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ANO VII • Nº 32 • outubro/dezembro de 2007

Conjuntura

Revista de

Publicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

ArtigoS

Projeções da economia para 2008

Instrumentos para realização da reforma da previdência Marcelo Abi-Ramia Caetano

Dívida pública o centro dos problemas nacionais

Maria Lucia Fattorelli Rodrigo Vieira de Ávila

CPMF, políticas públicas e responsabilidade fiscal

Edson Ronaldo Nascimento

Educação: base do desenvolvimento econômico Luiz Ernesto Antunes de Oliveira

A compensação financeira da indústria do petróleo Eduardo Toledo Neto

Visão prospectiva da agenda político-econômica do Brasil em 2008 José Matias-Pereira

Projeções de longo prazo do RGPS Amir Khair

O Corecon-DF contribuindo para divulgar o mercado de capitais

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Victor José Hohl

ISSN 1677-0668

ENTREVISTA O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcio Pochmann, fala dos principais desafios que o País enfrentará para conseguir um desenvolvimento econômico satisfatório

O mercado financeiro está cauteloso ao fazer qualquer previsão para o crescimento da economia brasileira para 2008. As expectativas para o crescimento da economia são muitas, mas o que esperar do cenário econômico para 2008? Confira matéria especial na página 26


IBRASE Instituto Brasiliense de Estudos da Economia Regional

Projetos Avaliações Análises de risco Oportunidades de negócio Assessoria e consultoria econômica

Entidades associadas: Corecon/DF – Conselho Regional de Economia do Distrito Federal • Sindecon/DF –Sindicato dos Economistas do Distrito Federal • ACDF – Associação Comercial do Distrito Federal • Dieese/DF – Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos • Fecomércio – Federação das Indústrias do Distrito Federal • CUT/DF – Cental Única dos Trabalhadores do DF • Sebrae/DF – Serviço de Apoio às Pequenas e Médias Empresas do Distrito Federal • IEL/DF – Instituto Euvaldo Lodi • Fibra – Federação das Indústrias de Brasília • UnB – Universidade de Brasília • UCB – Universidade Católica de Brasília • UniDF – Centro Universitário do Distrito Federal • Cesubra – Centro de Ensino Superior de Brasília • Faculdade Euro-Americana

(61) 3225-9242


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Nesta edição

6

Instrumentos para realização da reforma da Previdência

Marcelo Abi-Ramia Caetano

10

Dívida pública o centro dos Problemas Nacionais

Maria Lucia Fattorelli Rodrigo Vieira de Ávila

17

CPMF, políticas públicas e responsabilidade fiscal

Edson Ronaldo Nascimento

21

Educação: base do desenvolvimento econômico

Conjuntura Revista de

Publicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

ANO VII • Nº 32 • outubro/dezembro de 2007

2 editorial 3 entrevista Marcio Pochmann

26 capa Projeções da economia para 2008

Luiz Ernesto Antunes de Oliveira

29

A compensação financeira da indústria do petróleo

Eduardo Toledo Neto

40

Visão prospectiva da agenda político-econômica do Brasil em 2008

José Matias-Pereira

45

Projeções de Longo Prazo do RGPS

Amir Khair

49

O Corecon-DF contribuindo para divulgar o mercado de capitais

Victor José Hohl

A assinatura da Revista de Conjuntura pode ser efetuada contactando o Corecon/DF. O valor da assinatura é de R$ 70,00 anuais, o que equivale a quatro edições da revista.


Conjuntura

Revista de

Publicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

Editor Responsável Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Conselho Editorial Humberto Vendelino Richter José Aroudo Mota José Fernando Cosentino Tavares José Luiz Pagnussat Júlio Miragaya Maurício Barata de Paula Pinto Mônica Beraldo Fabrício da Silva Jornalista Responsável Daniela Lima (Reg. DRT/DF: 4926) Redação Daniela Lima Revisão Érica Dourado (1198/PA) Editoração Eletrônica www.arsventura.com.br Tiragem: 4.000 Periodicidade: trimestral As matérias assinadas por colaboradores não refletem, necessariamente, a posição da entidade. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO - DF Presidente Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Vice-Presidente Roberto Bocaccio Piscitelli Conselheiros Efetivos Evilásio da Silva Salvador José Aroudo Mota José Luiz Pagnussat Júlio Flávio Gameiro Miragaya Maria Cristina de Araújo Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Max Leno de Almeida Mônica Beraldo Fabrício da Silva Roberto Bocaccio Piscitelli Conselheiros Suplentes André Nunes Gilson Duarte dos Santos Homero Gustavo Reginaldo Lima Junia Rodrigues de Alencar Jusçanio Umbelino de Souza Maurício Barata de Paula Pinto Paulo Luiz Figueiredo de Oliveira Ronalde Silva Lins Equipe do Corecon Angeilton Francisco Lima Faleiro Iraci da Costa Lopes Ismar Marques Teixeira Jamildo Cezário Gomes Michele Cantuária Soares Estagiários Géssika de Freitas Souza (ensino médio) Rafael Amaral Dornelles (Economia) End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 – Brasília/DF Tel: (61) 3225-9242 / 3223-1429 3964-8366 / 3964-8368 Fax: (61) 3964-8364 E-mail: corecondf@corecondf.org.br Site: www.corecondf.org.br Horário de funcionamento: das 8h às 18h (sem intervalo)

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Editorial

Ao fim de 2007, bons indicadores econômicos eram obtidos: preços aparentemente sob controle, desemprego menor que no fim de 2006, crescimento esperado de 5% para o PIB, otimismo de empreendedores e empregados. E 2008, como será? Este o tema de capa deste número de nossa revista. Os leitores tomarão contato com opiniões de renomados economistas, como o professor Heron do Carmo e o professor Rubens Sawaya. José Matias-Pereira põe em questão as medidas e ações políticas e econômicas que o governo federal deve adotar para continuar estimulando o desenvolvimento socioeconômico do País. Embora admita a possibilidade de problemas ligados a “um cenário pouco favorável na economia mundial - no qual a possibilidade de uma recessão na economia americana é real – ” considera que “o Brasil possui as condições adequadas para continuar crescendo a taxas significativas”. Em seu artigo, escrito antes da decisão do Senado quanto à CPMF, Edson Ronaldo Nascimento lembra que o governo federal estabeleceu um programa econômico de médio prazo, contando com as receitas da CPMF. Como as finanças públicas serão rearranjadas com o fim dessa contribuição? Este pode ser um fator de risco em 2008. Alguns outros riscos perduram, como o do endividamento público e privado. Em vibrante artigo, Maria Lúcia Fattorelli e Rodrigo Ávila mostram a situação atual de endividamento e como a dívida externa se interioriza. Amir Khair trata do desequilíbrio do Regime Geral da Previdência Social que, segundo alguns analistas, é a bomba-relógio que irá explodir as contas públicas. Khair considera um mito essa explosão, embora defenda ajustes na legislação infraconstitucional para melhorar os resultados do RGPS. É relevante, também, considerar as recomendações de Marcelo Abi-Ramia quanto ao que fazer e não fazer em termos de reforma da Previdência, em busca do saneamento das finanças públicas. Na perspectiva de longo prazo, é importante formatar um projeto nacional de desenvolvimento que não implique apenas crescimento sustentado do PIB.Como formatar esse projeto nacional com partidos políticos de escassas expressões ideológica e programática? Marcio Pochmann, presidente do Ipea, mostra a sua preocupação a respeito, na entrevista que deu à nossa revista. O tema do desenvolvimento e sua relação como a educação do povo é motivo do artigo de Luiz Ernesto de Oliveira,que também aborda as diferenças entre crescimento econômico e desenvolvimento social. Não podemos esquecer que o processo de desenvolvimento econômico-social põe em risco a natureza. Neste sentido, vale considerar o artigo de Eduardo Toledo Neto, que registra o desvio de finalidade na aplicação dos recursos relativos à compensação financeira da indústria do petróleo, que visa formalmente à criação e suporte de um Programa de Mudanças Climáticas no Ministério do Meio Ambiente. Nossa revista mantém seu compromisso de pôr em discussão os temas relevantes da Economia em ambiente de total respeito à diversidade de opiniões. Sempre que a discordância é franca e livre, é também saudável. Ao leitor, fica a liberdade de escolha da posição que considere mais justa.


Em busca de um

desenvolvimento econômico satisfatório

O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcio Pochmann, fala dos principais desafios que o País enfrentará para conseguir um desenvolvimento econômico satisfatório

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Entrevista


Conjuntura – Qual o significado de desenvolvimento para o Brasil? Marcio Pochmann – Pensar em desenvolvimento signi­ fica ter em mente qual é a transição do capitalismo hoje. Quais são as questões-chave do desenvolvimento mundial. O segundo ponto é o desenvolvimento no Brasil. Será feito e cima de que base de trabalho, de execução ou de concepção? De que forma o Brasil se insere na nova divisão internacional de trabalho? Dependendo da opção que façamos, o desenvolvimento pode significar basicamente a construção de uma sociedade sem classe média. Mas o ponto final é a necessidade de se construir uma nova agenda civilizatória. Se a Consoli-

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dação das Leis de Trabalho (CLT), jornada de oito horas por dia, descanso semanal, férias, e feriados representou uma agenda civilizatória do capitalismo do século XX, qual seria a agenda do século XXI? O mais importante é entender o aumento do capitalismo na virada do século para cá. Há um esgotamento da base dinâmica do capitalismo que provém do século XX. Os setores dinâmicos do capitalismo do século XX foram os setores com alto valor unitário, o automóvel e a casa própria. A capacidade de consumo desses bens é decrescente. A saída civilizatória para a crise seria incluir a parcela da população que ficou de fora, dos países subde­senvolvidos. Mas a decisão que tivemos foi concentrar a renda e viabilizar

a maior taxa de lucro sustentada na especialização da produção e redução de custos. Conjuntura – Qual o modelo de trabalho que será adotado neste início de século? Marcio Pochmann – A perspectiva que se abre neste início de século é um outro tipo de visão do trabalho, que não é mais setorial. É um trabalho que se divide entre trabalho de concepção e de execução. O trabalho de execução é repetitivo e alienado. O trabalho de concepção é criativo e traz enriquecimento pela qualificação e tem correlação com a remuneração. O Brasil está espremido entre as economias de alta produtividade e as economias de baixos salários. Conjuntura – Quais são os principais desafios que o país enfrentará para conseguir um desenvolvimento econômico satisfatório? Marcio Pochmann – O primeiro desafio é a construção de uma maioria política que tenha como principal objetivo o compromisso com o desenvolvimento nacional. Temos um país que não tem partidos políticos, e isso pode ser um problema, pois a construção de um projeto nacional de desenvolvimento pressupõe capacidade de convergência nacional. No meu modo de ver, a maioria política que temos hoje não é compro-


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metida com a estabilidade monetária, e muitas vezes, é uma maioria anticrescimento econômico. Em segundo lugar­, uma nova programação em políticas públicas que permita o país aproveitar todas as potencialidades que possui. Em terceiro lugar, uma nova forma de inserção do país na economia mundial. Conjuntura – A desigualdade de renda é um entrave para o desenvolvimento? Como enfrentar esta barreira? Marcio Pochmann – Ela está intrinsecamente relacionada aos diferentes ciclos de expansão das atividades econômicas que o Brasil teve desde o ciclo do ouro até os dias de hoje. O desafio brasileiro é reinventar um programa de desenvolvimento que tenha a redução da desigualdade como o principal motor da inclusão social.

Conjuntura – A atuação do governo com relação ao desenvolvimento econômico do país está sendo eficaz? Marcio Pochmann – Está no sentido correto, mas no meu modo de ver, precisa ser mais acelerado e acompanhado de reformas estruturais.

Conjuntura – Como será a articulação do planejamento de longo prazo com o Plano Plurianual (PPA) 2008/2011? Marcio Pochmann – O PPA é uma iniciativa importante do ponto de vista da organização do setor público, da administração pública no Brasil, mas precisa ter mais efetividade – ser de fato um instrumento que normatize as forças públicas no âmbito dos governos estadual, federal.

Conjuntura – A longo prazo, o que deveria ser feito para o Brasil se desenvolver de forma sustentada? Marcio Pochmann – Nas últimas décadas, o país se manteve bastante comprometido com o curto prazo. O Brasil abandonou estratégias de pensar e atuar a médio e longo prazos. É necessário recuperar o planejamento como um instrumento de organização da atuação do setor público e indicação para o setor privado.

Conjuntura – O governo preocupa-se bastante com a infra-estrutura para desenvolver o país. Este pensamento, na sua opinião, está correto? Marcio Pochmann – A infra-estrutura permite que o país se desenvolva, mas não determina o desenvolvimento. Para se ter o desenvolvimento é necessário que se tenha uma infra-estrutura adequada, mas somente infra-estrutura adequada não é suficiente.

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“Nas últimas décadas, o país está bastante comprometido com o curto prazo. O Brasil abandonou estratégias de pensar e atuar a médio e longo prazos. É necessário recuperar o planejamento como um instrumento de organização da atuação do setor público e indicação para o setor privado” Marcio Pochmann


Artigo Instrumentos para realização da reforma da Previdência Marcelo Abi-Ramia Caetano

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Conjuntura

Sete são os elementos determinantes da sustentabilidade de um plano de previdência: demografia, mercado de trabalho, alíquotas de contribuição, formas de financiamento, condições de acesso aos benefícios, assim como sua fórmula de cálculo e regra de indexação. Uma reforma da Previdência altera pelo menos um destes elementos, mas nem todos são passíveis de modificação. Não se muda a demografia por legislação. Também parece carecer de sentido remodelar a legislação trabalhista com intuito de reformar a Previdência. Restaram os cinco demais elementos para servir como meios. As reformas se classificam em duas categorias: estruturais e paramétricas. Costumou-se chamar de reformas estruturais aquelas que alteram a forma de financiamento de repartição para capitalização. Estiveram em voga nos anos 80 e 90 do século XX na América Latina e têm o Chile como exemplo. Brasil, Europa Ocidental e Estados Unidos mantiveram a forma de financiamento de seus regimes. O empecilho à adoção de reforma estrutural no Brasil é seu custo fiscal. Vive-se um momento conjuntural em que o país necessita da obtenção de superávites fiscais para redução de sua dívida pública. Nesse contexto, descarta-se qualquer proposta que venha a elevar custos fiscais a curto e médio prazos. A razão de existência do chamado custo de transição é que, por um lado, o fluxo de despesa de curto prazo se mantém inalterado devido à garantia dos direitos adquiridos para os benefícios já concedidos ou em vias de concessão, e, por outro lado, há redução de receita porque a contribuição das gerações mais jovens se encaminha para

uma conta que financiará suas próprias aposentadorias e pensões futuras. Isto é, a transição para um regime de capitalização impõe custos de curto e médio prazos devido à manutenção da despesa e à queda da receita. Os ganhos fiscais da reforma estrutural ocorreriam no longo prazo porque o regime de previdência passaria a ter independência do orçamento governamental, pois se autofinanciaria, ou seja, os benefícios seriam pagos com ativos acumulados previamente, e não mais com recursos públicos. Os elevados custos de curto prazo em um ambiente de restrição fiscal sequer propiciariam o surgimento de um debate em que se contrapusessem os benefícios de longo prazo. A ambigüidade acerca dos impactos da Previdência sobre eficiência no mercado de trabalho e aumento da taxa de poupança tampouco colabora com a propositura de reformas estruturais. As reformas paramétricas se concentram nos quatro elementos restantes: alíquotas de contribuição, condições de qualificação, fórmula de cálculo do benefício e sua regra de indexação. É usual a afirmação de que a elevada carga tributária brasileira impediria que reformas previdenciárias futuras utilizassem o instrumento de elevação de alíquotas. De fato, esta é uma crença do autor. Entretanto, a reforma previdenciária do governo Lula, promulgada pela Emenda Constitucional 41, de 19 de dezembro de 2003, majorou a contribuição em três oportunidades. A primeira, ao instituir a contribuição de inativos e pensionistas no serviço público, a segunda, ao elevar o teto de contribuição e benefício do RGPS e a terceira, ao impor piso de contribuição aos servidores estaduais e municipais. Uma possível explicação


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Ao se aventar a introdução do fator previdenciário para os servidores públicos, o contra-argumento que rapidamente surge evoca o fato de que as idades limites de aposentadoria dos servidores implicariam maior valor de aposentadoria ou pensão. De modo genérico, o ganho fiscal obtido pela postergação da concessão do benefício pode se compensar pelo seu maior valor

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outro lado, do valor do benefício em relação ao salário de contribuição. A segunda cautela consiste na identificação dos grupos de pressão às modificações propostas. Reformas muito abrangentes, isto é, aquelas que restringem as condições de acesso para todos os grupos de forma indiscriminada tendem a apresentar menor probabilidade de aprovação, maior número de emendas que desfiguram a proposta original e tempo mais prolongado de negociação e aprovação. Na opinião deste autor, a rápida tramitação e as poucas emendas sofridas pela lei que criou o fator previdenciário e pela EC 41/03 se deveram ao fato, entre outros, de se focarem em poucos temas – a fórmula de cálculo do benefício no caso do fator previdenciário – ou em grupos específicos – servidores públicos para a Emenda Constitucional 43. Por sua vez, o longo tempo de tramitação e as emendas que alteraram substancialmente o teor da EC 20 podem ter sua origem relacionada à abrangência da proposta.

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para aumento de arrecadação é que este é, de fato, o único instrumento capaz de oferecer resultados fiscais no curtíssimo prazo, embora se reconheçam suas conseqüências negativas em um país de renda média, mas com elevada carga tributária. Todos os demais instrumentos apresentam seus impactos somente a médio e longo prazos por não alterarem o valor do benefício ou a condição de elegibilidade de um segurado já aposentado. Por pragmatismo, instrumentos descartados de início podem se mostrar de alguma serventia. Alterações nas condições de acesso aos benefícios também são usuais seja pela necessidade de redução dos custos da Previdência, seja pelo envelhecimento populacional que aumenta os anos de recebimento de aposentadorias, mas não prolonga o período de contribuição. A restrição das condições de qualificação alivia a carga fiscal da Previdência ao ampliar o tempo contributivo e decrescer o período de gozo de benefício. Devem-se observar dois cuidados relacionados a este tipo de reforma paramétrica: de um lado, a relação entre fórmula de cálculo e idade de aposentadoria e/ou tempo de contribuição; de outro lado, a identificação dos grupos de pressão contrários às alterações. A primeira precaução se deve ao fato de a fórmula de cálculo de benefício usualmente implicar maior valor em decorrência de uma idade de aposentadoria mais avançada ou de um maior tempo de contribuição. Há de se averiguar exatamente como a condição de acesso interage com a fórmula de cálculo para que a reforma reduza a insolvência de longo prazo do regime de previdência. Por exemplo, ao se aventar a introdução do fator previdenciário para os servidores públicos, o contra-argumento que rapidamente surge evoca o fato de que as idades limites de aposentadoria dos servidores implicariam maior valor de aposentadoria ou pensão. De modo genérico, o ganho fiscal obtido pela postergação da concessão do benefício pode se compensar pelo seu maior valor. Em conseqüência, este tipo de redesenho do plano traria ganhos fiscais de curto prazo, ao prorrogar o momento inicial do benefício, mas poderia causar perdas de longo prazo ao se pagar aposentadorias e pensões mais altas ao contingente de beneficiários. Tudo dependerá da relação entre os efeitos, de um lado, da queda da proporção entre beneficiários e contribuintes e do aumento, e do


Outro fator que explica a tramitação mais rápida e com menos emendas destas proposituras é que se deram em momentos de crise macroeconômica. A proposição e aprovação do fator previdenciário foram em 1999, ano da primeira crise cambial do real. Por sua vez, a reforma da Previdência do primeiro mandato do governo Lula ocorreu logo na seqüência da crise macroeconômica de 2002, ano em que a taxa de câmbio se aproximou de R$ 4,00 por um dólar e o risco-país atingiu patamares recordes. Em conclusão, os gestores da política previdenciária­ se deparam com as seguintes restrições da economia política da reforma. Em primeiro lugar, as reformas são mais fáceis de serem propostas e aprovadas em momentos de crise econômica. Em segundo lugar, há um dilema entre a abrangência da reforma e sua probabilidade de aprovação e se sujeitar a emendas.

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O terceiro instrumento para uma reforma paramétrica é a alteração da fórmula de cálculo do benefício. O advento da capitalização escritural em vários países­ europeus e o fator previdenciário no Brasil, todos na última década do século XX, mostram a relevância deste instrumento na história recente das reformas previdenciárias. [...] Esse tipo de reforma apresenta pequeno impacto financeiro no curto prazo, mas pode ser expressivo no longo

Propostas ambiciosas que permitam um reforma mais duradoura podem apresentar resultados modestos; projetos focados têm maior chance de ter o resultado final pouco alterado em relação à proposta inicial. O terceiro instrumento para uma reforma paramétrica é a alteração da fórmula de cálculo do benefício. O advento da capitalização escritural em vários países­ europeus e o fator previdenciário no Brasil, todos na última década do século XX, mostram a relevância deste instrumento na história recente das reformas previdenciárias. Em resumo, busca-se alterar ao longo do tempo a taxa de reposição, isto é, o quociente entre o valor médio do benefício previdenciário e o salário de contribuição. Esse tipo de reforma apresenta pequeno impacto financeiro no curto prazo, mas pode ser expressivo no longo. Os diminutos efeitos de curto prazo decorrem da manutenção do valor dos benefícios já concedidos e das regras de transição para os benefícios que se iniciarão nos próximos períodos­. Conforme a passagem do tempo, seus impactos incre­ mentam em decorrência da gradativa queda intertemporal da taxa de reposição. É usual combinar os objetivos fiscais da nova fórmula de cálculo de benefício com outros de natureza distributiva. Isso porque, em várias oportunidades, essas reformas sequer impactam ou alteram em menor intensidade os benefícios de menor valor e incidem mais fortemente sobre as aposentadorias e pensões mais altas. Como exemplos no Brasil, o fator previdenciário não reduz o benefício para aquém do salário mínimo e, por outro lado, os benefícios de pensão dos Regimes Próprios de previdência Social (RPPS) repõem a integralidade da aposentadoria até o limite do teto de benefício do Regime Geral de previdência Social (RGPS) e 70% daquilo que excede este valor. Observa-se conjugação de objetivos de estabilização e distributivos. O último instrumento de reforma paramétrica é a forma de indexação dos benefícios. A Emenda Constitucional 41 institui uma transição, ainda que gradual, da indexação pela inflação de salários para inflação de preços dos benefícios dos RPPS. De fato, essa é uma linha universal de reforma. No Brasil atual, um dos temas polêmicos diz respeito à sobreindexação dos benefícios equivalentes a um salário mínimo. Todos os


Síntese das Propostas

O que não fazer

• Modificar a forma de financiamento da Previdência para capitalização;

• Aumentar alíquotas de contribuição; • Unificar a administração do Regime Geral de Previdência e dos Regimes Próprios de Previdência devido à resistência política devido aos custos fiscais para Estados e municípios.

O que fazer

• Impor limites mínimos de idade na aposentadoria por tempo de contribuição e findar com as diferenças por gênero ou tipo de atividade como, por exemplo, aquelas existentes para professores e rurais. Naturalmente que essas regras se sujeitariam a um processo de transição;

• Igualar o fator previdenciário para homens e mulheres, assim como professores e não professores;

• Pensões por morte: impor critérios de idade mínima, carência contributiva e limites de acumulação entre aposentadorias e pensões;

• Indexação de todos os benefícios previdenciários à inflação passada;

• Reformas administrativas que coibissem fraudes ou aumento expressivo de benefícios de risco tal como aposentadorias por invalidez e pensões por morte.

Marcelo Abi-Ramia Caetano Economista do Ipea

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anos presenciam intenso debate acerca dos impactos fiscais e distributivos dos ganhos reais concedidos ao piso previdenciário. Em síntese, há duas formas de alterar as regras de indexação: em primeiro lugar, ao se alterar o próprio indexador de forma generalizada; em segundo lugar, ao unificar ou distinguir o indexador por tipo de benefício ou faixa de valor. Como ponto final desta seção, vale lembrar que é comum ver os ganhos fiscais se esvaírem em nome da justiça distributiva. Usualmente, no momento da proposição da reforma se demonstram os ganhos fiscais a auferir. Pouco tempo após sua aprovação – com ganhos usualmente inferiores aos inicialmente previstos por causa das emendas sofridas – sugere-se ampliação de benefício para algum grupo específico com base naquilo que se economizou com a reforma; por exemplo, aumento do salário mínimo. Em síntese, reforma da Previdência costuma apresentar dois momentos políticos. No primeiro, enfatizam-se os ganhos fiscais; no segundo, aspectos distributivos com a justificativa de aumento do gasto com base na redução das necessidades de financiamento obtidas pela reforma. Esse círculo vicioso pode gerar um longo ciclo de reformas. Exponho uma síntese das alterações que julgo relevantes tanto para fazer como para não implementar.


Artigo Dívida pública:

o centro dos problemas nacionais Maria Lucia Fattorelli Rodrigo Vieira de Ávila

O discurso do governo e de grande parte da mídia é de que a economia do país vai muito bem e que a dívida pública não é mais problema para o Brasil. Afinal, já pagamos tudo ao FMI e atualmente acumulamos grande volume de reservas que representa um “colchão” de quase 180 bilhões de dólares, suficiente para quitar a dívida externa pública. Além disso, os sucessivos recordes de arrecadação têm permitido cumprir e até superar as metas de superávit primário. Na verdade, o endividamento público é o problema mais grave do país; o pagamento ao FMI representou pequena parte da dívida externa, e o volume de reservas decorre de um verdadeiro ataque especulativo pelo qual o Brasil está passando.

da dívida interna, com juros de mais de 19% ao ano, naquele momento, enquanto os juros cobrados pelo FMI eram de cerca de 4% ao ano. Ou seja, foi feita a antecipação do pagamento de uma dívida mais barata, às custas da assunção de outra dívida bem mais cara, o que pode caracterizar gestão temerária dos recursos públicos, diante do dano financeiro provocado ao Estado. Conforme se vê também no Gráfico 1, o crescimento acelerado da dívida externa em 2007 já a fez retornar ao patamar de 235 bilhões de dólares, mesmo nível de antes do pagamento antecipado ao FMI.

Gráfico 1

Situação do endividamento público brasileiro em 2007

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O endividamento público é o problema mais grave do país, pois dele decorrem todas as outras condicionantes do atual modelo econômico (juros mais elevados do mundo; corte de gastos e investimentos públicos; reformas neoliberais; liberdade de movimentação de capitais; dentre outros), cujo objetivo final é garantir o pagamento da própria dívida. Por sua vez, o pagamento ao FMI representou pequena parte da dívida externa, como se pode ver no Gráfico 1. Além do mais, esse pagamento foi financiado pela emissão de mais títulos da dívida externa – com juros de cerca de 8,5% ao ano, na época – e também

Fonte: Banco Central

O Gráfico 2 mostra o crescimento explosivo da dívida interna nos últimos anos. O mais alarmante é que não se vislumbra a contrapartida em bens e serviços para o país que justifique tamanho crescimento. Pelo


parcela de 4,9%, a educação 2,39%, e a reforma agrária apenas 0,29%, conforme se vê no Gráfico 3. Todo sacrifício social que vem sendo praticado para

Gráfico 2

11 Fonte: Banco Central

se pagar a dívida não foi suficiente para impedir o crescimento explosivo da dívida interna federal em 2007. De dezembro de 2006 a outubro de 2007 esta dívida cresceu de R$ 1,153 trilhão para R$ 1,389 trilhão, conforme o Gráfico 2, ou seja, um crescimento de nada menos que 20% em apenas dez meses. Em valores absolu-

Gráfico 3 - Orçamento Geral da União - 2007 (Executado até 2/12)

Fonte: SIAFI. Não foi considerado o refinanciamento da dívida.

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contrário, no caso da dívida interna é evidente que seu crescimento exponencial decorreu dos próprios juros altos, além das elevadas emissões de títulos da dívida interna brasileira, feitas para bancar a política de captação de moeda estrangeira para a compra de títulos da dívida americana, como abordaremos no próximo tópico. Na verdade, o endividamento público está sendo uma ferramenta para acobertar uma brutal transferência de recursos do setor público para o setor financeiro privado nacional e internacional. Vamos aos números. O pagamento da dívida pública externa e interna do Brasil representa a parte mais significativa do orçamento nacional. De janeiro a 2 de dezembro de 2007 os juros e amortizações da dívida consumiram a impressionante cifra de R$ 222 bilhões, representando 32% do total de gastos no período, enquanto a saúde recebeu a


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No que se refere à dívida externa, ela cresceu fortemente em 2007, apesar de o governo afirmar o contrário. A dívida externa, que era de US$ 199 bilhões em dezembro de 2006, cresceu 20% apenas nos 10 primeiros meses de 2007, atingindo US$ 238 bilhões em outubro de 2007

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tos, esta dívida cresceu R$ 235 bilhões nos primeiros 10 meses de 2007, valor este equivalente a 8 vezes todo o gasto com saúde no mesmo período. No que se refere à dívida externa, ela cresceu fortemente em 2007, apesar de o governo afirmar o contrário. A Dívida Externa, que era de US$ 199 bilhões em dezembro de 2006, cresceu 20% apenas nos 10 primeiros meses de 2007, atingindo US$ 238 bilhões em outubro deste ano. Esse crescimento não aparece nos dados constantemente divulgados na imprensa pelo governo, uma vez que ele ocorreu na parcela “privada” da dívida externa, ou seja, aquela dívida tomada pelas empresas nacionais junto a credores externos. Porém, a dívida externa “privada” é paga pelo povo brasileiro, uma vez que cabe ao governo fornecer os dólares para os credores privados pagarem suas dívidas. Essa explosão da dívida externa ocorreu principalmente nas operações

de curto prazo, isto é, operações nas quais os bancos nacionais tomam empréstimos no exterior, a taxas de juros civilizadas, e utilizam esses recursos na compra de títulos da dívida interna brasileira, que remunera a taxas de juros mais altas do mundo. Isso explica uma parte do crescimento da dívida interna. Porém, há outros fatores que também explicam esse crescimento e que iremos descrever a seguir. Ataque especulativo Nos últimos anos, o Brasil tem aumentado suas receitas de exportação, principalmente em razão da alta do preço das commodities, como a soja, os minérios e o aço. Porém, como se vê no Gráfico 4, mais recentemente a entrada de dólares no país tem se dado mais intensamente nos investimentos estrangeiros em títulos de Renda Fixa (principalmente da “Dívida Interna”1 brasileira) e empréstimos externos, contraídos principalmente por bancos e empresas privadas, também utilizados na compra de títulos da dívida interna. A trajetória da curva relativa aos “Empréstimos Externos” mostra um salto gigantesco nos últimos 2 anos, ressalvando-se que não foram computados todos os dados do ano 2007, uma vez que encontram-se disponibilizados somente os dados dos nove primeiros meses do ano. Gráfico 4

Fonte: Banco Central. Observação: 2007: somente até setembro Fonte: Banco Central. Observação: 2007, somente até setembro

Hoje, grande parte da dívida interna encontra-se nas mãos de estrangeiros, não podendo mais ser aplicada a clássica definição de que a dívida interna é uma dívida do governo para com residentes no país. Esse processo se deve a um conjunto de fatores, destacando-se a abertura financeira, a prática de juros mais altos do mundo e a ausência de qualquer mecanismo de controle de capitais no país, além do incentivo, representado pela isenção de IR e CPMF, para que estrangeiros adquiram títulos da dívida interna brasileira. 1


Esse processo é resultado de um grande ataque especulativo pelo qual passa o país, no qual os investidores estrangeiros trazem seus dólares para investir na bolsa e em títulos da dívida interna, e assim forçam a desvalorização do dólar frente à moeda brasileira (o Real). Os bancos e empresas nacionais também se aproveitam disso, tomando empréstimos no exterior para emprestar ao governo brasileiro, por meio da compra de títulos da dívida interna. Quando auferem seus lucros e juros em reais, podem trocá-los por maior quantidade de dólares – uma vez que a moeda brasileira se valorizou – e assim cumprir seus compromissos com o exterior, tendo um lucro extra. O mais grave é que o próprio governo tem induzido esse processo, que significa enorme dano para as contas públicas e uma verdadeira farra para os especuladores, por meio das seguintes medidas: a manutenção das maiores taxas de juros reais do mundo (incidentes sobre os títulos da dívida interna); a manutenção de uma política de total priorização ao pagamento da dívida (conforme vimos no início deste artigo); e significativas isenções fiscais. Em 2002, as movimentações em bolsa de valores foram isentas de CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira). Posteriormente, em 2006, os estrangeiros foram isentos de imposto de renda sobre aplicações em títulos da dívida interna. Como resultado, o país tem acumulado reservas internacionais, que alcançaram a cifra de US$ 178 bilhões em dezembro de 2007, conforme vemos no Gráfico 5. Em apenas um ano, o país contabilizou volume de reservas superior a tudo o que havia acumulado historicamente.

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Em 2002, as movimentações em bolsa de valores foram isentas de CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira). Posteriormente, em 2006, os estrangeiros foram isentos de imposto de renda sobre aplicações em títulos da dívida interna

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Fonte: Banco Central

Porém, é importante ressaltar que, para o país acumular essas reservas, o Banco Central (BC) deve comprar os dólares dos exportadores e investidores estrangeiros, fornecendo-lhes reais para gastarem aqui no país. E quando fornece estes reais, o Banco Central julga que está injetando dinheiro na economia, o que poderia causar inflação. Então, o BC retira de circulação quantidade equivalente de dinheiro, através da colocação de títulos da dívida interna, isto é, tomando dinheiro emprestado e aumentando a dívida interna. Ou seja: o acúmulo de reservas cambiais não significa redução da dívida, mas a troca de dívida externa por dívida interna. Por esta razão, a dívida interna tem explodido, conforme demonstrado no Gráfico 2. E não cabe o argumento do governo de que este acúmulo de reservas seria necessário para fazermos face a uma eventual crise externa, pois, caso realmente haja uma crise financeira, não há nada que impeça a evaporação imediata desse enorme estoque de reservas, como já assistimos em outros momentos de nossa

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Gráfico 5

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O Brasil quase dobrou seu estoque de títulos do Tesouro Americano, provocando grande dano às contas públicas, representado pelo prejuízo de R$ 58,5 bilhões do Banco Central apenas no curto período de janeiro a outubro de 2007, uma vez que a moeda americana está se desvalorizando

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história. Diante da total liberdade para os fluxos de capitais vigente em nosso país, e considerando que esses capitais encontram-se em grande parte aplicados hoje nos títulos de curtíssimo prazo da dívida interna, poderá ocorrer o movimento inverso de troca desses títulos por moeda estrangeira, seguida da previsível fuga de capitais. Deve ser também ressaltado que este acúmulo de reservas cambiais pelo Brasil não pode ser utilizado para resgatar a dívida externa brasileira, pois os títulos dessa dívida, emitidos desde 20032, e que já correspondem a US$ 31,7 bilhões (o equivalente a 65% da dívida externa pública em bônus), contêm a questionável “Cláusula de Ação Coletiva” (CAC), que impede a recompra dos referidos títulos pelo governo brasileiro. Esta Cláusula também transfere para Nova York o foro para qualquer controvérsia relacionada à dívida e ainda obriga o governo brasileiro a renunciar expressamente à sua soberania, concedendo aos credores o direito de decidir sobre a

forma de renegociação dessa dívida. Dissemos que a referida cláusula é questionável, pois a mesma não foi sequer discutida pelo Congresso Nacional e, portanto, fere frontalmente o disposto no artigo 52, inciso V, da Constituição Federal, além de vários outros princípios constitucionais: supremacia do interesse público; legalidade; finalidade; razoabilidade; motivação; publicidade; moralidade administrativa e eficiência. Por outro lado, ao mesmo tempo em que o governo brasileiro está impedido de aplicar esse acúmulo de reservas para comprar a própria dívida brasileira, devido à Cláusula CAC, ele tem utilizado essas novas reservas cambiais para comprar títulos do Tesouro Americano. Ou seja: estamos financiando o governo dos EUA a cobrir seu déficit e custear, por exemplo, a Guerra no Iraque. O Gráfico 6 mostra que, apenas nos seis primeiros meses deste ano, o Brasil quase dobrou seu estoque de títulos do Tesouro Americano, provocando grande dano às contas públicas, representado pelo prejuízo de R$ 58,5 bilhões do Banco Central apenas no curto período de janeiro a outubro de 2007, uma vez que a moeda americana está se desvalorizando. Esse prejuízo tem sido integralmente coberto com recursos do Tesouro Nacional, ou seja, recursos do orçamento da União ou decorrentes da emissão de mais títulos da dívida interna. Gráfico 6

Fonte: Tesouro Americano, Bloomberg / elEconomista.es | 10:49 17/08/2007

Essa troca de dívida externa por dívida interna é altamente danosa ao país, uma vez que os credores

As emissões de títulos da dívida externa brasileira podem ser vistas na planilha disponível em: http://www.stn.fazenda.gov.br/divida_publica/ downloads/soberanosinternet.xls 2


Nota 1: os recursos dos fundos de pensões em fundos de investimento de renda fixa foram subtraídos da rubrica “Fundos de investimento” e colocados na rubrica “Fundos de pensões”. Nota 2: Inclui-se na rubrica “Bancos nacionais e estrangeiros” os títulos vinculados (que representam principalmente o depósito, junto ao BC, pelas instituições financeiras, de títulos públicos como garantia de operações em bolsa de valores) e as “Operações de mercado aberto” (que significam a retirada de moeda de circulação mediante entrega às instituições financeiras dos títulos públicos em poder do Banco Central).

da dívida “interna” também podem ser estrangeiros, o que aumenta nossa vulnerabilidade externa. Também é danosa devido ao fato de a dívida interna pagar os maiores juros do mundo e possuir prazos curtíssimos, enquanto as reservas cambiais rendem juros baixíssimos, e ainda estão se desvalorizando, uma vez que sua maioria está denominada em dólares e em títulos dos EUA. É como se uma pessoa tomasse dinheiro emprestado no banco, pagando juros altíssimos, para aplicar na poupança, recebendo taxas muito baixas (ou até negativas), levando o maior prejuízo e fazendo a sua dívida explodir. Parece loucura, mas é o que o governo está fazendo! O Gráfico 7 mostra que boa parte dos credores da “dívida interna” brasileira são estrangeiros, uma vez que

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O que tem ocorrido no Brasil é uma verdadeira reciclagem do velho mecanismo de espoliação da dívida externa, com uma nova máscara: o endividamento “interno”. Esse mecanismo é altamente rentável aos investidores estrangeiros, uma vez que, desta forma, eles ficam imunes à desvalorização da moeda americana

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Fonte: Banco Central (set/07) e Secretaria de previdência Complementar (Informe Estatístico – Maio 2007).

parcela importante do sistema bancário e empresas não financeiras (que detêm, juntos, 58% da dívida interna) vem sendo desnacionalizada na última década. Além disso, grande parte das aplicações em fundos de investimentos (com 25% da dívida) também pertence aos estrangeiros. Importante repetir que a parcela da dívida externa privada tem tido aumento expressivo devido à tomada de empréstimos externos pelos bancos e empresas nacionais para comprarem títulos da dívida interna brasileira. Ou seja: o que tem ocorrido no Brasil é uma verdadeira reciclagem do velho mecanismo de espoliação da dívida externa, com uma nova máscara: o endividamento “interno”. Esse mecanismo é altamente rentável aos investidores estrangeiros, uma vez que, desta forma, eles ficam imunes à desvalorização da moeda americana, recebendo seus lucros e juros em uma moeda que não pára de se fortalecer frente ao dólar. Na figura a seguir, temos um resumo de como se opera este esquema, que continua sugando as riquezas

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Gráfico 7 – Credores da dívida interna - set/2007

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nacionais em favor das elites brasileiras e estrangeiras. Os investidores estrangeiros e exportadores trazem os dólares ao país, que lhes são trocados por reais pelo Banco Central. Esses reais são “esterilizados” através da emissão de mais títulos da dívida interna, de modo a enxugar a base monetária e cumprir com a questionável política neoliberal de priorização absoluta das metas de inflação. Por sua vez, o Banco Central aplica os dólares (recebidos dos investidores e exportadores) em títulos do Tesouro Americano, que rendem menos da metade dos juros pagos pelo governo brasileiro pelos títulos da dívida interna. Além do mais, o dólar apresenta forte desvalorização, significando que os juros pagos pelo Tesouro Americano são, na realidade, negativos. Dívida interna: a nova face da Dívida externa

Bush em maio, para a produção de etanol), consomem o solo e a água, além de precarizar as relações de trabalho no meio rural. Grandes transnacionais têm comprado terras no Brasil, de modo a dominar esse sistema produtivo. Para mudar esse quadro, o governo teria que alterar sua política econômica, a fim de destinar, ao atendimento das necessidades sociais e demais investimentos públicos, o absurdo volume de recursos que tem sido consumido por esse inexplicável endividamento. Teria também que reduzir drasticamente a injustificável e altíssima taxa de juros, além de rever essa política monetária e cambial irresponsável do Banco Central, que tem permitido e estimulado a entrada maciça dos especuladores no país para ganharem rios de dinheiro com a dívida pública brasileira, enquanto o Banco Central acumulou o prejuízo recorde de R$ 58,5 bilhões no curto período de janeiro a outubro de 2007. Considerando o crescimento explosivo das dívidas interna e externa, o volume de recursos consumido por essas dívidas, os condicionamentos e danos à economia que elas provocam, os sacrifícios e o desrespeito aos direitos do povo brasileiro que elas impõem, a ausência de qualquer contrapartida que justifique tamanho endividamento, os prejuízos contabilizados anualmente pelo Banco Central, além dos inúmeros indícios de ilegalidades e ilegitimidades do endividamento público brasileiro, é urgente a realização de uma completa AUDITORIA DA DÍVIDA, como prevê a Constituição Federal.

Auditoria: condição para o enfrentamento da questão do endividamento

Maria Lucia Fattorelli

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Conforme vimos, o recente acúmulo de reservas cambiais pelo Brasil esconde, na realidade, um forte endividamento interno a juros altíssimos e prazos muito curtos. Esconde também um forte endividamento externo dos bancos e empresas nacionais que especulam com o dólar e compram títulos da dívida interna. Esconde ainda o saque dos recursos naturais do país, uma vez que o aumento recente das exportações se deve à super exploração do agronegócio para a venda de commodities no mercado internacional. As monoculturas da soja e, agora, da cana-de-açúcar (que deve aumentar consideravelmente a partir do acordo de Lula com

Coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida/Jubileu Brasil, e membro titular da Comisión para la Auditoría Integral del Crédito Público do Ecuador

Rodrigo Vieira de Ávila Economista da Auditoria Cidadã da Dívida/Jubileu Brasil


CPMF, políticas públicas e responsabilidade fiscal Edson Ronaldo Nascimento

Introdução Ao final do exercício financeiro de 2007 o assunto mais importante nas discussões sobre gestão pública em nível federal no Brasil certamente é o debate a respeito da prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira, a CPMF. Este artigo foi elaborado em um momento em que ainda não havia sido decidido pelo Congresso Nacional se a partir do exercício financeiro de 2008 o governo federal poderia continuar a lançar mão de um tributo que em 2006 trouxe cerca de R$ 32 bilhões aos cofres públicos. O objetivo deste texto é destacar a importância das receitas da CPMF para a administração pública federal, além de analisar os reflexos dessa contribuição sobre as políticas públicas em curso no país. Um breve histórico Logo após a promulgação da Constituição Federal de 1988, o governo federal, para enfrentar um desequilíbrio fiscal e financeiro que se desenhava no horizonte, adotou sucessivas medidas para compensar algumas perdas de receitas patrocinadas pela nova Carta Magna1. Na área tributária, foram criados de novos tributos, além da elevação das alíquotas de alguns já existentes, em particular aqueles não sujeitos à partilha com os

demais entes federativos. Alguns exemplos são a criação da contribuição incidente sobre o lucro líquido das empresas (1989), o aumento da alíquota da Cofins de 0,5% para 2%, e também o aumento das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (1990), além da criação do Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras (IPMF), que representaria mais um tributo cumulativo (1993). A CPMF substituiu o Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF), criado em 13 de julho de 1993 e que vigorou de 1º de janeiro de 1994 até 31 de dezembro de 1994. O IPMF tinha uma alíquota de 0,25% que incidia sobre os débitos lançados sobre as contas mantidas pelas instituições financeiras. Originalmente era destinado de maneira quase integral ao Fundo Nacional de Saúde - FNS. A Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira foi criada em 1996, com base em sugestão do então ministro da Saúde, Adib Jatene, em um momento em que o país enfrentava uma crise na área da saúde. Os recursos arrecadados deveriam ser usados, entre outras finalidades, para a construção e reforma de hospitais. A Emenda Constitucional nº 12, de 16 de agosto de 1996, ao incluir o art. 74 no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), outorgou competência à União para instituir a CPMF. A Lei no 9.311, de 24 de outubro de 1996, instituiu a contribuição, considerando como movimentação ou transmissão de valores e

Com a CF/88 aumentaram os repasses federais bem como as receitas próprias de Estados e municípios.

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De acordo com a Constituição Federal, 42,1% do que é arrecadado com a CPMF deve ser destinado para a saúde, 21,1% para o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, 21% para a Previdência Social e 15,8% são apropriados pelo orçamento fiscal para aplicação livre de vinculações

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de créditos e direitos de natureza financeira qualquer operação liquidada ou lançamento realizado pelas entidades referidas no seu art. 2º, que representem circulação escritural ou física de moeda e de que resulte ou não transferência de titularidade dos mesmos valores, créditos e direitos. A Emenda Constitucional nº 21, de 18 de março de 1999, prorrogou esse prazo para o período de 17 de junho de 1999 a 17 de junho de 2002, e a Emenda Constitucional nº 37, de 28 de maio de 2002, determinou que a CPMF fosse cobrada até 31 de dezembro de 2004. Em 19 de dezembro de 2003, a EC nº 42 prorrogou novamente o prazo de incidência da CPMF até 31 de dezembro de 2007. A CPMF em vigor tem alíquota de 0,38%, relativamente aos fatos geradores ocorridos no período de 18 de março de 2001 a 31 de dezembro de 2007 e, conforme visto, não é repartida com Estados e municípios. Desde que foi criada até o exercício de 2006, a CPMF já arrecadou cerca de R$ 203 bilhões. De acordo com o Ministério da Fazenda, deste total, R$ 136,8 bilhões foram para os fins aos quais a contribuição era origi-

nalmente destinada: o Fundo Nacional de Saúde (FNS) e Previdência Social. O restante, o Tesouro direcionou para outros fundos criados ao longo dos últimos dez anos. O FNS ficou com a maior parte, R$ 93,6 bilhões, e o Ministério da Previdência, com R$ 43,2 bilhões. Já o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, criado em 2001 com o objetivo de financiar programas públicos de combate à fome e à miséria (que também financia o programa Bolsa Família), ficou com R$ 34,1 bilhões. E cerca de R$ 32 bilhões da CPMF foram para a Desvinculação das Receitas da União (DRU). De acordo com a Constituição Federal, 42,1% do que é arrecadado com a CPMF deve ser destinado para a saúde, 21,1% para o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, 21% para a Previdência Social e 15,8% são apropriados pelo orçamento fiscal para aplicação livre de vinculações. Atualmente, a Constituição Federal, no art. 84 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), prevê que do produto da arrecadação da CPMF será destinada a parcela correspondente à alíquota de: I – 0,20% ao Fundo Nacional de Saúde para financiamento das ações e serviços de saúde; II – 0,10% ao custeio da Previdência Social; III – 0,08% ao Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza. A CPMF arrecadou, em 2006, cerca de R$ 32 bilhões (ou aproximadamente US$ 16 bilhões). Desses valores, R$ 13 bilhões foram para a saúde (40%), R$ 7 bilhões para a Previdência Social (21%) e R$ 6,7 bilhões para o Fundo de Combate a Pobreza (20%). O restante, aproximadamente R$ 5 bilhões, ficaram à disposição do Tesouro Nacional por conta da desvinculação de receitas (DRU). Além disso, em 2007, 87% da dotação orçamentária do Programa Bolsa Família teve como fonte a CPMF. Dos aproximadamente R$ 8,6 bilhões a serem gastos com o programa social, R$ 7,5 bilhões vieram do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, cuja fonte é a CPMF. A tabela a seguir mostra a evolução da arrecadação da CPMF para o período 2000/2006. Descontando-se a taxa de inflação (IGP-DI), observa-se um crescimento real (médio) de 10% ao ano a partir do exercício finan-


Período

CPMF

PIB nominal

CPMF/PIB

2000

14.396.561,39

1.101.254.907,19

1,31%

2001

17.157.001,52

1.198.736.187,56

1,43%

2002

20.266.821,60

1.346.027.387,76

1,51%

2003

22.984.137,82

1.556.181.873,12

1,48%

2004

26.393.531,02

1.766.621.054,48

1,49%

2005

28.995.769,70

1.937.600.000,00

1,50%

2006

31.935.232,81

2.095.000.000,00

1,52%

Fontes: Min. Fazenda e IBGE

ceiro de 2000. Percebe-se também o crescimento da CPMF em termos porcentuais em relação ao PIB, calculado antes da nova metodologia utilizada pelo IBGE a partir de 2005. Tramitação no Congresso Na Câmara Federal, o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) para a prorrogação da CPMF até 2011 foi aprovado por 333 votos favoráveis, 113 contrários e 2 abstenções. No Senado, o governo estava consciente de que as dificuldades seriam muito maiores para a aprovação do texto principal da PEC. Curiosamente, a grande rejeição à prorrogação da CPMF, desde que o projeto chegou naquela Casa Legislativa, partiu dos partidos políticos que criaram e ampliaram a alíquota da contribuição ao longo dos dois mandatos do presidente Fernando Henrique Cardoso. Por outro lado, quem atualmente defende e luta pela manutenção da contribuição até 2011 é quem no passado tentou, de todas as formas possíveis, acabar com a contribuição provisória desde a sua criação em 1993, quando era chamada IPMF. Alguns chamam a isso de “ciclo político”. De fato, quando o projeto de prorrogação da CPMF chegou ao Senado Federal teve início um jogo natural de barganhas e negociações, cujo objetivo final não é outro senão o aumento de participação no poder em nível federal. Uma análise teórica interessante a respeito desse processo pode ser encontrada em trabalho publicado por Graham Allison em 1962 (Essence of Decision: Explaning the Cuban Missile Crisis), onde o autor destaca um jogo de interesses que se desenrola em uma “arena política”, onde as ações e as decisões governamentais

estão relacionadas a agentes que buscam na política influência e poder sobre o Estado e sobre as organizações públicas. O modelo negocial (político-burocrático), proposto por Allison, pode ser observado nas relações internacionais entre os países e também nas relações internas de um país entre os seus partidos políticos e a burocracia estatal. Mas qual é a racionalidade que está por trás dessa disputa (aparentemente) ideológica? A CPMF é realmente necessária e importante para o atual processo de desenvolvimento econômico e social do país? A racionalidade desse processo, segundo o raciocínio de Allison, pode estar em uma constatação bastante simples: qualquer partido político que esteja no poder desejará desenvolver um maior número de programas que envolvam investimentos em infra-estrutura, saneamento, segurança etc. E isso se torna possível quando as receitas próprias são suficientes para a realização desses programas. Por outro lado, o sucesso de um programa de governo, onde se dispõe de um volume significativo de recursos para o desenvolvimento de políticas públicas, pode ser visto como uma ameaça para os partidos de oposição. De fato, qualquer partido político, seja de direita, esquerda, centro ou derivados, jamais abrirá mão das receitas públicas, na medida em que elas representam o principal combustível para os investimentos públicos. No caso da CPMF, além das receitas diretas que são arrecadadas sem a repartição natural com Estados e municípios, ela constitui um instrumento de controle importante da sonegação fiscal por parte das pessoas físicas e jurídicas. Nesse caso, sem a CPMF o governo federal poderá perder não apenas os valores previstos para a arrecadação do tributo (cerca de R$ 40 bilhões em 2007). Pode-se esperar também uma redução na arrecadação do imposto de renda, na medida em as transações bancárias, sem um instrumento de controle como a CPMF, deixarão a Receita Federal sem um bom indicador do padrão de renda dos agentes econômicos. A CPMF e a Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF Após a edição da LRF, em maio de 2000, a política fiscal passou a perseguir um conjunto de metas que devem estar definidas nas Leis de Diretrizes Orçamen-

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Evolução da arrecadação da CPMF no Brasil (R$ mil)

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tárias (LDO). Além disso, de acordo com a Lei Fiscal, a Receita Corrente Líquida (RCL) passa a ser o principal balizador para o equilíbrio financeiro e para a limitação dos gastos públicos. Em poucas palavras, a RCL representa a receita que fica disponível ao ente público após as repartições constitucionais. Nesse caso, a RCL da União corresponde à receita total arrecadada com tributos, deduzidas as transferências obrigatórias a Estados e municípios. Portanto, a CPMF, mesmo não sendo transferida para os demais entes federativos, compõe a RCL da União Federal. A RCL, conforme asseverado, representa atualmente o principal parâmetro para gastos públicos. Como exemplo, podemos verificar que as despesas com pessoal da União Federal não podem ultrapassar determinado percentual da RCL, no caso, 50% (artigo 19 da LRF). Portanto, sem a CPMF, a relação pessoal/RCL da União Federal será aumentada, visto que haverá uma redução no denominador da relação (note-se que mesmo que a CPMF não seja utilizada para pagamento de pessoal, ela compõe a RCL). No que se refere às metas fiscais definidas pela União para um período de três anos (2008 a 2010), de acordo com a LDO para 2008, grande parte do superávit primário projetado (meta fiscal) provém da arrecadação de tributos. Nesse caso, sem a CPMF as metas fiscais (já acordadas e autorizadas pelo Poder Legislativo Federal) ficarão prejudicadas. Objetivamente, sem a CPMF, é bem razoável supor que a meta macroeconômica de zerar o déficit nominal até 2012 não seria cumprida. Essas considerações são para identificar que o ­go­ver­no federal estabeleceu um programa econômico de médio prazo contando com as receitas da CPMF para a sua consecução, programa que foi negociado e aprovado no Parlamento. Sem a contribuição provisória, a Lei Orçamentária para 2008 (que considera a CPMF como fonte de recursos) também deverá ser revista. Alguns estudos buscam demonstrar que existem formas de compensar as perdas da CPMF, o que inclui desde a simples diminuição dos gastos públicos até a redução da guerra fiscal entre entes federativos. A questão que se coloca nesse momento é a dependência das políticas púbicas federais em relação à CPMF, conforme demonstrado anteriormente. Mesmo que medidas como estímulo ao

mercado de capitais e redução de alíquotas de bens de consumo possam vir a representar um aumento nas receitas da União, isso demandaria tempo. Por outro lado, o cidadão que recebe transferências do Bolsa Família espera ter esse recurso disponível em sua conta ao final de janeiro de 2008. Também o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e outros programas voltados para o desenvolvimento da infra-estrutura demandam recursos públicos em um momento em que o aumento do consumo requer investimentos em energia, transportes etc. Por fim, de acordo com a LRF, o procedimento a ser adotado no caso da redução nas receitas é a redução das despesas na mesma proporção. Nesse caso, onde será possível uma redução tempestiva nas despesas no caso em que a CPMF viesse a ser encerrada em dezembro de 2007? Conclusão O objetivo desse artigo não foi criticar ou elogiar esse ou aquele projeto de governo. A questão que se coloca é o efeito imprevisível de uma mudança nas regras de um projeto acordado com o Poder Legislativo na época da aprovação da LDO para 2008 e da votação do projeto da Lei Orçamentária Anual. Ambas consideravam a CPMF como fonte de receitas próprias, o que criou uma dependência das políticas públicas para um período de 3 anos em relação à contribuição. Mesmo que não concorde com a utilização permanente de um tributo que nasceu para ser provisório, entendo que a sua eliminação deve ser gradual para que os agentes (incluindo governo e sociedade) possam se adaptar paulatinamente à nova realidade.

Edson Ronaldo Nascimento Economista, especialista em Finanças Públicas


Educação:

base do desenvolvimento econômico Luiz Ernesto Antunes de Oliveira

A questão do desenvolvimento econômico tem raízes teóricas e empíricas. Alguns autores crêem que foi no pacto colonial a origem do atraso das economias contemporaneamente subdesenvolvidas; outros creditam aos que tratavam, no passado, das finanças públicas que tinham como objetivo aumentar o poder econômico e militar do rei. Pouco ou raramente havia a preocupação com a melhoria das condições de vida do povo, o analfabetismo era generalizado, muitas vezes a população se via dizimada pela fome e por epidemias provocadas por falta de condições sanitárias. A ignorância e a ganância, na verdade, reinavam. Para o desenvolvimento não existe uma definição universalmente aceita. Uma corrente de economistas mais teóricos, Meade (1959), Solow (1956), Harrod (1956), Domar (1985) e Kaldor (1975), por exemplo, consideram crescimento como sinônimo de desenvolvimento. Uma outra, com visão mais empírica, Hirschman (1974), Myrdal (1968), Lewis (1969), dentre outros, desenvolveram modelos mais próximos da realidade das economias atualmente subdesenvolvidas/emergentes. Contudo, a experiência tem demonstrado que o desenvolvimento econômico não pode ser confundido com crescimento porque o resultado dessa expansão nem sempre beneficia a economia como um todo e o conjunto da população mais pobre. Mesmo que a economia cresça a taxas relativamente altas, algumas variáveis de suma importância podem não estar diminuindo na rapidez necessária, tais como o desemprego, índice de mortalidade infantil, índice de analfabetismo. Além disso, o crescimento da renda per capita é fundamental para a melhoria dos índices sociais. Essas

variáveis correlacionam-se e influenciam os indicadores do bem-estar socioeconômico. Em que pese a utilização da renda per capita como principal indicador de desenvolvimento, porém como média, camufla a distribuição de renda, não refletindo o nível de bem-estar da população mais pobre. Para uma melhor tomada de posição se faz necessária a utilização de uma cesta de indicadores econômicos e de infra-estrutura, sintetizados pelos índices de desenvolvimento humano-IDH. No Brasil, como em outros países detentores de perversa distribuição de renda e de oportunidades, o melhor indicador é o IDHA - Índice de Desenvolvimento Humano Ampliado, que inclui a incidência da pobreza e o coefi­ ciente de Gini. Nesse caso, os estados brasileiros mais desenvolvidos, classificados por este índice, deveriam apresentar IDHA’s mais altos e, por conseguinte, menores indicadores de desigualdades econômico-sociais. As medidas destinadas a reduzir a pobreza são indispensáveis quando for grande o contingente de pessoas na situação de risco social. A adoção de políticas econômicas compensatórias é válida tão-somente para se acelerar o tempo histórico, proporcionando saltos sustentados de crescimento, expandindo e diversificando as exportações e fatores como a concentração de renda, educação defasada, falta de mão-de-obra especializada, deficiência de infra-estrutura e insuficiência de poupança interna. A mudança tecnológica e a crescente concorrência internacional criaram uma nova categoria de “despossuídos” de educação geral e tecnológica. No decorrer dos séculos, a tecnologia criou novos produtos e novas

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Artigo

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formas de produzi-los que tornaram os trabalhadores e suas qualificações redundantes. Embora o deslocamento decorrente da mudança tecnológica não seja uma novidade, seu ritmo se acelerou substancialmente. Além disso, atualmente afeta profissões cuja maneira de atuar não mudou muito com o passar do tempo. Como ainda afetará aqueles que não aprenderam a temer pela perda de seus empregos. Como criar ou desenvolver medidas temporárias e/ou compensatórias se desta vez o desemprego não será em conseqüência de uma fase adversa do ciclo econômico? Não haverá uma situação a ser revertida, pois o trabalhador perde seu sustento porque sua atividade se tornou obsoleta do ponto de vista tecnológico ou porque a concorrência estrangeira o substitui. Não é provável que o recupere. Esses novos riscos criam um novo tipo de desamparo econômico. No passado, aqueles que perdiam o emprego podiam manter sua esperança no mercado enquanto pudessem conseguir os meios de sobreviver até que a situação conjuntural melhorasse. Atualmente, um trabalhador que perdeu sua carreira não pode retomar a fé no futuro com meros auxílios. Da mesma forma, os jovens, que chegam ao mercado em busca de oportunidades, podem estar concorrendo de maneira desigual com um jovem na Índia, China etc. A concorrên-

‘‘ Conjuntura Revista de

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O Estado Moderno deve ser menos intervencionista, mais orientador de tendências econômicas em áreas de interesse estratégico. Assim, os recursos públicos ficariam destinados a áreas de interesse social, como educação, saúde, infra-estrutura e outros de maturação econômicofinanceira de longo prazo

cia não está na sua cidade ou na sua vizinhança; está em qualquer lugar do mundo globalizado. Nestes casos, ambos precisam de oportunidades para dar continuidade às suas vidas, e não de um subsídio temporário. No entanto, mesmo em processo para superação das deficiências socio­econômicas, o Estado Moderno deve ser menos intervencionista, mais orientador de tendências econômicas em áreas de interesse estratégico. Assim, os recursos públicos ficariam destinados a áreas de interesse social, como educação, saúde, infra-estrutura e outros de maturação econômico-financeira de longo prazo. A educação é um fator importante no desenvolvimento econômico e social. Atribuem alguns autores à prioridade dada, pelos chineses, coreanos e indianos, a educação básica e tecno-profissional, o sucesso de suas políticas de desenvolvimento. O Korean Journal Of Latin American Studies – Woo-Tack Kim, On the Role of Education and Culture in Economic Development (1988) compara os gastos públicos entre países latinos-americanos e a Coréia do Sul, a partir de 1980. Notabiliza o país asiático pelo investimento crescente no ensino básico, seguido, na América Latina, pelo Chile, Argentina e Brasil. O autor, que compara os gastos públicos entre o nosso país e a Coréia do Sul, verifica que os investimentos no ensino médio na década de 1980 são cerca de quatro vezes maiores na Coréia, enquanto que as despesas com o ensino superior são cerca de duas vezes maiores no Brasil (os dados são resultados de indicadores do estudo coreano que levantou o número de matrículas nos níveis de ensino básico e superior em relação à renda per capita). Resumindo, o autor declara que a prioridade dada ao ensino superior tem efeito concentrador de renda, contrariamente ao que ocorre com a prioridade dada ao ensino médio/técnico e considera a equilibrada distribuição de renda como fator importante para explicar o melhor desempenho da economia coreana, particularmente quando comparado com o caso brasileiro. No entanto, em que pese a educação, no caso coreano, é de suma importância salientar que pelo menos mais três fatores concorrem somando-se na construção da economia: a história, os movimentos sociais e a presença constante de um modelo político e econômico determinante por questões da geopolítica asiática. Definir com absoluta certeza o papel da educação na vida dos indivíduos e das sociedades é algo pratica-


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periência tem mostrado que o crescimento equilibrado requer integração de todos os aspectos da vida econômica e social se quisermos que os projetos e planos individuais dêem plenos resultados. O desafio das economias emergentes não está absolutamente separado do tecnológico, pois este levará a concorrência a muitos segmentos que até o momento eram imunes a eles. E a tecnologia está tornando cada vez mais possível que todos os tipos de trabalhos sejam prestados a distância. Exemplos não faltam. Empresas de telemarketing com sede na Índia prestam serviços nos Estados Unidos. A concorrência será implacável no caso das ocupações mais rotineiras que, de modo geral, são as que

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O que se deve combater é a forma extramente ineficaz e, conseqüentemente, muito cara em termos de produtividade da educação. É possível citar vários outros fatos que lançam algo diferente sobre a educação como aspecto do desenvolvimento socioeconômico, aceitando-se, de saída, que é essencialmente o investimento da sociedade no capital humano

mais empregam. Com o tempo, a concorrência se deslocará para atividades mais qualificadas à medida que os estrangeiros aprendam os costumes locais. Atribuem-se geralmente três funções iniciais à educação. Uma delas é o suprimento de mão-de-obra qualificada e de técnicos sem os quais o capital físico e, atual­ mente, o capital intelectual (economia da informação), se desperdiçariam. E nesse contexto, em uma sociedade pós-industrial, em que a economia expandiu, segundo Machup (1962), para a indústria baseada no conhecimento, insere-se a questão da educação como fator primordial para a competitividade e a inserção do país na concorrência mundial. Consiste a segunda em criar um “clima de crescimento”,dando às pessoas a capacidade de pensar além das necessidades e preocupações imediatas. A terceira é a de capacitar os agricultores, fontes de alimentos, energias, para além de produzirem um extra em relação ao consumo em bases sustentáveis, formarem base de acumulação física e da estabilidade. Pode-se declarar a educação, sem nenhuma margem de dúvida, como poderosíssimo meio e fim daqueles que

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mente impossível. Mas, sem nenhuma dúvida, pode-se afirmar que a educação é a base do desenvolvimento de uma nação. Só ela é capaz de transformar o meio. Como a maior parte do planeta é pobre, e como todos os países nas áreas pobres tentam elevar suas rendas per capita, segue-se que a educação deve desempenhar papel relevante nessas nações. Ajudando-as economicamente de maneira direta. O que se deve combater veementemente é a forma extramemente ineficaz e, conseqüentemente, muito cara em termos de produtividade da educação. Não obstante, é possível citar vários outros fatos que lançam algo diferente sobre a educação como aspecto do desenvolvimento socioeconômico, aceitando-se, de saída, que é essencialmente o investimento da sociedade no capital humano. A partir daí, seguir-se-á logicamente que o acúmulo desse capital deve ser fator de crescimento, qualidade de vida e pleno exercício da cidadania. Torna-se, pois, necessário afirmar o óbvio. Assim como não há motivo para construir uma siderúrgica antes de existirem fábricas que consumam o aço, ferro e carvão para alimentá-la e técnicos qualificados para fazê-la funcionar, não faria sentido construir um sistema escolar onde faltassem empregos capazes de absorver as pessoas­ que deles saíssem e equipamento de capital para ser utilizado por elas. Diante disso, um plano de educação deve ser concebido como parte importante de um programa geral de governo que vise a elevar o nível socioeconômico da comunidade e a sua inserção na comunidade tecnológica; isso porque a educação tende a justificar suas demandas de recursos nacional e distrital em competição com outros serviços sociais, como saúde e investimento em capital físico, e também porque a ex-

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almejam a melhoria e a inclusão socioeconômica. Mas assim só acontece em certas condições; por si mesma, ela provavelmente consome mais recursos do que produz. Proporcionada condições predeterminadas, porém, ela pode desempenhar papel primordial, desde que seus objetivos sejam delineados e relacionados com outras partes do programa de desenvolvimento do governo e que os recursos consignados sejam otimizados. Na Constituição brasileira, art.205, fica evidente que a educação é direito de todos, e dever do Estado e da família, e que será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Já o artigo subseqüente garante a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, a liberdade de aprender, ensinar, o pluralismo de idéias e de concepções, a gratuidade do ensino público, a valorização dos profissionais, a gestão democrática e a garantia de padrão de qualidade. Com os valores consignados na Carta Magna postos, é importante ressaltar que as tentativas de melhorias do ensino público brasileiro têm ficado sejam em níveis teórico­-acadêmicos e ou em níveis ideológicos, trazendo muito pouco resultado para um projeto de justiça social. No entanto, o Brasil, a partir dos anos 90, se inseriu no movimento de educação para todos e empreendeu diversas iniciativas e reformas, tanto pela União, Estados e municípios. Muitas inovações foram e estão sendo introduzidas, mas as avaliações da educação básica brasileira continuam a apontar déficits preocupantes que podem colocar em risco todo um projeto nacional de desenvolvimento sustentado.

uma expansão das forças produtivas da sociedade [...] O crescimento econômico torna-se, assim, vinculado a uma meta social específica e exige a intervenção do Estado na anárquica atuação das forças do mercado.” Adam Smith, em Riqueza das Nações (1776) – “As pessoas do mesmo ramo raramente se reúnem, mesmo para o lazer e a confraternização, sem que a conversa acabe em uma conspiração contra o público ou em alguma manobra para aumentar os preços.” Por outro lado, quando Marx e Engels escreveram, no Manifesto Comunista (1848), que o governo é “um comitê para administrar os negócios comuns de toda classe burguesa”, Marx pensava que o problema se restringia às democracias burguesas e desapareceria em um Estado socialista. No entanto, tudo o que a revolução socialista fez foi mudar a identidade da elite, como também eliminar as concorrências econômicas e políticas. Da mesma forma como as entidades econômicas ineficientes são obrigadas a se aprimorar quando há concorrência, os governos ineficientes podem ser forçados a melhorar não tanto pela concorrência em eleições, onde poucos podem ser organizar e distorcer a vontade da maioria mesmo em uma democracia, mas direcionando seus dependentes econômicos para a disputa do mercado mundial. E a regra para estar presente nesse mercado global é a manutenção das fronteiras abertas à educação, à entrada de bens e de capitais. Necessita-se adequar a educação às novas exigências da atualidade pois, no mundo tecnológico em constante mutação dos perfis profissionais, exige-se o desenvolvimento de novas habilidades e competências, como também a visão de mundo como um único mercado, um só

Para concluir de forma mais abrangente possível, haja vista que o tema é de conexão em banda larga (rápida, fascinante e de transformação do modo de viver do homem em relação ao homem e ao mundo que o cerca), cito Friedmann (1996), que advoga o empoderamento das comunidades locais e considera a auto-organização dos pobres como fundamental para se efetivar a sobrevivência coletiva. Mas ao mesmo tempo, enfatiza a necessidade de ajuda externa, especialmente do Estado, para obter resultados satisfatórios em escala compatível com a dimensão do problema. [...] “Nesta perspectiva, portanto, o crescimento econômico não é mais considerado como busca cega do crescimento pelo crescimento, mas como

ecossistema, uma mesma comunidade. O mundo está aberto a oportunidades! Então, hands on!

Luiz Ernesto Antunes de Oliveira Economista do Corecon/DF


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Projeções da econ por Ynaiana Leite

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O mercado financeiro está cauteloso ao fazer qualquer previsão para o crescimento da economia brasileira em 2008. Algumas estimativas advertem que o ano não será fácil. Já os donos das previsões mais animadoras apostam que o país começará o ano com a economia aquecida. Segundo o Boletim Focus, divulgado pelo Banco Central, a estimativa para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) aumentou de 4,70% para 4,71%, em 2007 enquanto para 2008, caiu de 4,37% para 4,33%. O professor da Universidade de São Paulo e conselheiro do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Heron do Carmo, está otimista em relação às perspectivas da economia para 2008.“Apesar das incertezas do cenário econômico, teremos uma continuidade no processo da retomada do crescimento econômico com taxa de 4% ao ano”, aposta. Ele acredita também que as taxas de desemprego terão uma redução, mas ressaltou que essa mudança não depende somente da conjuntura econômica, mas principalmente dos agentes da economia. O economista Rubens Sawaya, presidente da Associação Nacional dos Cursos de Graduação em Economia (ANGE), avalia que em 2008 a economia brasileira ainda deve permanecer aquecida, mas não tanto quanto em 2007. Sawaya estima que o país crescerá entre 3,5% e 3,8%. O economista explica que isso ocorrerá devido à taxa de câmbio que provavelmente ainda permanecerá baixa, pelo menos até meados do ano, o que terá impacto negativo sobre o balanço de pagamentos. “Também contribuirão para tal tendência as políticas econômicas fiscal e monetária excessivamente conservadoras, preocupadas unicamente com a inflação e não com o crescimento” , afirmou. O governo prevê que o país iniciará o ano com a economia aquecida. O ministro da Fazenda, Guido Man-

tega, afirmou, em entrevista aos meios de comunicação, que a economia brasileira está acelerada desde 2006 e que tem bases sólidas, como a inflação sob controle. Crise norte-americana pode afetar economia mundial Especialistas e instituições financeiras acreditam que a economia mundial pode ser afetada pela crise imobiliária americana. O Fundo Monetário Internacional (FMI) informou que deve revisar para baixo suas projeções para o crescimento global em 2008. A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) declarou que a economia nos Estados Unidos passa por uma forte desaceleração, mas não entrará em recessão. Na avaliação do economista Rubens Sawaya, China e Índia continuarão puxando a economia mundial com fortes taxas de crescimento e a realidade do Brasil não será a mesma. “As políticas econômicas adotadas e as estratégias desses países são completamente diferentes, envolvendo um alto grau de planejamento estratégico do desenvolvimento com papel importante do Estado. Se o Brasil não mudar sua postura, continuará a distanciar-se desses países”, ressaltou. Já o economista Heron do Carmo acredita que o cenário mundial favorecerá a economia brasileira, pois haverá aumento da commodity da indústria, agricultura e matéria-prima. Quanto à inflação, as projeções da OCDE apontam para variações do Índice Nacional dos Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) abaixo do centro da meta fixada pelo governo tanto em 2007 quanto em 2008. As estimativas indicam uma alta de 3,9% em 2007 e de 4% em 2008. Nos dois casos, a meta de inflação é de 4,5%, com


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nomia para 2008

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margem de flutuação de dois pontos percentuais, para cima ou para baixo. Cenário positivo para empresas brasileiras “Estamos vivendo uma Era de oportunidades para a economia brasileira. Se mantivermos a ousadia, essa Era será premiada. As empresas serão bem-sucedidas neste cenário da economia, crescendo 4% ao ano”. A afirmação é do economista Heron do Carmo, que vê perspectivas bastante favoráveis para as empresas em 2008. Rubens Sawaya pondera que se o país continuar com políticas econômicas conservadoras, e sem uma política mais radical em termos cambiais, o desenvolvimento

das empresas que produzem para o mercados interno e externo será dificultado, principalmente nos setores de bens de consumo não-duráveis. “Muitas empresas têm sobrevivido importando mais do que produzindo internamente, o que gera uma falsa impressão de crescimento da produção”, ressalta. Sawaya explica que, no caso das empresas que atuam no mercado externo, a competitividade vem decrescendo há tempo. “As empresas de bens de consumo duráveis estão se beneficiando do crédito abundante, da diminuição das taxas de juros e, em parte, até da própria taxa de câmbio. Mas, se a elevação do endividamento das famílias não for sustentada pelo crescimento econômico, pela elevação da renda de emprego, vamos ter problemas no futuro”, destaca.


Carga tributária brasileira A carga tributária do Brasil é superior a de 15 países, entre os quais estão os três que detêm as maiores economias do mundo – EUA, Japão e Alemanha. Na Europa vem ocorrendo um grande movimento dos cidadãos contra os excessivos tributos. Essa é também a queixa de muitos brasileiros. Mas é consenso, entre os economistas entrevistados, que a carga tributária não é um entrave se for bem utilizada. “Deve-se reduzir a carga tributária para que o governo gaste o dinheiro público bem”, opina Heron do Carmo. “O maior entrave é o excesso de conservadorismo das políticas econômicas aliadas ao nível de taxas de câmbio que encarecem os produtos brasileiros e barateiam os produtos importados”, afirma o economista Rubens Sawaya. Segundo ele, o que ocorre no Brasil é que os impostos arrecadados são mal gastos. “O Estado brasileiro precisa gastar, mas gastar produtivamente, gerando emprego e renda de modo a incentivar o investimento privado através de seus gastos. Gastando produtivamente (com o PAC, por exemplo), incentiva o crescimento econômico e eleva a arrecadação no futuro. Agora, gastando com juros nunca conseguirá fechar o caixa no futuro, a não ser cortando em gastos sociais e produtivos (o que já nem é mais possível, dado o estado calamitoso em que estão os serviços públicos), sem promover qualquer crescimento econômico, agravando a questão social e a competitividade da economia brasileira pela carência, por exemplo, de infra-estrutura”, diz. Investimentos em infra-estrutura continuam no mesmo patamar

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A economia brasileira sofre constantemente com a ameaça de apagões de energia e de transportes. Nos transportes, 70% da malha rodoviária brasileira está em condições ruins ou péssimas de rodagem. No setor de saneamento, 27% das residências não têm acesso à rede de tratamento de esgoto e 11% não têm água tratada. Segundo a Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Adib), o Brasil precisa investir R$ 88 bilhões de reais a cada ano para equacionar os problemas. Mas, no orçamento de 2008 para infra-estrutura o governo prevê o investimento de apenas R$ 22,7 bilhões.

Os especialistas em infra-estrutura ressaltam que o crescimento brasileiro não depende apenas da política monetária, mas também das limitações físicas ao crescimento e ao escoamento da produção. Os principais gargalos do setor são, segundo eles, as estradas, os portos e os projetos. Eles apontam dois problemas: a escassez dos investimentos públicos e a ausência de marcos regulatórios que atraiam o capital privado em áreas em que o Estado não consegue investir. O economista Heron do Carmo concorda que os gastos com infra-estrutura devem ser realocados para o setor privado. “Mas é preciso ficar bem definido o controle do poder público com o apoio das agências reguladoras”, pondera. Já o economista Rubens Sawaya avalia que o governo, ao entregar as responsabilidades de investimentos em infra-estrutura à iniciativa privada, desestruturou o Estado e eliminou sua capacidade de planejamento a longo prazo. “Toda a estrutura de planejamento de longo prazo, que sempre teve o papel de estudar e prever gargalos de infra-estrutura (como GEIPOT, Eletrobrás etc) foi desmantelada. O problema é justamente esse: o setor privado não é capaz, e nem é seu objetivo, pensar a longo prazo, e nem tem a função de resolver problemas que dizem respeito à sociedade. Investimentos em infra-estrutura exigem planejamento de 20 - 30 anos. Teremos que reestruturar o Estado ou ficaremos sem infra-estrutura”, afirma o economista.


A compensação financeira da indústria do petróleo Eduardo Toledo Neto

I – Introdução As alterações do clima afetarão a vida humana, em nível mundial, à medida que o mundo vai aquecendo. Estudos estão sendo desenvolvidos como, por exemplo, o Estudo Stern (2006), que calculou que o total dos custos e riscos de alterações climáticas será equivalente à perda anual de, no mínimo, 5% do PIB global; e as estimativas dos danos poderão aumentar para 20% ou mais do PIB. Os custos da tomada de decisões relacionadas à redução das emissões dos gases de efeito estufa, a fim de evitar o agravamento dos impactos das mudanças climáticas, podem ser estimados em cerca de 1% do PIB global anual. A proposta do Pacto Nacional pela Valorização da Floresta e pelo Fim do Desmatamento na Floresta Amazônica, apresentada no dia 3 de outubro de 2007, no Congresso Nacional, sugere a criação de instrumentos econômicos para incentivar a conservação florestal e reduzir o desmatamento na Amazônia – por meio de Sistemas de Pagamentos por Serviços Ambientais e de benefícios econômicos aos Estados que reduzirem suas taxas de desmatamento – e mecanismos financeiros compensatórios no âmbito do mercado de carbono­ (YOUNG et al, 2007). Em relação à problemática ambiental, a indústria do petróleo, em todos os seus segmentos, trabalha com riscos potenciais, seja no upstream ou no downstream; a exemplo, uma refinaria é responsável pela emissão

de muitos poluentes na atmosfera, mas o maior índice de acidentes no setor petrolífero ocorre durante o transporte de cargas (CARDOSO, 2005). As participações governamentais podem ser definidas como o preço pago pelo investidor para o governo pela exploração e produção dos recursos de um Estado, isto é expresso como um percentual de fluxo de caixa de um campo, e adquire a forma de bônus, royalties­, taxas e outros pagamentos pagos para o governo pelo investidor (OLDIANOSEN, 2005). E nesse sentido, a compensação financeira assume a função de compensar a União, Estados e municípios pelas externalidades resultantes dos processos de exploração e produção de petróleo. Este artigo analisa a compensação financeira da indústria do petróleo como fonte de recursos para criação e suporte de um Programa de Mudanças Climáticas no Ministério do Meio Ambiente (MMA), a partir da avaliação do arranjo institucional de amparo à utilização dos recursos financeiros; das condições de institucionalização da gestão da participação governamental pelo MMA; e dos efeitos da compensação sobre o desenvolvimento de estudos e projetos relacionados com a preservação do meio ambiente e recuperação de danos ambientais causados pelas atividades petrolíferas de exploração e produção; verificando se houve contribuição efetiva no interesse ambiental, ou se, apenas, o emprego dos recursos é exercido com fins arrecadatórios para composição de saldo financeiro

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no Tesouro Nacional do país, desvinculando-se do uso devido da participação especial em âmbito federal. II – Compensação financeira da indústria do petróleo A participação especial é uma das formas de participação governamental1 estabelecida nos contratos de concessão sob a figura de compensação financeira extraordinária, com pagamento estabelecido para os casos de grande volume de produção, ou de grande rentabilidade, de maneira que será aplicada sobre a receita bruta da produção, deduzidos os royalties, os investimentos na exploração, os custos operacionais, a depreciação e os tributos previstos na legislação em vigor. Nesse sentido, a compensação financeira da indústria do petróleo para o meio ambiente, estabelecida pela Lei 9.478, de 06 de agosto de 1997, que criou a Agência Nacional Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), corresponde à contribuição das empresas que detêm a concessão de exploração de petróleo ao MMA, no valor de 10% (dez por cento) decorrente do grande volume de produção ou de grande rentabilidade da empresa exploradora (concessionária) de petróleo e gás natural. O recolhimento da participação especial à Secretaria

do Tesouro Nacional foi regulamentado pelo Decreto 2705/98, e sua utilização é destinada ao desenvolvimento de estudos e projetos relacionados com a preservação do meio ambiente e recuperação de danos ambientais causados pelas atividades da indústria do petróleo, desenvolvidos com o apoio técnico da ANP2. A lei de criação da ANP assegura ao MMA condições para a promoção do desenvolvimento de ações, projetos e programas voltados para a preservação e conservação do meio ambiente e, dessa forma, os investidores ou concessionários compensam o Estado brasileiro pelos danos gerados. O princípio do poluidor/usuário pagador compreende a atribuição ou imputação, aos agentes poluidores da responsabilidade de integração do valor das medidas de proteção ambiental nos seus custos de produção (Oliveira, 1999). A arrecadação da compensação financeira pela ANP atinge um montante financeiro de cerca de R$ 3.500.000,00 (três bilhões e quinhentos milhões de reais), no período de 1999 a 2007. Cabe destacar o comportamento exponencial de crescimento anual dos recursos financeiros, conforme pode ser verificado pelo crescimento acumulado de 558% no período de 2000 a 2006 no gráfico a seguir.

Gráfico 1: distribuição das fontes 142, 100 e 148 / Orçamento – MMA

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30 Fonte: ANP (2007)

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Art.45 e 50 da Lei nº 9478/97.

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§ 3º da Lei 9478/97.


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O mecanismo técnico de elevação do nível da dotação orçamentária para cobertura dos recursos realiza alocações elevadas à reserva de contingência no patamar de 87%, em 2004; 82%, em 2005; 89%, em 2006; e 99%, em 2007 e 2008

Somente no exercício de 2003 os recursos repassados ao MMA correspondem a cerca de um terço da dotação total autorizada no orçamento e a 57% do montante total de despesas executadas pelo ministério (TCU, 2007). Assim, a significativa dependência dos recursos advindos de compensações financeiras da exploração do petróleo e gás natural pelo MMA, que representava 31% em 2004, alcançou 37% em 2006. Projeta-se o mesmo nível de dotação orçamentária para 2008, conforme pode ser visto demonstrado no gráfico a seguir.

Gráfico 2: Fluxo da compensação financeira destinada ao MMA

Fonte: Planejamento (2007)

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A governança na administração pública pode ser relacionada às questões de gestão das políticas governamentais, ao exercício de poder e ao controle na sua aplicação, sob o foco da dimensão operacional, todavia, outros aspectos têm sido incorporados, assim como a articulação de atores sociais e arranjos institucionais (FONTES, 2003). E, nesse sentido, os fundamentos normativos da governança pública se estabelecem por um novo entendimento do Estado como agente de governança; que no conceito de governança pública justifica uma política de amplitude de atribuições, onde as instituições públicas não têm mais a obrigação de oferecer em termos exclusivos todos os serviços públicos, transformando-se em um Estado cooperativo ao produzir o bem público em conjunto com outros atores (KISSLER et al, 2006). Assim, o MMA desenvolve suas atribuições por meio do Plano Plurianual (PPA), um arranjo normativo para suporte às ações e projetos. A pequena utilização dos recursos da compensação financeira, no período de 2000 a 2003, pode ser verificada pela dotação orçamentária correspondente a 55% do montante total arrecadado em 2003; a qual elevou-se para o patamar de 96%, em 2004; 109%, em 2005; e 86%, em 2006. Todavia, conclui-se que o mecanismo técnico de elevação do nível da dotação orçamentária para cobertura dos recursos realiza alocações elevadas à reserva de contingência no patamar de 87%, em 2004; 82%, em 2005; 89%, em 2006; e 99%, em 2007 e 2008.

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III – Governança da compensação financeira pelo MMA e determinações de controle externo

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De modo paralelo, a política de gestão orçamentário-financeira no MMA também apresentou significativo decréscimo no uso de recursos provenientes de operações de crédito externo, representando uma redução de endividamento de aproximadamente 83%; mas, por outro lado, ressalta-se que os recursos ordinários apresentavam porcentual reduzido frente ao porcentual da participação especial, todavia, projeta-se alcançar índice próximo a 2003 e 2004 no exercício de 2008. 3.1 Controle externo sobre os recursos originários de participação especial em 2003 A Constituição Federal de 1988 conferiu ao Tribunal de Contas da União (TCU), o papel de auxiliar o Congresso Nacional no exercício do controle externo, em especial, exercendo as competências constitucionais privativas de julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos; fiscalizar a aplicação de recursos da União repassados a Estados, ao Distrito Federal e aos municípios; aplicar sanções e determinar a correção de ilegalidades e irregularidades em atos e contratos. Em 2003, o TCU fundamentou decisão, Acórdão nº 787/2003, acerca da aplicação dos recursos originários

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A política de gestão orçamentário-financeira no MMA também apresentou significativo decréscimo no uso de recursos provenientes de operações de crédito externo, representando uma redução de endividamento de aproximadamente 83%

de participação especial na exploração do petróleo, a cargo do Ministério do Meio Ambiente, em decorrência do disposto no art. 50, § 2º, inciso II, da Lei 9.478/1997, auditando o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Agência Nacional do Petróleo (ANP). As ações de controle externo revelaram que o Ibama não teve estrutura para emissão de licenças ambientais para licitação dos blocos de exploração de petróleo e, em função do desaparelhamento do órgão ambiental federal, a ANP contratou consultores para emissão de pareceres sobre os pedidos de licença ambiental, que foram colocados à disposição do Ibama, em que pese a tarefa ser de competência daquela autarquia federal (TCU, 2003). O controle externo determinou que a ANP e o Ibama adotassem mecanismos de cooperação robustos e sistemáticos, inclusive com os órgãos seccionais (estaduais) e locais (municipais), a fim de integrar as ações de implementação da política energética nacional à ambiental, haja vista que os recursos repassados ao MMA estão vinculados a objeto determinado e que as reservas relativas deveriam ser utilizadas somente no objeto vinculado, determinado pela legislação (TCU, 2003). A solução para o problema estrutural identificado, a critério do controle externo, passa pela utilização dos recursos vinculados a fins específicos da lei do petróleo. 3.2 Controle externo sobre os recursos originários de participação especial em 2005 Em 2005, o TCU emitiu Acórdão nº 1665 acerca dos recursos originários de participação especial na exploração do petróleo, a cargo do MMA, em virtude da nãoutilização em programas específicos relativos à indústria petrolífera e da utilização de dotação orçamentária em programas não-exclusivos aos relacionados à indústria do petróleo, determinando o Ministério do Meio Ambiente e o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), o cumprimento da legislação. Ocorreu dotação orçamentária à conta de diversos programas não relacionados à indústria do petróleo, isto é, com o uso indevido dos recursos em programas não afins, ao invés de aplicação no programa diretamente relacionado à indústria do petróleo, Programa de Qua-


Relatório de Auditoria do TCU, TC-004.151/2004-6.

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As emissões de gases de efeito estufa são associadas ao consumo de combustíveis fósseis, sendo limitadas a um conjunto relativamente restrito de poluentes locais, que afetavam diretamente a saúde humana, e dióxido de enxofre, partindo para um conjunto maior de gases

IV – Arranjo institucional e efeitos da compensação financeira da indústria do petróleo no MMA

As emissões de gases de efeito estufa são associadas ao consumo de combustíveis fósseis, sendo limitadas a um conjunto relativamente restrito de poluentes locais que afetavam diretamente a saúde humana, e dióxido de enxofre, partindo para um conjunto maior de gases (ONIP, 2000). Segundo Bárbara Vons (2003), os países em desenvolvimento são especialmente vulneráveis às mudanças climáticas e apresentam menos capacidade de mitigar os danos gerados. 4.1 Arquitetura institucional de suporte à compensação financeira da indústria do petróleo Uma empresa ou instituição tem um modelo de gestão compreendido pelos princípios de administra-

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lidade Ambiental, na ação orçamentária “Fomento a Projetos de Preservação Ambiental e a Recuperação de Danos Ambientais Causados pela Indústria do petróleo”. Registra-se que a utilização da compensação financeira na referida ação foi ZERO3. A avaliação de controle externo realizada pelo TCU estabeleceu algumas causas e efeitos das evidências detectadas em auditoria da situação de execução dos recursos originários da participação especial, de modo que a ausência de mão-de-obra é obstáculo para que se possa ter uma garantia de aplicação de um montante, cujo objetivo é permitir o desenvolvimento sustentável da indústria petrolífera, e as dificuldades enfrentadas pelo Ibama, tais como carência de pessoal e baixa qualidade dos documentos técnicos apresentados pelos postulantes às licenças, implicando em prejuízo das atividades que subsidiem o trabalho da ANP (TCU, 2005). Ressalta-se que o controle externo identificou desconhecimento, por parte dos setores técnicos envolvidos, da existência dos recursos da participação especial e da vinculação deles aos programas relacionados com a ­indústria do petróleo (TCU, 2005). O TCU explicita que a legislação não foi cumprida devido a não-promoção do desenvolvimento da estrutura da área ambiental. Os recursos destinados às atividades de prevenção de acidentes e desenvolvimento sustentável da indústria do petróleo foram utilizados em outros fins, diversos dos determinados pelos legisladores. Conseqüentemente, verifica-se a dificuldade de englobar todos os aspectos ambientais da produção petrolífera (TCU, 2005). Dessa forma, o controle externo determinou ao MMA (unidades gestoras: Secretaria de Qualidade Ambiental nos Assentamentos Humanos (SQA) e Ibama) que seja desenvolvida parceria junto à ANP para elaboração de estudos e projetos relacionados com a preservação do meio ambiente e recuperação de danos ambientais causados pela atividade da indústria do petróleo. E, ainda, determinou que apliquem os recursos decorrentes da participação especial prevista na Lei nº 9.478/1997, art. 50, § 2º, II, exclusivamente em programas, ações e projetos específicos.

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Em 2004, houve o início do PPA 20042007 sem a presença concreta de ações orçamentárias direcionadas aos danos causados pela indústria do petróleo e gestão específica dos recursos arrecadados pela compensação financeira

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ção que influenciam o processo decisório, a estrutura organizacional e o sistema de informações. Após a definição desses princípios, a empresa passa a delinear sua estrutura organizacional coerentemente com seu processo de decisão (CHENG et al, 1989). Nesse sentido, delimita-se o universo institucional do Ministério do Meio Ambiente a partir do Decreto Nº 6.101, de 26 de abril de 2007, que aprova sua estrutura regimental, definindo suas competências de estabelecimento de políticas, proposição de estratégias, meca-

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nismos e instrumentos, em caráter geral, e definições de atribuições de órgão, em especial, ao órgão específico singular, que é a Secretaria de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental (SQA), de modo a constituir o marco legal que define instrumentos, instâncias e papéis que compõem o MMA, relativamente aos recursos da participação especial. No sentido de definir o escopo de institucionalização e arquitetura de execução dos recursos da Compensação Financeira, foi atribuída competência, diretamente à SQA, de desenvolver estudos e projetos relacionados com a preservação do meio ambiente e recuperação de danos ambientais causados pelas ati-

vidades da indústria do petróleo, conforme disposto no inciso X, art.14, do Dec 6.101, de 2007; estabelecendo competência ao Departamento de Qualidade Ambiental na Indústria, a execução direta da participação especial em ação específica, de acordo com o inc. II, art.17, Dec. 6.101/2007. Com isso, o Poder Executivo determinou o locus de gestão dos recursos da participação especial. A Política Nacional de Meio Ambiente, instituída pela Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, prevê instrumentos relacionados à indústria do petróleo, desde os padrões de qualidade ambiental aos instrumentos econômicos. Em relação ao enfoque programático de gestão e da estrutura organizacional, a SQA executou os recursos sob a forma de estudos voltados à preservação ambiental e à recuperação de danos causados pela indústria do petróleo; e após passou a constituir ação identificada por “Fomento a Projetos” (MPOG, 2007). Os recursos da participação especial foram executados por meio do Programa de Qualidade Ambiental (PQA) até o período de 2003; no entanto, em 2004, houve o início do PPA 2004-2007 sem a presença concreta de ações orçamentárias direcionadas aos danos causados pela indústria do petróleo e gestão específica dos recursos arrecadados pela compensação financeira; e em 2005, retomou-se o PQA, mas com especificação Procontrole e com objetivo de redução dos impactos de atividades potencialmente poluidoras ou degradadoras do meio ambiente, ainda sem a presença concreta de ações orçamentárias direcionadas aos danos causados pela indústria do petróleo, específicas na gestão dos recursos arrecadados pela compensação financeira; e o Programa de Mudanças Climáticas e Meio Ambiente concentrou suas ações na redução da emissão de gases responsáveis pelo efeito estufa e pela destruição da camada de ozônio (MPOG, 2007). Em 2006, o PQA caminha em retorno à concepção inicial do programa encerrado em 2003, mantendo-se ainda sem a titulação de ação orçamentária específica direcionada aos danos causados pela indústria do petróleo, mas definiu atividades consoantes aos impactos ambientais do petróleo. No exercício de 2007, o PQA novamente modifica sua ação orçamentária específica para a forma de “preservação e recuperação


4.2 Efeitos da compensação financeira sobre o desenvolvimento de estudos e projetos de preservação do meio ambiente e recuperação de danos ambientais A avaliação da eficácia da compensação financeira como instrumento de preservação do meio ambiente e recuperação de danos ambientais, é realizada na ação orçamentária “Fomento a Projetos de Preservação Ambiental e a Recuperação de Danos Causados pela Indústria do petróleo” – 2271 – sob competência do Programa Qualidade Ambiental – 0501 – do MMA, objeto deste estudo, e foi definida com base na destinação dos recursos financeiros, que são destinados de modo integral à respectiva ação orçamentária. Em 2000, houve a execução de cerca de 13% dos recursos autorizados, no valor de R$ 8.206.772,00, do ponto de vista quantitativo; todavia, do ponto de vista qualitativo, não houve controle de produto ou meta realizada, apesar da assinatura de um Termo de Cooperação para a Agenda Ambiental entre o Ministério do Meio Ambiente e a Agência Nacional do Petróleo, visando ao desenvol-

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Em 2000, houve a execução de cerca de 13% dos recursos autorizados, no valor de R$ 8.206.772,00, do ponto de vista quantitativo, todavia, do ponto de vista qualitativo; não houve controle de produto ou meta realizada, apesar da assinatura de um Termo de Cooperação para a Agenda Ambiental entre o Ministério do Meio Ambiente e a Agência Nacional do Petróleo

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de danos ambientais causados pela indústria do petróleo”, mantendo-se as mesmas atividades estabelecidas em 2006. Em projeção para o exercício de 2008, o PQA mantém a ação orçamentária específica relativa à indústria do petróleo do exercício anterior, realizando novas modificações e estendendo sua amplitude de ação em sentido às mudanças climáticas, após extinguir ações relacionadas ao clima nos exercícios de 2006 e 2007. Destaca-se a evidente e significativa inconstância de produtos na referida ação orçamentária e também a extinção da ação da indústria do petróleo durante os anos de 2004 e 2005, que retornou de forma incompleta em 2006, para no exercício de 2007 retornar à forma anterior de 2003. No entanto, para o exercício de 2008 estão propostas novas modificações, tanto na titulação quanto em seu produto esperado. Essas considerações permitem compreender que a estrutura constitui item essencial de um arranjo mais abrangente, que é o modelo de gestão e, portanto, qualquer tentativa de otimização organizacional impõe não apenas o redesenho da estrutura, mas também mudanças em outros elementos do modelo de gestão(MARTINS et al, 2006), a fim de corroborar com a necessidade de institucionalização dos recursos e determinações de controle externo, relativas à urgência no desenvolvimento da estrutura dos órgãos responsáveis pelo meio ambiente, para que haja a sustentabilidade na evolução da indústria do petróleo. A arquitetura institucional de apoio ao uso da participação especial no MMA é fundamental para o êxito nas ações de interesse ambiental, logo suas condições de institucionalização, desenho organizacional e sua inter-relação com os demais atores do processo de destinação financeira são cruciais para o alcance da política ambiental definida pela lei do petróleo, haja vista que a contribuição “participação especial”, em caráter de “compensação financeira”, é decorrente da Lei 9.478/97, a qual estabelece a proteção do meio ambiente e conservação de energia como balizamento da política nacional para o aproveitamento racional das fontes de energia e concebe a participação especial como meio para cumprimento das bases e metas da política estabelecida pelo legislador.

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vimento conjunto de programas e projetos definidos em 16 linhas temáticas do segmento de exploração, produção, processamento, refino e transporte do petróleo (MPOG, 2007). No período de 2001, informa-se que a referida ação orçamentária desenvolveu e disponibilizou alternativas tecnológicas viáveis à fiscalização, ações emergenciais, planos para adequação e recuperação de áreas degradadas pela indústria de petróleo (MPOG, 2007). Nesse exercício foram executados 97% dos recursos autorizados, no valor de R$ 11.630.043,00, para o alcance de 26 projetos realizados, realizando-se 100% do produto programado. No período de 2002, a ação orçamentária apresentou execução financeira de 20%, no valor de R$ 13.950.000; todavia, não houve produção de resultados específicos para a referida ação e nem ao menos houve registro de produto ou meta realizada por meio dos recursos da compensação financeira. Em 2003, o TCU afirma ser zero a utilização de recursos na ação específica da indústria do petróleo. No período de 2004, houve o início do Plano Plurianual (PPA) 2004-2007 com uma nova propositura de

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No período de 2002, a ação orçamentária apresentou execução financeira de 20%, no valor de R$ 13.950.000; todavia, não houve produção de resultados específicos para a referida ação e nem ao menos houve registro de produto ou meta realizada por meio dos recursos da compensação financeira

ações para o MMA, não contemplando de forma direta os recursos arrecadados pela compensação financeira, pois não foi estruturada ação orçamentária específica para uso dos recursos providos da participação especial. Em 2005, retoma-se o Programa de Qualidade Ambiental, mas com especificação Procontrole, visando reduzir os impactos de atividades potencialmente poluidoras ou degradadoras do meio ambiente, e existência do Programa de Mudanças Climáticas e Meio Ambiente; e novamente não houve geração de resultados diretos para a indústria do petróleo. Em 2006, o PQA caminha em retorno à concepção inicial do programa encerrado em 2003, retomando-se o desenho inicial em 2007 (MPOG, 2007). Do ponto de vista programático, no exercício de 2008, o PQA mantém a ação orçamentária específica relativa à indústria do petróleo do exercício anterior, todavia, realiza nova alteração de titulação, passando a ser denominada “Prevenção e combate a danos ambientais causados pela indústria do petróleo”, e além da recente modificação, em 2006, do produto “Projeto Realizado” para “Diretriz Padronizada”, há previsão de modificação para “Plano Elaborado”. Nesse exercício, inclui-se ainda a extensão do PQA em sentido às mudanças climáticas, após extinguir ações relacionadas a esta problemática nos exercícios de 2006 e 2007 (MPOG, 2007). V – Considerações finais A Lei 9.478, de 06 de agosto de 1997, estabeleceu a criação da ANP e assegurou ao MMA condições para a promoção do desenvolvimento de ações, projetos e programas voltados para a preservação e conservação do meio ambiente, haja vista os impactos ambientais e riscos potenciais relacionados às atividades de exploração e produção da indústria do petróleo, ou seja, os investidores ou concessionários do setor petrolífero compensam o Estado brasileiro pelos danos gerados. Segundo o Tribunal de Contas da União, “poder-se-ia até criar hipoteticamente um MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE DO PETRÓLEO com os recursos repassados”(TCU,2005), pois a arrecadação da compensação financeira pela ANP atinge um montante financeiro de cerca de R$ 3.500.000,00 (três bilhões e quinhentos milhões de reais) no período de 2000 a 2007.


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A maior preocupação não deve ser relacionada à garantia de fomento ou fundos aos projetos ou a programas voltados à indústria do petróleo, mas à necessária definição da estrutura organizacional, por meio de uma arquitetura institucional com base em uma cultura institucional sólida e desenho de programas próprios

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ceira é apoiada pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que estabelece que os recursos legalmente vinculados à finalidade específica serão utilizados exclusivamente para atender ao objeto de sua vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que ocorrer o ingresso. A participação especial é uma fonte de recursos já estabelecida, segura e concreta para a criação e suporte de um Programa de Mudanças Climáticas no Ministério do Meio Ambiente (MMA), com competência para estabelecer prioridades e metas para o financiamento de projetos, identificar e selecionar projetos, apoiar a organização de um sistema para execução dos projetos e a avaliação das metas, visando fornecer, ao MMA e à ANP, condições necessárias ao cumprimento de suas missões. Uma arquitetura institucional bem desenvolvida e integrada para suporte à indústria do petróleo proporciona melhores condições de atração de investimentos exploratórios e nas demais etapas da cadeia produtiva do petróleo, haja vista os anseios dos investidores por órgãos de meio ambiente preparados e com estrutura suficiente para assegurar os investimentos e o ritmo

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O modus operandi da arquitetura institucional estabelecida e o nível de institucionalização da gestão da compensação financeira no MMA são variáveis cruciais para o êxito da política ambiental definida pela lei do petróleo. Desse modo, o modelo de governança não apresentou continuidade no desenho organizacional do PQA ou arranjo institucional responsável pelos recursos da participação especial, evidenciando a não institucionalização da gestão, haja vista que nos últimos quatro anos ocorreram três modificações de produtos, de forma a não permitir planejamento e controle das ações ou atividades e influenciar negativamente no resultado ambiental e sucesso da política ambiental no suporte às atividades da indústria do petróleo. Os efeitos da compensação sobre o desenvolvimento de estudos e projetos relacionados com a preservação não contribuíram de forma efetiva no interesse ambiental, tendo em vista a não significativa aplicação ou utilização dos recursos arrecadados da participação especial; ao não controle de produtos e metas realizadas; e ao desvio de finalidade na aplicação dos recursos, a exemplo de gastos administrativos em planos de saúde e auxílio-alimentação, de modo a não gerar resultados diretos para a indústria do petróleo. É evidente que houve um processo de pulverização da participação especial com uso indevido em programas não afins ao invés de aplicação no programa diretamente relacionado à indústria do petróleo, a exemplo do ano de 2005, no qual a compensação financeira foi 63% dos recursos executados no MMA (MMA, 2007). A maior preocupação não deve ser relacionada à garantia de fomento ou fundos aos projetos ou programas voltados à indústria do petróleo, mas à necessária definição da estrutura organizacional, por meio de uma arquitetura institucional com base em uma cultura institucional sólida e desenho de programas próprios, pois apenas ocorre ação governamental com fins arrecadatórios, acumulando-se em cerca de mais de três bilhões de reais o saldo financeiro no Tesouro Nacional do país, e desvinculação concreta do uso devido da participação especial em âmbito federal. Com base nisso, sugere-se a adoção de mecanismos de controle social e sua institucionalização na gestão dos recursos da compensação financeira. A obrigatoriedade do uso da compensação finan-

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A lei do petróleo possibilitou ao país condições efetivas de competição por investimentos nas ofertas de blocos exploratórios, na exploração e nos investimentos das concessionárias privadas e públicas, mediante a modelagem de operações que agregam a variável ambiental ao seu desenho

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de crescimento do setor. Ressalta-se que a teoria institucional considera que os atores agem segundo padrões socialmente construídos e compartilhados (FONTES, 2003). Há, pois, evidente necessidade de estabelecimento de uma lógica de coordenação compartilhada do Programa de Mudanças Climáticas no Meio Ambiente, com a participação do MMA e da ANP, a fim de maximizar o potencial de oportunidades, assegurando o aproveitamento sistêmico do arranjo institucional. As participações governamentais médias arreca-

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dadas no mundo são de 64%, de modo que a maioria tem situado entre 40% a 85% (KHELIL, 1995). No caso brasileiro, o ensaio de Gandra (2006) avalia que o tributo de maior peso em um campo de produção é a participação especial, representando 20,6% da receita total e 48,5% do Government Take. A lei do petróleo possibilitou ao país condições efetivas de competição por investimentos nas ofertas de blocos exploratórios, na exploração e nos investimentos das concessionárias privadas e públicas, mediante

a modelagem de operações que agregam a variável ambiental ao seu desenho, isto é, o alcance de um maior grau de competitividade em comparação aos demais países produtores de petróleo. A atratividade do investimento pode ser decorrente de uma contrapartida em melhoria da imagem da empresa quanto às mudanças climáticas e sua sustentabilidade ambiental frente às comunidades locais, em consonância com a perspectiva da globalização. O sucesso da efetividade das ações e programa relacionados à indústria do petróleo depende do desenvolvimento do arranjo institucional para a compensação financeira. Faz-se necessário o estabelecimento de modelo de coordenação e, para tanto, a coordenação compartilhada do Programa de Mudanças Climáticas no MMA pode ser operacionalizada mediante o relacionamento interinstitucional sistêmico e integrado, entre os órgãos, a fim de atender à Decisão TCU nº 1665/2005, de 19 de outubro de 2005, que determina o desenvolvimento de parceria entre a ANP e o MMA para elaboração de estudos e projetos relacionados à preservação do meio ambiente e recuperação de danos ambientais causados pela atividade da indústria do petróleo. Nesse sentido, a gestão compartilhada da participação especial, no suporte ao Programa de Mudanças Climáticas no MMA, pode ser implementada conforme o disposto na Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, da Política Nacional de Meio Ambiente, que autoriza o Poder Executivo a criar uma fundação de apoio técnico e científico às atividades do Ibama, de maneira a atender as atividades que não estão sendo realizadas a favor do crescimento e suporte ao nível atual de exploração e produção do setor petrolífero, tais como a elaboração de estudos ambientais aplicáveis à indústria do petróleo; a consolidação e geração de dados ambientais; a recuperação de ecossistemas eventualmente afetados pela exploração, produção e transporte de hidrocarbonetos; e o mapeamento de áreas ambientais. Referências AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO, GÁS NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS (Brasil). Site institucional. Disponível em: <http://www.anp.gov.br>. Acesso em: 08.nov. 2007.


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Eduardo Toledo Neto Especialista em Regulação do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis da Agência Nacional do Petróleo (ANP)

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Artigo Visão prospectiva da agenda políticoeconômica do Brasil em 2008 José Matias-Pereira

Introdução

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Observa-se que a economia brasileira, desde 2004, vem se beneficiando de um ciclo virtuoso de crescimento mundial, com inflação e taxas de juros baixas. Esse ciclo, alimentado por um forte aumento da demanda dos países asiáticos, contribuiu para a elevação do preço de commodities como, por exemplo, os produtos minérios, metais e agrícolas, entre outros. Esse cenário que foi muito benéfico para a economia brasileira, além de contribuir para a elevação da consistência dos fundamentos econômicos do país, abriu inúmeras e diversificadas oportunidades para que o país tenha um crescimento mais sólido e sustentável nos próximos anos. O crescimento de 5,2% do Produto Interno Bruto do Brasil em 2007 (IBGE, 2008) – dados preliminares – foi sustentado por aumentos sucessivos no consumo, produção, nos investimentos e na renda, e na queda do desemprego. Os indicadores econômicos do Brasil revelam que em dezembro de 2007 (IBGE, Ipea e BCB, 2008) o país alcançou a menor taxa de desemprego desde 2002 (quando a série histórica do IBGE foi iniciada) e os trabalhadores estão tendo aumento de renda e o volume de crédito está aumentando. Esse novo contexto vem permitindo que milhões de pessoas migrem das classes D e E para a classe C, o que respalda os estudos que mostram que está havendo uma melhor distribuição de renda no país (IBGE, 2007). O aporte de R$ 1,2 trilhão em investimentos previstos para o período de 2008 a 2011, com destaque para os setores da indústria, infra-estrutura e habitação,

evidencia que o país encontra-se em uma etapa de aceleração dos investimentos (BNDES, 2007). Assim, o crescimento econômico do país na atualidade, entre outros fatores, vem sendo impulsionado pela demanda interna e pelo fluxo de recursos estrangeiros para o país. As questões colocadas para o debate neste artigo, a partir dessas observações, são as seguintes: Esse cenário econômico mundial vai continuar inalterado nos próximos anos? Que medidas e ações políticas e econômicas o governo federal deve adotar para continuar estimulando o desenvolvimento socioeconômico do país? As respostas para essas questões não são fáceis de serem respondidas. Entretanto, apoiado em inúmeros indicadores e estudos recentes sobre o desempenho da economia brasileira, torna-se possível analisar alguns temas que se apresentam como essenciais para o crescimento do país. É sobre estas questões que trataremos a seguir. Avaliação do cenário internacional Na avaliação do cenário internacional no final de 2007, em que pese às manifestações de diversos segmentos que sustentam que existe pouca inquietação na economia mundial, não é possível desconhecer que houve um significativo contágio da economia real americana em decorrência das recentes crises de crédito e do mercado imobiliário. O ambiente de incerteza, portanto, continuará presente em 2008, bem como os problemas de liquidez. A decisão do Banco Central


Perspectivas de crescimento da economia brasileira A possibilidade dos Estados Unidos mergulharem em uma recessão econômica nos próximos anos, conforme assinalada, não pode ser descartada. A dificuldade é mensurar a intensidade dessa recessão. Pesa a favor do Brasil a redução da dependência do país em relação à economia norte-americana, quando comparada com outros países emergentes (como é o caso do México – NAFTA) que destinam cerca de 80% da sua produção para os EUA. Assim, o governo brasileiro deve levar em conside-

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emergentes como, por exemplo, dos denominados BRICs: Brasil, Rússia, Índia e China. No caso dos dois últimos (Índia e China), que possuem grandes contingentes populacionais e pobres, deverão continuar sendo, no longo prazo, grandes demandadores de commodities, especialmente as metálicas (construção de infra-estruturas urbanas) e as agrícolas, na medida em que ocorre a elevação do nível de vida e do consumo de alimentos da população. O desenvolvimento de novas tecnologias no campo dos biocombustíveis também está colaborando para fomentar o crescimento da demanda por alimentos no mercado mundial. Dessa forma, pode-se argumentar que o nível de renda nas regiões agrícolas deverá continuar crescendo mais rapidamente que nas regiões urbanas (IBGE, 2007).

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O desenvolvimento de novas tecnologias no campo dos biocombustíveis também está colaborando para fomentar o crescimento da demanda por alimentos no mercado mundial. Dessa forma, pode-se argumentar que o nível de renda nas regiões agrícolas deverá continuar crescendo mais rapidamente que nas regiões urbanas

ração, na sua política macroeconômica, que a economia dos EUA possui os ingredientes básicos para enfrentar uma recessão em 2008 ou 2009. A gravidade desse cenário está nos ajustes contábeis que os bancos norteamericanos terão que fazer por ocasião do lançamento das perdas com o crédito imobiliário (subprime) em seus balanços, o que irá refletir na restrição ao crédito. A restrição ao crédito - conforme reconhecido no campo das ciências econômicas - é uma variável importante para levar uma economia à recessão. É preciso reconhecer, por sua vez, que o exame e o julgamento da adequação da política monetária norteamericana, diante de sua complexidade, é uma tarefa muito difícil, pois além da análise da taxa de juros, da inflação passada e sua projeção, é necessário que se faça uma profunda avaliação do ritmo de expansão do crédito e dos agregados monetários.

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dos EUA (Federal Reserve) de reduzir no final de 2007 a taxa de juros de forma moderada sinaliza a preocupação das autoridades monetárias norte-americanas em diminuir os riscos para a atividade econômica no médio prazo. Essa decisão evidencia que o Banco Central do EUA passou a atribuir riscos mais balanceados entre inflação e atividade, reduzindo as chances de cortes significativos na taxa de juros em 2008. A decisão do Banco Central daquele país colaborou no processo de desvalorização do dólar contra as demais moedas, inclusive da moeda brasileira. As principais análises prospectivas sobre as mudanças políticas, econômicas e socioambientais no cenário mundial nas próximas décadas, respaldam a crescente importância das economias dos países

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Mudanças nesse cenário exigirão que o governo adote diversas iniciativas que irão refletir tanto no campo político quanto no econômico. Entre essas medidas, podemos citar, por exemplo: a determinação de definir limites para as despesas de custeio e adotar instrumentos modernos de gestão pública; descartar as propostas de novos aumentos de tributação, em que pese o fim da CPMF

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Dívida pública, taxas de juros, programas sociais e salário mínimo

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Os dados da dívida pública total brasileira (soma do endividamento interno e externo) mostram que houve uma evolução de R$ 1,30 trilhão, em outubro de 2007 para R$ 1,33 trilhão, em novembro de 2007 (STN, 2007). A dívida pública interna, em novembro de 2007, era de R$ 1,21 trilhão. Esses dados revelam a necessidade do governo continuar desenvolvendo esforços para diminuir o tamanho da dívida pública interna, com vista a reduzir o pagamento de juros. Percebida como o principal fator inibidor do crescimento econômico nos últimos anos, a redução da taxa de juros continuará sendo o foco da campanha das entidades empresariais ligadas à produção. A preocupação com o social continuará recebendo prioridade em 2008, apesar da não prorrogação, pelo Senado Federal, da CPMF em dezembro de 2007, o que provocou uma perda nas receitas do governo federal de R$ 40 bilhões em 2008. O governo está sinalizando no orçamento da União 1

de 2008, que os incrementos dos programas sociais e os aumentos reais do salário mínimo continuarão, mas com menor intensidade. Estímulo ao crescimento e investimento do poder público Para manter o crescimento do PIB no patamar dos 5% em 2008 e 2009, o governo deverá buscar solução para algumas questões políticas bastante sensíveis. O peso da carga tributária, o elevado “spread” da taxa de juros, a burocracia e os gastos públicos ineficientes são setores que devem receber uma atenção especial do governo federal (veja a tabela nº. 1). A necessidade de recuperação da capacidade de investimento do poder público na atualidade, por exemplo, situado em um patamar muito reduzido (0,7% do PIB), se apresenta como essencial para o crescimento econômico do país. Mudanças nesse cenário exigirão que o governo adote diversas iniciativas que irão refletir tanto no campo político quanto no econômico. Entre essas medidas podemos citar, por exemplo: a determinação de definir limites para as despesas de custeio (veja a tabela nº. 2) e adotar instrumentos modernos de gestão pública; descartar as propostas de novos aumentos de tributação, em que pese o fim da CPMF; submeter ao Congresso Nacional uma reforma tributária que permita a simplificação do sistema, redução do número de tributos e redução de tributos sobre investimentos, incluindo nessa discussão a criação de um imposto único; avançar nos esforços para promover a reforma da Previdência Social, tendo como objetivo a modernização do sistema previdenciário; manter na agenda o interesse do governo em avançar com as reformas política e do Judiciário; combater a corrupção; aprofundar a integração do Mercosul; implantação de mecanismos para elevar a competitividade do país (nova política industrial exportadora); melhoria da infra-estrutura do país, especialmente de energia e estradas (apoiada pelo setor privado); elevação dos investimentos em políticas públicas de educação (inclusive na educação a distância); fortalecimento dos instrumentos de estímulo à ciência e tecnologia e à inovação; manutenção das políticas socioambientais, tendo como referência alcançar os objetivos do Protocolo de Kyoto1.

InterAcademy Council. Relatório Iluminando o caminho: em direção a um futuro de energia sustentável. Bali: ONU, out. 2007.


Os estudos e a literatura existentes revelam que o peso da carga tributária brasileira está associado ao baixo desempenho econômico do país (Matias-Pereira, 2003, 2006)2. A carga de impostos no Brasil, somandose as três esferas de governo, atingiu 34,23% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2006, com um aumento de 0,85% em relação a 2005, quando o PIB alcançou 33,38%3. O tributo que teve a maior variação em 2006 foi a contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento, com aumento de 0,29% em relação ao PIB. O aumento reflete o crescimento do mercado de trabalho e da massa salarial. Os dados disponíveis em dezembro de 2007 indicam que haverá um pequeno aumento da carga tributária de 2007 em relação a 2006 (SRF, 2008). Estabilidade versus crescimento da demanda A principal ameaça à estabilidade econômica é o crescimento da demanda acima da oferta. Com a expansão do crédito e da massa real de renda, o consumo interno vem apresentando uma consistente trajetória ascendente, assim como os investimentos estão aumentando. Caso ocorram sinais de que o país não possui capacidade de atender essa demanda, o Banco Central será obrigado a aumentar as taxas de juros, visando diminuir o ritmo de crescimento da economia. Um fator importante para provocar uma queda substancial nos juros é a redução dos gastos do governo4. A redução significativa dos gastos públicos, entretanto, dificilmente irá ocorrer, por tratar-se de

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dois ou três anos, o que irá continuar permitindo a expansão do crédito no país.

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A carga de impostos no Brasil, somando-se as três esferas de governo, atingiu 34,23% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2006, com um aumento de 0,85% em relação a 2005, quando o PIB alcançou 33,38%. O tributo que teve a maior variação em 2006 foi a contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento, com aumento de 0,29% em relação ao PIB

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Carga tributária no Brasil

um ano eleitoral, onde os resultados das eleições municipais irão influenciar decisivamente nas eleições de 2010, especialmente para a escolha do presidente da República. Se o crescimento do PIB se mantiver em 5% ao ano, o crescimento do consumo no Brasil será bem mais acelerado. Em particular, setores cujas vendas são mais dependentes de crédito como, por exemplo, os setores imobiliário, automobilístico, de eletrodomésticos e de móveis, devem ter um desempenho muito bom em 2008 e 2009. Deve-se ressaltar que as taxas de juros dependem da queda da inflação e do fortalecimento dos fundamentos econômicos brasileiros. Caso isso ocorra, as taxas de juros no Brasil tenderão a convergir para níveis internacionais nos próximos

Matias-Pereira, J. Economia Brasileira. São Paulo: Atlas, 2003; e, Finanças Públicas: A política orçamentária no Brasil, 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

O cálculo da carga tributária tem como referência a nova série do Sistema de Contas Nacionais (IBGE, 2006). O sistema alterou a metodologia de cálculo do PIB (Produto Interno Bruto), que passou a ter como base o ano de 2000 além de ter incorporado novas fontes de dados. 3

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Matias-Pereira, J. Manual de Gestão Pública Contemporânea. São Paulo: Atlas, 2007.

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É preciso ressaltar que a oportunidade política de realização das reformas do Estado brasileiro, que precisam ser feitas por meio de emendas à Constituição Federal, está esgotando-se, visto que no final de 2008, com a realização das eleições municipais, o jogo eleitoral voltará a interferir e a afetar o desempenho da administração pública.

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Apesar dos riscos assinalados, e mesmo diante de um cenário pouco favorável na economia mundial – no qual a possibilidade de uma recessão na economia americana é real –, o Brasil possui as condições adequadas para continuar crescendo a taxas significativas (superiores 5% ao ano)

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O país deve continuar buscando, ainda, atingir o grau de investimento (selo de investimento não-especulativo que amplia as alternativas de investidores e diminui o custo de captação), permitindo que as empresas nacionais tenham acesso ao capital mais barato. Conclusão

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A possibilidade real de uma alteração significativa no cenário internacional causada por uma desaceleração econômica global ou elevação acentuada das taxas de juros mundiais - que se mostram possíveis – nos leva a alertar que a economia brasileira deve preparase para enfrentar dificuldades em 2008, tendo como referência sustentar um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) na ordem de 5% ao ano. Apesar dos riscos assinalados, e mesmo diante de um cenário pouco favorável na economia mundial – no

qual a possibilidade de uma recessão na economia americana é real –, o Brasil possui as condições adequadas para continuar crescendo a taxas significativas (superiores 5% ao ano). São inúmeras as vantagens comparativas do país na atualidade que o coloca em condições de competir de forma adequada no mercado mundial, especialmente na agricultura, associada à indústria e ao comércio exportador (agronegócio). Pode-se argumentar, por fim, que diversos fatores colaboram para respaldar esse cenário otimista em relação às possibilidades de crescimento da economia brasileira nos próximos anos, com destaque para um quadro político estável, gestão da política econômica sem sobressaltos, uma crescente aproximação entre o Estado e a iniciativa privada, um volume significativo de reservas internacionais e a diversificação das exportações brasileiras, em termos de produtos e de países compradores. Dessa forma, a moeda brasileira se manterá estável em relação ao dólar, com tendência de gradual desvalorização, com a inflação sob controle nos próximos anos.

José Matias-Pereira Professor–pesquisador do programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade de Brasília. Brasília, DF


Projeções de longo prazo do RGPS

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Artigo Amir Khair

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Introdução O Regime Geral da Previdência Social (RGPS), segundo alguns analistas, é a bomba-relógio que irá explodir as contas públicas. Dizem eles que quanto mais tarde forem cortados os direitos de seus beneficiários, maior será o problema. E afirmam a suposta necessidade de um pacto entre gerações para assegurar aos jovens de hoje os recursos para suas aposentadorias no futuro. Aqueles que defendem a reforma previdenciária apóiam-se quase que exclusivamente em uma justificativa demográfica. O envelhecimento crescente da população, devido à maior longevidade e à redução da natalidade, impediria futuramente que os que contribuem na fase laborativa consigam arcar com as despesas crescentes de aposentadorias e pensões. Segundo o IBGE, os que têm mais de 65 anos passariam de 5,8% da população, em 2007, para 17,6%, em 2050, e os jovens até 15 anos reduziriam sua participação, nesse período, de 29,2% para 19,1%. Como só olham uma face da questão, prevêem o desastre fiscal. Não avaliam o reverso da medalha que é a redução relativa das despesas do setor público com a menor participação dos mais jovens. Também não perceberam que o determinante principal das despesas previdenciárias não é a participação dos idosos na população, mas sim as taxas anuais de crescimento da população com mais de 60 anos. Essas caem de seu ponto máximo em 2021, de 4,1%, ficando abaixo de 3% a partir de 2030, de 2,5% a partir de 2040 e de 1% a partir de 2060. O RGPS tem seu lado social e fiscal. Quanto ao primeiro é a maior política de Seguridade Social do

país. Quanto ao segundo, que é o objeto deste trabalho, veremos que o sistema é saudável para as gerações atuais e futuras. 1. Limitações das projeções Todas as projeções temporais dependem de premissas e estão submetidas a uma margem de erro tanto maior quanto maior for o período sob análise. No caso da Previdência Social, cujas receitas e despesas dependem de inúmeros fatores em constante mutação, as possibilidades de erro são ainda mais elevadas.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2008 destaca isso.

“Conforme observado, as projeções dependem de uma série de hipóteses acerca da evolução demográfica, estrutura do mercado de trabalho e probabilidades de entrada em benefícios, assim como de suposições sobre as taxas de crescimento da inflação, produtividade, PIB e mesmo acerca do comportamento dos indivíduos em relação à decisão de se aposentar. Parcela das limitações deste estudo reside, justamente, no grau de segurança em relação à definição das hipóteses. Quaisquer modificações em relação ao quadro de hipóteses podem alterar substancialmente os resultados. Além disso, os resultados de curto prazo modificam o ponto de partida das projeções, deslocando as curvas de receita, despesa e déficit. Por isso, é fundamental que haja a atualização anual deste estudo, conforme determina a Lei de Responsabilidade Fiscal, aprimorando-o em relação aos dados observados e aos cenários futuros.”


Mesmo em um curto prazo as previsões podem sofrer alterações significativas. O gráfico abaixo ilustra bem isso ao comparar os resultados do RGPS previstos na LDO de 2007 e na LDO de 2008.

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A LDO 2007 previa, para 2010, um déficit de 2,01% do PIB e a LDO de 2008 reviu essa projeção para 1,44% do PIB. Esse desvio de 0,57 pontos percentuais correspondeu a uma diferença a menor de 28,4%, ou de R$ 17 bilhões em valores de 2007. Em 2025 o déficit seria reduzido de 2,72% do PIB para 1,90% do PIB, com desvio de 30,2%. O Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão (MPOG) enviou, em agosto de 2007, ao Congresso Nacional, o Plano Plurianual (PPA), no qual constam suas projeções para as receitas, despesas e resultados do RGPS para o período 2008 a 2011. Essas projeções alteram mais uma vez para melhor os resultados do RGPS. Nelas, as receitas do RGPS corresponderiam, em 2011, a 6,7% do PIB. No modelo da SPS, em 2011, seriam de 6,0%. Esse diferencial representa um valor a mais de R$ 25 bilhões nas receitas. O quadro abaixo compara essas projeções com as mais recentes da SPS apresentadas ao FNPS. O déficit previsto para 2011 pela SPS é de 1,36%

do PIB, e pelo MPOG, de 1,07%. Em 2011 pioram os resultados, segundo a SPS, e o oposto ocorre para o MPOG. Além disso, as previsões da SPS têm sido sempre piores do que a realidade, evidenciando o conservadorismo do modelo adotado. Para este ano, a previsão era de déficit de R$ 46 bilhões, revisto em julho para R$ 44 bilhões, podendo cair mais.

Diante desses fatos, todas as projeções de resultados para o RGPS devem ser consideradas a partir de uma visão crítica. Diante destes fatos, é necessária uma auditoria sobre o modelo adotado pela SPS, para tornálo mais confiável. 2. Projeções para as despesas da Previdência Social (RGPS) As despesas com o RGPS são proporcionais ao número de beneficiários com mais de 60 anos e ao valor médio dos seus benefícios1. A evolução dessa despesa está, pois, vinculada diretamente à taxa de crescimento dessa população com o tempo. O gráfico, na página seguinte, apresenta essas taxas para a população com mais de 60 anos2, com destaque para os valores dos anos iniciais de cada década. Há um crescimento até 2021, quando atinge 4,1%. Fica abaixo de 3% a partir de 2030, de 2,5% a partir de 2040 e de 1% a partir de 2060. O valor médio dos benefícios depende da evolução dos salários da economia e dos reajustes do Salário Mínimo (SM).

Além das despesas com benefícios existem outras despesas como os auxílios (doença, acidente, reclusão, salário família e salário maternidade) e precatórios. Os benefícios, fora os vinculados ao salário mínimo, são corrigidos sempre pela inflação, conforme determina a Constituição. 1

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Caso fosse considerada uma idade inferior a 60 anos, as taxas de crescimento seriam menores ainda.


O modelo3 de projeções da Secretaria da Previdência Social considera todos os fatores acima apontados (número de aposentados e pensionistas, auxílios, precatórios e reajustes do SM4). Caso os salários médios da economia acompanhassem a inflação, que é o que vem ocorrendo, teríamos as seguintes taxas de crescimento das despesas previdenciárias, conforme os aumentos reais do SM5 a partir de 2011 até 2050.

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O modelo não considera nenhuma eficiência de gestão. Caso ocorresse, reduziria mais ainda as taxas de crescimento das despesas.

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O SM já está definido até 2010, pelo acordo do governo com as centrais sindicais, e cresce com o PIB de dois anos atrás.

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Para aumentos reais do SM de 1% ao ano a partir de 2011, em 2050 ele atingiria, em valores de hoje, R$ 740 e caso o reajuste fosse de 2%, iria para R$ 1.097. Para efeito de comparação, em 2007 o salário médio com carteira assinada para as regiões metropolitanas é estimado em R$ 1.100, com base nos dados realizados até outubro.

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As taxas de crescimento das despesas são declinantes como as relativas à população idosa. Essa é a principal conseqüência da evolução demográfica, que contraria os que prevêem problemas fiscais. O que interessa é avaliar essas despesas em relação à evolução do Produto Interno Bruto (PIB). Caso o PIB cresça acima dessas taxas, essa relação seria decrescente. De 1900 a 1980, o PIB brasileiro cresceu a taxas médias anuais de 5,7%. Na nossa pior fase, que vai de 1980 a 2005, cresceu 2,5%. Supondo que de 2011 a 2050 seja 3% ou 4%, a relação entre a despesa do RGPS e o PIB está nos gráficos a seguir.

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Em todos os cenários as despesas com o RGPS caem a partir de determinado ano, mesmo para crescimentos fortes e longos para o SM. No caso de crescimentos do PIB de 3% ao ano e reajustes reais do SM de 2% ao ano, a despesa em 2050 seria superior à atual, mas convergindo para reduções nos anos seguintes. Assim, o sistema previdenciário do RGPS é fiscalmente saudável devido à evolução demográfica da população idosa, além de cumprir seu papel de maior política de Seguridade Social do país. Se a evolução demográfica parece indicar que é um mito a explosão fiscal causada pela Previdência Social, qual o verdadeiro problema fiscal do país? Para responder a essa questão vamos avaliar o que ocorreu nesses últimos 12 anos. As despesas com a Previdência Social foram, em média, de 5,8% do PIB, com os juros de 8,0%. A Previdência beneficia diretamente 45 milhões de brasileiros e os juros, cerca de 100 mil. Nos últimos 12 meses, até outubro, as despesas com a Previdência Social atingiram R$ 180 bilhões, e com juros, R$ 160 bilhões. Assim, o setor público gastou por beneficiário, em valores atuais, R$ 4,00 com a Previdência Social e R$ 1.600,00 com juros, ou seja, 400 vezes mais. Talvez isso ajude a explicar o mito da suposta explosão da Previdência, escondendo a causa principal do problema fiscal, do freio ao crescimento econômico e da redistribuição de renda às avessas que vêm ocorrendo há mais de uma década no país. Essas conclusões não invalidam que devam ocorrer alguns ajustes na legislação infraconstitucional para melhorar ainda mais os resultados do RGPS. Assim, sugerimos:

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1. Manter todos os direitos adquiridos dos aposentados e pensionistas nas regras de acesso à aposentadoria em termos de idade e tempo de contribuição, sexo e clientela; 2. Desonerar as empresas na contribuição sobre a folha de pagamentos, com redução gradual da alíquota de 20% compensada pela desvinculação entre o teto de contribuição e o de benefício, eliminando a injustificável elevada regressividade, onde o assalariado médio paga 9,0% do seu salário e quem ganha R$ 10.000,00 paga apenas 3,2%. A desvinculação tornaria o sistema propor-

cional (alíquota constante de 11%) para salários superiores a R$ 1.447,15. 3. Não criar nenhum novo tributo que onere as empresas, dada a já elevada carga tributária que suportam e que reduzem seu poder competitivo face às concorrentes de outros países, o que é fator de geração de desemprego. A tributação sobre o faturamento vai contra a política de reforma tributária pretendida, que visa eliminar tributos em cascata. Eventual troca por tributação sobre o valor adicionado irá agravar mais ainda as elevadas alíquotas do novo IVA; 4. Ajustar o fator previdenciário de forma a dar peso maior ao tempo de contribuição do que a idade de solicitação de aposentadoria; 5. Ampliar a fiscalização sobre as empresas rurais, que sonegam metade da receita devida ao INSS, e ajustar sua alíquota de contribuição sobre o faturamento para reduzir o déficit da Assistência Social Rural; 6. Ampliar de 15 para 90 dias o tempo que a empresa deve pagar seu trabalhador afastado por licença médica para receber o auxílio-doença; 7. Reparar algumas injustiças inerentes ao uso do sistema como, por exemplo, o acúmulo injustificado de aposentadorias e pensões e concessões de pensão de pessoas com risco de vida que se casam para beneficiar o cônjuge mais jovem; 8. Divulgar os resultados do RGPS exclusivamente pelo conceito atual, o mesmo valendo para as projeções de longo prazo; 9. Adotar um novo modelo de projeções, para a SPS, que seja integrado e reflita melhor a realidade das receitas e despesas do RGPS.

Amir Khair Mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor


O Corecon-DF contribuindo para divulgar o mercado de capitais Victor José Hohl

Com a estabilidade da economia brasileira, o mercado de capitais já é a principal fonte recursos para financiar, com recursos permanentes, as empresas de capital aberto com ações cotadas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Em 2007, até o mês de julho as empresas captaram, através da emissão primária de ações, R$ 71 bilhões, enquanto o BNDES emprestou somente R$ 31 bilhões no mesmo período. Poucas pessoas conhecem o funcionamento do mercado de capitais e têm medo de investir. No Brasil menos de 2% da população investe em ações direta ou indiretamente; nos USA são mais de 23% da população. O medo de investir se justifica pelo desconhecimento das pessoas. O mercado de capitais passou a se destacar como alternativa de investimento e capitalização das empre-

Estamos preparados para iniciar uma fase de ­crescimento sustentado? Sabemos que para haver crescimento tem de haver investimentos. O Brasil tem-se desenvolvido basicamente com capital de crédito (empréstimos), principalmente empréstimos externos, empréstimos do BNDES, inversões externas diretas e investimentos estatais, oriundos parcialmente do pesado imposto inflacionário até 1994. O ambiente inflacionário não permitiu que o mercado de capitais pudesse e cumprisse seu principal papel, que é o de fornecer recursos para capitalizar as empresas (mercado primário). Após 1994, com a implantação do Plano Real, a questão inflacionária foi amenizada. Removido o principal obstáculo – a inflação –, era de se esperar que o mercado de capitais pudesse, finalmente, consolidar-

sas, principalmente a partir de 2004, quando analistas começaram a vislumbrar que o Brasil poderia alcançar o nível de “grau de investimento”, país livre de risco para investimentos, provavelmente, já a partir de 2008/2009. Como tudo aconteceu? É chegada a hora do mercado de capitais no Brasil. Não pode haver crescimento sustentado sem um forte e eficiente mercado de capitais capaz de alcançar dois objetivos: • Prover financiamento de longo prazo e assegurar a capitalização da empresa privada; e • Realizar a democratização do capital e da ­propriedade.

se e desenvolver-se. Mas não foi o que aconteceu. Nos primeiros oito anos do Plano Real, pudemos constatar que o mercado de capitais ficou estagnado ou até, sob certos aspectos, retrocedeu. Muitas empresas fecharam o seu capital e saíram da bolsa, por não conseguirem realizar o principal objetivo, que consistia em emitir novas ações para se capitalizar. No período considerado, as emissões primárias de ações registradas na CVM (Comissão de Valores Mobiliários) foram insignificantes. Removida a hiperinflação, quais os demais obstáculos que estariam impedindo o desenvolvimento­ do mercado de capitais?

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Obstáculos de natureza institucional, econômica e cultural têm inibido e distorcido o desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro. Entre eles, destacam-se: • Altas taxas de juros; • Distorções do sistema tributário e incentivo à economia informal; • Deficiente proteção ao investidor; • Obstáculos culturais. Decorridos os primeiros oito anos, após a implantação do Plano Real, os obstáculos citados foram parcialmente removidos ou pelo menos amenizados. Relembrando que, no final de 2002, muitos ainda estavam temerosos de que a economia brasileira pudesse trilhar rumos semelhantes aos da vizinha Argentina. A cotação do dólar atingia o pico de R$ 4,00. O risco-Brasil ultrapassava a marca dos 2.400 pontos. A taxa básica de juros foi elevada logo no início do governo do presidente Lula à marca de 26,5%, uma vez que a inflação mostrava sinais de descontrole, situação revertida logo nos primeiros meses da posse do novo governo.

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Ainda em 2006, a economia mundial, com a elevação dos juros americanos, passou a diminuir o ritmo de crescimento. No Brasil, com a queda da inflação, o Bacen pôde iniciar um processo de queda da taxa de juros, e analistas já previam que no final de 2006 a taxa se situasse ao redor de 14%

Inicialmente, a taxa de juros básica Selic refloriu 10 pontos percentuais e estacionou na marca de 16,5%, até o mês de fevereiro de 2004, quando o índice da Bovespa atingiu o seu ponto mais elevado na época, 29.450 pontos, apresentando valorização de 67% de maio/04 a fevereiro/05. No mês de março de 2005, após o aumento da taxa Selic para 19,25%, os preços finalmente começaram a ceder, seguindo-se um período de estabilidade e de queda no preço das ações. Em 2006, o índice Bovespa voltou a subir, atingindo cerca de 42.450 para, posteriormente, refluir, oscilando na faixa entre 33.000 e 37.000 pontos. Ainda em 2006, a economia mundial, com a elevação dos juros americanos, passou a diminuir o ritmo de crescimento. No Brasil, com a queda da inflação, o Bacen pôde iniciar um processo de queda da taxa de juros, e analistas já previam que no final de 2006 a taxa se situasse ao redor de 14%. Contudo a retomada altista somente poderia ser observada se a resistência dos 42.450 pontos do índice­ Bovespa fosse superada. O bom desempenho da balança de pagamentos entre 2003/2007 e a continuidade das expectativas positivas para o ano têm revertido o fluxo de capitais internacionais, o que permitiu recuperar as reservas internacionais e alongar o perfil da dívida externa. O Brasil não necessitava mais da tutela do FMI, tendo devolvido os vultosos empréstimos tomados no passado. Ficou, assim, removido o principal obstáculo, a falta de credibilidade externa, restabelecendo o fluxo de capitais. No período compreendido entre 2002 e 2007, os preços das ações, que se encontravam em patamar muito baixo, retornaram ao seu preço justo, tendo proporcionado àqueles investidores que acreditavam, e anteviram a mudança de cenário, um ganho de 680%, se medido pela variação do índice Bovespa, de seu ponto mínimo de 8.000 pontos, no final de 2002, para o ponto máximo de 59.624, atingido em setembro de 2007, ou seja um ganho médio anual de 50% nesses 5 anos. Com a queda da taxa básica de juros que se verifica no momento, podemos antever: 1. Os bancos, desejosos de manter sua rentabilidade, sairão parcialmente de sua cômoda posição das


Todos esses movimentos financeiros são positivos para a economia, desde que o Bacen tenha habilidade de, com sintonia fina, controlar o processo, para que não se elevem os índices inflacionários. A redução da taxa básica de juros diminui o custo do serviço da dívida. A transferência parcial dos recursos dos bancos monetiza parcialmente a dívida pública interna, reduzindo-a. O maior volume de recursos destinados ao crédito ajuda a aquecer a demanda e, ao mesmo tempo, destina mais recursos às empresas, aumentando a oferta. Se houver equilíbrio nesse processo, não há que se temer a elevação da inflação. A locomotiva do tão esperado crescimento coloca-se em movimento, garantindo a elevação de 4 a 5% do PIB em 2007/8, e a parcela de recursos que fluir para a bolsa ajudará, em um primeiro instante, a elevar as cotações. Em um segundo movimento, haverá estímulos para que as empresas emitam novas ações, capitalizando-se com recursos permanentes (capital fixo), em vez de tomarem crédito não adequado a inversões em máquinas e equipamentos e novas tecnologias. No terceiro momento, fase atualmente observada, novas empresas desejarão captar, agora, abundantes recursos à disposição no mercado de capitais, lançando novas ações e abrindo seu capital. Uma centena de empresas abriu o capital, lançando ações (mercado primário) no período compreendido entre 2005/7. Fo-

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2. Do lado dos aplicadores, desejosos de manter sua rentabilidade ou considerando a baixa, poderão: a) Destinar parte de suas aplicações ao consumo; b) Assumir maiores riscos, visando obter maior rentabilidade, aumentando as inversões nas bolsas de valores, mercados de risco; c) Destinar maiores aplicações para imóveis.

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O maior volume de recursos destinados ao crédito ajuda a aquecer a demanda e, ao mesmo tempo, destina mais recursos às empresas, aumentando a oferta. Se houver equilíbrio nesse processo, não há que se temer a elevação da inflação. A redução da taxa básica de juros diminui o custo do serviço da dívida

ram captados mais de R$ 100 bilhões, elevando a capacidade produtiva das empresas e a oferta de bens e serviços. Os recursos destinados pelos aplicadores para o mercado de imóveis aquecerão o setor, proporcionando maior oferta de trabalho à mão-de-obra de baixa qualificação. Todo o processo, acima descrito, reduzirá o desemprego e, posteriormente, elevará a renda média do trabalhador. As expectativas se confirmaram. Tendo a taxa de juros básica Selic refluído 14,5 pontos percentuais, e parado na marca de 11,25% até o mês de setembro de 2007, muitas pessoas perguntam: O que podemos esperar para o mercado de capitais em 2007/2008? À medida que a queda nas taxas reais de juros, forem percebidas, pelos investidores, há a tendência de mudarem de posição, procurando aplicações mais rentáveis, mesmo que seja com maior risco. A queda da taxa básica de juros Selic iniciou em maio de 2003

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operações de tesouraria, que consiste em aplicar em títulos públicos, ajudando o governo a rolar a mega dívida pública interna de aproximadamente 1,2 trilhões de reais, destinando mais recursos ao crédito, baixando a taxa, para o tomador final e alongando os prazos. É exatamente isso que está acontecendo no momento, já existe, por exemplo, financiamento para aquisição de carro em até 100 meses;

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(26,50% a.a. e taxa real era de 16,86% a.a.). Taxa real = Taxa nominal, descontando-se a inflação. Atualmente a taxa real oscila entre 8% e 9 % ao ano. Mesmo assim, ainda é umas das mais altas do mundo. Atualmente, analisando o comportamento do preço e da rentabilidade das ações da bolsa através do índice Bovespa, que mede o desempenho médio das ações mais negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo, verificamos que no inicio de 2003 o citado índice esteve ao redor de 10.000 pontos, dando início a um longo período de alta, interrompido somente de tempos em tempos, com pequenas quedas conhecidas no jargão do mercado como “realização de lucros”. Os investidores, após alta acentuada, vendem suas ações, realizando seus lucros, tomando fôlego para retomarem as compras após as quedas, trocando muitas vezes de posição. Esse vai-e-vem dos preços das ações é natural no mercado, que alterna ciclos de alta e baixa entre duas linhas batizadas pelos analistas, gráficos ou técnicos, como suporte e resistência. Atualmente, o índice oscila a níveis superiores a 60 mil pontos, significando que alguém que tivesse investido R$ 10 mil no início de 2003 teria hoje R$ 60 mil. Uma valorização de 500%, ou seja, 58% a.a. na média. Quem mais se aproveitou disso foram os investidores estrangeiros e os grandes investidores institucionais, que conseguiram retornos elevadíssimos. Por outro lado, o investidor estrangeiro que tivesse investido, digamos, U$ 100 em 2002, quando o câmbio se situava­ em R$4,00 por 1 dólar, ou seja, R$ 400,00, quando o índice marcava oito mil pontos, e vendido nos dias atuais, agosto de 2007, com índice na marca de 50 mil pontos, com os resultados da venda, recomprado os dólares a R$ 2,00 por 1 dólar, teria agora, fazendo os cálculos, U$ 1.213, ou seja, uma rentabilidade de 1.113 %, aproximadamente 65% a.a., em média. Em agosto de 2007, após o índice ter alcançado seu nível histórico mais elevado, 58.124 pontos, o mercado foi surpreendido com a crise de liquidez do mercado imobiliário americano. A crise, inicialmente avaliada por alguns analistas como circunscrita apenas ao mercado americano, tomou proporções mundiais. Diversos bancos centrais, visando minimizar os efeitos da crise, injetaram bilhões de dólares. O desenrolar da

crise ainda é difícil de ser avaliado. Contudo, devido aos sólidos fundamentos macroeconômicos o Brasil será pouco afetado, é o que se espera. Cabe, ainda, uma observação quanto à expressão “jogar na bolsa”. É comum muitas pessoas confundirem bolsa de valores com cassino. Na verdade, as pessoas investem na bolsa adquirindo ações de empresas como, por exemplo, da Petrobras, Companhia Vale do Rio Doce ou bancos muito rentáveis, tornando-se sócias delas , com direito a participar dos lucros e dos dividendos. Existem cerca de 460 empresas de capital aberto, com cotação em bolsa. A propósito, bolsa é apenas o local (hoje um local virtual) onde os investidores realizam operações de compra e venda de ações no chamado mercado secundário.

Victor José Hohl Professor, economista do Corecon-DF, analista de Mercado de ­Capitais e membro orientador do Instituto Nacional de Investidores (INI)



Não quebre a corrente!

Não quebre a corrente! O Corecon/DF defende os interesses da categoria e trabalha pela valorização dos economistas.

Mas, para que esta luta seja bem-sucedida, é importante a participação de todos. Visite o seu Conselho. Critique. Dê sugestões.

Participe!

A conquista é de todos.

Conselho Regional de Economia da 11ª Região-DF SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 - Brasília -DF Tels: (61) 3225-9242 / 3223-1429 3964-8366 / 3964-8368 Fax: (61) 3964-8364 E-mail: corecondf@corecondf.org.br Site: www.corecondf.org.br


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