Cê-viu?

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Cê Viu?

edição nº 5946460 setembro de 2012 quase primavera equipe Beatriz Beccari Barreto Daniel Agostini Cruz Estevão Sabatier Karol Costal Raul Maciel Ricardo Leite de Castro diagramação Daniel Agostini Cruz Estevão Sabatier agradecimentos GFAU

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Editorial

E o “Cê-Viu?” chega a mais uma edição. A terceira desde sua mais recente volta, a edição de número 5946460. Esta edição está ainda melhor que a última, não que isto fosse lá muito difícil, e, acredite, pior que a próxima (tomara que não)! Isso sim é tarefa complicada, porque esta edição está muito bem feita. Com muitos textos de qualidade. Temos textos críticos, quadrinhos, desafios, contos e até um conto erótico! Claro que nem todo o conteúdo aqui presente foi escrito por alunos desta nossa Escola. Mas foi escolhido para compor este jornal por acharmos que seu conteúdo ajudará na evolução de cada um que tiver curiosidade de pegar este pedaço de papel e o ler. E, já sabem, críticas, positivas ou negativas, sugestões, pedidos e qualquer outra coisa, podem mandar um e-mail para cec.ceviu@gmail. com. Não quer participar da criação e desenvolvimento do jornal mas quer mandar um texto? Tudo bem! Não quer mandar um texto

mas gostou de um quadrinho que leu em outro lugar? Tudo bem! Fez um caricatura do Diogo e quer mostrar pra todo mundo? Tudo bem! Este jornal é um espaço livre para mandarem o que quiserem! Quer vender alguma coisa e não tem facebook? Mande seu anúncio! Qualquer um pode participar. Nas edições mais antigas existiu uma coluna, ou um quadro, neste jornal que era muito interessante. Neste quadro, os alunos davam notas para os professores. Mas eram notas de como ele dava uma boa aula? Sim. Mas não só isso. Esse quadro era como um ranking. Ranking do professor mais bonito. Do mais feio. Do mais filho da puta. Do mais bonzinho. Do professor mais côxa. Então, quer fazer algo do tipo? Quer falar o que pensa sobre seu professor mas sem se expor? Mande pra gente, a gente publica e ninguém precisa saber de onde saiu essa crítica! Quer criticar o Diogo de forma mais ferrenha? Não tem coragem de falar na cara dele que a prova foi muito fácil para que depois ele dificulte e todos os outros alunos te vejam mal? Mande pra gente!

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A RealPolitik e o Problema da Habitação

Primeiramente, desculpe pelo palavrão, mas é um termo que se encaixa muito bem para o que acontece no país. RealPolitik é um conceito alemão que designa a política focada em considerações práticas no lugar de ideológicas. É vinculada, normalmente, à ações que agridem o “bom-senso” e a “moral” em detrimento de ações éticas, mas defendida por muitos, como Nietzsche e Maquiavel. Tal modelo, adotado amplamente durante as últimas gestões presidenciais, se observa nas absurdas alianças feitas pelos partidos que detém o poder, bem como nas ações governamentais voltadas para o atendimento de interesses de setores do mercado. Não falo aqui dos casos de corrupção que visam o interesse próprio ou do puro fisiologismo de alguns partidos, mas sim das ações que visam um projeto de poder e manutenção da governabilidade com o intuito de realizar reformas. Com isso, a discussão política ocorre ainda mais afastada da população, sendo o discurso dos partidos apenas de fachada, visando apenas a manutenção do poder. Hoje, só é possível conhecer de fato as ideias da maioria dos partidos se você participar ativamente de suas cúpulas internas. Isso gerou grande desinteresse e alienação política na população. Existe saída para isso? Existe modo de reverter essa situação e melhorar o cenário político brasileiro? A solução só pode vir com envolvimento ativo da população. Ações que visam a

Para se ter ideia do problema, o número do déficit habitacional no Brasil, fornecido pelo Censo 2010, é menor do que o número de vagas contidas em edifícios vazios na cidade. Grande parte do investimento na construção de novas moradias é desnecessário, já que a reabilitação de edifícios seria um gasto mais inteligente dos recursos públicos, além de aproximar o trabalhador do local de emprego e de áreas com mais infra-estrutura, minimizando problemas de deslocamento e investimentos em aparelhos públicos. Existe, entretanto, grande pressão das construtoras e imobiliárias, muito influentes no governo, para que o dinheiro seja gasto na produção de casas. A função social da propriedade, garantida na constituição e regulamenta-

Défict Habitacional

Domicílios Vagos

Delta

6,07 milhões Brasil

5,8 milhões

-270 mil

São Paulo (SP)

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maior participação política são muito interessantes nesse sentido. Para exemplificar a ocorrência desse tipo de problema e possíveis soluções, tomemos como exemplo a questão da habitação no país. Após anos de influência do mercado imobiliário no governo, iniciada mais fortemente nos anos da ditadura militar, criou-se na mentalidade do brasileiro a ideia de que o problema de moradia se resolve apenas com o oferecimento da casa-própria. Os grandes programas habitacionais foram elaborados com este enfoque desde então, culminando no “Minha Casa Minha Vida” que, na maioria das vezes, fornece moradia em áreas sem infra-estrutura urbana e postos de trabalho, gerando grandes problemas urbanos.

1,112 milhão 1,127 milhão

15 mil


da nos planos diretores municipais, é engolida pelo mercado. A enorme força dos detentores de muitos dos edifícios vazios no centro de São Paulo, que em muitos dos casos concentram enormes dívidas em impostos, impede que esses prédios sejam usados para o bem da população. O déficit habitacional se refere ao número de casas que devem ser construídas para comportar todas as famílias sem-teto ou em condições precárias de moradia. Delta se refere ao número de casas que, teoricamente, deve ser construído para comportar essas famílias, se forem ocupados os domicílios vagos. A rasa discussão de fachada sobre a questão da moradia feita pelo governo, produto do afastamento das discussões políticas causadas pela RealPolitik, instituiu na população o analfabetismo urbanístico, ou seja, o completo desconhecimento sobre impacto de políticas habitacionais, distribuição de aparelhos públicos ou de grandes centros comerciais (como shoppings) no cotidiano dos moradores da cidade, minimizando a cobrança de ações mais eficazes por parte dos governantes. Essa discussão ocorre nas salas de discussão de alguns partidos, mas não chegam a público pelos motivos já citados. Uma ação interessante para melhorar este cenário é a promoção da participação popular nos projetos e discussões na área de habita-

ção (como no conselho de habitação e nos projetos de habitação popular). Dessa forma o brasileiro teria cada vez mais conhecimento nessa área e capacidade de realizar melhores cobranças de seus governantes. Muitos argumentam que tais práticas já acontecem, seja em multirões da CDHU ou nos conselhos de habitação, dos quais participam movimentos de moradia e membros da sociedade civil, mas na verdade são falsos exemplos de envolvimento da sociedade. Os mutirões, em sua grande maioria, promovem uma falsa ideia de participação, nas quais os participantes atuam como mão-de-obra barata e não opinam sobre os projetos das construções. Nos conselhos de habitação são recorrentes as manobras do governo para eleger mais membros e aprovar medidas polêmicas. O que seria eficaz para envolver mais a sociedade nesses processos é a delegação de maior autonomia para as instâncias de tomadas de decisão abertas. Muitas das ações políticas tidas como pragmáticas, características da RealPolitik, não são eficientes a longo prazo e não produzem mudanças concretas. Devemos, portanto, sempre tentar abrir as portas das discussões políticas e torná-las acessíveis para todos. Isso só se dará com esforços para a inclusão de todos nos processos de tomada de decisão. Trabalhemos. João Salva Geddo 5


Aí é too much

Depois brotará o vazio no pasto da solidão, e ela perguntará antes de dormir para seu confidente, o travesseiro: “Não é melhor ser menos exigente? Quem vai cuidar de mim quando ficar velhinha?” Até lá, vamos curtir, baby... Ela jamais diria que a solteira é aquela que perdeu a ocasião de tornar um homem infeliz. Acreditava nas relações. Apostava no amor. Sua solteirice? Temporária, posta em xeque. Queria apenas curar a ressaca da separação recente. Farreando, por que não? Queria por um período aliar a independência financeira com a afetiva. Queria se divertir sem parar, ir ao cinema sozinha, viajar com amigas e amigos, reclamar que todos os homens são tolos e infantis, e que os caras mais lindos, gays. Porém, a fase festiva sofreu dois grandes baques: 1. O ex-marido se juntou com uma garota que não precisava de sutiã, luzes no cabelo, nem maquiagem, e andava enjoando em demasia; o peito tinha aumentado, e a barriga, começado a ficar redonda. Aquele ex que nunca quis ter filhos. Mudou de ideia ou foi forçado a? 2. O anúncio de que a melhor amiga, que recebia convites para as melhores festas, com quem saía todos os finais de semana e aprendeu a ser adolescente depois de madura, viajava nos feriados prolongados, desabafava sobre as loucuras do ex e as idiossincrasias das paqueras, estava... namorando! Com um garoto interessante, cheio de amigos interessantes que trabalhavam juntos num coletivo interessante e faziam projetos de interesse social, tecnológico e além de tudo sustentáveis. Claro que ela refez os planos, baixou a guarda, deixou a teimosia no armário e flutuou pela 6

correnteza da vida. Até enroscar numa curva e ser seduzida por Pedro, que tocava pandeiro no grupinho de pagode do coletivo, que se reunia no happy hour as sextas-feiras. E que fez tudo certo: a esnobou até o limite, xavecou no momento preciso, investiu com as armas apropriadas, falou o que precisava ser dito e, enfim, a beijou exatamente quando a brecha apareceu depois de gentilmente trazer a quinta latinha. Pedro foi um mestre. Conquistou o grande troféu, a solteira mais cobiçada. Recebeu reconhecimento dos amigos e adversários. Mas o convívio... Sempre ele a denunciar nossas incongruências. Pedro é daqueles que atendem celular no elevador. Viciados em UFC. OK, é um segmento forte do mercado. Que buzinam para os carros da frente assim que abre o farol. Tudo bem, ela se dizia, nem tudo é perfeito. Que param em vagas de idosos no shopping e ainda contam vantagem: “Dentro de estabelecimentos comerciais não podem multar.” Um dia ele implicou com a unha vermelha dela. “Não é coisa de empregada?”, disse ao entrar no carro quando ela foi pegá-lo, desviando do caminho, num dia de congestionamento recorde, sem ao menos passar na sua casa, para não atrasarem para o sambão do coletivo, para o qual trocou o almoço pela manicure. Calma, garota, não seja exigente. Sou suficientemente lúcida para admitir que não existe o par perfeito, ilusão, escapismo utópico inventado pelos românticos, e que exigir de alguém o mesmo comportamento social é um exercício de fraqueza narcisista de pessoas problemáticas que só conseguem se relacionar com o espelho.


Sustos apareceram no primeiro jogo de futebol pela TV que viram juntos. Ela não era fanática. Nem o ex. Gostava, assistia, e que ganhasse o melhor. Já Pedro... O time dele disputava cabeça a cabeça a liderança do campeonato com o de maior rivalidade. Xingava o juiz e os bandeirinhas sem economia. O fato de uma bandeirinha ser mulher incrementava os impropérios: “Vaca, piranha! Vai pra cozinha, filha da mãe!” Ela achava engraçado porque quando a decisão do outro bandeirinha, homem, era colocada em dúvida, sua heterossexualidade também. Quando o zagueiro do próprio time deu uma furada, expressões de preconceito social foram proferidas sem nenhum sentimento de culpa: “Burro! Imbecil! Se pensasse direito não seria jogador de futebol!” Quando o time fez um gol, a gritaria foi suficiente para matar de vez todos aqueles com problemas cardíacos na vizinhança. No apito final, palavras de carinho e solidariedade foram proferidas quando ele abriu a janela e começou a gritar: “Chupa, desgraçados, filhos da pu%$! Toma, seus via#$s do car%&*$!” O tempo em que ele ficou se comunicando aos berros com outros vizinhos aliados e adversários foi suficiente para esvaziar o estádio. Então, como se diz no jargão do esporte bretão, o que era promessa virou dúvida. Mas antes de um julgamento sem direito à defesa, ela ouviu do travesseiro: “Egocêntrica, não consegue conviver com ninguém, perdoar, aceitar as diferenças, passará o resto dos dias sozinha! O problema está em você!” Perdeu a prática, menina. Vamos. Vai dar certo.

Ficou surpresa quando numa manhã viu na rede social que ele mudara o status para “um relacionamento sério”. Surpresa, lisonjeada e receosa. Pedro jogava publicamente um estatuto de responsabilidades. Já está na hora de alterarmos o status? À tarde, o pânico tomou conta. Ele mudou a foto do perfil. Não era mais a que beijava o escudo do time, mas uma foto dos dois, isso mesmo, dele com ela, abraçados no sambão, olhando para a lente, cada um segurando uma latinha, foto de que ela nem lembrava, em que, por sinal, ela estava péssima, de retinas vermelhas e com a testa enrugada. Parecia uma tia e seu afilhado. Antes mesmo de ela sugerir que aquela foto não era apropriada, recebeu uma mensagem com outra foto deles abraçados anexada, em que ela estava pior, com a sugestão: “Se quiser usar no seu avatar.” Foi o fim. Celular no elevador, impropérios futebolísticos, comentários desrespeitosos que exaltam a luta de classes, parar na vaga de idosos e implicar com esmalte vermelho... Mas foto de casalzinho no perfil individual de rede social? Aí é too much. Sua resposta foi um calculado: “Pedro, precisamos conversar.” Marcelo Rubens Paiva O Estado de S.Paulo

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O coyote

Quando criança sempre nos perguntávamos o porquê do coyote nunca conseguir pegar o Papa-léguas. Esperamos muito tempo e inúmeros episódios até desistirmos de torcer pelo safado do coyote. Juntávamos todas nossas energias para odiá-lo e chamá-lo de burro. Não quero destruir seu sonho de infância, mas não acredito na burrice do nosso querido amigo faminto. O coyote, nada mais, nada menos, está passando por um processo imperceptível, que vivenciamos diariamente: a autosabotagem. Mentira, isso não existe! A explicação é simples: a Disney não podia mostrar sangue em um desenho pra criança. Além disso, por que ele iria cair de propósito em um penhasco, estando morrendo de fome, para poder não comer o danado do Bip-Bip?

mos traumas, não podemos negar que erramos e temos medo de errar de novo. Nunca é fácil aceitar que estava enganado. Frequentemente, o medo é tão grande que criamos um mecanismo elaborado de defesa. E é aí que entra a autosabotagem. Sabotamos alguns planos nossos para não precisarmos passar por essa situação desagradável parecida com alguma que já passamos. Porém, em vez de assumirmos nosso medo, simplesmente inventamos uma desculpa normalmente racional e aceita socialmente para justificar nossa fuga. Essas desculpas são elaboradas o suficiente para termos a total certeza de que é verdadeira. Por isso que é tão difícil identificar que estamos fazendo um mal inconsciente para nós mesmos. E o que isso tem a ver com o coitado do coyote?

Bem colegas, estamos cegos assim como nosso camarada. Se você não sabia desse fato, muito menos ele mesmo. A autosabotagem não é algo evidente e muito menos de fácil percepção. Muitas vezes, as razões desse processo louco e suicida acontecer são tão profundas que nem seu psiquiatra conseguirá arrancar de dentro de seu peito incrédulo. Eu não entendo, não vejo e não sinto nada disso. Logo, não acredito. Qualquer um poderia afirmar isso, concordo. Então vou tentar clarear as ideias para ti. Te-

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Ele também mente para si mesmo, e muito! O seu objetivo também é seu maior medo. Pegar o papa-léguas para ele pode tanto representar matar a fome, quanto matar seu sentido de existência. Seu maior medo é perder a razão de viver. Ele vive para ter fome. Enquanto isso ele continua se sabotando e não percebe que está em um ciclo de erro. Um exemplo mais real é até de minha pessoa. Vinha a um tempo empurrando meus estudos com a barriga. Escolhi como culpados para meu mau rendimento a dificuldade da facul-


dade, os péssimos professores e minha falta de motivação pessoal. Tudo isso parecia bem racional na época, realmente acreditava que isso fosse verdade. Mas a cortina uma hora tinha que se abrir. Percebi com algumas outras experiências que tinha muito medo de fracassar. Inconscientemente eu sabia que se eu desse meu máximo e mesmo assim fracassasse, eu sofreria muito. Então simplesmente escolhi o caminho mais fácil e criei uma ilusão que me deixava confortável e que dizia que se eu não me esforçasse

e fracassasse não tinha nenhum problema. Mas tinha. Um ENORME problema. O tombo do penhasco dói, a percepção do erro dói, mas dói mais continuar se enganando. Pense nisso. Onde você está se sabotando? É comum demorarmos para perceber que estamos errados. Renato Dallora www.cheirodobanheiro.wordpress.com

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Eleições 2012

E aí? Já sabem em quem votar? Eu não sei, vocês sabem? Mas antes de qualquer decisão, é bom fazer uma boa análise das propostas de cada candidato, conferir o histórico e a ficha de cada um. De olho nessas Eleições 2012. Recomendo esses sites aqui: http://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-2012, site do Tribunal Superior Eleitoral, cuja aba Prestação de Contas contém o “registro de prestação de contas eleitorais e relação daquelas rejeitadas pelo TCU”; http://www.

tre-sp.jus.br/eleicoes/2012/, site do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo. Infelizmente, o site Ficha Limpa não cadastra candidaturas de prefeitos e vereadores, mas quando vierem as eleições de âmbito estadual e federal, é uma boa pedida! Por fim, fica um site muito bom, para quem se interessar pelo assunto CPIs e corrupção, é o MUCO, Museu da Corrupção, http://www.muco.com.br/home.htm, nele há muita coisa interessante, deem uma olhada, vale a pena! Karol Costal

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Delegação Politécnica à Rio +20

Entre os dias 16 e 17 de junho, alunos da Politécnica, eis aqui uma delas, fomos até o Rio para participar dos eventos paralelos à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, mais conhecida como Rio +20. Estava a escrever um texto com relatos e balanços dessa viagem, porém achei por bem, não fazê-lo ainda. Que vocês tirem suas conclusões através de uma série de atividades que nós, participantes de tal jornada, estamos preparando. Em setembro, haverá uma exposi-

ção com a exibição de fotos (fotos tiradas por essa pessoa que vos escreve e pela Luciana Mascarenhas, Oiii) e de um vídeo-documentário editado também pela nossa querida Oi (ficou massa). Haverá também debates, organização encabeçada pelos caríssimos Lucca Pérez e Dan Ricci e um relatório organizado pela grande Lari Rahmilevitz. Não deixem de conferir! Ah, e leiam meu textinho a respeito dessa estada no Rio na próxima edição, só foi adiado... Até a próxima moçada ;D Karol Costal

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#Bola pro Mato 12

Coluna esportiva


Londres 2012

Brasil - 3 ouros, 5 pratas e 9 bronzes. Fiasco? A que ponto o Brasil, um país de dimensões continentais, tem a obrigação de se tornar uma potência olímpica. Resultados da última olimpíada deixam margem a sugestões de que 2016 será vergonhoso para a nação tupiniquim. Apesar disso, a participação brasileira foi, na análise fria dos números, a melhor da história, com 17 medalhas.

Medalha de latão - procura-se o atletismo brasileiro. Sumiu em Londres e não deu mais as caras. Foi o vento, né, Murer? Dividindo o prêmio, arriba México, Mano!?

Born in Piauí - com singelos 48Kg, Sarah Menezes emocionou o primeiro sábado de jogos. Primeira mulher a conquistar o ouro no judô brasileiro, a pequena brasileira é exemplo de amor às origens e a sua história. Treinando e lutando em seu estado, logo tomou conta do coração dos brasileiros, carente de verdadeiros heróis - ou, melhor, heroínas.

Curtas... Vovôs do brasileirão - O BR12 desfila com seus veteranos de alta categoria: Zé Roberto, Forlán, Assunção, Ceni, Seedorf, Juninho Pernambucano, Dida, Deco. Todos jogando em alto nível, decidindo jogos. Quem disse que a terceira idade não é produtiva?

O orgulho do boxe - até então com uma medalha solitária de Servílo de Oliveira em 1968, o boxe levou dois bronzes (masculino e feminino) e uma prata (no masculino). Destaque para os irmãos Falcão, forjados no quintal de casa pelo pai, Touro Moreno, para conquistar a glória olímpica. Esquiva! As meninas do vôlei - conseguiram o bicampeonato numa campanha de recuperação e com jogos épicos, como contra a Rússia. Sheila, Garay, Thaísa, Fabi, uma equipe renascida que calou as favoritas americanas. Bicampeãs olímpicas! Menções - a Robert Scheidt, com mais uma prata, recordista de medalhas brasileiro; à superação de Thiago Pereira, que antes só ganhava panamericano e desbancou a lenda Phelps; ao choro de Kitadai, bronze no judô, lutando com o coração; ao basquete, que mesmo eliminado nas quartas, ajudou a resgatar o orgulho do esporte no país, sob o comando do mestre Ruben Magnano.

Mito I - Olhe ele lá... ih, já passou. Bolt. Mito II – Phelps, dado como acabado antes dos jogos, tornou-se maior medalhista da história, com singelos 22 pódios (18 ouros).

Na Terra do Tio Sam - Pra quem curte a bola oval, os malucos da ESPN voltaram com as transmissões da NFL a partir de 05/09. Com Sunday e Monday nights, prevejo muito sono nas aulas do começo da semana. No velho continente – A bola também rola na Europa. Calcio! Premier League! La Liga! Em especial, Lés grandes Equipes... The Chaaaaaampions! Pra ferrar com aquele fim de semana dedicado aos estudos ou matar aquelas aulinhas de terça e quarta de tarde, os mais tradicionais campeonatos europeus de futebol voltaram. Gramados perfeitos, estádios lotados, muitos e muitos craques. PS: Muito politécnico gosta de esportes e dá seu palpite com os amigos, na mesa do bar, tomando aquela gelada. Por que não trazer suas opiniões pra cá? Interessando-se, procura por mim, alguém da equipe do jornal ou entra em contato lá no blog mesmo, em bolapromatoblog.blogspot.com pra colaborar com o esporte do Cê-Viu?! Saudações, um abraço! Ricardo Leite de Castro 13


Pela mística grená. Voltaremos, Moleque!

Você que chora com um título nacional ou a Libertadores: se você chorasse por um acesso à 2ª divisão do Campeonato Paulista? Você que é parte de milhões de torcedores: se você fosse parte de 500 no mundo e não mais milhões? E que esse grupo restrito, ainda subtraído de alguns heróis, numa aventura destemida lotasse quatro ônibus, na maior caravana da história do clube, para chorar tal acesso na vizinha Osasco? Abstraia e sinta a sensação do grito único, solitário. Qual seu sentimento? Pena, compaixão, um bobo? Meu caro, volte pra sua torcida, pros milhões, você não entenderá. Sentiu prazer, vontade de entender a mística e tudo isso? Seja bem-vindo à Javari, ao meu Juventus. 06/05/2012, por volta de 8 horas da manhã. Dia de jogo. Do jogo! Do acesso! As travessas que cercam o acanhado Estádio Conde Rodolfo Crespi se vêem repletas de camisetas grenás, exaltando seu orgulho pelo bairro e pela Casa Nostra - daqui a pouco tem jogo do Juve, porra! Voltaremos, como em 83! O clima, a confraternização, o cheiro de Javari se espalha pela Mooca. A semana toda ansioso, cantarolando ao 14

ritmo de Aquarela do Brasil “E Dale Dale Juventuuus, E Dale Dale Juventuuus...”. Fechando os olhos, posso ver tudo de novo... Em 1924, operários imigrantes do Cotonifício Crespi fizeram da sua distração perante os desmandos e sofrimentos o alimento da alma grená. Com uma camisa desbotada iam ao campo da Alameda Javry com a mesma fé que os trouxeram ao país em busca de uma vida melhor. De origem operária, o juventino mantém as raízes e a tradição e se apega ao seu sentimento, apoiando quem a cada vez veste nossas cores. O apelido, Moleque Travesso, surgiu nos tempos de presença constante na 1ª divisão, quando aprontava contra os ditos grandes. Mas desde o título de 2007 da Copa Paulista, o jogo mudou. Da elite passamos ao ostracismo. Das travessuras aos rebaixamentos. E estranho ao seu redor, o tempo parou e o time não mais reagiu. Por outro lado, desde que as nuvens negras se abateram, viu-se quem era quem - alguns foram e outros ficaram. E os que ficaram, cada dia mais envolvidos pelo ‘clube do bairro’, promoveram uma união, uma simbiose clube - time - torcida, que jamais lugar nenhum viu. Aqui é diferente.


E foi difícil. Foi chorado. Foi com o coração. Foi do jeito que tinha de ser. Um jogo tenso, dependência de outros resultados, a derrota iminente. E vinha a goleada contra o Osvaldo Cruz, a viagem pra Sorocaba, as viradas épicas contra Marília e Taboão. Tudo vinha à cabeça. Não, não podíamos perder essa chance, Moleque. Escrevendo relembro os minutos esperando a outra partida acabar; muito sofrimento, passa logo! Então, à conclusão: subimos, cazzo! Uma torcida que não para de cantar nunca. Que projeta os resultados do jogo no seu cotidiano, fazendo do seu humor função direta do time. Inexplicável. Uma torcida que vai ao encontro do seu time querendo sangue, suor e raça - nada mais. Pra jogar e ser respeitado, que olhe pro escudo e o reverencie. Que relembre o professor Clóvis, Pando, Brida, Brecha.

do campo com os pés e a cabeça e outros fora, com a voz. Porém todos com a alma. A mesma alma grená. 88 anos de histórias, de ídolos, de tropeços. De travessuras. E após tanto tempo, a vida é a mesma daqueles que sonhavam com dias melhores abraçados à esperança e a sua família. Os valores acima de tudo, a cabeça erguida, o orgulho da sua origem. Pra ser juventino não basta querer. Tem que ser. E ai, sentiu uma sensação boa depois disso? Se sim, seja bem-vindo à trupe. Se não, que este tempo de leitura e reflexão tenha lhe trazido um bom passatempo. Ah, #ForzaJuve Ricardo Leite de Castro

Uma festa única. Na volta, no gramado da Javari, torcedores e jogadores cantando emocionados o mesmo mantra. Lágrimas: só que agora de felicidade. O objetivo conquistado, e a realidade: somos iguais. A diferença é que uns lutam dentro 15


Existe algo de comum entre Futebol e Gramática?

Ao se deparar com este texto, o leitor, provavelmente, ficará curioso e, creio eu, desejará imediatamente saber do que se trata. Quando estudo com os meus alunos análises SINTÁTICA e MORFOLÓGICA, costumo, para elucidar melhor a matéria e fazê-los compreender o assunto de uma vez por todas, aplicar uma analogia entre o funcionamento de uma equipe de futebol dentro de campo e o funcionamento das palavras dentro da oração. De que forma? Acho melhor começar o assunto lembrando-se de que o professor de português, ao aplicar exercícios ou provas, tem por hábito sublinhar um termo da oração e pedir ao aluno que identifique a sua função sintática. Exemplo: O Brasil e a Venezuela são países da América do Sul. Pergunta-se ao aluno: Qual a função sintática do termo sublinhado? 1. SUBSTANTIVO – A resposta está incorreta porque foi informada a classe gramatical da palavra e não a função sintática que o substantivo exerce na oração. 2. NÚCLEO DO PREDICATIVO DO SUJEITO. Aqui, sim, a resposta está correta porque está identificada a função sintática do substantivo na oração. Trata-se de assunto simples. Fazer análise MORFOLÓGICA é informar a classe gramatical da palavra dentro da oração. Por outro lado, fazer análise SINTÁTICA é informar a função exercida por uma das classes gramaticais, dentro da oração. No exemplo supra, identificamos, pois, a função que o substantivo países, uma das dez classes gramaticais, exerce 16

dentro da oração. Trata-se, pois, de duas coisas bem distintas, mas muito ligadas. Por enquanto nada esclareci a respeito do futebol. Agora, sim, posso fazer a analogia a qual mencionei anteriormente, elucidando as dúvidas: Um time de futebol de campo é composto de (11) onze jogadores. Cada jogador tem o seu nome de batismo ou apelido. Exemplo: Júlio César, Kaká, Daniel Alves, Maicon, Michel Bastos, Lúcio, Thiago Silva, Elano, Robinho, Luís Fabiano, Juan. (jogadores da Seleção Brasileira de 2010) Todos sabem que cada um dos profissionais tem uma função dentro de campo: goleiro, zagueiro, lateral, meio de campo, centroavante, etc. É comum ocorrer que um dos jogadores possa exercer outra função que não seja a sua, deixando, às vezes, de ser zagueiro para assumir a função de lateral. Na Gramática acontece algo muito parecido. Vejamos: As classes gramaticais, em Português, são em número de (10) dez. O nosso time possui, pois, um jogador a menos, não importa. Quais os nomes de nossos jogadores: substantivo, adjetivo, advérbio, conjunção, interjeição, preposição, numeral, pronome, verbo, artigo.


Cada um desses jogadores - ‘gramaticais’ - podem, em campo, ou seja, na oração, desempenhar funções diferentes, como cada pessoa, no futebol. No exemplo dado, naquela oração mencionada acima, o substantivo países, nome do jogador = nome da classe gramatical, está jogando na posição de núcleo do predicativo. Agora, veja bem, o substantivo países (nosso jogador), na oração abaixo, recebeu outra função no campo, em nosso caso, na oração: Ex.: Os maiores países da América do Sul são Brasil e Argentina. Pergunta-se: Qual a função sintática da palavra destacada? 1. Núcleo do sujeito. A que classe gramatical ela pertence? 2. Substantivo Outros exemplos: 1. Os jogadores do Cruzeiro receberam uma boa recompensa do clube. 2. Você conhece todos os jogadores do Cruzeiro?

Assim sendo, o substantivo recebeu funções sintáticas diferentes nas duas orações, da mesma forma que um jogador pode receber funções diferentes em uma ou outra partida de futebol. Às vezes, quem sabe, o técnico muda a função do jogador em um jogo contra outro time. Não é verdade? Com o goleiro é mais difícil acontecer. Raramente ouvimos dizer que um goleiro tornou-se centroavante. A comparação aqui construída tem como objetivo fazer com que os estudantes não confundam função sintática com classe morfológica na oração. Espero que você, meu atencioso leitor, tenha entendido a comparação e aprendido, definitivamente, a fazer análise sintática e identificar a classe morfológica ou gramatical da palavra, promovendo a distinção entre uma e outra. Um grande abraço. Luiz Gonzaga Pereira de Souza

Pergunta-se: Qual a função sintática da palavra jogadores na primeira oração? Resposta: sujeito. A que classe gramatical ela pertence? Resposta: substantivo Qual a função sintática da palavra destacada na segunda oração? Resposta: núcleo do objeto direto. A que classe gramatical ela pertence? Resposta: substantivo 17


#100 Anos Coluna arte e cultura

Um poquinho de cultura não mata!

Nesta edição inauguraremos a coluna dos 100 anos! Em homenagem a músicos, poetas, matemáticos, atores, escritores. Começando em grande estilo destacaremos o escritor Jorge Amado. Jorge Leal Amado de Faria nasceu em 10 de agosto de 1912 em Itabuna, Bahia. Baiano de coração, o escritor estudou Direito no Rio de Janeiro. Lá, foi jornalista e começou a ter interesse na área da política. Entrou para o partido Comunista Brasileiro (PCB) e em 1945 se torna deputado federal. Em suas obras é notável sua ideologia, evidenciada no trecho ”Avô, mesmo que a gente 18

morra, é melhor morrer de repetição na mão , brigando com o coronel, que morrer em cima da terra, debaixo do relho, sem reagir. Mesmo que seja um dia só que a gente tenha elas, paga a pena de morrer.” Um de seus maiores feitos como deputado foi a aprovação da lei que permitia a diversidade religiosa, uma vez que já havia visto pessoas serem mortas ou sofrerem preconceito por serem protestantes ou de outras religiões. Ainda que ele dissesse ser materialista, sabe-se que o autor simpatizava com o candomblé, como é mostrado no livro Capitães da Areia, por exemplo.


Em 06 de abril de 1961, Jorge Amado ingressa na Academia Brasileira de Letras, onde senta na cadeira 23, da qual o patrono era José de Alencar, autor de Iracema. Ele foi o autor de obras como Gabriela, Cravo e Canela; Dona Flor e seus dois Maridos; Tieta do Agreste e Capitães da Areia, já citado anteriormente. Ganhou prêmios como o Prêmio Lênin da Paz (1951), Prêmio Dimitrof de Literatura(1986), Prêmio Pablo Neruda e Prêmio Jabuti. Além de ser um autor renomado no campo da literatura, Jorge Amado também é o escritor brasileiros cujas obras tiveram maior número de adaptações para a televisão e cinema. Dentre os livros citados anteriormente, todos foram adaptados para o cinema ou para a televisão na forma de minissérie. Em 1987, foi fundada a instituição “ Casa de Jorge Amado em Salvador. Tendo como lema “ se for da paz pode entrar”, a Fundação Casa de Jorge Amado é uma organização não-governamental e sem fins lucrativos cujo objetivo é preservar, pesquisar e divulgar os acervos bibliográficos e artísticos de Jorge Amado, além de incentivar e apoiar estudos e pesquisas sobre a vida do escritor e sobre a arte e literatura baianas. A Casa de Jorge Amado tem também como missão a criação de um fórum permanente de debates sobre cultura baiana – especialmente sobre a luta pela superação das discriminações raciais e sócio-econômicas. O autor morreu em 6 de agosto de 2001 aos 88 anos.

com um povo extraordinário. “Em suas obras percebemos isso na sua descrição e valorização da cultura, tradições e folclore brasileiro. Além disso, sua tendência comunista e sua preocupação social também são evidenciadas em suas obras. Em Capitães da Areia, livro que conta a história de um grupo de meninos de rua, observamos um retrato da pobreza na cidade de Salvador em meados do século XX, com um enfoque para luta de classes e militâncias políticas. Porém nem tudo é política, já que o autor descreve de maneira única os pontos turísticos da cidade, como o Pelourinho e Elevador Lacerda. Para os amantes da cidade, ou para os detentores de uma poderosa imaginação, o livro nos permite uma viagem ao Nordeste, da qual não se voltará ig ual. É com uma incrível admiração que posso dizer que Jorge Amado atravessou a barreira do tempo e espaço apenas com suas palavras. Autor de obras atemporais que divertem e emocionam todos que se permitem uma imersão no mundo da literatura. Beatriz Beccari Barreto

Sobre seu estilo, é possível observar que ele participou da segunda parte do movimento modernista, sendo este o modernismo regionalista. O patriotismo do movimento é evidenciado nesta frase “ Eu sou muito otimista, muito. O Brasil é um país com uma força enorme. Nós somos um continente, meu amor. Nós não somos um paisinho, nós somos um continente, 19


Nem a rosa, nem o cravo...

As frases perdem seu sentido, as palavras perdem sua significação costumeira, como dizer das árvores e das flores, dos teus olhos e do mar, das canoas e do cais, das borboletas nas árvores, quando as crianças são assassinadas friamente pelos nazistas? Como falar da gratuita beleza dos campos e das cidades, quando as bestas soltas no mundo ainda destroem os campos e as cidades? Já viste um loiro trigal balançando ao vento? É das coisas mais belas do mundo, mas os hitleristas e seus cães danados destruíram os trigais e os povos morrem de fome. Como falar, então, da beleza, dessa beleza simples e pura da farinha e do pão, da água da fonte, do céu azul, do teu rosto na tarde? Não posso falar dessas coisas de todos os dias, dessas alegrias de todos os instantes. Porque elas estão perigando, todas elas, os trigais e o pão, a farinha e a água, o céu, o mar e teu rosto. Contra tudo que é a beleza cotidiana do homem, o nazifascismo se levantou, monstro medieval de torpe visão, de ávido apetite assassino. Outros que falem, se quiserem, das árvores nas tardes agrestes, das rosas em coloridos variados, das flores simples e dos versos mais belos e mais

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tristes. Outros que falem as grandes palavras de amor para a bem-amada, outros que digam dos crepúsculos e das noites de estrelas. Não tenho palavras, não tenho frases, vejo as árvores, os pássaros e a tarde, vejo teus olhos, vejo o crepúsculo bordando a cidade. Mas sobre todos esses quadros bóiam cadáveres de crianças que os nazis mataram, ao canto dos pássaros se mesclam os gritos dos velhos torturados nos campos de concentração, nos crepúsculos se fundem madrugadas de reféns fuzilados. E, quando a paisagem lembra o campo, o que eu vejo são os trigais destruídos ao passo das bestas hitleristas, os trigais que alimentavam antes as populações livres. Sobre toda a beleza paira a sombra da escravidão. É como u’a nuvem inesperada num céu azul e límpido. Como então encontrar palavras inocentes, doces palavras cariciosas, versos suaves e tristes? Perdi o sentido destas palavras, destas frases, elas me soam como uma traição neste momento. Mas sei todas as palavras de ódio, do ódio mais profundo e mais mortal. Eles matam crianças e essa é a sua maneira de brincar o mais inocente dos brinquedos. Eles deson-


ram a beleza das mulheres nos leitos imundos e essa é a sua maneira mais romântica de amar. Eles torturam os homens nos campos de concentração e essa é a sua maneira mais simples de construir o mundo. Eles invadiram as pátrias, escravizaram os povos, e esse é o ideal que levam no coração de lama. Como então ficar de olhos fechados para tudo isto e falar, com as palavras de sempre, com as frases de ontem, sobre a paisagem e os pássaros, a tarde e os teus olhos? É impossível porque os monstros estão sobre o mundo soltos e vorazes, a boca escorrendo sangue, os olhos amarelos, na ambição de escravizar. Os monstros pardos, os monstros negros e os monstros verdes. Mas eu sei todas as palavras de ódio e essas, sim, têm um significado neste momento. Houve um dia em que eu falei do amor e encontrei para ele os mais doces vocábulos, as frases mais trabalhadas. Hoje só 0 ódio pode fazer com que o amor perdure sobre o mundo. Só 0 ódio ao fascismo, mas um ódio mortal, um ódio sem perdão, um ódio que venha do coração e que nos tome todo, que se faça dono de todas as nossas palavras, que nos impeça de ver

qualquer espetáculo – desde o crepúsculo aos olhos da amada – sem que junto a ele vejamos o perigo que os cerca. Jamais as tardes seriam doces e jamais as madrugadas seriam de esperança. Jamais os livros diriam coisas belas, nunca mais seria escrito um verso de amor. Sobre toda a beleza do mundo, sobre a farinha e o pão, sobre a pura água da fonte e sobre o mar, sobre teus olhos também, se debruçaria a desonra que é o nazifascismo, se eles tivessem conseguido dominar o mundo. Não restaria nenhuma parcela de beleza, a mais mínima. Amanhã saberei de novo palavras doces e frases cariciosas. Hoje só sei palavras de ódio, palavras de morte. Não encontrarás um cravo ou uma rosa, uma flor na minha literatura. Mas encontrarás um punhal ou um fuzil, encontrarás uma arma contra os inimigos da beleza, contra aqueles que amam as trevas e a desgraça, a lama e os esgotos, contra esses restos de podridão que sonharam esmagar a poesia, o amor e a liberdade!

Jorge Amado 21


Sobre o IBRACON:

O IBRACON, Instituto Brasileiro do Concreto é uma organização tecno-científica de defesa e valorização da engenharia. O IBRACON tem o objetivo de proporcionar aos profissionais do setor de concreto e construção civil, nas áreas de materiais, tecnologia, projeto, gestão, controle, arquitetura, estruturas e construções, maiores conhecimentos, por meio de cursos, eventos, publicações, certificações de pessoal, reuniões tecno-científicas, valorização e incentivos às investigações e pesquisas científicas e tecnológicas e sua respectiva divulgação. 1_Sobre o Congresso Brasileiro do Concreto: Promovido pelo IBRACON, o Congresso Brasileiro do Concreto é o maior fórum técnico nacional de debates sobre a tecnologia do concreto e seus sistemas construtivos. O evento objetiva divulgar, anualmente, as novidades em termos de pesquisas científicas, tecnologias e inovações em análises e projetos estruturais, metodologias construtivas, materiais de construção e suas propriedades, gestão e normalização técnica, e outros aspectos relacionados ao material industrial mais consumido no mundo. Em sua 54ª edição, o Congresso Brasileiro do Concreto será realizado em Maceió, Alagoas, de 08 a 11 de outubro de 2012.

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2_Sobre os Concursos: Aparato de Proteção ao Ovo O Concurso desafia os estudantes de engenharia a elaborar um projeto e construir um pórtico em concreto armado. A competição consiste em colocar sob o pórtico um ovo cozido e em submetê-lo a impactos progressivos de uma carga. Vence a equipe que construir o pórtico mais resistente. Concrebol O Concurso demanda conhecimento e técnica para a construção de uma bola de concreto simples. A competição faz a bola rolar sobre um equipamento dotado de um contrapeso, que arremete a bola, fornecendo-lhe o impacto necessário para que atinja a outra extremidade, onde está posto um gol. Caso acerte o gol – para isso, precisará rolar em trajetória retilínea – a próxima etapa é submeter a bola a um aparelho de compressão, para medir sua resistência. Ganha bola esférica de maior resistência. Concreto Colorido Ecoeficiente Moldar um corpo-de-prova com concreto colorido ecoeficiente, com dimensões pré-estabelecidas que seja capaz de atingir altas resistências no ensaio à compressão axial. Este concurso pretende testar a habilidade dos competidores na produção de concretos resistentes e coloridos.


3_Sobre a Equipe: A equipe Ecotraço da Escola Politécnica participa dos três concursos promovidos pelo IBRACON no Congresso Brasileiro do Concreto. A primeira participação dos alunos da poli nos concursos foi em 2011, com a fundação da equipe batizada de Ecotraço motivada pelo desenvolvimento e uso de traços ecoeficientes para os concursos. Atualmente é composta por 15 alunos estudantes do curso de engenharia civil, cursando a partir do 3º semestre. Conta também com o apoio e orientação de diversos doutorandos que contribuem com suas experiências no laboratório. Por ser uma equipe nova, ainda está se adaptando aos concursos, não tendo alcançado grandes resultados no seu primeiro ano de participação, tendo em vista que também participam outras escolas de engenharia do país mais experientes na competição. Entretanto, com a consolidação da equipe e a experiência do ano anterior, espera-se bons resultados no concurso atual.

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William Brascher

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Sobre o BIM

O BIM (Building Information Modeling) é um novo conceito empregado na construção civil, que permite projetar e visualizar as várias etapas de um empreendimento, desde sua concepção, até sua operação e demolição. Muitos acham que o BIM é um substituto do CAD; porém, suas funções englobam e extrapolam (e muito) aquelas encontradas no primeiro. Sob este conceito, os desenhos da estrutura e arquitetura são feitos muito mais rapidamente graças à adoção de um banco de dados com os componentes a serem usados durante o projeto, e graças à atualização automática dos desenhos quando há alteração envolvendo mais de um deles. Outro ponto interessante na utilização do BIM é a possibilidade de verificação de interferências entre os diversos projetos, como o de sistemas prediais e o de estruturas, por exemplo. Isso economiza tempo e custos extras para corrigir problemas deste tipo durante a execução da

obra. A fácil visualização do empreendimento, sob diversos ângulos e com o próprio acabamento, é outra vantagem que traz a sensação de maior confiabilidade do projeto junto ao cliente final. O fato de cada etapa/componente ser modelado individualmente para ser visualizado junto aos outros aumenta as possibilidades de evolução técnica, pois cada processo tem que ser realmente pensado antes de ser feito. É claro que nem tudo são flores. Para conceber um projeto utilizando BIM, é necessário um maior esforço inicial dos projetistas, para que todos os detalhes do projeto sejam pensados e modelados nas etapas iniciais, efetivando assim as vantagens do uso do BIM. No Brasil, o conceito ainda está se expandindo, e infelizmente muita gente envolvida em construção civil nem sabe ainda do que se trata. Porém, para quem quer ingressar no ramo, saber usar o BIM certamente é um grande diferencial. Iohana Marques

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Itaipu: Binacional Brasil-Paratudo

Do tupi-guarani “a pedra que canta”, ou como diria papa jans : “a geba cantante”, é a segunda maior hidroelétrica do mundo e todo engenheiro que se preze deve visita-la ao menos uma vez na vida (pelo menos é isso que seus pais devem saber, exceto a parte da geba, é claro), é para muitos um marco na engenharia moderna, mas para nós, jovens politécnicos, Itaipú, como o próprio nome já sugere, representa muito mais. Tal experiência “acadêmica” se inicia em São Paulo, o que é um tanto estranho, visto que Itaipú se encontra no majestoso território paranaense; aqui mesmo no CEC a tripulação já começa a dar indícios de estranha euforia alcoólica, que mais pra frente, a caminho do nosso destino, se manifestam em impulsos escatológicos, vulgo resets, a cada ano tal prática se torna mais prematura, o recorde até a presente data foi um reset antes de sair do P2; enfim se você é como eu que costuma ter enjoos em veículos automotivos, tente quebrar o recorde esse ano. O resto da viagem infelizmente terá de ser ilustrada com os curtos flash-backs que me restam na memória: no primeiro dia vamos direto para o free-shop onde as primeiras convulsões de consumo acontecem, a noite rola uma balada em Foz do Iguaçu , palco das tradicionais competições “tonelada do amor” e “miss baranga”, todas devidamente registradas e testemunhadas. No segundo dia conhecemos o parque das cataratas e a noite tem cassino na Argentina, o terceiro dia, particularmente meu favorito, vamos ao Paraguai, um dos lugares mais

bizarros que conheço, um povo estranho que fala uma língua estranha, que estranhamente a gente entende, vendendo coisas estranhas, vulgo camisinha musical nas versões calypso, calcinha preta e aviões do forró, mas não só de coisas estranhas vivem os comerciantes paraguaios; se bem procurado, encontramos ótimas bebidas, perfumes, roupas maquiagens, doces, secador, chapinha e 3 dias explicando pra sua mãe a fatura do cartão de crédito. Eis que a melhor noite de todas acontece ali mesmo no hotel ( que por sua vez, é um grande alivio para os frequentadores fieis de alojas e colchão de ar furado), onde temos todo tempo do mundo para consumir os recém adquiridos absintos, Absoluts, licores, vinhos, coquetéis, red/black labels, jack daniels, devassa, paratudo , etc . Nessa noite rola de tudo, twister, sueca, nigga flip, verdade ou consequência, eu nunca, C ou S, mãe da rua, pic-esconde, tudo que um acampamento de escoteiros alcoólatras pode te proporcionar. No quarto e último dia, a duras custas e ressacas vamos enfim conhecer a Binacional Itaipú e então voltamos para casa assistindo filmes pornôs paraguaios traduzidos e narrados por aqueles que ainda tem estômago. Como podem ver Itaipú é tradicionalmente uma viagem que deixa ótimas recordações (ou não) para quem já foi e grande expectativa para quem pretende repetir a dose . Então para os aspirantes a muambeiro, faça seu pé de meia e venha com o CEC embarcar nessa excursão nada convencional; em setembro vejo vocês a caminho do P2. Luara Moreno

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Entrevista Marcelo Tas

Domingo à tarde. 1 email não lido na caixa de entrada. Sem esperar muito, começo a ler até que percebo que este email Após isso, um despretensioso email foi mandado. E, em poucos dias a grande vontade tornou-se tangível: “O Sr. Marcelo ficará feliz em participar de uma entrevista para o “Cê Viu?” “. Depois de uma grande euforia um pensamento veio à mente... “ O Sr. Marcelo ficará feliz”... só poderia ser piada. Nem minha mãe gosta tanto assim de falar comigo. E depois de algumas semanas, o grande dia chegou.

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E de uma maneira incrível, tudo se tornou realidade quando um simpático homem entrou meio atrapalhado pela porta nos cumprimentou e se desculpou pelo atraso. E assim, chegamos a entrevista. Ainda que ele não tenha dito, realmente imagino que a poli tenha feito seu trabalho, já que somente alguém que aprendeu a aprender e questionar, e não somente aceitar, poderia dizer: - Porque sim não é resposta.


Fomos até a Bandeirantes e batemos um papo gostoso com Marcelo Tas. Eis alguns trechos dessa nossa conversa. Marcelo Tas “... a foto1 que foi publicada no facebook é no dia que a gente ganhou a eleição, Beleza Pura, tá todo mundo com a camiseta escrita Beleza Pura, e a vitória foi sobre os Kassab, o Gilberto tava no segundo ano, mas os irmãos todos , terceiro, quarto e quinto, e eles eram a direita. Tinha também a esquerda, mas eu sempre estive naquela turma que não se identificava nem com a esquerda e nem com a direita.” O Cê-Viu? era assim, um jornal irônico, um jornal de humor e que tinha espaço para todo mundo, o pessoal da esquerda publicava, o pessoal da direita publicava e nós, que éramos anarquistas, não bem direito o que, estranhos, esquisitos (risos). Era legal, curto muito isso, uma faculdade de exatas fazendo um exercício de expressão artística, que é um jornal, que tem cartum, que tem poesia, que, enfim, tem tudo, entrevista...” Essa foto tem todo mundo da chapa, e como ela foi parar no facebook, começou a aparecer um monte de gente. Ah, aquele ali é fulano. Cadê fulano? Tá aqui. E aí, foi aparecendo todo mundo e em poucos minutos, essa é uma virtude dos engenheiros, a gente, rapidamente, esquadrinhou a foto e estava todo mundo ali já indicado. Descobrimos até quem tinha feito a foto, assim, rapidamente, muito legal.” Eu acabei mandando essa foto para a Vejinha. Duas semanas depois, a Vejinha me pediu uma foto, era assim, eles tinham uma matéria de capa, uma foto importante da sua vida, eu mandei essa foto e foi publicada, e de repente, tava todo mundo ali. 1

Foto publicada na Veja São Paulo, na página 30

Eu nunca tive essa dificuldade (de gostar de coisas que não sejam da área de exatas, da engenharia). Eu sempre tive uma vida, digamos, boêmia. Sempre gostei de música, sempre gostei de teatro. E é engraçado porque, quando fiz a opção por engenharia, a gente tava numa época, que para nós, praticamente, só tinham três opções: engenharia, medicina ou direito. Eu não gosto de medicina nem de direito, então, foi falta de opção. E aos poucos, eu comecei a entender essa opção e a ver até algum sentido em você estudar mecânica dos fluidos, por exemplo, estudar transferência de calor e massa, é uma coisa absurdamente delirante e você se pergunta pra quê né? Desde o meu primeiro dia na Poli, eu me achei um estranho naquele ninho, mas eu comecei a procurar outros estranhos, gente que também se sentia como eu e aí fui encontrando. O Cê-Viu?, para mim, foi importantíssimo porque foi onde caiu a ficha. Falei: não, é isso que eu gosto, comunicação. Só que eu to lá na Politécnica, meu Deus, como é que eu vou explicar isso agora? E aí, eu resolvi ser editor do Cê-Viu?. A meta da minha vida era conseguir publicar, primeiro, uma poesia no Cê-Viu? Porque era impossível, no primeiro ano, publicar. O pessoal do primeiro ano é tratado como débil mental. E, aí, no segundo ano, eu consegui publicar uma poesia, veja vocês, no Cê-viu?. Daí, os caras quiseram me conhecer, os veteranos: quem é esse?. Eu assinei Cocão. Aí, veio: quem é esse Cocão?” (Olhando para uma edição antiga do Cê-Viu?) Aí, Lois, esse bando de vagabundo (risos), o Exel, toda essa turma. Aqui já é um pouco da minha turma, mas tem uma turma anterior à minha que são os meus ídolos, o Koxinha, o Labate, o Alge, uma série de figuras, o Ricardo Jagger. Que eram, enfim, pessoas que publicavam poesias,caras que sabiam tudo de mú27


sica, conheciam o The Who. Conheciam coisas que eu tava ainda patinando. Eu resolvi conhecer aquela turma e virar editor do negócio. E foi dificílimo virar editor, até que, finalmente, eu ganhei esse cargo pomposo de secretário de imprensa naquela chapa Beleza Pura. Fui editor por dois anos do Cê-Viu? e aí, eu ia na Poli só pra fazer o Cê-Viu?, e tentava me virar pra tirar nota. Prestei vestibular pra ECA e fiz as duas ao mesmo tempo, naquela época podia. Estudava à noite na ECA, quer dizer, eu não estudava em lugar nenhum, tentava à noite na ECA e de dia, na Poli e fazia teatro. E aí, me desvirtuei total. Não sabia se ia terminar uma, se ia terminar a outra. Comecei a fazer teatro, comecei a fazer televisão e me perdi; me perdi num mundo artístico. Era trabalhar sem ganhar nada, evidentemente, mas enfim, comecei a ter outra profissão e só voltei até à Poli pra terminar porque faltavam seis meses pra eu tirar o diploma, entendeu? Você não vai ter diploma nenhum? Duas faculdades na USP e não vai ter nenhum diploma? Ah, então tá bom. Fui lá, e graças a Deus, eu terminei porque uma bolsa de estudos que ganhei mais tarde, por exemplo, era necessário que eu tivesse curso superior, tivesse graduação em alguma coisa, e eu usei o diploma da Poli pela primeira vez para fazer um curso de cinema em Nova York. O primeiro ano da Poli é um trauma. Por quê? Eu nem sei se ainda é assim. Raspam a sua cabeça e te alinham por ordem alfabética, quando eu entrei, você não decidia qual era o seu curso, você caía numa vala comum dentro daquele redondo que tinha ali. E você entrava numa sala de cinquenta pessoas. Alguém falava Marcelo, todo mundo virava pra trás e tinha duas Márcias, coitadas, na minha sala (risos). Era um horror. Você perde a sua identidade, você não tem mais nome. Você se chama 28


“Não antecipe a vida chata que você pode ter porque ela vem. Se você qui- vários anos juntos. E uma coisa legal do Cê-Viu? é de unir, ser antecipar, ela de quebrar um pouco aquelas barreiras se é do terceiro, se é virá.”

Marcelo, mas têm cinquenta caras que se chamam Marcelo, todos carecas, não tem nenhuma diferença um do outro, ou seja, você dissolve. É uma experiência espiritual, é um mosteiro e aí, aos poucos, você tem que descobrir quem você é. Foi essa experiência que eu tive e fui reencontrando meus pedacinhos ali. Ah, esse cara gosta de música. Ah, esse barbudo deve ser um doido, vou atrás dele, talvez eu tenha salvação com ele. E fui encontrando os caras com quem me identificava, inclusive nerds também.

Em 78, a gente programava em Fortran. Tinha um computador que era do tamanho dessa redação. A gente programava naqueles papelzinhos furados, com aquela máquina trammmmmmm... Aquilo é uma viagem né. Encontrei muitos nerds ali, conheço até hoje. Alguns geniozinhos que tão por aí, fazendo coisas incríveis, inclusive. E hoje, eu acho que tem muito mais sentido o nome Politécnica. O nome Politécnica é muito legal pro mundo que a gente tá vivendo agora, que é um mundo de informação plural. Você não é engenheiro civil, você tem que lidar com tudo, tem que saber de sociologia, tem que saber lidar com gente, você tem que saber de ambiental, você tem que entender de administração, de tudo, de sustentabilidade, de materiais, enfim, de reciclagem, de técnicas. Graças a Deus que o Lindão tá lá. O Lindão é um querido. O Lindão sempre foi um cara que nos deu uma visão humanista da engenharia, e ele, inclusive, sempre apoiou muito o Cê-Viu?. Era um cara que saía pra beber com a gente. Eu acho isso fantástico. Isso, pra mim, que é um professor, um mestre, um cara que vai além da sala de aula. Dessa época têm figuras fantásticas. Eram

do quarto, se é do quinto, se é do oitavo, nono, então, tinha gente que tava lá, há dez anos na Poli. Eu acho isso muito importante e, principalmente, pra uma escola da importância da Poli, que, às vezes, enxerga pouco a importância da formação humanista. Eu sempre, dentro do campus da USP, procurei me meter lá na FAU e era muito maltratado, porque, quando percebiam que eu era politécnico, me tratavam que nem um leproso. Na ECA também, eu ia lá na ECA. Tinha um preconceito do lado deles, mas tinha um preconceito do nosso lado também. A universidade existe, tá todo mundo no mesmo canto justamente por isso, pra trocar experiências, de todos os níveis. E, às vezes, a gente perde isso. Aproveitem que tem esse tempo porque ele é precioso e aproveitar significa o seguinte: não tente antecipar a sua vida profissional. Porque tem muita gente que já quer estágio, já quer arrumar um emprego. Eu acho uma roubada total porque é com esses caras, com essa turma que você convive que você vai inventar a pessoa que você vai ser, inclusive como engenheiro. Não é com papai noel, com o amigo do meu pai que tem construtora ou alguém que vai indicar. Não é; esses caras, inclusive, vão querer arrancar o seu couro, não vão querer o melhor de você. Com seus amigos, com seus colegas é que você vai inventar a pessoa que você quer ser. Quando eu acabei parando numa coisa como o Cê-Vi? ou num grupo de dança; a gente tinha um grupo de dança na Poli chamado Company e a gente fazia performance, que era uma palavra muito chique naquela época. 29


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Em restaurante, a gente começava a dançar no meio dele, ou na casa de alguém, enfim, na rua. Essas coisas você tem que fazer agora e elas não são tão bobinhas quanto parecem. Elas são as coisas que vão fazer você se conhecer melhor, ter contato com o seu coração, que é o que importa na verdade, que é o que vai fazer você ser um cara feliz, que é o que vai fazer você encontrar a pessoa que você ama, com quem você vai querer ter filhos ou não, ou querer viajar o mundo, é agora. Não antecipe a vida chata que você pode ter porque ela vem. Se você quiser antecipar, ela virá. Você vira um estagiário sub-aproveitado... Sub-aproveitado não, explorado, com baixo salário, e você vai perder essa chance de conhecer agora as pessoas que vão mudar a sua vida. O tempo passa muito rápido, por incrível que pareça. Eu sei que uma aula de mecânica do fluidos demora muito pra acabar, mas vai acabar, vai passar rápido. Aproveite também a piscina, que é fantástica, o Cepeusp. Olha, eu levei muita coisa (da Poli). A televisão é uma indústria, e você só trabalha com equipes grandes. A cabeça do engenheiro ajuda muito você resolver problemas de forma econômica, de uma forma eficiente, vamos chamar assim. Isso na televisão é fundamental. Eu to aqui conversando com vocês, mas sei exatamente que tem uma equipe lá embaixo, que daqui a pouco, a gente vai fazer isso e aquilo. Tem gente que não tem essa cabeça e se estrepa muito quando vai fazer várias coisas ao mesmo tempo. Acho que essa formação me ajudou muito a poder dar conta dessa minha rotina, por exemplo. Sem falar naquela questão espacial né. A imaginação. Eu nunca me esqueci que uma das coisas que eu mais adorei na Poli, bom, vou contar uma história, eu só tirava nota ruim em cálculo. A minha primeira nota em cálculo foi 0,5, de 0 a 10. Eu era bom alu32

no. Quem entra na Poli é , relativamente, bom aluno. E fiquei ofendido, tirava 8, 10, 9 e tal; daí falei: pô, esses caras não me conhecem, eu vou estudar, você vão ver, vocês vão ver com quem vocês estão mexendo. E estudei que nem louco pra segunda prova de cálculo e tirei 2,5, de 0 a 10. E penei no cálculo 1 e no cálculo 2. No cálculo 3, eu tirei 9,5 e todo mundo tirou 0,5. Foi quando a gente estudava superfícies, você tinha que olhar pra uma equação e enxergar uma superfície e eu vi que eu sabia fazer aquilo, que eu tinha uma coisa com imagem, imaginar superfícies, de ver imagem. É uma coisa pra mim que hoje é muito clara, uma coisa que foi desenvolvida ali de uma maneira muito complexa, evidentemente, que não precisa saber de equação pra montar um programa, mas me ajuda muito esse exercício que eu tive, por exemplo, em lidar com imagem. Essa formação (da Poli), se você conseguir complementar com uma coisa humanística, é muito bacana, muito legal porque ela permite você lidar com exercícios do seu cérebro, você tem que lidar com muito conhecimento, com muita informação que você tem aqui, transferir pra trabalhos ou provas, etc. E se você complementar isso com conhecimento de literatura, por exemplo, é ótimo. Se eu pudesse dar uma única dica, eu diria: pô, encontre os livros que vão mudar a sua vida, os dez, ou cem de preferência, mas pelo menos dez que você vai falar: puta, isso começou antes e depois daquele livro. Isso é fundamental para um engenheiro porque a literatura te ajuda a pensar melhor; pensar, inclusive, em termos de exatas; pensar em termos de palavras, de você ampliar o seu vocabulário. E, às vezes, isso não é muito valorizado na faculdade de engenharia como deveria.


Cê viu?_Você deu mais pro Cê-Viu? ou o Cê-Viu? deu mais pra você? Marcelo Tas_O Cê-Viu? deu muito mais pra mim, eu não tenho dúvida disso. Eu vivo falando do Cê-Viu? por aí porque ele foi o veículo que me fez descobrir a minha vocação, isso não é pouco, isso foi uma virada importantíssima na minha vida. Eu descobri o meu amor pela comunicação por causa do Cê-Viu?. Eu descobri que editar um jornal é o grande tesão da minha vida. Que capa nós vamos fazer? Que ilustração nós vamos botar? Como é que nós vamos montar uma entrevista? Eu falei: cara, isso é muito legal. Aí, fiz vestibular pra comunicação e continuei a Poli também, e continuei fazendo o Cê-Viu?. Eu vi que aquela era uma estrada sem volta. E então, encontrei o teatro, que foi outra coisa que me deu um estalo gigantesco. Fiz o Antunes Filho durante um ano e meio, internado dentro do grupo dele e depois o vídeo, que foi a facada final. Aí falei: não, eu quero trabalhar com comunicação em televisão. E pronto, acabou assim. E a televisão era uma mistura toda daquelas maquinazi-

nhas que eu já tinha usado, da HP, dos cálculos pra gente editar uma edição de televisão, por exemplo. É muito complexo você mexer com todos aqueles números, frames e tal. E com máquina de fliperama, eu era muito bom de videogame na época, gostava muito. Então, era um mistura, era eu poder usar uma HP me divertindo. Era tudo que eu queria e não tive mais dúvida, abandonei tudo e fui fazer uma coisa que eu não tinha a menor garantia de que eu ia dar certo, mas que era o que eu queria fazer, que eu acho que é o que a gente tem que fazer nessa vida. A vida é muito curta, o período que a gente passa aqui é muito curto, você não pode se dar ao luxo de fazer uma coisa que você não goste porque, aí sim, tem pouco tempo. Introdução Beatriz Beccari Barreto Transcrição Karol Costal

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Onde está o cuidado com o outro num mundo de imagens?

Vivemos uma época de crise, de crise com nós mesmos e com o ambiente que nos cerca, numa época recheada de pseudo-valores e pseudo-necessidades. Ao longo da história da humanidade, períodos se sucederam com suas virtudes e seus defeitos, retrocessos e avanços tecnológicos, retrocessos e avanços em outros campos da vida humana; períodos em que se viu muita coisa boa, mas também muita coisa ruim. Nossa época não fica fora disso, porém, alguns pontos, como os já citados “pseudos”, são algo novo. As relações interpessoais adquiriram uma feição que reflete o modelo de sociedade atual. Uma sociedade em que o ter em detrimento do ser já se deslizou para o parecer em detrimento do ter. Um mundo no qual o fundamental é (a)parecer na cena social, uma questão de existência. Guy Debord, filósofo francês, em seu livro A Sociedade do Espetáculo, comenta: “o espetáculo... é uma visão de mundo que se materializou... é a afirmação da aparência e a afirmação de toda a vida humana - isto é, social - como simples aparência”. O espetáculo tenta nos convencer de que “o que aparece é bom, o que é bom aparece”. O real surge no espetáculo e o espetáculo se torna real. A sociedade do espetáculo, para Debord, é uma sociedade em que há a supremacia da representação sobre o representado, da mediação sobre o mediado, do concebido sobre o vivido, da política e da economia sobre a sociedade, do fetichização da mercadoria, ou seja, um mundo criador de pseudo-valores e pseudo-necessidades.

Nessa “cultura da imagem”, o sujeito tem seu valor atribuído por aquilo que aparenta ser. Muitos alegam que vivemos um momento do eu narcisista, o que não deixa de ser verdade, mas também vivemos numa época em que o olhar dos outros é o combustível de nossos anseios e valores. As redes sociais são um ótimo exemplo disso, é interessante observar a importância que algumas pessoas dão a esta realidade virtual, mesmo sendo apenas uma extensão de nossas próprias vidas. Se antes todos passavam a valer pelo que tinham e não pelo que eram, hoje, todos passam a valer pelo que parecem ter, não mais pelo que têm e muito menos, pelo que são. Nessa busca de aparências, diluímos o outro, o diferente, o que não está entre nossos “iguais”. Enquanto os nossos “iguais” é o olhar a aprovar /reprovar nossa imagem, os diferentes são algo a ser expurgado, deixado de lado. Leonardo Boff, um importante professor e teólogo brasileiro, toca num ponto extremamente perverso, ele diz que “essa anti-realidade afeta a vida humana naquilo que ela possui de mais fundamental: o cuidado e a compaixão”. Nos anestesiamos pessoal e socialmente. Vale ressaltar, contudo, que não somos marionetes desse estado de coisas, e sim co-autores desse mundo. Um mundo em que fica a pergunta: E o cuidado com o outro? Onde fica? Vamos continuar a fingir que não é conosco e assistir passivamente a essa forma de suicídio pessoal e social? Ou vamos começar a dar mais importância ao que é verdadeiro? Trocar experiências com gente de verdade, voltar a se relacionar com o mundo sem precisar de intermediação? Karol Costal

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A arte de ver

“Ver de verdade“, essa frase apareceu em vários muros da cidade de São Paulo como um protesto à maneira com que as pessoas olham as coisas. Apesar de diversos dicionários colocarem como sinônimos, ver e olhar são ações distintas. Rubem Alves publicou no jornal Folha de São Paulo um texto em que se pode identificar a distinção entre esses dois verbos. Apoiou-se em William Blake, poeta inglês que disse: “A árvore que o sábio vê não é a mesma que o tolo vê.” Isso é ilustrado pela enunciação da lei da gravidade. Newton, que ao ver um fruto caindo de uma árvore, reconheceu a existência dessa força, enquanto inúmeras pessoas simplesmente olhavam o fruto cair. Essa mesma afirmação também é válida para poetas, escritores, músicos, artistas em geral. Eles enxergam atos cotidianos de uma maneira diferente das pessoas que o vivenciam e, com

isso, os transformam em fotografias, esculturas, músicas, desenhos. Embora exemplificar a disparidade entre ver e olhar não seja uma tarefa árdua, entender o que está por trás dessa visão subjetiva pode ser. O conhecimento adquirido e a vivência de cada um interferem na maneira como um mesmo objeto é visto. A interpretação de uma ocorrência costuma ir além dos fatos. As pessoas criam filtros para a visão de acordo com sua personalidade e seu humor. Um mesmo copo pode estar meio cheio ou meio vazio. São esses e outros diversos fatores que influenciam o jeito de ver. A sociedade não tem consciência de que não basta abrir os olhos ou prestar atenção no que é visto, mas que se precisa refletir, filosofar e pensar para ver, não apenas olhar. Karina Piva

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Soldados de Chumbo

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Quando apagam a luz Da última cela do meu pavilhão Um clarão vem iluminar a minha janela É a lua Não sei o que seria de mim se não fosse ela O sentinela caminha de um lado para outro Acende um cigarro... Um carro passa por trás da muralha Não posso vê-lo, apenas ouvi-lo Não posso tocá-lo, mas posso senti-lo

Quando acordava de bom humor Danava-se a falar do moleque sem cor Que queria que fosse engenheiro Sei que minha mãe sonhava pra mim Um futuro semelhante Mas quando olhava pro neguinho Com ar de maloqueiro Arriava o semblante e sofria Como quem descobre uma infinita distância Entre desejo e realidade

É engraçado Não fosse pelo andar desengonçado Pela deselegância Diria que o homem fardado Se parece com alguns soldados de chumbo Que ganhei na minha infância Minha mãe trabalhava Por quanto tempo durasse o dia E acaso, não fosse o bastante Seu esforço tinha a noite como companhia Às vezes, me levava para o emprego E eu ficava confinado à área de serviço Talvez porque a patroa não gostasse de negros Circulando pelos cômodos do seu luxuoso cortiço

Certo dia A madame me deu de esmola A Guarda Real Britânica Em formato de miniaturas Criaturas sem pernas ou braços Que o pequeno engenheiro enjoou Eu tinha, lá em casa Uma tribo com dezenas de caixas de fósforos Daquelas amarelas Com a figura de um índio estampado nos rótulos Vivazes, meus amigos me eram sagrados E estavam sempre prontos Para conterem a invasão Dos soldadinhos amputados Outros mais me foram dados Mas minha tribo sempre vencia Por mais que o pelotão crescesse Era como se pelo menos ali, naquele dia O neguinho também vencesse


Eu era pequeno, gigante na minha imaginação Não creio que o fabricante mais astuto Pudesse imaginar que seu produto Fosse além de acender cigarro ou fogão À noite Quando minha mãe voltava pra casa Silenciávamo-nos a todo custo Para velarmos seu sono tão justo Depois, cada peça do meu invento Ia para debaixo do colchão Ao lado do bloco de cimento Que sustentava minha cama A dois palmos do chão Quando Deus achou que era a hora Resolveu levar minha santa senhora Antes que ela pudesse perceber No que a vida me transformou Se foi ganância, fraqueza ou necessidade Não sei Ninguém nunca me explicou

Amanhã, é dia de visita Meu filho, a criança mais bonita Virá me conhecer Vou rezar até o amanhecer Para que a vida também não o torne um bandido Para que seja talvez como minha mãe sonhou Um profissional bem-sucedido E se acaso eu perceber Que ainda existe uma infinita distância Entre desejo e realidade Maior terá que ser meu pensamento Mais forte há de ser minha vontade! Serginho Poeta enviado por Dan Ricci

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Bruna

Bruna andava pela calçada desatenta. Havia até esquecido o que ia fazer fora de casa. Chegando numa esquina, parou e aguardou o sinal de pedestres ficar verde. Olhando para o outro lado, reconheceu um rapaz que esperava para atravessar a mesma rua, mas no sentido oposto. Era Luiz, um amigo de infância, que estudou com ela desde o primário. Surpresa, já que não se viam há uns 6 anos, Bruna resolveu acenar. Luiz a reconheceu e quando o sinal abriu veio em sua direção. Bruna, que nem lembrava mais o que ia fazer na rua, acabara de achar um motivo para não andar mais a esmo.

- É, é verdade. Era tudo o que eu tinha naquela época.

- Luiz, quanto tempo!

- Acho que você foi a única pessoa que estudou comigo desde o primário. Nem imaginava que ainda faríamos o colegial juntos. No final do último ano eu lembro que você me entregou uma carta, dizendo que me amava mas que entendia que a gente não tinha nascido pra ficar juntos, algo assim.

- Bruna! Como vai você? - Estou bem! E você, como está? - Ah, tudo bem, comigo tudo tranquilo. - O mesmo bom humor de sempre, não é? Nunca vi você reclamar de nada. - É, acho que sim. A vida já é bem dura pra quem é bem humorado, imagina pra quem vive de mau humor.

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- Na sétima série você também fez um cartão, não foi? - Fiz, sim. Um cartão com um buquê de flores. - Acho que eu era meio difícil, não é? - Creio que sim. Isso era tudo o que eu tinha naquele momento, mas não foi suficiente pra fazer você gostar de mim.

- Foi exatamente isso. Como eu não tinha nada a lhe oferecer que você quisesse, escrevi aquela carta. Era tudo o que eu podia fazer naquele momento. - Desculpa, não queria fazer você se sentir mal com isso.

- Que engraçado te encontrar assim no meio da rua depois de tanto tempo. Nos conhecemos há quantos anos mesmo, uns 20?

- Não precisa se desculpar, na verdade eu lhe agradeço por isso.

- Acho que sim, por aí. Desde o primário.

- Como assim, agradecer?

- Isso mesmo, desde o primário no colégio. Logo que nos conhecemos você queria ser meu namoradinho, lembra? Hahaha! - Lembro, claro…

- A sua honestidade. É melhor ser rejeitado do que estar com alguém que não gosta de você na mesma intensidade. Eu entendi que isso era tudo o que você tinha pra me oferecer naquele momento.

- Lembro que você fez um cartãozinho à mão, tão fofo.

- Entendo. Mas não precisa agradecer. Segui o meu coração naquela época.


“Às vezes você tem que deixar ir.” - Claro, com certeza. Foi a melhor coisa a fazer. Apesar de saber que não tinha chance, eu também segui meu coração. Infelizmente não deu certo, mas me serviu de lição que pra um amor dar certo, tudo o que eu tinha a oferecer, teria que ser tudo o que você precisava.

- E acabaram se casando.

- Acho que sim…

- Logo que ela me abraçou.

- A propósito, tenho que ir, vou encontrar a Ana.

- Com um abraço você já sabia que casaria com ela?

- Quem é Ana?

- Sabia. Parece só um abraço, mas era tudo o que ela tinha. E naquele momento, era tudo o que eu precisava.

- Minha mulher. - Ah, você casou? - Sim, casamos ano passado. - Como você a conheceu? - Logo que entrei na faculdade. Eu estava triste, no primeiro dia no campus e ela veio conversar comigo.

- Foi. Descobri que casaríamos na hora em que nos conhecemos. - Como?

E despediram-se. Luiz foi ao encontro de Ana. Bruna continuou andando, a esmo, sem lembrar por qual motivo havia saído de casa. Não fazia diferença. Naquele momento, tudo o que ela queria era um abraço. Marcel Dias

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Lilith

Lilith era sexualmente frígida e seu marido tinha quase certeza disso, não obstante todo o fingimento dela. Foi esse fato que causou o seguinte incidente: Ela nunca se servia de açúcar porque não queria engordar e usava um adoçante. Eram pequenas pílulas brancas que carregava o tempo todo na bolsa. Um dia Lilith ficou sem seu adoçante e pediu ao marido que o comprasse quando viesse para casa. Assim, ele lhe trouxe um frasquinho igual ao que ela pedira, e Lilith pôs duas pílulas em seu café, depois do jantar. Os dois sentaram-se juntos. Billy a fitava com a expressão de jovial tolerância que usava com frequência, quando de seus ataques de nervos, suas crises de egoísmo, de auto-acusação, de pânico. A todo seu comportamento dramático ele reagia com inabalável bom humor e paciência. E Lilith ficava brigando sozinha, furiosa, passando por vastas crises emocionais em que ele não tomava parte. Possivelmente tudo isso era um símbolo da tensão que não ocorria entre eles no plano sexual. Ele recusava todas as suas hostilidades, seus desafios violentos e primitivos, não se permitia entrar nessa arena emocional com Lilith e reagir à sua necessidade de ciúme, temores e batalhas. Talvez se Billy tivesse aceito os desafios de Lilith e participado dos jogos de que ela gostava, Lilith poderia ter sentido sua presença como algo mais que um mero impacto físico. Mas o marido de Lilith não conhecia os prelúdios do desejo sexual, ou os estimulantes que certas naturezas selvagens exigem, e assim, em vez de reagir corretamente logo que via seus cabelos ficarem elétricos, seu rosto mais cheio de vida, seus olhos cintilantes, seu corpo irrequieto como o de um cavalo de corrida, retirava-se para sua parede de compreensão objetiva, de brincadeiras gentis e de plena aceitação de sua natureza, como alguém que observa um animal em um jardim zoológico e 48

sorri de suas excentricidades, mas não se deixa envolver. Era isso que deixava Lilith em um estado de total isolamento — como um animal selvagem que habitasse uma região deserta. Quando Lilith brigava e sua temperatura subia, o marido não era visto em parte alguma. Era como um céu sereno olhando para ela de cima, esperando que a tempestade passasse. Se Billy, como outro animal selvagem, aparecesse do outro lado do deserto, fitando-a com a mesma tensão elétrica nos cabelos, na pele e nos olhos, se aparecesse com o mesmo corpo selvagem, pisando forte e querendo achar qualquer pretexto para lançar-se sobre ela, abraçá-la com fúria, sentir-lhe o calor e a força, podia ser que acabassem rolando na cama, que os sorrisos sarcásticos se transformassem em mordidas de paixão e que a luta passasse a ser um combate de amor. Os puxões de cabelo uniriam suas bocas, seus dentes, suas línguas. E de toda essa fúria podia ser que seus aparelhos genitais se esfregassem um contra o outro, soltando centelhas, e tivessem os dois corpos que se interpenetrar para pôr fim à formidável tensão. Naquela noite Billy mais uma vez se sentou com a expressão costumeira nos olhos, enquanto ela se colocou perto do abajur, pintando um objeto qualquer com tanta fúria que dava a impressão de que iria devorá-lo quando terminasse. O silêncio foi quebrado por ele, quando disse: — Sabe, não era adoçante aquela pílula que eu trouxe e que você pôs no café. Era cantárida, um pó excitante. Lilith ficou atônita. — E você teve coragem de me dar isso? — Sim, eu queria ver você ficar excitada. Pensei que podia ser bem agradável para nós dois.


— Oh, Billy — disse ela —, o que você fez comigo! E eu prometi a Mabel que iríamos ao cinema. Não posso desapontá-la. Há uma semana que Mabel está trancada em casa. E se essa droga começar a fazer efeito quando eu estiver no cinema?

Assim, meio febril e muito tensa, Lilith foi ao encontro de Mabel. Não se atreveu a contar o que o marido havia feito com ela. Não saíam de sua cabeça todas as histórias que ouvira a respeito da cantárida. Esse afrodisíaco fora muito usado pelos homens na França do século XVIII. Lembrava-se da história de um certo aristocrata que, aos quarenta anos, já um pouco enfraquecido por ter assiduamente feito amor com todas as mulheres atraentes de seu tempo, apaixonou-se violentamente por uma dançarina de apenas vinte anos e passou três dias e três noites tendo relações sexuais com ela com a ajuda da cantárida. Lilith tentou imaginar como poderia ser uma experiência dessas, receando que a droga fizesse efeito a qualquer instante, obrigando-a talvez a ir correndo para casa e confessar seu desejo ao marido. Lilith não conseguiu concentrar-se no que se passava na tela do cinema. Sua cabeça era um caos. Sentou-se muito tensa, tentando sentir os efeitos da droga. E teve um sobressalto quando percebeu que se sentara com as pernas muito abertas e a saia bem levantada, acima dos joelhos. Recompôs-se, achando que aquilo já deveria ser indício de uma febre sexual que a

que quem estivesse sentado na fila da frente, colocada muito abaixo da sua, seria capaz de, com uma simples olhada para trás, regalar-se com o espetáculo das calcinhas e das ligas novas que comprara naquele mesmo dia. Tudo parecia conspirar em benefício de uma noite de orgia. Deveria ter sido dominada por uma premonição quando resolvera comprar aquelas calcinhas rendadas e um par de ligas cor de coral que ia tão bem com suas pernas de dançarina. Foi com raiva que fechou as pernas. Se fosse envolvida por uma selvagem torrente de desejo, não saberia o que fazer. Deveria se levantar de repente, dizer que estava com dor de cabeça e ir embora? Talvez pudesse se virar para Mabel — Mabel sempre a adorara. Teria coragem de se voltar para Mabel e acaricia-la? Já ouvira falar de mulheres que se acariciavam. Uma conhecida sua já se sentara daquele modo na escuridão do cinema e, muito lentamente, a mão da amiga que estava a seu lado abrira sua saia, escorregara até seu sexo e a acariciara até que ela gozasse. Não saberia dizer com que frequência essa sua conhecida vivera aquela deliciosa situação de ter que ficar quieta, controlando a parte superior do corpo, enquanto estava sendo acariciada no escuro, secreta, lenta e misteriosamente. Nunca tinha acariciado uma outra mulher. Diversas vezes pensara que deveria ser algo maravilhoso afagar uma mulher, acompanhar a curva de suas nádegas, sentir a suavidade do seu ventre e da pele entre as pernas. Já tentara se acariciar na cama, à noite, só para ver como seria tocar outra mulher. Reiteradamente fizera isso com seus próprios seios, imaginando que fossem de outra mulher.

estava acometendo e que se agravava a cada instante. Tentou lembrar se algum dia já se sentara daquela maneira no cinema. No seu modo de entender, aquela posição era a mais obscena que jamais imaginara. Sabia

Fechando os olhos imaginou o corpo de Mabel em traje de banho, Os seios redondos eram tão grandes que pareciam querer pular para fora do maiô a qualquer instante. Ela estava sempre sorrindo, e sua boca de lábios grossos prome-

— Bem, se você prometeu, tem de ir. Mas eu estarei à sua espera.

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tia ser muito suave. Como deveria ser maravilhoso! Mas até então Lilith não sentia nenhum calor entre as pernas que pudesse fazê-la perder o controle e esticar a mão na direção de Mabel. As pílulas ainda não tinham produzido efeito. Estava frígida, constrangida, entre as pernas; havia mesmo uma evidente tensão lá. Não podia relaxar. Se tocasse em Mabel, não poderia prosseguir depois com um gesto mais ousado. E, no entanto, a saia de sua amiga abria-se lateralmente. Será que Mabel gostaria de ser acariciada? Lilith estava ficando inquieta. Sempre que se descuidava, suas pernas se abriam de novo, tomando aquela posição que lhe parecia tão obscena, tão convidativa e que a fazia recordar certos passos de dança das bailarinas nativas da ilha de Bali. O filme terminou. Em silêncio, Lilith dirigiu seu carro pelas estradas escuras. De repente os faróis iluminaram um carro que se achava estacionado no acostamento. Dentro dele havia um casal que não estava se acariciando do modo usual. A mulher estava sentada no colo do homem, de costas para ele; o homem se erguia todo de encontro a ela, o corpo na pose característica de quem estava gozando. Seu estado era tal que ele não foi capaz de parar quando os faróis do carro de Lilith o iluminaram. Pelo contrário, esticou-se mais ainda, para sentir melhor a mulher que tinha nos joelhos, enquanto ela dava a impressão de estar meio desmaiada de prazer. Lilith permaneceu em silêncio, tomada de espanto, e Mabel comentou: — Sem dúvida nós os pegamos no melhor momento. E riu. Então Mabel conhecia o clímax que Lilith jamais experimentara e que tanto ansiava por conhecer. Gostaria de perguntar como 50

era, mas se conteve. Logo saberia. Ver-se-ia obrigada a liberar todos aqueles desejos experimentados em geral apenas nas fantasias, em longos devaneios que enchiam suas horas quando ficava sozinha em casa. Ficava pintando e pensava: “Agora entra aqui um homem por quem estou muito apaixonada. Ele aparece no quarto e vai dizendo: ‘Deixe-me despir você’. Meu marido jamais tira minha roupa; ele se despe sozinho; mete-se na cama e, se me quer, apaga a luz. Mas esse homem virá e me despirá lentamente, peça por peça. Isso me dará bastante tempo para senti-lo, para ter as mãos dele sobre mim. Antes de tudo, ele abrirá meu cinto, tocará em minha cintura com ambas as mãos e dirá: ‘Que linda cintura você tem; como é estreita, que belas curvas’. Então desabotoará minha blusa muito devagar; eu sentirei suas mãos em cada botão, e depois tocando meus seios pouco a pouco, até que eles saiam da blusa. Ele os amará e sugará os bicos como se fosse uma criança, machucando-me um pouco com seus dentes. E eu sentirei tudo isso se espalhando pelo meu corpo, liberando todos os meus nervos e me dissolvendo em um mar de desejo. Ficará impaciente com a saia. Estará desesperado de paixão. Não apagará a luz. Ficará me olhando, me admirando, me adorando, aquecendo meu corpo com suas mãos, esperando até que eu esteja totalmente excitada, até que cada poro de minha pele tenha despertado para o amor. Será que já estaria sendo perturbada pela cantárida? Não, sentia-se lânguida, perseguida por todas aquelas fantasias que se repetiam interminavelmente — mas era só. E, contudo, gostaria de conhecer o êxtase que observara no casal surpreendido pelos faróis do seu carro. Quando chegou em casa encontrou o marido lendo. Ele ergueu os olhos para ela e sorriu com malícia. Lilith não quis confessar que não tinha sentido os efeitos do


afrodisíaco. Estava imensamente desapontada consigo mesma. Que mulher glacial ela devia ser, a quem nada perturbava, nem mesmo algo que fizera um nobre do século XVIII passar três dias e três noites fazendo amor sem parar. Ela era um verdadeiro monstro. E seu próprio marido já devia saber disso. Iria rir dela. E acabaria por procurar uma mulher mais sensível. Assim, ela começou a se despir na frente dele, andando de um lado para o outro seminua, escovando os cabelos ao espelho. Em geral não fazia nada disso. Não queria que ele a desejasse. Não sentia nenhum prazer com o ato sexual. Era algo que tinha de ser feito o mais rápido possível apenas por causa dele. Para ela era um sacrifício. A excitação e o prazer que não compartilhava lhe eram repulsivos. Sentia-se como uma prostituta paga para aquilo. Era uma prostituta sem sentimentos, que em troca de seu amor e de sua devoção lhe dava um corpo totalmente frígido. Sentia vergonha de ser assim. Mas quando finalmente se deitou, ele lhe disse: — Não creio que a cantárida tenha produzido efeito suficiente em você, e estou com sono. Acorde-me se. . Lilith tentou dormir mas não conseguiu, aguardando que seu corpo se enchesse de desejo. Depois de uma hora levantou-se e foi até o banheiro. Pegou o vidrinho que Billy lhe comprara e tomou dez pílulas de uma só vez, pensando: “Isto vai resolver o problema”. Deitou-se de novo, esperando. Durante a noite seu marido foi procurá-la. Mas ela estava tão tensa e seca entre as pernas que ele teve de umedecer o pênis com saliva.

— Mas, Lilith, tudo não passou de uma brincadeira. O que você tomou não era cantárida. Mas daquele momento em diante Lilith passou a ser perseguida pela idéia de que deveriam existir modos de se excitar artificialmente. Tentou todas as fórmulas de que já ouvira falar. Bebeu enormes copos de chocolate com grandes quantidades de baunilha. Comeu montanhas de cebolas. O álcool não a afetava como a outras pessoas, porque já estava em guarda quando começava a beber. Na verdade, não conseguia deixar de pensar em si própria e em seu problema. Já tinha ouvido falar de umas bolinhas que eram usadas como afrodisíaco nas Índias Orientais. Mas como poderia obtê-las? Onde poderia se informar a esse respeito? As mulheres nativas daquele país as inseriam dentro da vagina. Eram bolinhas de borracha muito macia, revestidas de um material bem parecido com pele. Quando eram introduzidas na vagina, essas bolinhas se acomodavam e passavam a se agitar toda vez que a mulher se movia, causando um efeito muito mais excitante do que um dedo ou um pênis. Lilith gostaria de conseguir essas bolinhas, para andar com elas dentro de si dia e noite. Anaïs Nin

Na manhã seguinte Lilith acordou chorando. Billy interrogou-a e ela lhe disse a verdade. Ele soltou uma risada. 51


Poemeu Nulo

O que os olhos veem

Vocês acham que sou zero. Não me zango, Sou sincero. Se pra vocês o zero é zero Eu ponho o zero onde eu quero.

O retrato da favela tem só uma imagem, mais cada olho tem sua interpretação pra essa imagem. Meus olhos veem quando eu olho pra favela almas tristes, sonhos frustrados, esperanças destruídas, crianças sem futuro. Vejo apenas vitimas e dor

Millõr Fernandes

Folhas da Relva Apalpar as folhas da relva e sentir o gozo do silêncio. Sim, o gozo do silêncio, a busca que não cessa pelas vozes do interior. Vozes que são veladas, apagadas, estancadas como hemorragia, como algo que nos mataria, que revelaria o que não queremos que se mostre. Mas não, nos salva, pois está nelas as nossas entranhas que nos deixam sentir, sentir e não pensar, e apenas sentir, sentir o gozo de sermos apenas nós, sem outros, sem a procura do outro para saciar a sede infindável de procurarmos o que não se pode achar. Kaka Chiquitos

Dedução Não acabarão nunca com o amor, nem as rusgas, nem a distância. Está provado, pensado, verificado. Aqui levanto solene minha estrofe de mil dedos e faço o juramento: Amo firme, fiel e verdadeiramente. Vladimir Maiakóvski 52

Os olhos do gambé veem traficantes com AR15 e lançador de granada, vagabundas drogadas, mães solteiras, desempregados embriagados no balcão do bar Adolescentes viciados, pivetes com pipa, com rojão, avisando que os homens tão chegando Veem em cada barraco um esconderijo, uma boca; em cada senhora de cabelo branco uma dona maria, mãe de bandido Os olhos do político veem empresas ignorantes, ingênuas marionetes de manuseio simples a faca e o queijo, o passaporte pra genebra, o talão de cheque especial, o tapete vermelho pra loja da Mercedes, o tamanco, o vestido, o Modess e o vibrador da sua puta. Veem um mar de peixes cegos que sempre mordem o mesmo anzol Os olhos do boy, esses ai esses não veem nada, nenhum problema, os aviões com droga, o trafico de arma, as escolas sem telhado, lousa, professor, segurança, o jovem sem acesso a livro, quadra esportiva, centro cultural; não veem os ossos no cemitério clandestino, as vitimas da brutalidade da policia, o povo esquecido e desassistido Os olhos do boy só são capazes de enxergar na imagem da favela, o medo. O medo em forma de HK na ponta do seu nariz, e você truta, o que seus olhos veem quando olham pra favela ? Facção Central


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Tudo que é bom...

Com um tom romântico muitos dizem que tudo que é bom dura o suficiente para ser inesquecível, pensando em um amor de verão. Para eles eu digo, Sério mesmo?! Talvez eu nunca tenha sido romântica, ou meu pouco tempo na POLI tenha me feito mais prática. O que eu sei é que inesquecível nem sempre é suficiente. Vejamos as férias. Com certeza estas foram inesquecíveis, afinal como posso deixar de lembrar de algo tão efêmero? Quase como se não tivessem ocorrido. Noites em claro estudando para as subs, recs, indo para a iniciação científica, para os mais novos, o famoso trabalho de PTR, para os veteranos, o estágio.

Alguém deve estar pensando... “Mas se você estudasse durante o semestre não teria subs nem recs.” Sinceramente, não sei se é verdade. No entanto, algo me diz que, ainda que todos estudassem, os professores não seriam felizes com 100% de aprovação. Posso estar enganada, e sei que há professores que ficariam, e muito, mas no geral, não foi essa a impressão com a qual a escola me deixou. Filosofias à parte, esse breve texto foi apenas fruto de uma indignação. Para todos aqueles que se identificaram, apenas digo... Boa sorte!

Por que não tudo que é bom dura o suficiente para ser inesquecível e legendário? Afinal, não é assim que lembramos de churrascos, festas e viagens com amigos e primos...

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Beatriz Beccari Barreto


Reformas na poli

Eu queria entender porque os alunos de engenharia não são chamados a participar da discussão e do projeto de reformas que estão acontecendo na poli. As obras de repavimentação da Av. Almeida Prado foram um exemplo claro. Não lembro ao certo quanto tempo a avenida ficou fechada, mas o atraso foi enorme. A placa que informava o custo e prazo de entrega da obra foi alterada no mínimo duas vezes. E as obras da entrada da civil? E as obras do cirquinho? Uma iniciativa que poderia ser feita novamente foi a do concurso para a Sharewood. Foi realizado um concurso com alunos para a elaboração de um projeto para a área, inclusive a vivência, e depois o projeto foi escolhido por votação entre os politécnicos.

Acho, inclusive, que poderíamos montar um grupo, talvez de extensão, para extravasar os limites da poli, e também da usp. Outro dia estava passando ao lado da construção do prédio de R.I. e vi o pessoal tacando fogo nas recém utilizadas formas de concreto. Uma cena que deixaria os cabelos do Prof. Cardoso de pé! Bom, é bem bizarro o desinteresse dos alunos com a própria faculdade. A faculdade virou espaço de passagem, onde os estudantes se escondem em seus quadrados, cada vez mais restritivos, e aprendem qual a proporção de cimento e água, pedra e cal: sem nenhum vislumbre do porquê de estar fazendo aquilo. Que voltemos a ser engenheiros! Daniel Agostini Cruz

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Teoria de onda solitária Sublimações poéticas em aula D’Alfredini

Uma realidade junto da refração, lá vem a onda de sete segundos, subindo a costa o que acontece com a celeridade? conclusão óbvia. A rosa de onda mais profunda é desabrochada quando chega na costa ela se fecha Fechando o ângulo, fechando a rosa se vê nas cristas das fotos aéreas nossas linhas de conveniência O que nós enxergamos é um comprimento de onda crista, trista, triste, esta é ortogonal essa linha sou eu que construo eu marco o ângulo. No fundo a refração faz girar, girar a onda, a crista se amolda à costa a mudança do alfa a mudança da rosa a medida que vai ficando mais raso Só sobra pedra, só sobra rocha ela busca convergindo uma concentração de energia nas pontas um para raio mas com muito mais força no pontal É a onda que molda a costa ou a costa que molda a onda? o final e fim das variações é a arrebentação função da declividade da praia e da esbeltez da onda a onda quebra quando a altura é igual à profundidade a onda que reflete dobra de tamanho pois se superpõe às outras cria picos é nós. Estevão Sabatier Desenho de Guilherme Pianca

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#jogos 1) Deseja-se descobrir quantos degraus são visíveis numa escada rolante. Para isso foi feito o seguinte: duas pessoas começaram a subir a escada juntas, uma subindo um degrau de cada vez enquanto que a outra subia dois . Ao chegar ao topo, o primeiro contou 21 degraus enquanto o outro 28. Com esses dados foi possível responder a questão. Quantos degraus são visíveis nessa escada rolante? (obs: a escada está andando). 2) O quadrado abaixo é impressionante. Ele contém 36 números primos (que só podem ser divididos por 1 ou por si mesmo) e se você somar qualquer linha, coluna ou diagonal, o total será 666! 3

107

5

131

109

311

7

331

193

11

83

41

103

53

71

89

151

199

113

61

97

197

167

31

367

13

173

59

17

37

73

101

127

179

139

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Tente completar o quadrado a seguir, usando apenas números inteiros entre 1 e 16. Cada número poderá ser usado uma única vez, sendo que o total de cada linha, coluna e diagonal deverá resultar 34. 3 5

13 11

6 4

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3) Nosso código genético está impresso no DNA como se fosse uma palavra de muitas letras. Lentamente (e bota lentamente nisso...) vai mudando uma letra de cada vez. Daqui a muitos milhões de anos talvez sejamos um ser extraordinário ou, o que não é pouco provável, regressemos à barbárie. Como que adivinhando, o escritor britânico Lewis Carroll (autor de Alice no País das Maravilhas) inventou um jogo de palavras bem interessante, e que serve como um modelo simplificado do jogo da natureza que chamamos de evolução: escreva duas palavras com o mesmo número de letras, ÓDIO e AMOR, por exemplo, e, agora passando de palavra em palavra, caminhe do ódio ao amor, trocando uma única letra de cada vez – de modo que a palavra encontrada em cada mudança exista, isto é, conste em algum dicionário. Tente, é um belo jogo de palavras e ainda enriquece o nosso vocabulário. Use verbos também. Fica mais fácil. Depois, tente com outras palavras. 4) Meu professor desenhou no quadro-negro – que, aliás, era azul – três caixas, cujas tampas tinham as etiquetas: PP, PB e BB. “Quando eu vinha para cá resolvi trazer essas caixas”, nos disse. E prosseguiu: “Uma contém duas bolas pretas (PP), outra, uma preta e uma branca (PB) e a terceira duas brancas (BB)”. Tomou um fôlego, nos olhou sorridente, e lançou: “Um colega brincalhão, aproveitando-se da minha distração, trocou todas as tampas. Então eu gostaria que vocês me ajudassem a descobrir onde estão, respectivamente, as bolas. Para isso imaginem que só se pode retirar uma bola de cada vez, sem olhar aquela que resta na caixa. Qual é o menor número de bolas, e de qual caixa ela deve ser retirada para que se possa colocar as tampas nas caixas correspondentes?” Bem, caro leitor, veja como você resolve essa pequena charada. Use a imaginação, e, se não conseguir pergunte à criança que há em você. Resposta da última edição A resposta para o enigma da última edição é muito simples, caro leitor. Para obter sucesso, os presos deveriam fazer a seguinte estratégia: o primeiro, o qual teria sua morte incerta, falaria a cor de quantidade em número ímpar na cabeça dos outros nove. Assim o de sua frente saberia qual seria a sua cor, já que a cor cuja soma era ímpar mas agora é par, é a cor de sua cabeça. E assim por diante. Logo, só o primeiro na fila poderia morrer.

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