundadores, conhecer o mundo econômico é meio para transformá-lo: “Neste ponto interfere, vá lá, a reflexão marshalliana segundo a qual a Economia tem como objeto ´adquirir conhecimento para seu próprio uso´, isto é, ´estudar e interpretar os fatos´ e, a seguir, saber fazer bom uso desse conhecimento na vida prática”.53 Assim, existe a necessidade de produzir informação sobre as grandezas econômicas de toda

“Onde fica, então, o economista? Dito de outro modo, em que medida a atividade de auditoria insere-se no conjunto de suas atividades”?

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natureza, segundo critérios predefinidos em função da necessidade prática da realidade material. Furtado define o problema de uma maneira mais formal: À diferença da análise, que pretende explicar o comportamento das variáveis econômicas, a política deseja condicionar esse comportamento. Com efeito: a política transforma certos valores das variáveis econômicas em objetivos a alcançar. [..]. Os problemas técnicos que coloca a política econômica são diferentes, conforme sejam os objetivos estabelecidos de forma fixa ou flexível. Contudo, os fundamentos racionais são os mesmos: transforma-se um certo número de variáveis endógenas – as incógnitas do modelo analíticos – em dados de um novo modelo. E um certo número de dados do modelo analítico, que no novo modelo assumem a forma de incógnitas, passam a ser tratados como variáveis instrumentais. Trata-se, na essência, de transformar um modelo analítico em um modelo de decisão54. Assim, os recursos e práticas da auditoria, quando versem sobre qualquer aspecto da realidade econômica, são meios de ação que completam e potencializam o papel do economista em sua função primordial de abordar os problemas do mundo econômico – nestes termos, a auditoria é, então, um dos ramos da Economia Aplicada. Através dela, recolhe ou formula os critérios econômicos (“objetivos de política econômica”, na descrição de Furtado), aplica-os ao exame da realidade e


oferece à sociedade a informação analisada e sistematizada para a tomada de decisão. 7- Auditoria e profissão do economista A pertinência epistemológica e tecnológica de uma atividade a um ramo do saber não basta, no entanto, para assegurar uma prática profissional. É preciso passar ainda pelo crivo da organização formal, jurídico-administrativa, da regulação das profissões. Campo tradicionalmente conflitivo (“trincheiras, fortalezas, Linhas Maginot encarando Linhas Siegfried”55), sujeito à “balcanização de territórios profissionais”. 56 No âmbito da profissão de economista, a reflexão sobre a inserção da auditoria no campo profissional é razoavelmente recente, somente tendo sido explicitada através da Resolução 1612/95 do Conselho Federal de Economia.57 Daquele singelo texto pioneiro, que refletia as primeiras demandas surgidas pela atividade dos economistas, a reflexão no âmbito da profissão estendeu-se e ganhou profundidade, sendo coroada pela inclusão pelo Conselho Federal de Economia, no texto da nova regulamentação profissional consolidada, de dispositivos que explicitam minuciosamente a afinidade da auditoria no campo profissional.58 Em seus fundamentos, a regulamentação esclarece que: a) a Auditoria Externa é serviço (contratual ou obrigatório por lei) no qual um profissional técnico avalia uma determinada matéria ou informação (responsa-

“A pertinência epistemológica e tecnológica de uma atividade a um ramo do saber não basta, no entanto, para assegurar uma prática profissional. É preciso passar ainda pelo crivo da organização formal, jurídicoadministrativa, da regulação das profissões”. bilidade de outra parte), mediante o uso de critérios adequados e identificáveis, com o fim de expressar uma conclusão que transmita a um terceiro destinatário um certo nível de confiança sobre a matéria ou informação em questão; sua finalidade é de aumentar a credibilidade da informação sobre uma matéria ou informação determinada, mediante a avaliação de se a mesma guarda conformidade, em todos os seus aspectos mais significativos, com critérios adequados, aumentando assim a probabilidade de que a matéria ou informação esteja de acordo com as necessidades do seu usuário ou destinatário;59 b) a Auditoria Interna é atividade de avaliação independente, dentro da organização da qual faz parte, tendo por objetivo o

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exame e avaliação da adequação, eficiência e eficácia dessa organização; de seus sistemas de controle, registro, análise e informação, e do desempenho das áreas em relação aos planos, metas e objetivos organizacionais (emitindo opinião conclusiva ou considerações a respeito das operações examinadas, e avaliando os fluxos, sistemas, plano de controle interno e desempenho da organização ou de qualquer de seus segmentos). 60 E qual é o objeto, o “assunto determinado” em relação ao qual o economista desenvolverá trabalhos de auditoria? Todo o vasto universo de questões econômicas que a lei confere aos cuidados dos economistas, ou as “questões atinentes à economia nacional e às economias regionais, ou a quaisquer de seus

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setores específicos e dos meios de orientá-las ou resolvê-las através das políticas monetária, fiscal, comercial e social”, a “organização e racionalização do trabalho”.61 Estas resoluções contêm, no formato sintético exigido por um texto normativo, os conceitos que aqui foram descritos, fruto de uma longa evolução conceitual em nível internacional. A abordagem consciente da auditoria por parte permite aos economistas incorporarem à sua prática profissional um recurso metodológico e de conhecimento bastante útil à geração de valor por parte da análise econômica (uma vez que o economista pode lidar com as potencialidades e

limitações desse instrumento). O conhecimento em profundidade da atividade de auditoria permite, também, fundamentar solidamente as posições dos economistas em atividade nesse âmbito dentro do áspero embate regulatório, fortalecendo seu espaço a partir da demonstração da pertinência epistemológica, técnica e social de sua atuação na

auditoria de temas econômicos, pertinência esta que é a única razão que legitima a fixação de espaços reservados pela regulamentação das profissões. Como auditor, o economista somente poderá subsistir afirmando-se “antes pela sua suficiência ético-técnico-científica do que por uma epidérmica proeminência corporativa”62.

*Fernando M. R. Bittencourt

Economista e consultor. Analista do Tribunal de Contas da União

Notas 1

Saramago, 1997 p. 216 Uma versão de maior extensão e profundidade desta seção do texto pode ser encontrada em Bittencourt, 2005. 3 Salvador, 2000, p. 41; Izique, 2004, p. 22 4 Power, 1999, p. 16; García, 1999, pp. 168-172. 5 Power, 1999, pp. 16-20 e 45-49; também Motta, 1992 e Pollit, 1999. 6 Pereira, 2001, p. 30. 7 Watts & Zimmermann, 1986, pp. 196-199; também Rabelo & Silveira, 1999, pp. 6-8. 8 Paz-Ares, 1996, pp. 31-32. (tradução do autor deste artigo) 9 A tradução literal dessa expressão seria “risco moral”. Preferimos manter aqui a expressão original para evidenciar que se trata de um construto teórico específico, que apenas tem um significado claro no contexto semântico de textos de ciência social (na vertente metodológica da rational choice ou public choice), podendo ser confundida se a utilizarmos no sentido literal fora desse contexto. 10 Power, 1999 p. 5 11 Díaz, 1996, pp. 51-55 12 Power, 1999, p. 5 13 Furtado, 1985, p. 140 14 Furtado, 1985, p. 139 15 Paz-Ares, 1996, pp. 29-31 16 Especialmente a Efficient Markets Hypothesis (EMH) – Watts & Zimmermann, 1986, pp. 17-19 17 Power, 1999, p. 4; Meny & Thoenig, 1992, pp. 43-46; Reis, 2000, pp. 45-46. 18 Pérez, 1996, p. 11 (tradução do autor deste artigo) 19 Power, 1999, pp. 3-9 (a obra de Michael Power é seminal para essa vertente do estudo da auditoria); Pentland, 2000, pp. 307-309. 20 Power, 1999, p. 3 (tradução do autor deste artigo). 21 Traduzimos por “auditoria como demanda” as expressões “audit as program” e “programmatic demand fo audit” originais de Power (1999) Uma primeira opção havia sido “auditoria como programa , mas o uso didático de versões anteirrores deste texto revelou que essa opção causa entre muitos leitores confusão entre o conceito de que se trata e a noção instrumental de “programa de auditoria”, de uso corrente na terminologia técnica de auditoria, e que denota exatamente o contrário (é um componente da “auditoria como tecnologia”). 2

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Power, 1999, p. 6. Observe-se que a distinção entre “programa” e “tecnologia” foi formulada em caráter geral para qualquer prática social (Rose & Miller, 1992), e é utilizada nos mesmos termos por Pentland (2000, p. 309)

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Note-se que por “organizações” podemos entender uma empresa comercial, uma entidade governamental, uma política pública, um conjunto de prestadores de serviço ou qualquer empreendimento conjunto entre pessoas. 24 Estas partes com interesses legítimos no empreendimento já foram contempladas no debate público (técnico e político) com a denominação stakeholders. 25 Power, 1999, p. 33 (tradução do autor deste artigo)” 26 Listados de maneira didática em Bergamini Jr., 2002. 27 Bergamini Jr., 2002, p. 44; Olmo, 2001, pp. 21-22; McConnel & Banks, 2003; Lorinc, 2004 28 Olmo, 2001, p. 22 (tradução do autor deste artigo) 29 Power, 1999, p. 7 30 “Excesso de expectativas” ou audit expectations gap, fenômeno recorrente segundo o qual o público espera que “o auditor contribua a proteger os interesses dos acionistas, credores, empregados e o público em geral, dando-lhes segurança da exatidão das demonstrações contábeis, a continuidade do funcionamento da sociedade, a existência de fraudes, o cumprimento correto por parte da sociedade de suas obrigações fiscais, previdenciárias e legais e a atuação responsável da sociedade em termos meio-ambientais e sociais” (Taboada, 2000, p. 1000), esperança esta inteiramente em desacordo com a capacidade informativa dos pareceres de auditoria contábil (García, 2000, pp. 21 e 35; Taboada, 2000, pp. 100-101) 31 Power, 1999, p. 7 (tradução do autor deste artigo) - mesmo sentido, Pentland, 2000, p. 309. 32 García, 2000, p. 35 (tradução do autor deste artigo) 33 Pérez, 1996, p. 11. (tradução do autor deste artigo) 34 Pérez, 1996, p. 11. (tradução do autor deste artigo) 35 Pérez, 1996, p. 11. 36 As definições que passaremos a expor inserem-se numa seqüência epistemológica que busca paralelo com os métodos da Economia Política clássica. Esta ciência, segundo Oskar Lange (Lange, 1986, pp. 97-99) caracteriza-se por três comportamentos sucessivos de pesquisas: a abstração, a concretização progressiva e a verificação. O primeiro passo, que é o que nos interessa aqui, “consiste em isolar, pelo pensamento, os elementos essenciais - quer dizer, aqueles que, em condições determinadas, se repetem constantemente – do processo econômico, assim como as relações constantes que surgem entre eles”. Essa abstração busca eliminar “tudo que é secundário, fortuito, isto é, que só se produz de tempos em tempos, ´por acaso´, e em destacar o que, em condições determinadas, se produz constantemente, se repete constantemente, isto é, o que é essencial, ou seja, necessário.” É o produto dessa abstração, no caso da auditoria, que apresentaremos aqui, avançando sumariamente em algumas aplicações de concretização progressiva, e esperando suscitar conclusões suficientemente interessantes para que sejam aperfeiçoadas e tomadas por hipóteses válidas para verificação. 37 IFAC, 2000, pp. 116-121. Para efeitos comparativos, as outras definições são: Auditoria: “Es el proceso sistemático de obtener y evaluar objetivamente la evidencia acerca de las afirmaciones relacionadas con actos y acontecimientos económicos, a fin de evaluar tales declaraciones a la luz de los criterios establecidos y comunicar el resultado a las partes interesadas.” (Pérez, 1996, p. 21, grifos no original) Assurance services são “os serviços profissionais independentes que aperfeiçoam a qualidade das informações e/ou seu contexto para os usuários”. (Silva, 2000, p. 40) Auditoria “es la función independiente al sistema de comparar (o sea, el auditor sería el grupo de controle) las características o condiciones controladas, a través del uso de pautas, normas o elementos para medirlas (sensor), determinar las desviaciones e informar al organismo o sector del cual la auditoría depende (grupo activante) el que está jerárquicamente ubicado por encima del sistema auditado. (Newton, 2001, p. 5). 38 Assurance services, em inglês; Encargos de confiabilidad, em espanhol 39 Valderrama, 1997, p. 117 40 GAO, 1992, pp. 3-4 / 3-5 41 Saramago, 2000 p. 127 42 Valderrama, 1997, pp. 21-24; Franco & Marra, 1995, p. 53 43 GAO, 1992, p. 2-2 44 Anglès, 1999, p. 29; TCU, 2003, p. 15; IGAE, 2001, p. 219 45 Newton. 2001, p. 5.; Bravo, 1998, pp. 423-424 46 Diamond, 2002, p. 6; Valderrama, 1997, pp. 26-27; Newton, 2002, p. 60; Jund, 2002, pp. 26-27 47 Nos estudos voltados ao setor privado, pode-se encontrar referências a auditoria operacional, auditoria operativa, auditoria gerencial, auditoria administrativa, auditoria de operações, auditoria organizativa (Mas & Ramió, 1997, pp. 29-30; Newton,2001, p. 61, Valderrama, 1997, p. 27-27.). Já naquelas obras enfocando o setor público, a variedade não é menor: auditoria de desempenho ou de performance, com suas subdivisões de auditoria de economia e eficiência e auditoria de programas; auditoria de natureza operacional, divididas em auditoria de desempenho operacional e avaliação de programas; controle financeiro de programas; value-for-money audit Anglès, 1999, p. 11; GAO, 1992, p. 2-3; TCU, 2000, pp. 15-20; Power, 1999, pp. 49-50; RRV, 1999, p. 17; IGAE, 2001, pp. 219-220; Fernández-Molina, 1996, pp. 173-175). 48 Lima, 2000; Power, 1999, pp. 60-66 e 85-86 49 Werkema, 1995, p. 106; Power, 1999, pp. 57-60 50 Power, 1999, pp. 104-111 51 Piattini & Del Peso, 1998, especialmente pp. 28-29; AUDIBRA, s.d. 52 Furtado, 1979, p.81. 53 Mendes, 2001, p. 54. Itálicos no original. 54 Furtado, 1979, p. 279. Itálicos no original 55 Mendes, 2001, p. 67 56 Mendes, 2001, p. 68 57 Publicada no D.O.U. de 25.09. 95. Hoje esta Resolução está revogada pelos normativos adiante citados.

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Capítulo 2.3.1 (itens 2 alínea ´o´ e 3.3) e Nota Técnica 10.4 da Consolidação da Regulamentação Profissional do Economista, Anexo III da Resolução 1737/2004 do Conselho Federal de Economia, publicada no D.O.U de 07/07/2005, íntegra dos textos disponível em <www.cofecon. org.br>. 59 Nota Técnica 10.4 da Consolidação da Regulamentação Profissional do Economista, item 3 60 Nota Técnica 10.4 da Consolidação da Regulamentação Profissional do Economista, item 4 61 Decreto Federal 31794/1952; Capítulo 2. 2 (item 1) da Consolidação da Regulamentação Profissional do Economista, Anexo III da Resolução 1737/2004 do Conselho Federal de Economia, publicada no D.O.U de 07/07/2005, íntegra do texto disponível em <www.cofecon.org.br>. Repare-se, aqui, no cuidado que a regulamentação tem em não recorrer à simples em favor de privilégios cartoriais, reconhecendo que existem áreas instrumentais que não são inerentes à matéria econômica (como a simples escrituração contábil - Nota Técnica 10.4 da Consolidação da Regulamentação Profissional do Economista, item 6) 62

Mendes, 2001, p. 68

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