26.03.13
O BLOG DA INNOVARE PESQUISA DE MERCADO E OPINIÃO
http://innovaresemescala.wordpress.com/
*Paulo Savaget, sócio da Innovare Pesquisa de Mercado e Opinião e responsável pelos projetos de inovação e sustentabilidade da empresa, é autor desse texto, exclusivo para o Sem Escala.
foto: divulgação
Torço para que Tião Rocha e
Bunker Roy estudou no melhor
deles. Ao conversar com os an-
Bunker Roy tenham a oportu-
sistema educacional na Índia e,
ciões da vila, Bunker Roy rece-
nidade de se conhecer. Quem
quando um mundo de oportu-
beu um conselho importante:
nidades se abria para ele, resol-
não traga ninguém com di-
veu contrariar as expectativas e
ploma universitário para a sua
se mudar para uma vila pobre
universidade. Esta passou a se
para cavar poços. Lá ficou 5 anos
chamar Barefoot College (a
até que teve a ideia de criar uma
faculdade dos pés descalços).
sabe em uma conversa de pés descalços debaixo de um pé de manga? Embora um seja brasileiro e o outro indiano, ambos possuem em comum a
universidade que fosse apenas
crença de que aprendizado vai
para os pobres. O objeto de estu-
A faculdade segue o estilo de
muito além da ensinagem.
do seria o que fosse do interesse
vida e trabalho de Gandhi.
Os trabalhos são no chão, não
por linguagem corporal com os
Foi assim que surgiu a peda-
existem contratos, os alunos são
indianos da Barefoot e, em 6 me-
gogia da roda, um espaço ge-
professores e os professores são
ses, se tornaram engenheiras de
neroso de aprendizado: em
alunos. E eles podem ingressar
energia solar. A primeira vila no
círculos não existem arestas,
ou sair quando quiserem. Nin-
Afeganistão a ter energia solar
todos estão na mesma posi-
guém vai para a Barefoot Colle-
foi pelo trabalho de 3 avós. Após
ção para discutir, avaliar e pro-
ge por dinheiro: eles vão pelo
capacitarem tantas outras, as
por as atividades do dia. Um
trabalho, desafio e sentimento
avós já eletrificaram mais de 100
espaço aonde todos apren-
de pertencimento à comunida-
vilas no Afeganistão.
dem e todos ensinam. Nas
de. É uma escola na qual não se
discussões em roda surgiu,
dá um certificado: se você tem o
O mesmo foi feito em 9 países
também, a pedagogia do brin-
reconhecimento da comunida-
na África com resultados similar-
quedo, que consiste no uso do
de, não precisa de um papel para
mente surpreendentes.
conhecimento e experiências
pregar na parede. Eles tem elei-
dos participantes como prin-
ções a cada 5 anos, para as quais
Nas bandas de cá, Tião Rocha,
cipais recursos para desenvol-
apenas crianças de 6 a 14 anos
um antropólogo por formação e
ver suas próprias ações peda-
são elegíveis. E o primeiro minis-
educador por escolha, também
gógicas. É baseada na ideia de
tro eleito nomeia seus ministros
procurou soluções dentro das
que aprender não requer sofri-
da saúde, educação, etc. Estas
próprias comunidades. Era pro-
mento. Foi assim que algumas
crianças, de fato, supervisionam
fessor da Universidade Federal
crianças criaram, dentre várias
150 escolas que totalizam mais
de Ouro Preto (UFOP). Insatis-
tecnologias sociais, a “Damá-
de 7 mil crianças.
feito com a exclusão da cultura
tica”: um tabuleiro de Damas
popular no processo de apren-
que, para mover uma peça, o
Além disso, é um espaço no qual
dizado e com a forma unidirecio-
jogador deve fazer uma ope-
se espera que as pessoas des-
nal de transmissão de conheci-
ração matemática.
bravem ideias malucas. Não im-
mento, Tião descreve as escolas
porta se falhar: você começa de
como um espaço de ensinagem,
Hoje o CPCD de Tião já atua em
novo. A Barefoot conseguiu inse-
altamente excludente e seletivo,
várias localidades do Brasil,
rir energia solar em várias áreas
que desconsidera as individuali-
além de outros países como
da Índia, por meio da capacita-
dades dos alunos. Pediu demis-
Moçambique e Guiné Bissau.
ção das comunidades. Levaram
são da UFOP e resolveu abrir o
Não sei se ele conhece Bunker
isso também ao Afeganistão. E
Centro Popular de Cultura e De-
Roy. Mas a interação entre eles
como os homens e jovens são
senvolvimento (CPCD) em Cur-
com certeza inspiraria dife-
mais propensos a abandonar as
velo, no sertão de Guimarães
rentes formas de fortalecer o
vilas do que mulheres e idosos,
Rosa. Lá Tião criou um projeto
sentimento de pertencimento
chegaram a uma ótima solução:
pedagógico baseado na cultu-
e empoderamento das comu-
treinar as avós! Estas sim, pos-
ra local e com a proposta de
nidades, por meio da partici-
suem um compromisso com o
que educação pode acontecer
pação e do conhecimento dos
desenvolvimento da comunida-
em qualquer lugar, até mesmo
seus próprios integrantes.
de. Estas passaram a interagir
debaixo do pé de manga.