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ESPECIAL AÇORES

ESPECIAL AÇORES

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Apesar da chuva, crentes e não crentes participaram na procissão. Festas em honra a Nossa Senhora de Guadalupe são as mais importantes da freguesia, garante ‘mordomo’

Festas de Agualva atraem milhares à freguesia da ilha Terceira

CMCTV acompanhou festejos, que já não aconteciam há 2 anos, em exclusivo

TERESA LENCASTRE EDUARDO VIEIRA

Foram sete dias recheados de música, touradas à corda, cortejos, procissões, gastronomia e, sobretudo, convívio, muito valorizado pelos açorianos e pelos emigrantes, que sempre que podem regressam à sua terra natal, para matarem saudades dos amigos, da família e das tradições festivas da ilha Terceira, conhecida como o ‘parque de diversões’ dos Açores.

As festas em honra a Nossa Senhora de Guadalupe, padroeira de Agualva, atraíram milhares à freguesia, de 14 a 20 de agosto, tendo tido vários pontos altos, como o cortejo de abertura, a procissão, o concurso de ganadarias ou o concerto de Eduardo Santana.

De acordo com a comissão que organizou os festejos, um grupo de casais que nos Açores se designam ‘mordomos’, o balanço é positivo: “No fim, há sempre alguma coisa que podíamos ter mudado, nada como passarmos pelas experiências para depois sabermos como lidar com elas. Foi o nosso primeiro ano, para os três casais, mas o balanço é muito positivo, correu tudo dentro daquilo que idealizámos”, conta uma das ‘mordomas’, Taciana Costa.

“Dá muito trabalho ser ‘mordomo’, principalmente numa festa como a de Agualva, que tem certas especificidades, como o cortejo de abertura ou o bodo de leite, o concurso de ganadarias. É uma freguesia que tem de se engalanar e que tem de receber muito bem quem nos visita. Daí a dificuldade de ao longo destes últimos meses termos preparado estas festas”, revelou, por sua vez, o ‘mordomo’ Bruno Messias, aproveitando para agradecer o apoio dos patrocinadores, nomeadamente do Canadá.

Dificuldades à parte, os festejos, que de acordo com Bruno Messias são os mais importantes do ano em Agualva, pareceram agradar as multidões que durante a semana estiveram na freguesia, incluindo inúmeros emigrantes, sobretudo dos Estados Unidos e do Canadá. O Correio da Manhã Canadá conversou com vários e entre todos a satisfação foi evidente.

“Diga-me lá, quem é que não gosta da sua terra? Eu posso morrer amanhã, mas morro consolado. Estou a ver o que há muitos anos não via”, disse-nos o luso-canadiano Reinaldo Garcia, que já não visitava os Açores há nove anos, durante uma das várias touradas à corda que integraram a programação dos festejos.

A principal tourada à corda aconteceu na sexta-feira, dia 19 de agosto. Quatro touros, todos eles estreantes em touradas à corda, passearam durante a tarde pelas ruas da freguesia, não apenas para animar os espetadores, mas também para serem avaliados por um júri anónimo, que no final da lide distinguiu dois animais. O touro da ganadaria de José Gabriel Mendes

“Dá muito trabalho ser ‘mordomo’, principalmente numa festa como a de Agualva, que tem certas especificidades, como o cortejo de abertura ou o bodo de leite, o concurso de ganadarias. É uma freguesia que tem de se engalanar e que tem de receber muito bem quem nos visita”

Bruno Messias ‘Mordomo’

venceu na categoria ‘apresentação’ e o touro da ganadaria de Humberto Filipe ganhou na categoria ‘bravura’.

Festejos atraíram milhares de pessoas. Pároco da freguesia e figura de Santo António abençoaram animais

“Estou muito contente e acho que foi bem entregue. Já estava à espera, já tinha este touro guardado para Agualva há dois anos e estava sempre à espera de um prémio”, disse José Gabriel Mendes ao nosso jornal. Já João Sousa, filho de Humberto Filipe, disse que a decisão de selecionar um “touro de confiança” para a tourada em Agualva compensou.

A PRINCIPAL TOURADA À CORDA ACONTECEU NA SEXTA-FEIRA, DIA 19 DE AGOSTO. QUATRO TOUROS PASSEARAM DURANTE A TARDE PELAS RUAS DA FREGUESIA, NÃO APENAS PARA ANIMAR OS ESPECTADORES, MAS TAMBÉM PARA SEREM AVALIADOS POR UM JÚRI ANÓNIMO

O cortejo de abertura, a procissão e o bodo de leite foram outros momentos altos dos festejos. O cortejo saiu logo na primeira noite, a 14 de agosto, voltando a sair no dia do bodo de leite, na tarde de 16 de agosto. A ideia foi presentear o público com o desfile mais do que uma vez e assim exibir os fatos, a marcha e os carros ornamentados não só à noite, mas também durante o dia.

João Mendonça, um açoriano natural de Agualva profundamente envolvido em vários festejos populares da Terceira, escreveu a marcha, com o tema ‘Agualva regressa à festa’. “Escrevi a marcha este ano e há dois anos, tenho escrito com frequência. A marcha abrange toda a temática da nossa ilha, as festividades da freguesia e também o regresso dos nossos emigrantes à terra, o matar das saudades”, revelou o compositor.

A Sociedade Filarmónica Espírito Santo de Agualva foi outra peça central dos festejos. Presente em vários momentos da festa, a organização teve este ano um duplo motivo para celebrar: além do regresso das festas da freguesia, a filarmónica assinala este ano 100 anos.

“A nossa banda foi fundada no dia 19 de março de 1922. A atual direção decidiu abraçar este projeto no ano passado, com o objetivo de assinalar o centenário, e estamos a fazê-lo desde outubro passado”, revelou Marco Rocha, presidente da Sociedade Filarmónica Espírito Santo de Agualva.

Ana Lima, açoriana, caminhou descalça durante a procissão, em cumprimento de uma promessa Touro da ganadaria de José Gabriel Mendes venceu na categoria ‘apresentação’

Touro da ganadaria de Humberto Filipe ganhou na categoria ‘bravura’

No dia da tourada principal, família Rocha ofereceu o chamado ’quinto touro’, nome dado aos comes e bebes. Luís e Fernanda Leite vieram do Canadá e participaram nos festejos. Nova música de Eduardo Santana fez sucesso na freguesia

“Temos tido vários eventos na nossa casa, lançámos inclusive um livro infantil escrito por um músico da casa, e desenhado por um elemento da nossa freguesia, o Abel Mendonça, e ilustrado por todas as crianças do nosso ATL. O livro conta a história de um menino na banda e o seu percurso pelas várias festividades.”

Também ao Grupo Desportivo e Recreativo de Agualva não faltaram motivos para festejar. A equipa de futsal sénior do clube venceu no passado mês de março o campeonato da ilha, aspeto bastante enaltecido pelos vários membros da organização ao longo da festa. Há 20 anos que o grupo não era campeão, sendo que da última vez venceu na modalidade de futebol. A conquista inédita na categoria de futsal também integrou os festejos de Agualva, sendo que a junta de freguesia procedeu à entrega de faixas aos membros do clube.

O chamado bodo de leite foi outro momento muito aguardado. Trata-se de uma tradição antiga, que decorreu em Agualva na tarde de 16 de agosto, e que consiste num desfile de animais e de pessoas, vestidas com trajes rurais, contando ainda com vários momentos cómicos. O desfile, acompanhado pelo cortejo de abertura, culminou no largo da igreja, onde foram distribuídos leite e massa sovada. Logo depois, o pároco da freguesia, Moisés Rocha, abençoou várias vacas, à semelhança de uma figura de Santo António, padroeiro dos animais, que também saiu da igreja.

Um dia antes, a 15 de agosto, decorreu a tradicional procissão que, de acordo com o padre Moisés Rocha, é o momento religioso mais importante dos festejos. As ruas encheram-se dos tradicionais tapetes florais, feitos pela população local, que traçaram o caminho da procissão.

Apesar da chuva, crentes e

A MÚSICA TAMBÉM MARCOU OS FESTEJOS. ALÉM DA SESSÃO DE CANTARES AO DESAFIO, EM QUE PARTICIPANTES IMPROVISARAM LETRAS AO SOM DE GUITARRAS, A PROGRAMAÇÃO INCLUIU CONCERTOS DE VÁRIAS BANDAS

não crentes desfilaram pela rua e houve até quem fizesse o caminho descalço, seguindo várias figuras religiosas, incluindo a de Nossa Senhora de Guadalupe, em cumprimento de promessas. Foi o caso da açoriana Ana Lima, que quis agradecer a cura de uma doença: “Tenho 55 anos e nunca vi uma procissão com chuva. Mas até está fresco”, disse, entre risos, garantindo que caminhar descalça à chuva não foi um problema.

A música também marcou os festejos. Além da sessão de cantares ao desafio, em que participantes improvisaram letras ao som de guitarras, a programação incluiu concertos de várias bandas, incluindo os Myrica Faya, grupo açoriano de música folk, e de Eduardo Santana, cantor e compositor originário de Monchique, que vive em Setúbal.

A comunidade local, nomeadamente Liliana Rocha, mãe da ‘mordoma’ Taciana Rocha, garantiu que nunca um concerto atraiu tanta gente ao largo da igreja com o de Eduardo Santana. Mais do que um espetáculo com pessoas a assistir, a noite de 17 de agosto foi de proximidade

Sociedade Filarmónica Espírito Santo de Agualva assinala este ano 100 anos. Milhares de pessoas, incluindo locais, turistas e emigrantes, participaram nos festejos

Última noite contou com fogo de artifício

com o público e a nova música do cantor, ‘Too much beaucoup’ foi a que fez mais sucesso.

Eduardo Santana saiu várias vezes do palco, falou com as pessoas, e até se sentou ao colo de uma açoriana chamada Guadalupe, que por ter o nome da padroeira da freguesia, acabou a noite com uma história para contar: “Não estava com ideias de sair de casa hoje, mas foi mesmo a Nossa Senhora de Guadalupe que quis que isto acontecesse”, contou ao nosso jornal, entre risos.

Questionado sobre o sucesso do concerto, Eduardo Santana garantiu que o segredo é ser ele próprio enquanto atua: “Estou imensamente feliz, porque foi uma noite divertida, em que consegui ter o público na mão. Sou um artista do povo. Estou a atravessar um momento de auge na minha carreira, em que surgiu este grande êxito, o ‘Too much beaucoup’, numa altura da minha vida em que julgava que já tinha feito tudo”, revelou o artista, acrescentando que o concerto em Agualva foi um dos melhores que já experienciou nos Açores.

A programação das festas de Agualva incluiu ainda outras iniciativas, nomeadamente animação de rua para as crianças, missas, uma excursão ao mato, um bazar, um torneio de pesca, uma demonstração de andebol, fogo de artifício, entre outros. l

Eduardo Vieira, diretor do CMC, acompanhado pelos ‘mordomos’, Eduardo Santana e Luís Leite

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