Egolatria Satanista e Egolatria Vazia

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Egolatria Satanista e Egolatria Vazia Critica-se muito o Satanismo por conta de sua aparente determinação ególatra que nada mais faz senão iludir o indivíduo com sua supervalorização, estagnando-o assim por conta de seu ego e da falsa afirmação da condição de deus. Como grande parte do que é comentado a respeito do Satanismo, os discursos infelizmente não ultrapassam os limites da superficialidade. Como todo bom tema que de alguma forma se destaca, muitos equívocos são a ele atribuídos e tentarei desfazer algumas idéias que não condizem com a verdadeira postura Satanista. A noção que será tratada aqui, já exposta no título, será a da egolatria, sob a perspectiva Satanista. Assim como é de meu intuito traçar um paralelo entre o que poderíamos chamar de uma egolatria válida e uma vazia. Esta última por sua vez, é a que vem a constituir os tais argumentos superficiais dos quais falei no início. Ou seja, confunde-se a com a primeira, e graças a isto, temos um show de opiniões que não partem de pressupostos religiosos Satanistas. De início, é preciso entender de forma integral a importância do indivíduo para o Satanismo. Mantém-se este no foco do culto, no sujeito sagrado, no elemento chave para sua própria fortuna. E é justamente a partir disto que chegaremos ao conceito da egolatria. Ora, esta por sua vez pode ser entendida como a ação que se caracteriza por culto a si mesmo, ou culto ao ego. É importante se fazer entendido que estou a partir de uma noção de ego que não diz respeito ao ego do senso comum. O ego é o eu, é a noção de indivíduo que este tem de si mesmo, é o que constitui um ser humano, em termo mais clichê, algo como sua essência, assim por ele reconhecida. O ego é o conjunto de predicativos e a possibilidade de muitos outros destes, constituindo cada qual da forma que cada um assim o é. Ou seja, temos por egolatria toda a valorização e veneração de si próprio. Isto expressa bem a noção Satanista do eu e sua importância. Mas de qual forma dá-se a egolatria e quais são suas implicações? É disto que trataremos agora. A prática da egolatria não se resume na ostentação vazia de um orgulho ou ainda em um egocentrismo exacerbado no qual o indivíduo coloca-se como o centro do mundo. É uma falha comum entender que tanto a egolatria quanto o egocentrismo colocam-se como posturas na qual haja uma subtração daquilo que se coloca exteriormente ao indivíduo. Observar a si próprio como um alguém é justamente reconhecer também no próximo a possibilidade de infinitos diferentes “alguéns”. Colocar-se como o foco das ações e do pensamento não é anular o que está ao nosso redor. Muito pelo contrário, é entender-se como parte integrante deste e diretamente por ele a cada instante influenciado. O grande problema é que as diversas interpretações do pensamento foram encaminhando o indivíduo para um lugar cada vez mais distante de si mesmo. O pensamento individualista foi sempre estigmatizado, quando penso eu, todo o pensamento provém do “si mesmo”. Mas temente a revoltas individuais, os detentores de poder e formadores de tradição, cultura e moral fizerem sempre nada mais senão sufocar o ego alheio, para que os seus pudessem sobre este exercer controle. Tudo não passara de artimanhas que envolviam fatores sociais, políticos, econômicos; fatores de poder. Era a busca de um único para calar uma massa, que quando consciente de si mesmo (dos vários “sis”) poderia se rebelar. A despeito disto, sempre esteve em jogo a centralização do eu. O que pensamos hoje, sob a ótica Satanista não constitui qualquer tipo de revolução de pensamento, ou ainda de inversão dos valores em voga. É apenas a afirmação do ego, em oposição aos valores hipócritas que serviam de agentes ideológicos de manipulação. Da mesma forma que é também um reconhecimento do sagrado alheio, do sagrado humano. Portanto, o que se tem com a egolatria nada mais é que uma postura essencialmente humana e que remete o sujeito à sua forma, não a uma supervalorização irreal que desligue o indivíduo de seu meio. Somos parte de um todo. Colocamos-nos como o elemento central quando junto a todos os outros, mas não como elemento essencialmente superior e desconexo dos demais. Propõe-se com o Satanismo não uma misantropia tola, no sentido de culto a um ego tão superior que independa de fatores externos. Isso não é egolatria, não é o culto a si mesmo, mas sim o culto a um eu numa condição irreal, mítica. Esta sim deve ser a postura a ser criticada. Em suma, por agora, é preciso compreender que o indivíduo que sofre o culto nada mais faz senão aceitar sua condição humana, da mesma forma que assim fazendo-o, compreende-se a si mesmo como o elemento mais importante do pensamento, mas não o único. Há ainda uma segunda abordagem a ser feita, partindo desta vez mais diretamente para o Satanismo. Como se dá esta a partir da religião é a pergunta que se pretende responder. E é com Satanismo que o farei. A religião Satanista, da mesma forma que tende a nos guiar ao sagrado, determinando-o e propondo seu caminho, também nos fornece pressupostos para o culto. Este por sua vez, dá-se em primeiro momento, a partir da constatação do caráter tipicamente humano, como comentado anteriormente. É a partir desse que teremos a noção do culto associada ao trabalho. Isto, pois não cabe ao Satanista prestar devoção gratuita, diferentemente como pensam alguns. O grande fator motivador para o


desenvolvimento é justamente a adoração do eu. É justamente por considerarmo-no o elemento máximo que é preciso potenciar suas capacidades, expandir seus poderes. Ou seja, a evolução é a meta a ser estipulada. Neste sentido, diversos fatores podem entrar em questão. Conhecimento relacionado a experiências, a estudos científicos, a produções artísticas, dentre uma série de outras. O indivíduo Satanista vê-se não como uma figura estática, não como um sagrado em condição de perfeição absoluta. Enxerga-se ele como um sempre vir a ser melhor, um que, à medida que se relaciona com seus semelhantes e com o mundo amplia suas capacidades habilidades para tornar sua vida mais satisfatória. Tem-se sempre esta preocupação em permanecer sempre em movimento, caracterizando assim deus (o eu satanista) como uma entidade em constante mudança e que faz da vivência o grande aprendizado para potencializar o existir. E é a partir desta experimentação máxima, de tornar cada experiência única, de valorizar o momento e a vida, que temos um outro elemento relacionado ao culto do eu. É a satisfação. A satisfação coloca-se como finalidade máxima de toda e qualquer ação. É um conceito amplamente explorado na religião e que merece até um destaque maior do que está a ter neste ensaio. Mas por agora, entendamos este sob a perspectiva do culto. Ora, venerar a si mesmo, a condição de ser, é tornar a vida a mais prazerosa possível. O culto por sua vez alia-se ao labor que vai promover a satisfação do ego. E é nesta parte que retomamos a idéia da continuidade do indivíduo Satanista, da característica de estar sempre em movimento. Este não busca simplesmente uma resposta vazia que o coloque na condição de um deus absoluto. Ele busca o crescimento pessoal, e não se contenta em parar sua trajetória por conta de uma condição divina. Este é o grande ponto que precisa ser compreendido. Esta condição divina não é o elemento que encerra o caminho do ego Satanista, muito pelo contrário, é justamente aquele que o motiva, que o mantém em constante movimento e aprendizado, para que então obtenha-se a satisfação. Até ao momento presente do texto, tratei de discorrer sobre a egolatria em si, sem qualificá-la como “vazia”. Ora, tendo plena compreensão da verdadeira egolatria Satanista, não será difícil distinguila da egolatria vazia. Esta não se trata de movimento. Não se trata de algo mais essencialmente humano. Do contrário. Ela se caracteriza pela inércia. Pela satisfação vazia, pela ilusão. Constitui-se pela ausência do labor, motor essencial da mudança. O indivíduo que adota para si tal postura comete o pecado da autoilusão. Contenta-se este não com uma capacidade desenvolvida, ou com uma experiência adquirida, mas com uma superficialidade não verossímil. Aquele que assim age, gaba-se por suas falsas qualidades, trabalha em cima de uma imagem forjada sem qualquer conteúdo. Qualifica-se por aceitar de bom grado, talvez por preguiça ou por incapacidade, apenas um reflexo falso, daquilo que não se é. A egolatria vazia ignora a condição divina do indivíduo Satanista, para estagná-lo no mundano, no comum. Ignora também a consciência responsável que nos alerta que para alcançarmos nossas metas é preciso esforço, desempenho. O ególatra vazio expõe-se para satisfazer, não mais o ego, o eu, mas a sua auto-ilusão. Por conta de sua inferioridade, sacia-se com esta, e permanece parado, tornando-se obsoleto para si mesmo. Em suma, o que se pretendeu mostrar aqui foi a diferença entre uma postura caracterizadamente Satanista, e uma outra forjada, criada por aqueles que nos criticam, sempre em seu desconhecimento de nossa religião. É preciso mostrar ao aprendiz Satanista a linha que separa as duas posições, bem como atentar para que não cometamos o erro de confundi-las. É preciso compreender que a condição divina postulada pelo Satanismo não anula nem encerra as possibilidades, do contrário, é a maior força promotora para tal. Portanto, é preciso apreender que o movimento é a chave para uma vida tipicamente Satanista, de satisfação e desenvolvimento. Da mesma forma, fazendo breve ponte com o egoísmo, venerar a condição de nosso ego é também reconhecer e respeitar esta nos egos alheios, distinguindo tal posição da misantropia na qual há uma supervalorização do eu, sendo esta não correspondente à sua verdadeira natureza. E encerro meu texto com um recado para aqueles que nos criticam, conheçam-nos antes de tecer seus comentários. O culto ao eu estabelece como meta a satisfação. A satisfação dá-se através do labor e mantém o indivíduo em movimento. Vítor Vieira, Novembro de 2008.


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