Caroline Sampaio Rossetti Thiago Correia dos Santos
O ROCK NACIONAL E SUAS PRINCIPAIS REPRESENTANTES FEMININAS
Osasco 2016
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Caroline Sampaio Rossetti Thiago Correia dos Santos
O ROCK NACIONAL E SUAS PRINCIPAIS REPRESENTANTES FEMININAS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Comunicação do Centro Universitário FIEO - UNIFIEO para obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo. Orientador: Mônica Rugai Bastos Co-orientador: Andreia Cristina Alevato Rodrigues
Osasco 2016
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SUMÁRIO INTRODUÇÃO………………………………………….………....…………….…….4 1.1 Objetivos……………….………………………………...….…………........5 1.1.1 Objetivo Geral……………..…………………………....…………………5 1.1.2 Objetivos Específicos…………….………………………………..............5 1.2 Justificativa.………………………………………………………….............6 1.3 Problematização ………...…………………………………………...............6 1.4 Hipótese…….………………………………………………………..............7 O ROCK NACIONAL E SUAS PRINCIPAIS REPRESENTANTES FEMININAS 1 - O ROCK DO BRASIL……….…………..…………..………………………..........8 2 - RÁDIOS E ROCK AND ROLL……..……………………………..………..........19 3 - AS MULHERES NO ROCK NACIONAL ………...............................................26 3.1 Rita Lee……………………………………………………………………..27 3.2 Baby Consuelo……………………………………………………………...34 3.3 Paula Toller……………………………………………………………........37 3.4 Fernanda Takai………………………………………………………….......42 3.5 Pitty………..……………………………………....….…………..………...46 CONSIDERAÇÕES FINAIS………………………………………………………...66 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS…….………………...……………………....68 APÊNDICES …………….……………………..…………………………………......74 1. Entrevistas……………………………………………………………………...74 1.1 José Norberto Flesch………………………….…….……………………......74 1.2 Edgard Piccoli………………...……………………………….…....……...77 1.3 L uka Salomão…………………………………………………………..........85 1.4 Roger Moreira (Ultraje A Rigor)…………………………………………...86 1.5 Luiza Pereira (Inky)………………...……………………………………....92 1.6 Emmily Barreto (Far From Alaska)………………………………………...97 1.7 Cris Botarelli (Far From Alaska)…………………………………………...99 1.8 Carol Navarro (Supercombo)……………………………………………..102 1.9 Nasi (Ira!)………………………………………………………………....103 1.10 Edgard Scandurra (Ira!)………………………………………………….105 1.11 Álvaro Bufarah Júnior…………………………………………………...107 2. Diário de Campo….…………………………………………………………...118 3. Roteiro - O Rock Delas……………………………………………………......121
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INTRODUÇÃO O referencial teórico a seguir propõe dialogar sobre a trajetória e os desafios das mulheres que se destacaram no rock brasileiro, desde a chegada do gênero ao país no início dos anos 1950. Para isso, este referencial está dividido em três capítulos. O primeiro capítulo abordará o rock desde sua chegada ao Brasil nos anos 1950, quando ainda havia a produção do rock importado, isto é, versões em português de músicas estrangeiras com o foco, sobretudo, em cantoras. Será tratado de quando o rock passou a ter realmente produção brasileira na década de 1960 e quem foram os artistas responsáveis por isso. Décadas de 1970, 1980, 1990 e os anos 2000 também serão apresentados com os principais representantes do rock nacional, letras de músicas marcantes em cada período, e a relação da produção musical às situações pelas quais o país passou. O segundo capítulo tratará da importância de algumas emissoras de rádio que dedicaram e dedicam suas programações para a disseminação do rock nacional, uma vez que este se trata do veículo escolhido para a elaboração do produto final deste referencial. No terceiro e último capítulo serão apontadas, mais especificamente, as mulheres que alcançaram destaque no rock nacional, como Rita Lee, Baby Consuelo, Paula Toller, Fernanda Takai e Pitty. Delas serão abordadas discografia e trajetória artística, pelo fato de cada uma ser band leader e principal representante do rock em seu mais importante momento de carreira. Apontando fatores e ações que essas mulheres tomaram para serem lembradas, reconhecidas e respeitadas no meio artístico, sobretudo, no rock. Tudo isso atrelado à indústria fonográfica de cada época. Após todo trabalho de pesquisa realizado para elaboração deste referencial, será construído um produto final. Este será apresentado no programa de rádio O Rock Delas, englobando as mulheres do rock nacional em uma linha histórica desde os anos 1950 até os dias de hoje. O formato radiofônico foi escolhido por estar diretamente ligado à produção musical, além de ir de encontro com a facilidade que o público tem de acompanhar as ondas do rádio em qualquer lugar, a qualquer hora do dia.
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1.1 Objetivos 1.1.1 Objetivo Geral
Apontar a importância da mulher como compositora, líder e musicista de banda para a continuidade da cena do rock nacional através de programa radiofônico.
1.1.2 Objetivos Específicos
Este referencial teórico tem como norte abordar a história do rock no Brasil desde o seu início no final dos anos 1950, passando pelas décadas seguintes, até os dias atuais. Bandas e artistas importantes deste gênero musical, como Raul Seixas, Legião Urbana e Paralamas do Sucesso serão apontados. E este referencial irá indicar, sobretudo, as mulheres que se destacaram no rock nacional, como Rita Lee, Baby Consuelo, Paula Toller, Fernanda Takai e Pitty. Para elaboração do produto final, entrarão entrevistas de especialistas da área de cultura, como jornalistas e radialistas, além de artistas que veem a força e a influência da mulher na cena do rock nacional. O produto final deste referencial será um programa de rádio Intitulado O Rock Delas, este programa tratará sobre a importância e a trajetória das mulheres do rock nacional, com entrevistas do jornalista José Norberto Flesch, dos radialistas Edgard Piccoli e Luka Salomão, além de artistas de peso para o rock brasileiro como Roger Moreira (Ultraje a Rigor), Edgard Scandurra e Nasi (Ira!), assim como a nova geração formada por bandas como Inky, Far From Alaska e Supercombo. Portanto, será apontado o meio de comunicação, rádio, com o qual será elaborado o produto final, trilhando aqui o histórico das principais rádios rock do Rio de Janeiro e de São Paulo. Colocando em discussão como a indústria fonográfica, com foco no mainstream, enxerga a mulher inserida em um ritmo rotineiramente masculino.
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1.2 Justificativa Será abordada, neste referencial teórico, a trajetória do rock nacional do prisma de suas lideranças femininas. Para isso, será explanada a força do rock nacional, sua importância e evolução desde a década de 1950 até os anos 2000. Além de elencar as mulheres do rock nacional que marcaram períodos importantes da história da música brasileira, como Nora Ney, Celly Campello, Wanderléa, Rita Lee, Paula Toller, Fernanda Takai e Pitty. Será discutida a indústria fonográfica nacional e o preconceito que as mulheres superaram para conseguir um espaço no gênero rock, caracterizado por ter vocalistas e integrantes homens. Tratar da importância da mulher no rock em pleno século XXI está diretamente ligado à discussão da conquista de espaço pelo gênero feminino na sociedade. Do mesmo modo que os cuidados com o lar passaram a ser divididos com as tarefas do mundo do trabalho, os vocais de bandas de rock vem ganhando tons mais delicados e, com isso, vem proporcionando lugar de destaque para mulheres que sabem o peso que suas conquistas deixam para as próximas gerações. O legado da mulher que contesta os padrões sociais e mercadológicos faz com que a cada década tenha, ao menos, uma band leader no mainstream. Feito este, que impulsiona a cena alternativa na criação de novas bandas com mulheres, trazendo à tona e reforçando a sociedade moderna que, cada vez mais, luta pela valorização e empoderamento feminino. A respeito da escolha do veículo rádio como meio de propagação do programa O Rock Delas, deve-se ao fato do rádio estar diretamente entrelaçado à divulgação musical no Brasil. Ainda que, nos dias atuais, são incontáveis as plataformas digitais disponíveis para o consumo de música, o rádio continua a ser a porta de entrada para alcançar o público e o sucesso, de modo mais amplo.
1.3 Problematização
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A problematização deste referencial encontra-se no fato do gênero musical rock no Brasil e no mundo ser um terreno cultural, e historicamente, masculino. Mesmo que exista a ocorrência de mulheres à frente de bandas de rock, elas chegam às grandes mídias, como o rádio, de forma pontual ao longo das décadas.
1.4 Hipótese
Ao longo deste referencial teórico, serão apresentados instrumentos que apontam períodos na história do rock nacional e que qualificam a hipótese de que em cada década, desde os anos 1950, o mercado da música brasileira destaca sempre uma banda de rock com vocal feminino. Tornando essa constatação, ter mulheres como band leader é algo único em cada década do rock nacional.
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O ROCK NACIONAL E SUAS PRINCIPAIS REPRESENTANTES FEMININAS 1. O Rock do Brasil O rock’n’roll desembarcou no Brasil no final dos anos 1950, quando o cinema norte-americano virou febre entre os jovens. The Blackboard Jungle (1955), dirigido e roteirizado por Richard Brooks, conta a história do veterano de guerra Richard Dadier, interpretado por Glenn Ford, que, após ser expulso do exército, passa a lecionar inglês na escola North Manual High, em Nova York (Estados Unidos), onde o preconceito racial, o assédio, e as gangues formadas por jovens delinquentes excedem os limites. Mesmo sofrendo constantes ameaças, Dadier toma a postura de retomar a ordem dentro da sala de aula, já que seus colegas perderam a esperança na juventude. No elenco também estão Vic Morrow, no papel de Artie West, líder da gangue rebelde da escola, além de Anne Francis, como a mulher de Dadier, Anne Dadier; Sidney Poitier, como o aluno negro Gregory Miller; e John Hoyt, como o diretor da escola, sr. Warneke. Com quatro indicações ao Oscar, Melhor Fotografia, Edição de Arte, Edição e Roteiro, The Blackboard Jungle teve sua trilha sonora comandada por Scott Bradley e seu roteiro inspirado no romance homônimo de Evan Hunter, um dos pseudônimos do escritor norte-americano Ed McBain, publicado um ano antes do lançamento do filme. Aqui no Brasil, o longa ganhou o título de Sementes da Violência e atingiu em cheio a euforia juvenil. Cadeiras de cinema foram, literalmente, quebradas país afora por conta do frenesi causado pelo ritmo que figurava na abertura e encerramento do filme, o rock’n’roll. Com sua voz marcante, Bill Haley & His Comets, grupo norte-americano que ficou conhecido por aqui como Billy Haley E Seus Cometas, pontuavam as notas da melodia Rock Around the Clock escrita por Max C. Freedman em parceria com o produtor musical James Mayers. A canção não havia alcançado sucesso até a entrada no longa, tendo vendido apenas 75 mil cópias nos Estados Unidos no ano em que foi lançada, em 1954, muito longe da repercussão dos hits anteriores de Halley.
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Nesse momento, a indústria fonográfica via a necessidade de saciar essa histeria do público jovem que passava a consumir músicas vinculadas ao cinema norte-americano. Foi então, que o rock tomou voz no Brasil com a cantora de samba-canção Nora Ney e sua interpretação da primeira versão brasileira de Rock Around the Clock. [...] Estrangeiro, numa nação de estrangeiros, o rock penou quase três décadas até conseguir, de fato e de direito, cidadania brasileira. Este mulato americano desembarcou aqui através do mesmo veículo que o conduziria ao estrelato em sua terra natal: o filme “The Blackboard Jungle”, dirigido por Richard Brooks em 1955. Sua trilha sonora utiliza uma música que o conjunto Bill Haley and His Comets gravara um ano antes, “Rock around the clock”. No Brasil, a fita foi batizada de “Sementes da violência”, e fez tanto sucesso que, logo, Nora Ney (uma cantora de dor-de-cotovelo!) estava dando sua versão, no original, para a música tema[...] (DAPIEVE, 1995, p.11).
Rock Around the Clock ficou marcada como o primeiro registro do rock produzido aqui no Brasil no dia 24 de outubro de 1955 . Essa data, marcante na história do rock brasileiro, só se concretizou por conta de uma coincidência. Nora, na época, era a única intérprete que detinha uma dicção e facilidade com a língua inglesa, por isso foi chamada pela gravadora Continental para cantar o hit em inglês, como na versão original, mas com o título de Rondas da Hora. Depois de Nora, vários intérpretes fizeram suas próprias versões que não vingaram. Mesmo com o rock ganhando admiradores pelo país e com Rock Around the Clock sendo sucesso absoluto entre os jovens, Nora Ney não prosseguiu carreira no ritmo. Em 1961, pela mesma gravadora que fez o registro de Rock Around the Clock, a Continental, Nora Ney chegou até a gravar a canção Cansei de Rock, samba de Moacir Falcão e Armando Cavalcanti, para marcar definitivamente seu fim de relacionamento com o rock. Eu ligo o rádio e tome rock Vou a boate e tome rock Vejo filme italiano Da Lolo ou da Mandano
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E tome rock e tome rock Compro parte de piano Entro logo pelo cano E tome rock e tome rock É de amargar, não tem mais jeito Eu vou me mandar no peito Lá pra América do rock Talvez um samba de gente bamba O meu amigo cane-cabalar o toque Talvez um samba de gente bamba O meu amigo cane-cabalar o toque Compro parte de piano Entro logo pelo cano E tome rock e tome rock É de amargar, não tem mais jeito Eu vou me mandar no peito Lá pra América do rock Talvez um samba de gente bamba O meu amigo cane-cabalar o toque Talvez um samba de gente bamba O meu amigo cane-cabalar o toque Toque cabalado, toque um samba, toque Toque cabalado, já cansei de rock Teco, telecoteco, teleco... (NEY, Nora. Cansei de Rock, 1961)
Versões de hits que estouraram nos Estados Unidos marcaram o primeiro contato do Brasil com o rock. Celly Campello, cantora do interior de São Paulo, despontou também pelos mesmos caminhos de Nora Ney no final dos anos 1950, nas ondas das versões brasileiras de Banho de Lua (1958) e Estúpido Cupido (1959), as quais concederam a Celly o título de Rainha do Rock pela Revista do Rock (19ª edição) em 1962.
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[...] As gravadoras vinham atrás dos cinemas e das rádios. A Odeon descobriu em Taubaté os irmãos Campello, Sérgio e Célia. Batizou-os artisticamente de Tony e Celly[...] Nasciam ali os primeiros astros do rock brasileiro. Tony emplacou “Boogie do bebê” e “Pertinho do mar”. Celly, “Banho de lua”, “Lacinho cor-de-rosa” e, estouro dos estouros, “Estúpido cupido” [...] (DAPIEVE, 1995, p.13).
Ainda nos anos 1960, quem surgiu por aqui como representante do, até então, novo ritmo aos ouvidos brasileiros foi a Jovem Guarda. Formada por Erasmo Carlos (Tremendão), Roberto Carlos (Rei) e Wanderléa (Ternurinha), surgiu no programa dominical da TV Record, Jovem Guarda, com o ritmo do momento, iê iê iê, impulsionado pelos garotos de Liverpool, The Beatles. Logo no primeiro LP dos três, Jovem Guarda (1965), Quero Que Vá Tudo Pro Inferno foi o grande sucesso na voz de Roberto Carlos. Com sua estreia no domingo, 22 de agosto de 1965, às 16h30, o programa Jovem Guarda d itou o que os jovens deveriam consumir, tanto no estilo musical como no modo de se vestir, afinal, o programa surgiu como criação da indústria cultural, que logo lançou bonecas da Wanderléa, cintos Tremendão e calças Calhambeque . A produção do programa ficou a cargo da agência Magaldi, Maia & Prosperi, e o nome Jovem Guarda foi sugerido pelo publicitário Carlito Maia que o retirou de uma frase do líder revolucionário soviético Vladimir Lênin “O futuro pertence à jovem guarda, porque a velha está ultrapassada”. A ideia inicial era colocar como apresentadores Roberto Carlos, que nesse momento já havia estourado com Splish Splash e É Proibido Fumar, ao lado de Celly Campello, a eterna Rainha do Rock. Porém, Celly já havia deixado os holofotes nesta época para poder se dedicar à vida familiar. O programa chegou ao fim em 1968, após a saída de Roberto Carlos. Dentre as várias versões interpretadas pela Jovem Guarda, destaca-se Pare o Casamento, tradução literal de Stop The Wedding (1963) de Fred Johnson, Leroy Kirkland e Pearl Woods, interpretado pela cantora norte-americana Etta James que, por aqui, ganhou a voz de Wanderléa. Foi só com a chegada de Rita Lee, ainda na década de 1960, que o rock começou a ter uma produção brasileira, por assim dizer. Rita Lee formou com os irmãos Arnaldo e Sérgio Baptista o grupo Os Mutantes, que fez sua primeira apresentação em 15 de
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novembro de 1966 no Pequeno Mundo de Ronnie Von, da TV Record, que competia em questão de público com a Jovem Guarda de Roberto Carlos, mesmo sendo transmitido nas noites de sábado. No ano seguinte, juntamente com Gilberto Gil e Caetano Veloso, Rita Lee encabeçou o movimento Tropicália, que inseria a guitarra elétrica na música brasileira, o que não agradou a muitos ouvidos em um primeiro momento. [...] em 17 de julho de 1967, apenas um mês depois do mítico show de Jimi Hendrix no Festival de Monterey, na Califórnia, em que ele incendiara a guitarra no palco, e do lançamento do clássico psicodélico Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, jovens músicos brasileiros se reuniram no centro de São Paulo para uma passeata contra um inimigo poderoso, a guitarra elétrica. A MPB temia e rechaçava o rock. A esquerda brasileira via a guitarra como símbolo da dominação norte-americana. Fazer rock no Brasil era coisa de maluco ou alienado. (BARCINSKI, 2014, p.41).
Em 1969, ocorreu na pequena cidade de Bethel, nos Estados Unidos, o Woodstock Music & Art Fair. Conhecido também como Festival de Woodstock, o evento reuniu nomes como The Who, Janis Joplin e Jimi Hendrix, e teve como objetivo “afirmar a cultura hippie, celebrar a paz e o amor e protestar contra a Guerra do Vietnã (1959-1975)” (MARIUZZO, 2009). Foi nesse mesmo tom de contestação do Festival de Woodstock de 1969, que nos anos 1970, o rock no Brasil ganhou substância com figuras importantes como Novos Baianos, Made in Brazil, Secos & Molhados e, principalmente, o baiano Raul Seixas. Em parceria com o escritor Paulo Coelho, o chamado “Maluco Beleza” espalhou sua cultura da “Sociedade Alternativa” através de músicas como Maluco Beleza (1977), Sociedade Alternativa (1974) e a contestadora Aluga-se (1980), que foi censurada pela ditadura militar vigente de 1964 a 1985, e em que Raul Seixas entoava sua crítica em relação ao governo brasileiro. Governo este que, por enxergar a “Sociedade Alternativa” como uma ameaça ao país, o exilou nos Estados Unidos junto com Paulo Coelho. [...] A parceria com Paulo Coelho, dois anos mais novo que ele, foi um momento capital não só na vida de Raul, mas na história do pop-rock brasileiro. Entre 1973 e 1976, a dupla lançou quatro discos - Krig-ha, Bandolo!, Gita, Novo Aeon e Há 10 mil anos atrás - que estabeleceram um padrão até hoje inigualado de ecleticismo musical. No caldeirão dos dois valia tudo: rock, iê-iê-iê, xaxado, forró, tango, country, black music,
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funk, brega e sertanejo. Nada era proibido ou esquisito demais [...] (BARCINSKI, 2014, p.63).
Seguindo a linha do Festival de Woodstock, Raul Seixas foi a principal atração do primeiro Hollywood Rock, que ocorreu no Estádio de General Severiano, Rio de Janeiro, em 1975. O festival, organizado pelo jornalista Nelson Motta e patrocinado pela marca de cigarros Hollywood (da empresa Souza Cruz), contou com um line-up inteiro de atrações tupiniquins. Além do “Maluco Beleza”, Rita Lee & Tutti Frutti, Celly e Tony Campello, Erasmo Carlos, Vímana, Os Mutantes, O Peso e a banda Veludo tocaram no festival, que foi registrado no documentário Ritmo Alucinante de Marcelo França, lançado no mesmo ano. Em entrevista à Folha de S. Paulo, Nelson Motta revelou que um policial (um “araponga”, segundo ele) não viu o discurso de Raul Seixas pregando a “Sociedade Alternativa”: O discurso do Raul foi uma loucura. Isso o cara não viu. Se ouvisse o discurso do Raul, ele iria enlouquecer. O Raul levantando 10 mil pessoas, “viva a sociedade alternativa”, uma coisa de louco. “Faz o que tu queres, pode tudo, tá liberado”. Um louco.1
Após anos de luta para fazer com que o rock criasse raízes aqui no Brasil, sua explosão só veio a acontecer na década de 1980. Com a ditadura militar perdendo força, os jovens tinham muitos assuntos entalados, e oprimidos, para extravasar em rede nacional. No coração político do Brasil, Renato Russo fundava em 1978 o Aborto Elétrico, que depois se desmembrou para o Legião Urbana (com Renato) e Capital Inicial (com Flávio e Fê Lemos). A cena do Planalto Central começava a carregar de influências do punk inglês e não mais do blues e do rockabilly americano, como nos anos 1950 e 1960, ou do pop rock inglês, como na década de 1970. Brasília tinha, então, Legião Urbana, Plebe Rude e Capital Inicial, que tinha Heloísa Helena Ustarróz como vocalista antes da entrada de Dinho Ouro Preto na banda. Esse movimento fez espalhar uma maré de rock feito aqui, com preocupações brasileiras, para um público que não queria mais só consumir o que vinha enlatado dos EUA.
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Notícia da Folha de S. Paulo: Policial não viu discurso de Raul Seixas pregando a “sociedade alternativa”. 2000. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fol/cult/ult02062000076.htm> Acesso em: 30 out. 2016.
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O jornalista, compositor, escritor, roteirista e produtor musical Nelson Motta, em entrevista a Edgar Picolli, ressalta que: [...] A MPB, a geração mais velha, dizia que a garotada dos anos 1980 foi criada sob a ditadura, não pôde ouvir nada, não viu determinados filmes, não leu alguns livros e matérias de jornais. Foi criada na alienação. Engano total! Porque essa turma veio com muito mais fúria e informadíssima. Tanto que Cazuza e Renato Russo foram os primeiros a tocar em temas-tabu para a esquerda e para a direita brasileiras: sexo e drogas.[...] (PICOLLI, 2008, p.79).
Em Geração Coca-Cola, um dos maiores hits escritos por Renato Russo, que entrou no CD de estreia do Legião Urbana, de nome homônimo, de 1985, é traçado o perfil do público jovem dos anos 1980 ironizando o senso comum que rotulava essa como a geração perdida. Quando nascemos fomos programados A receber o que vocês Nos empurraram com os enlatados Dos U.S.A., de 9 às 6 Desde pequenos nós comemos lixo Comercial e industrial Mas agora chegou nossa vez Vamos cuspir de volta o lixo em cima de vocês Somos os filhos da revolução Somos burgueses sem religião Somos o futuro da nação Geração Coca-Cola Depois de 20 anos na escola Não é difícil aprender Todas as manhas do seu jogo sujo Não é assim que tem que ser Vamos fazer nosso dever de casa E aí então vocês vão ver
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Suas crianças derrubando reis Fazer comédia no cinema com as suas leis Somos os filhos da revolução Somos burgueses sem religião Somos o futuro da nação Geração Coca-Cola (4x) Depois de 20 anos na escola Não é difícil aprender Todas as manhas do seu jogo sujo Não é assim que tem que ser Vamos fazer nosso dever de casa E aí então vocês vão ver Suas crianças derrubando reis Fazer comédia no cinema com as suas leis Somos os filhos da revolução Somos burgueses sem religião Somos o futuro da nação Geração Coca-cola (4x) (RUSSO, Renato. Geração Coca-Cola, 1985)
Esse período do rock do Brasil também ganhou representantes como Paralamas do Sucesso (1977), Marina Lima (1979), Blitz (1980), Ultraje a Rigor (1980), Camisa de Vênus (1980), Titãs (1981), Ira! (1981), Barão Vermelho (1981), Inocentes (1981), Voluntários da Pátria (1982), Kid Abelha & Os Abóboras Selvagens (1982), RPM (1983), As Mercenárias (1983), Biquini Cavadão (1985), Engenheiros do Hawaii (1985), Violeta de Outono (1985), entre outros. Em 1985, o rock nacional entrou na rota dos grandes festivais com a primeira edição do Rock In Rio, em Jacarepaguá. Entre 11 e 20 de janeiro, nomes como AC/DC e Queen foram colocados ao lado do rock nacional de Cazuza, ainda à frente do Barão Vermelho, e da ingenuidade dos Paralamas do Sucesso que, nas palavras do próprio baterista João Barone no especial Rock In Rio 30 anos (2015) do canal Multishow, só tinham “uns coqueiros no palco ao lado da bateria” que eles tinham pegado da porta do
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camarim, enquanto as bandas internacionais traziam uma estrutura de amplificadores que enchiam o palco que não era nada pequeno, já naquela época. Um milhão trezentos e oitenta mil pessoas: esse foi o número total de espectadores dessa primeira edição do Rock In Rio em um terreno de 250 mil metros quadrados em Jacarepaguá, já na “Cidade do Rock”. Com uma estrutura de luz e som extremamente avançados para a época, o festival marcou o primeiro grande show em que a plateia foi iluminada. Mesmo que o Rock apareça em seu nome, o Rock In Rio sempre foi um festival eclético, destinado a vários públicos. O que o line-up de 1985 não deixa negar. Além dos nomes já citados, participaram do Rock In Rio 1985: Elba Ramalho, Rita Lee, Ney Matogrosso, Erasmo Carlos, Gilberto Gil, Ivan Lins, Lulu Santos, Blitz, Morais Moreira, Alceu Valença, Baby Consuelo e Pepeu Gomes, Eduardo Dusek e Kid Abelha & Os Abóboras Selvagens. Entre as atrações internacionais também figuraram: Rod Stewart, Iron Maiden, Ozzy Osbourne, Whitesnake, Scorpions, Yesb, George Benson, James Taylor, Al Jarreau, The B-52’s, The Go Go’s, Nina Hagen. Após o Rock In Rio em 1985, o Hollywood Rock retornou em 1988 com sua “edição oficial”. Isto porque, apesar do evento ter ocorrido em 1975, foi só a partir de 1988, que a Souza Cruz consolidou a proposta de realizar o festival mais vezes. Nessa “primeira edição”, o Hollywood contou com quatro noites de shows no Sambódromo do Rio de Janeiro e no Estádio do Morumbi em São Paulo. Entre os artistas, dessa vez nomes nacionais, como Ira!, Marina Lima, Titãs, Paralamas do Sucesso, Ultraje a Rigor e Lulu Santos, foram mesclados a artistas internacionais, como Pretenders, Simple Minds, Simply Red, Supertramp, UB 40 e Duran Duran. O Hollywood Rock ainda teve mais seis edições: 1990, 1992, 1993, 1994, 1995 e 1996. Não ocorrendo em 1991, apenas para não bater de frente com o Rock In Rio II, que aconteceu naquele ano. Já os anos 1990 ficaram marcados pela mistura do rap e hip-hop com o rock, nas vozes do Planet Hemp, com Marcelo D2, Gabriel O Pensador e o início de uma cultura skate/rock que só se consolidou em 2000 com o Charlie Brown Jr. Mas teve espaço para bandas mais pop rock como os mineiros do Skank e Pato Fu, os cariocas de O Rappa e dos Los Hermanos.
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A década de 1990 é importante para indústria fonográfica nacional por três acontecimentos: a estreia da MTV Brasil, a popularização do CD e o crescimento de selos independentes. A chegada do canal norte-americano MTV ao Brasil, no início daquela década, foi um fator importante para a divulgação das gravadoras. Antes da MTV, os videoclipes dos artistas estreavam no Fantástico (programa dominical exibido pela Rede Globo de Televisão desde 1973). Com um canal voltado para o mercado da música, as gravadoras passaram a promover seus produtos e artistas, seja com videoclipes, seja com propagandas. O projeto Acústico MTV também marcou a década de 1990, trazendo versões intimistas de nomes que fizeram história no rock nacional, como Barão Vermelho, Legião Urbana, Titãs, Rita Lee, Capital Inicial, Os Paralamas do Sucesso, entre outros fizeram parte do formato. Ao mesmo passo, a entrada do CD no Brasil em 1990 fez com que a produção de músicas aumentasse significativamente. O chamado Compact Disc (CD) comportava um número maior de canções em um único álbum, quase o dobro que o LP. Mais músicas em uma única mídia. Os selos independentes, que já estavam no mercado dos EUA desde a década de 1970, chegaram ao Brasil duas décadas depois não tão independentes assim. O ponto é que selos independentes abrem espaço e lançam artistas de cenas mais regionais, que dificilmente teriam chance de produzir material em grandes gravadoras. O maior “problema” é que, no Brasil, esses selos estavam vinculados a gravadoras. A Banguela Records, por exemplo, era subsidiária da Warner Music Brasil. Fundada pelos Titãs e o produtor Carlos Eduardo Miranda, o selo “independente” lançou bandas como Maskavo Roots e Raimundos, que posteriormente assinou com a Warner. Ainda teve a Chaos, da Sony Music, e a Plug, da BMG. Hoje, um pequeno número de empresas de entretenimento controla uma parte substancial do mercado de bens culturais e, além disso, monopoliza praticamente todas as instâncias de produção, já que esse domínio envolve o percurso que vai desde a feiura dos produtos até os aparelhos que permitem a sua reprodução e consumo. (JANOTTI JUNIOR, 2003, p.2).
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Já nos anos 2000, bandas com o estilo mais punk e emo surgem em um cenário no qual a Internet passa a ser o principal meio de divulgação. MySpace, Orkut, YouTube, Facebook passam a fazer parte do dia-a-dia de bandas, que não precisam mais ir em gravadoras e rádios levar sua demo em fita para fazer com que cheguem ao mercado musical e ao ouvido do público. Entre as bandas que representam este período estão: CPM 22, formada em Barueri, São Paulo, em 1995 foi uma das poucas bandas de hardcore a ganhar espaço no mainstream impulsionando essa nova geração do rock brasileiro, a banda ganhou reconhecimento após ser indicado ao MTV Vídeo Music Brasil - VMB 2000 p elo clipe de Anteontem, d o CD independente A Alguns Quilômetros de Lugar Nenhum, posteriormente, assinaram contrato com a Arsenal Music, s elo da Abril Music, em 2001 e lançaram o CD CPM 22, com as faixas Regina Let’s Go e Tarde de Outubro; Detonautas Roque Clube, formado em 1997, alcançou destaque nacional após lançamento pela Warner Music do CD Detonautas Roque Clube (2002) c om os hits Outro Lugar, Olhos Certos e Quando o Sol se For; Fresno, formada em Porto Alegre em 1999, a banda ganhou reconhecimento ainda na cena independente com músicas de sucesso nas rádios, como Quebre as Correntes e Alguém Que Te Faz Sorrir, e só chegou à uma gravadora em 2008, lançando pela Arsenal Music/Universal Music o disco Redenção; Nx Zero, formado em 2001 em Osasco, São Paulo, assinou com a Arsenal Music/Universal Music em 2005 e estourou em rede nacional com os hits Razões e Emoções, Pela Última Vez com o auxílio do produtor Rick Bonadio, que também foi tutor do CPM 22 e Fresno. É em 2000, em meio à efervescência da cena independente que começa a tomar corpo no mainstream, que o rock começa a adentrar os dias atuais e o surgimento em cena nacional da cantora que leva o seu apelido à sua banda, Pitty.
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2. Rádios e Rock and Roll Toda essa trajetória do rock and roll brasileiro foi disseminada ao público através de determinados veículos de comunicação, como a TV (com a chegada da MTV ao Brasil no início dos anos 1990, que mesmo não sendo uma emissora exclusivamente roqueira, contribuiu na divulgação de bandas nacionais, como Charlie Brown Jr. e O Rappa) e o rádio (que viu a onda rock chegar na década de 1970 com emissoras dedicadas ao ritmo e é o produto final deste referencial). Primeira FM do Rio de Janeiro, a Eldorado FM (Eldo Pop) foi uma delas. Inaugurada em 1971 pelo Sistema Globo de Rádio (SGR), a Eldorado FM era comandada
pelo
disc
jockey/ locutor/programador
musical/coordenador
Nilton
Alvarenga Duarte, o Big Boy, tendo funcionado até 1978. Outra radiodifusora roqueira foi a também carioca Federal AM, que existiu de 1972 até 1974. Essas rádios abriram espaço para as guitarras em sua programação, ainda que tenham durado apenas até o fim dessa década de 1970. Segundo Maria Estrella, “O rock era um estilo marginal no rádio carioca nos anos 1970 e, ao apostar nesse segmento na década seguinte, a Fluminense FM conquistou ouvintes oriundos da Eldo Pop [...] e também da Federal AM.” (ESTRELLA, 2012, p.26). A primeira a dedicar-se totalmente ao rock and roll foi a Rádio Fluminense FM. Inaugurada como Rádio Difusora Fluminense FM, em 1972, para a transmissão de corridas de cavalo, a rádio conhecida como “A Maldita” e localizada em Niterói, no Rio de Janeiro, nasceu do projeto do jornalista Luíz Antônio Mello junto com os produtores e radialistas Samuel Wainer Filho, Sergio Vasconcellos, Alex Mariano, Amaury Santos e Maurício Valladares. No dial 94,9MHz, “A Maldita” entrou no ar no dia 1º de maio de 1982, pela voz da locutora Selma Boiron e com The Kids Are Alright, da banda inglesa The Who, como a primeira música a ser transmitida. Faltavam cinco minutos para as seis horas [...] naquele histórico 1º de março. Eu, Amaury e Serginho tínhamos gravado, sei lá, umas 20 ou 30 vinhetas que iam sendo encartuchadas. Entre uma e outra, nos abraçávamos. Chegamos à conclusão de que tínhamos, finalmente, inventado uma rádio ousada, criativa, audaciosa, independente,
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como os malditos da arte, da ciência... Aí não se sabe por que, pedimos ao operador que abrisse o microfone e juntos, os três disparamos: “Fluminense FM, Maldita!” Absolutamente sem querer [...] foi a vinheta que definiu tudo aquilo que pensávamos, que trabalhávamos. Era um produto maldito [...] Dois minutos depois, pilotada por Selma Boiron, a Maldita entrou no ar. A primeira música já estava decidida há muito tempo [...] foi Serginho quem lutou para que a primeira música a ir ao ar fosse The Kids Are Alright , com The Who. [...] A letra, em seu refrão cantado para o Rio de Janeiro que ainda se contorcia nos trens, ônibus e camas, àquela hora da manhã, dizia: “Os garotos têm razão, os garotos têm razão.” Valeu Townshend! Valeu Serginho! [...] (MELLO, 2015).
Aliás, ter um time de locutoras, que também contou com Selma Vieira, Monika Venerabille, Liliane Yusim, Edna Mayo e Cristina Carvalho, foi um diferencial que marcou a história da rádio como sendo a pioneira em ter mulheres à frente dos microfones. Voz feminina e público-alvo 70% masculino pareciam ser incompatíveis. Mas a ideia do jornalista João Luiz Faria Netto, então consultor da Presidência do grupo O Fluminense, foi um diferencial da rádio e é considerado um divisor de águas no mercado de locução. Com grande parte da programação com rock dos anos 1960 e 1970, o contraste com a voz feminina seria perfeito. Das 6h às 2h, elas estariam à frente dos microfones, numa época em que o mercado era majoritariamente masculino, com poucas oportunidades para as mulheres. [...] Ao anunciarem no jornal, mais de 200 meninas participaram da seleção e seis foram escolhidas para inaugurar a rádio: 1) Selma Boiron (novata em rádio, 19 anos) assumiu o horário das 6h às 10h. 2) Selma Vieira (ex-Manchete AM) assumiu o horário das 10h às 14h. 3) Mônika Venerabile (ex-Fluminense AM, 19 anos) ficou com a tarde, das 14h às 18h. 4) Liliane Yusim (ex-Tupi AM, 25 anos) pegava das 18h às 22h. 5) Edna Mayo (ex-Del Rey) trabalhava das 22h às 2h. 6) Cristina Carvalho (novata em rádio) trabalhava como folguista. [...] (ESTRELLA, 2012, p.44- 45).
A rádio contava com os programas como Rock Alive, que serviu de impulso inicial no projeto de Luíz Antônio Mello e era comandado por Maurício Valadares e Liliane Yusim com um tom mais eclético, Módulo Especial, com meia hora do mesmo
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artista, Guitarras, com punk e metal, Espaço Aberto, com rock nacional e MPB, entre outros. Para divulgar o rock nacional dos anos 1980, “A Maldita” firmou parceria com o Circo Voador, tradicional casa de shows do bairro da Lapa, e com o selo da Warner Music, WEA, através do lançamento de fitas-demo, LPs e promovendo shows nas datas em comemoração aos aniversários da rádio. Em janeiro de 1983, foi lançado o disco Rock Voador [...] Nesse LP estava reunido um grupo que marcaria a nova fase do rock nacional: Lulu Santos, Barão Vermelho e a voz feminina dessa geração, Paula Toller, e seu Kid Abelha [...] A rádio inovou ao lançar fitas-demo, que, apesar de não terem excelente qualidade técnica, conseguiam mostrar o som verdadeiro de cada banda. Foi por essa via que Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, Capital Inicial e Plebe Rude conquistaram seus fãs[...] (PICOLLI, 2008, p.61).
Após ter passado o ano de 1990 com uma programação voltada para a indústria da música pop, representada por “Britneys Spears” e por boy bands c omo Backstreet Boys, o rock foi definitivamente exonerado da “Maldita” em 30 de setembro de 1994. Com uma nova direção musical, a rádio ainda fez uma última tentativa de permanecer no ar na frequência AM em 2001, o que a impulsionou a voltar para a FM em 2002, mas seu fim se deu logo no início de 2003. Em comemoração aos 30 anos da Fluminense FM, foi montada a exposição Maldita 3.0: no Universo da Rádio Fluminense, que ficou no Centro Cultural Correios, no Rio de Janeiro, entre julho e agosto de 2012, e teve sua segunda edição no Imperator, casa de shows de rock no bairro do Méier, em 2015. Além da exposição, também foi criado o site Maldita 3.0, que tem como objetivo manter a memória da Fluminense viva e funciona até hoje como se a rádio ainda estivesse no ar. Em São Paulo, a força do rock começava a ser vista pelo mercado radiofônico em um período de abertura política, pós-ditadura militar, atrelada à expansão e descoberta de um público jovem e roqueiro, pós primeira edição do Rock In Rio, em 1985. Este cenário de busca pelo público jovem, na década de 1980, colocou duas rádios paulistas em concorrência direta. De um lado, estava a Difusora FM, c omandada pelo Diário dos Associados, foi a primeira emissora de rádio na capital paulista a operar
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em FM a partir 1978. E de outro lado, a rival Excelsior FM, que migrou do AM, também em 1978, sob o comando das Organizações Globo e vinha com o slogan “a máquina do som”, marca do radialista Antônio Celso. Ambas seguiam o formato de rádio norte-americano com locuções mais rápidas e programações direcionadas para um perfil mais pop, apresentando sempre as músicas que eram sucesso nas paradas internacionais. E, mesmo que a Difusora FM e a Excelsior FM não tivessem programas cem por cento dedicados ao rock, sucesso, nos anos 1980, se resumia ao ritmo. O especialista em rádio, jornalista, e mestre da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), Álvaro Bufarah Júnior, afirma esse contexto histórico: [...] A Difusora e a Excelsior entram num embate buscando um novo perfil de público mais jovem incluindo, historicamente, como nós temos a disco nos anos 70, eles buscam um perfil mais pop. Dentro desse perfil, você tem uma situação que eles tentam apresentar o que havia de mais novo em música sendo lançada. Então, um apresenta os sucessos da BillBoard, da revista, e a outra apresenta os sucessos da Cashbox, uma outra revista concorrente da Billboard [...] Então, a busca desse público mais jovem inclui o pop. O rock é um pedaço disso, porque dentro do pop brasileiro, lembra que nosso rock foi alvejado por um grande período da ditadura à um certo ostracismo, até por conta do perfil contestador do rock. Então, o rock brasileiro vai ficar meio em dormência até os anos 80, com o processo de abertura, e as rádios vão ter esse perfil muito mais americanizado. Tanto que as locuções seguem perfil americano, um time mais rápido, acelerado, dispara música, o cara fala em cima, tem todo um projeto plástico, com vinheta, com trilha, com carimbos completamente diferente do que nós tínhamos antes. Então, o rádio busca num novo nicho do mercado, um rejuvenescimento, para que ele atinja um perfil mais jovem[...]2
Com as pitadas de rock na grade da Difusora FM e da Excelsior FM, São Paulo só escutou a onda rock ocupar 24 horas de uma emissora de rádio com a chegada de uma das concorrentes diretas da carioca Fluminense FM, a 89 FM. Comandada pelo Grupo Camargo de Comunicações (GC2), a frequência 89,1 MHz, com prefixo ZYD 906, foi originalmente ocupada pela rádio Pool FM, que tinha o funk e a música disco como trilha sonora Informação oral coletada pelos autores deste referencial mediante entrevista realizada com o jornalista, doutor, mestre e especialista em rádio, Álvaro Bufarah Júnior, no dia 16 de novembro de 2016. Entrevista completa em: Apêndices, 1.Entrevistas, 1.11 - Álvaro Bufarah Júnior. 2
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Com concessão na cidade de Osasco e sede na Praça Osvaldo Cruz, início da Avenida Paulista, o rock da 89 FM entrou no ar dia 2 de dezembro de 1985 disputando audiência também com a 97 FM, inaugurada em 1983 em Santo André e que saiu do âmbito do rock em 1994 para dar lugar à música eletrônica e se consolidar com a Energia 97. [...] às 20 horas do dia 2 de dezembro de 1985, depois de um dia todo muito longe dos funks poderosos da Pool FM, entrou a guitarra torta e a galhardia de Nós Vamos Invadir sua Praia, do Ultraje a Rigor. Começou ali, oficialmente, a vida da 89 FM, a Rádio Rock. (ALEXANDRE, 2014).
Desde os primeiros anos de existência, a 89 FM tornou-se pioneira na transmissão do rock hit-parade, modelo que já vigorava nas FMs. Mesmo assim, sua programação mesclava esse rock mais comercial ao clássico e alternativo. Trazendo então, uma personalidade à rádio que atrai o público jovem e é mantida até os dias de hoje. No primeiro time que figurou à frente da 89 FM estava o radialista Luís Fernando Maglioca, ex-diretor artístico da Rádio Excelsior FM e AM nos anos 70, e nos microfones estavam Selma Borion, ex-locutora da Fluminense FM, Sarah Oliveira, Jairo Bouer, Edgard Piccoli, Paulo Bonfá, João Gordo (vocalista da banda Ratos de Porão), entre outros. Luka Salomão, Tatola Godas, Zé Luiz e PH Dragani estão entre os locutores presentes nesse início da rádio e que mantém-se nos microfones até hoje, Na grade da “Rádio Rock” , já atuavam os programas Do Balacobaco, comandado até hoje pelo bom humor do radialista Zé Luiz, e Hora dos Perdidos, em que a locutora Luka Salomão, hoje com a ajuda de Thiago Deejai, atende aos pedidos dos ouvintes. Por conta do aumento das rádios pop e a perda de audiência por parte da 89 FM, a direção artística da emissora decide, em 2006, submeter a rádio a uma reformulação. E logo em julho do mesmo ano, sob o comando de Wagner Rocha (ex-diretor artístico da Rádio Metropolitana) , o título de “Rádio Rock” cai e entra em vigor o pop, black music e dance music que imperava nas outras rádios jovens. Junto com a mudança de estilo musical, a 89 FM apostava em uma programação mais interativa, com canais de comunicação com o ouvinte pela internet, pelo telefone e
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com entradas ao vivo. Com essa repaginação de identidade, a rádio também mudou de endereço e passou a ocupar o 21º andar do número 2200 da Avenida Paulista. Mesmo com os altos números de audiência, houve a especulação de que a 89 FM passaria para o formato web e que a concessão da rádio seria comprada pela Igreja Universal. Tanto que, em 27 de outubro de 2012, entrou no ar uma programação especial ao estilo “Rádio Rock” , sob o comando do locutor Tatola Godas das 19h às 21h, voltada para a divulgação do novo projeto de web rádio do Grupo Camargo. A grande repercussão entre os ouvintes fez com que esse especial ganhasse uma segunda edição com seis horas de duração, do meio-dia às seis da tarde, no dia 4 de novembro com a locutora Luka Salomão, que havia deixado a rádio durante sua fase pop, nos microfones. A transmissão do especial Top 10 Fim do Mundo, em 21 de dezembro de 2012 confirmou a volta oficial da “Rádio Rock”, que durante um ano manteve o nome de UOL 89 A Rádio Rock FM 89.1, por conta de uma parceria com o provedor de conteúdo UOL. Sendo a última música tocada nesse especial, pouco antes da meia-noite e da volta da “Rádio Rock” , It’s The End Of The World As We Know It (And I Feel Fine) da banda R.E.M. Segundo reportagem da revista Veja São Paulo, o retorno da “Rádio Rock” projetou-se como algo promissor. “[...]Após as primeiras semanas de transmissão, encontra- se em décimo lugar no ranking do Ibope, com uma média de mais de 91.000 ouvintes por minuto. É hoje a segunda em audiência entre as emissoras focadas no público jovem, atrás apenas da Mix FM (106,3 MHz)[...]”.3
Após a volta da “Rádio Rock” , foi lançado, em abril de 2014, o livro 89 FM: A História da Rádio Rock do Brasil. Escrito pelo jornalista Ricardo Alexandre, o livro traz toda trajetória da 89 FM e conta com os dez melhores depoimentos enviados à rádio pelos ouvintes durante o primeiro semestre de 2013, e que figuram no capítulo A 89 faz parte da minha história. GOUVEIA, Júlia. 89 reinveste na fórmula rádio rock para recuperar o sucesso - Uma das frequências mais queridas da cidade volta a tocar Led Zeppelin, Pink Floyd e Yes. 25 jan. 2013, com atualização em 18 jun. 2013. In Veja São Paulo. Disponível em: <http://vejasp.abril.com.br/materia/89-fm-radio-rock> Acesso em 10 mai. 2016. 3
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Em 2015, para comemorar o aniversário de 30 anos da 89 FM foi promovido o Show de 30 Anos da Rádio Rock, que aconteceu no dia 28 de novembro na Arena Anhembi, em São Paulo. Para compor o line-up de artistas que representassem esses anos em que o rock comandou a programação da rádio, foram chamados: Titãs, Paralamas do Sucesso, Capital Inicial, Raimundos, CPM 22, Pitty, Vespas Mandarinas, Supercombo e Scalene, além da banda cover Urbana Legion e de Nem Liminha Ouviu, em que o locutor, Tatola Godas, canta as faixas que não fizeram sucesso nos anos 80. Tributo ao rock nacional, o Show de 30 anos da Rádio Rock d emonstrou claramente a um dos autores deste referencial, o tamanho que a voz de Pitty atinge ao encontrar-se com um público que, mesmo que estivesse ali por conta das bandas oitentistas, sabia cantar todas as músicas tocadas por ela e sua banda. Hoje, com o responsável pela volta da “Rádio Rock” , José Camargo Junior, à frente da emissora, a 89 FM é considerada pela audiência a principal rádio dedicada 24 horas por dia ao rock and roll de São Paulo, tendo o classic rock da Kiss FM, com a qual trocou acusações mútuas de irregularidades de concessão em 2002, como concorrente direto. Além disso, a “Rádio Rock” possui aplicativo para dispositivos móveis e link no site para os ouvintes acompanharem a programação.
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3. As mulheres no rock nacional Como vimos, a história da mulher no rock brasileiro começou em 1955 com Nora Ney e sua versão para Rock Around the Clock. C elly Campello veio na sequência em 1958; Wanderléa e Rita Lee com os Mutantes na década de 1960; Baby Consuelo aparece em 1969 com os Novos Baianos; Kid Abelha & Os Abóboras Selvagens, de Paula Toller, na década de 1980; o Pato Fu de Fernanda Takai na década de 1990; e Pitty nos anos 2000. Em meio a tantos nomes masculinos, são poucas as mulheres que fizeram sucesso frente a uma banda de rock. Isto porém, não é exclusividade apenas do rock. Áreas importantes da sociedade, como a política ou cargos mais altos nas empresas, ainda são majoritariamente dominados por homens, como relata a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie: Homens e mulheres são diferentes. Temos hormônios em quantidades diferentes, órgãos sexuais diferentes e atributos biológicos diferentes — as mulheres podem ter filhos, os homens não. Os homens têm mais testosterona e em geral são fisicamente mais fortes do que as mulheres. Existem mais mulheres do que homens no mundo — 52% da população mundial é feminina, mas os cargos de poder e prestígio são ocupados pelos homens. A já falecida nigeriana Wangari Maathai, ganhadora do prêmio Nobel da paz, se expressou muito bem e em poucas palavras, quando disse que quanto mais perto do topo chegamos, menos mulheres encontramos. (2014, p. 7)
Chimamanda Ngozi Adichie (2014, p. 8) cita ainda a Lilly Ledbetter Fair Pay Act4, primeira lei assinada pelo então presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em 2009: Na última eleição dos Estados Unidos5, ouvimos, com frequência, falar da lei Lilly Ledbetter, que visa à equiparação salarial das mulheres. Se formos além do nome bonito e aliterativo, o significado é o seguinte: nos EUA, quando um homem e uma mulher têm
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Lei que estabelece como ilegal a discriminação salarial entre homens e mulheres, baseado no caso da ex-supervisora da Goodyear Tire and Rubber, que entrou com um processo na Suprema Corte Norte Americana após saber que, durante 15 anos, a empresa pagou a ela 40% a menos em relação aos homens, que realizavam o mesmo tipo de trabalho. 5 Eleição de 2012, que reelegeu o presidente Barack Obama à Casa Branca contra o republicano Mitt Romney.
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o mesmo emprego, com as mesmas qualificações, se o homem ganha mais é porque ele é homem.
Por isso, ter tão poucos nomes de relevância e representatividade feminina no rock nacional6 pode ser atribuído também ao fato desse gênero musical, apesar do forte tom de crítica, insatisfação, denúncia, protesto político e social que possui principalmente após o movimento punk - ser dominado por cantores ou bandas lideradas por homens, conforme afirma Cristiane Pawlowski: Embora as características do movimento rock carregassem ideias de liberdade, de igualdade, de contestação e ruptura com o sistema político e cultural dominante, o rock delineou-se como um universo artístico e musical predominantemente masculino, em que os homens eram as estrelas e as mulheres, tietes (2013, p.60).
No cenário mainstream do rock nacional, destacaram-se algumas mulheres - já mencionadas aqui - que trataremos adiante.
3.1 Rita Lee Historicamente, tivemos pouquíssimas representantes femininas no rock brasileiro, sendo que, somente com a chegada de Rita Lee ao cenário musical, de fato, a produção do rock nacional feito por uma mulher ocorreu. Rita Lee foi a mulher que deu o ponta pé inicial como líder de uma banda de rock no Brasil, indo além do papel de vocalista, mas também, atuando como compositora e musicista em Os Mutantes, formado por Sérgio Dias e Arnaldo Baptista, com quem Rita Lee casou-se posteriormente. O rock é um gênero musical que exige bom desempenho musicista, em especial aos que tocam guitarra, e tal técnica esteve sempre reservada aos homens de forma não democrática. Privilegiava-se a atuação do homem, mesmo que a mulher exercesse a função de musicista tão bem quanto (ROCHEDO, 2015, p.1). 6
Este referencial se aterá apenas a cena do rock brasileiro, portanto, abordará apenas as mulheres que se encontram à frente de uma banda que se encaixe nesse quesito. Mesmo assim, há a total consciência da existência de mulheres como vocalistas/compositoras de bandas de rock internacionalmente, como Janis Joplin, Nina Hagen, Pretenders (Chrissie Hynde), Sonic Youth (Kim Gordon), The Runaways, Blonde, Evanescence (Amy Lee), Paramore (Hayley Williams), entre outras.
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Junto com Os Mutantes, Rita Lee participou de cinco álbuns de estúdio do grupo. Entre o terceiro disco, A Divina Comédia ou Ando Meio Desligado, e o quarto, Jardim Elétrico, a cantora lançou em 1970 seu primeiro álbum solo, Build Up. O disco foi um marco em sua carreira, não só pelo fato de ser o primeiro sem Os Mutantes, mas por representar sua liberdade poética como musicista e como mulher, que tem desejos de fazer o que bem entende. A letra da canção Sucesso, Aqui Vou Eu (Build Up) reflete bem os anseios da cantora em “construir” sua independência artística roqueira. Já estou até vendo Meu nome brilhando E o mundo aplaudindo Ao me ver cantar Ao me ver passar I wanna be a star! Como Ginger Rogers vou sapatear Mais de mil vestidos vou poder usar Num show de cores em cinemascope Eu direi adeus aos sonhos meus Sucesso, aqui vou eu! Rádio, televisão, revistas, muito mais, ah Meu rosto, meu sorriso, à venda nos jornais Paris Match, N.Y.Times, Look, Life, BBC of London Here I come: Maquiagem, "mis-en-scène" para o Oscar cobiçado Luzes, câmera... ação! Eu vou lutar, eu vou subir Eu vou ganhar e conseguir! Será que algum dia Famosa eu seria? Meu sonho acontecia E eu direi goodbye! Mamãe, papai
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I wanna be a star! Abram alas Eu vou passar Sucesso, aqui vou eu! Abram alas I wanna be a star! Sucesso, aqui vou eu! Sucesso, aqui vou eu! Ah! (LEE, Rita. Sucesso, Aqui Vou Eu (Build Up), 1 970)
Além de Build Up, Rita Lee lançaria em 1972, Hoje É o Primeiro Dia do Resto da Sua Vida, creditado como seu segundo álbum de estúdio. O disco foi desenvolvido junto com os seus companheiros de banda, que já haviam lançado naquele ano o álbum Mutantes e Seus Cometas no País do Baurets e, por contrato com a gravadora Polydor Records, só podiam lançar um disco por ano. Em 1973, Arnaldo Baptista, que era o grande responsável pelas composições e direcionamento musical do grupo, decidiu que Os Mutantes incorporariam o rock progressivo (estilo que busca misturar música pop e o rock com outros gêneros mais complexos ou rebuscados como música clássica, jazz, entre outros) a partir de então, inspirados pela banda britânica Yes. Rita Lee, porém, não gostou da ideia, pois acreditava que isso afastaria o grupo da sua essência: fazer música humorada que entretém as massas. Certo dia, ao chegar a um ensaio da banda na casa na Serra da Cantareira, Rita Lee escutou de Arnaldo que estava fora de Os Mutantes, como conta a Almir Chediak em seu Songbook vol. 2: Um dia, na casa da Cantareira, antes de um ensaio, o Arnaldo colocou assim: “Olha, você está fora dos Mutantes.” Assim, ó, na bucha. Como? Como? “Não tem mais lugar pra você porque você não toca.” E eu agarrada com o meu miniMug, meu Muguizinho, tentava retrucar: “Pelo amor de Deus, eu sou intuitiva.” Eu tinha feito uns solinhos de Mug e Mellotron e tinha dado o maior pé. Soube depois que o Liminha e o Sérgio não queriam que eu saísse, mas o Arnaldo, não sei bem por que, queria. Assim fui comunicada que estava fora dos Mutantes. Dei entrevistas depois, dizendo que eu é que tinha saído, mas a verdade é que fui despedida. Almir - Você nunca disse isso?
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Rita - Nunca. Estou declarando pela primeira vez, talvez porque finalmente digeri a coisa! Mas é verdade que fiquei muito triste. Olha quase desesperei. Foi muito duro pra mim. “Pega tuas coisas porque já tem uma pessoa no teu lugar.” Um cara do Rio, parece, não me lembro direito. Peguei minhas coisas, botei no meu jipe e fui embora pra casa da minha mãe, back to the future! (CHEDIAK, 1990, p. 14).
Após isso, Rita Lee pegou seus instrumentos e pertences, pôs tudo em seu Jeep e foi embora. Com o fim de seu ciclo em Os Mutantes, Rita Lee formou a dupla Cilibrinas do Éden com sua amiga Lúcia Turnbull. O projeto não foi adiante e no mesmo ano Rita Lee e Lúcia Turnbull formam a banda Rita Lee & Tutti Frutti junto com os integrantes da banda Coqueiro Verde (Luis Sérgio Carlini, Emilson Colantonio e Lee Marcucci). A formação da banda mudou inúmeras vezes. Mas a principal mudança no grupo aconteceu em 1976, com a entrada de Roberto de Carvalho - músico, compositor e posteriormente marido de Rita. Bem ao estilo de sexo, drogas e rock n’ roll, naquele mesmo ano, grávida de Roberto, Rita Lee é presa por porte de drogas, sendo condenada, posteriormente, a um ano em regime domiciliar. Em março do ano seguinte, nasce o primeiro filho de Rita, Beto Lee. Junto com Rita Lee, o grupo Tutti Frutti lançou quatro discos: Atrás do Porto Tem uma Cidade (1974), Fruto Proibido (1975), Entradas e Bandeiras (1976) e Babilônia (1978). Rita Lee & Tutti Frutti conseguiram inúmeros sucessos como Menino Bonito, Agora Só Falta Você, Fruto Proibido, Ovelha Negra, Esse tal de Roque Enrow, entre outros. Após desavenças com Luis Sérgio Carlini, Rita Lee lança, em parceria com Roberto de Carvalho, o álbum Rita Lee (conhecido também como Mania de Você), em 1979, ano em que nasce o seu segundo filho com Roberto, João Lee. No ano seguinte, a cantora lança outro álbum autointitulado (dessa vez conhecido como Lança Perfume) . Lança Perfume é um dos maiores sucessos de Rita Lee. A música, assim como o álbum, era dançante. O fato da disco no Brasil (1976 - 1979) ocorrer na época de lançamento do álbum explica tal sonoridade, e, talvez, o sucesso do LP. A letra da canção mostra toda a feminilidade e sexualidade da mulher. Lança menina Lança todo esse perfume
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Desbaratina Não dá pra ficar imune Ao teu amor Que tem cheiro De coisa maluca Vem cá, meu bem Me descola um carinho Eu sou neném Só sossego com beijinho Vê se me dá o prazer De ter prazer comigo Me aqueça! Me vira de ponta cabeça Me faz de gato e sapato E me deixa de quatro no ato Me enche de amor, de amor Oh! Lança menina (x1) Oh! Lança! Lança Perfume! Oh! Oh! Oh! Oh! Lança! Lança Perfume! Oh! Oh! Oh! Lança! Lança! Lança Perfume! Lança Perfume! (LEE, Rita. Lança Perfume, 1980)
Rita Lee lança o álbum Saúde em 1981, mesmo ano em que nasceu seu terceiro filho, Antônio Lee. Após este disco, o marido Roberto de Carvalho, que já compunha em álbuns anteriores da roqueira, passa a fazer dupla com a esposa “oficialmente”. Juntos, Rita Lee e Roberto de Carvalho lançam os álbuns: Rita Lee e Roberto de Carvalho (1982), Baila Conmigo (1982) - álbum com faixas antigas da cantora
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gravadas em espanhol, Bom bom (1983), Rita e Roberto (1985), Flerte Fatal (1987), Zona Zen (1988) e Rita Lee e Roberto de Carvalho (1990). Dentre os sucessos da dupla estão faixas como Flagra, Pega Rapaz, Caso Sério, Barata Tonta, Vírus do Amor, Cor-de-Rosa Choque, entre tantas outras. Em 1991, Rita Lee e Roberto de Carvalho interrompem a parceria de sucesso. A cantora lança então o álbum ao vivo Rita Lee em Bossa ‘n’ Roll, com releituras dos maiores hits da sua carreira. É em 1993, que a cantora paulistana lança Rita Lee, terceiro álbum autointitulado, e o primeiro de estúdio sem Roberto de Carvalho. Dele sai Todas as Mulheres do Mundo, música recheada de empoderamento feminino, cita inúmeras mulheres; de todas as tribos, de todos os estilos, de todos os jeitos. A cantora ainda diz que “toda mulher é meio Leila Diniz”, em referência à atriz brasileira, símbolo da liberdade feminina no país, principalmente, na década de 1960. Em pleno regime militar, Leila posou grávida de biquíni na praia de Ipanema em 1971, algo que para época foi um grande choque. Além disso, Leila Diniz pouco se importava com o que as pessoas pensavam ou iriam dizer sobre ela. “Você pode amar muito uma pessoa e ir para a cama com outra. Já aconteceu comigo”, declarou a cantora ao semanário O Pasquim em 1969. Leila morreu em 1972, aos 27 anos de idade em um acidente de avião. Elas querem é poder! Mães assassinas, filhas de Maria Polícias femininas, nazijudias Gatas gatunas, kengas no cio Esposas drogadas, tadinhas, mal pagas Toda mulher quer ser amada Toda mulher quer ser feliz Toda mulher se faz de coitada Toda mulher é meio Leila Diniz Garotas de Ipanema, minas de Minas Loiras, morenas, messalinas Santas sinistras, ministras malvadas
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Imeldas, Evitas, Beneditas estupradas Toda mulher quer ser amada Toda mulher quer ser feliz Toda mulher se faz de coitada Toda mulher é meio Leila Diniz Paquitas de paquete, Xuxas em crise Macacas de auditório,velhas atrizes Patroas babacas, empregadas mandonas Madonnas na cama, Dianas corneadas Toda mulher quer ser amada Toda mulher quer ser feliz Toda mulher se faz de coitada Toda mulher é meio Leila Diniz Socialites plebeias, rainhas decadentes Manecas alceias, enfermeiras doentes Madrastas malditas, super homem sapatas Irmãs La Dulce beaidetificadas Toda mulher quer ser amada Toda mulher quer ser feliz Toda mulher se faz de coitada Toda mulher é meio Leila Diniz (LEE, Rita. Todas
as Mulheres do Mundo. 1 993)
Rita Lee ainda foi uma dos responsáveis por abrir os primeiros shows dos Rolling Stones em terras brasileiras em 1995. Sofreu overdose, acidente doméstico que quase a fez parar de cantar, lançou mais cinco álbuns - Santa Rita de Sampa (1997), 3001 (2000), Aqui, Ali, em Qualquer Lugar (2001), Balacobaco (2003) e Reza (2012). Ganhou o Grammy Latino em 2001 de Melhor Disco de Rock por 3001 e tornou-se o maior nome feminino no rock nacional, referência para as próximas gerações. Rita Lee foi importante não só pelos discos que gravou, mas também por sua postura a favor do pop e contra certo esnobismo da “autenticidade”, que contaminava fãs de rock
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e MPB. Foi uma artista inovadora, que, com os Mutantes, desafiou o conservadorismo da música brasileira e depois abraçou o “popular”, vendendo 55 milhões de discos. No ranking de maiores vendedores do país feito pela Associação Brasileira de Produtores de Discos (ABPD), ela está em quarto lugar, atrás apenas de Tonico e Tinoco, Roberto Carlos e Nelson Gonçalves. Até hoje, é nossa maior pop star feminina. (BARCINSKI, 2014, p.137).
Aos 68 anos de idade, a cantora lançou em outubro de 2016 sua autobiografia. Intitulado Rita Lee - Uma Autobiografia, o livro aborda a infância e os primeiros passos na carreira artística, sua prisão em 1976, seu relacionamento com Roberto de Carvalho; o nascimento de seus filhos, assim como músicas e álbuns; o uso de drogas e álcool, tudo na maior transparência, como acredita Zeca Camargo em sua crítica à Folha de S. Paulo: Três anos atrás, procurei Rita para um, digamos "projeto biográfico". Já havia nela uma vontade de revisar as aventuras e desventuras de uma carreira extraordinária. Naquele esboço de colaboração, senti sua preocupação em deixar a versão “correta” dos fatos. Desconfiada de “biógrafos”, preferia ela mesma contar sua história - e aqui está. Honesta? Tudo leva a crer que sim, até porque ela não poupa nem a si mesma.7
Rita Lee prova que a mulher brasileira tem sim espaço no rock e pode fazer muito sucesso cantando esse gênero musical. E como o jornalista Zeca Camargo intitula sua crítica, “Rita Lee mostra que fez e fará muita gente feliz”, consagrando-se como a principal representante do rock nacional de todos os tempos.
3.2 Baby Consuelo Além de Rita Lee, outro nome que movimentou a cena do rock nacional foi Baby Consuelo com os Novos Baianos. Nos anos 1970 no Brasil, toda produção musical acontecia de forma bem distinta. Quem escutava Led Zeppelin não se atrevia a chegar perto de pandeiros e bandolins, e aqueles que se embalavam ao ritmo de Chico
CAMARGO, Zeca. Crítica: Em autobiografia, Rita Lee mostra que fez e fará muita gente feliz. In: Folha de S. Paulo, 2016. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2016/11/1828780-em-autobiografia-rita-lee-mostra-que-fez-e-far a-muita-gente-feliz.shtml> Acesso em: 05 nov. 2016. 7
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Buarque eram fiéis ao samba até o último segundo. Foi com o espetáculo “Desembarque dos Bichos Depois do Dilúvio Universal”, ainda em 1969, em Salvador, que o grupo Novos Baianos alçou mão da mistura de ritmos brasileiros incrementados com guitarra elétrica, instrumento que já havia sido apresentado ao gosto popular com a Tropicália de Gilberto Gil e Caetano Veloso, que nessa época se encontravam exilados em Londres por conta da repressão da ditadura. Formado por Luíz Galvão, Moraes Moreira, Baby Consuelo, Pepeu Gomes, Paulinho Boca de Cantor e Dadi, os Novos Baianos adotava uma fórmula simples: uma música regional com guitarra e bateria. Em 1970, lançam seu primeiro disco É Ferro na Boneca, p ela gravadora RGE Fermata, p ermanecendo como uma novidade exótica até o grupo se mudar para um apartamento em Botafogo (Rio de Janeiro) e começar a ter contato com João Gilberto, que lhes ensinou a importância de uma melodia bem construída. O próximo endereço do grupo na cidade maravilhosa, um sítio em Jacarepaguá, foi o laboratório de onde saiu, segundo o ranking de 2007 da revista Rolling Stone, o M elhor Álbum de Música Brasileira de Todos os Tempos8, Acabou Chorare, n o qual João Araújo, pai de Cazuza, produtor e sócio da Som Livre, apostou na gravação. Depois do auge com o disco Acabou Chorare (1972), Novos Baianos FC (1973) e mais 6 álbuns, o grupo decidiu que cada um deveria seguir seu caminho. Foi quando Pepeu Gomes e Baby Consuelo, mesmo depois de terem se relacionado durante os anos como companheiros de banda na qual permaneceram até 1978, partiram para carreira solo. Depois do fim dos Novos Baianos, Pepeu e Baby finalmente conseguiram fazer sucesso comercial. Eles capricharam no visual futurista/tropicalista/new wave, misturando cabelos coloridos, penas, roupas de aparência metálica e penteados esquisitos [...] (BARCINSKI, 2014, p.123).
Informação constante na lista “Os 100 Maiores Discos Da Música Brasileira”, realizada pela Revista Rolling Stone, em 2007. Em 1º lugar está o disco Acabou Chorare - Novos Baianos (1972 - Som Livre) com crítica escrita por Marcus Preto, disponível em: <http://rollingstone.uol.com.br/listas/os-100-maiores-discos-da-musica-brasileira/biacabou-chorarei-novo s-baianos-1972-som-livreb/> Acesso em 27 set. 2016. 8
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Baby Consuelo, Baby do Brasil ou, como em seu registro de nascimento, Bernadete Dinorah de Carvalho Cidade, vinha de uma família de classe média/alta de Niterói, Rio de Janeiro, e havia conhecido sua banda durante uma viagem, ou melhor uma fuga de casa com uma amiga, para a Bahia. Seu primeiro álbum solo, O Que Vier Eu Traço, lançado em 1978 pela Warner Music, atinge a mídia e vira sucesso de vendagens com 400 mil cópias. A faixa de maior sucesso de sua carreira está no seu segundo CD Pra Enlouquecer (1979), Menino do Rio, composta por Caetano Veloso exclusivamente para ela, que ganha repercussão nacional após entrar na trilha sonora da novela da Rede Globo, Água Viva. A capa do disco traz Baby com seus quatro primeiros filhos com Pepeu, que continuou colocando suas guitarras no projeto solo da esposa: Riroca (Sarah Sheeva após os 15 anos de idade), Zabelê, Nãna Shara, as quais formariam depois a girl band SNZ, e Pedro Baby. Anos depois, Baby ainda daria luz a dois meninos, Krishna Baby, o qual intitula o disco de 1984, e Kriptus Baby, que figura na capa de Sem Pecado Sem Juízo do ano seguinte. Menino do rio Calor que provoca arrepio Dragão tatuado no braço Calção, corpo aberto no espaço Coração de eterno flerte, adoro ver-te Menino vadio Tensão flutuante do rio Eu canto para Deus proteger-te Menino do rio Calor que provoca arrepio Dragão tatuado no braço Calção corpo aberto no espaço Coração de eterno flerte, adoro ver-te Menino vadio Tensão flutuante do rio Eu canto para Deus proteger-te O Havaí, seja aqui, o que tu sonhares Todos os lugares As ondas dos mares
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Pois quando eu te vejo Eu desejo o teu desejo Menino do rio Calor que provoca arrepio Toma esta canção como um beijo (CONSUELO, Baby. Menino do Rio, 1980)
Após se dividir entre a carreira de cantora, pastora da Igreja Ministério do Espírito Santo de Deus, desde 1990, e a música gospel, Baby volta a interpretar clássicos de sua carreira em 2012 com arranjos feitos pelo próprio filho, Pedro, que também é músico. Esse projeto ficou intitulado como “Baby Sucessos” e teve sua primeira apresentação no Vivo Open Air, no Jockey Club Brasileiro, Rio de Janeiro, que contou com a participação de Caetano Veloso em Menino do Rio. Nessa turnê, foram produzidos por Pedro o CD e DVD Baby Sucessos - A Menina Ainda Dança (2015), r egistro de um show no Centro Cultural João Nogueira, no Rio de Janeiro em 2014.
3.3 Paula Toller Seguindo a linha de mulheres de sucesso no rock nacional, na década de 1980 surgiu uma artista tímida, mas que se mostrou à prova de críticas. Nos anos 1980, o rock brasileiro ganhou maior representatividade com o surgimento de inúmeras bandas do gênero, vindas, sobretudo, de São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro. Em 1981, Carlos Leoni, vocalista e baixista da então banda Chrisma, conhece a tímida Paula Toller, estudante de Desenho Industrial e Comunicação Visual da PUC-RJ. Os dois passam a namorar e Paula Toller é convidada a ser vocalista da banda. Além dos dois, Beni Borja (bateria), Pedro Farah (guitarra) e posteriormente George Israel (saxofone), convidado por um amigo de Leoni, formaram a banda. Até então sem nome, em 1982, a banda enviou uma demo da canção Distração à Rádio Fluminense FM. Com uma lista de nomes estranhos, após votação dos integrantes em transmissão ao vivo na rádio, a banda ganha o nome de Kid Abelha & Os Abóboras Selvagens. Tocando no Circo Voador, importante espaço para shows no Rio de Janeiro
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na época, o Kid Abelha & Os Abóboras Selvagens começa sua carreira de sucesso. Com a saída precoce de Pedro Farah, que abandonou a banda para morar nos Estados Unidos, Bruno Fortunato entra para a banda e assume a guitarra. O grupo lança o seu primeiro álbum, Seu Espião, em 1984. "Durante um mês, nós ficamos só ensaiando. Nada de shows, viagens, TV e etc. A gente queria apresentar um trabalho bem acabado pra garantir que o disco soasse à nossa maneira e para impressionar o produtor (aquela altura um ser desconhecido e onipotente9)”. Os produtores eram Liminha, ex-baixista de Os Mutantes, e Lulu Santos. E não para por aí, a música título do álbum foi composta por Paula, Leoni e Herbert Vianna, vocalista da banda Os Paralamas do Sucesso. O primeiro single da banda, Pintura Íntima, foi um grande sucesso no Brasil. O disco ainda contou com mais singles de sucesso como: Como eu Quero, Nada Tanto Assim, Fixação e Alice (Não me Escreva aquela Carta de Amor). Apesar da boa recepção comercial, o álbum amargou críticas negativas por as músicas serem “infantis, fúteis e açucaradas demais”. E as músicas realmente eram mais leves do que o rock oitentista. Muitas falavam sobre amor juvenil, como as já citadas aqui. Vem amor que a hora é essa Vê se entende a minha pressa Não me diz que eu tô errado Eu tô seco, eu tô molhado Deixa as contas que no fim das contas O que interessa pra nós
É fazer amor de madrugada Amor com jeito de virada (2x) Larga logo desse espelho Não reparou que eu tô até vermelho Tá ficando tarde no meu edredon Logo o sono bate
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Informação obtida no site oficial do Kid Abelha. Disponível em: <http://www.kidabelha.com.br> Acesso em: 3 abr. 2016.
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Deixa as contas que no fim das contas O que interessa pra nós É fazer amor de madrugada Amor com jeito de virada (KID ABELHA. Pintura Íntima, 1983)
Em 1985, o grupo apresentou-se na primeira edição do Rock In Rio, ao lado de inúmeras bandas nacionais como Barão Vermelho e internacionais como Scorpions e AC/DC. Com o público mais roqueiro, Kid Abelha & Os Abóboras Selvagens e Eduardo Dusek foram vaiados em suas apresentações. Somente o Barão Vermelho foi poupado das vaias. Apesar das críticas, a banda continuou trabalhando em novas canções e lançou naquele mesmo ano o segundo álbum de estúdio, Educação Sentimental. Com músicas como Lágrimas e Chuva e Os Outros, Educação Sentimental foi duas vezes disco de ouro. A canção A Fórmula do Amor, última faixa do álbum, foi composta por Leoni e Leo Jaime, e também entrou no disco Sessão da Tarde ( 1985) de Leo Jaime. Curiosamente, a saída de Leoni do Kid Abelha aconteceu em um show de Leo Jaime, no qual ele se irritou após Leo Jaime não tê-lo citado como parceiro da faixa. Paula Toller, que namorava Herbert Vianna na época, tomou partido de Leo, assim como os outros integrantes do grupo. Dessa forma, Leoni deixa o Kid Abelha para formar o Heróis da Resistência. O Kid Abelha passava, então, a ser um trio: Paula, George e Bruno, e também a não ter o seu principal compositor, Leoni. Paula Toller, que escrevia música ou outra do Kid, teve mais espaço para suas composições. Isso se refletiu no terceiro disco da banda, Tomate (1987). A cantora compôs todas as músicas do álbum com seus parceiros Bruno Fortunato e, sobretudo, George Israel. Para o disco Kid (1989), o grupo ganhou reforço de peso. A faixa De quem é o Poder? f oi composta por George, Nilo Romero e Cazuza. Segundo o próprio Cazuza, em release disponível no site do Kid Abelha:
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A carreira do KID começou praticamente junto com a nossa, do Barão, no Circo Voador. Eu não gostava do grupo nem daquela garota tímida miando no microfone, achava tudo bobo. Mas a vida e o tempo, os amigos inseparáveis, vieram me provar que não. A banda, com a energia de George Israel, a contenção de Bruno, firme na guitarra, o charme de Paula Toller, que cada dia canta melhor e fica mais gostosa - está usando os graves, voz de mulher decidida - tudo isso transformou o KID na maior banda pop brasileira. Eu tenho orgulho de ser parceiro de George Israel e ter uma letra minha neste disco, e assim de uma certa maneira, ser um Kid Abelha10.
A canção é a mais “politizada”, por assim dizer, do grupo. Na letra, Paula Toller entoa: “De quem é o poder? / Quem manda na minha vida? / De quem é? / De quem é? / Uns dizem que ele é de Deus. / Outros, do guarda da esquina. / Uns dizem que é do presidente. / Outros, quem vem lá de cima”. Mais a frente, a música em tom de metáfora, rememora o período da ditadura militar ainda recente: Às vezes você me domina Pensando que eu sou teu dono Às vezes você me dá nojo Seguindo feliz o rebanho Onde vai dar tudo isso? Prender alguém ou ser preso Quem é o mais infeliz? Eu, dando ordem o dia inteiro? E você, que nem sabe o que diz? Me dê poder e eu te mostro O mais inteiro dos sonhos Porque as verdades da vida São sempre ditas na cama. (KID ABELHA. De Quem é o Poder?, 1989)
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Informação obtida no site oficial do Kid Abelha. Disponível em: <http://www.kidabelha.com.br> Acesso em: 3 abr. 2016.
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Os álbuns seguintes mantiveram o Kid Abelha mais do que ativo, alheio a todas as críticas. Tudo é Permitido (1991) trouxe o single Grand’ Hotel; Iê Iê Iê (1993), título mais que sugestivo à Jovem Guarda, teve os sucessos Eu Tive um Sonho e Mil e Uma Noites. Na sequência veio Meu Mundo Gira em Torno de Você (1996) com Na Rua, na Chuva, na Fazenda e o sucesso Te Amo pra Sempre. Em 1997, a banda lançou mais dois discos: Espanhol com regravações dos sucessos do grupo em espanhol, divulgado nos Estados Unidos, Espanha e países latinos - no Brasil, foi lançado somente em 2005. E Remix, álbum com alguns sucessos remixados - foi disco de platina duplo. Já com quinze anos de estrada, o Kid Abelha contou ainda com mais quatro discos: Autolove (1998), Coleção (2000), Surf (2001) e Pega Vida (2005). Entre Surf e Pega Vida, a banda lançou em 2002 o registro, possivelmente, mais importante da carreira. Trata-se do Acústico MTV Kid Abelha, em comemoração aos vinte anos de carreira do grupo. Com o formato CD e DVD, o Acústico MTV Kid Abelha vendeu cerca de mil, duzentos e cinquenta mil cópias, tornando-se disco de diamante e platina, e ainda teve o single Nada Sei, carro chefe de divulgação do álbum. Contou ainda com a regravação de Quero Te Encontrar da dupla Claudinho & Buchecha, em homenagem a Claudinho, que faleceu no mesmo ano; regravação de Brasil de Cazuza; Mudança de Comportamento do Ira! com a colaboração do guitarrista da banda, Edgard Scandurra; e a participação do cantor Lenine em Na Rua, na Chuva, na Fazenda. O disco ainda foi indicado ao Grammy Latino de Melhor Álbum de Pop Contemporâneo Brasileiro em 2003, única indicação que o Kid Abelha recebeu até hoje. O grupo também comemorou em 2012 os trinta anos de estrada com o registro Multishow Ao Vivo Kid Abelha 30 Anos, m arcando o fim de uma era gloriosa para o grupo de pop rock. Em nota de agradecimento, divulgada no site e página oficial da banda no Facebook em 22 de abril de 2016, Paula Toller, George Israel e Bruno Fortunato anunciaram oficialmente o fim do Kid Abelha: A vontade de experimentar outras formas de criar e o desgaste natural de tanto tempo juntos nos levaram a essa decisão. Optamos por um soft-ending, um final suave, evitando o sensacionalismo, com a convicção de que nossa trajetória vitoriosa sempre se deveu ao entusiasmo e dedicação sempre renovados a cada disco, cada turnê.
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[...] Ao fã que nos acompanha há tanto tempo, viajando para nos assistir ao vivo, escrevendo cartas, mandando mensagens e comentando nas redes sociais, elogiando, criticando, se preocupando… a esse amigo, que convida seus amigos a nos ouvir, e cuja vida está marcada através das canções que nós fizemos, e cujo carinho e atenção também marcaram nossas vidas, MUITO OBRIGADO11!
Paula Toller, assim como Rita Lee fez em determinado momento da carreira, dividiu-se entre a banda e carreira solo. A carioca lançou quatro discos como solista: Paula Toller (1998), SóNós ( 2007), Nosso (2008) e Transbordada (2014). A música de maior sucesso da carreira solo de Paula Toller foi Nada por Mim, do álbum Nosso, a canção alcançou o topo das paradas brasileiras. Com 53 anos de idade, Paula Toller fez parte do projeto Nívea Viva Rock Brasil de 2016. Ao lado de Os Paralamas do Sucesso, Pitty (substituída por Marjorie Estiano por conta da gravidez) e Nando Reis, ela interpretou os maiores hits do rock nacional em sete shows gratuitos nas cidades de Porto Alegre, Rio de Janeiro, Recife, Fortaleza, Salvador, Brasília e São Paulo. Paula Toller é uma das maiores intérpretes da música pop rock brasileira e marcou seu nome na história.
3.4 Fernanda Takai Com o mesmo estilo pop rock que popularizou Paula Toller e o Kid Abelha nos anos 1980, na década de 1990 foi a vez da voz delicada de Fernanda Takai tomar frente à produção de rock no Brasil. Natural de Serra do Navio, no Amapá, Fernanda Barbosa Takai foi para Belo Horizonte, Minas Gerais, onde formou a banda Pato Fu, em 1992, e graduou-se em Relações Públicas pela Universidade Federal de Minas Gerais, em 1993. Passando pelas bandas Data Vênia e Fernanda & 3 do Povo, ambas do underground de Belo Horizonte e sem discos lançados, Fernanda Takai conheceu John Ulhoa e Ricardo Koctus, que trabalhavam em uma loja onde ela comprava palhetas e cordas, e logo a convidaram para fazer parte da banda Sustados por 1 Gesto, a qual viria a ser o embrião do Pato Fu.
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Informação obtida no site oficial do Kid Abelha. Disponível em: <http://www.kidabelha.com.br/> Acesso em: 23 abr. 2016.
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Ao longo dos anos, o Pato Fu construiu uma reputação como uma das bandas mais trabalhadoras e criativas do rock nacional, mesmo sem jamais ter se encaixado em um estereótipo padrão. Fruto da "mente maligna" de John, a banda caracterizou sua discografia pelo contraste entre momentos pop e esquizofrênicos em um mesmo disco, mesclando pérolas radiofônicas com experimentos bem-humorados sem nenhum pudor. (AGOSTINI, 2010).
Em entrevista à revista Rolling Stone12, o guitarrista John Ulhoa, companheiro de banda e marido de Fernanda Takai, a intitulou como dona de “um dos maiores tesouros da música pop, que é uma voz reconhecível em poucas notas”. Por mais clichê que possa parecer um marido elogiar a mulher, é notavelmente reconhecida a importância de Fernanda Takai no cenário da música brasileira. O ponta pé inicial de tal reconhecimento só aconteceu após a entrada do Pato Fu no mainstream, quando Maurício Valadares, coordenador do selo Plug, da gravadora BMG, assistiu a uma apresentação do grupo no Rio de Janeiro em 1994. Até então, o Pato Fu já havia lançado seu primeiro CD, o Rotomusic de Liquidificapum (1993), pelo selo independente mineiro, Cogumelo Records, que apostava no metal e tinha Sepultura como principal artista. Com um rock alternativo e experimental como característica, o Pato Fu ganha um novo membro, o baterista Xande Tamietti que fica na banda até a entrada de Glauco Nastacia em Não Pare de Pensar ( 2014), e lança seu primeiro CD pela BMG, Gol de Quem? em 1995. O disco traz Sobre o Tempo, primeiro grande hit da banda o qual foi vencedor na primeira edição do prêmio MTV Video Music Brasil (VMB) como Melhor Videoclipe de Artista Revelação, categoria essa em que também concorriam Planet Hemp, com o clipe de Legalize Já, além de Chico Science e Nação Zumbi, com Da Lama ao Caos. Com músicas gravadas em português, inglês e japonês, este último idioma por conta de Fernanda Takai ser descendente de japoneses por parte de pai, o Pato Fu conquistou reconhecimento internacional quando, em 2001, a revista norte-americana
Informação obtida em entrevista à revista Rolling Stone r ealizada pelo jornalista Tiago Agostini com Fernanda Takai e John Ulhoa em julho de 2010. Disponível em: <http://rollingstone.uol.com.br/edicao/46/dupla-personalidade-pato-fu#imagem0> Acesso em: 3 abr. 2016. 12
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Time apontou o Pato Fu como uma das melhores bandas do planeta, e Fernanda Takai entre as 10 melhores cantoras do mundo. Como vocalista, instrumentista e compositora no Pato Fu, Fernanda Takai gravou 10 CDs de estúdio, 2 CDs ao vivo e 5 DVDs, com destaque para o álbum Música de Brinquedo (2010). Lançado pelo selo independente Rotomusic Records, fundado em 2005 pela própria banda, o álbum traz covers que vão desde sucessos nacionais, como Primavera ( Tim Maia), a té versões de músicas internacionais, como Love Me Tender (Elvis Presley), todos gravados apenas com instrumentos de brinquedo. Com a participação de Nina Takai, fruto do casamento de Fernanda Takai e John Ulhoa, em algumas faixas, o disco venceu o Grammy Latino 2011 como Melhor Álbum de Música Latina para Crianças, além de, no mesmo ano, ser coroado com Disco de Ouro, trazendo ao Pato Fu o título da primeira banda independente a atingir esse feito. Em paralelo ao Pato Fu, Fernanda Takai despontou em carreira solo em 2007, com o lançamento do disco Onde Brilhem os Olhos Seus, em que homenageia Nara Leão, apontado pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) como o Melhor Disco de MPB de 2007. Depois desse, vieram ainda os discos Luz Negra (2010), Fundamental (2012), o qual contou com 5 faixas em português, 6 em inglês, além da produção do ex-guitarrista do The Police, Andy Summers, e Na Medida do Impossível (2014), no qual Pitty foi coautora da faixa Seu Tipo junto com Fernanda Takai. Sou do tipo que devolve livros E espera por mais de uma hora Sabendo que você não vem Sou do tipo que ainda escuta E recolhe da calçada as flores Que já não tem ninguém Tipo, que você nem olha Tipo, que ainda tem memória Sinto muito sua falta Não ficar junto Me dissolve um pouco mais
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Sou do tipo que ainda ouve discos E no caso sabe a hora De virar o lado B Sou do tipo que pergunta o signo Cola selos, guarda sigilos Sou o tipo pra você Tipo, que você nem olha Tipo, que ainda tem memória Sinto muito sua falta Não ficar junto Me dissolve um pouco mais Tipo, que você nem olha Tipo, que ainda tem memória Sinto muito sua falta Não ficar junto Me dissolve um pouco mais (2x) (TAKAI, Fernanda e Pitty. Seu Tipo, 2 014)
Além de sua carreira solo e no Pato Fu, Fernanda Takai também contribui com crônicas nos jornais Correio Brazi liense e Estado de Minas escritas em seu tempo livre entre uma turnê e outra. Esse trabalho resultou na publicação de seus três livros: Nunca Subestime uma Mulherzinha, de 2007; A Mulher que não Queria Acreditar, de 2011, ambos lançados pela Panda Books; além da fábula A Queixa e o Panda Vermelho, lançado em 2013 pela Editora Cobogó. Em meio aos lançamentos de seus livros, Fernanda Takai ainda dedicou-se à produção de trilhas sonoras. Em 2002, Takai compôs o tema de abertura e participou do seriado da TV Cultura escrito por Flávio Sousa, Ilha-Rá-Tim-Bum, como a narradora Tim. Em 2011, a pedido da Walt Disney, produziu duas músicas, O Bosque dos Cem Acres e Uma Coisa Muito Importante Para Se Fazer, em português, para o filme fruto do desenho animado Winnie the Pooh, conhecido no Brasil como Ursinho Pooh. Dois anos depois, contando com a parceria de John Ulhoa, compôs 27 canções para o espetáculo Aventuras de Alice no País das Maravilhas, do grupo de teatro de bonecos
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Giramundo, n o qual Fernanda Takai também emprestou sua voz para a personagem principal, Alice. Dez anos separam o lançamento do primeiro disco de Fernanda Takai com o Pato Fu, Rotomusic de Liquidificapum (1993), e posterior entrada no mainstream, com o surgimento de Pitty, maior referência feminina no cenário do rock nacional na atualidade.
3.5 Pitty Como viu-se até agora, cada década teve ao menos uma representante feminina à frente de uma banda de rock. Não que essas tivessem sido as únicas mulheres que tomaram os microfones nesses 60 anos de rock no Brasil, muitas outras despontaram na cena alternativa/underground, mas foram estas (Rita Lee, Baby Consuelo, Paula Toller e Fernanda Takai) as que ganharam reconhecimento chegando ao mainstream, são apontadas como referência e traçam uma linha até chegar aos anos 2000. É na cena alternativa da Bahia que Pitty, apelido de Priscilla Novaes Leone, começa a fundamentar sua carreira na música. Nascida em Salvador em 7 de outubro de 1977, Pitty passou sua infância e adolescência em Porto Seguro, onde o pai, que era músico e dono de bar, a influenciou com canções de Raul Seixas e clássicos dos anos 1960 e 1970, como Beatles e Elvis Presley. Foi assumindo os vocais da Inkoma, de 1995 a 2001, na qual era a única mulher, e fazendo parte do grupo de meninas Shes, em que tocou como baterista ao lado de Carol Ribeiro (guitarra), Liz Bee (guitarra e vocal) e Lu (baixo), de 1997 a 1999, que Pitty passou a trilhar seu caminho rumo à banda que hoje faz com que seu apelido seja conhecido em território nacional. Conforme comenta Cristiane Pawlowski: “[...] Pitty, encontrou no rock a possibilidade para o seu grito de indignação e revolta, de perplexidade diante das regras da sociedade, da aversão à discriminação pela aparência.”(2013, p.98). Com o fim da Inkoma, grupo de hardcore com o qual gravou sua primeira fita demo e lançou o CD Influir, em 2000 Pitty seguiu em frente. Foi estudar música na Universidade Federal da Bahia, e começou a compor suas próprias letras. Após receber uma ligação de Rafael Ramos, com quem havia lançado o CD do Inkoma pelo selo Tamborete Entertainment, Pitty foi ao Rio de Janeiro. Com Rafael
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Ramos, filho do dono da Deckdisc e atual produtor da gravadora, aliado aos três melhores músicos que ela conhecia na época, Peu Sousa (guitarrista), Joe Gomes (baixista) e Duda Machado (baterista), Pitty gravou o primeiro CD da banda que levava seu apelido como um nome temporário que acabou se tornando permanente. Esse primeiro disco ganhou o nome de Admirável Chip Novo, em referência ao livro do escritor britânico Aldous Huxley, Admirável Mundo Novo (1932), que narra um futuro distópico em que a humanidade, dividida por castas, é pré-condicionada biológica e psicologicamente a viver em harmonia com as leis e regras sociais. Gravado no estúdio Tambor (RJ), o álbum foi lançado em 2003 já pela Deckdisc e conta com as faixas: Máscara, Admirável Chip Novo, Teto de Vidro, Equalize, Temporal, entre outras. Além de ter sido o disco de rock mais vendido no Brasil em 2003, conquistando Disco de Platina, Admirável Chip Novo recebeu indicação ao Grammy L atino de 2 004 como Melhor Álbum de Rock Brasileiro. Máscara, primeira música de divulgação do disco, escrita por Pitty quando ainda fazia parte da Inkoma, fez parte da trilha sonora da telenovela da Rede Globo, Senhora do Destino ( 2004 - 2005), escrita por Aguinaldo Silva, que fez grande sucesso na época. A canção fala sobre assumir quem você é de fato, tirando as “máscaras” colocadas para aceitação na sociedade que repudia aquilo que não é “normal”. Diga quem você é, me diga Me fale sobre a sua estrada Me conte sobre a sua vida Tira a máscara que cobre o seu rosto Se mostre e eu descubro se eu gosto Do seu verdadeiro jeito de ser Ninguém merece ser só mais um bonitinho Nem transparecer consciente inconsequente Sem se preocupar em ser adulto ou criança O importante é ser você Mesmo que seja estranho, seja você Mesmo que seja bizarro, bizarro, bizarro
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Mesmo que seja estranho, seja você Mesmo que seja Meu cabelo não é igual A sua roupa não é igual Ao meu tamanho não é igual Ao seu caráter não é igual Não é igual, não é igual Não é igual I had enough of it But I don't care I had enough of it But I don't care (PITTY, Máscara, 2003)
Na canção O Lobo, também presente em Admirável Chip Novo, Pitty narra a teoria do Estado de Natureza do filósofo inglês, Thomas Hobbes13. Nela, os homens são iguais, providos dos mesmos desejos e necessidades, possuem o instinto de autopreservação, ou seja, não são sociáveis naturalmente, e por isso entram em conflito entre si, usando meios como a violência, para conseguir o que querem. Pitty, na introdução da música, conta como o homem tornou-se mau:”Houve um tempo em que os homens / Em suas tribos eram iguais / Veio a fome e então a guerra / Pra alimentá-los como animais / Não houve tempo em que o homem / Por sobre a Terra viveu em paz / Desde sempre tudo é motivo / Pra jorrar sangue cada vez mais”. Na sequência, entra o refrão com a frase: “O homem é o lobo do homem, o lobo / O homem é o lobo do homem, o lobo” ( Homo, homini lupus e m latim). A terceira estrofe continua: “Sempre em busca do próprio gozo / E todo zelo ficou pra trás / Nunca cede e nem esquece / O que aprendeu com seus ancestrais / Não perdoa e nem releva / Nunca vê que já é demais”. Com essas três estrofes, a canção, que dura pouco mais de três minutos e trinta segundos, mostra-se representativa dentro do álbum. Entre as onze faixas presentes no álbum, uma balada tornou-se grande sucesso nas paradas musicais do Brasil em 2004. Deixando o rock mais pesado de lado, em “O homem é o lobo do homem” (HOBBES, 1651). Frase presente na obra de Thomas Hobbes, O Leviatã, publicada originalmente em 1651. 13
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Equalize, Pitty mostra seu lado mais romântico. A música escrita por Pitty e Peu Sousa, contou com a participação especial de Liminha, ex-baixista de Os Mutantes. Equalize liderou o Brazil Top 20 por três semanas não consecutivas, permanecendo no chart por 14
vinte e uma semanas , algo significativo para uma mulher cantando rock, afinal, em 2004 tínhamos o sertanejo de Zezé Di Camargo & Luciano e o axé de Ivete Sangalo tocando em todos os cantos do Brasil, e artistas como Felipe Dylon, KLB e Br’Oz em seu ápice na carreira. Pitty encerrou os trabalhos do disco com o lançamento do DVD, Admirável Vídeo Novo, um compilado de vídeos em estúdio e na estrada, dois documentários (Do Mesmo Lado e Tem Alguém Lá Fora?) , e mais quatro videoclipes (Máscara, Teto de Vidro, Admirável Chip Novo e Equalize) . Em 2004, a cantora Pitty participou do Acústico MTV da banda Ira!. Juntos, cantaram a faixa Eu Quero Sempre Mais. Ainda em 2004, o guitarrista Peu Sousa resolve deixar a banda e em seu lugar entra o baiano Martin Mendonça, que antes tocou em bandas como Malefactor e Cascadura, ambas oriundas de Salvador (BA). Peu Sousa ainda colaborou com Pitty na música Déjà Vu, l ançada no segundo álbum da banda, Anacrônico. Com o repertório do primeiro álbum e agora com novo guitarrista, a banda tocou na segunda edição do Rock In Rio Lisboa em maio de 2006. Para um público de cinquenta mil pessoas, Pitty foi responsável pela abertura dos shows de bandas como Xutos e Pontapés, The Darkness e Guns N’ Roses. Em agosto daquele mesmo ano, novamente com produção de Rafael Ramos, a banda lançou o disco Anacrônico nos formatos CD, LP e DualDisc, que vinha com o videoclipe da faixa homônima, galeria de imagens e documentário sobre o disco. Em entrevista à Folhateen, Pitty contou mais sobre o novo álbum: Folha - Em que sentido o novo disco é anacrônico? Pitty - É anacrônico porque tem músicas antigas e novas e uma atualidade de sonoridade. Gravamos o disco com todo mundo tocando junto e usando o mínimo de tecnologia. E também refere-se ao momento que vivemos, ao fato de estarmos, no
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Informação obtida no site do Top40-Charts. Disponível em: <http://top40-charts.com/> Acesso em: 22 abr. 2016.
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século 21, nos deparando com problemas antigos, com questões da humanidade que 15
nunca foram resolvidas. (2005)
O lead single, Anacrônico, trouxe uma Pitty mais sombria e ainda mais crítica da sociedade. O início da letra de Anacrônico é complementar a letra de Admirável Chip Novo. Se na última, Pitty fala em ser um robô manipulado pela sociedade - “Parafuso e fluído em lugar de articulação / Até achava que aqui batia um coração / Nada é orgânico é tudo programado / E eu achando que tinha me libertado”16. - em Anacrônico ela sugere que esse controle continua se não notarmos e nos modifica de acordo com quem nos relacionamos. É claro que somos as mesmas pessoas Mas pare e perceba como seu dia-a-dia mudou Mudaram os horários, hábitos, lugares Inclusive as pessoas ao redor São outros rostos, outras vozes Interagindo e modificando você E aí surgem novos valores Vindos de outras vontades Alguns caindo por terra Pra outros poderem crescer (PITTY, Anacrônico, 2005)
Segunda canção de trabalho do álbum, Memórias f oi lançada também em 2005 e alcançou o topo das paradas musicais brasileiras. Após esse single, mais três músicas foram trabalhadas: Déjà Vu, Na Sua Estante e De Você, dessas somente Na Sua Estante teve bom desempenho. A canção romântica tocou muito nas rádios e é hoje, uma das principais músicas do repertório da banda nos shows. Pitty é uma artista que não costuma expor sua vida pessoal na mídia. Apesar disso, mantém uma relação estreita com os fãs através de suas redes sociais e O Boteco,
Entrevista concedida ao jornalista Leandro Fortino da Folhateen em 8 de Agosto de 2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/folhatee/fm0808200509.htm> Acesso em: 14 mai. 2016. 16 Trecho da música Admirável Chip Novo d a banda Pitty, lançada em 2003. 15
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blog criado pela cantora em 2006, no qual compartilha experiências, situações de seu dia-a-dia e diversos assuntos em uma espécie de desabafo boêmio. Ai, meu querido botequim, esse balcão engordurado, aqui observando coisas e escrevendo num pedaço de guardanapo qualquer… de volta, e espero q agora o tempo, essa entidade q nos suga, me deixe frequentar mais vezes. Aqui, o mundo girando, esperando Deja Vu ficar pronto, tocando por aí. Cabeça cheia de pensamentos loucos, sempre. Vamo q vamo? Então tá, o Boteco tá vivo após um breve período de reforma e hoje é tudo por conta da casa. Até a maca, pra quem precisar no final da night. (2006)17
Como o blog O Boteco revela e o cantor Frejat acentua em entrevista à Edgard Picolli, “Pitty tem aquele discurso da garotada, fala o que a geração dela pensa, mas está à frente, porque o artista está sempre um pouquinho à frente [das outras pessoas com a mesma idade]. Nesse sentido, ela é uma grande representante da nova geração” (PICOLLI , 2008, p. 200). Na edição de 2006 do MTV Video Music Brasil (VMB), a banda venceu todos os três prêmios que concorria: Melhor Website, Melhor Videoclipe por Dèjá Vu e Escolha da Audiência. Nessa mesma edição da premiação, Pitty conheceu Daniel Weksler, baterista da banda NX Zero e seu atual marido, como contou à Revista TPM c omo o conheceu: Quando nos conhecemos eu tinha 28 e ele, 20. Foi num VMB, em 2006, numa noite em que eu tinha sido superpremiada. Menino bonito, bom papo, acabamos ficando juntos nessa noite, mas para mim não ia passar disso. Estava pela primeira vez na vida de solteira e pensava: 'Agora vou barbarizar. Vou comer todo mundo e beijar todas as bocas que aparecerem'. Mas não conseguia, não sou assim. E aí acordei no dia seguinte pensando no Daniel. Ele me ligou, a gente saiu e descobri que ele era muito mais que um menino bonitinho18.
Texto Back to the Bar escrito por Pitty para O Boteco em 30 de Abril de 2006. Disponível em: <http://www.pitty.com.br/boteco/?m=200604> Acesso em: 7 mai. 2016. Este é o primeiro texto publicado no blog. 18 Retirado de entrevista concedida à jornalista Renata Leão, Revista TPM, e m Outubro de 2009. Disponível em: <http://revistatrip.uol.com.br/tpm/pitty> Acesso em: 10 mai. 2016. 17
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No ano seguinte, Pitty ficou grávida de Daniel e perdeu o bebê. Para ela, foi “um susto engravidar e um susto perder o bebê”19. Pitty estava grávida de três meses. Pitty fez planos de compor músicas durante a gravidez, aproveitar a “sensibilidade”, parou de beber e fumar. Segundo a cantora, a noite na qual perdeu seu filho, foi a pior de sua vida: “Passei um tempo péssima porque, além de mim, tinha as pessoas querendo saber. Um momento tão íntimo e ainda tinha que pensar em nota pra imprensa20”. Apesar do baque em perder seu bebê, o ano de 2007 foi de muito trabalho para Pitty. Em setembro, após a turnê do disco Anacrônico, a banda lançou seu primeiro DVD ao vivo, {Des}Concerto ao Vivo. Gravado em São Paulo, o CD/DVD rendeu as canções inéditas Pulsos, trabalhada como música de divulgação do material, e Malditos Cromossomos, que traz crítica social. Composta por Pitty e Martin Mendonça, Malditos Cromossomos trabalha com o conceito de identidade do ser, já que os cromossomos constituem uma sequência do material genético, o DNA, que possui os genes que determinam nossas características físicas mais peculiares como cor dos olhos, cabelos e pele, por exemplo. É o que Pitty entoa nos primeiros versos da canção: “Todas as características / Explícitas ou escondidas / Físicas, psíquicas / Genética ou adquirida / Raiva competitiva / Apatia desmedida / Ângulo fora do esquadro / Objeto fálico”21. No primeiro refrão, Pitty e Martin usam o recurso da paronomásia para iniciar sua crítica social: “Ah! Malditos cromossomos!”. O “maldito cromossomos” sai com o som de “maldito como somos”, que é cantado ao final da música. A próxima estrofe da música cita a Teoria Darwinista, na qual os seres que se adaptam melhor ao ambiente, sobrevivem, se multiplicam, evoluem e terão seus descendentes como dominadores de determinado ambiente. Teoria Darwinista O fruto, o meio e a iniciativa Livre-arbítrio ou prisão Genealogia da exclusão Tanta coisa já contida E o exemplo ao longo da vida Retirado de entrevista concedida à jornalista Renata Leão, Revista TPM, e m Outubro de 2009. Disponível em: <http://revistatrip.uol.com.br/tpm/pitty> Acesso em: 10 mai. 2016. 20 Retirado de entrevista concedida à jornalista Renata Leão, Revista TPM, e m Outubro de 2009. Disponível em: <http://revistatrip.uol.com.br/tpm/pitty> Acesso em: 10 mai. 2016. 21 Trecho da música Malditos Cromossomos (2007). 19
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Espécie de bagagem Um dia sempre pesa na viagem (PITTY e MENDONÇA, Malditos Cromossomos, 2 007)
Com seu primeiro álbum ao vivo, Pitty recebeu sua segunda indicação ao Grammy Latino em 2008 para Melhor Álbum de Rock Brasileiro. O disco perdeu o prêmio para Cidade Cinza d o CPM 22. Em 14 julho de 2009, Pitty lançou o single Me Adora, primeira música do seu terceiro álbum. A música gerou certo burburinho na mídia por conter a palavra “foda” no refrão. Ao portal UOL, Pitty disse o que pensa sobre o uso da palavra: Foda não é palavrão há muito tempo, as pessoas não usam mais como conotação sexual. Para a minha geração é adjetivo, e era a única palavra que eu podia usar para dizer o que eu queria naquele momento. A língua muda, senão ainda estaríamos nos tratando 22
por 'vossa mercê'.
No mês seguinte, Pitty lançou seu terceiro álbum de estúdio, Chiaroscuro. O disco foi produzido novamente pelo produtor Rafael Ramos e masterizado em Los Angeles pelo engenheiro de som Bernie Grundman, que possui no currículo trabalhos como Thriller de Michael Jackson e Purple Rain de Prince, além de ter trabalhado com outros artistas como Beck, Neil Young e U2. Pitty contou à Mariana Tramontina do UOL sobre a escolha do nome de seu terceiro álbum: “Chiaroscuro é uma palavra italiana para ‘claro e escuro’, e também uma das técnicas de pintura de Leonardo Da Vinci. Quando estávamos gravando, percebi que as músicas tinham um contraste em termos de sonoridade23”. A cantora revelou a Paulo Terron da Rolling Stone como foi o processo de gravação do disco e as inspirações:
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Entrevista concedida à Mariana Tramontina do portal UOL em 9 de agosto de 2009. Disponível em: <http://musica.uol.com.br/ultnot/2009/08/09/pitty-abusa-de-referencias-literarias-em-chiaroscuro-e-come nta-faixa-a-faixa.jhtm> Acesso em: 14 mai. 2016. 23 Entrevista concedida à Mariana Tramontina do portal UOL em 9 de agosto de 2009. Disponível em: <http://musica.uol.com.br/ultnot/2009/08/09/pitty-abusa-de-referencias-literarias-em-chiaroscuro-e-come nta-faixa-a-faixa.jhtm> Acesso em: 14 mai. 2016.
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Pela primeira compusemos fazendo jam sessions. A gente tocava 30 minutos, improvisando, e depois editava - 'Pô, isso aqui pode ser uma parte A, aquilo pode ser refrão, legal esse riff'. [...] Também entrei numa de tango, o drama... A ‘cortação’ de pulso, acho do caralho! [...] Vão comparar com a Jovem Guarda, o que até faz sentido, 24
já que ela era um reflexo do que estava acontecendo na música lá fora [nessa época].
No final de setembro de 2009, a banda iniciou em Buenos Aires, na Argentina, sua quarta turnê, a Turnê Chiaroscuro, que mesclou o repertório dos três álbuns da banda e contou com 78 apresentações - duração de pouco mais de um ano e meio na estrada. E em outubro, lançou o DVD Chiaroscope, com vídeos para todas as músicas do álbum, gravados durante as sessões da banda no estúdio e ensaios. Dando continuidade à divulgação do disco, Pitty escolhe a faixa Fracasso para ser o segundo single de Chiaroscuro. Lançada em fevereiro de 2010, a música é segundo Pitty “bem humorada25” e fala sobre pessoas que não aceitam o seu fracasso e desdenham do sucesso dos outros. O que trago sobre os ombros É meu e é só meu Sustento sem implorar a benção e o pesar Mais vil é desdenhar do que não se pode ter… (PITTY, Fracasso, 2009)
A música ainda cita a fábula de Esopo26, A Raposa e as Uvas, na qual a raposa morrendo de fome passa por uma videira com uvas maduras e viçosas, tenta então pegá-las, mas não consegue alcançá-las e é vencida pelo cansaço. A raposa então, vai embora dizendo que as uvas estavam verdes, azedas e que não lhe seriam úteis. Pitty introduz as “uvas verdes” no refrão de Fracasso. Vive tão disperso,
Entrevista concedida à Paulo Terron da Revista Rolling Stone, edição 34 - julho de 2009. Disponível em: <http://rollingstone.uol.com.br/edicao/34/reconfigurando-o-caminho> Acesso em: 15 mai. 2016. 25 Sonora da cantora Pitty comentando faixa a faixa do álbum Chiaroscuro. Disponível no YouTube: <https://www.youtube.com/watch?v=Ht3c043gvmk> Acesso em: 15 mai. 2016. 26 Fabulista grego, nascido na Trácia (região da Ásia Menor), do século VI a.C. Disponível em: <http://pensador.uol.com.br/autor/esopo/biografia/> Acesso em: 15 mai. 2016. 24
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Olha pros lados demais Não vê que o futuro é você quem faz Porque o fracasso lhe subiu a cabeça Atribui ao outro a culpa por não ter mais Declara as uvas verdes, mas não fica em paz Porque o fracasso lhe subiu a cabeça. (PITTY, Fracasso, 2009)
A canção “humorada” de Pitty nos faz pensar o quanto dessas pessoas existem, que por não possuírem o que outros batalharam para ter, simplesmente desprezam, desdenham e torcem contra para que tudo dê errado com o outro, esquecendo-se de olhar para si mesmos e tentar mudar suas vidas. É o que Pitty canta em outros versos da música. O maestro bem falou A ofensa é pessoal Quem aponta o traidor É quem foi traído Já sabe o que é cair, Ao menos tentou ficar de pé E, vítima de si, despreza o que nunca vai ter O mais verde é sempre além Do que se pode ter (PITTY, Fracasso, 2009)
Como último single do Chiaroscuro, Pitty escolheu a romântica Só Agora. A música, segundo a cantora, foi escrita por ela enquanto estava sozinha, tocando violão e cantando baixinho em seu quarto27. Só Agora f oi composta para ser uma canção de ninar: “Baby, tanto a aprender / Meu colo alimenta você e a mim / Deixa eu mimar você, adorar você / Agora, só agora”28. Além de representar os sentimentos de uma mãe que diz ao filho o quanto o ama e estará presente para o que precisar, mas que quando ele crescer, o deixará ir embora para que viva a sua vida: “Porque um dia eu sei / Vou Sonora da cantora Pitty comentando faixa a faixa do álbum Chiaroscuro. Disponível no YouTube: <https://www.youtube.com/watch?v=Ht3c043gvmk> Acesso em: 15 mai. 2016. 28 Trecho da canção Só Agora, PITTY (2009). 27
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ter que deixá-lo ir”29, continua a canção. Curiosamente, a música não tem relação com o aborto espontâneo que a cantora sofreu em 2007. Após ser questionada inúmeras vezes por suas amigas sobre como é ser mulher hoje em dia, dando conta de tanta coisa e ainda ficar linda para dar atenção ao namorado, Pitty saiu em busca dessa resposta, releu o livro O Segundo Sexo da escritora, filósofa e feminista francesa Simone de Beauvoir, e dele saiu uma frase do refrão de Desconstruindo Amélia, canção escrita por ela e Martin Mendonça. Quando diz: “[...] já não quer ser o outro / hoje ela é um também”, P itty trabalha a ideia de Simone de Beauvoir de que, “o outro só se coloca na condição de outro quando ele elege alguém para ser o um”, a mulher inconscientemente sempre elegeu o homem como este “um”, o referencial. Para Pitty, esse panorama mudou, e a mulher hoje elege ela mesma como esse “um” como referencial30. A música serve também de contraponto à canção Ai que Saudades da Amélia de Mário Lago e Ataulfo Alves. Lançada em 1942, a música tornou-se sinônimo de mulher submissa. Nunca vi fazer tanta exigência Nem fazer o que você me faz Você não sabe o que é consciência Não vê que eu sou um pobre rapaz Você só pensa em luxo e riqueza Tudo o que você vê, você quer Ai meu Deus que saudade da Amélia Aquilo sim que era mulher Às vezes passava fome ao meu lado E achava bonito não ter o que comer E quando me via contrariado dizia Meu filho o que se há de fazer Amélia não tinha a menor vaidade Amélia que era a mulher de verdade
Trecho da canção Só Agora, PITTY (2009). Conteúdo retirado de sonora da cantora Pitty comentando faixa a faixa do álbum Chiaroscuro. Disponível no YouTube: <https://www.youtube.com/watch?v=0GIGjMCHO_o> Acesso em: 15 mai. 2016. 29 30
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(LAGO, Mário / ALVES, Ataulfo - Ai que Saudades da Amélia, 1 942)
Pitty começa a canção falando de uma mulher prendada e do lar, que cuida do filho e marido, mas que esquece de si própria; a mulher que rejeita sua liberdade para a vida doméstica. Porém, essa mulher se cansa da rotina e deixa de ser apenas a mulher do lar para ser a mulher que quiser. A que cuida dos filhos; a que estuda e trabalha fora, mesmo ganhando menos que o namorado ou marido; e a que faz tudo isso, é vaidosa, se cuida e vai na “night f erver” como Pitty fala. Já é tarde, tudo está certo Cada coisa posta em seu lugar Filho dorme, ela arruma o uniforme Tudo pronto pra quando despertar O ensejo a fez tão prendada Ela foi educada pra cuidar e servir De costume esquecia-se dela Sempre a última a sair Disfarça e segue em frente Todo dia, até cansar E eis que de repente ela resolve então mudar Vira a mesa, Assume o jogo Faz questão de se cuidar Nem serva, nem objeto já não quer ser o outro hoje ela é um também A despeito de tanto mestrado Ganha menos que o namorado E não entende o porquê Tem talento de equilibrista ela é muitas, se você quer saber Hoje aos trinta é melhor que aos dezoito Nem Balzac poderia prever
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Depois do lar, do trabalho e dos filhos Ainda vai pra night ferver Disfarça e segue em frente (1x) (PITTY, Desconstruindo Amélia, 2009)
No final de 2010, Pitty se casou com Daniel Weksler após quatro anos de namoro. Os dois fizeram a cerimônia em um bar em São Paulo e a cantora usou sua conta no Twitter para informar a novidade, tuitou: “ops, casei”.31 Mesmo com o casamento recente, Pitty não pisou no freio. Em 2011, a cantora iniciou sua quinta turnê, A Trupe Delirante em Turnê, no dia 11 de maio em São Paulo. E já no dia 13, lançou seu segundo álbum ao vivo, A Trupe Delirante no Circo Voador. Com este disco, Pitty recebeu sua terceira indicação ao Grammy L atino, novamente na categoria Melhor Álbum de Rock Brasileiro. A banda perdeu para Caetano Veloso e o álbum MTV Ao Vivo: Zii e Zie. Ainda em 2011, após a banda terminar a turnê e entrar de férias, Pitty e Martin Mendonça resolveram usar as férias para lançar o projeto intimista Agridoce. Ao Portal G1, Pitty afirmou: “Sou meio 'musicaholic', mas pode ser que num outro momento sinta vontade de fazer outra coisa. Gosto de produzir, criar, isso me faz feliz. Quem sabe nas próximas férias eu não viaje... Para assistir a algum festival lá fora32”. Em uma espécie de folk, o duo gravou o disco em uma casa na Serra da Cantareira. Sem nenhum instrumento elétrico, os dois usaram violão, piano, colheres, batida de uma porta, enfim, tudo o que fizesse som diferente. Pitty contou à Andréia Silva, da Saraiva Conteúdo, que Agridoce “foi despretensioso, mas foi também uma vontade de experimentar33”. O Agridoce saiu em turnê pelo Brasil, lançou o DVD Multishow Registro: Agridoce - 20 Passos e m 2012 e ainda tocou na edição de 2013 do Lollapalooza Brasil. Mas nem só de momentos bons seria o ano de 2013, pelo contrário. Três fatos que ocorreram naquele ano balançaram a cantora. Primeiro, um susto. Pitty foi internada
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Tuite da cantora Pitty em 23 de dezembro de 2010. Disponível em: <https://twitter.com/pitty/status/18001621543813120> Acesso em: 21 mai. 2016. 32 Entrevista concedida à Braulio Lorentz, Portal G1. 2011. Disponível em: <http://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2011/11/pitty-cria-projeto-agridoce-em-vez-de-sair-de-ferias-sou-m eio-musicaholic.html> Acesso em: 21 mai. 2016. 33 Entrevista de Pitty e Martin Mendonça para Andréia Silva da Saraiva Conteúdo. 2011. Disponível em: <http://www.saraivaconteudo.com.br/Entrevistas/Post/42247> Acesso em: 21 mai. 2016.
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e ficou uma semana na UTI após perder muito sangue, devido a uma crise de hipotireoidismo , uma doença autoimune, isto é, nossos anticorpos ao invés de proteger nosso corpo de bactérias, vírus, toxinas e até mesmo stress, passa a atacá-lo organismo, tecidos e órgãos34. “Achei que era uma menstruação forte. Quando dei por mim, estava tendo um choque hemorrágico. Perdi muito sangue, tive que fazer transfusões e usar um cateter na veia do pescoço”, disse a cantora à TPM
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(2015). A
cantora fez tratamento com endocrinologista, terapia para lidar com transtorno de ansiedade, perfeccionismo e fragilidade, e mudou hábitos alimentares. Segundo, uma perda. O ex-guitarrista da banda, Peu Sousa, foi encontrado morto em sua casa em Salvador com um cinto amarrado ao pescoço. A motivação para o suicídio ainda é incerta, mas Peu estava brigado com a mulher Monique Ferrari, que tinha saído de casa com os dois filhos após uma briga entre o casal. Em sua conta no Twitter, Pitty escreveu: “muito, muito triste com essa notícia. tanta história partilhada desde a adolescência... fica na memória o músico incrível que ele sempre foi”.36 Terceiro, uma surpresa. Ainda em 2013, o baixista Joe Gomes, que estava na banda desde sua formação em 2003, deixa a banda e processa Pitty por direitos trabalhistas. “Nunca imaginei que ele faria isso. Pra mim, foi uma espécie de morte, mesmo que simbólica”37. Em entrevista à Rodrigo Ortega do G1, Pitty afirmou: “É muito triste você ver uma pessoa jogar fora seu caráter e honra por causa de dinheiro”.38 Como lidar com todos esses problemas e dar a volta por cima? Para Pitty, a resposta foi compor músicas. E foi de um ano turbulento em sua vida, que a cantora lançou em 2014 o seu quarto álbum de estúdio, Setevidas. Gravado no Estúdio Madeira, novamente produzido por Rafael Ramos e agora mixado pelo britânico Tim Palmer conhecido por seus trabalhos com Ozzy Osbourne, U2 e Pearl Jam - o álbum foi gravado já com Guilherme Almeida no baixo, que entrou no lugar de Joe Gomes. 34
O que são doenças autoimunes? NEDAI (Núcleo de Estudos de Doenças Autoimunes - Sociedade Portuguesa de Medicina Interna. Disponível em: <http://www.nedai.org/informacao.aspx?id=12> Acesso em: 22 mai. 2016. 35 Entrevista concedida à Natacha Cortêz da Revista TPM. 2015. Disponível em: <http://revistatrip.uol.com.br/tpm/pitty-depois-da-tempestade> Acesso em: 22 mai. 2016. 36 Tuite da cantora Pitty em 6 mai. 2013. Disponível em: <https://twitter.com/pitty/status/331435909658578946> Acesso em: 22 mai. 2016. 37 Entrevista concedida à Natacha Cortêz da Revista TPM. 2015. Disponível em: <http://revistatrip.uol.com.br/tpm/pitty-depois-da-tempestade> Acesso em: 22 mai. 2016. 38 Entrevista concedida a Bruno Ortega do G1. Disponível em: <http://g1.globo.com/musica/noticia/2014/06/pitty-lanca-disco-que-reflete-periodo-dificil-e-experiencia-d e-quase-morte.html> Acesso em: 22 mai. 2016.
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Setevidas c onta com dez faixas e foi gravado ao vivo, com a banda no estúdio. “Gosto desse tipo de gravação. Exige uma concentração maior e demora um pouquinho mais, porque é uma coisa coletiva muito forte, sempre a busca pelo melhor take válido pra todo mundo”, contou a cantora na publicação do Correio.39 O álbum é o grito da cantora à descoberta do hipotiroidismo, a uma perda, a uma traição e a um aborto. “Na Bahia, a gente diz: 'O que não mata, engorda'. É um clichê, mas uma verdade. O que não me destruiu, me fortaleceu. É por isso que esse trabalho é uma espécie de vômito. Eu precisava expurgar tudo o que me aconteceu”, disse a cantora à TPM40 sobre Setevidas. Sua doença é retratada já na faixa título, quando diz: “Era um mar vermelho” (em alusão ao sangue que perdeu quando sofreu disfunção hormonal) / “Me arrastando do quarto pro banheiro / Pupila congelada / Já não sabia mais de nada” (a cantora foi diagnosticada com hipotireoidismo após uma semana na UTI) / “É besta assim esse quase morrer” (sensação de que iria morrer após o susto) / “Desconcertante perceber / Que as coisas são / E tudo floresce a despeito de nós.” E a música continua: “Pálido, doente / Rendido, decadente / Viver parece mesmo / Coisa de insistente” ( aqui a luta da cantora para continuar vivendo, mesmo estando ‘pálida e doente’). Então a cantora passa a reagir, a lutar contra o que a atinge, em uma espécie de fênix, que ressurge das cinzas: “A postura combativa / Ainda tô aqui viva / Um pouco mais triste / Mas muito mais forte / E agora que eu voltei / Quero ver me aguentar / Só nos últimos cinco meses / Eu já morri umas quatro vezes / Ainda me restam três vidas pra gastar.” Nos últimos dois versos, Pitty fala de sua relação com gatos, que atribui-se a crença de que este animal possui sete vidas. A cantora tem dois gatos: Billie e Charlie. Na capa do álbum Pitty está ao lado da gata Nêga, que morreu dias após a sessão de fotos do disco. Há também o verso: “O que sobra é cicatriz,” esse da música Serpente, segundo single do disco e faixa que encerra o álbum. A cicatriz que Pitty fala é a que ficou por ter usado o cateter na veia do pescoço. Sobre Serpente, Pitty disse que a faixa possui “uma célula de afoxé no agogô”, e completa “Queria descobrir e tentar unir coisas
Entrevista concedida à Camila Jasmin do Correio (BA), 2014. Disponível em: <http://www.correio24horas.com.br/detalhe/noticia/com-nova-banda-pitty-lanca-o-autoral-sete-vidas-seuquarto-album/?cHash=859a4126685aa619471e1262d384fc22> Acesso em: 22 mai. 2016. 40 Entrevista concedida à Natacha Cortêz da Revista TPM. 2015. Disponível em: <http://revistatrip.uol.com.br/tpm/pitty-depois-da-tempestade> Acesso em: 22 mai. 2016. 39
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rítmicas diferentes com o rock pra ver o que rolava”, contou à Thais Valverde do site MixMe41. Serpente é como um renascer de Pitty para a vida, jogando toda a tristeza e solidão embora, principalmente quando fala no refrão: “A sustentação é que a manhã já vem / Logo mais a manhã já vem”. Essa manhã que virá, é a chance de mudar sua vida, de deixar as coisas ruins para trás e seguir em frente. É o que Pitty fala ao citar o uróboro, isto é, a serpente que engole a própria cauda e representa o eterno recomeço da vida42: “Chega dessa pele, é hora de trocar / Por baixo ainda é serpente / E devora a cauda pra recomeçar”. Além disso, Pitty canta no refrão o mantra Om Namah Shivaya, 43
que traduzindo do sânscrito para o português, significa “Eu honro Deus que habita em mim” (Om: é o som primordial, de onde surgiu todo o Universo. Namah: significa reverência. Shivaya: louva Shiva, Deus hindu que elimina os pensamentos negativos, 44
traz equilíbrio interior e proteção espiritual) . Em entrevista ao portal Virgula Música, quando questionada se a sonoridade leve, tranquila e de esperança de Serpente era reflexo do seu estado atual, Pitty disse que: “Sim. E é por isso que ela é a última do disco, porque é o último capítulo dessa história. Eu tenho gostado da bonança, essa querida estranha”.45 Não bastasse o álbum lançado, Pitty ainda lançou o livro de visual Pitty Cronografia: Uma Trajetória em Fotos, no qual é mostrada sua vida desde a infância até o auge do sucesso, tudo através de fotos. Caroline Bittencourt, Otavio Sousa, Rui Mendes, Sora Maia e Jorge Bispo são alguns dos fotógrafos que fizeram os registros. Com o álbum lançado, como de costume, Pitty saiu em turnê, sua sexta em onze anos de carreira da banda. A Turnê Setevidas cruzou o Brasil com shows em São Paulo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Ceará, só para citar alguns dos estados. Em 2015, a
Entrevista à Thais Valverde do site MixMe. Disponível em: <http://mixme.com.br/novidades/pitty-mostra-o-poder-de-se-reinventar-no-disco-setevidas/> Acesso em: 22 mai. 2016. 42 Planeta Sustentável. O uróboro e a sustentabilidade. Disponível em: <http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/atitude/preservar-meio-ambiente-mudanca-humana-acoesdiarias-680562.shtml> Acesso em: 23 mai. 2016. 43 Dialeto clássico e um dos 22 idiomas oficiais da Índia. Linguagem religiosa do hinduísmo, budismo e jainismo. Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/o_que_e/sanscrito.htm> Acesso em: 23 mai. 2016. 44 STARLING, Emilce Shrividya. Aprenda a entoar um mantra especial. Site Vya Estelar. Disponível em: <http://www2.uol.com.br/vyaestelar/mantra_shiva.htm> Acesso em: 23 mai. 2016. 45 Entrevista concedida ao portal Vírgula Música. 2014. Disponível em: <http://virgula.uol.com.br/musica/pitty-fala-de-setevidas-e-reflete-sobre-perdas-usei-tudo-como-escada-eaprendizado/> Acesso em: 23 mai. 2016. 41
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turnê desembarcou no festival Lollapalooza Brasil. Foi a segunda vez que a cantora tocou no festival, a primeira com sua banda. Para Rolling Stone, Pitty disse o que essa turnê tinha de mais particular em relação às demais turnês que fez. Acho que é a turnê mais profissional que já fizemos. E a mais coesa artisticamente, a meu ver. Tudo foi pensado com cuidado nos detalhes, a estética visual, as projeções criadas para cada música, a luz desenhada para contar essa história. Sentei com os técnicos e fui criando junto a eles coisa por coisa. Sonoramente também está diferente, com a adição de outros elementos – como lap steel, teclados, percussões e mais vozes. Isso trouxe mais texturas para o som. Eu também uso pedal de voz e os efeitos são “tocados” ao vivo, junto à banda. Ainda é um show de rock, vigoroso, intenso – mas há 46
essas sutilezas artísticas que vêm com o tempo e ajudam a aprofundar a coisa toda.
Ainda em 2015, Pitty lançou seu quarto documentário, o Pela Fresta, que mostra todo o processo de gravação do disco Setevidas e ainda traz o videoclipe de Um Leão, que se tornou o terceiro single do álbum. Em 2016, Pitty foi anunciada como uma das atrações da turnê Nivea Viva Rock Brasil, que celebrou o rock nacional em sete shows gratuitos em Porto Alegre, Rio de Janeiro, Recife, Fortaleza, Salvador, Brasília e São Paulo. Pitty cantaria sucessos do rock como Tempo Perdido do Legião Urbana, Ovelha Negra de Rita Lee, entre outros, ao lado dos Paralamas do Sucesso, Paula Toller, Nando Reis e Dado Villa-Lobos. Mas no dia primeiro de abril, dia da mentira e dois dias antes da primeira apresentação da turnê, a cantora contou uma novidade aos fãs. Estava grávida. Posteriormente, Pitty cancelou todos os shows da turnê e demais compromissos profissionais devido a um encurtamento do colo do útero, que torna a gravidez de risco. Quanto às demais apresentações do Nivea Viva Rock Brasil, a organização do evento colocou a cantora Marjorie Estiano para substituir Pitty. Mesmo longe dos palcos, Pitty continuou a todo vapor nas redes sociais interagindo com os fãs e preparando o lançamento do seu novo DVD ao vivo, o Turnê SETEVIDAS - Ao Vivo. Gravado na Audio Club e m São Paulo no ano passado, o registro da Turnê Setevidas f oi lançado no simbólico dia 13 de julho, Dia do Rock. Para Entrevista concedida a Lucas Brêda do site da Rolling Stone, 2015. Disponível em: <http://rollingstone.uol.com.br/noticia/lollapalooza-2015-pitty-apos-tocar-com-agridoce-retorna-ao-festiv al-com-guitarras-show-mais-profissional-da-carreira/#imagem0> Acesso em: 23 mai. 2016. 46
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Bernardo Araújo, de O Globo, neste trabalho Pitty mostrou “maturidade e bom gosto, sem esquecer o peso e a agressividade47”, ao fazer um DVD diferente dos demais de sua carreira. Além do show, o DVD contou com o documentário intitulado Dê um Rolê, que mostra os bastidores da Turnê Setevidas. Dê um Rolê é uma música lançada pelos Novos Baianos em 1971, e que Pitty cantou durante um show da turnê em Americana SP. Foi a única apresentação da canção na turnê. Em entrevista à Natacha Cortêz (2016) da TPM, Pitty contou qual foi a importância de cantar “Não se assuste, pessoa. Se eu lhe disser que a vida é boa. [...] Enquanto eles se batem, dê um rolê e você vai ouvir. Apenas quem já dizia, eu não tenho nada. Antes de você ser, eu sou. Eu sou, eu sou, eu sou o amor da cabeça aos pés”, naquele momento em que esteve grávida: [...] Entoar o mantra “eu sou amor da cabeça aos pés” bem alto, num palco e fora dele, é catártico e absolutamente necessário num momento como este. Essa música vem de uma memória de infância. Sempre bateu forte em mim. Já adolescente, pesquisando psicodelia brasileira, encontrei uma versão ao vivo de Gal, num disco de 71, se não me engano. Visceral, rasgada, urgente. É nessa versão que me baseio. O que está no DVD é uma tocada só; essa foi a única vez que tocamos essa música durante a turnê.48
Com DVD lançado, Pitty voltou suas atenções inteiramente à gravidez de sua filha, batizada de Madalena e que nasceu no dia 17 de agosto. No dia seguinte, utilizando sua conta no Twitter, a própria Pitty agradeceu a todos pelas mensagens positivas em uma série de tuites: faço aqui um agradecimento coletivo por tanto amor e carinho recebidos. brigada, gente!49 bem vinda, filha. que o mundo lhe seja doce e gentil50
ARAUJO, Bernardo. Pitty mostra maturidade e bom gosto, sem esquecer o peso e a agressividade. In: O Globo, 2016. Disponível em: <http://oglobo.globo.com/cultura/musica/critica-pitty-mostra-maturidade-bom-gosto-sem-esquecer-peso-a -agressividade-19831040#> Acesso em: 3 set. 2016. 48 Entrevista concedida à Natacha Cortêz da Revista TPM. 2016. Disponível em: <http://revistatrip.uol.com.br/tpm/gravida-pitty-fala-sobre-gestacao-e-carreira-para-a-tpm> Acesso em: 3 set. 2016. 49 Tuite da cantora Pitty em 18 de agosto de 2016. Disponível em: <https://twitter.com/Pitty/status/766262897202692096> Acesso em: 3 set. 2016. 50 Tuite da cantora Pitty em 18 de agosto de 2016. Disponível em: <https://twitter.com/Pitty/status/766264612710932480> Acesso em: 3 set. 2016. 47
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e agora deixo só uma palavrinha pra vocês: puerpério. beijo tchau, até algum dia ;) 51
Pitty conquistou seu espaço no rock nacional não à toa. Saiu de um lugar onde o axé e o forró são os gêneros musicais mais populares e simplesmente foi cantar hardcore. “O surpreendente é ver que uma menina baixinha, inteligente, bem articulada saiu de uma cidade em que ser roqueiro era quase uma afronta ao establishment do axé” (PICOLLI, 2008, p.198), diz Ricardo Cruz em entrevista a Edgard Picolli. A música de Pitty atrai não só roqueiros, mas artistas de diferentes gêneros como Lulu Santos, por exemplo, referência na música pop brasileira. acho bem bacana ela cantar rock de vestido. Os clipes são ótimos, a música é muito bem realizada, os sons são muito bons, é muito profissional - e sempre em português. A Pitty é muito interessante, ainda que o rock que faça não seja o que eu consumo. (PICOLLI, 2008, p.200).
O jornalista Ricardo Cruz ainda completa: “passamos a ter outra faceta: mulher no rock. Estava faltando. A última grande mulher no rock havia sido Rita Lee”. (PICOLLI, 2008, p. 199). Para a própria Rita Lee, “Pitty é linda e tem uma voz poderosíssima!” (PICOLLI, 2008, p.199). Pitty: [...] se tornou a mais célebre mulher do rock brasileiro contemporâneo - não sem antes passar pelos perrengues que o sucesso traz. Entre mortos e feridos são cinco álbuns de canções inéditas desde que deixou a Bahia. Nenhuma outra roqueira brasileira de sua geração se equipara a sua popularidade. (CORTÊZ, 2015).
Pitty contou à TPM, que no início da carreira tinha uma atitude masculinizada apenas para se proteger de machistas, já que a mulher no rock não é tão bem aceita. “Mais velha, descobri que não queria ser como eles, queria, sim, a liberdade deles52”. A cantora usa hoje a voz que ganhou com o sucesso de anos na estrada, para defender as mulheres, causas LGBT, políticas e de direitos humanos. O uso de suas redes sociais, principalmente o Twitter, permite que essa voz seja ouvida.
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Tuite da cantora Pitty em 18 de agosto de 2016. Disponível em: <https://twitter.com/Pitty/status/766265769122496512> Acesso em: 3 set. 2016. 52 Entrevista concedida à Natacha Cortêz da Revista TPM. 2015. Disponível <http://revistatrip.uol.com.br/tpm/pitty-depois-da-tempestade> Acesso em: 22 mai. 2016.
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Quando berra no Twitter por direitos humanos não está de cabeça quente.'Penso dez vezes antes de falar ou postar qualquer coisa', garante. Pitty quer direitos iguais e uma sociedade mais justa, como sabe que sua voz ecoa, não poupa seus fãs do que pensa. E, quanto mais puder dialogar com outras mulheres, melhor. ‘Eu posso ser completamente diferente de outra mulher. Me vestir diferente, ser ideologicamente diferente, mas, se no final do dia, for julgada por gênero, ela também será. As pessoas não entendem como o machismo é nocivo pra sociedade’. (CORTÊZ, 2015).
Pitty marcou seu nome na história do rock nacional, assim como Rita Lee, Baby Consuelo, Paula Toller e Fernanda Takai fizeram, pelo simples fato de conseguir se destacar em um meio predominantemente masculino.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS Conquistar o espaço majoritariamente dominado por homens, não é uma tarefa fácil para as mulheres na sociedade. Até hoje as mulheres ainda são minoria na política brasileira, por exemplo. Dos 513 deputados federais eleitos em 2014, somente 51 são mulheres, ou seja, as mulheres são apenas 9.9% da Câmara dos Deputados. Em outras áreas isso não é muito diferente, como é o caso do rock. Durante nossa pesquisa sobre o rock nacional, notamos que o Brasil teve inúmeros representantes masculinos que fizeram muito sucesso desde os anos 1950, tantos que possivelmente não conseguiríamos listar todos em uma conversa entre amigos. Infelizmente, não podemos falar o mesmo em relação aos nomes femininos desse rock, que possui mais de 60 anos de história no Brasil. Foram poucas as mulheres que seguiram o caminho do rock n’ roll e tiveram seus nomes marcados na história da música brasileira. Porém, mulheres fortes como Rita Lee, Baby Consuelo, Paula Toller, Fernanda Takai, Pitty e outros nomes como Marina Lima, Wanderléa e As Mercenárias, provaram que lugar de mulher é aonde ela quiser, inclusive no palco cantando e tocando músicas de rock. Se até os anos 2000, mulheres que desejavam ter uma banda de rock tinham apenas Rita Lee, Baby Consuelo, Paula Toller e Fernanda Takai como principais referências. Hoje, em tempos de mídias sociais, maior disseminação de informações e discursos engajados, Pitty passa a ser mais uma influencer para a nova geração, por todo o sucesso de sua carreira e, principalmente, atitude frente a música. É desse cenário de mulheres lutando por espaço no rock, que surgem as bandas que compõem a cena atual, como Far From Alaska, com Emmily Barreto no vocal e Cris Botarelli no sintetizador, lap steel e vocal; Inky, com o vocal e o synth de Luiza Pereira; Supercombo, com Carol Navarro no baixo e nos vocais, só para citar algumas. Com essa nova geração de roqueiras brasileiras, podemos observar que as mulheres passaram a assumir outras funções dentro de uma banda, como ser guitarrista, baixista, baterista ou tocar outro tipo de instrumento. Mostrando que hoje, a mulher não
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precisa ser a vocalista ou a band leader para fazer sucesso em uma banda de rock no Brasil. As mulheres do rock moderno passaram a conquistar o espaço que, talvez, não fosse possível para suas antecessoras, que deram voz à mulher no rock nacional. Essas “meninas” de hoje conseguem ser versáteis e talentosas o suficiente para ocupar toda e qualquer posição dentro de uma banda.
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APÊNDICES 1. Entrevistas 1.1 José Norberto Flesch (via WhatsApp - 09 ago. 2016 ) 1 - Como o rock é visto hoje no Brasil? Em termos de popularidade, relevância, presença nas rádios e demais meios de comunicação. Bom, o rock é muito popular no Brasil. A relevância dele é... assim, ele influencia até mesmo o pop mais popular sabe, assim, chega a influenciar a música sertaneja, e tal. Porém, a presença nas rádios é pequena, ou é rádio específica de rock, ou quase não toca. Então, assim, é uma coisa muito cultuada fora dos grandes veículos de comunicação. A TV, por exemplo, se não for um canal específico de rock você não vê rock na TV. Então, assim, ele é bem cultuado fora da grande mídia. Tem casas de shows, tem casas noturnas, selos independentes, programas específicos de rock no rádio, mas ele não está forte hoje na grande mídia.
2 - Na história do rock nacional, não tivemos tantas mulheres cantando esse gênero musical. Rita Lee, Baby Consuelo, Paula Toller, Fernanda Takai e Pitty são alguns dos poucos nomes que representaram o rock brasileiro. Por que isso acontece? Eu não concordo que não tivemos tantas mulheres cantando rock, nós tivemos várias mulheres. Você citou, assim, cantoras muito conhecidas, Rita Lee, Baby Consuelo, Paula Toller, ok, mas nós tivemos várias cantoras, e cantoras cultuadas. Syang, Bianca Jhordão, Megh Stock. Então, temos, se a gente for ver assim, desde o início, tivemos já várias cantoras, não são muitas, mas são várias, é um número bem significativo sim.
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3 - Existe preconceito do mercado musical com relação às bandas de rock formadas por mulheres? Preconceito do mercado com bandas formadas por mulheres. Não mais, isso aí é coisa dos anos, sei lá, 80, 90, não mais. Hoje já se gosta muito de mulheres no rock. Já se gosta, tem uma parte ali mais radical que tinha preconceito e tal. Eu, particularmente, sempre adorei mulher no rock, entendeu. Então, pra mim, esse negócio de preconceito, sabe, eu já ouvi alguém falar, mas eu sempre gostei. Pra mim, isso aí passou ao largo. Mas, lá atrás ok, “ah... a mulher não sabe”, você ouvia aqueles papos, “ah... homem faz uns rock melhor”, sei lá, enfim. Pra mim, não existe preconceito, porque eu gosto muito. Mas, hoje, eu não vejo preconceito nenhum. Eu sempre vejo comentários. Outro dia, um amigo meu foi ver uma banda de rock, tinha uma guitarrista, o cara “nossa cara ficou prestando atenção, queria saber o nome, oh... mais uma guitarrista do rock pra gente gostar, pra gente cultuar”, entendeu. Então, eu não vejo preconceito não cara, eu não concordo.
4 - Qual a importância da Pitty no cenário musical do Brasil, de maneira mais ampla, e no rock? Qual é a importância da Pitty. A Pitty é a artista mais popular do rock atualmente. E quando você é o artista mais popular de qualquer gênero que seja, você também influencia muito. Então ela é bem forte hoje, ela entra até...você pode fazer um festival com artistas super pop e colocar Pitty que tá tudo certo, entendeu. Ela é super popular, super querida, então, vai dar certo, dificilmente você vai errar. Então a Pitty é assim, a importância dela é que, assim, ela abriu o mercado, não só do rock, como ela foi penetrando também numa coisa mais pop, porque ela tá super forte. É a artista mais forte do rock hoje.
5 - A Pitty já lançou quatro álbuns de estúdio desde o início de sua carreira em 2003. Você acha que houve amadurecimento no som dela? De qual forma? Com 4 discos, assim, mais de 10 anos, hoje não se lança tanto disco como se lançava antes. Por exemplo, uma artista dos anos 90, anos 80, provavelmente já teria mais discos. Mas, é, hoje não dá pra ver só assim, você tem que ver como ela tá, por exemplo, a evolução do show, a evolução do discurso. De um disco pro outro
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pausadamente, você vê um amadurecimento até normal, porque ela também está mais velha, ela também está mais madura. Eu até acho bem normal, mas eu também não fico cobrando de artista amadurecimento dessa forma, entendeu. É...sei lá, vou dar um exemplo, Ramones ficou maduro do primeiro pro último disco, não sei que tipo de amadurecimento, talvez alguma coisa de letra, sabe, mas é... o som talvez menos rápido, mas assim... é aquela coisa da diversão, aquele som que a gente gostava de ouvir. Então, assim, amadureceu? Amadureceu, mas eu não fico cobrando, não ficaria cobrando, entendeu, eu acho isso uma coisa muito natural, esse amadurecimento
6 - Como a Pitty influencia para a criação de novas bandas com mulheres como vocalista? Como a Pitty influencia, pois é, o que te falei. Como ela é a mais conhecida, tem, vamos dizer assim, um fã clube maior, saem braços pra tudo quanto é lado. Então, ela passa a ser super influente, então assim, você é uma mulher, você quer entrar no rock, você pode olhar pra Pitty e falar “pô, quero ser ela, quero ser alguma coisa próxima”. Então a influência dela é muito forte, e não é só no rock. É como eu falei, de repente uma coisa mais pop, mas ela tem aquela atitude. Ou então, ela pega aquela atitude e ela quer ser ainda mais radical, ela quer fazer um heavy metal, mas com atitude da Pitty. Ou então, ela quer fazer um pop, mas assim, também com aquela coisa da Pitty. Então, ela influencia de várias formas.
7 - A Pitty está na Deckdisc, gravadora independente, desde 2003. Isso permitiu uma liberdade criativa maior no som que ela vem fazendo até então. Qual a importância de gravadoras independentes para novas bandas? Eu acho que não só pra Pitty, como pra muita gente que quer fazer rock, selo e gravadora pequena é essencial. Até porque, as gravadoras grandes que nunca gostaram tanto de rock, lá atrás no Brasil, era quase nula. A coisa se não era um rock mais pop ali nos anos 80, foi forte. Mas, fora isso, nunca se olhou tanto pro rock, que é assim, é sempre o pop, o super popular, agora é sertanejo ou, sei lá que, o pagode, ou seja lá o que for. Então, selo, assim, os selos e as gravadoras independentes são essenciais pro rock. Eu acho que não existiria hoje, eu não consigo pensar numa banda nova pra citar sem ser de algum selo. E pra mulheres no rock é a mesma coisa, não é diferente. Então,
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eu acho essencial, hoje no Brasil não vejo nenhuma maneira de uma banda chegar..., a não ser que seja, assim, alguém que foi/tocou num programa da Globo e aí, ou teve/ficou famoso num programa da Globo e aí uma gravadora grande vai e... Mas fora isso, são casos específicos. Fora isso, não vejo como não passar por uma gravadora independente, ou ficar anos numa gravadora independente.
8 - Você acredita que as gravadoras independentes são o caminho mais “fácil” para outras bandas de rock com mulheres surgirem? A 8 é bem próxima da pergunta 7. É como eu falei. Tanto faz, para mulheres ou para homens, gravadora independente é essencial. É, então, é a resposta 8 é o que eu falei na resposta 7, são bem próximas.
9 - Voltando ao assunto Pitty, como você definiria a carreira dela? A Pitty tem uma carreira consistente. A Pitty não está em baixa, muito pelo contrário, ela está super bem, está em alta agora, super pedida pra shows, enfim, toca bastante quando ela lança disco. Eu acho que ela está, assim, está numa fase muito boa da carreira. E... como a gente tem falado, desde o início das perguntas e respostas aqui, ela é super influente e tá forte. Mesmo que ela não tivesse tão forte, ela também ia continuar sendo influente. Não apareceu ainda uma cantora no rock, no momento, mais forte do que ela, entende.
1.2 Edgard Piccoli (pessoalmente - Rádio Jovem Pan - SP - 23 ago. 2016) 1 - Edgard, você está hoje na Jovem Pan, mas já trabalhou na Bandeirantes, na 89 FM. Sim, sim. De rádio, eu comecei em Campinas, a cidade onde eu nasci, numa emissora da Rede Bandeirantes. Foi lá que eu com 17 anos, comecei a trabalhar como operador de áudio e me encantei. Eu não acredito que as coisas acontecem por acaso, mas eu através de um amigo da rua, que trabalhava na rádio, ele me avisou das férias e como eu gostava muito de música, e fazia gravações em fitas cassete, já tinha essa coisa de ser locutor e tal. Ele me convidou para ir cobrir as férias. Eu fui e segui em frente. Acabaram as férias e eu continuei trabalhando. E até hoje estou de alguma forma no
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meio. Depois de trabalhar em Campinas por cinco anos, ganhar experiência já como locutor lá também; vim pra cá, pra São Paulo, trabalhei como locutor na 89. Depois, ainda na 89, ingressei na MTV, e aí foram 14 anos de MTV. Depois fiquei cinco anos no Multishow, trabalhei na Bandeirantes um ano. E essa trajetória, sei lá, 99% do tempo eu estive junto da música de alguma maneira. Um entretenimento para um público jovem. Então, é o que me formou e que me traz até aqui. Mas o rádio sempre foi uma paixão assim, desde sempre. Não só por ter começado no rádio, mas mesmo quando eu estava na televisão, o rádio sempre foi um veículo que eu gostei muito.
2 - Com todos esses anos no rádio, você pode fazer um balanço pra gente de como era o rádio quando você entrou e qual é a diferença pra hoje? Bom, a grande diferença é que o rádio não tinha tantos concorrentes. Eu acho que basicamente isso. Você tinha a televisão, o rádio e a mídia impressa, de uma forma geral. Depois o que começou a fazer uma frente ao rádio – olha como a gente vai lá longe – foram os walkmans, talvez vocês nem saibam o que é um walkman. Mas era um aparelho do tamanho, sei lá, talvez de um... bom era um gravador de fita cassete. Você punha sua fita cassete ali, e punha na cintura e um fone de ouvido. São esses tocadores de MP3 de hoje, talvez, vai nem tão mais usados, porque o telefone acabou concentrando todas as mídias de imagens, de áudio, de impressa. Então, a mudança é essa mesma. O rádio não tinha tanta concorrência como mídia. E hoje, você tem uma profusão de opções pra quem quer se informar, pra quem quer adquirir conhecimento. Então, com a Internet isso tudo mudou. A principal diferença era essa mesma. A gente vivia num mundo ainda digamos, a ser desbravado. E agora está tudo aí, exposto, escancarado pra quem quiser colher, pegar.
3 - O que mudou no rock de lá pra cá? Ah, mudou. Cara mudou. Estava conversando hoje com a banda Scalene, que veio ao programa. O que mudou? Mudou talvez a maneira de enxergar a partir de uma amplitude advinda com a Internet. Então, os movimentos musicais, o que a juventude anda produzindo em termos de música, está absolutamente acessível pra qualquer jovem que queira montar uma banda e levar adiante a proposta de ter uma banda. Então primeiro daí, você tem informação, você tem o conhecimento do que anda acontecendo.
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Se você quiser saber qual é o movimento de bandas novas na Islândia, você sabe; você tem como fazer isso, o que na época não tinha. Isso se dava de uma maneira mais lenta e muito precária: com a chegada de um disco novo de uma banda que demorava pra lançar ou alguma coisa que algum amigo que viajava trazia. Então, o que eu acho que mudou, analisando a música como um mercado. Um mercado eu não falo só parte comercial, mas a parte artística também de gente que admira o trabalho de determinada banda. Quando surgiu a grande possibilidade, o “boom” das gravadoras para o rock nacional, digamos ali nos anos 80, porque o rock já se fazia no Brasil desde muito antes; mas nos anos 80 enquanto indústria fonográfica a coisa se expandiu de uma maneira em que todo mundo que tinha lá já o seu projeto pronto, a sua banda em andamento, foi pra uma gravadora e mostrou o seu trabalho com respaldo dessa multinacional, com a estrutura dessa multinacional, com orçamentos dessa multinacional, e foram bem sucedidas. E existia um mercado a ser explorado e as gravadoras o fizeram muito bem. E as bandas surgiram com estilos muito distintos, embora ainda incipiente você pegava bandas que eram com uma característica muito própria na maneira de fazer um som. E hoje, com a derrocada desse modelo, eu acho que essa liberdade criativa de novo ganha força, porque você não tem que atender mais a uma demanda puramente comercial. Claro que você quer ficar conhecido, você quer ter um público cada vez maior, mas isso está baseado pura e simplesmente na arte que você faz. Não está baseado mais em quanta grana colocaram na tua banda pra você atingir o público e fazer sucesso. Então, eu acho que isso voltou. A democratização advinda com a Internet deu mais liberdade para que as bandas pudessem focar na música, como uma expressão artística mesmo, e não puramente comercial, mercadológico.
4 - Na história do rock nacional, a gente consegue destacar algumas mulheres que despontaram mais na cena do rock como Rita Lee, Paula Toller, Fernanda Takai e a Pitty. São até poucos nomes femininos. Porque acontece isso? Hoje talvez seja diferente por causa da Internet? Boa pergunta. O meio sempre foi um meio machista na maneira de ver. A gente poderia seguir respondendo com vários enfoques, desde o sociológico da coisa, desde o psicológico, eu não sei. O menino, ele por uma questão da sociedade machista mesmo,
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ele sempre teve a possibilidade de juntar sua turma e seu grupo de amigos. É normal o menino ir pra rua. Infelizmente a nossa cultura veio assim. Agora está mudando. E a menina não. A menina sempre ficou no resguardo, a menina ficou sempre dentro de uma redoma e oprimida ali, isso em função do machismo da nossa sociedade, talvez. Que, como todas as outras áreas, se estendeu também para o mundo do rock. Mas, acho que tem muita menina interessante fazendo arte, fazendo música, usando a música como expressão artística. A Pitty que você citou é uma delas, que vem dessa geração anos 90 / começo dos anos 2000. Ela estava ainda embrionária, mas nos anos 2000 ali já com toda a força dentro de um mercado, para sim mostrar que é possível uma mulher liderar uma banda de igual pra igual. Eu acho isso, e se você pegar exemplos no rock internacional também, você vai lembrar do quê? Da Patti Smith, que é um grande emblema de uma mulher forte, poetisa, que esteve à frente do seu projeto com bandas masculinas acompanhando. Você pega já a Chrissie Hynde com os Pretenders. Você pega a Joan Jett. Você pega as Runaways, que era uma banda de rock só de mulheres. Bom, As Mercenárias aqui na década de 80 no Brasil também, fazendo punk rock; uma banda só de mulheres levantando uma postura aguerrida frente à música, especialmente o punk rock que era o som que elas faziam. Tem nomes incríveis: Rita Lee, como uma pioneira no Brasil. É uma mulher que esteve à frente da banda mais importante, até hoje quando se fala de banda de rock, Mutantes é um emblema, não só no Brasil, mas internacionalmente. E eu acho que isso se deu por uma questão da sociedade ser machista mesmo, e ainda bem que isso dá sinais de mudança.
5 - Hoje a principal representante no rock no Brasil é a Pitty. A grande representante feminina no rock nacional é ela. Qual a importância dela não só no rock, mas também na música brasileira? Eu acho que a Pitty, mesmo que ela não tenha premeditado essa coisa de representar algo, levantar uma bandeira, ela em si, por si só, já na sua atitude já representa. Me lembro disso, os primeiros dias dela na MTV, desejando levar adiante um projeto musical, vinda de Salvador, na Bahia, tendo participado de outros projetos musicais. E aí saindo em carreira solo – Inkoma eu acho que era a banda que ela pertenceu –, já se libertando disso e saindo para colocar as suas ideias, acompanhada por uma banda de homens e tal. Já era um diferencial, mesmo quando ela era uma incógnita, ela já merecia
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um respaldo de audiência. E despertava curiosidade em querermos saber mais, “o que vem aí dessa menina?”. Começaram a vir as letras legais, as coisas interessantes que ela colocava no papel pra cantar no palco. E sim, querendo ou não, ela pra essa geração é um ícone mesmo, ela representa a imagem feminina, a resistência feminina dentro de um meio primordialmente, majoritariamente masculino.
6 - A Pitty já lançou quatro álbuns na carreira e ela está desde 2003 no mercado. Como aconteceu esse amadurecimento dela? É natural. Eu vejo de uma forma natural. Eu entendo que a Pitty é uma mulher que não perdeu o seu foco em decorrência da exposição que ela obteve. E é curioso, vocês estão me perguntando e eu estou me lembrando que ela foi muito utilizada na MTV. Qualquer programa ela estava, qualquer reportagem ela estava. Eu me lembro de uma vez que fui conversar com ela e falar: “Pitty, talvez seja o momento de segurar um pouco essa exposição”. E ela depois concordou comigo, viu que era um momento de baixar um pouco essa guarda de aparecer tanto na mídia para todos os programas, falando de música, falando de outras coisas também, fazendo reportagens para MTV. A gente queria muito que ela estivesse lá. Eu mesmo enquanto estive à frente do jornalismo, apresentando o Contato MTV, o Jornal da MTV, cheguei a conversar com ela e a falamos sobre isso: “talvez nesse momento, menos seja mais”, eu estou só ilustrando com essa história, porque frente a toda a exposição que ela teve, acho que ela seguiu bem o norte da proposta que ela tinha desde o início. Não se deslumbrando e continuando a escrever coisas relevantes mesmo, com teores sérios, letras duras, muitas vezes colocando o dedo na ferida, sem se preocupar se estaria agradando ou não gravadora, ou veículo da mídia. Isso vem com o amadurecimento. Agora eu estou muito curioso para saber como vai ser o próximo projeto dela depois de ter virado mãe. Tem toda essa história de “ah, o que a maternidade mudou na tua vida?”, e muda todo mundo, não só para um artista da música, mas para quem vive do público é realmente uma espera muito aguardada. O que vem aí, a partir dessa experiência dela como mãe? Desse processo de amadurecimento dela como indivíduo. 7 - Qual a importância da MTV para o rock nacional e até mesmo para a carreira da Pitty como você já citou aqui?
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A importância foi extrema. A MTV nessa questão foi determinante para o surgimento de bandas. Muitas bandas foram formadas em decorrência da MTV. A MTV representou para essa geração um veículo de chegada do público, e mercadologicamente falando foi a grande catapulta para produção de imagens de bandas. O videoclipe passou a ser uma ferramenta, como hoje tem tantas outras – cada banda tem sua página, o seu site, a sua mídia digital pra divulgar o trabalho –, a MTV era ainda dentro de um padrão antigo, hoje considerado antigo – que é o formato televisão, programa de televisão, shows de televisão, jornalismo e tal – era o que representava para essas bandas, para esses artistas, a via de contato com o público. Então, uma importância extrema da MTV, não só no mercado de produção de videoclipes, mas na formação de bandas mesmo. Tem toda a geração dos anos 90, que você pega O Rappa, Skank, Los Hermanos, Charlie Brown Jr., que surgiram junto com a MTV e formaram um mercado – Nação Zumbi – muito consistente, um mercado muito forte.
8 - Qual é a influência hoje da Pitty para a formação de novas bandas com mulheres? Se você tomar por base que as bandas novas, de alguma maneira, se espelham em outros nomes e sempre foi assim, mesmo que não seja de uma forma premeditada, você sempre vai estar influenciado pelo o que te toca, pelo o que te emociona. E não só na música, você pode ver uma escultura; você pode ver um quadro e se inspirar nele; você pode ler um livro; você pode ver uma notícia no jornal, que te toca e te inspira a escrever algo, a pintar algo, a esculpir algo. Então, com ela não acho que seja diferente, das pessoas buscarem de alguma maneira uma inspiração nela, embora eu veja também nessa geração uma vontade muito forte, muito arraigada de expressar a sua identidade própria. De achar a sua maneira, deixar a sua digital impressa no que está fazendo. E na música também é assim. Então, acho sim que a Pitty pode servir como uma referência para que as outras meninas se inspirem a formar uma banda de rock, e viver disso e conseguir se bancar, ter uma autonomia em função disso. Mas, eu acho que para aí. Porque a partir do momento em que você começa a botar a caneta no papel, escrever uma obra musical, o que tem que estar presente ali? Você. Porque se não for você, a tendência é você apagar logo. E a Pitty só está aí, talvez porque ela conseguiu, mesmo sendo influenciada
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por outros nomes, ser ela mesma. Expressar a identidade e imprimir a digital dela no que ela faz.
9 - A Pitty está na Deckdisc, gravadora independente, desde 2003. Isso permitiu uma liberdade criativa maior no som que ela vem fazendo até então. Qual a importância de gravadoras independentes para novas bandas? Sempre as gravadoras independentes na música tiveram uma importância de revelar novos nomes. Por quê? O que se tem por base quando você fala de uma gravadora independente? O que é uma gravadora independente? Uma gravadora não atrelada a uma multinacional, a uma major como se diz na área da indústria fonográfica. Então, o que isso representa? Independência para criar, independência criativa, criar com liberdade, poder ser você mesmo e não criar algo para atender a uma necessidade, uma demanda do que é uma moda, do que o mercado está consumindo. Por que o público também, obviamente, você sempre vai ter os movimentos populares. Você pega aí no Brasil essa questão do sertanejo, um pouco mais atrás o axé que teve sua explosão, o funk. E que aí você começa a ver uma réplica de artistas, um igual ao outro, isso aconteceu no rock também, porque o rock tem as suas oscilações em que há mais popularidade e menos popularidade. Mas esses movimentos vão sempre acontecer, vão sempre estar presentes na cultura de massa. Mas o que eu acho que a gravadora independente traz ainda, e principalmente nos dias de hoje onde existe uma liberdade maior em função disso, é a liberdade do artista ser quem ele é. Criar e desejar, e realizar o que ele quer realizar, com liberdade total e não para atender a algo.
10 - Na época em que você estava na MTV, ela ainda servia para o público como um canal para descobrir novas bandas. Hoje a MTV está focada em uma programação feita por programas importados. Quais são os outros canais que as novas bandas têm para se divulgarem? Hoje você tem aí o Bis, o Multishow de alguma forma. Me lembro de um programa que eu fazia no Multishow, o Experimente, eu acho que segue na grade de programação, o Beto Lee depois assumiu o programa. Era uma via para essas novas bandas e é uma via para esses novos nomes. Hoje em dia é difícil. A derrocada da própria MTV mesmo aconteceu em função da chegada da Internet. Isso revolucionou de uma maneira como
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há muito... Acho que da mesma forma que chegou a televisão. Que não tinha a televisão e chegou a televisão, tinha só o rádio, aí chegou a televisão e foi aquele “boom”, “nossa a televisão”, e quanto tempo a televisão está aí? Só que a maneira como as pessoas utilizam a televisão e consomem produtos para televisão foi mudando de público. Então, hoje quando você pega um jovem que não assiste televisão, porque ele vê tudo no computador ou no smartphone, isso é uma revolução de alguma forma na maneira de consumir tudo, tudo. E inclusive arte e inclusive música. Claro, tem programas de música? Tem. Na Rede Globo tem com o The Voice, agora a Bandeirantes também tem com o X-Factor. Esses realities shows formatados, que vêm mesmo produzidos e encomendados em função de uma cultura de massa. Então a música, ela passou a não bastar por si só para esses programas. Você tem que fazer um show, você tem que fazer o reality show, para você conseguir cativar a audiência e massa. Eu acho que o lugar dessas bandas novas é aonde elas sempre deveriam estar, é na estrada. É fazendo show, é divulgando por conta própria as suas coisas através das suas ferramentas digitais e indo lá para o corpo a corpo, pro show, pra apresentação ao vivo. De novo, esses meninos que vieram aqui do Scalene, eles estão divulgando o trabalho deles e saindo na estrada pra atender aos fãs que querem ver o show deles, pronto. Basta. Hoje ninguém mais é refém de uma gravadora, por exemplo. Você pode estar associado a uma gravadora, mas os modelos de contrato são outros, como no caso eles estão. A Pitty também. A Deck acho que distribui por uma grande gravadora, mas a Deck tem uma estrutura. Eu não estou bem certo quanto à Pitty, mas muitas gravadoras têm esses esquemas com as majors. “Olha, eu produzo, eu tenho a minha liberdade, é um artista meu e você tem um contrato, um acordo comigo de distribuição desse trabalho físico”, hoje que já está cada vez mais escasso. Então, eu acho que o lugar dessas bandas é aonde toda banda tem que estar, pra se mostrar verdadeira, pra se mostrar legítima, que é tocando ao vivo, tocando diretamente pro público.
11 - Qual a importância da Jovem Pan para disseminação do rock e de outros gêneros musicais? A Jovem Pan não tem como um estilo reconhecido por tratar desse gênero. A Jovem Pan, ela tem uma programação baseada numa música pop, feita fora do país e aqui no país também, em alguma proporção. Mas nunca foi a bandeira, a defesa da Jovem Pan
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levar adiante esse gênero musical. Embora no talk show que eu faço matinal aqui da rádio, a gente receba nomes da música, nomes da música alternativa, do rock, sem nenhum tipo de restrição, mas é claro, eu estaria mentindo e o meu nariz cresceria se eu dissesse que a Jovem Pan encampou alguma coisa dentro do cenário do rock alternativo. Tocou nos anos 80, tocou o que era pop. Quando o rock ficou pop, quando o rock era o pop com a mistura dessa coisa da new wave com a música nacional, das bandas surgindo lá, os emblemas do rock: o Barão, o Paralamas, a Legião, obviamente. O que é sucesso toca na Jovem Pan. Então, nas altas do rock a Jovem Pan surfa nessa onda.
1.3 Luka Salomão (pessoalmente - 89 FM - A Rádio Rock - SP - 23 ago. 2016) 1-Qual é a importância do rock hoje no Brasil em termos de popularidade, relevância? E qual a importância da 89 FM - A Rádio Rock - para a entrada de bandas nacionais na programação? A importância do rock, não só hoje, como sempre, acho que é um life style mesmo, assim, acho que é importante sempre. E pra 89, acho que ela acaba virando um foco pra quem tem banda. Sabe, assim, você..., vira um objetivo. “Ah, eu vou montar uma banda e um dia eu vou tocar na 89”. Então, isso que eu acho muito legal. E, pra quem não tem banda, é legal pra você ter uma referência do que está acontecendo, porque a gente toca coisas atuais também. E não só pelas coisas atuais, também pra você conhecer o que já passou e que você não teve acesso, então vira um pacote completo da alegria.
2- Qual é a importância de Pitty no cenário musical no Brasil, não só no rock, como para os outros gêneros de modo geral? Os outros gêneros eu não sei, assim, pro sertanejo, forró, pagode, não sei te dizer uma importância. Acho que, no geral, a Pitty é uma figura pública, néh. Não sei se, é…, pra qual estilo, eu diria assim, dos outros sem ser pro rock, mas por ser uma figura pública o nome já diz tudo. Então, ela é uma pessoa importante. Então ela tem opiniões legais, ela tem posicionamentos legais, ela é uma figura importante no Brasil. Então, essa é a posição dela, néh, então, às vezes, as coisas que ela fala tem um peso legal, néh, assim, as colocações que ela se propõe são importantes e tudo mais. Então, é…, deve ser difícil ser uma Pitty, e também interessante ser uma Pitty. Eu não gostaria de ter essa
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responsabilidade (risos), mas deve ser também muito “du caralho”. Acho que ela é uma pessoa de extrema importância pro rock pra “caralho”, porque ela é a única, assim, de uma geração ela está na frente do trenzinho de maquinista solando, néh, ela tá em primeiro lugar e o segundo tá muito embaixo. Assim, isso acontece com poucas pessoas, e ela é uma delas.
3- Como Pitty serve de referência para criação de novas bandas com mulheres à frente? Eu não tenho banda, mas assim, pra quem tem banda eu acredito que ela é o ponto principal de referência porque como ela é única. Porque assim, você vê, tinha Rita Lee lá atrás, e lógico que você tem um monte de menina, como vocal e tal de várias bandas, mas de mainstream não dá pra você dizer que tem várias, infelizmente. Então, você tem a Pitty. Mas tem, você tem Bianca Jhordão, dá pra enumerar algumas meninas assim, mas como a Pitty não tem, então ela é uma “puta duma” referência. 4- Como você (Luka) se sente hoje sendo uma das maiores audiências da 89 FM? Ai que “bunitinha” (risos/emoção). Eu acho “mô” legal, assim, eu acho legal porque no “trampo” da rádio é um negócio que, é…, eu tenho “mô” orgulho, sabe, assim, é um negócio legal pra caramba, eu acho “foda” demais. É que eu fico até meio emocionada.
1.4 Roger Moreira (Ultraje A Rigor) (pessoalmente - SBT - SP - 03 out. 2016) 1 - O Ultraje A Rigor foi fundado lá no início da década de 80, e de lá pra cá muita coisa mudou no mundo e na música. Qual o diagnóstico que você faz do rock nacional que é produzido hoje em relação ao rock feito pelo Ultraje e outras grandes bandas nos anos 80? A gente começou muito espontaneamente, assim o movimento todo. O Ultraje, por exemplo, começou... no mercado que tinha pra gente, na época, era tocar em barzinho, tocar cover de Beatles, cover dos Rolling Stones, coisas desse tipo assim. A gente era muito fã dos Beatles, então começamos a tocar essas músicas e a ideia era tocar na noite só, não tínhamos uma pretensão de gravar disco nada. Mas, a gente logo foi vendo que
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tinha outras bandas, o nosso guitarrista na época fazia parte de outra banda, e a gente começou a saber que tinha bandas na Rio, e a gente começou a compor por causa disso. O mercado, por outro lado, de barzinhos e bandas cover já tava muito saturado, era sempre as mesmas bandas que trocavam os elementos e tocavam em todos os bares ali. E a gente também tinha uma característica de não… a gente não fazia um cover muito fiel, a gente fazia uma versão nossa das músicas meio, às vezes, até avacalhada, por isso o nome Ultraje A Rigor. Agora, tinha muito idealismo naquela época, sabe, porque a gente não tinha perspectiva de tocar em rádio, de gravar disco… perspectiva de nada. A gente se reunia e falava “olha, abriu uma casa em tal lugar que dá pra gente tocar”. E você vê que as bandas daquela época tinha, “pô” o Barão era uma coisa, os Titãs é outra, o Ultraje é outra, sabe, o Kid Abelha, cada um era do seu jeito. Então, tinha muito esse idealismo, e você vê que muitas delas estão aí até hoje. Depois, a geração MTV começou muito um lance de “ah, eu sei como que faz o esquema de divulgação, eu vou usar tal visual”, sabe. era muita imagem também, que a gente não tinha internet, a gente não tinha a MTV, não tinha nada. Todo esse ambiente foi a nossa geração que criou, de loja de instrumento, de festivais de rock que começaram a tocar no Brasil e passar aqui também, enfim, rádio de rock propriamente eu vi; todo esse ambiente propício só veio depois da gente. Então, acho que essa é uma das principais características. Do que se faz hoje é pra rádio. O rock perdeu muito da força, o rock é uma coisa de contestação principalmente no Brasil, é uma coisa que não e que tem que ser bravo com alguma coisa, mas é o alternativo, o normal mesmo, o mainstream é samba, sertanejo, axé, sei lá essas coisas. O rock nos anos 80 foi uma exceção que durou bem, talvez tenha caído um pouco culpa do nosso próprio idealismo talvez.
2 - O Ultraje começou a carreira fazendo covers dos Beatles, punk e new wave. Como é ver hoje novas bandas fazendo covers das músicas de vocês? (Risos) Eu fico muito contente né, claro. E tem bandas fazendo cover da gente, e o Ultraje A Rigor tem músicas suas em punk, thrash-metal, bossa nova, axé, sertanejo, pagode, eu acho legal, não que eu curta todas essas versões, mas assim, eu acho legal que elas tenham sido feitas. E, “pô”, bacana a gente fez uma coisa que ficou aí, Nem era nossa intenção inicial, mas hoje a gente pode afirmar que entrou pra história da música brasileira
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3 - O álbum Nós Vamos Invadir sua Praia de 1985 é considerado um dos maiores clássicos do rock nacional. Como é ver as músicas desse álbum tão atuais ainda na cena política do Brasil? Obrigado, mas é mesmo (risos) [com relação ao disco ser um dos clássicos do rock nacional]. Verdade, sabe, é um cuidado que eu tive baseado nos meus ídolos. Porque lá quando eu tinha, sei lá, 13/14 anos tal, eu ouço música desde muito cedo, toco violão desde os 8/9 anos de idade, mas meus ídolos era uma coisa de não tocar na rádio, foi até uma escolha minha financeira, vamos dizer, com o meu dinheiro de mesada não dava pra comprar um disco, não dava não, eu não queria comprar um disco que tocava na rádio eu queria comprar uma outra coisa pra aproveitar mais o dinheiro, sei lá. E eu gostava de rock e comecei a pesquisar mais, o que hoje em dia são todas muito populares como Black Sabbath, Deep Purple, Led Zeppelin, assim, mas que na época era meio underground também. E os discos que a gente comprava eram atemporais, discos dos Beatles, dos Stones, não tinha essa coisa de assim “essa é minha música de trabalho e o resto não presta”, sabe, era o disco inteiro. Foi uma época de muitas mudanças no mundo, então, época de psicodelismo, de movimentos feministas… sabe, de muitas coisas. E depois vem o punk e o new wave que também era mais político e tal, e no Brasil teve uma época que você precisava falar por analogias, você tinha que esconder o que você falava por causa da censura. Então, foi juntando tudo isso que eu formei meu jeito de escrever. Eu não me julgo um compositor, é uma vocação minha, não, eu faço com bastante esforço e tal, e é muito pessoal o que eu escrevo. Então eu tomei esse cuidado, eu falava “pô, não vou fazer uma música sobre um negócio que tá na moda agora porque eu quero que as músicas durem”. Eu mesmo cheguei a falar “numa” entrevista que eu esperava que durasse uns cinco anos o Ultraje (risos) que era mais ou menos o quanto durava as bandas que eu gostava, não esperava jamais estar aqui, faz 35 anos já e as músicas estão ainda muito atuais. Algumas, infelizmente, que nem tipo “Inútil” é bom pra música mas, eu tinha esperança que o Brasil mudasse mais rapidamente.
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4 - Com mais de 30 anos de carreira do Ultraje, você com certeza viveu inúmeras histórias que marcaram a sua vida. Qual foi a experiência mais inusitada que você teve durante esses anos à frente da banda? “Vixi”, teve por exemplo, época de festa junina a gente estar tocando no palco de repente voa um rojão no palco, a bomba cai no palco perto da gente. O nosso segurança veio correndo pra chutar de volta o que, graças a Deus, ele não conseguiu porque podia estourar na cara de alguém, foi um reflexo dele, então, antes que ele conseguisse chutar a bomba estourou ali à, sei lá, dois metros de mim. Coisas assim, sabe. Já “me tacaram”, teve uma época que a gente tocava “Mim quer tocar” que eu falo “dinheiro” e o pessoal jogava moeda, porque moedas valiam tão pouco que o pessoal jogava, daí começou a virar moda em tudo quanto é show e começaram a trazer saquinho de moeda e “tacar” com força na gente (risos) começou a machucar. Então, uma vez nós fizemos um show no Circo Voador, no Circo Voador não, no Noites Cariocas no Morro da Urca lá no Rio, e nós apagamos a luz, antes dessa música e enfiamos no palco um alvo com as nossas caras (risos) aí saímos do palco e deixamos a música tocando (risos), e “pô”, quebraram o fundo do palco que era tudo de espelho, quebrou muita coisa ali, então. E bom, tem milhares de coisas engraçadas, mas eu vou contar as mais leves (risos).
5 - Durante nossa pesquisa sobre as mulheres no rock nacional, percebemos que não há muitos nomes femininos no mainstream. O que você pode falar sobre a presença feminina no rock brasileiro? Eu acho que o rock é uma coisa essencialmente masculina e não é nenhum machismo falar isso, é porque o rock é uma espécie de dança do acasalamento (risos) pros meninos, entende, os meninos não tem a atração natural que as meninas já tem com 16 anos, 18 anos tal, as meninas já são moças e elas não tem nenhum problema de arrumar um namorado. O homem ele (risos) precisa de um pouco mais de enfeite. E o rock é muito isso, é uma expressão de juventude, quer dizer, hoje em dia é uma música quase que clássica, quase como o blues, como o jazz, né, é um negócio que já tem 55 anos, acho, de existência, começou lá pra 1955, não fiz as contas, 60 anos talvez, é, acho que 60 anos. Então, mas ele tem muito isso de, sabe, hoje em dia pode ser outro tipo de música, pode ser o rap, sei lá, mas ainda tem muito disso, sabe, é uma maneira do jovem, principalmente o homem, de se expressar. Mas, claro que não é exclusivo isso e
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umas meninas também sentem essa vontade, talvez elas sejam mais pelas músicas que pelo sexo como acontece com muitos homens. E não digo que é uma escolha consciente disso que o menino quer ser roqueiro porque “opa, eu vou arrumar um monte de namorada”, mas tem muito disso, sabe, mesmo que ele não saiba. E então, acho que talvez por isso, sabe, sei lá, o instrumento, a guitarra, o baixo é tudo uma coisa muito fálica né, um formato e tal. Tem as apresentações principalmente nos anos 70 tinha daquelas coisas de fazer pose das guitarras e tal. Acho que talvez seja por isso que normalmente as meninas escolhem outro caminho, ser modelo, ser atriz, apresentadora, (risos) estou brincando, é que tem muita atriz, modelo e apresentadora.
6 - Tem alguma cantora do rock nacional que você possui alguma admiração? Por quê? Tem muitas desde o começo. Tem a Carole King ela surgiu nos anos 70 como cantora, mas ela compõe desde os anos 50 e compôs muitos clássicos do rock, todo música que você olhar King Jeoffrey, ela é a King. Deixa eu ver quem mais eu gosto. Cantoras, normalmente as cantoras, você vê que as meninas normalmente vão pra essa parte de cantar. Eu não me lembro. “Tá”, tem algumas bandas tipo, Joan Jett, tem a El Seven, tem algumas bandas que se destacam mas, no geral, eu não tenho… tem a baterista do Prince, por exemplo, uma época é uma baterista excelente e tal. Mas é difícil você ter um modelo no meu caso de guitarrista mulher. Tem mulheres que se acompanham ao violão, sabe, mas guitarrista mesmo, não lembro. Na música o pessoal chama de musicista pra não ficar esquisito música, mas musicista também não é a palavra certa. E no Brasil? A Rita Lee né, a Rita Lee é sensacional e é minha idola, por exemplo, e não só idola foi um modelo meu também, foi uma coisa que eu pensava pra mim, eu falava “eu quero ser como a Rita Lee”. Ela no Brasil, foi o contrário, ela foi um dos maiores modelos no rock foi a Rita Lee pra mim, foi, principalmente, a Jovem Guarda, mas a Rita Lee é um grande modelo pra mim.
7 - A cena do rock nacional vem despontando com nomes da nova geração, como Scalene, Supercombo, Far From Alaska, Vespas Mandarinas, entre outras. O
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quanto vocês escutam ou conhecem as bandas dessa nova geração do rock nacional? Eu conheço o Scalene de ter visto na TV no programa da Globo. Conheci a banda do filho do Moacyr Franco também, esqueci o nome da banda*, achei muito boa, ele chama… esqueci o nome dele também, é “num sei o que” Franco, e a banda dele esqueci também, se escreve em inglês, e tem um jeito de… deu uma atualizada no rock, vamos dizer assim, a música parece música antiga, mas tem uma cara nova, sabe, parece música dos anos 60 mas com uma cara nova. Eu costumo ouvir muita coisa que me mandam, sabe, “ah, escuta isso aí, e tal”. Mas, primeiro que meu critério de achar bom ou ruim leva alguns discos, sabe, é como eu julgava naquela época, sei lá, olha “eu comprei esse disco do Led Zeppelin; puxa, muito bom; vamos, ver o outro: nossa, também é muito bom”, aí eu começava a procurar os antes que eu tinha perdido, sabe. Então, aqui a gente, vê às vezes, fogo de palha, vê que não dura, o cara tem um sucesso ou tem uma música boa mas a carreira não sustenta. O Scalene me parece muito criativo e muito bom, com bons músicos e tal. Essa outra banda que, infelizmente, eu não lembro o nome, mas tem bandas de… eu não vou lembrar o nome agora, mas eu sei que tem bandas em Santa Catarina, por exemplo, menos São Paulo, bandas que mandam coisa mas, é difícil né, não tem… não tem espaço não, na nossa época também não tinha espaço (risos), mas ou não “tão” criando o espaço, sabe, não “tão” aparecendo como deveriam.
*The Moondogs é o nome da banda de Johnny Franco, filho do Moacyr Franco. A banda participou do reality show da Rede Globo, Superstar, em 2015, mesma edição que contou com Scalene.
8 - Quais são os meios para divulgação do rock hoje no Brasil? Bom, internet o mais óbvio, mas uma coisa que eu aprendi no nosso tempo, eu aprendi antes quando eu morei nos Estados Unidos e trabalhava limpando casa, eu era diarista (risos), eu “pus” um anúncio no jornal e ninguém me ligou. Me ligou um cara oferecendo um outro tipo de… pra ser vendedor porque ele viu que eu “tava” procurando emprego. E daí eu resolvi ir diretamente onde eu queria ir, então fui no bairro onde poderiam me contratar e enfiava filipeta nas caixas de correio. Chegando
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aqui no Brasil, na nossa época, a gente começou a fazer a mesma coisa, Primeiro que nós inventamos essa marca do Ultraje A Rigor, o logotipo, e a gente fez grafite pela cidade toda, mas principalmente, perto de onde a gente queria tocar, de forma que o cara depois quando ia contratar a gente falava: “ah! Vocês são o Ultraje A Rigor? Já ouvi falar”, (risos) ele não tinha ouvido falar, ele tinha lido no muro (risos). E a gente ia na porta dos outros bares e punha filipeta também no vidro dos carros, por exemplo, mas era uma coisa dirigida. Então, talvez esse seja também um bom caminho, porque a internet ao mesmo tempo que é fácil, dilui muito, perde a informação, é difícil você ir lá e achar. Então, de repente e mais fácil você ir naquelas casas onde você quer tocar e, esse é outro conselho que eu dou, você tem que tocar muito, tem que aparecer, tem que criar um público, não dá pra fazer o caminho inverso. “Eu vou ser famoso primeiro e depois eu vou arrumar um público”, sabe, você tem que tocar e ir conseguindo, sei lá, seus amigos primeiro, a família, os amigos, se nem a família nem os amigos gostarem de você, desiste né (risos), então você começa por aí. Família, amigos, você começa a juntar gente, começa o boca-a-boca, esse ainda é, eu acho, o caminho mais rápido do que a internet até.
1.5 Luiza Pereira (Inky) (pessoalmente - estúdio da banda - Santo Amaro - SP - 11 out. 2016)
1 - Luiza, para começar você pode contar como o Inky foi formado e a trajetória da banda até aqui? Bom, a gente começou em 2010. O Gui, que é o baixista, tinha um projeto de música eletrônica com baixo ao vivo, que era ele com outro integrante da banda que tocava synth e soltava uns echos e tal. Aí, eu tinha dezessete anos na época, eu tinha comprado um synth e o Gui queria muito ter uma banda mesmo, ele falou :“Pô, vem fazer uma jam, ver o que a gente consegue fazer pra deixar isso menos eletrônico possível”. Aí foi assim, a gente fez essa primeira jam estamos juntos desde então. A gente teve uma mudança de formação, esse cara saiu, o Ste, nosso guitarrista, entrou, isso já faz uns quatro anos já. E a gente tem dois discos lançados, a gente nosso disco novo agora em agosto, o Animania, o s dois gravados no Red Bull Studios. E, a gente tem uma trajetória meio maluca assim de ser uma banda independente, muito alternativa e já ter
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conseguido fazer coisas muito legais, assim, a gente foi tocar no Primavera Sound esse ano, no Primavera Fauna ano passado, a gente já tocou com uma orquestra em Amsterdam, trabalhamos com Steve Lillywhite, com Russell Elevado, com Guilherme Kastrup e com o Coelho, enfim. Então, é isso, estamos aí.
2 - O Inky participou dos festivais Primavera Fauna 2015, no Chile, e Primavera Sound 2016, em Barcelona, gravou com The Metropole Orchestra sob o comando de Steve Lillywhite, além de ter realizado turnês pela Europa e Estados Unidos. Como tem sido divulgar a cena do rock brasileiro fora do país? Uma coisa que eu percebi é que eles têm muito interesse, muita curiosidade de ouvir o que é feito no Brasil além do que é o MPB, o samba e tal. A gente tem um pouco essa visão, que o estrangeiro também só que ouvir o que é regional do Brasil, e não é isso. E a gente ficou muito surpreso de ver a recepção, até porque tem lugares que nosso som, tipo em Nova Iorque, você tem o LCD Soundsystem lá, toda onda do disco punk, quando a gente foi tocar nosso primeiro disco a gente foi super bem recebido, pra eles já era bem mais palatável do que é aqui dentro do Brasil. Então é isso, foram experiências muito legais. 3 - Depois do Primal Swag (2014), o Inky lançou seu segundo disco, Animania, em agosto deste ano. Como foi o processo criação e produção do CD? Qual a expectativa com o novo disco e quais são os planos da banda para o próximo ano? A gente sempre compõe fazendo jam, então alguém vem com um riff ou com uma melodia, alguma coisa, e a gente vai construindo em cima. Esse disco [Animania] a gente compôs inteiro assim aqui no nosso estúdio, onde estão. E foram muitos e muitos meses de ensaio porque além da gente compor junto, o que faz o processo ser mais lento, a gente sempre grava os discos ao vivo o instrumental, então, a gente realmente tem que ensaiar e deixar tudo bem encaminhado. E aí o processo foi assim, eu escrevi as letras depois junto com um amigo meu, o Marco, que é um parceiro, um amigo que eu amo, e foi isso. A gente espera que esse disco atinja mais pessoas, a gente acha que por mais que ele seja um disco sofisticado, assim, tem a barreira do inglês pra muitas pessoas, mas a gente também acha que ele é um disco bem mais acessível, assim, menos experimental que o Primal Swag, e ele tem uma cara mais de canção, apesar de não ser
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exatamente isso que a gente faz. Então é isso, a gente espera continuar tocando e ganhando um público cada vez maior.
4 - Luiza, você pode falar um pouco sobre sua formação como musicista e como isso influencia nas composições do Inky? Olha, é uma formação informal porque eu comecei a estudar música com quatro ou cinco anos de idade, fiz aulas de piano até, sei lá, uns onze, depois fiz aula de canto, daí tive a banda e depois entrei numa faculdade de música, que eu não terminei, continuei estudando várias coisas por minha conta e fazendo aulas, e tal. Então, eu tenho uma formação informal em várias coisas assim, acho que a banda também é uma formação pra mim, e foi a coisa que eu ganhei mais experiência. [Sobre como estudar música influência nas composições] Olha influência, sempre que você aprende coisas novas você internaliza isso, então, você vai ganhando uma noção mais complexa das coisas, tanto rítmica, melódica. Ajuda muito nesse sentido, assim, os meninos [do Inky] acho que a maioria ali é cem por cento instinto, nunca estudaram, não querem saber, e são ótimos músicos. Mas ajuda sempre, eu acho que eu consegui evoluir como cantora, como instrumentista também, me trouxe uma base para várias coisas.
5 - Quais as mulheres do rock que te inspiram e servem de modelo para você tanto na parte de composição quanto de atuação no palco? Nossa, tem um monte de mulher, mas vamos lá. Tem que falar Rita Lee porque não dá pra não citar Rita Lee, Rita Lee é maravilhosa, acho que no rock brasileiro com certeza Mutantes tem um papel que acho que nenhuma outra banda teve, e ela é “foda” em todos os sentidos, né, ela é muito “foda”. Então, tem a Rita Lee, tem a Björk que eu sou completamente louca pela Björk. Deixa eu ver quem mais. Eu sempre fui bem fã do Jack White também, e do The White Stripes, então, tipo, por mais que seja uma mulher que muita gente nem considera uma ótima instrumentista, acho que ela* é uma influência também. Deixa eu ver quem mais. A baixista do Talking Heads**, que eu nunca lembro o nome dela. As meninas do Deep Valley, Warpaint, acho que são muitas mulheres no rock que tem muita atitude, que tem um papel fundamental, tanto nas composições como no estilo da banda. Enfim, mas é muita gente que me dá até branco. Sei lá, se eu lembrar mais alguma eu vou citar depois.
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*”Ela” é Meg White, baterista do duo de rock norte-americano The White Stripes, composto por ela e Jack White **O nome da baixista do Talking Heads, banda de pós-punk formada em 1974 em Nova Iorque - EUA, é Tina Weymouth. 6 - Como você vê a cena do rock hoje, no Brasil, para as mulheres e de modo geral? Acho que a cena do rock hoje está muito forte, assim, crescendo muito. Já falei isso uma vez, que eu sinto que ela é uma cena menos segmentada. Antes você tinha o hardcore, o pessoal do pop-rock, e era tudo muito separado, assim, e hoje em dia é todo mundo junto, a gente já descobriu que não dá pra você supor que o seu público não vai gostar de outra coisa, que o público de outra banda não vai gostar de você, então é vantajoso pra todo mundo isso. Por exemplo, a gente vê que tem vários fãs do Supercombo, que é uma banda super legal de rock, de pop-rock, que é completamente diferente do nosso estilo, e a gente tem muitos fãs deles que gostam da gente. Enfim, eu acho que é uma cena que realmente tem se fortalecido e produzido material de muita qualidade, assim, e de todos os jeitos, né. Tem o rock psicodélico, tem o pop-rock, stoner, um rock mais misturado com música regional brasileira, indie, então, é uma cena bem diversificada e que está crescendo além do poder das gravadoras, porque, antes, isso era muito forte no Brasil. O rock virou um produto muito comercial e que, tipo, tinha uma força ali que era muito difícil você conseguir entrar no mesmo mercado, sabe, você não tinha dinheiro pra pagar uma boa gravação, enfim, era muito difícil você competir nesse sentido. Então acho que é isso também, a música independente ganhou muita força no Brasil, com ela o rock, e essa união também é muito importante, assim. Bandas de todos os lugares do Brasil circulando e divulgando show uma da outra, e… vamos ver onde é que a gente vai chegar.
7 - Você sofreu algum tipo de preconceito por ser mulher e cantar rock no Brasil? Cem por cento. Acho que nem é um problema do rock, da música, acho que o ambiente de trabalho pra mulheres é geralmente hostil se não for uma carreira feminina, por assim dizer. Então, ah, várias vezes, desde o técnico de som me chamar de amor, de gatinha, e não me chamar pelo meu nome, ah, duvidarem se eu sei ligar meu próprio instrumento,
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perguntarem se eu uso playback, se recusarem, tipo, “ah, não vou fazer isso pra você”, “não vou aumentar sua voz”, “você que se vire, e num sei o que”. Aí já passei até por coisas, tipo, pegarem na minha bunda, assédios assim, então. E eu vejo que são realmente coisas que obviamente não acontecem com meu colegas de banda, e é por isso, porque eu sou mulher. Muitas vezes me subestimam, não tem respeito, assim né, se eu chego pra um show com uma roupa decotada, e tal, já me olham tipo..., não tenho a mesma voz que os meninos. Sempre vão duvidar da sua capacidade, também, tipo, se é mulher é porque você é bonitinha, ou porque sei lá, né. Uma vez um cara falou pra mim, “ah, você canta, legal, deve ser bom pro marketing da banda, né!”, tipo, “não cara, tô aqui porque eu toco um instrumento, porque eu canto, eu componho, tipo, tudo o que a gente fez é porque a gente fez, sabe”. Então fica uma coisa que, tipo, os méritos acabam sendo dos meninos, assim. E é isso, tem esse tipo de desrespeito, de tratamento com a mulher que é chato, assim, é pra me subestimar e desafiar mesmo. Mas, estamos aí, faz parte, e é um mundo que está ficando um pouco menos masculino, o que me deixa muito feliz, porque antes você tinha, tipo, o roadie é homem, o produtor da casa é homem, o técnico de som é homem, só tem músico homem. Sabe, acaba sendo um ambiente meio hostil por isso, tipo, não tem mulheres, eles não estão acostumados a trabalhar com mulheres. Isso tem mudado, assim, que eu fico bem feliz. Os line-ups também, hoje em dia quando eu vejo um line-up que só tem músico homem eu fico “meu, o que esse produtor tá fazendo”, já reclamei várias vezes, até evento que eu não ia tocar, ou que, tipo, não tinha nada a ver, eu falo “pô, faz um line-up que não tem uma mulher”, as vezes me falam: “ah, mas tem pouca banda”, você vê. E se você parar pra ver o que tem de banda no Brasil com mulher e de DJs, produtoras, enfim. A gente tem um grupo chamado “Mulheres na Música” no Facebook que já tem mais de, sei lá, centenas e centenas de mulheres do Brasil inteiro, em todas as funções, se você ver que realmente, assim, se você quiser você consegue trabalhar com mulheres em todos os ramos do mercado, sabe. E, é isso, nós estamos ganhando nosso espaço, as pessoas estão percebendo a importância de ter mais oportunidade. Porque tem muito isso, as vezes as pessoas falam: “ah, mas mulher não tem ...”, já ouvi coisa assim, “...o mesmo tesão pra tocar”, “...não tem a mesma habilidade”. Cara, é mentira, além de tudo, tipo, a gente não incentiva as mulheres a quererem ser musicistas ou terem profissões assim, sabe, no geral a gente cria a mulher pra ser insegura, pra não ter confiança. Então, pra
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você resolver, tipo, realmente seguir uma carreira assim tem que ser por muita teimosia, muita vontade, então, acho que a gente acaba tendo menos espaço desde sempre, sabe. Os meninos vão montar banda preferem chamar um amiguinho que toca baixo do que uma menina, então, é uma coisa bem profunda assim. Mas, é legal ver que tem muita qualidade em todos os aspectos e a gente tá aí ganhando espaço.
8 - Qual conselho você daria às meninas de hoje que desejam conquistar o seu espaço na indústria fonográfica? Olha, persistir. Porque eu acho que se você quer viver de música é saber que, tipo, você nunca vai estar de boa, sabe. Tipo você tem uma banda há sete anos tem hora que você fala: “putz, não sei se isso aqui vai dar certo”. Então, tipo, tem que persistir, tem que encarar as coisas e passar “perrengue”, porque passar “perrengue” é muito bom. E é isso, e se arriscar e querer fazer coisas novas, não se deixar intimidar por nenhum aspecto, não ficar se comparando com outras mulheres, nem com outros músicos, e realmente procurar ser muito bom no que você faz que, com certeza, isso vai te levar longe.
1.6 Emmily Barreto (Far From Alaska) (pessoalmente - Festa Avalanche - Clash Club - Barra Funda - SP - 30 out. 2016) 1 - Como você e a banda reagiram ao receber o Internacional Midem Award em Cannes? Nossa, foi surreal. Primeiro, antes de ganhar o prêmio a gente já tava todo “abestalhado” por estar na França tocando em um lugar magnífico, as pessoas falando “bla bla bla”, a gente não entendia “bexiga nenhuma”. E, foi inacreditável quando a gente ganhou o prêmio. Até hoje, na real, não caiu minha ficha quando a galera chega pra falar: “ah, você tem um prêmio em Cannes”, aí eu: “pode crer”, não parece real, assim, porque foi tão… Mas é incrível, nunca imaginei na minha vida que um dia ia ganhar um prêmio qualquer, imagine em Cannes, é bem emocionante
2 - Como é divulgar o som feito aqui no Brasil fora do país?
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Então, nas experiências que a gente teve a galera se espanta ao saber que a gente é do Brasil, assim na real. A galera não espera, e quando a gente fala eles acham irado a gente ser daqui. Mas, não tem muito isso, acho que aqui no Brasil a galera tem mais espanto da galera, tipo, eu escutei mais na minha vida: “nossa, eu achava que vocês eram gringos”, e num sei o que lá. E fora, tipo, eles te tratam normal, porque é a língua deles e eles não estão nem aí, e quando eles descobrem que a gente é brasileiro eles ficam de cara, não pelo som, vê que eu não sei nem explicar, que eu tô enrolando. Mas, a gente foi muito bem recebido lá fora, inclusive, temos planos de em breve voltar lá e fazer uma turnê maior, e é isso aí. 3- Você já enfrentou alguma barreira para divulgar seu trabalho com o Far From Alaska aqui no Brasil, por tocar stoner e pela produção da banda ser toda em inglês? Não cara, a gente recebe muito essa pergunta, mas, não estou mentindo, nunca rolou isso. É o contrário. Já rolou da galera dizer assim: “nossa, eu não gostava de banda com mina, e vocês mudaram essa realidade pra mim”. Mas, não lembro de nenhuma experiência de preconceito, nem nada não, graças à Deus, ainda bem.
4 - Quais mulheres que te influenciam, tanto como composição quanto como atitude em cima do palco? Do Brasil ou do mundo? Dos dois. Então vou ficar a tarde inteira aqui falando. Vamos começar pelo Brasil. Obviamente, a Pitty, que não tem como não falar, maravilhosa, maravilhosa, maravilhosa. Minhas amigas aqui, a Carolzinha [Supercombo], a Cris [Far From Alaska], a Luiza [Inky], até que você falou com ela também. Tem muita mina aqui no Brasil, a galera não vê muito, mas, está surgindo ainda. vocês vão ver muita coisa boa de mina. E, putz, de fora do Brasil é uma lista absurda, tem a Hayley [Williams] do Paramore, tem a Emily [Kokal] do Warpaint, tem a Lynn Gunn do Pvris. Nossa, eu vou parar por aqui, é muita gente.
5 - Você já sofreu algum tipo de preconceito por ser mulher e estar em uma cena roqueira?
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Não, por incrível que pareça. Mas, eu tenho muitas amigas que já sofreram, mas acho que eu tenho sorte mesmo, não sei, nunca sofri isso. Acho que mais por… eu cresci em igreja evangélica, e na igreja é muito comum menina tocar desde pequena, meu pai é baterista também, então, tipo, ele achou massa já, desde pequenininha ele me empurrou pra bateria e era o orgulho dele. Então, eu cresci como se fosse normal, até porque é normal né, nunca sofri nada disso, mas entendo que pessoas sofrem, mas eu fui agraciada por ainda não ter passado por nenhuma situação constrangedora de preconceito assim.
6 - No início da sua carreira na música, você era baterista da Talma & Gadelha. O que te impulsionou a deixar de lado as baquetas e tomar a frente como vocal do Far From Alaska? Cara, então, eu tinha uma paixão secreta por cantar e, como você falou, eu era baterista e a vida toda só baterista, nunca tinha cantado em nenhum lugar, mas eu tinha essa paixão secreta por cantar. E aí, eu decidi ter uma banda pra cantar e eu chamei a Cris, e foi assim, eu não sabia o que ia acontecer, não tinha tido nenhuma experiência parecida. E foi muito difícil no começo, eu vejo os vídeos dos primeiros shows eu morro de vergonha. Porque, como eu ficava na bateria, eu ficava lá atrás, não tinha interação nenhuma com o público. E agora você tá na frente, a galera lá, tipo, às vezes nem olha pra nenhuma outra pessoa, tá olhando o show inteiro pra você. E que coisa chata é você ir pra um show e o vocalista ficar parado sem fazer nada, né. Então, eu tenho muito isso na minha cabeça. Então, o show inteiro eu fico que nem uma doida pulando no palco hoje em dia, mas, no começo foi muito tenso, assim, eu não sabia o que fazer com a mão… nem nada. Então, foi uma escadinha aí, eu ainda vou melhorar muito, mas, é só a experiência de palco, só os show que vão me levar pra onde eu quero chegar, ou, sei lá, melhor ainda se Deus quiser (risos).
1.7 Cris Botarelli (Far From Alaska) (pessoalmente - Festa Avalanche - Clash Club - Barra Funda - SP - 30 out. 2016) 1 - Quais mulheres que te influenciam como atitude em cima do palco?
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Cara, eu sou meio aleatória nesse ponto, assim. Mas, as bandas que eu escuto a maioria são com mulher cantando. Eu gosto muito da Lady Gaga, acho ela muito corajosa nas coisas que ela faz, essa coisa também de não ser tanto o padrão, né, ela vai pra um lado mais esquisito, e eu gosto muito. Ah, eu gosto de outras coisas tipo Norah Jones, que não tem nada a ver com nada, Feist, Pato Fu também é uma banda que eu escutei muito durante minha adolescência inteira, o trabalho solo da Fernanda Takai também é muito inspirador pra mim. Cara, e basicamente, o Inky, é uma banda que eu falo que eu tenho a sorte de ser amigo deles porque eu curto muito a banda, acho de verdade uma influência pessoal, assim. Cara, é isso, toda banda que tem mulher. Rihanna, eu tô escutando muito o disco novo da Rihanna também. Tudo o que tem mulher eu tendo a gostar mais de cara, assim, pela identificação, eu acho. 2 - Como você e a banda reagiram ao receber o Internacional Midem Award em Cannes? Como é divulgar o som feito aqui no Brasil fora do país? Cara, primeiro foi uma surpresa a gente ter sido chamado [pra tocar], porque foram bandas do mundo inteiro que foram inscritas, e aí quando a gente chegou lá que rolou essa história do prêmio, que a gente foi pego meio desavisado, assim, mas foi muito legal. A história do prêmio significa muito pra gente, porque o nome do prêmio é We Are The Future, e ele fala exatamente de bandas que venham de uma realidade x e que tenham um potencial global, e isso encaixa muito. A gente ficou muito honrado com isso, porque a nossa história é muito assim, a gente é de Natal, a gente tá aqui em São Paulo agora, o que já foi um grande passo pra gente, e a gente sempre se via como uma banda que podia chegar em mais pessoas, aí ver uma galera muito consagrada reconhecendo isso na gente foi uma coisa… Até hoje é meio que não caiu a ficha direito, assim, quando a gente fala sobre isso a gente fica: “caraca, pode crer, massa”.
3- Cris, o Far From Alaska tem você e a Emmily na banda, como é ter duas meninas em um meio que é, rotineiramente, mais masculino? É, tem pouca mulher de fato, agora eu e a Emmily, especialmente, tem uma particularidade, não sei se ela falou isso, a gente cresceu na igreja evangélica e na igreja evangélica, por incrível que pareça, não é um meio machista no que diz respeito à música. Então, desde criança meninos e meninas são ensinados a tocar na igreja os
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louvores, e tal. E a gente é meio dessa galera, assim, a gente aprendeu na igreja, tocava na igreja e tudo mais. E é engraçado porque é um meio muito tradicional, né, que é um meio evangélico, mas não tem essa amarra com o gênero, é tanto menina quanto menino, não tem isso de menina. Ela [Emmily] tocava bateria na igreja. É um exemplo que, se você parar pra ver, a gente devia ter muito mais mulher no rock, né. Imagina se na igreja tem, que é um meio super tradicional, imagina no rock. Mas, tá mudando, as meninas tão… E é legal, por exemplo, tem a gente, tem a Carol do Supercombo, tem a Luiza do Inky, tem a própria Pitty que é a maior expoente, assim, hoje. E as meninas vão vendo, vão se espelhando, e vão tendo vontade de fazer banda e é bem por aí que tem que ser mesmo. Pra gente “pô” é muito legal ter meninas no rock, vamos tirar um pouquinho essa macharada toda, né, vamos deixar o meio mais feminino que vai ver muito mais massa.
4 - Você já sofreu algum tipo de preconceito por ser mulher e estar em uma cena roqueira? Não. Eu não, mas assim, tem uma coisa muito engraçada a respeito disso que a gente, eu toco, a Emmily canta, são duas meninas, isso já dá um… a gente já não chega sozinha, assim. Mas, eu tenho várias histórias de amigas que é, tipo, só ela na banda e sim sofre preconceito dos caras não acharem que ela não sabe tocar, ou que tá ali só pra ser bonitinha no palco. E, cara, do mesmo jeito que os meninos não estão lá pra serem bonitinhos, a gente não tá lá pra ser bonitinha, a gente tá lá pra tocar, pra fazer rock, e é isso aí. Tipo, sabe, a gente não quer ser um bibelô pra pessoas ficarem admirando, mesmo porque, eu e a Emmily, por exemplo, a gente não é no padrão de beleza que, né, que existe na mídia e tudo mais, a gente é meio fora da curva porque a gente não tá lá pra isso, a gente tá lá pra tocar e fazer música boa. E eu acho que as meninas todas tem que ter isso na cabeça também, da gente não deixar se levar pelo papel que querem que a gente tenha, que é de ser a menina bonitinha, gostosinha lá, só posando, tipo cara, não. As meninas tão mandando muito, tão tocando muito, tão cantando muito, tão fazendo uma parada séria, de forma… muita qualidade, e a gente busca sempre isso. Mas o lance do preconceito, eu acho que a gente não sofreu, acho, porque a gente já é duas, a agente já chega de duas. Mas quando eu tinha outra banda, que tocava guitarra, e a Emmily inclusive tocava bateria nessa outra banda, e tinha outro menino que tocava guitarra na
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banda, então era uma coisa meio se não pedisse, minha guitarra ficava muito baixa, os caras não aumentavam minha guitarra porque achava que eu tava ali posando, era chato, era tipo: “pô cara, velho, são duas guitarras que estão ali em pé de igualdade, não porque ele é menino”, muito chato. Mas nessa banda [Far From Alaska], graças a Deus. até hoje não sofremos.
5 - Como você vê a cena do rock hoje, no Brasil, para as mulheres e de modo geral? Cara, muita coisa legal rolando, muita banda nova com qualidade, a galera está realmente se preocupando em fazer coisas de qualidade. E o mais interessante que eu acho desse momento que a gente tá vivendo hoje é que, diferente de outras cenas que já surgiram antes, tipo, a cena do hardcore, a cena do emo, a cena de hoje, tipo, você vê, o exemplo é o evento que tá rolando aqui hoje: são bandas muito diferentes entre si, muito plurais. Tem o Supercombo, que é mais pop, tem o Ego [Kill Talent] que é mais pesado, tem a gente [Far From Alaska] que tá ali no meio entre pop e pesado, tem o Medulla que tem muita coisa de rap no meio, e essa galera tá no rolê junto, faz o rolê junto porque é assim que tem que ser. E, é muito bom pro público também, porque você não fica preso em um estilo, você não vai pra ver… quem tá aqui hoje vai ver coisas muito diferentes, e aí isso é massa pra formação do público, pra pessoas terem acesso a coisas diferentes. Tipo, as vezes o cara vai vir pra ver Supercombo, mas, tá vendo o Ego agora, nesse momento, e tá achando muito irado, nunca tinha visto, isso nunca tinha chegado pra ele. E essa é a parte mais interessante que eu acho disso tudo, é essa coisa dos estilos diferentes, e tal.
1.8 Carol Navarro (Supercombo) (pessoalmente - Festa Avalanche - Clash Club - Barra Funda - SP - 30 out. 2016) 1 - Quais mulheres que te influenciam como atitude em cima do palco? Desde que eu comecei a tocar eu sempre fui muito fã da Gwen Stefani, do No Doubt, e ela foi uma grande influência pra mim, quis começar a ter banda e querer me me mexer, me movimentar no palco por causa dela. A Shirley Manson, do Garbage, também. A Fiona Apple, apesar dela ter um postura diferente das outras que eu falei, né. A Norah Jones, também. Eu acho que mais essas, assim, que mais me vem na cabeça. Tenho
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inúmeras mulheres que eu aprecio demais na música...Ah, a Esperanza Spalding, que é uma “puta” baixista. Mas, são elas.
2 - Você já sofreu algum tipo de preconceito por ser mulher e estar em uma cena roqueira? Eu costumo falar que, apesar de todo preconceito que eu tive, eu nunca foquei exatamente nisso pra conseguir chegar onde eu tô. Acho que mulher em todas as formas de trabalho sofre preconceito, e em determinadas áreas, em determinados assuntos, a gente sofre, tipo, exatamente todo dia por pequenas causas. Sim, é um universo muito caos, ele é basicamente masculino. Hoje, aqui no festival, somos em três mulheres só, e o resto é tudo homem, né. Mas, acho que é essa coisa de hoje não realmente focar no que é: “ai, não tem muita mulher”, “ai, o pessoal não dá valor pra gente”, não! É, tipo, meu, são amigos, você esquece essas ideias e brincadeiras machistas e segue com o seu trabalho que vai dar muito mais fruto do que ficar se permitindo ser alvo de preconceito.
3 - Carol, qual a diferença de estar hoje no Supercombo (2012 - atualmente), sendo a única mulher da banda, da época em que você integrava o Lipstick (2003 - 2013), que era uma banda só de meninas? Então, quando eu estava com as meninas a gente meio que fazia tudo junto, né, e hoje em dia eu só tenho amigos meninos na banda. E eu sinto que é a mesma coisa, assim, algumas piadas são diferentes, algumas fofoquinhas são diferentes, eles se arrumam em dez minutos, eu fico me maquiando porque eu gosto… Mas, é basicamente isso, assim, eu acho que o musical e a agressividade de palco, assim, é tudo a mesma coisa.
4 - Como você vê a cena do rock hoje, no Brasil, para as mulheres e de modo geral? Tá muito massa. Eu nunca vivi..., eu tenho trinta anos, e eu nunca vivi algo tão bonito, assim, igual tá agora. Porque, parece que quem tá agora é porque a galera resistiu mesmo, sabe, resistiu de estar tocando muito tempo se “ferrando”, tocando em lugar ruim, tocando com equipamento ruim. A galera hoje em dia tá unida, tá pelo rock, não tá por ficar se estragando, doido, e, sei lá, pensando só em pegar mulher, pegar cara, e vida que esquece a família, não! A galera tá pela música, tá pela situação, tá pela cena, tá por mandar um mensagem boa, essa coisa muito do feminismo, do homosexualismo,
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da fobia que a galera sente por esses temas. Eu sinto que, hoje em dia, isso tá deixado de lado e a arte é o que importa mais.
1.9 Nasi (Ira!) (via WhatsApp - 31 out. 2016) 1 - O Ira! foi fundado lá no início da década de 80, e de lá pra cá muita coisa mudou no mundo e na música. Qual o diagnóstico que você faz do rock nacional que é produzido hoje em relação ao rock feito pelo Ira! e outras grandes bandas nos anos 80? É realmente, quando nós surgimos, é um mundo bem diferente, o mundo musical na sua relação com o público. Era a época em que se vendiam discos, vendiam muitos discos. Era a época que não tinha Internet ainda, você não tinha acesso tão direto à produção dos artistas; não é como se tem hoje. Na verdade, não dá muito pra se comparar aquela geração com os momentos atuais. Eu acho que aquela geração veio ao encontro de uma necessidade do jovem brasileiro de ter novas referências, novos artistas, artistas que fossem jovens como eles, que falassem a linguagem de uma juventude, de um momento do Brasil muito interessante, que foi o final da ditadura militar e o fim da censura, a esperança de novos tempos, de tempos melhores, tempos diferentes, tudo isso fez com que gerasse uma geração que foi porta voz de toda essa época.
2 - Como o rock é visto hoje no Brasil? Em termos de popularidade, relevância, presença nas rádios e demais meios de comunicação. Bom, obviamente, hoje em dia o rock não é a música da moda como era na década de 80 e até início década de 90. Por um lado, isso é até bom, porque também na década de 80 era só rock que tocava em todos os lugares, então isso fez também que vários artistas de baixa qualidade e de música apelativa e sem conteúdo, acabassem entrando nesse saco de gato. Agora, hoje em dia, a gente tem veículos também diferentes. Hoje em dia, uma banda de rock não necessita mais dos filtros, das redes de FM, da MTV, dos programas de auditório. Hoje você consegue ter uma atividade alternativa, você pode colocar em link com o mundo inteiro, com o Brasil inteiro, temos festivais de música independente, coisa que não existia muito na década de 80. Então, o artista hoje, ele não
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tem mais tantos filtros pra chegar ao seu público. Por outro lado, isso faz com que não se tenha o rock mais como uma música, quase uma ditadura hegemônica na mídia.
3 - Durante nossa pesquisa sobre as mulheres no rock nacional, percebemos que não há muitos nomes femininos no mainstream. O que você pode falar sobre a presença feminina no rock brasileiro? É realmente, esse é um fenômeno não só no Brasil, mas internacionalmente. A gente vê também no rock inglês e americano, que infelizmente que as garotas, as mulheres não são tão presentes como os homens. Eu acho que no Brasil a gente tem algumas grandes representantes, acho que a maior de todas foi a Rita Lee, a gente pode falar também da Wanderléa no passado, e numa geração mais atual eu acho que se destaca bastante a Fernanda Takai do Pato Fu e a Pitty. Acho que são bons exemplos de cantoras do rock nacional.
4 - Tem alguma cantora do rock nacional que você possui alguma admiração? Por quê? É eu citaria a Pitty. Não à toa, nós a convidamos no Acústico MTV pra dividir comigo o canto de Eu Quero Sempre Mais, que foi um tremendo sucesso na época. Eu acho que ela tem uma atitude bastante protagonista. Ela não tem essa coisa muito de fragilidade feminina, eu acho que isso é bacana pra autoestima das meninas e das garotas, que podem ver nela um ídolo legal de ser ouvido.
5 - Vocês voltaram a ativa após 7 anos de recesso. Como é voltar aos palcos, rever os fãs, cantar músicas que nunca saíram de moda, como é essa sensação de retorno? A sensação ótima, porque apesar das melhores expectativas que a gente tinha, e também não voltaríamos se não tivéssemos boas expectativas, foi acima de tudo, acima das maiores expectativas. A quantidade de shows, nós estamos acabando 2016, dois anos e meio, mais ou menos após o início, praticamente com cerca de 200 apresentações, mas todas elas encontrando um público muito emocionado; casas e espaços lotados, vibrantes, mostrando a saudade que tinham da nossa presença, da nossa música. A relevância que a gente sente que tem mesmo parado sete anos, porque sete anos é quase
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uma geração. Encontramos também muito público jovem, que talvez era garoto demais quando o Ira! parou em 2007 e agora vem pra conferir a nossa atuação. Nós estamos muito felizes e muito satisfeitos.
1.10 Edgard Scandurra (Ira!) (via WhatsApp - 31 out. 2016 - Edgard preferiu não gravar áudio, então enviou apenas as respostas escritas)
1 - O Ira! foi fundado lá no início da década de 80, e de lá pra cá muita coisa mudou no mundo e na música. Qual o diagnóstico que você faz do rock nacional que é produzido hoje em relação ao rock feito pelo Ira! e outras grandes bandas nos anos 80? Dos anos 60 aos 80, as bandas nacionais eram muito influenciadas pelas bandas inglesas e americanas e nos anos 80, com o fim da ditadura militar, os tempos começaram a ganhar valores políticos e a ganhar mais personalidade do que simples imitações. Hoje, o rock não mais imita mas traz muita informação sobre os mais de 50 anos do estilo, incorporando elementos da música brasileira, deixando de focar no rock do velho mundo e trazendo para as músicas, influências do forró, samba, maracatu e até sertanejo! Bom para a personalidade do rock nacional, mas nem por isso, bom para os ouvidos.
2 - Como o rock é visto hoje no Brasil? Em termos de popularidade, relevância, presença nas rádios e demais meios de comunicação. O rock vem sido bombardeado por outros estilos, desde que tornou-se popular nos anos 80. Axé, forró, sertanejo, rap, funk se tornaram mais populares e o rock voltou ao seu nicho. Mas sempre é movimento cíclico. No momento eu diria que o rock está retomando para seu aspecto alternativo, o que, para mim, o torna mais atraente do que no mainstream. 3 - Durante nossa pesquisa sobre as mulheres no rock nacional, percebemos que não há muitos nomes femininos no mainstream. O que você pode falar sobre a presença feminina no rock brasileiro?
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Acho que Rita Lee fez coisas maravilhosas para o rock nacional, sem ser fofa e manter a atitude roqueira, mesmo durante a sua fase " bolero”. Outras cantoras são do rock, mas seguiram uma linha mais suave, ligadas ao sucesso das rádios. Mas, na minha opinião, temos no Brasil, uma das melhores bandas femininas do mundo: As Mercenárias, com quem tive o prazer de tocar bateria por 3 anos, quando elas começaram em 1982. Elas ainda estão na ativa e são poderosas no palco! Outra grande mulher do rock é Karina Buhr com quem também colaboro, em discos e shows. Pitty no sentido pop, faz o som mais pesado e é uma grande artista, assumidamente roqueira. Está difícil, hoje em dia, uma cantora assumir-se roqueira, mesmo fazendo rock and roll.
4 - Vocês voltaram a ativa após 7 anos de recesso. Como é voltar aos palcos, rever os fãs, cantar músicas que nunca saíram de moda, como é essa sensação de retorno? Voltar aos palcos com o Ira! me mostrou que deixamos uma lacuna que outras bandas ou artistas não conseguiram preencher e nosso final tragicômico em 2007, tinha que ser recuperado, em respeito, principalmente, ao nosso público e a nossa história. Nosso objetivo desde o princípio, era fazer uma música que tivesse sentido pra todas as gerações e conseguimos dar a nossa obra, o valor atemporal que uma boa música deve ter.
1.11 Álvaro Bufarah Júnior (pessoalmente - Ricardo Viveiros & Associados - Oficina de Comunicação - Pinheiros SP - 16 nov. 2016)
Sobre o contexto histórico das rádios Nos anos 1970, nós temos historicamente uma situação de uma limitação técnica do rádio brasileiro que tem a ver com o fato de que nós não temo o FM, o FM chega no final dos anos 1970. Então, há uma programação, uma diversificação da programação, que vai buscar um contato maior com os jovens. Isso já vem desde o final dos anos 1960, mas isso se intensifica nos anos 1970 com a chegada da TV a cores. Nos anos 1950 com a chegada da TV, o rádio tem que se reposicionar dentro de um perfil de comunicação, informação e serviço. E nos anos 1970, você tem uma tentativa de
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revitalizar o rádio, buscando um novo perfil de público. Só que é uma limitação física, que depois vai ser resolvida com a FM, porque o perfil de onda da FM te possibilita ouvir a emissora de FM num raio físico menor, porém com a qualidade de som melhor em trânsito. Então, eu tenho uma área restrita de cobertura, por exemplo, como a cidade de São Paulo, e não tenho qualidade fora dela. Então, se eu pegar o carro e sair ouvindo uma rádio FM de São Paulo, entrar na Bandeirantes, na Castelo Branco, alguns municípios pra frente eu perca esse sinal. Saindo da área da Grande São Paulo, eu já perco o sinal. O AM, eu tenho uma situação ao contrário. O AM eu tenho uma pior qualidade em trânsito. Então, pra eu ouvir rádio AM no carro eu tenho dificuldade, tanto que o AM é uma tendência de eu continuar ouvindo AM em situações paradas. Então, é a costureira, o mecânico, o funileiro, o cara que não tem trânsito. E a onda, portadora do AM, ela vai mais longe, então, eu tenho possibilidade de ouvir rádios AM a uma distância muito maior que a FM. O que ocorre, nesse processo histórico, no final dos anos 1960 para os anos 1970, o rádio tenta virar o jogo em relação ao que ele vem perdendo de mídia, investimento desde os anos 1950 com relação a TV. Com isso, o rádio vai tentar buscar uma nova programação com um conteúdo diferenciado mais voltado ao jovem. No caso específico de São Paulo, duas emissoras vão buscar esse caminho: a Excelsior com o slogan “A máquina do som” e a Difusora. Então o que vai acontecer, há uma tentativa de melhorar o perfil da programação, tornando essa programação mais jovem. Desde o final de meados dos anos 1960, final dos anos 1960, a partir de 1967, 1968, a Bandeirantes AM tenta buscar uma programação mais jovem com um cara chamado Hélio Ribeiro, que fazia um programa que começa na Tupi, depois vai ter o seu grande auge na Bandeirantes, chamado O Poder da Mensagem. O Hélio, na época, era um jovem, comunicador, que fazia um perfil de comunicação que misturava locução, música e informação, prestação de serviço. O Hélio traz ao rádio brasileiro uma situação curiosa, ele trabalhou um período nos Estados Unidos, e vendo um filme no cinema brasileiro, ele viu que a tradução, a legenda não batia com a fala. E aí chega um dia na rádio e diz para os caras “vamos traduzir música”, os caras falam “tá louco!”, e aí ele foi o primeiro cara a tocar música e traduzir; e ele não chamava tradução, chamava de uma “versão livre para o português”. E o Hélio começa a buscar um público mais jovem, falando com as pessoas, brincando, conversando, ele tinha um perfil um pouco mais romântico
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até, ele dava mensagens, tanto que a ideia, o conceito do programa Mensagem, era um programa para àqueles que tinham um perfil mais jovem, mais inquietante, mais inquieto até. A Difusora e a Excelsior entram no embate buscando um novo perfil de público, mais jovem, incluindo historicamente, como nós temos as discos nos anos 1970, eles buscam um perfil mais pop. Dentro desse perfil, você tem uma situação que eles tentam apresentar o que havia de mais novo em música sendo lançada. Então um apresenta os sucessos da Billboard, da revista, e a outra apresenta os sucessos da Cashbox, uma outra revista concorrente da Billboard. E a ideia era apresentar. Então, no sábado à noite, por exemplo, eles tinham um programa em que alguns dos locutores transmitiam a partir dos Estados Unidos o que havia de mais novo. Então, “Donna Summer lança tal disco”, “Bee Gees está tocando mais que Abba”, enfim, vai por aí afora. Então, a busca desse público mais jovem inclui o pop. O rock é um pedaço disso, porque dentro do pop brasileiro, lembra que nosso rock ele foi aleijado por um grande período da ditadura ao certo ostracismo, até por conta do perfil contestador do rock. Então o rock brasileiro vai ficar meio em dormência até os anos 1980 com o processo de abertura, e as rádios vão ter este perfil muito mais americanizado; tanto que as opções seguem o perfil americano, um time mais rápido, acelerado, dispara música, o cara fala em cima, tem todo um projeto plástico: com vinheta, com trilha, com carimbos, completamente diferente do que nós tínhamos antes. Então o rádio tenta buscar um novo nicho de mercado, quer um rejuvenescimento deste rádio, para que ele atinja o perfil mais jovem. Na mesma linha, o mesmo período, você tem a Tupi com Hélio Ribeiro, que vai pra Bandeirantes; depois Difusora e Excelsior, que competem neste perfil mais pop, que entra um pouco de rock; e a Jovem Pan também vai ter uma produção musical diferenciada, entre os programas um destaque específico para o programa do Zuza Homem de Mello, das cinco às seis, todos os dias de segunda a sexta. Tem um relato muito interessante sobre isso num livro do Zuza, chamado Música nas Veias. O Zuza era músico, ele larga o que ele estava fazendo aqui para estudar músicas nos Estados Unidos, e ser técnico de som de um estúdio, que grava os principais caras do jazz; e quando ele volta, ele volta ao Brasil pra ser operador de áudio, e vai trabalhar como operador de áudio e músico – ele vai fazer bicos de músico e operador de áudio para ganhar uns trocos – quando ele começa como operador de áudio, ele vai trabalhar no
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teatro da TV Record. E é ele o responsável pelo material do Fino da Bossa, ele vai ser o técnico de áudio do teatro da Record, responsável pelo Fino da Bossa, por exemplo. Depois nos anos 1990, ele salva uma parte desse arquivo que ele tinha guardado e remasteriza como uma série de produções da Velas, gravadora do Ivan Lins. Então você tem dentro desse período Difusora, Excelsior, Jovem Pan e Bandeirantes disputando um perfil de público mais jovem com perfis de linguagens diferentes. O Zuza no programa da Jovem Pan, ele parava a música no meio para explicar a música, tocava de novo, explicava a questão do cara ter um baixo, olha o posicionamento da bateria, então às vezes ele tocava um Cole Porter, tocava rock, tocava blues, tocava jazz, tocava música brasileira, MPB, enfim, era uma grande miscelânea que ele amarrava. O Hélio tinha um perfil mais americanizado, mas também tocava músicas nacionais, fazendo as traduções do que era internacional, de algumas músicas, e um perfil diferente. A Excelsior e a Difusora tinham esse perfil mais jovem, onde o rock se inseria aí dentro. Eu acho que efetivamente A Maldita no Rio, vai ser talvez a primeira a ter um perfil mais engajado de produção musical em rock e depois nos anos 1980 pra 1990, aí você chega com a 89. O Adhemar (Altieri) monta a Kiss já nos anos 1990 com o perfil de core radio que ele viu e estudou nos Estados Unidos e no Canadá, o Magliocca (Luis Fernando) monta a 89 com outro perfil. Então, caso específico da mulher no rock, eu acho que nós temos pouquíssimos registros de locutoras efetivamente envolvidas no rock. Primeiro, que nós vamos ter até meados dos anos 1980 uma dificuldade em ter programas de rock. O rock era algo considerado meio alternativo na época que você tinha... Acabamos tendo dois redutos efetivos de resistência ao perfil musical da época. De um lado o rock, que foi quase abafado, propositalmente no regime militar, pra colocá-los na clandestinidade; então sobrou Raul, Rita, alguma coisa do Secos & Molhados, mas muito pontual. E na outra ponta, a MPB. O que sobrou fora disso, você tem pouca opção. Você tem música de raiz, que vai sobreviver muito lateralmente, se virando com shows pelo país. E no caso do rock, o rádio só vai voltar a olhar o rock efetivamente a partir dos anos 1980, quando teve o processo de abertura. E aí você retoma, e mesmo assim, num primeiro momento, ainda havia uma dificuldade em investir. As gravadoras tinham dificuldade em investir em rock nacional, por uma série de fatores, até de mercado, o mercado ainda não tinha se habituado a consumir o rock nacional. A gente vinha dos anos 1970 do perfil das
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discos, com um envolvimento muito grande do rádio em vender o padrão disco music pra época. Então, a locução foi voltada para o perfil americano. Eu não me lembro efetivamente de mulheres fazendo locuções para programas específicos de rock, sinceramente. Eu acho que depois dos anos 1980, melhorou um pouco. Na 89 a gente passou a ter meninas como apresentadoras, mas aí apresentador perfil geral de FM. Assim, “fulana é só especialista em rock”. Passou a ser assim, o cara gosta de rock trabalha com uma voz feminina, mas efetivamente mulheres, não. No caso da Difusora e da Excelsior, eu não me recordo de ter programas específicos de rock. Do ponto de vista de rádio, nós tivemos um período muito curioso. O rádio entra num processo histórico e vai se perder um pouquinho em uns anos, a partir dos anos 1950. Quando a gente sai dos anos 1940 aos anos 1950, o rádio tem um grande auge de produção de entretenimento. Com a chegada da TV, o rádio se reloca como produtor mais de notícias e serviço, do que necessariamente entretenimento, porque a TV ganha no entretenimento. Então o rádio entra no processo de companhia, “olha, vou te fazer companhia ao longo do dia”. Então você está em trânsito, você está trabalhando, você está ouvindo rádio, você não está vendo a TV, até porque tinha algumas dificuldades também pra você conseguir esse material de conteúdo, de imagem. Imagina que até um período no final dos anos 1970, a TV era “telecinada”, o cara saia pra gravar com película, se não o repórter gravava, voltava, a gente tinha que editar na película, montar a trilha de áudio, telecinar pra poder passar na TV. Então não tinha muita opção, “ah, eu acho que eu errei”. Sinto muito amigo, ou você faz de primeira, ou vai ficar muito caro pra gente tirar os pedaços do filme. Então imagina, isso era algo caríssimo. E o rádio, sempre teve uma vantagem competitiva com a TV com a questão da produção de conteúdo, e as músicas também. O que houve, por exemplo, a gente praticamente não tem mais. O perfil da rádio “vitrolão”, o tocador de música, tende acabar, porque você tem o Spotify, você tem o Deezer. Eu prefiro ouvir os canais específicos. Pra aquela época não, você tinha o tutor, que era o disc jockey. A gente vai ter de período do rádio no Brasil entre 1919 e 1932, a implementação do rádio. Então, o rádio está chegando ao país. As primeiras transmissões são da década de 1910, entre 1910 e 1919, sendo que em 1919 efetivamente a rádio de Pernambuco começa a transmitir com mais periodicidade, e em 1922 chega a Nacional do Rio, a Roquete Pinto. De 1932 a 1940, a gente tem a estruturação das programações, então aí
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de 1932 a 1940 a gente vai num período em que a gente trabalha a organização das audiências, os recortes das programações, a montagem dos programas. De 1940 a 1950, ali eu tenho o apogeu do rádio espetáculo, com muitos programas de auditório, com muita participação do ouvinte, com programas fora, e também um envolvimento político muito grande do rádio. Depois, em 1955 a 1970, eu tenho o período de decadência do rádio, o rádio entra no período de dormência, como eu disse pra vocês, porque ele vai perder espaço pra TV e demora esse período para conseguir se realocar. A partir de 1970, o rádio entra em um período de reestruturação no país, o meio rádio vai se reestruturar. E aí, você tem uma busca por um processo de programação voltada ao público jovem, seguindo o modelo norte-americano. O nosso rádio no país sempre seguiu o modelo norte-americano fundamentalmente. As emissoras vão se concentrar principalmente no jornalismo, na cobertura esportiva e na prestação de serviços. E no meio desse tripé, a gente põe a música. Então são rádios mais faladas, mas que também vão tocar músicas. Aí esse período de reestruturação, de busca do novo rádio, vai até os anos 1980, 1983 mais ou menos, onde o rádio volta a buscar uma segmentação. Então entre 1983 a 1990, a gente vai buscar a segmentação. Nesse período do início dos anos 1980 até os anos 1990, a criação da 89, a criação de outras rádios específicas, com públicos específicos, mais jovem, mais velho, público infantil, pra cá, pra lá. Entre 1970 e 1990, você tem um período de reestruturação e segmentação desse trabalho de rádio. A partir dos anos 1990, você chega com a revitalização, com entrada dos equipamentos digitais, e é o que a gente está vivendo até hoje que é uma programação... Talvez a gente possa falar futuramente que a gente vive hoje uma segmentação dentro da digitalização, é quem comprar o público mais específico através de podcasts de conteúdos, de programações pré-definidas no Deezer, no Spotify, eu começo a segmentar cada vez mais. Há que se lembrar que o rádio na Internet vai possibilitar um perfil de segmentação de abrir espaço para que mulheres, homens, jovens, crianças, enfim, todo mundo participe e crie os seus programas. Então, a partir dos anos 1990, com a chegada da tecnologia digital, a gente teve também uma diversificação de conteúdos, que incluem a produção de programas, de podcasts, de materiais que alguns foram e voltaram, outros sumiram ou foram criados a partir da daí e estão no ar até hoje; conteúdos que falam de rock, rock progressivo... Então aí você tem uma pluralização de conteúdos, você tem o cara
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que só fala de rock anos 1960, o cara que só fala de anos 1970, o outro que só fala de rock progressivo, e aí você vai ter segmentações, quer dizer, você digitaliza e a popularização da tecnologia que cada um que está aí com um computadorzinho e um microfone, o cara separa um playlist e diz “ah, isso aqui é Earth, Wild & Fire tocando não sei o que”... Alguns confundem o que é rock, as várias matizes do rock, mistura rock com pop, e vai por aí afora. Sobre o mercado fonográfico e a presença do rock no rádio e na TV A gente tem um período de abertura nos anos 1980, coincide com o processo de segmentação. Pra isso, pra visibilidade do gênero rock no Brasil, o gênero musical rock tem o Rock In Rio, o Hollywood Rock, mas principalmente o Rock In Rio vai dar muita visibilidade em 1985, e nesse período chega o rock nacional. Um pouquinho antes disso, embora o rádio também se preocupasse em fazer os lançamentos, quem vai chamar atenção para esses caras do rock, e aí eu não sei quem vem primeiro, se é o ovo ou a galinha, se é o rádio; provavelmente o rádio apresenta primeiro numa esfera local, mas em esfera nacional quem vai apresentar esses caras do rock brasileiro para o país serão dois programas populares, um especial que é o Chacrinha e o outro o Bolinha. Chacrinha tocava os caras do rock sim, a Blitz ia tocar no Chacrinha, Titãs foi tocar no Chacrinha. Então assim, o programa do Chacrinha era um caldeirão completamente maluco; a ideia do Caldeirão do Huck na realidade não passa nem perto do que era o caos no programa do Chacrinha. Esses dias eu estava pela web pra ver de novo; assim, os cortes de câmera eram um inferno, tinha muita gente, era muito confuso, tinha muita câmera, muita bagunça, as chacretes pulando seminuas, “nego” cantando, “nego” pulava junto; ele jogava abacaxi, bacalhau nas pessoas, saco de farinha. Era uma muvuca generalizada. Mas fundamentalmente, foi a partir desses programas, que ainda tinham uma força muito grande em nível nacional, que os caras do rock nacional começaram a aparecer, como Paralamas. Outro programa que passou a apresentar o rock nacional em nível nacional para a população mais caseira, fora do gueto - vamos chamar assim - foi o Fantástico, que é outra coisa maluca, você pensar numa estrutura como a TV Globo, com programas mais familiares ou muvucados como o Chacrinha, apresentando o rock nacional. É bem contrasenso, mas era um processo de abertura e mostrava-se que tinha um mercado, e por isso as gravadoras passaram a investir, e passaram a investir em rádio, e passaram a investir nos programas de TV. Por que? Porque era mercado. Havia
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um mercado reprimido, lembrando que as gravadoras ainda fazem isso, mas fazem muito mais, que era coisa de pagar para tocar. A história do single é o velho e tradicional “jabá”. Então o cara levava o disco na rádio ou depois a gravação, seja ela digital, CD; dizendo pro cara “você vai tocar essa música”, e pagava para as rádios tocarem. Por isso, quando chega o Barão Vermelho com o Cazuza, é uma quebra de paradigma também porque eles investem no Cazuza com toda a rebeldia dele e tal, mas o Cazuza era filho de um dos executivos da gravadora, por isso também havia uma facilidade maior - não que eles fossem competentes, mas ajudou a ter visibilidade a conhecer um circuito nacional que não era conhecido. Então a gravadora percebe nos anos 1980, que o rock nacional é um filão interessante e passa a investir, por isso surge Titãs, por isso surge Paralamas, por isso surge Ultraje a Rigor, todos esses caras com o perfil fazendo rock muito parecido, e já no processo de abertura. Aí os caras começam a usar alguns palavrões na música “oh, que baita impacto”, tinha rádio que tinha que cortar, os caras editavam a música para tirar uma “bunda”, um “cacete”. “Meu Deus, como assim? Que horror!”. Mas como as gravadoras investiam diretamente nas rádios, com a história do jabá, que é um diminutivo de jabaculê. Tem um jabá, qual é o jabá? Você paga pra tocar. Ainda tem rádios que sobrevivem assim até hoje. Mas com o mercado das gravadoras muito reduzido ao longo dos últimos anos, por conta do MP3, do digital, dos serviços de streaming, as gravadoras perderam muito espaço. E o que vai acontecer é que elas ficam com menos dinheiro no caixa, elas têm menos dinheiro pra investir. Imaginem que até os anos 1990, a gravadora (as rádios, no caso) falava assim “vou substituir o meu transmissor”. Vou usar um transmissor mais potente. Vamos apostar um milhão, tá bom. Chama a gravadora, faz um esquema, a gravadora pagava, um esquema de propina indireto. O processo da Lava Jato já tá meio conhecido faz tempo. Hoje, isso reduziu. Não que os caras não paguem, pagam. Só que tem menos grana e às vezes não é em espécie. Então hoje o que você tem é “ah, rádio x vai fazer um mega show de aniversário com fulano, beltrano, chiquinha, zezinho, luizinho”, esses caras não cobram cachê. O cachê é o brinde da gravadora pra levar esses caras lá pra poder tocar. Então você toca o cara, e quando você fizer aí, eu vou levar o cara aí pra fazer um almoço com o teu ouvinte e tal. Quer dizer, o jabá não deixou de existir, mas mudou a configuração.
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Como o meio fonográfico perdeu a força que tinha para os meios digitais, então isso também impactou o próprio desenvolvimento do conteúdo das emissoras. Se vocês veem hoje, a tendência que a gente tinha de segmentação nas emissoras, o rádio está meio caótico. Você ouve rádio hoje está muito parecido. Tem playlist que toca quase que ao mesmo tempo. O cara copiou a mesma playlist de um pro outro? Os caras tocam iguais. O cara diz assim “quem é o primeiro lugar jovem? Ah, é a Mix, tá bom. O que a Mix t oca? Toca essas cinquenta músicas. Opa, vou tocar esse cantor, faz esquema com a gravadora e vamos lá. Se vocês olharem, também a gente perdeu nesses últimos anos, dos anos 1990 pra cá, uma outra conotação que o rádio tinha até os anos 1980 - que inclui 89 e tal - que era uma locução autoral. Então você tinha o Morcegão, você tinha uns caras na 89, depois os caras que foram pra Kiss, que você sabia como era a cara, como o Kid Vinil, você conhece o cara. Hoje de uma forma geral, que é equivocado do meu ponto de vista, você tem um processo de produção de conteúdo no rádio que tanto faz como tanto fez, se você trocar o zezinho pelo huguinho, você coloca o cara com o mesmo timbre, um timbre parecido, que fala do mesmo jeito acelerado, toca as músicas, opera a mesa, acabou. Então você perdeu aqueles grandes salários. Esses caras eram muito caros, porque era “o cara”. Quando você tinha “o Chacrinha” na programação, você imagina que o Sílvio Santos tinha um programa de rádio, então você tinha “o Sílvio Santos” na programação. Hoje como você não tem nenhum medalhão, todo é igual, você paga um salário lá embaixo, se você não quer tá bom. Eu contrato outro que faz igual ou melhor com um salário de fome. Então imagina, a Kiss do Adhemar pagava um salário melhor, quando a Kiss estava com ele. Quando ele estruturou e a Kiss começou a decolar, o dono que é uma figura da família Abreu, chamou ele e falou assim: “Então, agora não dá mais. Vai ter que cortar, reduzir e tal”. Ele falou “não dá velho, perder pessoas”, “não dane-se!”. Então os caras que ficaram, ficaram pra ganhar metade dos salários mais ou menos. E no meio deles, já tinha uma ou outra menina, mas era muito pontual, sempre foi muito pontual. As mulheres serviam mais para as produções, locução feminina - por exemplo, no caso da Alpha FM que nos anos 1990 tinha uma programação inteira só de mulheres, não tinha homens falando na Alpha por um grande período - e reportagem, ok. Mas apresentação, focada ainda mais em rock, esquece. Era aquela coisa meio arrogante mesmo, do machão, aquela coisa mais estereotipada, depois isso dá uma melhora. Mas
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em um primeiro momento falar em rock, ainda hoje tem uma versão estereotipada de você ver o cara do rock ainda como aquele motoqueiro viking, a quele cara que anda com Harley Davidson, barbudo, jaqueta de couro e tal. Quer dizer, isso é um pedaço dos roqueiros, tem uma infinidade de grupos, de nichos aí dentro, que hoje estão na rede, que não estão mais nas programações. As programações de rádio hoje entraram em colapso, exatamente pelo fato de que eu quero ouvir Sepultura, eu posso ouvir direto o conteúdo do próprio Sepultura no site do Sepultura. Eu não preciso mais me dar ao luxo de esperar uma emissora receber o material, ter um esquema de programação pra tocar aquilo. Se vocês terem uma ideia nos anos 1970, as pessoas gravavam parte das programações, imaginem isso. Seja pra rock, seja pra pop, o cara que gostava tinha o equipamento que era um toca fitas, gravava; depois saiu um equipamento super moderno na época, que era o três em um: tinha toca fitas, toca vinil e rádio AM e FM. Então o cara deixava uma fita, comprava algumas fitas de 90 minutos, que era 45 de cada lado, e deixava lá no “rec”, “play rec” de um lado “pause” no outro, e aí os caras faziam assim meia hora de música, os caras gravavam e tinham saco de cortar as músicas. “Olha, isso aqui é a última música do Led Zeppelin, isso aqui é a última música do Ozzy, isso aqui é a última gravação do disco x”, e os cara montavam isso em fita e carregavam no carro, porque era genial você ter toca fitas no carro. Nos anos 1980 chegam os discman, e aí você não precisa mais carregar o carro, você carrega o equipamento em você. E depois você não vai mais precisar do discman, você carrega o celular, um relógio, tablet, o que for. Então isso é uma mudança de paradigma muito grande do perfil do usuário, do consumidor de rock. O rock brasileiro vai ficar muito segmentado por um período a gueto, e depois ele passa por um período de abertura e hoje volta para alguns guetos. Você tem variações aí, que automaticamente você começa a ter o fã clube, que migra pra dentro das redes sociais. Então você tinha o encontro do cara do Led Zeppelin, encontro dos fãs do x, tinha algumas casas que só tocavam rock, “oh meu Deus, que legal, vamos ouvir rock”, “culto ao rock”. Hoje se você olhar, quase não tem mais isso. Os grupos passaram a virar o que eram listas, encontros de aficionados, passou tudo pra dentro da rede, aí você compra bonequinho no site de não sei quem, compra jaqueta não sei aonde, participa do sorteio de não sei o que, compra a guitarra que foi usada pelo Jimi Hendrix no leilão da
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Sócrates, tudo digital. Então, essa pulverização também acabou impactando a programação de rádio hoje de uma forma muito direta. Efetivamente, a Difusora e a Excelsior n ão tinha pelo que me lembro um programa específico de rádio, se tinha um pedaço, muito específico. De programação como um todo, o foco delas eram os jovens. Se dentro disso, tinha um pedaço que tocava rock, ótimo, que legal, o cara toca junto, cola aí pra gente ouvir, porque não tinha uma segmentação tão grande. Então o cara trazia pra perto, punha pra rodar e tocava rock, tocava MPB, tocava samba e misturava, fazia um pacotão e ia tocando. Põe aí, quanto mais gente melhor. Depois que você começa a segmentar isso em nichos menores, como a 89, como a Kiss, c omo a SulAmérica Trânsito, você vai pegando mais específico. Sobre a participação de mulheres no rock. É um meio machista ainda? Sim. Eu acho que a gente tem aí é evidente quem vai contar melhor essa história é a própria Rita Lee, que acabou de lançar uma biografia. Eu acho que a gente tem uma dificuldade muito grande, por vários fatores. Lembra que, a emancipação feminina no Brasil demorou muito. E mesmo assim, hoje com todo o processo, mulher trabalhando, mulher dona de casa, mãe de família, arrimo de família, mãe solteira, biquíni, anticoncepcional, DIU, o mundo andou, graças à Deus. Vendo pelo lado masculino, ainda é difícil pra você explicar pro homem que ele não é o único provedor da casa, que ele não é o machão. Então imagina, você não consegue explicar a posição do homem diante de uma mulher mais independente, como é que você vai explicar uma cantora de rock dentro de um universo masculinizado brasileiro? É muito difícil. A Cássia Eller vai transitar um pouco por aí, não só de rock, mas ela faz um pop que passa no rock. A Rita efetivamente. É, eu não vejo muita gente não. A gente ainda tem hoje uma visão de mulher na música, com raras exceções, ainda mulher muito frágil. Ela é sempre docinha, bonitinha, você não tem mulher de atitude, de pancada e tal. Uma vez eu fui ver o show da Cássia, até porque eu fui entrevistar a Cássia e fiquei pro show. Ela é hiper tímida fora do palco, um doce, uma pessoa querida, mas tímida. Imagina entrevistar a Cássia, pra mim, genial, estou falando com Cássia Eller. A gente conversou um pouco antes, depois eu gravei, mesmo assim ela ainda estava um pouco receosa, porque não era o perfil dela muito de falar. No palco, o show da Cássia Eller era um show de atitude, ela era uma roqueira no palco, porque ela se travestia, virava
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um demônio, era algo maluco, muito forte. E você vê de uma forma geral, que você tem poucas mulheres com atitude de palco, com presença. Todo mundo é meiguinho, bonitinho, arrumadinho, engomadinho. Não que pra ser roqueiro você precisa ser transgressor, mas pressupõe que você tenha um perfil diferente de comunicação, fala. Você não imagina o Ozzy cantando música lenta, bonitinha, não consegue visualizar. Mesmo internacionalmente, a gente também não tem muitos grupos femininos. Se você quantificar, você vai ver que são muito mais masculinos do que femininos. Você vai ter o que, históricos aí, B-52’s, pô quem mais? Difícil hein! Nina Hagen, que é um caso à parte, cantando heavy, mulher cantando heavy metal. Agora deu uma popularizadinha, mas mesmo assim, historicamente tem poucas referências comparativamente.
2. Diário de Campo
Para a produção deste trabalho de conclusão de curso, passamos por inúmeros percalços até chegar a este resultado. Todo o registro do desenvolvimento deste trabalho segue abaixo.
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Setembro/2015 Definimos o tema do nosso trabalho de conclusão de curso: “Pitty: como uma
mulher baiana conseguiu ultrapassar preconceitos e barreiras para se tornar um ícone do rock nacional”. Fizemos o primeiro contato com a assessoria da cantora Pitty, que na época era a Namoral Comunicação.
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Novembro/2015 Com o tema definido, entregamos o primeiro esboço de nosso projeto
experimental com justificativa, problematização, objetivos gerais e específicos, metodologia e referências bibliográficas. A professora Mônica Rugai fez indicações de livros, sites, artigos, trabalhos acadêmicos e outras mídias para leitura e que serviriam de fonte para nosso trabalho de pesquisa.
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Fevereiro/2016 Leituras de livros, artigos e demais arquivos que serviram de apoio para a
pesquisa e aprofundamento do tema.
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Março à Junho/2016 Vivemos todo processo de escrita do referencial, devolutivas com os professores
orientadores, até a entrega do mesmo no final de junho. Nesse período passamos por uma verdadeira batalha de persistência para conseguir entrevistar Pitty, recebendo sempre negativas por parte da assessoria de imprensa da cantora, que passou a ser a Batucada Comunicação. Negativas essas, que se intensificaram após o anúncio público da gravidez de Pitty, no mês de abril.
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Julho à Agosto/2016 Depois de meses tentando contato com Pitty através de sua assessoria de
imprensa, iniciamos o ciclo de entrevistas com pessoas que pudessem trazer uma visão do mercado da música e da importância de Pitty para o rock brasileiro. Para isso, conseguimos entrevistar pessoalmente em seus locais de trabalho, os locutores Edgard Piccoli, da rádio Jovem Pan, e Luka Salomão, da 89fm - A Rádio Rock, além do jornalista José Norberto Flesch, editor de Diversão & Arte do jornal Destak, que comunicou-se conosco via WhatsApp. A assessora de Pitty, Piky Mariana Candeias, da Batucada Comunicação, com quem havíamos nos comunicando desde o início de 2016, nos respondeu somente após a cantora anunciar a gravidez com um: “ela não pode atender, pois está de repouso”. Após uma ligação e mais algumas trocas de e-mails, a última que tivemos de Piky foi: “Oi, queridos./ Não tem como, ela está de licença, não vai fazer nada./ Talvez procurando no Google vocês encontrem o suficiente./ beijos e grata pela compreensão / Piky”. Mesmo após esta resposta, insistimos por mais duas oportunidades: uma ainda com a Piky e outra com Marcus Cesar, também assessor da Batucada.
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Setembro/2016
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Com a entrevista com Pitty descartada e os prazos cada vez mais próximos, sob orientação de nossa orientadora de produto, professora Andreia Alevado, resolvemos utilizar uma abordagem diferente que não alterasse muito este referencial. Enviamos e-mails para artistas que tivessem feito algum tipo de parceria com Pitty, como foi o caso, por exemplo, dos Paralamas do Sucesso, Rita Lee, Baby Consuelo, Negra Li, Far From Alaska, Ira! (através de um contato de Rebeca Serpa, amiga de Thiago), mas naquele primeiro momento, não tivemos retornos positivos. Sem retorno desses artistas, resolvemos disparar diversos e-mails para outros artistas, como Fernanda Takai, Titãs, Capital Inicial, Cachorro Grande, CPM 22, Paula Toller, Kid Vinil, Wanderléa, Marina Lima e Roger Moreira que aceitou falar conosco em outubro, desde que não tocássemos no assunto Pitty.
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Outubro/2016 Entrevistamos, então, o vocalista do Ultraje A Rigor, Roger Moreira, que trouxe
o peso do rock dos anos 1980 à nossa pesquisa, no SBT, pois a banda é contratada do talk-show The Noite, apresentado por Danilo Gentili. Partimos para uma espécie de Plano C, remanejando todo o referencial teórico e produto final para o leque das mulheres do rock brasileiro. Assim, seguimos para um caminho, segundo orientação dos professores envolvidos no projeto, mais jornalístico e atrativo para o público, de modo geral. Conversamos também com Luiza Pereira, vocal, synth e compositora da banda paulista Inky. No dia da entrevista, fomos até a casa do guitarrista Stephan Feitsma, em Santo Amaro, onde a banda ensaia. Passamos um final da tarde lá, gravamos a entrevista com a Luiza e conversamos de forma descontraída com a banda. Com as quatro entrevistas que conseguimos até então já transcritas, fomos aprovados pela pré-banca no dia 25 de outubro, com algumas correções e adições a serem feitas neste referencial. No final do mês, a Caroline (autora deste trabalho junto com Thiago) foi à Festa Avalanche, na qual tocaram as bandas Medulla, Scalene, Ego Kill Talent, Far From Alaska e Supercombo. Os shows aconteceram na Clash Club, em São Paulo, e no segundo dia de festival a Caroline encontrou Emmily Barreto, do Far From Alaska, logo na entrada do evento. Falando que já havia entrado em contato com Emmily e que ela
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havia dito que a responderia por e-mail, o que aconteceu entre agosto e setembro de 2016, Emmily pediu desculpas por não ter respondido e levou Caroline até o camarim para conceder uma entrevista. No camarim, Caroline conversou também com Cris Botarelli, integrante do Far From Alaska junto com Emmily, e com a baixista do Supercombo, Carol Navarro, a qual fecharia aquela noite de festival. No dia seguinte à Avalanche, o assessor da banda Ira!, Airton Valadão Júnior, com quem já havíamos entrado em contato, respondeu via WhatsApp com as respostas de Nasi, em formato de áudio, e Edgard Scandurra, em formato de texto (segundo Airton Valadão, Edgard Scandurra não responde mais nada por áudio). -
Novembro/2016 Focamos na finalização do referencial teórico com os devidos ajustes requeridos
pela pré-banca, no final de outubro, e seguimos para a estruturação do programa de rádio, isto é, elaboração do roteiro, escolha das músicas que serviram de trilha, decupagem dos áudios das entrevistas, definição do nome do programa de rádio, confecção da arte do CD, gravação de nossas sonoras no estúdio de rádio da universidade e finalização do programa. Com indicação de nossa orientadora, Mônica Rugai, realizamos entrevista com o doutor, jornalista, especialista em rádio e professor da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), Álvaro Bufarah Júnior, na Ricardo Viveiros & Associados - Oficina de Comunicação, local onde ele realiza seu segundo trabalho. Álvaro nos proporcionou um panorama do rádio no Brasil, com foco nos dials dedicados à divulgação do rock no país. Ao final do mês, fechamos o produto e entregamos o projeto completo: referencial teórico e CD com o programa de rádio O Rock Delas. -
Dezembro/2016 Realizamos a apresentação do nosso trabalho de conclusão de curso para a banca
final do departamento de Jornalismo do Centro Universitário FIEO - UNIFIEO.
3. Roteiro - O Rock Delas Trabalho realizado como conclusão do curso de Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo
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Caroline Sampaio Rossetti Thiago Correia dos Santos Orientação Mônica Rugai Bastos Andreia Cristina Alevato Rodrigues Coordenadora do projeto experimental de jornalismo Mônica Rugai Bastos Coordenador do curso de jornalismo Marcello Chami Rollemberg Reitor Dr. Luíz Fernando Costa e Silva Centro Universitário FIEO - UNIFIEO Dezembro de 2016
UNIFIEO PROGRAMA O ROCK DELAS EDITOR CAROLINE ROSSETTI THIAGO CORREIA
EDITORIA CULTURA/MÚSICA TEMPO tLOC tSON tTOTAL: 20’
DATA Dez/ 2016
RETRANCA MULHERES DO ROCK PÁGINA 1
THIAGO
OLÁ, EU SOU THIAGO CORREIA
CAROL
OLÁ, E EU CAROLINE ROSSETTI
THIAGO
COMEÇA AGORA O ESPECIAL “O ROCK DELAS”
TEC
ENTRA VINHETA - ESSE TAL DE ROQUE ENROW - RITA LEE 0:25 - 0:38
CAROL
O PROGRAMA DE HOJE TRAZ AS MULHERES QUE SE DESTACARAM NO ROCK BRASILEIRO AO LONGO DESSES MAIS DE SESSENTA ANOS DE HISTÓRIA
THIAGO
POR FALAR EM HISTÓRIA, FOI LÁ NA DÉCADA DE SESSENTA QUE APARECEU A PRIMEIRA MULHER A CANTAR ROCK NO BRASIL: CELLY CAMPELLO
TEC
SOBE SOM - BANHO DE LUA - CELLY CAMPELLO 1:12 - 1:30
CAROL
CELLY CAMPELLO VINHA NA ONDA DAS VERSÕES BRASILEIRAS DE MÚSICAS CONSAGRADAS NOS ESTADOS UNIDOS, COMO É O CASO DE “BANHO DE LUA”
THIAGO
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E FORAM ESSAS VERSÕES QUE FIZERAM COM QUE ELA RECEBESSE O TÍTULO DE RAINHA DO ROCK EM MIL NOVECENTOS E SESSENTA E DOIS CAROL AINDA NOS ANOS SESSENTA, QUEM SURGIU POR AQUI FOI O GRUPO JOVEM GUARDA THIAGO FORMADO POR ROBERTO CARLOS, ERASMO CARLOS E WANDERLÉA,O GRUPO DITAVA MODA E COMEÇAVA A INSERIR A MULHER NUM MEIO MASCULINO, QUE É O ROCK, COM A FIGURA DA ETERNA TERNURINHA
UNIFIEO PROGRAMA O ROCK DELAS EDITOR CAROLINE ROSSETTI THIAGO CORREIA
EDITORIA CULTURA/MÚSICA TEMPO tLOC tSON tTOTAL: 20’
RETRANCA MULHERES DO ROCK
DATA Dez/ 2016
PÁGINA 2
TEC
SOBE SOM - PARE O CASAMENTO - WANDERLÉA 0:46 - 1:00
CAROL
FOI SÓ COM CHEGADA DE RITA LEE E O GRUPO OS MUTANTES QUE O ROCK COMEÇOU A TOMAR CORPO COM UMA PRODUÇÃO CEM POR CENTO BRASILEIRA, COMO FALA O RADIALISTA DA JOVEM PAN, EDGARD PICCOLI
TEC
SONORA EDGARD 3 2:40 - 2:52 (RITA LEE PIONEIRA MUTANTES É EMBLEMÁTICO)
THIAGO
NASI, VOCALISTA DO IRA! COMPLETA.
TEC
SONORA NASI 3 0:25 - 0:31 (RITA LEE É O MAIOR REPRESENTANTE DO ROCK)
CAROL
A VOCALISTA DA BANDA INKY, LUIZA PEREIRA, TAMBÉM FALA SOBRE RITA LEE.
TEC
SONORA LUIZA 1 5:55 - 6:13 (TENHO QUE FALAR RITA LEE ELA É FODA)
THIAGO
ROGER, VOCALISTA DO ULTRAJE A RIGOR, CONTA A SUA ADMIRAÇÃO POR RITA.
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TEC
SONORA ROGER 1 12:35 - 12:50 (RITA LEE MINHA ÍDOLAQUERO SER COMO ELA)
CAROL
DEPOIS DOS MUTANTES, RITA LEE FORMOU A BANDA TUTTI-FRUTTI E FOI ALI, EM PLENO OS ANOS SETENTA QUE ELA PRODUZIU UM DOS MAIORES HITS DA CARREIRA: OVELHA NEGRA
TEC
SOBE SOM - OVELHA NEGRA - RITA LEE 0:30 - 1:28
UNIFIEO PROGRAMA O ROCK DELAS EDITOR CAROLINE ROSSETTI THIAGO CORREIA
EDITORIA CULTURA/MÚSICA TEMPO tLOC tSON tTOTAL: 20’
DATA Dez/ 2016
RETRANCA MULHERES DO ROCK PÁGINA 3
CAROL
CONTINUANDO NOSSA LINHA DO TEMPO, QUEM MOVIMENTOU A CENA LÁ NOS ANOS SETENTA FOI BABY CONSUELO E SEUS NOVOS BAIANOS
THIAGO
A IRREVERÊNCIA DO GRUPO CONQUISTOU PÚBLICO E CRÍTICA A PONTO DE O DISCO “ACABOU CHORARE”, DE MIL NOVECENTOS E SETENTA E DOIS, TER GANHADO O TÍTULO DE MELHOR ÁLBUM DE MÚSICA BRASILEIRA DE TODOS OS TEMPOS
CAROL
E DESSE ÁLBUM VOCÊ ESCUTA AGORA A MÚSICA “A MENINA DANÇA”, QUE AINDA ROLA NOS SHOWS DE BABY MESMO DEPOIS DELA TER PARTIDO PARA CARREIRA SOLO
TEC
SOBE SOM - A MENINA DANÇA - BABY 0:51 - 1:30
THIAGO
O BRASIL VIU A ONDA ROCK TOMAR REALMENTE O PAÍS NA DÉCADA DE OITENTA COM O BOOM DAS GRAVADORAS, COMO RELATA EDGARD PICCOLI.
TEC
SONORA EDGARD 2 3:08 - 3:39 (BOOM DAS GRAVADORAS PRO ROCK - AS BANDAS FORAM BEM SUCEDIDAS)
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CAROL
E UMA DESSAS BANDAS BEM SUCEDIDAS, FOI O KID ABELHA, COM A VOZ DELICADA DE PAULA TOLLER.
TEC
SOBE SOM - PINTURA ÍNTIMA - KID ABELHA 0:57 - 1:38
THIAGO
O PRIMEIRO SINGLE QUE COLOCOU O KID ABELHA NAS RÁDIOS DE TODO PAÍS FOI “PINTURA ÍNTIMA”
CAROL
COM MÚSICAS MAIS AÇUCARADAS E UM RITMO MAIS POP, A BANDA ABUSAVA DAS ENTRELINHAS, COMO É O CASO DA FAIXA “NADA SEI”
UNIFIEO PROGRAMA O ROCK DELAS EDITOR CAROLINE ROSSETTI THIAGO CORREIA
EDITORIA CULTURA/MÚSICA TEMPO tLOC tSON tTOTAL: 20’
DATA Dez/ 2016
RETRANCA MULHERES DO ROCK PÁGINA 4
TEC
SOBE BOM - NADA SEI - KID ABELHA 0:16 - 1:08
THIAGO
NA LINHA DO POP ROCK, OS ANOS NOVENTA VEIO COM SURGIMENTO DO PATO FU E DE SUA VOCALISTA FERNANDA TAKAI
CAROL
A INTEGRANTE DA BANDA FAR FROM ALASKA, CRIS BOTARELLI, REVELA TER O TRABALHO DE FERNANDA TAKAI COMO INSPIRAÇÃO.
TEC
SONORA CRIS 1 0:40 - 0:48 (PATO FU É UMA BANDA QUE ESCUTEI NA ADOLESCÊNCIA E O TRABALHO SOLO DA FERNANDA TAKAI)
THIAGO
A BANDA CHEGOU COM A BOLA TODA EMPLACANDO SEU PRIMEIRO PRÊMIO COM O CLIPE DA MÚSICA “SOBRE O TEMPO” NA MTV
TEC
SOBE SOM - SOBRE O TEMPO - PATO FU 0:36 - 1:16
CAROL
FOI NOS ANOS DOIS MIL QUE A ROQUEIRA QUE ATUA COMO
126
REFERÊNCIA PARA AS NOVAS GERAÇÕES SURGIU, PITTY. COMO AFIRMA O JORNALISTA DO DESTAK, JOSÉ NORBERTO FLESCH. TEC
SONORA NORBERTO 6 0:17 - 0:22 (VOCÊ É MULHER - QUERO SER QUE NEM A PITTY)
THIAGO
EMMILY BARRETO, VOCALISTA DO FAR FROM ALASKA, UMA BANDA DE STONER ROCK, DIZ O QUE PENSA SOBRE PITTY.
TEC
SONORA EMMILY 1 2:20 - 2:25 (PITTY MARAVILHOSA)
CAROL
NASI, QUE TRABALHOU COM PITTY EM DOIS MIL E QUATRO, FALA SOBRE A ATITUDE DA ROQUEIRA COMO MODELO PARA AS NOVAS GERAÇÕES.
TEC
SONORA NASI 4 0:02 - 0:31 (TEM ATITUDE - ÍDOLO LEGAL)
UNIFIEO PROGRAMA O ROCK DELAS EDITOR CAROLINE ROSSETTI THIAGO CORREIA
EDITORIA CULTURA/MÚSICA TEMPO tLOC tSON tTOTAL: 20’
RETRANCA MULHERES DO ROCK
DATA Dez/ 2016
PÁGINA 5
THIAGO
A RADIALISTA LUKA SALOMÃO DA OITENTA E NOVE FM FALA DA IMPORTÂNCIA DE PITTY PARA ESTA GERAÇÃO.
TEC
SONORA LUKA 1 1:52 - 2:04 (ACHO ELA IMPORTANTE PRO ROCK - ELA É ÚNICA DA GERAÇÃO - TA NA FRENTE DO MAQUINISTA SOLANDO)
CAROL
EDGAR PICCOLI DA JOVEM PAN COMPLETA.
TEC
SONORA EDGARD 3 4:48 - 5:02 (QUERENDO OU NÃO, ELA É ÍCONE - MEIO MASCULINO)
THIAGO
EM DOIS MIL E TRÊS, LOGO EM SEU PRIMEIRO DISCO, PITTY COLOCOU NAS PARADAS O SINGLE MÁSCARA
TEC
SOBE SOM - MÁSCARA - PITTY 0:58 - 1:35
CAROL
DEPOIS DE TODA ESSA TRAJETÓRIA DE MULHERES COMO
127
THIAGO
ESPELHO PARA AS MENINAS QUE QUEREM SE AVENTURAR NO UNIVERSO DO ROCK, CHEGAMOS AOS DIAS ATUAIS COM, SIM!, UMA CENA DE ROCK SE FORTALECENDO
TEC
É CAROL, MAS MESMO ESTANDO NO SÉCULO 21, ESSAS MENINAS AINDA SENTEM O PESO DE SER MULHER E ESTAR EM UM MEIO MASCULINO
CAROL
SOBE SOM - ECHOES IN THE GROVE - INKY 1:11 - 1:29
TEC
É O CASO DA VOCALISTA DA BANDA INKY, LUIZA PEREIRA
TEC
SONORA LUIZA 1 9:21 - 9:32 (O AMBIENTE É HOSTIL PRA MULHERES SE NÃO FOR PROFISSÃO FEMININA)
TEC
SONORA LUIZA 1 9:34 - 10:00 (ASSÉDIOS ASSIM)
TEC
SONORA LUIZA 1 10:21 - 10:45 (SEMPRE VÃO DUVIDAR) SONORA LUIZA 1 10:52 - 11:09 (TEM ESSE DESRESPEITO - ME DEIXA FELIZ)
UNIFIEO PROGRAMA O ROCK DELAS EDITOR CAROLINE ROSSETTI THIAGO CORREIA
EDITORIA CULTURA/MÚSICA TEMPO tLOC tSON tTOTAL: 20’
DATA Dez/ 2016
RETRANCA MULHERES DO ROCK PÁGINA 6
THIAGO
A BANDA INKY JÁ TOCOU EM FESTIVAIS NO CHILE E EM BARCELONA, GRAVOU COM STEVE LILLYWHITE E TEVE SEU ÚLTIMO DISCO “ANIMANIA” PRODUZIDO POR GUILHERME KASTRUP
CAROL
E DESSE DISCO, VOCÊ CONFERE AGORA A FAIXA “FUTURE TONGUES”
TEC
SOBE SOM - FUTURE TONGUES - INKY 1:13 - 1:48
TEC
SOBE SOM - PILOTO AUTOMÁTICO - SUPERCOMBO 0:22 1:02
THIAGO
NO MEIO DE TODO ESSE CENÁRIO DE MULHERES LUTANDO POR ESPAÇO NO ROCK, AINDA PODEMOS CITAR A BAIXISTA CAROL NAVARRO, QUE ESTÁ NA BANDA SUPERCOMBO DESDE DOIS MIL E DOZE
128
TEC
SONORA CAROL 1 0:59 - 1:28 - 1:35 (MESMO COM TODO PRECONCEITO, NÃO FOCAR NISSO - MULHERES SOFREM TODO DIA - UNIVERSO MUSICAL É MASCULINO)
TEC
SONORA CAROL 1 1:44 - 2:13 (SEGUE SEU TRABALHO VAI DAR MAIS FRUTO) [TIRAR DESSE TEMPO “SÃO AMIGOS”]
CAROL
ALÉM DE TOCAR BAIXO, A CAROL NAVARRO AINDA FAZ OS BACKING VOCALS DO SUPERCOMBO. SE LIGA NO NOVO SINGLE “MAGAIVER”
TEC
SOBE SOM - MAGAIVER - SUPERCOMBO 1:51 - 2:13
TEC
SOBE SOM - THIEVERY - FAR FROM ALASKA 1:03 - 1:37
THIAGO
AS MENINAS DO FAR FROM ALASKA, EMMILY BARRETO E CRIS BOTARELLI, TAMBÉM DERAM UMA PALHINHA SOBRE A CENA DO ROCK NACIONAL PARA AS MULHERES.
UNIFIEO PROGRAMA O ROCK DELAS EDITOR CAROLINE ROSSETTI THIAGO CORREIA
EDITORIA CULTURA/MÚSICA TEMPO tLOC tSON tTOTAL: 20’
DATA Dez/ 2016
RETRANCA MULHERES DO ROCK PÁGINA 7
TEC
SONORA EMMILY 1 1:52 - 1:59 (VCS MUDARAM MEU CONCEITO COM BANDA COM MINA)
TEC
SONORA EMMILY 2 0:10 - 0:45 (TENHO MUITAS AMIGAS - NÃO TER PASSADO POR PRECONCEITO)
TEC
SONORA CRIS 2 2:44 - 3:27 ( A GENTE É EM 2 - PRA FAZER MÚSICA BOA)
TEC
CRIS 2 3:57 - 4:20 (QUANDO EU TINHA OUTRA BANDA - É MUITO CHATO)
TEC
CRIS 2 2:00 - 2:29 (TEM A CAROL, LUIZA, A GENTE, PITTY VAMO TIRAR ESSA MACHARADA E DEIXAR O MEIO MAIS FEMININO)
129
CAROL
ESSE FOI “O ROCK DELAS”, TRABALHO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL COM HABILITAÇÃO EM JORNALISMO, DO CENTRO UNIVERSITÁRIO FIEO - UNIFIEO.
THIAGO
PRODUZIDO POR CAROLINE ROSSETTI E THIAGO CORREIA. COM ORIENTAÇÃO DE MÔNICA RUGAI BASTOS E ANDREIA CRISTINA ALEVATO RODRIGUES.
CAROL
SONOPLASTIA, LEANDRO DE ANDRADE. COORDENAÇÃO DE CURSO, MARCELLO CHAMI ROLLEMBERG. REITOR, DOUTOR LUIZ FERNANDO DA COSTA E SILVA. ORIENTAÇÃO DE ROTEIRO, ANDREIA CRISTINA ALEVATO RODRIGUES.
THIAGO
AGRADECIMENTOS: JOSÉ NORBERTO FLESCH, EDGARD PICCOLI, LUKA SALOMÃO, ROGER MOREIRA, LUIZA PEREIRA, EMMILY BARRETO, CRIS BOTARELLI, CAROL NAVARRO, NASI, EDGARD SCANDURRA, ÁLVARO BUFARAH JUNIOR, MELISSA ELY, AIRTON VALADÃO JUNIOR
CAROL
MÔNICA RUGAI, ANDREIA ALEVATO, LEANDRO DE ANDRADE, ANDRÉ OLIVA, MARCELLO ROLLEMBERG, NARA LYA CABRAL, SANDRO RIBEIRO, CAIO ROSSETTI, WESLEY ATICO, REBECA SERPA.
UNIFIEO PROGRAMA O ROCK DELAS EDITOR CAROLINE ROSSETTI THIAGO CORREIA
EDITORIA CULTURA/MÚSICA TEMPO tLOC tSON tTOTAL: 20’
DATA Dez/ 2016
RETRANCA MULHERES DO ROCK PÁGINA 8
THIAGO
ÀS FAMÍLIAS, AMIGOS E COLEGAS DE SALA QUE ACOMPANHARAM TODO NOSSO TRABALHO, SEMPRE NOS APOIANDO.
CAROL
É ISSO AÍ, CAROS OUVINTES, FICA POR AQUI O ESPECIAL “O ROCK DELAS”
THIAGO
E PRA FECHAR O PROGRAMA, VOCÊ ESCUTA TODO PESO DO FAR FROM ALASKA E A FAIXA “DINO VS DINO”. ATÉ A PRÓXIMA
CAROL
TCHAU!
TEC
SOLTA DINO VS DINO - FAR FROM ALASKA 0:50 - 1:07
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