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ANO VII • Nº 29/30 • janeiro/junho de 2007

Conjuntura

Revista de

Publicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

ArtigoS A Nova Série das Contas Nacionais – referência 2000 Roberto Luís Olinto Ramos

Complexo do rio Madeira Bolívar Pêgo Carlos Campos Neto

Perdas da Poupança com os Planos Bresser, Verão e Collor

Novo cálculo do PIB possibilitará maior crescimento econômico ao País?

José Luiz Pagnussat

Região metropolitana de Brasília: um fosso entre o DF rico e o entorno metropolitano empobrecido Júlio Miragaya

Licitações pelo prisma da Teoria dos Jogos: o papel da Auditoria José Henrique Fernandes Borges

ISSN 1677-0668

ENTREVISTA O professor do Instituto de Economia da UFRJ Francisco Eduardo Pires de Souza fala sobre o cenário econômico internacional e os impactos na economia mundial

Em março deste ano o IBGE divulgou mudanças na fórmula de cálculo do PIB. Segundo alguns especialistas estas revisões visam medir com mais qualidade a atividade econômica. Para outros, estas mudanças foram encaradas de forma positiva para o crescimento do País. Com a nova metodologia, o PIB em 2005 ficou 11% maior, colocando o Brasil na 8ª posição entre as maiores economias do mundo.


IBRASE Instituto Brasiliense de Estudos da Economia Regional

Projetos Avaliações Análises de risco Oportunidades de negócio Assessoria e consultoria econômica

Entidades associadas: Corecon/DF – Conselho Regional de Economia do Distrito Federal • Sindecon/DF –Sindicato dos Economistas do Distrito Federal • ACDF – Associação Comercial do Distrito Federal • Dieese/DF – Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos • Fecomércio – Federação das Indústrias do Distrito Federal • CUT/DF – Cental Única dos Trabalhadores do DF • Sebrae/DF – Serviço de Apoio às Pequenas e Médias Empresas do Distrito Federal • IEL/DF – Instituto Euvaldo Lodi • Fibra – Federação das Indústrias de Brasília • UnB – Universidade de Brasília • UCB – Universidade Católica de Brasília • UniDF – Centro Universitário do Distrito Federal • Cesubra – Centro de Ensino Superior de Brasília • Faculdade Euro-Americana

(61) 3225-9242


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Nesta edição

Conjuntura Revista de

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A Nova Série das Contas Nacionais – referência 2000

Roberto Luís Olinto Ramos

Publicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

ANO VII • Nº 29/30 • janeiro/junho de 2007

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Complexo do rio Madeira

Bolívar Pêgo Carlos Campos Neto

4 editorial 5 entrevista

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Francisco Eduardo Pires de Souza

Perdas da Poupança com os Planos Bresser, Verão e Collor

José Luiz Pagnussat

28 capa

Novo cálculo do PIB possibilitará maior crescimento econômico ao País?

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Região metropolitana de Brasília: um fosso entre o DF rico e o entorno metropolitano empobrecido

Júlio Miragaya

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Licitações pelo prisma da Teoria dos Jogos: o papel da Auditoria

José Henrique Fernandes Borges

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DF: Tempos Modernos

Luiz Ernesto Antunes de Oliveira

A assinatura da Revista de Conjuntura pode ser efetuada contactando o Corecon/DF. O valor da assinatura é de R$ 70,00 anuais, o que equivale a quatro edições da revista.


Conjuntura

Revista de

Publicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

Editor Responsável Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo, Conselho Editorial André Nunes, Evilásio da Silva Salvador, Humberto Vendelino Richter, José Aroudo Mota, José Fernando Cosentino Tavares, Júlio Miragaya, Maurício Barata de Paula Pinto e Mônica Beraldo Fabrício da Silva. Jornalista Responsável Daniela Lima - Reg. DRT/DF: 4926 Redação Daniela Lima Editoração Eletrônica www.arsventura.com.br Tiragem: 4.000 Periodicidade: Trimestral As matérias assinadas por colaboradores não refletem, necessariamente, a posição das entidades. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte. CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO - DF Presidente Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Vice-Presidente Roberto Bocaccio Piscitelli Conselheiros Efetivos Evilásio da Silva Salvador, José Aroudo Mota, José Luiz Pagnussat, Júlio Flávio Gameiro Miragaya, Maria Cristina de Araújo, Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo, Max Leno de Almeida, Mônica Beraldo Fabrício da Silva e Roberto Bocaccio Piscitelli. Conselheiros Suplentes André Nunes, Gilson Duarte dos Santos, Homero Gustavo Reginaldo Lima, Junia Rodrigues de Alencar, Jusçanio Umbelino de Souza, Maurício Barata de Paula Pinto, Paulo Luiz Figueiredo de Oliveira e Ronalde Silva Lins. Equipe do Corecon Angeilton Francisco Lima Faleiro, Iraci da Costa Lopes, Ismar Marques Teixeira, Jamildo Cezário Gomes e Michele Cantuária Soares. Estagiários Géssika de Freitas Souza (ensino médio) e Rafael Amaral Dornelles (economia). End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 - Brasília -DF Tels: (61) 3225-9242 / 3223-1429 3964-8366 / 3964-8368 Fax: (61) 3964-8364 E-mail: corecondf@corecondf.org.br Site: www.corecondf.org.br Horário de Funcionamento: das 8 às 18 horas (sem intervalo)

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Editorial

O Conselho Regional de Economia do Distrito Federal apresenta aos leitores da nossa Revista de Conjuntura um produto renovado, com maior número de páginas, novo desenho e diferente dimensionamento dos artigos. A nova revista passa a incluir um assunto de capa. Neste número, trata-se da nova metodologia de cálculo do PIB. A jornalista Daniela Lima entrevista a assessora do Ministério do Planejamento Aumara Bastos, o professor Dr. Carlos Alberto Ramos e o economista e mestre em Finanças Públicas pela Fundação Getúlio Vagas (FGV), Amir Khair, e lança a questão: “O novo cálculo do PIB possibilitará maior crescimento econômico ao País?” A pergunta se justifica pela possibilidade que se abre ao maior conhecimento da real participação de cada segmento econômico na composição do PIB. Daí poderão advir mudanças de expectativas quanto aos resultados de investimentos que induzirão o crescimento. Roberto Luís Olinto Ramos, Chefe da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE, explica, em seu artigo, a atualização e os procedimentos de cálculo referentes ao Sistema de Contas Nacionais do Brasil (SCN). A Revista de Conjuntura não é publicação temática. Assim, é mantido o espaço para entrevista sobre tema relevante e atual, como“O cenário econômico internacional e os impactos na economia mundial”.A propósito, diz o economista Francisco Eduardo Pires de Souza:“não faltam razões para uma crise econômica mundial séria”. Os economistas do IPEA Bolívar Pêgo e Carlos Campos Neto assinam artigo sob título “Complexo do rio Madeira”, para tratar do projeto que abrange a geração de energia elétrica, e a construção de eclusas para transposição de obstáculos à navegação do rio Madeira e seus afluentes, com vistas, inclusive, ao desenvolvimento agrobusiness na região. O professor José Luiz Pagnussat, explica e calcula as “Perdas da Poupança com os Planos Bresser, Verão e Collor”, e registra: “milhões de poupadores que possuíam depósito em caderneta de poupança na época esqueceram de buscar esse direito pacífico e recuperar a parcela expurgada de suas contas relativa à atualização monetária”. O economista Júlio Miragaya, conselheiro do Corecon-DF, trata da “Região metropolitana de Brasília: um fosso entre o DF rico e o entorno metropolitano empobrecido”.O tema foi objeto de exposição por seu autor, seguido de debate, em evento que ocorreu no auditório do nosso Conselho e que contou com a participação de prefeitos, secretários e presidentes de associações industriais e comerciais de municípios do Entorno de Brasília. Do artigo assinado pelo economista José Henrique Fernandes Borges,o leitor pode obter entendimento de como a Teoria dos Jogos pode ser empregado para “avaliar a racionalidade do comportamento teórico de empresas que se submetem à norma que regulamenta os processos licitatórios”. A seleção dos temas que compõem nossa Revista de Conjuntura ajusta-se à firme determinação do Corecon-DF de manter a qualidade – com a intenção de melhorá-la sempre – de seu veículo de comunicação com os economistas, estudantes, professores, e com o conjunto das pessoas que bem podem avaliar como a Economia atinge suas próprias vidas. Este é o nosso compromisso.


O cenário econômico internacional e os impactos na economia mundial A Revista de Conjuntura entrevistou o professor do Instituto de Economia da UFRJ Francisco Eduardo Pires de Souza sobre o cenário internacional econômico. O economista falou também sobre a grave crise na economia americana e o possível impacto na economia mundial.

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Entrevista


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“O déficit nas transações correntes dos EUA é um desequilíbrio grave, talvez o mais grave entre os problemas da economia americana. Em conseqüência deste déficit, o passivo externo líquido americano duplicou entre 2000 e 2005”

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Conjuntura

Francisco Eduardo Pires de Souza

Conjuntura - O cenário econômico internacional é preocupante? A recente instabilidade do mercado financeiro internacional é um indicador de que poderemos entrar num período de baixo crescimento ou a prosperidade mundial se manterá, ainda, por um longo período? Francisco Eduardo Pires de Souza - O quadro atual da economia mundial é bastante surpreendente. Não faltam razões para uma crise econômica mundial séria: os desequilíbrios macroeconômicos internacionais são enormes, a começar pelo déficit em conta corrente dos EUA, de 6,1% do PIB em 2006 (critério BEA); a bolha imobiliária nos EUA (e em muitas economias avançadas) estourou e os preços começaram a reverter; o preço do petróleo multiplicou por 2,5 entre 2002 e 2006, ao mesmo tempo em que as cotações de outras commodities, especialmente as metálicas, também sofreram altas extraordinárias, impondo um importante choque de custos à economia mundial. Porém, apesar

mentarem a parcela de seu portfolio aplicada em ativos de risco elevado. Em suma, apesar dos prognósticos relativamente otimistas em relação ao desfecho do atual quadro de desequilíbrios internacionais, há que ter presente a possibilidade de uma crise financeira desencadear uma recessão global, já que as fontes de tensão continuam presentes.

de todas essas tensões, o cenário que os principais analistas desenham para a economia mundial neste e nos próximos anos é de uma suave desaceleração. E isto depois de um crescimento médio mundial de 4,8% nos últimos 4 anos (bem acima, portanto, da média de 3,8% a.a. dos últimos 37 anos). Reforça esta expectativa o fato de que a recente instabilidade financeira acabou se revelando efêmera, a aversão ao risco baixou, e a liquidez internacional continua abundante. Ainda assim, não se pode descartar a possibilidade de uma crise financeira, até porque o quadro de abundância de liquidez internacional tem favorecido a adoção de posturas menos prudentes, levando os investidores internacionais a au-

(dado mais recente disponível), tendo alcançado, neste último ano a marca de 22% do PIB do país. A escalada do endividamento externo da maior economia do planeta estava se mostrando improjetável, como advertiram vários economistas norte-americanos. Para deter esta tendência, o déficit tem que ser reduzido, e a dúvida que fica é apenas se a solução se dará de forma brusca, em meio a uma crise (o chamado crash landing) ou de forma suave. O que se pode dizer a respeito disto, a partir das tendências recentes? Em primiero lugar, verifica-se que a economia americana já se desacelerou. Nos últimos 4 trimestres, o crescimento acumulado foi de 2,1%, bem abaixo do ritmo médio de 3,5%

Conjuntura - Qual a gravidade da crise na economia americana? Uma possível desaceleração da economia dos Estados Unidos terá que impacto na economia mundial? Francisco Eduardo Pires de Souza - O déficit nas transações correntes dos EUA é um desequilíbrio grave, talvez o mais grave entre os problemas da economia americana. Em conseqüência deste déficit, o passivo externo líquido (a diferença entre as dívidas e outras obrigações frente ao resto do mundo e os ativos do país no exterior) americano duplicou entre 2000 e 2005


mundial, a participação chinesa também se aproxima da americana (8,1% e 8,6% do total das exportações mundiais em 2006, respectivamente). Está ocorrendo, portanto, um deslocamento do eixo de equilíbrio da economia mundial que tem por consequência uma redução do impacto da desaceleração econômica americana sobre o mundo. Mas esta mudança no motor propulsor da economia mundial tem consequências importantes para o comércio internacional de todos os países, inclusive do Brasil. Assim, enquanto os EUA importam principalmente produtos manufaturados do Brasil, a China importa principalmente commodities minerais e agrícolas. Isto contribui para um crescimento forte do valor das nossas exportações de commodities­, ao mesmo tempo em que tem um efeito negativo

mundial e depreciação do dólar) estão contribuindo para uma correção gradual do mais sério desequilíbrio da economia americana. Se este processo vai continuar controlado e suave, é algo sobre o que não se pode ainda ter certeza.

sobre as nossas exportações de produtos manufaturados (via câmbio apreciado). Neste sentido, são mais afetados, negativamente, os setores sensíveis à taxa de câmbio, em particular os produtores de manufaturas intensivas em mão-de-obra. Os setores produtores

Conjuntura - A desaceleração da economia mundial terá que impacto na economia brasileira? Quais os setores que serão mais afetados? Francisco Eduardo Pires de Souza - Primeiramente, existe hoje a possibilidade de que a desaceleração da economia mundial seja relativamente branda, quando comparada a redução do crescimento da economia americana. E este é um dos principais fenômenos novos, responsáveis pelo surpreendente quadro mundial a que fiz referência de início. A razão é a importante mudança nos motores responsáveis pela expansão da economia mundial. De acordo com os dados do FMI, há 10 anos, o PIB da China, medido em PPP, representava 9% do PIB mundial. Em 2006 já representava 15%. No mesmo período o PIB dos EUA baixou de 21% para 19,6% do PIB mundial. Então, na atualidade, o efeito direto de um crescimento de 10% do PIB chinês é de 1,5 ponto percentual no PIB mundial, enquanto que um de 3,5% do PIB americano, como vinha ocorrendo até recentemente, tem um impacto direto de pouco menos de 0,8 ponto percentual no PIB mundial, e uma queda da taxa de crescimento do PIB americano de 3,5% para 2% teria um impacto direto de 0,3 ponto percentual a menos no PIB mundial. Em termos de comércio

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alcançado­ nos últimos 3 anos. Com isso, abriu-se um hiato razoavelmente grande entre o crescimento dos EUA e o crescimento da economia mundial (5,4% em 2006), o que contribui para que as exportações americanas cresçam mais do que suas importações. Além disso, a depreciação já experimentada pelo dólar tende a aumentar a competitividade externa dos produtos americanos. E não foi nada pequena a mudança no valor da moeda americana: o dólar começou a depreciarse no segundo trimestre de 2002 e, desde então, já caiu 29% em relação a uma cesta das 7 principais moedas, situando-se atualmente (maio de 2007) no menor nível nominal desde a queda da Ordem de Bretton Woods e o início da flutuação generalizada das moedas no mundo. Em suma, esses dois fatores (crescimento abaixo do


de ­commodities agrícolas e minerais são beneficiados, juntamente com aqueles sub-setores ou empresas que conseguirem explorar nichos na crescente demanda por importações da China. Conjuntura - Como os países emergentes, a exemplo do Brasil, podem se adaptar a esse possível cenário mundial de crise que está se formando? Francisco Eduardo Pires de Souza - Não necessariamente assistiremos a uma crise internacional. Certamente estamos tendo uma troca do motor propulsor da economia mundial dos EUA para a Ásia (principalmente China). Até alguns anos atrás, quando ocorriam problemas na economia americana ou crises em economias emergentes, o Brasil era sempre afetado da mesma forma. O principal mecanismo de transmissão das crises estava no mercado de câmbio. Diante de uma contração da liquidez internacional e do aumento da aversão dos investidores ao risco, ocorria uma contração (ou mesmo interrupção) do fluxo de recursos externos para o país, o que provocava uma escassez de divisas no mercado de câmbio e, consequentemente uma depreciação cambial e/ou redução de reservas internacionais. O Banco Central reagia elevando brusca e acentuadamente a taxa de juros e a economia do País entrava em recessão. Agora, com a drástica redução da

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vulnerabilidade externa – seja pela melhoria dos indicadores de endividamento, pela redução da necessidade de financiamento externo, ou pelo aumento espetacular das reservas – dificilmente o mecanismo de propagação da crise externa para o país funcionaria como no passado. Então esta é uma outra grande novidade – ao lado do novo contexto internacional – que torna difícil prever o impacto de uma crise nos EUA sobre a economia brasileira. A única coisa que se pode afirmar é que esse impacto será bem menor do que no passado. Conjuntura - Na sua opinião, quais os cenários mundiais mais prováveis? E em qual você apostaria? Francisco Eduardo Pires de Souza - Visto a partir da situação atual, o cenário mundial que me parece mais provável é de uma desaceleração do crescimento econômico mundial, sem, no entanto, ficar caracterizada uma situação de recessão internacional. E a razão principal para isso é, como dito anteriormente, o fato de que o “motor de propulsão asiático” está ficando cada vez mais potente e cada vez mais capaz de compensar uma desaceleração da economia americana – esta sim inevitável, e já em curso. Mas, conforme dito de início, não se pode descartar uma crise financeira, seguida de recessão, como desfecho dos principais desequilíbrios hoje presentes na economia mundial.


A Nova Série das Contas Nacionais – referência 2000 Roberto Luís Olinto Ramos

A Coordenação de Contas Nacionais do IBGE (CONAC) publicou, em março de 2007, uma revisão do Sistema de Contas Nacionais do Brasil (SCN) para o período de 1995 até 2006. Esta revisão, chamada de Nova Série das Contas Nacionais – referência 2000, foi resultado de um trabalho de mais de quatro anos onde o SCN não apenas foi atualizado em diversos conceitos e procedimentos de cálculo, como, também, foi realizada uma integração das pesquisas anuais do IBGE e dos dados do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (DIPJ) com o SCN brasileiro. Este artigo apresenta, de forma sucinta, o que foi esse processo e as mudanças realizadas nos quadros das contas nacionais. O detalhe deste processo pode ser encontrado em uma série de notas metodológicas que estão disponíveis no site do IBGE na Internet no seguinte endereço: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/ pib/default_SCN.shtm

O sistema de contas nacionais é um instrumento com um objetivo bem estabelecido: a partir de um marco estrutural, teórico, apresentar recomendações de como obter os dados para quantificar esse marco. Assim, o SCN surge a partir da interação entre desenvolver e aprimorar a base conceitual e, ao mesmo tempo, desenvolver procedimentos para quantificar estas vari-

As origens do Sistema de Contas Nacionais remontam ao relatório “Definição e medição do Rendimento Nacional e Totais Relacionados”, publicado em 1947 pelo Subcomitê de Estatísticas do Rendimento Nacional da Sociedade das Nações, sob orientação de Richard Stone (United Nations 1993). A partir deste estudo pioneiro a organização do SCN se tornou cada vez mais prioritária dentro dos organismos internacionais que procuravam uniformizar os conceitos e a estrutura de apresentação dos dados. Com o crescimento das necessidades de se aprimorar e padronizar a mensuração de agregados econômicos, estudos foram publicados e debates realizados sobre o tema. A publicação do primeiro relatório culminou em um informe, escrito por um grupo de especialistas cujo principal autor foi Richard Stone apoiados pela Secretaria Geral das Nações Unidas. O relatório tornou-se o primeiro manual amplamente adotado para a construção de SCN, o “A System of National Accounts and Supporting Tables” de 1953 (United nations 1953), conhecido como SNA-53. A partir de 1964, um novo grupo se reuniu e publicou uma revisão e ampliação deste manual em 1968. O “A System of Natinal Accounts”, o SNA 68. (United Nations 1968) Em 1982, foi instituído, pelas Nações Unidas, o Inter-Secretariat Working Group on National Accounts (ISWGNA) constituído de representantes de cinco organizações internacionais além de especialistas interna-

áveis. Um pouco da história da evolução dos SCN está associada ao desenvolvimento de recomendações práticas de como obter e/ou estimar os dados necessários para que o arcabouço teórico possa ser completado.

cionais de vários países. Este grupo trabalhou de forma coordenada para publicar em 1993 um novo e renovado manual de contas nacionais o “System of National Accounts 1993”, agora SNA 93 (United Nations 1993).

Um pouco da história das contas nacionais

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Artigo


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A transferência para o IBGE significou um enorme avanço na elaboração das Contas Nacionais do Brasil. A produção das estatísticas básicas e a elaboração das contas nacionais numa mesma instituição é um fator que permite a integração completa entre a base de dados e o SCN

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O manual de 1993 foi uma mudança forte no desenvolvimento e implementação dos sistemas de contas nacionais no mundo, pois ampliou o escopo de vários conceitos, rompeu com os quadros propostos nos manuais anteriores, ampliando-os para fornecer uma descrição mais ampla da economia, estabeleceu o sistema de contas nacionais como uma referência determinante na produção de estatísticas econômicas e procurou apresentar estruturas mais flexíveis de forma que suas recomendações possam ser adaptadas em diversas condições econômicas. Atualmente, o ISWGNA trabalha na primeira revisão do manual de 1993, prevista para ser divulgada em 2008. Um aspecto importante na elaboração do SNA 93 foi sua integração com outros manuais sobre estatísticas econômicas, como o OECD Guidelines on Foreign Direct Investment e os manuais do FMI sobre balanço de pagamentos e estatísticas financeiras do governo. É interessante observar o desenvolvimento das equipes responsáveis pela elaboração dos manuais de contas nacionais como um reflexo da complexidade que a definição clara dos conceitos adotados e a mensuração dos agregados econômicos tomou nos últimos

anos. O SNA 53 foi elaborado por uma equipe de cinco pessoas, o SNA 68 já envolveu 15 pessoas. Por fim, o SNA 93 foi elaborado por uma equipe de mais de 50 pessoas e a participação de diversas organizações internacionais. No Brasil O primeiro registro de um trabalho sobre Contabilidade Social, no Brasil data de setembro de 1948, com a publicação do livro Renda Nacional (teoria), do professor Antônio Dias Leite, tese apresentada à Escola de Engenharia da Universidade do Brasil. A primeira iniciativa para organizar equipes técnicas com vistas à mensuração de agregados macroeconômicos partiu da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro - FGV, com a criação, em 1947, do Núcleo de Economia, que iniciou o desenvolvimento de trabalhos sobre o cálculo da Renda Nacional. As primeiras estimativas da Renda Nacional Líquida, a custo de fatores, foram concluídas em 1949 e revisadas em 1950, sendo em seguida publicadas, apresentando, também, dados referentes ao ano de 1946. Após quatro anos de trabalho, com diversas adaptações metodológicas, o Núcleo de Economia foi transformado em Equipe de Estudos da Renda Nacional (EERN), para, a partir de 1951, com a criação do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE), transformar-se em Centro de Contas Nacionais (CCN), órgão responsável pela elaboração das Contas Nacionais do Brasil, até dezembro de 1986, quando a responsabilidade passou, oficialmente, para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na estrutura montada na FGV/IBRE, foi criado, também, o Centro de Estudos Fiscais que, entre outras atribuições, era responsável pela elaboração da Conta do Governo, uma das componentes do Sistema de Contas Nacionais, àquela época. A transferência para o IBGE significou um enorme avanço na elaboração das Contas Nacionais do Brasil. A produção das estatísticas básicas e a elaboração das contas nacionais numa mesma instituição é um fator que permite a integração completa entre a base de dados e o SCN. Esta união veio a atender as recomendações internacionais sobre integração na produção de estatísticas.


A nova série do SCN com referência em 20001 A arquitetura do sistema de estatísticas brasileiro mudou durante a última década. Desde meados da década de 90 o IBGE passou a produzir pesquisas

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Estas revisões são fundamentais pelo seu caráter de atualização dos dados, porém trazem o inconveniente de romperem com as séries históricas, exigindo que as análises sobre períodos mais longos sejam realizadas com cuidado e conhecimento dos procedimentos que foram adotados para cada período.

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O acompanhamento da evolução das recomendações internacionais mostra claramente que os SCN devem ser atualizados periodicamente. Estas revisões podem, de forma bastante ampla, serem classificadas em dois tipos: introdução de mudanças na estrutura do SCN, como entre o SNA de 1968 e o de 1993, e incorporação de novos dados ou atualização de conceitos (novas pesquisas ou revisões de séries históricas). Desta forma, a divulgação de uma série das contas nacionais revista e aprimorada é apenas um procedimento padrão dentro da rotina de cálculo de séries de variáveis econômicas. Estas revisões, por um lado, são fundamentais pelo seu caráter de atualização dos dados, porém, por outro, trazem o inconveniente de romperem com as séries históricas, exigindo que as análises sobre períodos mais longos sejam realizadas com cuidado e conhecimento dos procedimentos que foram adotados para cada período. No Brasil, durante todo o período de cálculo dos agregados das contas nacionais, várias revisões foram realizadas. A publicação da série do Produto Nacional Bruto e Líquido data de 1953, com dados para 1947 – 1952. Já em 1956 o sistema é adequado, dentro do possível, às recomendações do SNA de 1953. Em 1962, nova revisão na série é realizada pela FGV. Durante os anos seguintes várias alterações tiveram que ser realizadas, causadas por alterações nas estatísticas disponíveis. Em 1973, a FGV mantém a estrutura do manual de 1953, mas incorpora recomendações do manual de 1968. Em 1984, completam a passagem para o sistema preconizado pelo SNA 68. As séries eram revistas sempre que se publicava um censo econômico pelo IBGE. Em dezembro de 1987, com a publicação do sistema de contas nacionais com base no SNA1993, o IBGE faz uma revisão radical no sistema de contas brasileiro rompendo com o chamado Sistema de Contas Consolidado, que vinha sendo publicado desde do período da FGV, com base no SNA 68, e passa a publicar um SCN de acordo com as recomendações internacionais mais recentes. Nesta revisão há, efetivamente, uma ruptura fun-

damental na estrutura do SCN, passando-se a publicar um conjunto de quadros mais amplo e complexo que o anterior. Foram introduzidas as Tabelas de Recursos e Usos (TRU), a Conta Econômica Integrada por setor institucional (CEI) e mudou o cálculo dos valores constantes. Estes eram calculados a preços de um ano fixo alterando-se esse ano de 10 em 10 anos. Com a revisão de 1987, os valores constantes passaram a ser sempre calculados a preços do ano anterior, ou seja, passou-se de séries com base fixa para séries com base móvel. A revisão, agora realizada, tem um caráter que deve ser apontado de imediato: não houve ruptura no SCN. O SCN brasileiro foi mantido inalterado estruturalmente, permaneceu publicando as TRU, a CEI e manteve a base móvel. Essencialmente, incorporou-se uma nova base estatística e procedimentos foram atualizados.

Baseado na Nota Metodológica No. 1 do IBGE disponível em http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/pib/default_SCN.shtm

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Revisões nas séries no SCN

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considerando a amplitude da revisão realizada no SCN brasileiro, a terminologia não se valeu mais da expressão ‘mudança de base’ por seu caráter restrito ao trabalho realizado, e adotou para a nova série a denominação ‘Nova Série das Contas Nacionais – Referência 2000’

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anuais por amostragem, não mais realizando os censos econômicos. Uma mudança deste porte no sistema de estatísticas de um país tem impacto direto em seu SCN. Esta mudança estabeleceu a necessidade de incorporar as novas pesquisas no cálculo das contas nacionais. No entanto, este processo deve ser realizado em um determinado ano e com todas as mudanças de forma simultânea. Esta é a característica fundamental da revisão do SCN brasileiro, publicado como “Nova Série do SCN – referência 2000”. O significado da “referência 2000” é a indicação do ano no qual se iniciou a integração com as pesquisas anuais do IBGE e com os dados do Imposto de Renda Pessoa Jurídica. Uma das regras adotadas no cálculo de contas nacionais é que a incorporação de novas fontes

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de dados seja feita em um período previamente determinado, realizando-se todas as mudanças simultaneamente. Isto faz com que as séries não sejam modificadas freqüentemente e percam comparabilidade. Esta nova série passou a incorporar a Classificação Nacional de Atividades Econômicas 1.0 (CNAE), as pesquisas anuais do IBGE para a indústria, comércio, serviços e indústria da construção. Com a incorporação da CNAE foi possível introduzir os dados das declarações do Imposto de Renda Pessoa Jurídica. Como o IBGE não pode ter acesso às declarações do DIPJ identificadas, a

adoção da CNAE nas contas nacionais e nas declarações do imposto de renda permitiu a integração destes dados na base de dados das contas nacionais. Esta base de dados ampliada possibilitou análises comparativas por atividade econômica e o aperfeiçoamento dos dados de várias atividades como as instituições privadas sem fins de lucro, a educação e saúde privada, entre outras. É tradição se chamar as revisões de um SCN como a “nova base”. Definição, normalmente, compreendida como a atualização dos pesos das atividades econômicas adotados no cálculo do Produto Interno Bruto e de seus componentes a preços constantes de um determinado ano. Entretanto, quando se realiza a chamada “mudança de base” incorpora-se, também, nova classificação de atividades e produtos (bens e serviços), novas fontes de dados, os resultados de pesquisas realizadas visando o estabelecimento de marcos estruturais (periodicidade não anual) que serão referência para os próximos anos como, por exemplo, uma pesquisa de orçamentos familiares, um censo agropecuário ou um estudo sobre as margens de comercialização de bens. Assim, considerando a amplitude da revisão realizada no SCN brasileiro, a terminologia não se valeu mais da expressão “mudança de base” por seu caráter restrito ao trabalho realizado, e adotou para a nova série a denominação “Nova Série das Contas Nacionais – Referência 2000”. Uma atualização do peso das atividades econômicas no Produto Interno Bruto – PIB visa melhorar a série de valores a preços constantes. A recomendação anterior para as séries de contas nacionais, ainda adotada nos SCN de muitos outros países, era que os valores a preços constantes fossem referenciados a um ano fixo. Ou seja, que os pesos adotados para a agregação de seus componentes permanecessem invariantes durante períodos de cinco ou dez anos. Com a recomendação do SNA 93, de que as séries a preços constantes sejam sempre calculadas a preços do ano anterior, a atualização das ponderações passou a ser permanente, não havendo mais sentido em se falar de atualização de ponderações. As séries com um ano de referência fixa (base de referência e não base de ponderação) são obtidas pelo encadeamento das variações base móvel, denominadas séries encadeadas, e os valores calculados a partir destas séries, valores encadeados.


Divulgação da nova série A série com as Tabelas de Recursos e Usos e Contas Econômicas Integradas definitivas foi divulgada de 2000 até 2003. Para o ano de 2004 foi divulgada ­apenas

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Com a disponibilidade de dados em valores correntes é estabelecido um ‘marco estrutural’ que permite controlar a evolução da série do SCN, evitando vieses característicos do uso de índices de volume e preço por períodos demasiado longos.

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A série das contas nacionais divulgada incorpora em sua compilação as seguintes ações: i) Nova classificação de produtos e atividades integrada com a CNAE 1.0. ii) Ampliação do número de atividades e produtos apresentados nas Tabelas de Recursos e Usos. Atualização da Conta Econômica Integrada com os dados da DIPJ. iii) Dados das pesquisas anuais contínuas realizadas pelo IBGE: Pesquisa Anual da Indústria (PIA), Pesquisa Anual de Serviços (PAS), Pesquisa Anual de Comércio (PAC) e Pesquisa Anual da Indústria da Construção (PAIC). Os resultados destas pesquisas foram integrados no SCN como referência para os valores correntes da parcela da produção coberta por estas pesquisas. iv) Introdução dos dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2002 como referência para o consumo das famílias. v) Introdução dos dados do Censo Agropecuário de 1995/6. vi) Desagregação dos trabalhos por modo de produção, o que possibilita a realização de estimativas considerando as características das unidades produtivas.

vii) Desenvolvimento da metodologia de cálculo do consumo de capital fixo pelas Administrações Públicas e Instituições Privadas sem Fins de Lucro, tornando com isso possível estimar seus valores de produção brutos. viii) Distribuição dos Serviços de Intermediação Financeira Indiretamente Medidos entre consumo intermediário e final. E a distribuição da parcela do consumo intermediário pelos utilizadores, possibilitando a eliminação do setor fictício Dummy Financeiro. ix) Atualização das metodologias de cálculo de índices de volume. Principalmente para administrações públicas e intermediação financeira que, na série anterior, eram extrapolados pelo crescimento demográfico e pela média da economia, respectivamente. x) Detalhamento no consumo final das Instituições Privadas sem Fim de Lucro a Serviço das Famílias.

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No caso brasileiro são calculadas séries encadeadas apenas na série trimestral do SCN. No cálculo de um SCN existem dados/estruturas/ taxas que não se consegue estimar a cada ano. Assim, na compilação do primeiro ano da nova série, ou ano de referência estatística, se despende um maior tempo procurando atualizar estas referências. Pode-se citar como exemplo as estruturas de margem de transporte e comércio, o vetor de consumo das famílias, o quadro de consumo intermediário etc. A série do SCN divulgada caracteriza-se pela amplitude das atualizações introduzidas, pois, além dos fatores citados nos parágrafos anteriores, realizou a mudança entre um SCN que era estimado através, basicamente, da extrapolação por índices de volume e preço para um sistema que é referenciado por pesquisas e registros administrativos anuais. Com a disponibilidade de dados em valores correntes é estabelecido um “marco estrutural” que permite controlar a evolução da série do SCN, evitando vieses característicos do uso de índices de volume e preço por períodos demasiado longos.

13


a Tabela de Recursos e Usos por não se dispor dos dados do DIPJ que permitem a compilação das Contas Econômicas Integradas2. Para 2005 foram divulgadas as versões preliminares obtidas pela soma dos resultados trimestrais. Neste caso, foram divulgadas TRU com apenas 12 atividades econômicas. A disponibilidade de dados estabelece o âmbito e a defasagem para cada versão do sistema de contas nacionais. Como as pesquisas anuais do IBGE e o Imposto de Renda do ano T, fontes chaves para a estimação definitiva do SCN, são disponíveis para a CONAC no início do primeiro semestre do ano T+2. Considerando esta disponibilidade de dados a divulgação do SCN com dados anuais passa a seguir a seguinte rotina: • Em março do ano T divulga-se o PIB, os componentes da demanda e o valor adicionado do ano anterior, com base nos resultados trimestrais por apenas 12 atividades econômicas em valores correntes e índices de volume. • No fim do segundo semestre divulga-se a versão definitiva do ano T-2, com TRU completa (110 produtos e 55 atividades) e CEI e uma versão preliminar do ano T-1 com TRU reduzidas (12 atividades). Os dados trimestrais passam a ter uma única divulgação 70 dias após o fim de cada trimestre. Nesta divulgação serão apresentados os índices de volume e os valores correntes para o PIB, os componentes da demanda final e o valor adicionado de 12 atividades econômicas.

contas nacionais. Ao realizar este passo, o SCN brasileiro passará a não mais necessitar de revisões desse porte. O que não significa que não mais existe a necessidade de revisões. Já em 2012, com referência a 2010, teremos uma nova revisão, desta vez com a incorporação das recomendações da primeira revisão do SNA 93, a serem publicadas em 2008, a incorporação da nova classificação de atividades econômicas, a CNAE 2.0 e as pesquisas específicas realizadas no período como a Pesquisa de orçamentos Familiares de 2007, o Censo Agropecuário de 2007, entre outras. Assim, os usuários deverão estar preparados para a nova realidade das contas brasileiras, a cada cinco anos estaremos melhorando os dados, atualizando os conceitos e provocando dores de cabeça nos usuários. Bibliografia Feijó (2003) Carmem, Olinto Ramos, Roberto et al; O Novo Sistema de Contas Nacionais do Brasil, Segunda Edição, Editora Campus. OECD (2006), Lequellier, François e Blades Derek, Understanding National Accounts. United Nations (1952), A System of National Accounts and Supporting Tables, Studies in Methods, Series F, No. 2. United Nations (1968), A System of National Accounts, Series F, Rev. 3. United Nations (1993), Commission of European Communities-EUROSTAT, International Monetary Fund, Organization for Economic Co-operation and Development (1993), System of National Accounts 1993.

Passos futuros

Revista de

Conjuntura

14

A realização de revisões nos Siste­mas de Contas Nacionais é um padrão adotado em todos os países. Usualmente, se realizam revisões a cada cinco ou dez anos, dependendo das características de cada região. A revisão recém realizada nas contas brasileiras apresentou um caráter atípico extremamente importante de ser compreendido. Momento no qual depois de mais de 20 anos, foi possível integrar o sistema de estatísticas do IBGE, às declarações do Imposto de Renda com as

2

Excepcionalmente as CEI de 2004 e 2005 serão divulgadas no fim de 2007.

Roberto Luís Olinto Ramos Chefe da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE


Complexo do rio Madeira1 Bolívar Pêgo Carlos Campos Neto

1 - Introdução e antecedentes A capacidade instalada de geração de energia elétrica no Brasil, considerando todo o parque gerador existente, as interligações internacionais já em operação e também a parcela de Itaipu importada do Paraguai, é da ordem de 100.000 MW, conforme detalhado na tabela 1. Constata-se a importância da geração de energia elétrica a partir de fonte hídrica, que atinge cerca de 75,1% do parque gerador. O Brasil ainda detém grandes potenciais hidráulicos a serem explorados, dois bons exemplos são as duas usinas hidrelétricas do rio Madeira [Santo Antônio (3.150 MW) e Jirau (3.300 MW)] totalizando 6.450 MW e a hidrelétrica de Belo Monte, com capacidade de vir a gerar 11.000 MW. O Brasil, pela larga experiência na construção de grandes usinas hidrelétricas, detém tec-

nologia de ponta em termos mundiais. Deve-se ressaltar, ainda, que se trata de fonte renovável, limpa e de menor custo, quando comparada às outras fontes. O Programa de Aceleração do Crescimento – PAC (2007-2010) contempla os empreendimentos do Complexo do rio Madeira tanto do ponto de vista da geração, quanto da transmissão. Dessa forma, no que se refere à região Norte, para a geração de energia elétrica, o PAC prevê investimentos de R$ 24,368 bilhões até 2010 e de R$ 10,541 bilhões após 2010. Com isso, a potência instalada será acrescida de 1.664 MW até 2010 e de 15.685 MW, após 2010. No Plano constam três usinas termelétricas – UTEs - em implantação: Rondon II, São Salvador e Estreito. Constam, também, sete usinas hidrelétricas – UHEs – a serem construídas: Santo Antônio, Jirau, Belo Monte, Serra Quebrada, Novo Acordo, Tupiratins e Tocantins.

Tabela 1 – Brasil: Parque gerador de energia elétrica em 2005

Fonte

Capacidade Instalada (MW)

1. Hidrelétrica

69.631

2. Termelétrica

19.770

3. Nuclear

2.007

4. Pequena Central Hidrelétrica - PCH

1.330

Subtotal

92.738

5. Interligação com a Argentina

2.178

6. Parcela de Itaipu da ANDE

5.600

Total

100.516

Fonte e elaboração: ANEEL (BIG).

As opiniões aqui expressas não refletem, necessariamente, as opiniões do IPEA e do Ministério do Planejamento.

1

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Artigo

15


Quanto às linhas de transmissão - LTs de energia elétrica, o PAC estabeleceu investimentos, para a região Norte, da ordem de R$ 5,420 bilhões até 2010 e R$ 466 milhões após 2010. Serão construídas 4.721 km, até 2010, e 613 km após 2010. Da programação, duas LTs estão em implantação: interligação N/CO–Jauru (MT) a Vilhena (RO); e Norte–Sul III–Marabá (PA) a Serra da Mesa (GO). Em previsão está a LT Interligação das Usinas do Madeira Porto Velho (RO)–Araraquara (SP). Uma outra em fase de estudo: LT Tucuruí-Macapá (AP) a Manaus (AM). O Plano Decenal de Expansão de Energia Elétrica (2006-2015), elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética – EPE, vinculada ao Ministério de Minas e Energia – MME, relaciona as UHEs Santo Antônio e Jirau entre os oito empreendimentos que apresentaram os estudos de viabilidades à Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. Essa Agência atestou que os estudos de viabilidade técnica e econômica das hidrelétricas do Complexo do rio Madeira, referente à implantação das usinas de Santo Antônio e Jirau (em Rondônia), são viáveis. Os despachos números 909 e 910 que aprovaram os estudos, foram publicados no Diário Oficial da União do dia 2 de abril último. Porém, devido a atrasos no licenciamento ambiental para início das obras, a cargo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBAMA, a programação constante do Plano Decenal está

Conjuntura Revista de

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Estas obras estão dentro do cronograma previsto, a ANEEL realizou a licitação ao final de 2006 e assinou os contratos em abril do corrente ano, a previsão para a conclusão das obras é de dezoito meses, o que deverá ocorrer no último trimestre de 2008

atrasada. Por esse cronograma, a UHE Jirau iria a leilão em 2006 e iniciaria a operação em janeiro de 2011. Quanto a UHE Santo Antônio, a programação indicativa era para início de operação em janeiro de 2012. Até o momento, meados de maio de 2007, não há previsão para a licitação dessas obras. Com respeito à transmissão de energia elétrica, o Plano Decenal prevê a interligação do subsistema dos Estados do Acre e Rondônia, atualmente isolado, com o subsistema da região Sudeste/Centro-Oeste, que foi considerada a partir do ano de 2008, por meio das LTs Samuel–Ariquemes-Ji-Paraná (315 km), Ji-Paraná–Pimenta Bueno–Vilhena (354 km, circuito duplo) e Vilhena–Jaru (278 km). De fato, estas obras estão dentro do cronograma previsto, a ANEEL realizou a licitação ao final de 2006 e assinou os contratos em abril do corrente ano, a previsão para a conclusão das obras é de dezoito meses, o que deverá ocorrer no último trimestre de 2008. No Plano Plurianual 2004-2007, onde estão programados os investimentos do Governo Federal, foi possível identificar uma única ação dentro do Programa de Energia na Região Norte: a interligação elétrica do Sistema Isolado Acre-Rondônia à Rede Básica, com a implantação de um sistema de transmissão no Estado do Mato Grosso (MT). Os recursos financeiros previstos para o período são de R$ 317,5 milhões. Este artigo tem como objetivo geral fazer uma análise dos impactos da implantação dos projetos das UHEs Santo Antônio e Jirau, destacando-se os cortes nacional, regional e no setor elétrico. Além desta introdução e antecedentes, este texto possui mais três seções: seção 2, onde são apresentadas as características dos projetos (localização, investimento, abrangência, áreas de influência, etc.); na seção 3, onde são feitas as análises dos impactos; e na seção 4, onde são apresentadas as conclusões. 2 - Caracterização dos projetos O Projeto Complexo do rio Madeira tem como objetivo geral a interiorização do desenvolvimento da América do Sul, por meio de: (i) Geração de energia em quantidade expressiva (usinas hidrelétricas Jirau – 3.300 MW e Santo Antônio


Segundo o Estudo de Viabilidade, concluído em abril de 2005, pela Construtora Norberto Odebrecht S/A, a

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Pela impossibilidade de obtenção de dados este artigo ficará restrito a análise dos projetos de construção das UHEs Santo Antônio e Jirau. A construção prevista no estudo das duas usinas vai possibilitar a geração de 6.450 MW de capacidade instalada total3. Elaborado pela Construtora Norberto Odebrecht S/A, sob as diretrizes de Furnas Centrais Elétricas S/A, os estudos servem como subsídio ao processo de outorga de futuros empreendimentos hidrelétricos necessários à expansão da oferta de energia. A ANEEL atestou que os estudos de viabilidade técnica e econômica das hidrelétricas do complexo do rio Madeira, referente à implantação das usinas de Santo Antônio e Jirau (Rondônia), são viáveis. Os despachos números 909 e 910, que aprovaram os estudos, foram publicados no Diário Oficial da União do dia 2 de abril último. Com a aprovação pela ANEEL dos estudos de viabilidade técnica e econômica dessas UHEs fica faltando, para a realização das licitações, o licenciamento ambiental, ainda em análise pelo IBAMA. Nessa etapa, também, é feita a apresentação de Estudos de Impacto Ambiental - EIA e de Relatórios de Impacto Ambiental - RIMA, para a obtenção da Licença Prévia junto ao IBAMA. 2.1 - UHE Santo Antônio

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Segundo o Estudo de Viabilidade, concluído em abril de 2005, a usina terá uma potência instalada de cerca de 3.150,4 MW e será implantada no rio Madeira, bacia do Rio Amazonas. A barragem e casa de força ficarão situadas no município de Porto Velho

usina terá uma potência instalada de cerca de 3.150,4 MW e será implantada no rio Madeira (25 km a montante de Porto Velho), bacia do Rio Amazonas. A barragem e casa de força ficarão situadas no município de Porto Velho. A vazão média mensal (m³/s) do rio Madeira varia de 34.207 no mês de abril (época de cheia) a 5.691 em setembro, período de estiagem. O reservatório terá um perímetro de 1.071 km, com profundidade média de 11 metros e máxima de 27 m. A altura máxima da barragem será de 55 metros. A capacidade de armazenamento de água será de 2.075,1 milhões de m³. A construção da barragem vai inundar 271 km² do município de Porto Velho. Serão instaladas, na UHE Santo Antônio, 44 turbinas de 73 MW cada. A queda d’água de referência para acionar as turbinas será de 13,9 m, com uma vazão nominal unitária de 561 m³/s. Cada turbina é acoplada a um gerador com potência unitária de 80 mil kVA. Serão construídas 11 subestações elevadoras e 5 km de linhas de transmissão em 500 kv, que servirão exclusivamente à central geradora.

O complexo do rio Madeira é composto, ainda, pelos aproveitamentos hidrelétricos de Guajará-Mirim, empreendimento binacional com a Bolívia, que terá 3 mil MW e Cachoeira Esperanza, que será localizada no lado boliviano e terá 600 MW de potência instalada. No caso da usina de Guajará-Mirim, o estudo de inventário que antecede o estudo de viabilidade ainda não foi realizado. Este complexo permitirá, além da geração elétrica, a navegabilidade desde Belém até o interior da Bolívia, que contribuirá para o desenvolvimento sócio-econômico e integração de toda essa região. 2

Além disso, o projeto prevê a construção de uma linha de transmissão de 105 km, até Porto Velho e outra de 1.277 km, até Cuiabá (MT), para permitir a interligação com o sistema elétrico do Centro-Oeste-Sudeste. 3

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– 3.150 MW e trecho binacional2); (ii) Interligação elétrica dos Estados de Rondônia, Acre, Mato Grosso (oeste) ao Sistema Elétrico Interligado Brasileiro e Amazonas (eventual – em análise); (iii) Transposição de obstáculos naturais à navegação do rio Madeira e seus afluentes (construção de eclusas); (iv) Integração de Infra-Estrutura Energética e de Transporte Brasil, Bolívia e Peru; e (v) Consolidação do Pólo de Desenvolvimento Industrial do Agrobusiness na região oeste.

17


O custo total da obra está estimado em R$ 9,673 bilhões (c/ JDC e R$ 8,778 bilhões s/JDC), tem como referência o mês de agosto de 2004, com taxa de câmbio fixada em 3,05 R$/US$. Neste custo total estão incluídas obras civis (R$ 3,391 bilhões); equipamentos eletromecânicos (R$ 3,482 bilhões); despesas com recuperação do meio ambiente (R$ 458,4 milhões) e; custos indiretos (R$ 1,447 bilhão). O custo da energia gerada será de 23,02 US$/MWh. A vida útil da usina está estimada em 50 anos. Quanto aos impactos sócio-ambientais, prevê-se que: terá uma população atingida não muito significativa, perfazendo 437 habitantes em cinco núcleos urbanos e 1.609 pessoas no meio rural. A obra também provocará impacto na Área de Preservação Permanente do rio Madeira, a realocação de 10 km de estrada e de ponte. O prazo para a totalização do investimento é de 82 meses (6,83 anos), sendo 39 meses até o desvio do Rio e 44 meses para operação da primeira unidade. Empregos gerados durante a construção: diretos [20.000 (pico) e 13.000 (médio)] e indiretos (50.000). A construção da barragem viabilizará outros usos da água, como navegação de grande porte, turismo e lazer.

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Os investimentos estão estimados em R$ 10,3 bilhões, tendo como principais componentes de custo: R$ 3,7 bilhões para equipamentos eletromecânicos; R$ 3,6 bilhões para obras civis; R$ 1,5 bilhão de custos indiretos; R$ 950 milhões de JDC e R$ 513,4 milhões para meio ambiente.

2.2 - UHE Jirau A usina terá uma potência instalada de 3.300 MW (44 turbinas com potência unitária nominal de 75 MW), com localização no rio Madeira (115 km a montante de Porto velho), bacia do rio Amazonas, distância de 1.197 km da foz. O seu reservatório terá vida útil de 50 anos, com perímetro de 936 km, profundidade máxima de 19 metros e média de 11 metros, altura máxima da barragem 35,5 metros e área inundada máxima de 375,6 km2, 11 subestações e 120 km de linhas de transmissão (tensão de 500 kW). Os investimentos estão estimados em R$ 10,3 bilhões, tendo como principais componentes de custo: R$ 3,7 bilhões para equipamentos eletromecânicos; R$ 3,6 bilhões para obras civis; R$ 1,5 bilhão de custos indiretos; R$ 950 milhões de JDC e R$ 513,4 milhões para meio ambiente. O custo de geração está estimado em US$ 22,76/ MWh (constante - cota 90) e US$ 22,50/MWh (variável – cota 90), ambos os valores têm como referência o mês de agosto de 2004, com câmbio = R$ 3,05/US$. Os impactos sócio-ambientais chegam a: população total atingida = 953 habitantes (604 em área urbana e 349 em área rural); famílias atingidas = 272 (171 em área urbana e 101 em área rural); e quantidade de núcleos urbanos atingidos = 2 [Mutum-Paraná (sede do Distrito) e Comunidade Garimpo Palmeiral)]. Haverá interferência em áreas legalmente protegidas (rio Madeira e do baixo curso de afluentes no trecho). Não haverá interferência em áreas indígenas. Haverá realocações de estradas (45 km) e pontes (0,5 km). O cronograma das obras está estimado em 82 meses (6,83 anos), sendo 38 meses (início das obras até o desvio) e 44 meses para fechamento do desvio, montagem eletromecânica (1ª unidade) e operação da 1ª unidade. Empregos gerados durante a construção: diretos [20.000 (pico) e 13.000 (médio)] e indiretos (50.000). Alguns aspectos críticos do empreendimento devem ser considerados: serão afetadas reservas minerais (garimpeira no rio Madeira), bem como sítios arqueológicos. Outros usos da água serão implementados: a criação do lago e a construção da eclusa viabilizarão a navegação de grande porte, inexistente atualmente, bem como o turismo local e lazer (praias e pescas locais).


3.1 – Impactos nacionais das UHEs Santo Antônio e Jirau 3.1.1 - Garantia de abastecimento do mercado consumidor de energia elétrica Não há dúvida de que o aspecto mais relevante dos investimentos a serem realizados na implantação das duas usinas hidrelétricas brasileiras do Complexo do Rio Madeira é a redução do risco de déficit4 no abastecimento do mercado brasileiro. O custo do déficit brasileiro (inibição na demanda por racionamento), medido em percentagem de redução de carga, apresenta: de 0 a 5% (R$ 841,2/MWh); de 5 a 10% (R$ 1.814,7/MWh); de 10 a 20% (R$ 3.792,1/MWh); e superior a 20% (R$ 4.309,3/ MWh). Para entender melhor este aspecto é importante fazer uma breve retrospectiva do comportamento do mercado de energia elétrica nos últimos anos. Dessa forma, cabe registrar que a elasticidade-renda do consumo de energia elétrica registrou valores extremamente elevados na década de 1980 (3,8% em média). Esta média caiu para 1,7% na década de 1990, por conta de mudanças estruturais no perfil do mercado consumidor, destacadamente no que se refere ao setor industrial, devido à reduzida taxa de crescimento do produto da indústria, à modernização tecnológica, ao uso mais eficiente do insumo eletricidade e pela menor participação das indústrias eletrointensivas, que não apresentaram expansões significativas. A abertura econômica iniciada nos anos 1990 e aprofundada a partir da implantação do Plano Real impôs um complexo ajustamento do setor industrial brasileiro. Por um lado, verificou-se o fechamento de firmas que

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A elasticidade-renda do consumo de energia elétrica registrou valores extremamente elevados na década de 1980 (3,8 em média). Esta média caiu para 1,7 na década de 1990, por conta de mudanças estruturais no perfil do mercado consumidor, destacadamente no que se refere ao setor industrial, devido à reduzida taxa de crescimento do produto da indústria [...]

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Três podem ser as análises de impacto das hidrelétricas do rio Madeira: nacional; regional; e no setor elétrico. No caso nacional, algumas variáveis podem ser consideradas: garantia de abastecimento do mercado consumidor de energia elétrica; fontes de financiamento; e impacto dos investimentos sobre alguns agregados macroeconômicos.

não conseguiram sobreviver à forte concorrência internacional. Por outro, constatou-se que parte significativa do setor industrial brasileiro passou por uma fase de modernização dos processos produtivos, na busca de maior eficiência e produtividade, com crescente terceirização, visando adaptar-se ao novo cenário de competição no mercado globalizado. Estes fatos se refletiram no perfil de evolução do mercado de energia elétrica, que registrou baixo crescimento na classe industrial e elevado crescimento na classe comercial, em função da expansão e modernização dos setores de comércio e serviços. “Entre 1990 e 1995 o mercado de energia elétrica (incluindo autoprodutores) cresceu 4,0% ao ano, contra uma variação do PIB de 3,1% no mesmo período. A elasticidade resultante foi 1,3. No período 1995-2000 a elasticidade foi superior, atingindo 2,0, em função do crescimento de 4,7% ao ano do consumo total de energia elétrica e de 2,3% do PIB” (EPE 2005, p. 259). Esse elevado crescimento do consumo de eletricidade na segunda metade da década passada deveu-se aos efeitos do Plano Real: estabilização da moeda e controle

“Risco de Déficit”, o popular “apagão”, é definido como a probabilidade de que a disponibilidade da oferta de energia elétrica seja menor do que o mercado de energia correspondente, em pelo menos um mês do ano, não importando a magnitude do déficit. Observe que este conceito implica um risco de déficit de 8,33% (1 mês em um ano: 1/12x100), o que implica afirmar que risco de déficit de 5% corresponde a aproximadamente 22 dias. 4

janeiro / junho / 2007

3 – Impactos dos projetos hidrelétricos

19


Tabela 2 - Brasil: Oferta e demanda de energia elétrica Taxa de crescimento (Em %)

Ano

Oferta (1)

Demanda (2)

PIB (3)

2007

4,3

5,3

4,5

2008

3,2

5,3

5,0

2009

1,7

5,3

5,0

2010

2,3

5,0

5,0

2011

1,0

5,0

ND

Média

2,5

5,2

4,9

Máxima

4,3

5,3

5,0

Mínima

1,0

5,0

4,5

Fonte: (1) ANEEL. Não foram considerados os projetos classificados como “graves restrições para entrada em operação (630,0 MW em 2009 e 110,0 MW em 2010). A ANEEL não inclui as usinas de Jirau e Santo Antônio nessas previsões; (2) MME/EPE; e (3) PAC. Elaboração dos autores.

Revista de

Conjuntura

20

do processo inflacionário que viabilizaram, nos seus primeiros anos, uma melhoria do nível de renda da população. Os efeitos positivos do Plano Real no mercado de energia elétrica foram sentidos até o ano de 1998, com exceção da classe de consumidores industriais que, nesse ano, já apresentava crescimento baixo. Em resumo, a taxa de crescimento médio do consumo de energia elétrica na década de 1990 foi de 5,7% ao ano para classe residencial, 2,8% ao ano para consumo industrial e de 7,2% ao ano na classe comercial. No entanto, no período 2000/2005 o consumo total de energia elétrica apresentou crescimento médio abaixo do histórico, sendo que em 2001 houve uma redução da ordem de 7,0%, por conta dos efeitos do racionamento. Paralelamente, a economia brasileira apresentou crescimento extremamente baixo na média do período, pouco

mo total de energia elétrica de 1,23, no período. O pior é que os estudos indicam dificuldades crescentes de garantia de abastecimento do mercado de energia elétrica para os próximos anos. As chuvas que encheram todos os grandes lagos (a ponto de ter que verter água em suas barragens), garantem o suprimento do País até 2008. O próprio governo5 admite que se os projetos de gasodutos e as duas plantas de conversão de Gás Natural Liquefeito – GNL importado não amadurecerem a tempo são grandes as incertezas para o biênio 2009 e 2010, caso as chuvas venham abaixo da média (Valor Econômico, A18, 14/03/2007). (Tabela 2). Na hipótese, prevista no PAC, de crescimento de 4,5% este ano e de 5% entre 2008 e 2010, o País vai precisar de aproximadamente 3.000 MW adicionais ao ano para cobrir o aumento da demanda. Para se ter uma noção das di-

acima de 2,0%. A redução do consumo como conseqüência do racionamento fez com que a elasticidade neste período fosse reduzida para 1,02. Para o período de 2006 a 2015, o Governo Federal (MME/EPE) trabalha com uma trajetória de referência que resulta em uma taxa média de crescimento do consumo de energia elétrica de 5,2% ao ano, e de 4,2% ao ano para o PIB. Essas hipóteses estabelecidas resultam em uma elasticidade-renda do consu-

ficuldades à frente, pela previsão da ANEEL serão agregados em média, no período 2007-2011, 2.520 MW ao ano. Estudo divulgado pelo Instituto Acende Brasil, entidade criada em 2006 pela Câmara Brasileira dos Investidores em Energia Elétrica, mostra que em 2009 o risco de racionamento no sudeste, principal região consumidora do País, subirá para 5%, limite máximo aceitável pela ANEEL e pelo Operador Nacional do Sistema – ONS6. Para

5

Estão previstas no PAC, mas não estão em implantação.

O Conselho Nacional de Política Energética – CNPE estabeleceu, por meio da resolução nº 1, de 18/11/2004, que os estudos de planejamento de expansão da oferta de energia elétrica devem aplicar o seguinte critério de garantia: “O risco de insuficiência da oferta de energia elétrica no Sistema Interligado Nacional não poderá exceder a 5% em cada um dos subsistemas que o compõem”. 6


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Deve-se destacar que, sem licitações de grandes empreendimentos hidrelétricos e com incertezas em relação ao abastecimento do mercado de gás natural, o preço do MWh no mercado livre de energia está em alta

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preendimentos hidrelétricos e com incertezas em relação ao abastecimento do mercado de gás natural, o preço do MWh no mercado livre de energia está em alta. Contratos de fornecimento de energia iniciados em janeiro de 2005 pagaram entre R$ 50 e R$ 60 por MWh. Em janeiro de 2006 os preços variaram de R$ 60 a R$ 75. Contratos fechados em janeiro de 2007 já pagavam entre R$ 80 e R$ 90 e quem fechar um contrato de longo prazo, para vigorar a partir de 2008, pagará entre R$ 110 a R$ 130 o MWh. O mercado livre de energia é muito influenciado pelas previsões de investimento. Se o governo conseguir colocar em licitação grandes projetos, como as hidrelétricas do Complexo do Rio Madeira, os preços tendem a cair. (Valor Econômico, A1, 03/05/2007).

Tabela 3 – Remuneração básica do BNDES para projetos de energia (Em %)

2005

2006

2007

Variação

1. Geração Hídrica e Termelétrica

2,5

1,5

1,0

-60

1. Geração Hídrica Estruturante (+ de 2.000 MW médios)

2,5

1,5

0,5

-80

1. Geração PCH, Co-Geração a Gás e Bioeletricidade

2,5

1,5

1,0

-60

2. Transmissão

2,5

2,0

1,5

-40

3. Distribuição

3,0

3,0

2,0

-33

Área

(07/05)

Fonte e elaboração: BNDES.

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o Brasil, em 2010, esse indicador aumentará para 8% e chegará a 14% em 2011, quase o triplo do risco máximo recomendado (Valor Econômico, A2, 17/04/2007 e B7, 13 a 15/04/2007). Os dados oficiais gerados pela Empresa de Pesquisa Energética – EPE – são mais conservadores: risco de déficit de 4,5% em 2010 e de 10% em 2011, o dobro do que o mercado de energia aceita como limite. Portanto, o quadro de oferta futura de energia elétrica, aliado às projeções de crescimento da demanda de 5,2% ao ano até 2011, apontam a fragilidade de garantia da oferta deste insumo. Para agravar a situação, além da baixa agregação de usinas hídricas, o parque térmico a gás natural está pouco operante por falta do combustível. A PETROBRAS assumiu encargos de oferta de gás superiores à sua real condição de abastecimento da atual demanda pelo insumo. O governo está ultimando um plano de hierarquização de prioridades no abastecimento do gás: prioridade para a geração térmica de energia, depois abastecimento industrial e por último abastecimento veicular (Gás Natural Veicular - GNV). A alternativa possível para buscar amenizar as dificuldades de abastecimento do mercado em anos vindouros será a entrada de usinas termelétricas movidas a óleo combustível, óleo Diesel ou a carvão mineral, com custos operacionais mais elevados e mais poluentes. Esses fatos permitem visualizar a dimensão da necessidade que o País tem de fazer os investimentos nas UHEs do rio Madeira que, atualmente, representam 8% da capacidade instalada. Deve-se destacar que, sem licitações de grandes em-

21


3.1.2 - Fontes de financiamento As linhas de Financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES visam estimular investimentos no setor de energia elétrica e estão em condições mais atraentes. Como parte do PAC, o BNDES aprovou, em 25 de janeiro de 2007, a redução da taxa de juros para os segmentos de geração, transmissão e distribuição de energia, produção e distribuição de gás, ferrovias, portos, aeroportos, rodovias, saneamento e transportes urbanos. Com essa iniciativa, as taxas de juros serão, em média, 60% inferiores às de 2005. Trata-se da segunda queda de juros realizada pelo BNDES nos dois últimos anos - a primeira delas no início de 2006 - com o objetivo de estimular os investimentos na economia brasileira. A taxa de juros total dos empréstimos do BNDES é composta por Taxa de Juros de Longo Prazo - TJLP mais remuneração básica, conforme ilustra a tabela 3, mais a taxa de risco de crédito, de até 1,8% a.a., conforme o risco do beneficiário. Em particular, para projetos estruturantes7 de geração - usinas hidrelétricas com potência superior a 2 mil MW médios - o BNDES tomou medidas adicionais para assegurar a oferta de energia que dê suporte ao cresci-

mento econômico e à modicidade tarifária: (i) Redução especial da remuneração básica de 1,5% ao ano para apenas 0,5% ao ano (queda de 80%), que minimiza o efeito do custo de financiamento sobre as tarifas; (ii) Aumento do prazo total de amortização de financiamento de 14 anos para acima de 20 anos nos projetos de usinas hidrelétricas acima de 1 mil MW. É o prazo mais longo já praticado para o financiamento a uma obra de geração de energia no Brasil, superando os 20 anos concedidos no financiamento a Itaipu (1978 a 1998). O prazo de amortização para projetos abaixo de 1 mil MW passa de 14 para 16 anos; e (iii) Financiamento na modalidade Project Finance, que dispensa garantias corporativas dos empreendedores ao financiamento. Isto é, os financiamentos terão como suporte os contratos de venda de energia e seguros mitigadores de risco, que visam assegurar a conclusão da obra. Esta modalidade permitirá, aos grupos privados, empreenderem obras sem onerar seus balanços com dívidas financeiras. Para todos os projetos de geração hídrica, a participação máxima do BNDES no total do investimento foi ampliada de 80% para 85%. Em conjunto, as medidas ampliam o universo de potenciais interessados em pro-

Tabela 4 – Prazos máximos de amortização para financiamentos em energia Área

Revista de

Conjuntura

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Prazo Máximo (Anos)

1. UHEs com capacidade instalada igual ou superior a 1.000 MW

20

1. UHEs com capacidade instalada superior a 30 MW e inferior a 1.000 MW

16

1. Geração Pequenas Centrais Hidrelétricas - PCHs

14

1. Eólica

14

1. Termoelétrica, Co-geração a Gás e Bioeletricidade

12

2. Transmissão

12

3. Distribuição

6

Fonte e elaboração: BNDES.

Projeto Estruturante: capaz de gerar impacto no desenvolvimento de determinada área ou região, ao criar condições econômicas para atração de outros projetos, e operações multissetoriais e integradas, decorrentes de ações de articulação institucional. 7


Empreendimento

Extensão aproximada (km)

1. LT Jauru (MT) – Vilhena (RO)

354

2. LT Vilhena (RO) – Pimenta Bueno (RO)

160

3. LT Pimenta Bueno (RO) – Ji-Paraná (RO)

118

4. LT Ji-Paraná (RO) – Ariquemes (RO)

164

5. LT Ariquemes (RO) – Samuel (RO)

153

Total

949

Vencedor: Elecnor S/A (Espanha). Transmissora: Jauru Transmissora de Energia Ltda. Previsão de entrada em operação comercial: 18 meses. Investimento: R$ 404 milhões.

jetos de infra-estrutura, permitem redução nas tarifas dos novos projetos de energia, em relação às condições vigentes em 2005, e visam estimular investimentos em projetos de grande porte. Condições Especiais, aplicáveis ao Setor de Energia Elétrica: o prazo de carência é de até seis meses após a entrada do projeto em operação comercial. Para as operações realizadas com Sociedades de Propósito Específico – SPE, os juros serão capitalizados durante o período de carência e para as demais beneficiárias, os juros serão exigíveis ao longo do período. Os prazos máximos de amortização são definidos, conforme a tabela 4. Obrigações da Beneficiária: Índice de Cobertura do Serviço da Dívida – ICSD, durante todo o período de amortização, deverá ser igual ou superior a 1,3% a ser comprovado anualmente. Para os projetos de geração hídrica, na modalidade Project Finance, o ICSD mínimo poderá ser de 1,2%, desde que o projeto apresente taxa interna de retorno – TIR mínima de 8% ao ano. O capital próprio dos acionistas deverá ser de, no mínimo, 30% do investimento total e de, no mínimo, 20% no caso de operações realizadas na modalidade Project Finance, excluindo-se, para efeito deste cálculo, eventuais participações societárias da BNDESPAR. Nas operações

Fonte: ANEEL. Elaboração dos autores.

de Project Finance, a exposição do BNDES poderá ser de, no máximo, 70% do ativo total projetado da beneficiária. No caso de projetos de geração hídrica este limite poderá ser de, no máximo, 75%. 3.1.3 - Impacto dos investimentos sobre alguns agregados macroeconômicos Como mostrado anteriormente, os investimentos requeridos para os projetos hidrelétricos de Santo Antônio (R$ 9,7 bilhões) e Jirau (R$ 10,3 bilhões) totalizam R$ 20,0 bilhões. Esses valores correspondem a praticamente 1% do PIB (revisto) de 2005 e 5,7% da Formação Bruta de Capital Fixo – FBKF. Isto faria com que a FBKF passasse de 16,3% para 17,2% do PIB (valores de 2005), isto é, o impacto seria de quase um ponto percentual no crescimento da FBKF. Os investimentos em equipamentos eletromecânicos estão estimados em R$ 3,5 bilhões, na Usina de Jirau, e R$ 3,7 bilhões, em Santo Antônio, perfazendo R$ 7,2 bilhões. Este volume de recursos para investimento em máquinas e equipamentos corresponde a 13% do faturamento do setor de bens de capital brasileiro no ano de 2005 (R$ 55,9 bilhões, Abimaq/Informaq).

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Tabela 5 - Interligação Acre – Rondônia – Mato Grosso

23


3.2 – Impactos regionais das UHEs Santo Antônio e Jirau No que se refere ao impacto regional, destacam-se as seguintes variáveis: geração de energia para a região; interligação intra e inter-regiões; área alagada do reservatório; geração de emprego; e aspectos sócio-ambientais. A geração de energia para a região será significativa. Segundo o Balanço Energético Nacional - BEN 2006 (ano base 2005) a região Norte possui uma capacidade instalada total de geração hidrelétrica de 8.274 MW (11,7% da capacidade instalada brasileira) e o estado de Rondônia detém, apenas, 3,1% da capacidade instalada da região Norte (255 MW). Com relação ao consumo residencial de energia elétrica, a região norte representou, em 2005, apenas 5% do consumo total brasileiro e o estado de Rondônia, 12,7% da região Norte. Com a entrada em operação plena das usinas de Santo Antônio e Jirau, a região Norte terá um aumento de 6.450,4 MW de capacidade instalada, equivalente a um acréscimo de 77,9% da capacidade de 2005. O Estado de Rondônia terá a sua geração aumentada em 25,3 vezes e sairá do quarto para ocupar o primeiro lugar como gerador de energia daquela região, se mantida a posição citada no BEN.

‘‘ Conjuntura Revista de

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A instalação da Interligação Acre–Rondônia–Mato Grosso, em 230 kv, trará benefícios aos consumidores da região devido ao aumento da confiabilidade do suprimento de energia elétrica, tornando o sistema de transmissão mais robusto, diminuindo a freqüência e a duração de desligamentos

A interligação do subsistema dos estados do Acre e Rondônia, atualmente isolado, com o subsistema da região Sudeste/Centro-Oeste foi considerada no Plano Decenal a partir do ano de 2008, por meio das LTs Samuel – Ariquemes - Ji-Paraná (315 km), Ji-Paraná– Pimenta Bueno – Vilhena (354 km, circuito duplo) e Vilhena – Jaru (278 km). A licitação dessas instalações foi realizada em 2006. Observa-se que a futura integração das usinas do rio Madeira ao Sistema Interligado Nacional - SIN deverá contemplar uma interconexão com o Sistema Regional Acre-Rondônia, chegando a Porto Velho – independentemente da alternativa selecionada para as regiões Sudeste e Centro-Oeste. A partir da instalação desta interconexão, prevista para 2011, o subsistema Acre-Rondônia se estabelece como importante região exportadora de energia elétrica. Até a entrada das usinas do rio Madeira, no período 2008-2010, esse subsistema continuará importadando energia elétrica da região Sudeste/ Centro-Oeste. Só poderá operar como exportador, caso se concretize a disponibilidade de gás natural na região. Para avançar no processo de interligar os subsistemas do Acre-Rondônia ao SIN, foram assinados, em abril deste ano, contratos de 5 novas linhas de transmissão. Somados, os empreendimentos terão 949 km que irão reforçar esse Sistema (Tabela 5). A localização do empreendimento abrangerá 22 municípios nos estados de Rondônia e Mato Grosso. Em Rondônia (18 municípios), serão: Alto Paraíso, Ariquemes, Cacaulândia, Cacoal, Candeias do Jamari, Chupinguaia, Governador Jorge Teixeira, Itapuã do Oeste, Jaru, Ji-Paraná, Ministro Andreazza, Pimenta Bueno, Presidente Médici, Rio Crespo, Teixeirópolis, Theobroma, Vale do Paraíso e Vilhena. Já em Mato Grosso, serão 4 municípios, a saber: Comodoro, Jauru, Nova Lacerda e Pontes e Lacerda. A instalação da Interligação Acre–Rondônia–Mato Grosso, em 230 kv, trará benefícios aos consumidores da região devido ao aumento da confiabilidade do suprimento de energia elétrica, tornando o sistema de transmissão mais robusto, diminuindo a freqüência e a duração de desligamentos. O empreendimento fará com que o Sistema de Transmissão do Acre e de Rondônia, atualmente em operação, passe a operar integrado ao SIN. Um dos grandes diferenciais dos estudos de viabilidade dessas hidrelétricas é em relação ao tamanho do reservatório e a capacidade de geração. As áreas que


‘‘

O impacto nas regiões de construção das usinas deverá ser muito alto: demanda por bens e serviços (bens de consumo durável, imobiliário, alimentação, saúde, educação, segurança, lazer, etc.); infra-estrutura econômica (comunicações, energia elétrica e transportes); e o aumento do processo migratório oriundo de várias regiões do País

‘‘

A substituição da geração térmica pela hídrica será um marco para a região Norte, particularmente para o estado de Rondônia que tradicionalmente sofre com racionamentos e quedas permanentes de oferta de energia. Estas restrições de oferta deixarão de existir. As características do projeto das usinas do rio Madeira trazem uma concepção de desenvolvimento com proteção ambiental racional. O projeto prevê a construção de barragens com altura máxima de 15 metros e a utilização de turbinas geradoras de modelo avançado (tipo bulbo), adequadas

Tabela 6 - UHEs Região Norte: Relação área alagada e capacidade instalada Área Alagada [km2] (A)

Capacidade Instalada [MW] (B)

Relação C) = (A)/(B) (km2/MW)

1. Santo Antônio

271

3.150

0,09

2. Jirau

375

3.300

0,11

3. Tucuruí

2.430

4.240

0,57

4. Samuel

560

222

2,52

5. Balbina

2.360

250

9,44

Usina

Fonte: Eletronorte. Elaboração dos autores.

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serão alagadas, de acordo com os estudos, são bem menores se comparadas com usinas localizadas na mesma região, como por exemplo, a hidrelétrica de Balbina, que tem potência de 250 MW e possui um reservatório de 2.360 km2. A construção das barragens das duas usinas irá inundar uma área total de 646,6 km2 (271 km² para Santo Antônio e 375,6 km2 para Jirau). A tabela 6 mostra que a melhor relação área alagada versus capacidade instalada é da usina de Santo Antônio, com 0,09 km2 alagado para gerar um MW de energia. Em segundo lugar está Jirau, seguida de Tucuruí. A pior relação é da usina de Balbina com 9,44 km2/MW de energia. A geração total de empregos nos dois projetos está estimada em 140 mil, sendo 40 mil diretos e 100 mil indiretos. A relação é a mesma para cada projeto: [diretos 20 mil (pico) e 13 mil (médio) e indiretos (50 mil)]. O impacto nas regiões de construção das usinas deverá ser muito alto: demanda por bens e serviços (bens de consumo durável, imobiliário, alimentação, saúde, educação, segurança, lazer etc.); infra-estrutura econômica (comunicações, energia elétrica e transportes); e o aumento do processo migratório oriundo de várias regiões do País. Quanto aos impactos sócio-ambientais, ambos os projetos atingirão uma população de 2.999 habitantes, sendo 1.041 na área urbana e 1.958 na área rural, podendo considerar que essa população não é significativa, tendo em vista a importância dos dois projetos. Os projetos atingirão áreas legalmente protegidas. Não haverá interferência em áreas indígenas e haverá realocação de estradas e pontes num trecho de 55,5 km.

25


‘‘

Os investimentos previstos no Plano Decenal do Setor Elétrico estão estimados em R$ 75 bilhões, no período 2006-2015, sendo R$ 60 bilhões para usinas hidrelétricas e R$ 15 bilhões para termelétricas. Os investimentos para os projetos do rio Madeira estão estimados em R$ 20 bilhões [...]

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para baixas quedas de água. Com isto, as áreas de inundação dos reservatórios são bastante reduzidas, sendo pouco superiores às que já ocorrem nos períodos de cheias dos rios, o que diminui consideravelmente os impactos ambientais diretos e a necessidade de desapropriações. 3.3 – Impactos, no setor elétrico, das UHEs Santo Antônio e Jirau

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Conjuntura

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Em 2005, o setor elétrico brasileiro possuía uma capacidade instalada total de 93,2 mil MW (BEN 2006, p. 130), sendo 91,2 mil MW (97,8%) somente das fontes hídrica (70,9 mil MW) e termo (20,3 mil MW). Em 2015 prevê-se uma capacidade instalada hidrelétrica de 104,3 mil MW8 e a possível entrada em operação das usinas de Santo Antônio e Jirau trará um acréscimo nessa modalidade de geração de 6,4 mil MW (6,1%). Existe, ainda, no setor elétrico grande dificuldade para se mensurar custos de expansão da geração hidrelétrica, particularmente por duas razões: os estudos existentes são desatualizados; e os recentes nem sempre observam 8

Plano Decenal de Expansão de Energia Elétrica 2006-2015, p. 85.

a otimização do uso dos recursos naturais nacionais. O setor elétrico trabalha com o custo marginal de operação, em cada subsistema, igual ao custo marginal de expansão, pré-fixado em R$ 118/MWh. Como “tolerância superior” adota-se o valor de R$ 130/MWh para o custo marginal de expansão. Dado um determinado custo de déficit o planejamento da expansão da geração deve atender ao critério de segurança, estabelecido pelo Conselho Nacional de Política Energética – CNPE. O risco anual de déficit não deve superar 5% em cada subsistema e, simultaneamente, ao critério da expansão econômica com a igualdade do custo marginal de operação e do custo marginal de expansão. O custo de geração da usina de Santo Antônio está previsto em US$ 23,02/MWh enquanto que o de Jirau está em US$ 22,76/MWh. Esses valores têm como base o câmbio de R$ 3,05/US$ (agosto de 2004). Com o câmbio, atualmente, em torno de R$ 2,1/US$ significa que o custo de geração, em Reais, foi reduzido nominalmente em aproximadamente 33%. Comparando-se o custo de geração de Santo Antônio (mais alto), com o custo marginal de geração, pode-se observar que essas usinas são muito competitivas (cerca de R$ 67 contra R$ 118/MWh, respectivamente). Os investimentos previstos no Plano Decenal do Setor Elétrico estão estimados em R$ 75 bilhões, no período 2006-2015, sendo R$ 60 bilhões para usinas hidrelétricas e R$ 15 bilhões para termelétricas. Os investimentos para os projetos do rio Madeira estão estimados em R$ 20 bilhões (cerca de R$ 10 bilhões para cada projeto), representando 26,6% dos investimentos totais em geração e 33,3% dos investimentos em geração hidrelétrica. 4 - Conclusão Apesar da diversificação recente da matriz de geração de energia elétrica brasileira, com o crescimento da geração termelétrica a gás, a melhor alternativa continua sendo a de fonte hídrica. Problemas com a garantia de fornecimento de gás, poluição e custos mais elevados oriundos da geração a carvão mineral,


ções de uso de recursos naturais e, principalmente, de licenciamento ambiental, deixando de zelar pelas 288 unidades de conservação, que ficarão a cargo do novo Instituto Brasileiro de Conservação da Biodiversidade. Paralelamente, o Ministério de Minas e Energia vem pressionando o MMA com o objetivo de obter a licença ambiental para a construção das usinas do rio Madeira. Portanto, uma posição favorável desse Instituto é indispensável à continuidade do processo de licitação das hidrelétricas. Nesse sentido, se o impasse não for superado rapidamente, o governo terá que procurar outra alternati-

va energética de fonte térmica, nuclear ou à base de carvão mineral (Valor Econômico, A2, 26/04/2007). Só resta aguardar, na expectativa de que efetivamente possa haver agilização em importantes obras de infraestrutura, que precisam ser viabilizadas para não criar barreira ao crescimento econômico sustentável.

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óleo combustível e Diesel, tornam os projetos de geração do Complexo do rio Madeira uma das melhores alternativas energéticas do País. Porém, causou surpresa análise preliminar do IBAMA que nega o licenciamento ambiental, tornando sem previsão de data a licitação para as obras (Valor Econômico, A2, 21, 22 e 23 de abril de 2007). Há que se encontrar um equilíbrio entre a garantia de preservação ambiental e o desenvolvimento do País. Não há desenvolvimento sem degradação ambiental. Existe a necessidade de mitigar os impactos ambientais. Porém, há muitos anos várias obras fundamentais ao destravamento da infra-estrutura econômica estão com cronogramas atrasados por conta das demoras nas licenças ambientais. São obras dos setores elétrico, rodoviário, ferroviário, hidroviário e de dragagem dos portos. Será um problema se depois de 25 anos de baixo crescimento econômico, agora que as condições macroeconômicas estão a permitir um crescimento sustentado mais elevado (em torno de 5% ao ano), o País ficar estrangulado por deficiências de infra-estrutura, em função de atrasos das licenças ambientais. Adequadamente, o Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal - MMA anunciou mudanças significativas na sua estrutura organizacional, com o intuito de dar respostas concretas ao desenvolvimento econômico aliado à proteção ambiental. As mudanças no Ministério foram no sentido de retirar as decisões do IBAMA da influência exclusiva das organizações não-governamentais, consideradas carregadas de sectarismo ambiental. O novo IBAMA terá seu foco de atuação nas ações de fiscalização, autoriza-

27 Bolívar Pêgo Carlos Campos Neto Economistas do IPEA


Novo cálculo do PIB crescimento eco por Daniela Lima

Revista de

Conjuntura

28

Em março deste ano o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou mudanças na fórmula de cálculo do Produto Interno Bruto Brasileiro (PIB) – uma revisão dos números entre 1995 e 2005. O IBGE, assim como ocorre em outros países, desenvolvidos ou não, realiza periodicamente revisões metodológicas nas Contas Nacionais. Outras mudanças importantes foram as alterações na fórmula de cálculo dos gastos do governo, do PIB das instituições financeiras e de setores como pecuária, construção civil e serviços de informação. A assessora Econômica do Ministério do Planejamento Aumara Bastos explica que estas revisões visam medir com mais acuidade a atividade econômica, alterando o ano de referência, incorporando novas bases de dados, atualizando conceitos, metodologia de cálculo e definições, com vistas a uma maior adequação às recomendações das Nações Unidas e de outros organismos internacionais. Para o economista e professor da Universidade de Brasília (UnB) Carlos Alberto Ramos o motivo pelo qual o IBGE mudou a metodologia de cálculo do PIB se dá devido a construção de um indicador que está datado no tempo. “Por um lado, temos o desenvolvimento de novas técnicas estatísticas, novas bases de dados, recomendações e padronizações sugeridas pelos organismos internacionais etc, que levam a uma constante pressão por mudanças metodológicas. Por outra parte, estamos diante de mudanças na economia real e a construção de um indicador, sua metodologia e sistema de informações que o alimentam, precisam acompanhar essa mudança, sob pena de não representar o fenômeno que pretende mensurar”. Carlos Alberto fala ainda da atual etapa histórica, com rápidas mudanças

tecnológicas, padrões de consumo em permanente evolução, crescente alteração na estrutura econômica devido à maior exposição da economia nacional aos fluxos de comércio e serviços. Para ele, congelar as fontes que alimentam um indicador seria condená-lo a perder eficácia como sintetizador de uma determinada realidade. “Nesse sentido, a última alteração metodológica do IBGE foi produto desse tipo de tendência à mudança. Não tê-la realizada redundaria em uma avaliação da situação do país viesada”, disse. As diferenças fundamentais no cálculo anterior e no atual diferem sob a ótica da produção, diz o economista e mestre em Finanças Públicas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Amir Khair.“O setor de serviços cresceu 10,4 pontos percentuais na participação da composição do PIB passando de 56,3% para 66,7%, a indústria caiu de 36,1% para 27,9% e a agropecuária de 7,7% para 5,6%. Outras diferenças incorporam uma série de bases de dados (PIA-Pesquisa Industrial Anual, PACPesquisa Anual do Comércio, PAS - Pesquisa Anual de Serviços etc.) e desenvolve metodologias novas para o cálculo do capital fixo das administrações públicas. Estima o valor agregado de ONG´s (Organizações sem Fins de Lucro) e o melhor tratamento do setor fictício


dummy financeiro desaparece”. Carlos Alberto ressalva que para ter uma idéia da importância de certas alterações é considerado o caso das pesquisas anuais. “A sua incorporação terá como corolário uma mudança constante na estrutura do PIB que, em tese, corresponderá às mudanças na base produtiva. Já não serão realizadas extrapolações de preços e quantidades a partir de um ano base”, afirma. A assessora econômica destaca que a nova série do PIB tem como referência o ano de 2000, enquanto a anterior tinha o ano 1990. “Na nova série, existe um maior detalhamento de atividades e produtos para as tabelas de recursos e o impacto na economia das instituições sem fins lucrativos, como universidades, igrejas e usos e de setores institucionais. As novas informações incorporadas tornaram possível medir ONGs, e incluir novos setores, como a informática. No cálculo atual, o consumo da intermediação financeira é distribuído pelas

famílias e pelas diversas atividades, desaparecendo a dummy financeira que mascarava o destino de serviços prestados por esse setor. O valor da produção das administrações públicas que era anteriormente apresentado de forma líquida se equiparou aos demais valores de produção, calculados pelo valor bruto, ao se acrescentar uma estimativa de depreciação. Para ela, a quantidade física dos serviços da administração deixou de ser medida pelo crescimento da população, passando a considerar o consumo intermediário, a depreciação e o número de empregados. A parcela da formação bruta de capital fixo referente à construção teve o cálculo melhorado graças à incorporação da pesquisa anual da indústria da construção.

Principais resultados do PIB a preços de mercado do 4º trimestre de 2005 aa 4º trimestre de 2006 – PIB anterior e novo

Taxas (%) PIB

4º trim. 2005

1º trim. 2006

2º trim. 2006

3º trim. 2006

4º trim. 2006

Acumulado ao longo do ano/ mesmo período do ano anterior

Novo Anterior

2,9 2,3

4,1 3,3

2,7 2,2

3,3 2,5

3,7 2,9

Últimos 4 trimestres/ 4 trim. imediatamente anteriores

Novo Anterior

2,9 2,3

3,3 2,4

2,9 1,7

3,3 2,3

3,7 2,9

Trimestre/ mesmo trimestre do ano anterior

Novo Anterior

3,1 1,4

4,1 3,3

1,5 1,2

4,5 3,2

4,8 3,8

Trimestre/ trimestre imediat. anterior

Novo Anterior

0,7 0,7

1,6 1,2

-0,5 0,6

2,6 0,8

0,9 1,1 Fonte: Amir Khair

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B possibilitará maior onômico ao País?

29


Para muitos economistas o novo cálculo pode vir a beneficiar o País em várias modalidades. Entre elas, o novo sistema permite que, ao final de cada ano, seja feita uma confrontação entre a variação observada nos dados dos últimos dois anos (trimestrais ou anuais), e as pesquisas realizadas no ano (anuais, qüinqüenais ou censitárias). A economista Aumara acredita que desta forma essas pesquisas são utilizadas como “marcos estruturais”, implicando na revisão das contas nacionais recentes, e permitem uma melhor aferição das evoluções de preço e volume. Estatísticas, elaboradas com acuidade e isenção, seguindo as recomendações internacionais, permitem a realização de estudos empíricos, inclusive comparativos com outros países, a percepção de pontos de estrangulamento, e a determinação de políticas de forma mais eficaz e eficiente. Para Amir Khair, com a nova metodologia, o PIB em 2005 ficou 11% maior, colocando o Brasil na 8ª posição entre as maiores economias do mundo, em termos de paridade de poder de compra da moeda, que é a base usada para as comparações entre países pelos organismos internacionais. Segundo ele, para as finanças públicas, esta mudança tem fortes implicações. “Todas as variáveis macroeconômicas são referenciadas ao PIB. No final de 2005 a dívida do setor público atingiu R$ 1.002.485 milhões e o PIB pela metodologia antiga R$ 1.937.598 milhões. Assim, a relação entre a dívida e o PIB deu 51,7%. Com a nova metodologia o PIB passou

a ser de R$ 2.147.944 milhões e essa relação caiu para 46,7%. A carga tributária é por definição o total arrecadado de tributos dividido pelo PIB. Em 2005, pela metodologia antiga foi de 37,4% e na nova caiu para 33,7%. Assim, o peso dos impostos ficou menor. A previsão do PAC para a dívida no final de 2010, passaria de 39,7% do PIB para 32,9%, que seria um dos mais baixos que o país já teve”, explica o economista. Setores mais afetados De acordo com Aumara Bastos, dois pontos de vista têm de ser considerados: primeiro pela ótica da oferta, a principal mudança refere-se ao aumento da participação do setor serviços, chegando a uma diferença de mais de dez pontos percentuais nos últimos anos. Por outro lado, a indústria e a agropecuária perdem participação no Produto Interno Bruto. As mudanças decorrem da incorporação de dados das Pesquisas Anuais da Indústria, Comércio, Serviços e de Construção, reformuladas pelo IBGE na segunda metade da década de 90, e das informações da Declaração de Informações Econômicas – Fiscais das Pessoas Jurídicas. Alterou-se, principalmente, os cálculos dos aluguéis, dos serviços da administração pública, dos serviços financeiros e dos serviços de informação. Algumas atividades que não faziam parte do cálculo foram incorporadas, como o serviço de internet de banda larga do setor comunicações.

Novo PIB – revisão dos indicadores % do PIB

Carga Tributária em % do PIB

Revista de

Conjuntura

30

Ano

CT CT Nova anterior

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

25,8 24,5 27,1 27,5 27,2 30,4 31,3 32,4 32,0 32,6 33,7 34,2 33,6

Carga Líquida = Carga Bruta menos Juros

Carga Tributária Bruta e Líquida

29,0 28,1 29,0 29,7 31,7 32,5 34,0 35,6 34,9 35,9 37,4 38,5 38,2 Fonte: Amir Khair


crescimento populacional. Na nova série, o IBGE passou a usar a variação de pessoas empregadas pela administração pública (pessoal ocupado). Outra mudança importante no cálculo desta atividade, foi a estimativa da depreciação, que passou a considerar o valor bruto da produção. Antes, ao contrário das demais atividades, a administração pública era computada pelo valor líquido. Quanto ao Setor Financeiro, a maior variação está na aferição da intermediação financeira, do spread entre a captação e os empréstimos de recursos. Esta não tinha seu destino computado, aparecendo, na metodologia anterior, em uma atividade fictícia, a dummy financeira. Na nova metodologia, ampliou-se a abrangência da

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Pela ótica da demanda, a participação do consumo das famílias é maior na nova série, tendo em vista, principalmente a nova fonte de informação utilizada: a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), projetada para os anos correntes com base nos dados anuais de renda da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD). Nota-se também uma menor participação da Formação Bruta do Capital Fixo em Construção, tendo em vista a incorporação de informação da Declaração de Informações das Pessoas Jurídicas e das pesquisas anuais da indústria e da construção. Para Carlos Alberto Ramos, pelo lado da oferta, cai a participação do Setor Agropecuário, da Indústria de Transformação e da Construção Civil. Do lado da demanda, aumenta o Consumo das Famílias e cai a Formação Bruta de Capital Fixo (em ambos os casos fala-se como proporção do PIB). “A Formação Bruta de Capital Fixo, por exemplo, cai de mais ou menos 20% do PIB para pouco menos de 17%”. Aumara cita ainda as atividades do governo e do setor financeiro como sujeitas à mudanças no cáculo. “No caso da Administração Pública, tem-se três atividades: Educação Pública, Saúde Pública e Administração Pública. Esta última, ao reunir serviços de caráter coletivo (justiça, defesa, administração geral), enfrenta problemas como a situação das bases de informação e a determinação do preço, por ser uma atividade não mercantil. O IBGE procurou minimizar os problemas de aferição. Na série anterior, pressupunha-se que a oferta de serviços da administração pública acompanhasse o ritmo de crescimento da demanda (governo não acumula estoques), usando como proxi a estimativa do

31

intermediação financeira, incluindo os fundos de investimento, bem como eliminou-se a dummy financeira, distribuindo o seu valor conforme sua utilização pelos demais setores”, afirma. Para muitos analistas essas mudanças foram encaradas de forma positiva para o crescimento do País, conforme conclui o economista Carlos Alberto.“Um dos indicadores da possibilidade de crescimento econômico, o investimento, apesar de ter caído, se mostrou de melhor qualidade e mais produtivo. Aumentou o peso dos investimentos em máquinas e equipamentos, tipo de bem melhor correlacionado com maiores taxas de crescimento. Os dados do último ano também mostraram uma variação maior do investimento na nova série (passando de 6,3% para 8,7%), com o crescimento de máquinas e equipamentos em 12% e de construção civil em 4,4%. Assim, as mudanças refletiram um país com maior renda, menos endividado, apesar do menor superávit primário relativo ao PIB, e mais produtivo, apesar do menor investimento. As perspectivas de crescimento oficiais e de mercado para os próximos anos se elevaram, melhorando os indicadores de confiança no país”.


Artigo

Perdas da Poupança com os Planos Bresser, Verão e Collor josé Luiz Pagnussat

32

Os planos econômicos foram fartos em expurgar parte da correção monetária de reajustes contratuais como o salarial, do FGTS e até da poupança, atropelando a legislação vigente e proporcionando grandes “esqueletos” para o governo federal e múltiplas ações na justiça contra perdas de trabalhadores, investidores, poupadores etc. Este artigo procura esclarecer a questão das perdas das cadernetas de poupança derivadas da mudança na forma de calcular a correção monetária implementada pelos planos Bresser, de 12 de junho de 1987; Verão, de 15 de janeiro de 1989; Collor I, de 15 de março de 1990; e Collor II, de 31 de janeiro de 1991. Este tema tem sido destaque da mídia nos últimos meses dada a proximidade de término do prazo para ajuizar ações na justiça para receber a diferença de remuneração da poupança do Plano Bresser. As informações disponíveis indicam que milhões de poupadores,

a alteração do indexador alcançou de forma retroativa e indevida as cadernetas de poupança com aniversário na primeira quinzena do mês. Neste caso, a justiça já reconheceu que os poupadores têm direito à aplicação retroativa do IPC – Índice de Preços ao Consumidor – de 26, 06% no mês de junho de 1987 e de 42,72% no mês de janeiro de 1989 nos saldos existentes à época, deduzidos os percentuais já pagos a título de correção monetária na ocasião (18,02 e 22,35%, respectivamente). O Plano Collor I (mar/90) foi ainda mais ousado, suprimindo a correção monetária da poupança no mês de abril de 1990 e aplicando indexador inadequado no mês de maio, o mesmo ocorrendo com o Plano Collor II (jan/91). Nestes casos, os poupadores terão direito a pleitear a título de correção monetária, a correção integral do IPC de março de 1990 (44,80%) e as diferenças entre os percentuais devidos em maio/90 (7,87%) e fevereiro/91 (21,87%), deduzidos dos percentuais pagos

que possuíam depósito em caderneta de poupança na época, esqueceram de buscar esse direito pacífico e recuperar a parcela expurgada de suas contas relativas à atualização monetária.

nos respectivos meses (5,38% e 7,00%). O Quadro 1 ilustra as diferenças entre a correção monetária devida e a efetivamente aplicada em cada um dos planos. Certamente há controvérsias sobre a aplicação dos indexadores para a correção monetária da poupança. A Justiça já promulgou milhares de sentenças reconhecendo, na maioria dos casos, essas diferenças, determinando a aplicação sobre os saldos das poupanças da época e a atualização monetária dos valores devidos aos poupadores e o pagamento de juros de mora de 0,5% ao mês, além dos juros contratuais. Surge aqui outro problema, que é a escolha do indexador para correção dos valores. Algumas deci-

Revista de

Conjuntura

Os Expurgos da Poupança Os expurgos da correção monetária da poupança ocorreram em razão da manipulação dos índices de inflação pelos referidos planos, pela alteração dos indexadores e sua aplicação retroativa de forma indevida, entre outras impropriedades aplicadas. No caso do Plano Bresser (jun/87) e Verão (jan/89)


‘‘

O Plano Bresser foi instituído pelo Decreto-Lei Nº 2.335, de 12 de Junho de 1987. Congelou, pelo prazo máximo de 90 dias, todos os preços, inclusive os referentes a mercadorias, prestações de serviços e tarifas, nos níveis dos preços praticados no dia 12 de junho de 1987. Instituiu a Unidade de Referência de Preços (URP) com variação trimestral pela média do IPC – Índice de Preços ao Consumidor do IBGE, para fins de reajustes de preços e salários. O Plano Bresser mudou a forma de cálculo da correção monetária da poupança. As regras para remuneração da poupança foram definidas pelo Conselho Monetário Nacional, conforme previa o artigo 16 do Decreto-Lei, e divulgadas pelo Banco Central pela Resolução nº 1.338, de 15 de junho de 1987. As novas regras foram aplicadas de forma retroativa, indevidamente, sobre os saldos das cadernetas de poupança com aniversário entre os dias 1º e 15 do

‘‘

Plano Bresser (12/06/87)

As novas regras foram aplicadas de forma retroativa, indevidamente, sobre os saldos das cadernetas de poupança com aniversário entre os dias 1º e 15 do mês. Tais contas-poupança não poderiam ser atingidas pelas novas normas, que só deveriam ser aplicadas a partir de 16 de junho de 1987

mês. Tais contas-poupança não poderiam ser atingidas pelas novas normas, que só deveriam ser aplicadas a partir de 16 de junho de 1987. A mudança do indexador para a correção monetária da poupança foi exclusiva para o mês de julho. A Resolução 1.338 alterou a correção nominal da OTN – Obrigações do Tesouro Nacional, que era feita pela variação do IPC e nesse mês foi atualizada pelo rendimento da LBC (Letras do Banco Central), do período de

Quadro 1 - Expurgos da Correção Monetária na Poupança Rentabilidade da Poupança (paga no mês seguinte)

Planos

Correção monetária devida

Diferença (CM)

período

CM paga

Remuneração (CM+juros)

Plano Bresser

Jun/ago/87

18,02%

18,61

26, 06%

8,04%

Plano Verão

Jan/fev/89

22,35%

22,97

42,72%

20,37%

mar/abr/90

0%

0,5

44,80%

44,80%

abr/mai/90

5,38%

5,91

7,87%

2,49%

jan/fev/91

7,00%

7.54

21,87%

14,87%

Plano Collor I

Plano Collor II

janeiro / junho / 2007

sões da justiça têm aplicado o INPC – Índice Nacional de Preços ao Consumidor do IBGE, que é um dos piores indexadores para o poupador, como veremos mais adiante. Para entender uma pouco melhor a controvérsia sobre as diferenças de correção monetária faremos a seguir uma síntese das alterações promovidas pelos respectivos planos econômicos.

33


1º a 30 de junho de 1987. A partir do mês de agosto de 1987, o valor nominal da OTN volta a ser atualizado, mensalmente, pela variação do IPC, e a correção monetária da poupança passa a ser o valor maior entre a variação do valor nominal das OTN ou o rendimento das LBC. O texto da Resolução era o seguinte: “I - O valor nominal das Obrigações do Tesouro Nacional – OTN será atualizado, no mês de julho de 1987, pelo rendimento produzido pelas Letras do Banco Central (LBC) no período de 1º a 30 de junho de 1987, inclusive. II - A partir do mês de agosto de 1987, o valor nominal da OTN será atualizado, mensalmente, pela variação do Índice de Preços ao Consumidor – IPC, aferido segundo o critério estabelecido no art. 19 do Decretolei n. 2.335, de 12.06.87. III - Os saldos das cadernetas de poupança, bem como os do Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS) e do Fundo de Participações PIS/PASEP, serão atualizados, no mês de julho de 1987, pelo mesmo índice de variação do valor nominal da OTN. IV - A partir do mês de agosto de 1987, os saldos referidos no item anterior serão atualizados por um dos seguintes índices, comparados mês a mês: a) a variação do valor nominal das OTN; ou, se maior,

‘‘ Conjuntura Revista de

‘‘

34

A alteração na correção monetária da poupança significou a perda de 8,04% do índice de reajuste, pois ao invés de se aplicar o percentual de 26,69% (26,06% da OTN/IPC + 0,5% de juros contratuais da poupança), foi aplicado o percentual de 18,61% (18,02% LBC + 0,5% juros).

b) o rendimento das LBC que exceder o percentual fixo de 0,5% (meio por cento).” A alteração na correção monetária da poupança significou a perda de uma parcela de 8,04% do índice de reajuste, pois ao invés de se aplicar o percentual de 26,69% (26,06% da OTN/IPC + 0,5% de juros contratuais da poupança), foi aplicado o percentual de 18,61% (18,02% LBC + 0,5% juros). Prescrição do Plano Bresser A possibilidade de cobrar essa dívida das instituições financeiras, que se apropriaram indevidamente de tais valores, prescreveu em 11/junho/2007 (contado da edição do Decreto-Lei 2.335). O prazo tem como base legal o prazo prescricional para obrigações pessoais, definido pelo Código Civil, que é de 20 anos. Cabe registrar a controvérsia sobre a data da prescrição, associada aos seguintes fatos: prescrição em 31 de maio, que corresponde ao mês anterior ao da instituição do plano e dado que as cadernetas de poupança de 1º de junho foram atingidas pela mudança na correção; 11 de junho, contado da edição do Decreto-Lei, que foi 12 de junho; 15 de junho, contado da edição da resolução 1.338 do Conselho Monetário Nacional (Banco Central), que efetivou a alteração do indexador da poupança; ou, ainda, 1º a 15 de julho, conforme a data de aniversário da poupança, quando se creditou a remuneração menor nas contas dos poupadores. Os advogados têm recomendado, para evitar eternas discussões judiciais sobre a ocorrência ou não da prescrição, considerar o dia 31/05/2007 como data final do prazo prescricional. Plano Verão (15/01/1989) O Plano Verão foi instituído pela Medida Provisória nº 32, de 15.01.89, convertida na Lei nº 7.730, de 31.01.89. Instituiu o cruzado novo em substituição ao cruzado – com corte de três zeros; congelamento dos preços; e regras de desindexação da economia. O Plano Verão determinou a correção da poupança pelo rendimento da LFT (Letra Financeira do Tesouro), nos meses de fevereiro e março/89, em substituição ao


‘‘

A aplicação da LFT implicou em reajuste de 22,35% nos saldos das cadernetas de poupança, em fevereiro de 1989, valor muito inferior aos índices de inflação de janeiro. Hoje, é pacífico o entendimento da justiça no sentido de ser devido o percentual de 42,72% [...]

‘‘

rial número 202, de 31 de janeiro de 1989, e pelo aviso número 174 do Ministério do Planejamento, foram determinados procedimentos especiais para o cálculo do IPC de janeiro e fevereiro de 1989 ... A variação do IPC de janeiro de 1989 (70,28%) mediu a inflação ocorrida entre o dia 30 de novembro de 1988 e o dia 20 de janeiro de 1989, ou seja, a variação do IPC de janeiro expressa a elevação de preços verificada ao longo de 51 dias. Conseqüentemente, o IPC de fevereiro (3,60%) mediu a inflação ocorrida entre 20 de janeiro e 31 de janeiro de 1989, expressando a variação de preços verificada ao longo de 11 dias.”

Quadro 2 – Variação da Inflação e da Selic no período pós-planos até abril de 2007 (Em milhões %) Indicadores

Bresser (jul/87)

Verão (fev/89)

Collor I (Abr/90)

Collor II (fev/91)

IGP-DI (FGV)

44.387,1

1.535,7

20,9

5,437297

ICV (Dieese)

43.697,2

1.702,5

19,4

4,550

IPCA (IBGE)

30.319,1

1.058,6

13,2

3,268

INPC (IBGE)

29,633,4

1.051,4

13,8

3,445

IPC-SP (Fipe)

20,847,1

870,7

11,7

2,956

Selic

464.246,6

14.612,5

198,0

43,86

janeiro / junho / 2007

IPC até então adotado. A regra foi estabelecida pelo Artigo 17 da MP 32 (Lei 7.730), conforme segue: “Art. 17. Os saldos das cadernetas de poupança serão atualizados: I - no mês de fevereiro de 1989, com base no rendimento acumulado da Letra Financeira do Tesouro Nacional - LFT, verificado no mês de janeiro de 1989, deduzido o percentual fixo de 0,5% (meio por cento); II - nos meses de março e abril de 1989, com base no rendimento acumulado da Letra Financeira do Tesouro - LFT, deduzido o percentual fixo de 0,5% (meio por cento), ou da variação do IPC, verificados no mês anterior, prevalecendo o maior; III - a partir de maio de 1989, com base na variação do IPC verificada no mês anterior.” A mudança na regra de correção monetária atingiu, indevidamente as cadernetas de poupança com aniversário na primeira quinzena do mês, por aplicação retroativa da Medida Provisória nº 32/89, de 15.01.89, posteriormente convertida na Lei nº 7.730/89. A aplicação da LFT implicou em reajuste de 22,35% nos saldos das cadernetas de poupança, em fevereiro de 1989, valor muito inferior aos índices de inflação de janeiro. Hoje, é pacífico o entendimento da justiça no sentido de ser devido o percentual de 42,72%, a título de correção monetária, das cadernetas de poupança abertas ou renovadas na primeira quinzena de janeiro de 1989. Portanto, a perda resultante é de 20,37%, sobre os respectivos saldos da época (janeiro/1989). É interessante registrar a manipulação no cálculo do IPC promovida pela Medida Provisória nº 32, que instituiu o Plano Verão. Segundo o IBGE, “em seu artigo número 9, complementado pela Portaria Interministe-

35


Quadro 3: Mudanças de Moeda no período de 1986 a 2007 Plano Econômico

Denominação da moeda

Símbolo

Período de Vigência

Paridade em Relação à Moeda Anterior

Plano Cruzado

Cruzado

Cz$

28/02/1986 a 15/01/1989

1.000 cruzeiros = 1,00 cruzado

Plano Verão

Cruzado Novo

NCz$

16/01/1989 a 15/03/1990

1.000 cruzados = 1,00 cruzado novo

Plano Collor I

Cruzeiro

Cr$

16/03/1990 a 31/07/1993

1,00 cruzado novo = 1,00 cruzeiro

Plano xxx

Cruzeiro Real

CR$

1/08/1993 a 30/06/1994

1.000 cruzeiros = 1,00 cruzeiro real

Plano Real

Real

R$

Desde 01/07/1994

CR$ 2.750,00 cruzeiros reais = R$ 1,00 real

Algumas ações judiciais têm utilizado esse índice de 70,28% para a correção monetária da caderneta de poupança. Entretanto, a manipulação do índice elevou consideravelmente o seu valor o que impõe o ajuste para os critérios prevalecentes antes do plano. Plano Collor I (15/03/1990)

‘‘

O Plano Collor I foi instituído pelas Medidas Provisórias nº 154 e nº 168, de 15.03.90, convertidas nas

Conjuntura Revista de

‘‘

36

As demais aplicações em caderneta de poupança, não convertidas em cruzeiros ou as contas novas em poupança, já em cruzeiros, abertas em data posterior ao dia 15 de março de 1990, receberam, am abril de 1990, atualização vinculada à variação do BTNF

Leis nº 8.030 e nº 8.024, de 12.04.90, respectivamente. Promoveu o confisco da poupança e restabeleceu a denominação de cruzeiro para a moeda nacional, em substituição ao cruzado novo. A remuneração da poupança foi de 0,5% e 5,91% nos meses de abril e maio, incluindo correção monetária mais juros contratuais. Enquanto isso, o IPC de março foi de 84,32%, o de abril foi de 44,80% e o de maio foi de 7,87%. A perda estimada foi de 44,8%, referente atualização monetária do mês de abril, e 2,49%, referente à diferença na correção monetária de maio. Cabe, entretanto, uma análise caso a caso, dado que alguns bancos aplicaram corretamente os índices e dada a diversidade na aplicação das regras, conforme a data e situação da poupança. Em abril de 1990, foi aplicada a atualização vinculada a variação do IPC de 84,32%, para as quantias já objeto de caderneta de poupança, convertidas para cruzeiros em data anterior a 15 de março de 1990, ou ainda, em cruzados novos, com aniversário até o dia 13. As demais aplicações em caderneta de poupança, não convertidas em cruzeiros, ou as contas novas em poupança, já em cruzeiros, abertas em data posterior ao dia 15 de março de 1990, receberam, am abril de 1990, atualização vinculada à variação do BTNF. Há controvérsia sobre o expurgo da correção monetária nas poupanças que venciam de 14 a 28 de março de 1990. Essas contas renderiam 85,24% (IPC+juros), porém tiveram correção pouco acima de


O Plano Collor II foi instituído pelas Medidas Provisórias Nºs 294 e 295, de 31/01/1991, convertidas, respectivamente, nas Leis Nºs 8.177 e 8.178, de 1/03/1991. Criou a taxa de referência de juros (TR) como instrumento de remuneração das aplicações financeiras de curto prazo e que serviria para compor a remuneração das cadernetas de poupança. A alteração determinou perdas na correção monetária da poupança, que deveria ter sido de 21,87%, em fevereiro/91, mas que apresentou remuneração de apenas 7,54% (CM+juros). Deduzidos os percentuais já considerados a título de correção monetária, a perda total foi de 14,87%.

‘‘

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Plano Collor II (31/01/1991),

A inflação do Plano Bresser para cá, medida pelo IGP-DI (Índice Geral de Preços) da FGV a partir de julho, é de 44,39 bilhões percentual; de 29,63 bilhões pelo INPC; e, no caso do IPC-SP a inflação do período é de 20,85 bilhões

Correção dos Valores devidos Identificadas as perdas decorrentes da não aplicação correta dos índices de correção monetária nas cadernetas de poupança pelos diversos planos econômicos, o passo seguinte é a atualização monetária dos valores devidos e a aplicação de juros contratuais (remuneratórios da poupança) de 6% ao ano (0,5% ao mês) e de juros de mora (0,5% ao mês). O IDEC (Instituto de Defesa do Consumidor) propõe um cálculo que inclui a correção dos valores, juros remuneratórios e juros de mora. O fator acumulado utilizado pelo IDEC é composto do índice acumulado das cadernetas de poupança, com a inclusão dos expurgos inflacionários reconhecidos judicialmente, já consideradas as reformas monetárias ocorridas no período. Ao resultado, é necessário aplicar, ainda, os juros de mora. Para o cálculo dos índices de juros de mora o IDEC adota 0,5% ao mês até janeiro/2003 e 1% a partir de fevereiro/2003. Podem ser adotados outros índices para atualização monetária dos valores devidos, como já vem ocorrendo em diversas decisões judiciais. A escolha do índice é importante para não acarretar prejuízo para o poupador, dada a grande diferença entre os índices de inflação no período. A inflação do Plano Bresser

para cá, medida pelo IGP-DI – Índice Geral de Preços da FGV a partir de julho, é de 44,39 bilhões percentual; de 29,63 bilhões pelo INPC; e, no caso do IPC-SP a inflação do período é de 20,85 bilhões. A melhor opção é a aplicação da Taxa Selic cuja variação no período foi de 464,2 bilhões %. O Quadro 2 faz a comparação dos índices de inflação para o período posterior à edição de cada um dos planos até abril de 2007, e inclui a variação da taxa selic. A atualização monetária dos valores deve considerar, ainda, as mudanças de moeda ocorridas no período, que além da alteração da denominação da moeda teve três cortes de 3 zeros do valor e a divisão por 2.750. O Quadro 3 ilustra as alterações da moeda nacional no período considerado. Considerações Finais As perdas dos poupadores com as mudanças na correção monetária dos saldos da poupança, introduzidas pelos planos Bresser, Verão, Collor 1 e 2 são significativas. Os dados apresentados ilustram a magnitude. Esta análise se aplica também para o FGTS, no caso dos trabalhadores que não assinaram o acordo e não

janeiro / junho / 2007

4% (BTNf ). Por outro lado, há indicações de que nem todas as contas com aniversário até o dia 15 do mês, tiveram a correção pelo IPC.

37


entraram na justiça reivindicando as perdas. Os trabalhadores que fizeram o acordo têm uma referência dos valores devidos em função dos expurgos. No caso do acordo do FGTS, os trabalhadores não receberam a totalidade dos expurgos e, ainda, foi aplicado um deságio crescente em função do valor devido, além do pagamento parcelado. A prescrição do Plano Bresser ocorreu em junho e do Plano Verão ocorre em dezembro de 2008. Nestes dois planos, tiveram perdas todos que possuíam aplicações em caderneta de poupança, com aniversário entre os dias 1º e 15, em junho de 1987 e janeiro de 1989, e mantiveram suas aplicações até o mês seguinte. O artigo não pretendeu esgotar o tema, mas colocar na pauta de discussão as perdas esquecidas pelos poupadores e estimular o debate sobre o assunto.

José Luiz Pagnussat Economista, ex-presidente do Cofecon e ANGE

Revista de

Conjuntura

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Região metropolitana de Brasília: um fosso entre o DF rico e o entorno metropolitano empobrecido

39

Júlio Miragaya O Brasil conviveu durante muito tempo com uma distribuição de suas atividades produtivas fortemente concentradas nas grandes cidades, principalmente nas suas Regiões Metropolitanas (RM), e, particularmente, nos núcleos destas, os municípios das capitais; desempenhando os municípios periféricos a função de cidades-dormitório. Nos últimos anos esta situação vem se modificando, de forma que houve um espraiamento das atividades econômicas para as cidades de porte médio, e, dentro das regiões metropolitanas, seu deslocamento para seus municípios periféricos. Este processo se deu em tal magnitude que hoje o Produto Interno Bruto (PIB) per capita das periferias de algumas metrópoles chega mesmo a superar o do núcleo metropolitano, casos de São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre e Salvador; e em outros casos (Rio de Janeiro e Recife), se aproximam bastante. A notável exceção à esta realidade é a região me-

tropolitana de Brasília. Aqui existe um verdadeiro fosso entre o Distrito Federal e os municípios que compõem o seu entorno metropolitano, tanto em relação ao tamanho do PIB como quanto ao valor do PIB per capita. A causa principal desta situação foi o seu excepcional crescimento populacional, sem o correspondente desenvolvimento de atividades produtivas, particularmente, da atividade industrial. Os quadros 01 e 02 apresentam o PIB total e per capita das sete principais regiões metropolitanas do país em 2004, e que são também aquelas em que se realizam pesquisas de emprego. Observa-se no Quadro 01 que o PIB da RM de Brasília totaliza R$ 46,5 bilhões, sendo o sexto maior do país, e não muito distante do terceiro, Porto Alegre (R$ 57,5 bilhões). Ocorre que, diferentemente das demais RMs, ele se encontra fortemente concentrado no núcleo da RM, o Distrito Federal.

Quadro 1: produto interno bruto (PIB) nas principais regiões metropolitanas em 2004 (em milhões de reais)

Região metropolitana

Total (A)

Núcleo metropolitano (B)

Periferia metropolitana (C)

(C) / (A) (%)

São Paulo

286.986,2

160.637,5

126.348,7

44,0

Rio de Janeiro

118.808,7

73.974,9

44.833,8

37,7

Belo Horizonte

56.853,4

24.513,4

32.340,0

56,9

Porto Alegre

57.464,0

15.944,2

41.519,8

72,3

Recife

30.176,9

14.279,5

15.897,4

52,7

Salvador

49.194,9

14.218,1

34.976,7

71,1

Brasília

46.543,0

43.521,6

3.021,4

6,5

Fonte: IBGE.

janeiro / junho / 2007

Artigo


Quadro 02: PIB per capita nas principais regiões metropolitanas em 2004 (em reais). Região metropolitana

Total

Bsb =100

Núcleo metrop.(a)

Bsb =100

Periferia metrop. (b)

Bsb =100

(a) / (b) (%)

São Paulo

15.004

102

14.821

78

15.243

439

97,2

Rio de Janeiro

10.490

71

12.224

64

8.648

249

141,4

Belo Horizonte

11.879

80

10.429

55

13.278

382

78,5

Porto Alegre

14.437

98

11.257

59

16.195

466

69,5

Recife

8.502

58

9.604

50

7.696

222

124,8

Salvador

14.920

101

5.402

28

53.065

1.527

10,2

Salvador (1)

7.877

53

5.402

28

22.157

638

24,4

Brasília

14.769

100

19.071

100

3.475

100

548,8

(1) excluindo os municípios de Camaçari e São Francisco do Conde.

Revista de

Conjuntura

40

Dessa forma, enquanto as demais periferias metropolitanas apresentam uma enorme participação no PIB metropolitano, no mínimo de 37%, chegando em alguns casos, como Porto Alegre e Salvador, a superar o patamar de 70%, na região metropolitana de Brasília esta participação limita-se a pífios 6,5%. Quanto ao PIB per capita, o Quadro 02 revela que a Região Metropolitana de Brasília só é superada, e apenas levemente, pelas RMs de São Paulo e Salvador (o caso de Salvador deve ser relativizado devido ao excepcional peso dos setores petrolífero e petroquímico nos municípios de São Francisco do Conde e Camaçari). Entretanto, tratando-se isoladamente o PIB per capita dos núcleos das RMs, verifica-se que Brasília supera amplamente as demais regiões, com quase 30% acima de São Paulo, a segunda colocada. Por sua vez, analisando-se os números nas periferias metropolitanas, a situação se inverte completamente. O PIB per capita do entorno metropolitano de Brasília é disparadamente o menor, sendo inferior a metade dos verificados nas periferias metropolitanas do Recife e do Rio de Janeiro e de quatro a cinco vezes inferior aos encontrados em São Paulo, Porto Alegre e Belo Horizonte. A causa principal desta situação é a não ocorrência na RM de Brasília de um processo que se deu em todas as demais RMs: a industrialização das periferias metropolitanas. Até algumas décadas atrás praticamente restritos ao conhecido ABC paulista, este processo se propagou a

Fonte: IBGE.

partir da década de 1970, com a fortíssima industrialização de inúmeros municípios metropolitanos. Pode-se destacar Guarulhos, Osasco e Mogi dass Cruzes (RM de São Paulo); Canoas, Triunfo e Novo Hamburgo (RM de Porto Alegre); Contagem e Betim (RM de Belo Horizonte); Duque de Caxias e Nova Iguaçu (RM do Rio de Janeiro); Cabo e Jaboatão (RM do Recife) e Camaçari e Candeias (RM de Salvador). Deve-se destacar que o surgimento de plantas industriais estimulou nesses municípios o desenvolvimento dos serviços de apoio à indústria. Mas a periferia metropolitana de Brasília ficou absolutamente à margem deste processo. 1 – Comportamento do mercado de trabalho O quadro 03 apresenta a evolução da PEA e da ocupação nas principais regiões metropolitanas do país entre 2003 e 2006. Observa-se que o Brasil vem, desde meados de 2003, não obstante o reduzido ritmo de crescimento do PIB, experimentando uma expressiva recuperação nos níveis de emprego. A taxa de desemprego vem decrescendo, segundo todas as pesquisas realizadas (PED/DIEESE, PME/IBGE, PNAD/IBGE). Consequentemente, ocorreu uma sensível redução do contingente desempregado em todas as RMs, com uma equivalente queda em todas as taxas de desemprego.


Região metropolitana

(nov/03)

São Paulo

9.878

10.136

7.912

Rio Janeiro (1)

5.324

5.480

Rio Janeiro (2)

5.324

B. Horizonte

PEA

PEA

PO

PO

Desemp Desemp Taxa(%) Taxa(%)

(nov/06) (nov/03) (nov/06)

(nov/03)

(nov/06)

(nov/03)

(nov/06)

8.707

1.966

1.429

19,9

14,1

4.848

5.078

476

401

8,9

7,3

5.480

4.574

4.850

750

630

14,1

11,5

2.319

2.505

1.869

2.207

450

298

19,4

11,9

Porto Alegre

1.783

1.903

1.475

1.642

308

261

17,3

13,7

Recife

1.541

1.605

1.179

1.263

362

342

23,5

21,3

Salvador

1.706

1.781

1.249

1.378

457

403

26,8

22,6

Brasília (3)

1.142

1.257

893

1.033

249

224

21,8

17,8

(1) dados referentes a Pesquisa Mensal de Emprego – PME/IBGE. (2) dados da PME/IBGE ajustados à metodologia da PED/DIEESE. (3) dados referentes apenas ao Distrito Federal, não incluindo o Entorno Metropolitano.

Fonte: Pesquisa de Emprego e Desemprego – DIEESE e Pesquisa Mensal de Emprego - IBGE.

de 18,1%; tal resultado foi parcialmente anulado pela grande expansão da população econômicamente ativa (PEA) no período, a maior entre todas as regiões metropolitanas. Deve-se destacar que o aumento de 115 mil pessoas na PEA no período de 3 anos (38 mil pessoas/ano ou crescimento de 3,3% ao ano) refere-se apenas ao Distrito Federal. Estima-se que a PEA no Entorno Metropolitano seja da ordem de 450 mil, e cresça numa velocidade quase duas vezes maior (6% ao ano ou 27 mil pessoas). Em suma, são cerca de 60 mil pessoas ingressando a cada ano no mercado de trabalho da RM de Brasília.

O Quadro 4 apresenta estas variações em termos absolutos e relativos, revelando que Brasília apresentou o segundo pior desempenho quanto à redução do contingente desempregado. Enquanto o número de desempregados teve uma redução de quase 34% na RM de Belo Horizonte, de quase 30% em São Paulo e de mais de 15% em Porto Alegre, Rio de Janeiro e Salvador, no Distrito Federal a queda foi de 10%, superando apenas a RM do Recife. Muito embora tenha tido o segundo maior incremento em termos de ocupação; que cresceu 15,7% no período, superado apenas pela RM de Belo Horizonte, com expansão

Quadro 4: Variação absoluta (em mil pessoas) e relativa (%) da PEA, pessoal ocupado e contingente desempregado nas principais regiões metropolitanas entre novembro de 2003 e novembro de 2006. Região metropolitana

PEA (mil)

Var. (%)

(mil)

Var. (%)

São Paulo

258

2,6

795

Rio de Janeiro (1)

156

2,9

Belo Horizonte

186

Porto Alegre

PEA

PO

PO

DESEMP DESEMP (mil)

Var. (%)

10,0

- 537

-27,3

276

6,0

- 120

- 16,0

8,0

338

18,1

- 152

- 33,8

120

6,7

167

11,3

- 47

- 15,3

Recife

64

4,2

84

7,1

- 20

- 5,5

Salvador

75

4,4

129

10,3

- 54

- 17,5

Brasília (2)

115

10,1

140

15,7

- 25

- 10,0

(1) dados da PME/IBGE ajustados à metodologia da PED/DIEESE. (2) dados referentes apenas ao Distrito Federal, não incluindo o Entorno Metropolitano.

Fonte: Pesquisa de Emprego e Desemprego – PED/DIEESE.

janeiro / junho / 2007

Quadro 03: Evolução da PEA, pessoal ocupado e contingente desempregado nas principais regiões metropolitanas entre novembro de 2003 e novembro de 2006 (em mil pessoas).

41


2 – Migração, crescimento demográfico e PEA Em suma, ao se aproximar de seu cinquentenário, o acelerado ritmo de crescimento demográfico, decorrente do forte fluxo migratório (explicado pelo fator renda), continua sendo um problema e uma oportunidade para Brasília e sua região. Se de um lado, este explosivo crescimento seja responsável pela elevada taxa de desemprego, parcialmente anulando os efeitos positivos da recuperação dos níveis de emprego, de outro, tem contribuído para a emergência de Brasília e região como um dos principais mercados do país. Os Quadro 05 e 06 apresentam a evolução populacional em termos absolutos e relativos na Região Metropolitana de Brasília desde a transferência da capital. De pouco mais de 200 mil habitantes em 1960, a população da Região Metropolitana atingiu 3,33 milhões em 2006, devendo alcançar 3,78 milhões em 2010, quando Brasília

completará 50 anos de existência. O Quadro 7 apresenta a população estimada em 2006 das sete principais Regiões Metropolitanas. Observa-se que a participação do Entorno Metropolitano já se aproxima dos 30%, percentual bem superior ao do PIB (6,5%). Já os quadros 8 e 9 apresentam a evolução populacional das regiões metropolitanas desde as suas efetivas formações em 1940. Pode-se observar uma notável desaceleração nas taxas de crescimento populacional de todas as RMs, inclusive de Brasília. Ocorre, contudo, que a partir de 1980, enquanto nas demais RMs a queda no ritmo de crescimento persiste, na RM de Brasília o ritmo tem se mantido relativamente estável. Deve-se registrar que, nos casos de Belo Horizonte e Porto Alegre, o crescimento no período 2000/06 maior que no período precedente (1991/00) decorreu da incorporação de novos municípios às respectivas regiões metropolitanas.

Quadro 05: evolução da população na região metropolitana de Brasília no período de 1960 a 2006.

Revista de

Conjuntura

42

Anos

1960

1970

1980

1991

1996

2000

2006 (1)

Área metr. Brasília

208.098

625.916

1.357.198

1.980.432

2.368.119

2.748.086

3.326.832

Distrito Federal

140.164

537.492

1.176.935

1.601.094

1.821.946

2.047.794

2.383.784

Perif. metr. Brasília

67.934

88.424

180.263

379.338

546.173

700.292

943.048

Águas Lindas Goiás

(2)

(2)

(3)

(3)

61.478

105.379

168.919

Alexânia

8.022

9.390

12.124

16.472

18.623

20.063

22.689

Cidade Ocidental

(2)

(2)

(2)

(2)

33.147

40.375

48.778

Formosa

21.708

28.874

43.296

62.982

68.704

78.647

92.331

Luziânia

27.444

32.807

80.089

207.674

106.695

140.813

187.262

Novo Gama

(2)

(2)

(2)

(2)

60.497

74.297

96.442

Padre Bernardo

4.637

8.381

15.857

16.500

16.879

21.495

25.220

Planaltina de Goiás

6.123

8.972

16.172

40.201

58.576

73.546

98.491

Sto Ant. Descoberto

(2)

(2)

12.725

35.509

46.194

51.717

78.995

Valparaíso de Goiás

(2)

(2)

(2)

(2)

75.380

93.960

123.921

(1) estimativa; (2) Incluído em Luziânia; (3) Incluído em Santo Antônio do Descoberto.

Fonte: IBGE.


Períodos

1960/70

1970/80

1980/91

1991/00

2000/06 (1)

Área metr. Brasília

11,64

8,05

3,50

3,72

3,24

Distrito Federal

14,39

8,15

2,84

2,77

2,56

Perif. metr. Brasília

2,67

7,37

6,99

7,05

5,09

Águas lindas Goiás

-

-

-

-

8,18

Alexânia

1,59

5,47

0,27

2,21

2,07

Cidade Ocidental

-

-

-

-

3,20

Formosa

2,89

4,14

3,46

2,50

2,71

Luziânia

1,80

9,34

9,04

-

4,87

Novo gama

-

-

-

-

4,44

Padre Bernardo

6,10

3,49

2,92

3,19

2,70

Planaltina de Goiás

3,83

6,07

8,63

6,95

4,99

Sto Ant. Descoberto

-

-

9,46

4,64

7,32

Valparaíso de Goiás

-

-

-

-

4,72

(1) estimativa.

Fonte: IBGE.

Quadro 07: população nas principais regiões metropolitanas em 2006. Região metropolitana

Total

Núcleo metropolitano (A)

Periferia metropolitana (B)

(B)/(A) (%)

São Paulo

19.677.506

11.016.703

8.660.803

44,0

Rio de Janeiro

11.467.222

6.136.652

5.330.570

46,5

B.Horizonte

4.975.126

2.399.920

2.575.206

51,8

Porto Alegre

4.101.032

1.440.939

2.660.093

64,9

Recife

3.646.204

1.515.052

2.131.152

58,4

Salvador

3.408.273

2.714.018

694.255

20,4

Brasília

3.326.832

2.383.784

943..048

28,3

Fonte: IBGE.

Quadro 08: população nas regiões metropolitanas brasileiras no período 1940 a 2006. Região metropolitana

1940

1950

1960

1970

São Paulo

1.531.226

2.662.786

4.791.167

8.137.401

12.588.439 15.435.707 17.833.511 19.677.506

Rio Janeiro

2.227.245

3.177.304

4.869.103

6.893.286

8.776.753

9.796.496

10.871.960 11.467.222

B.Horizonte

357.634

522.919

939.687

1.668.485

2.620.693

3.445.258

4.253.350

4.975.156

P. Alegre

434.276

623.287

1.061.116

1.574.161

2.280.891

3.050.747

3.507.624

4.101.032

Recife

576.467

843.409

1.275.125

1.828.576

2.388.596

2.916.663

3.331.552

3.646.204

Salvador

335.166

463.545

739.799

1.148.828

1.772.018

2.493.224

3.018.326

3.408.273

Brasília

-

-

208.098

625.916

1.357.198

1.980.432

2.748.086

3.326.832

1980

(1) estimativa.

1991

2000

2006 (1)

Fonte: Censos Demográficos/IBGE.

janeiro / junho / 2007

Quadro 06: taxas médias anuais de crescimento demográfico na região metropolitana de Brasília no período 1960 a 2006 (em %).

43


Quadro 09: taxas médias anuais de crescimento demográfico nas regiões metropolitanas brasileiras no período 1940 a 2006 (em %). Região metropolitana

1940/50

1950/60

1960/70

1970/80

1980/91

1991/00

2000/06(1)

São Paulo

5,69

6,05

5,44

4,46

1,87

1,62

1,65

Rio Janeiro

3,62

4,36

3,54

2,44

1,00

1,16

0,89

B.Horizonte

3,87

6,04

5,91

4,62

2,52

2,37

(2) 2,65

P. Alegre

3,68

5,46

4,02

3,78

2,68

1,56

(2) 2,64

Recife

3,88

4,22

3,67

2,71

1,83

1,49

1,52

Salvador

3,30

4,79

4,50

4,43

3,15

2,15

2,05

Brasília

-

-

11,64

8,05

3,50

3,72

3,24

Estimativa houve incorporação de novos municípios à RM após 2000.

3 – Ocupação e desemprego: núcleo x periferia A análise mais apurada do Quadro 10 revela dois aspectos evidentes: as regiões metropolitanas da parte mais desenvolvida do país (o Centro-Sul) têm taxa de desemprego menor que as do Nordeste; as taxas de desemprego das periferias metropolitanas superam as dos núcleos entre 15% e 30%. Brasília, entretanto, escapa às duas regras. Sua taxa de desemprego aproxima-se das taxas verificadas nas metrópoles nordestinas e a diferença (estimada) entre a taxa do núcleo (DF) e da periferia atinge quase 70%. O Entorno Metropolitano, cuja PEA é estimada em 450 mil, além do elevado contingente desempregado – estimado em cerca de 30% (135 mil) – tem cerca de metade do pessoal ocupado residente trabalhando no

Fonte: Censos Demográficos/IBGE.

Distrito Federal. A fragilidade da economia do Entorno Metropolitano pressiona fortemente o mercado de trabalho do Distrito Federal, que se vê obrigado a gerar postos de trabalho para absorver não somente os cerca de 38 mil pessoas residentes no DF que se incorporam anualmente à PEA, mas também cerca de metade dos 27 mil novos integrantes do mercado de trabalho residentes no entorno. 4 – Ocupação no setor industrial Se o setor público explica o elevado PIB do Distrito Federal, a elevada taxa de desemprego e a baixa geração de postos de trabalho é explicada pela reduzida geração de emprego na atividade industrial. O quadro 11 mostra que a atividade industrial gera

Quadro 10: PEA, pessoal ocupado e contingente desempregado nas principais regiões metropolitanas em novembro/2006 Região metropolitana

Revista de

Conjuntura

44

São Paulo Rio Janeiro B.Horizonte P. Alegre Recife Salvador Brasília (2) D. Federal

PEA

Pessoal ocupado

desempregados

taxa RM

Taxa NM

Taxa PM

10.136 5.480 2.505 1.903 1.605 1.781 1.707 1.257 450

8.707 4.850 2.207 1.642 1.263 1.378 1.348 1.033 315

1.429 630 298 261 342 403 359 224 135

14,1 11,5 11,9 13,7 21,3 22,6 (2) 21,0

12,6 10,9 11,3 (1) 19,7 21,4 17,8

16,1 12,0 13,0 (1) 22,8 27,4 (2) 30,0

(1) desde 2005 não são divulgadas, mas até 2004 a diferença girava em torno de 20%. (2) estimativa.

Fonte: IBGE e DIEESE.


Região metropolitana

PO

PO

PO IND

(PED)

(PME)

(PED)

São Paulo

8.707

8.782

1.759

20,2

1.950

22,2

766

8,8

Rio Janeiro

ND

5.078

ND

ND

635

12,5

ND

ND

B.Horizonte

2.207

2.253

329

14,9

379

16,8

267

12,1

P. Alegre

1.642

1.759

286

17,4

389

22,1

ND

ND

Recife

1.263

1.380

114

9,0

161

11,7

ND

ND

Salvador

1.378

1.478

127

9,2

151

10,2

190

13,8

Brasília (2)

1.034

ND

38

3,7

ND

ND

238

23,0

(%)

PO IND (PME)

(%)

um número muito reduzido de empregos no Distrito Federal (38 mil), ou tão somente 3,7% do total do pessoal ocupado. Se estimar-se o mesmo percentual para o Entorno Metropolitano, seriam menos de 50 mil postos na atividade industrial em toda a região metropolitana. Se a RM de Brasília tivesse o mesmo grau de industrialização de Recife e Salvador (9% do pessoal ocupado total), o número de postos de trabalho na indústria seria em torno de 120 mil. Se o seu grau de industrialização fosse equivalente aos de Belo Horizonte e Porto Alegre (de 15% a 17%), esse contingente superaria os 200 mil. Deve-se ressaltar que para cada emprego na atividade industrial, são gerados, em média, 0,8 emprego em serviços de apoio à indústria. Parece evidente que a industrialização da região metropolitana, particularmente de sua periferia, é uma questão vital para o seu futuro.

PO SET.PUB (PED)

(%)

Fonte: IBGE e DIEESE.

A industrialização do Entorno Metropolitano, particularmente com base nos segmentos intensivos em mãode-obra (alimentação e bebidas, calçados e confecções, metalurgia, mobiliário, etc) geraria pelo menos quatro consequências diretas e positivas para o DF: 1. reduziria a pressão sobre o mercado de trabalho do DF; 2. atrairia investimentos em atividades de apoio ao setor industrial (serviços de manutenção, financeiros, de transporte, comercialização, etc) que em boa parte se instalariam no DF; 3. aumentaria o poder aquisitivo da população local, que em boa parte seria dispendido no DF; aumentaria a capacidade de arrecadação das prefeituras locais; e 4. consequentemente a capacidade de investimento na ampliação e melhoria dos serviços e equipamentos urbanos, reduzindo a pressão sobre os mesmos do DF.

5 - Conclusões A conclusão central deste estudo é de que o diminuto PIB da periferia metropolitana de Brasília, assim como a sua reduzida geração de emprego (e elevada taxa de desemprego) decorre de seu baixo nível de atividade econômica. O caminho percorrido pelas periferias metropolitanas do país para a elevação do nível de atividade econômica (e consequentemente do PIB e da geração de emprego) foi o da industrialização. A industrialização da região metropolitana de Brasília, particularmente de sua periferia metropolitana, pode ser um dos caminhos, senão o principal, para a resolução dos graves problemas que a atingem.

Desse modo, torna-se premente para o Distrito Federal – não só o Governo, mas o conjunto das organizações representativas da sociedade local – se conscientizarem de que o Entorno Metropolitano é uma questão afeita ao DF, tão ou mais que a Goiás. A elaboração de uma estratégia de desenvolvimento para a região metropolitana, envolvendo o GDF, o Governo de Goiás e o Governo Federal é o primeiro passo para a superação dos graves problemas que atingem a região.

Júlio Miragaya Economista do Corecon/DF

janeiro / junho / 2007

Quadro 11: pessoal ocupado total, na indústria e no setor público em novembro de 2006.

45


Artigo Licitações pelo prisma da Teoria dos Jogos: o papel da Auditoria José Henrique Fernandes Borges

Revista de

Conjuntura

46

A Teoria dos Jogos Econômicos analisa as estratégias que dão vantagem a uma empresa sobre suas concorrentes. Ela também pode ser aplicada ao exame de situações particulares como por exemplo, ao exame do ambiente no qual a Administração Pública convoca empresas interessadas em suprir determinadas necessidades do Estado, por meio de processo licitatório. O aspecto mais importante da estratégia do jogo é poder compreender as expectativas do adversário — como ele provavelmente reagirá às ações do outro jogador. Naturalmente, a premissa básica é o comportamento racional dos jogadores. Os jogos abordados neste artigo são de estratégias puras: os agentes fazem uma escolha específica ou decidem agir de determinada forma, sem a possibilidade de repensar ou repetir as ações eventualmente executadas. Isso é, a técnica de análise se restringe a jogos sem repetição. Do ponto de vista econômico, o instituto licitações

condições estabelecidas em edital ou convite, empresas interessadas na apresentação de propostas para o oferecimento de bens e serviços. A licitação, regulamentada pela Lei nº 8.666/93, objetiva garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para o Estado, de maneira a assegurar oportunidade igual a todos os interessados e a possibilitar o comparecimento ao certame do maior número possível de concorrentes. De acordo com essa Lei, a celebração de contratos com terceiros na Administração Pública deve ser necessariamente precedida de licitação, ressalvadas as hipóteses de dispensa e de inexigibilidade. O procedimento de licitação tende a criar condições para que a Administração faça contratos que contemplem aspectos relacionados à capacidade técnica e econômico-financeira do licitante, à qualidade do produto e ao valor do objeto. A análise a seguir se restringe às modalidades de

cria um ambiente de maior competição entre firmas interessadas em ofertar produtos ou serviços para o Estado. É a partir dessa concepção que se utilizará o instrumental da Teoria dos Jogos para se avaliar a racionalidade do comportamento teórico de empresas que se submetem à Norma que regulamenta os processos licitatórios.

concorrência, tomada de preços e convite, indistintamente. Em decorrência, será utilizado o termo licitações como um sinônimo das modalidades citadas.

Licitações Licitação é o procedimento administrativo formal em que a Administração Pública convoca, mediante 1

Estímulos para competir O Dilema dos Prisioneiros ilustra o problema com que se defrontam empresas oligopolistas e duopolistas. Ele é útil também no exame dos movimentos estratégicos desenvolvidos ao longo de um processo licitatório. O enunciado dessa parábola é o seguinte1: dois prisio-

Adaptado de PINDYCK, R. e RUBINFELD, D. Microeconomia. S.P: Makron Books, 1994. P. 581


Bertrand possibilita uma visão mais próxima da vivenciada num processo licitatório. A seção abaixo tratará desse tema. Equilíbrio de Bertrand Em essência, o modelo de Bertrand é um ambiente de duopólio em que as empresa fixam os preços e deixam o mercado determinar a quantidade a ser vendida de um produto homogêneo. O jogo funciona assim: quando um vendedor determina o preço, tem que prever o preço que será adotado pela outra empresa. Dessa maneira, o equilíbrio será obtido em função dos preços a serem estabelecidos, que levará à maximização do lucro de um vendedor dado a decisão do seu concorrente. Nesta estrutura duopolista, o equilíbrio alcançado é idêntico ao equilíbrio do modelo de concorrência perfeita: o preço se iguala ao custo marginal. Em outras palavras, as empresas acabam ajustando seus preços aos do mercado — o preço é uma variável exógena. Quando cada firma cobrar um preço igual ao custo marginal se obterá um equilíbrio de Nash em estratégias de preços. Portanto, o equilíbrio de Nash surge quando cada concorrente estiver cobrando o menor preço possível. Fenômeno equivalente ocorre num jogo de licitações, quando as competidoras assumem como dado o preço-base anunciado pela Administração, e a partir daí elaboram suas estratégias de preço, tentando imaginar o que as outras participantes do certame farão. Ou seja, cada firma estará fazendo o melhor que pode em função da decisão de preço que ela espera que seu oponente adote. O modelo de Bertrand ajuda a enxergar porque a licitação leva a um equilíbrio de duopólio com estratégia de preços. Cada participante traça sua estratégia assumindo como dado o preço-

Prisioneiro B

Prisioneiro A

Confessa Não confessa

Confessa

-15,-15

-3,-30

Não confessa

-30,-3

-6,-6

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neiros foram acusados de terem cometido um crime. Esses cúmplices estão aprisionados em celas diferentes, não havendo comunicação entre os dois. Foi feita uma solicitação de confissão do crime a cada um deles individualmente. Se ambos confessarem, cada um receberá condenação de 15 anos. Se ninguém confessar, o processo será dificultado, possibilitando que eles entrem com recurso, recebendo cada qual uma condenação de 6 anos. Por outro lado, se um dos prisioneiros confessar o crime, mas o outro não, aquele que confessou será condenado a apenas 3 anos de prisão, enquanto o que não confessou será condenado a 30 anos. A matriz de perdas da tabela abaixo resume os possíveis desfechos. Por essa legislação hipotética, se o Prisioneiro A não confessar, estará correndo risco de beneficiar seu ex-parceiro às suas expensas. Afinal, não importa o que possa fazer o Prisioneiro A, o B estará em melhor situação confessando. Igualmente, o Prisioneiro A estará sempre fazendo melhor negócio ao confessar, portanto o Prisioneiro B não precisa se preocupar que, por não confessar, poderia estar beneficiando o outro prisioneiro às suas custas. Sendo assim, ambos provavelmente confessarão, e serão condenados a 15 anos. Em síntese, para eles o desenlace perfeito seria ninguém confessar, ambos recebendo condenação mínima: 6 anos de reclusão. Contudo, confessar é uma estratégia dominante para cada um deles: a estratégia que propicia a menor perda independente da decisão que ocasionalmente o outro prisioneiro possa adotar. Portanto, faz sentido e é racional o desfecho em que cada prisioneiro confesse. Um caso especial de aplicação desse raciocínio é o ambiente em que se implementa um processo de licitações, no qual cada participante elabora sua estratégia de preço baseando-se na expectativa das ações de seus concorrentes. Contudo, o modelo de duopólio de

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No processo licitatório a atuação velada de um participante pode gerar ações ocultas, em que um ou mais firmas são cooptadas a atuar de maneira anticompetitiva, prevalecendo acordos e práticas desleais, culminando com a ocorrência de corrupção no certame.

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base ­ estipulado pela Administração; imagina os demais como um bloco monolítico. Assim, atuam como duopolistas (interessado versus demais participantes) e alcançam o Equilíbrio de Bertrand, que é um equilíbrio estável de Nash em estratégias de preços. No entanto, o equilíbrio de Bertrand pode ser inviabilizado pela formação de coalizão. No mundo real acontecem várias situações desse tipo. Por exemplo, quando algumas empresas de grande porte fazem acordos implícitos com a finalidade de retirar do mercado pequenos concorrentes e exercer de fato um poder de cartel. Analogamente, num processo licitatório a atuação velada de um participante pode gerar ações ocultas, em que um ou mais firmas são cooptadas a atuar de maneira anticompetitiva, prevalecendo acordos e práticas desleais, culminando com a ocorrência de corrupção no certame. Estratégia Maximin Nos modelos examinados, as firmas funcionam independentemente. Como pode haver comunicação

entre as interessadas, alguém pode ser convencido a participar de uma licitação com um preço artificialmente abaixo do seu oponente. Ele perderia a venda, mas embolsaria um prêmio de suborno. Assim, estaria adotando uma estratégia maximin, porque estaria aumentando o menor ganho que ele considera que poderia ser obtido, ante a expectativa de perder o contrato, desfecho no qual não lucraria nada. É um quadro de conluio implícito, em que um jogador deliberada e conscientemente aceita perder o jogo, recebendo uma quantia comparativamente pequena por essa atitude. Aqui as condições de perfeita simetria e perfeita informação são violadas. Ou seja, um subconjunto dos participantes da licitação está alterando as condições concorrenciais que o Legislador previu ao elaborar a Lei nº 8.666/93. O quadro examinado, dadas essas regras comportamentais, estimula entendimentos entre uma firma que pensa ter fortes chances de vencer o jogo e outra que não deseja sair da competição sem ganhar nada. Para se neutralizar subjogos de conluio implícito é necessário atuar preventivamente e sinalizar que ações espúrias e anticompetitivas poderão ser realmente punidas Nesse contexto, entram os sinais emitidos pelas ações de auditoria, que geram nova regra comportamental que muda as relações internas do jogo e condiciona as estratégias adotadas pelos jogadores, aumentando a transparência e a previsibilidade. De fato, a introdução do mecanismo de auditagem no jogo altera os movimentos estratégicos que poderiam formar conluio implícito, inviabilizando desta maneira as estratégias maximin. Neste caso, é racional e faz sentido que os jogadores aceitem as regras preestabelecidas: a Lei nº 8.666/93 e os princípios éticos usualmente aceitos. Auditoria: desarticulando as estratégias maximin A auditoria das despesas estatais visa avaliar a gestão e a aplicação de recursos públicos, comparando uma situação com um determinado critério técnico, operacional ou legal. Atua no sentido de corrigir os desperdícios, evitar a improbidade, a negligência e a omissão – antecipando-se a essas ocorrências. Para tanto, o auditor realiza verificações previstas no programa de auditoria, de maneira a obter evidências­


não cooperativo. Cada participante do certame é fortemente estimulado a adotar sua estratégia de preço visando a assegurar a venda do seu produto, tentando antever as ações das outras participantes, observando as condições estabelecidas formalmente no processo licitatório. Em síntese, a auditoria provoca uma mudança comportamental dos jogadores — os movimentos estratégicos não levarão mais em conta a expectativa de ganho mínimo que se poderia auferir com um eventual prêmio

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A auditoria desempenha papel crucial num jogo de licitação porque sinaliza para o mercado que o Estado possui instrumentos eficazes para detectar vícios e fraudes [...] a Administração pode viabilizar a aplicação das sanções estipuladas na Lei nº 8.666/93

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Nesse caso, o auditor tem como parâmetros de análise: a) o Princípio da Legalidade; b) a qualidade da competição nas fases da licitação (Princípios da Isonomia e da Impessoalidade); c) a conduta dos licitantes e dos agentes públicos (Princípios da Moralidade e da Probidade Administrativa); d) a facilidade de acesso à licitação e ao seu controle (Princípio da Publicidade); e) o respeito pelo Gestor e pelo licitante às condições estabelecidas no ato convocatório (Princípio da Vinculação ao Instrumento Convocatório); f ) os critérios objetivos contidos no ato convocatório para julgamento das propostas (Princípio do Julgamento Objetivo); g) a situação do licitante perante a União (regularidade fiscal); h) o documento de solicitação do material ou do serviço pela área demandante; i) a comprovação de crédito disponível (planejamento orçamentário e controle legal das receitas); j) os atos de julgamento, homologação e adjudicação da licitação; k) a existência de pesquisa de mercado, atestando a coerência dos preços cotados na licitação; l) a cópia da nota de empenho (comprovação do planejamento orçamentário e controle legal de despesas); m) o contrato aprovado e n) a entrega do bem ou a realização do serviço (compatibilidade com as cláusulas contratuais).

Atuando dessa maneira, a auditoria desempenha papel crucial num jogo de licitação porque sinaliza para o mercado que o Estado possui instrumentos eficazes para detectar vícios e fraudes, e, com base nas evidências apuradas, a Administração pode viabilizar a aplicação das sanções estipuladas na Lei nº 8.666/93. Tal expectativa condiciona os movimentos estratégicos adotados pelos jogadores. Então, o jogo da licitação se desenrola oscilando entre as ações previstas no modelo do Dilema dos Prisioneiros, em que os oponentes são estimulados a competir, e no modelo de Bertrand, em que todos assumem uma postura concorrencial, admitindo como dado o preço-base estipulado pela Administração: alcança-se um equilíbrio de Nash em estratégia de preços, que é um equilíbrio

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suficientes e adequadas para fundamentar as suas opiniões sobre os atos do gestor público. Os auditores têm em vista avaliar, com razoável segurança, que os procedimentos de controle interno adotados pelo órgão ou entidade estão funcionando efetivamente. Paralelamente, o auditor busca identificar evidências quanto à suficiência, exatidão e validação dos dados produzidos pelos sistemas administrativo e contábil da organização. As técnicas abordadas acima são igualmente aplicadas ao exame das etapas do processo licitatório. Essencialmente, as ações de auditoria direcionadas a um determinado certame tem como objetivo comprovar a legalidade e a legitimidade dos atos e fatos administrativos e avaliar os resultados alcançados.

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de suborno. Isto é, as estratégias maximin são inviabilizadas. O importante agora é vencer o jogo, fazendo ofertas que sejam mais vantajosas para a Administração: alcança-se assim um equilíbrio estável de Nash. Conclusão Embora os cartéis sejam ilegais, podem ocorrer na prática. A Teoria Econômica prevê que um cartel normalmente será instável porque cada firma será tentada a vender mais do que o acordo velado determina. Fato semelhante pode ocorrer num jogo de licitações. Um jogador pode ser persuadido a não concorrer efetivamente, recebendo um prêmio de suborno. Do ponto de vista da Teoria dos Jogos, é uma atitude racional, pois ele estará adotando uma estratégia maximin. Os custos com processos judiciais e prejuízos ocasionados com a degradação da imagem de sua empresa podem ser considerados eventos de baixa probabilidade, se não houver um eficiente mecanismo de fiscalização e uma forte expectativa de punição. A auditoria desempenha papel fundamental num jogo de licitação porque tende a sinalizar para o mercado que práticas desleais e ilegais poderão ser efetivamente detectadas, o que possibilita ao Estado meios para aplicação das punições legalmente previstas. Tal sinalização acaba por influenciar os movimentos estratégicos, delimitando-os ao espectro operacional proporcionado pela Lei nº 8666/93.

José Henrique Fernandes Borges Economista do Corecon/DF

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Artigo

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DF: Tempos Modernos

“Subdesenvolvimento, não se improvisa, é obra de séculos” (Nelson Rodrigues)

No serviço público há 30 anos, muito dos quais no Governo do DF, incentivou-me escrever sobre o Distrito Federal: o seu momento, oportunidades e seu novo tempo. Recorro inicialmente ao urbanista Lucídio Albuquerque que no seu livro, O Desenvolvimento Regional Sustentável ensina que o Estado Moderno deve ser estruturado e gerenciado como mega empresa de prestação de serviços à sociedade. E sociedade, seu desejo é uma ordem! Mas como alertava Goethe, “cuidado com o que deseja porque vai acontecer”! Em plena era da disseminação de empresas e mercados globais, vivemos nos países emergentes a industrialização retardatária. Gerschenkron (1962) afirma que quanto mais atrasado tecnológica, econômica e socialmente um país, em relação às economias desenvolvidas, tanto mais importantes serão as ações governamentais para acelerar o processo de desenvolvimento. Para esta intervenção, a razão principal ancora-se em fatos largamente observados: a falta de

como estratégia para o desenvolvimento, respeitada a visão de um Estado necessário do tamanho que a sociedade exige, sendo, no caso brasileiro mais presente no eixo norte-nordeste. Nos outros, tanto mais presente quanto menos estruturadas e/ou organizadas suas respectivas economias. Em comum, em todo território brasileiro a presença econômica do Estado deveria ocorrer como condutor de recursos destinados à infraestrutura, a tudo que envolve logística, e à educação. Na perspectiva pós-industrial e na visão de competitividade sistêmica, além dos mecanismos clássicos de incentivo, o mapeamento dos APL’s e o estímulo aos mais promissores, quer seja por fundos de capital de risco, de aval ou de garantia às parcerias público-privadas, deveriam estar nas agendas governamentais (Federal, estaduais e municipais). Nessa ordem de idéias, temos observado que o Brasil viveu no século XIX até 1930, quando a era Getuliana obrigou o país a entrar no século XX, apagar

limites para o progresso tecnológico, os processos de produção cada vez mais capital-intensivos, técnicas produtivas cada vez mais sofisticadas, dentre outras, que dificultam e tornam mais onerosa a manutenção de vantagens de mercado. Mesmo assim, a intervenção só se justifica se os seus benefícios excedem os custos decorrentes de possíveis falhas de governo e rent-seeking. Podemos encontrar, na história do desenvolvimento econômico mundial, exemplos de forte intervenção do Estado, notadamente na Alemanha e Rússia, àquela altura, último quartel do século XIX, retardatárias frente à Inglaterra. Contemporaneamente, o modelo de Alexander Gerschenkron continua válido

os últimos vestígios da escravidão e industrializar-se; criando, no processo, o operariado brasileiro. No entanto, desde as três últimas décadas do século XIX, havia no ideário paulista a presença de uma relação direta entre Educação e Progresso. Lê-se, de um relatório de 1878... “É uma verdade incontestável que a instrução pública caracteriza uma nação e assinala a sua posição de grandeza ou inferioridade”. “(...) Não há progresso social e nem reforma política que não seja dependente do grau de cultura moral e intelectual de um povo. (...) É a escola que prepara o cidadão... que o adapta para as conquistas do mundo industrial e para os grandes cometimentos da inteligência”. No Segun-


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A Inglaterra sentiu-se incentivada a se valer dos poderes políticos e econômicos, por estar na liderança do processo de desenvolvimento, para desestimular aqueles países, ou colônias, que desejassem tornar-se economias desenvolvidas

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do Império (1840-1889), durante esse período aconteceram alguns fatos essenciais para o desenvolvimento, dentre outros, citamos: • Tarifa Alves Branco (1844) – taxava os produtos importados; • Lei Eusébio de Queirós (1850) – proibia o tráfico externo. Esses acontecimentos influenciaram na modernização de infra-estruturas no país: bancos, fábricas e transporte. É conhecido como “Era Mauá”, o primeiro surto industrial brasileiro. Por que, então, não se deu o Desenvolvimento Econômico-Social do Brasil? A razão consagrada, e sem o propósito de esgotar o tema, é que os países em desenvolvimento, seja no passado ou no presente, sofrem uma série de pressões do establishment. Já se pensava no Brasil do século XIX em rudimentos de manufaturas, mas, no século XIV, sob o reinado de Eduardo III, a Inglaterra desenvolvia a fabricação de tecido de lã, inaugurando na verdade a pré-industrialização e a intervenção do Estado na economia. Paradoxalmente fonte intelectual das doutrinas modernas do Laissez-Faire, a Inglaterra está longe da verdade, segundo a qual se desenvolveu sem a intervenção do Estado.

Em outros tempos, a Grã-Bretanha adotou providências para impedir a transferência de tecnologia para os concorrentes potenciais, pressionou os países menos desenvolvidos para que abrissem seus mercados, inclusive empregando a força, reformulou a legislação mercantil, criando a Lei Robert Walpofe que introduzia o pensamento, bem conhecido dos economistas: nada mais contribui para promover o bem-estar inglês que a exportação de manufaturados e a importação de matéria-prima estrangeira. Em suma, a Inglaterra sentiu-se incentivada a se valer dos poderes políticos e econômicos, por estar na liderança do processo de desenvolvimento, para desestimular aqueles países, ou colônias, que desejassem tornar-se economias desenvolvidas. O Brasil por razões políticas e econômicas chegou atrasado na era industrial, Justiça seja feita, não faltaram brasileiros-empreendededores: Irineu Evangelista de Souza, Delmiro Gouveia, dentre outros, que trabalharam pela industrialização nacional. Na atualidade, o país vem imprimindo uma nova velocidade ao processo produtivo, incorporando tecnologias e dinâmicas para sua inserção no mercado internacional competitivo. Nesse sentido, o Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior – MDIC, por intermédio dos Fóruns de Competitividade, promovem as discussões (entre trabalhadores, setor produtivo e o governo como um todo) na busca de soluções, oportunidades de cada cadeia produtiva; contribuindo, assim, para a efetivação do conceito de desenvolvimento sustentado, como também, a compreensão de que o funcionamento da economia depende de um conjunto de sinergias. Na abordagem evolucionista, chego à Brasília, que veio na alma das políticas desenvolvimentistas de JK – com o ideário de induzir, promover a interiorização do Brasil, e, numa perspectiva pouco difundida, como portal de ocupação da Amazônia brasileira, (visão de integração geopolítica e geoeconômica defendidas pelas Forças Armadas e pela Escola Nacionalista de ilustres economistas da época). No mapa Novo Distrito Federal (engenheiro Joffre Parada 6ª Edição de setembro /1958), o DF tinha uma configuração de poucas edificações na Asa Sul, fazendas, sítios e Planaltina e Brazlândia como únicos núcleos urbanos. Passados 46


cardo e Mill levaram mais longe a idéia de educação como indutora de hábitos, prudência, economia, autoaperfeiçoamento e cidadania. O DF deve acelerar o seu tempo histórico, pela maneira como cresce o saber científico-tecnológico e como os produtos resultantes (spin-offs) de sua ação são rapidamente disseminados na sociedade, gerando amplas modificações ou rupturas que se sucedem em intervalos de tempo cada vez mais curtos. A educação neste caso, cria o chamado spillover na sociedade, pelo conhecimento e pela mobilidade social. Além disso, é necessária a construção de uma matriz educacional com alto grau de flexibilidade, onde deverão estar definidas as políticas vocacionais que atendam aos pré-requisitos para o Desenvolvimento Regional Sustentável. As fragilidades ambientais do nosso território impõem uma maior cooperação com a RIDE, para dar solução aos graves problemas sociais. Isso feito, haverá, certamente, melhor distribuição da renda, como também a relação profícua entre as duas economias. É no contexto contemporâneo em que a educação se formalizou plenamente e se tornou mais acessível que se pode falar em Matriz Educacional como política de Estado com a finalidade de prover a educação formal, profissional, integrada, criativa, solidária, flexível,

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A Cidade-Estado, segundo seus planejadores estratégicos, deveria ser além de indutor da ocupação do Planalto Central, um modelo, para o Brasil, de desenvolvimento econômico regional. Nesse caso, cabe a pergunta ‘por onde andam os Planos Diretores do DF’?

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anos de uma paisagem rural, vivemos uma realidade fortemente urbana. É o progresso, podem dizer... mas progresso tem ordem! Esqueceram, governos e sociedade, os estudos e os planos deixados pela Comissão de Localização da Nova Capital. A Cidade-Estado, segundo seus planejadores estratégicos, deveria ser, além de indutor da ocupação do Planalto Central, um modelo, para o Brasil, de desenvolvimento econômico regional. Nesse caso cabe a pergunta por onde andam os Planos Diretores do DF? O ZEE (Zoneamento Ecológico-Econômico, o Código de Posturas, o de Mineração, dentre outros? Todos importantes – sendo o ZEE fundamental – para as tomadas de decisões públicas, sejam territoriais ou econômico-sociais. É sabido que o uso sustentável do território e as vocações econômicas dependem da Matriz Ecológica, no entanto, as intervenções antrópicas, o descaso e a ausência sistêmica de planejamento tornaram o DF um dos núcleos populacionais dinâmicos mais densamente povoados do território brasileiro, envolvido por um cinturão populacional ávido por empregos, detentor de altos índices de violência e da pior distribuição de renda do país. Eduardo Giannetti, em O Valor do Amanhã, incitanos à ação na percepção do tempo. “... O animal humano adquiriu a arte de fazer planos e refazer impulsos, isto agora ou aquilo depois? Desfrutar o momento ou cuidar do amanhã? Ousar ou guardar-se?”. Os problemas estão postos. O dinamismo do Distrito Federal nasceu com o próprio ideário de Brasília - Capital do Brasil. As dificuldades, o fluxo migratório, a questão ambiental, o desemprego, a saúde, o desnível econômico com a RIDE eram previsíveis! Nada do que está acontecendo é surpreendente! O modelo “viver agora, pagar depois”; prêmio da impaciência, foi o adotado pelos governos passados, e gerou “grosso modo” uma descaracterização de médio e longo prazos na missão institucional do Distrito Federal. Acertadamente, o Novo Governo do DF elegeu a Educação como o investimento e a ferramenta principal do Desenvolvimento Econômico-Social. Malthus, Principle of Political Economy (Londres-1820): (...) “a Educação pode prevalecer sob o despotismo... pouco pode fazer sob um mau governo, embora possa realizar muito sob o que seja bom”. Economistas como Ri-

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dotada de instalações, equipamentos e força de trabalho preparada. Nosso território não poderá dispor de um parque produtivo que contemple todos os setores industriais, por razões institucionais e ambientais. Entretanto, em conjunto com a RIDE,poderá fomentar negócios geradores de externalidades positivas. A Matriz Educacional será o grande pilar para a sustentabilidade econômico-social do Distrito Federal e Entorno. Jean-Baptiste Say percebeu que; desde o operário que molda a madeira, até o ministro de estado que, com um golpe de pena, define tudo ao que se refere ao comércio, indústria, agricultura; cada indivíduo executará melhor o seu ofício se conhecer melhor a natureza das coisas, se for mais instruído (...) Novos progressos em nossos conhecimentos proporcionarão à sociedade um aumento de felicidade. E felicidade é um desejo, como também um incentivo econômico-moral que a sociedade ordena! “O progresso social é o objetivo do desenvolvimento econômico” (JK – 1958). O planejamento para o desenvolvimento regional integrado é a busca de um mundo socialmente justo, no contexto de um desejável equilíbrio dinâmico: território-população-economia-meio ambiente que exige compreensão de todos, parceria, participação e completo entendimento técnico-político.

Luiz Ernesto Antunes de Oliveira Economista do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

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Não quebre a corrente!

Não quebre a corrente! O Corecon/DF defende os interesses da categoria e trabalha pela valorização dos economistas.

Mas, para que esta luta seja bem sucedida, é importante a participação de todos. Visite o seu Conselho. Critique. Dê sugestões.

Participe!

A conquista é de todos.

Conselho Regional de Economia da 11ª Região-DF SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 - Brasília -DF Tels: (61) 3225-9242 / 3223-1429 3964-8366 / 3964-8368 Fax: (61) 3964-8364 E-mail: corecondf@corecondf.org.br Site: www.corecondf.org.br


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