Jornal Casa do Patrimônio 03

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JORNAL

Edição 3 - Ano 2013 - Casa do Patrimônio de João Pessoa

CASA DO PATRIMÔNIO Resgate de urnas incentiva instalação do Museu de Arqueologia de Pilões

Saberes, fazeres e expressões - Riqueza cultural de Zabelê - p. 2 Cidade e Patrimônio - A antiguidade e a juventude de Areia - p. 3 Relicário da memória - Penha: um bairro guiado pela fé de seu povo - p. 6 Cultura em ação - Um museu da comunidade para a comunidade - p. 8

Tema da edição - p. 4 Projeto de Educação Patrimonial ensina crianças e adultos a valorizarem os bens culturais da região. Foto: Acervo LA/UFPE.


Saberes, fazeres e expressões

Riqueza cultural de Zabelê Phillipe Xavier

(Estudante de Comunicação Social / Jornalismo da UFPB - 6° Período)

Zabelê traz consigo a incongruência de ser pequena, mas possuir uma vasta riqueza cultural. Com área territorial de 109 km² e apenas 2.075 habitantes, segundo dados do Censo 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o município tem uma história composta por muitos saberes, tradições e particularidades. A primeira que pode ser destacada consiste em um tipo de artesanato característico da região do Cariri paraibano: a Renda Renascença. O bordado, que mistura delicadeza, harmonia e complexidade, é fonte de sobrevivência de muitas mulheres zabelenses. Elas realizam o trabalho de forma singular e são auxiliadas por diversas associações locais, que tentam garantir seus direitos e facilitar o contato com comerciantes de grandes centros. Como iniciativa para assegurar o reconhecimento da produção, um selo de indicação geográfica estaria prestes a ser conferido às rendas oriundas da cidade. Com ele, a procedência do material teria certificação e as técnicas inovadoras das artesãs estariam protegidas. Outra tradição muito cultivada e reverenciada entre a população de Zabelê é o Reisado. Comemorado em diferentes localidades no período natalino, o ato popular é feito sem datas específicas na cidade. “Inicialmente, era cantado com vozes masculinas, por ser de formação de homens, mas atualmente é cantado com vozes femininas e

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masculinas. O grupo tem se apresentado dentro da Igreja Matriz, nas ruas, nas casas, nos sítios, nas escolas, nos clubes, em outros municípios como São Paulo, Recife, João Pessoa, Campina Grande e em muitas outras cidades do semiárido paraibano”, afirma o secretário de Cultura de Zabelê, Romério Zeferino, em depoimento aos técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) Carla Gisele Moraes e Luciano de Souza e Silva. Criado em 1919, o Reisado de Zabelê voltou a ser celebrado recentemente graças a ações de produtores culturais na cidade. É famoso por mesclar ritmos como baião e valsa, além de trazer personagens e figuras famosas do folclore que contam histórias e enriquecem ainda mais o espetáculo. As fantasias são um elemento à parte: produzidas com fitas de seda, lantejoulas, espelhos e outros adereços, garantem um visual especial a todos os brincantes. E a descrição do folguedo não estaria completa se não fossem citadas as cantigas que, executadas durante as apresentações, tratam de variados temas, como religiosidade e a vida do sertanejo. A cultura do gado e outras manifestações As manifestações da cultura popular de Zabelê também se estendem aos ofícios dos vaqueiros. O aboio é um canto entoado enquanto se conduz o gado e não se restringe às pastagens. Os aboiadores frequentemente se apresentam junto

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de boiadeiros e cantores de forró em cidades espalhadas pelo Brasil. Somadas a esse canto, estão as vestimentas típicas, produzidas em couro, igualmente utilizadas na Pegada de Boi, festa característica das regiões do Cariri paraibano. Em Zabelê, o evento acontece todo ano em outubro e é derivado da Festa de Nossa Senhora das Dores. É constituído por uma missa, em que os vaqueiros pedem bênçãos aos santos padroeiros, além de um almoço para todos os presentes e de uma competição – o pega – que é realizada na caatinga e cujo objetivo é perseguir e laçar o gado. Costume que aparece como mais uma prova da força da cultura zabelense, a Reza é uma forma de oração aos espíritos superiores objetivando a cura e a proteção. Na cidade, destacam-se dois rezadores descobertos através da visita dos técnicos do Iphan: Antonino Manuel da Silva, conhecido como “Seu Antonino rezador” e Maria Ferreira de Amorim, conhecida como “D. Maria rezadora”. Eles não são remunerados pelo ofício, mas recebem algumas doações de pessoas sensibilizadas com a situação humilde de ambos. No leque cultural do município ainda incluem-se os tocadores de música popular, que despontam na arte por intermédio de gaiteiros como João Alves de Santana, conhecido como “João de Coquinho”, também encontrado pela equipe do Iphan. Renda renascença. Foto: Daniella Lira. Reisado de Zabelê. Foto: Anderson Alcântara. Vaqueiros participantes da pega de boi. Foto: Antonio Ronaldo.


Cidade e Patrimônio

A antiguidade e a juventude de Areia Letícia Passos (Estudante de Comunicação Social / Jornalismo da UFPB - 7° período) O munício de Areia, no Brejo paraibano, esquecido pelo tempo e lotado de adversidades, tem passado por uma série de projetos e ações que dão o valor que essa cidade histórica merece. Ciente do valor cultural da arquitetura do século XIX da cidade, a Associação dos Amigos de Areia (Amar) reuniu documentos para pleitear ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) os encaminhamentos para o tombamento de Areia. A atual secretária de educação do município, Lúcia Giovanna, explicou que o objetivo era iniciar um novo “ciclo econômico” na região e no turismo cultural. “Essa ação aliava dois objetivos básicos do grupo: a preservação e divulgação do bem patrimonial e a ampliação de possibilidades econômicas para a comunidade.”. Mas o tombamento de Areia não é o único feito cultural que ocorre na cidade. A Amar, com a ajuda da Superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan/PB, decidiu restaurar a mala e os pincéis do artista plástico Jovens realizam restauro em arte sacra. Ao lado, alunos da rede pública conhecem o Museu da Rapadura. Fotos: Acervo AMAR.

Pedro Américo – nascido em Areia em 1843 e autor de O Grito do Ipiranga, 1888, e Tiradentes Esquartejado, 1893. Além disso, a Associação criou um programa de oficinas de capacitação para salvaguarda e restauração dos bens, com a finalidade de envolver jovens da cidade. A partir daí, o projeto ‘Oficina de Salvaguarda e Restauração: Areia e seus Museus’ se consolidou. Com o andamento da Oficina de Salvaguarda e Restauração, os participantes perceberam que eles faziam parte do patrimônio cultural e tornou-se clara a vontade dos areienses em ajudar a história de seu município. Este sentimento fez com que o programa de salvaguarda se multiplicasse: agora, as ações existentes se expandiram para várias áreas, como turismo, cultura, educação, história e patrimônio. Assim, desde 2010, editais vêm sendo publicados e os jovens são selecionados e capacitadosno projeto. Hoje, com apenas 20 mil habitantes, Areia possui três museus: Museu Casa de Pedro Américo, Museu Regional de Areia e Museu do Brejo Paraibano. Em cada um, a Amar tentou valorizar o patrimônio com o objetivo de conhecer cada peça, como também a sua história, sua técnica e suas referências para a população da cidade. Segundo o presidente da Associação, Carlomano Correa de Abreu, as ações incentivam a cultura e a preservação do patrimônio histórico. “Nesse projeto nós requalificamos os modelos e a estabilização dos acervos e a casadopatrimoniojp.com

partir dele também foi criado um laboratório de preservação e restauro”, explicou Carlomano. Com a maioria de seu acervo recuperado, a riqueza do projeto Oficina de Salvaguarda e Restauração é louvável. Os participantes, alguns em situações sociais delicadas, estão inseridos em ações reconhecidas e valorizadas pela comunidade areiense e os municípios vizinhos e, portanto, tendo a chance de construir uma nova perspectiva de vida. O projeto conta também com aulas de informatização de acervos, que recebeu a ajuda do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro. Já para garantir as ações sistemáticas da capacitação dos jovens e a conservação dos acervos, a Amar teve o apoio do Banco Mundial de Desenvolvimento Social (BNDES) e do Ministério da Justiça. Em 2012, o projeto ‘Oficina de Salvaguarda e Restauração: Areia e seus Museus’ foi premiado, nacionalmente, na 25ª Edição do Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, na categoria Preservação de Bens Móveis. Esse prêmio é concedido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional para pessoas e instituições que desenvolvam projetos exemplares com vistas à preservação e valorização do patrimônio cultural do país. No mesmo ano, o projeto também ganhou o troféu da Associação Brasileira de Jornalismo e Turismo. 3


Tema da edição

Resgate de urnas incentiva instalação do Museu de Arqueologia de Pilões Jéssica Figueiredo (Estudante de Comunicação Social / Jornalismo da UFPB - 6º Período)

Em meados de setembro de 2009, estudiosos da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, que faziam trabalho de prospecção arqueológica por conta da instalação de uma subestação de energia da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco – Chesf, encontraram, na área rural do município de Pilões, na Paraíba, uma série de urnas funerárias pré-históricas. Após pesquisas, foi descoberto que aquela área se tratava de um cemitério indígena da tradição Aratu, e as urnas datavam dos anos de 1190 a 1682. Segundo os especialistas, os indícios mostram que o terreno poderia ter sido ocupado continuamente – ou seja, durante vários anos pela mesma tribo –, ou apenas durante períodos específicos. Por conta de ação da Superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan/PB, as obras da subestação foram suspensas, de modo que se pudesse iniciar um programa de resgate arqueológico, desenvolvido pelo Laboratório da Arqueologia da UFPE. Enquanto realizavam os estudos arqueológicos, a equipe executou sondagens e encontrou um rico acervo de material, composto principalmente

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por vasilhames de cerâmica. De acordo com o professor responsável pela equipe, Marcos Albuquerque, os vasilhames estavam em bom estado de conservação, algo raro de se encontrar em sítios arqueológicos. A técnica em Arqueologia do Iphan/PB, Paola Bonfim, explica que “ao todo, foram encontrados 57 conjuntos funerários. E, no interior de algumas urnas, havia pequenos recipientes, provavelmente utilizados para oferendas, além de outros objetos da época, como blocos, lâminas de pedra, algumas muito semelhantes a machados, peças de adorno, entre outros”. Segundo ela, esses objetos provavelmente pertenciam aos respectivos mortos. Durante as escavações, também foi observado que provavelmente as urnas já haviam sido abertas e os corpos retirados. De acordo com os estudos do professor Marcos Albuquerque, os cadáveres provavelmente foram retirados ou para um sepultamento secundário ou para outro ritual da própria tribo, porém ainda não identificado. O único indício humano encontrado pelos arqueólogos foram dois dentes molares que, segundo o professor, “podem ter se casadopatrimoniojp.com

Trabalho em campo de resgate de urnas funerárias São três passos para restaurar as peças: colagem, aplicação de gesso odontológico e aplicação da pigmentação. Fotos: Acervo LA/UFPE.

desprendido do corpo durante a retirada do esqueleto”. Processo de resgate Finalizadas as escavações e os estudos no terreno de Pilões, os estudiosos reuniram as peças resgatadas e levaram para o Laboratório de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco, para que fossem devidamente restauradas. Após a organização, identificação e catalogação do material fragmentado, os arqueólogos deram início à recomposição das peças encontradas. O primeiro passo para recompor os objetos encontrados é aquecê-los. Após o aquecimento, a equipe adiciona na borda da peça – no caso, dos vasilhames de cerâmica – uma espécie de colante conhecido como “asa de barata”. Depois desse processo, o objeto novamente é aquecido e então


é feita a união das partes e retirado o excesso do composto. Posteriormente, os arqueólogos cobrem o artefato com gesso odontológico, para disfarçar as emendas. Por fim, as peças recebem a pigmentação aproximada do original, e ganham sua identidade visual. Construção do Museu de Arqueologia de Pilões A descoberta das urnas funerárias em Pilões causou grande comoção na população da cidade. Num determinado momento, praticamente toda a comunidade próxima ao terreno se dirigiu ao local onde aconteceram as escavações e clamou pela permanência desse acervo histórico no município. Com isso, a Prefeitura Municipal de Pilões e a Superintendência do Iphan na Paraíba começaram as tratativas para se definir onde poderiam construir um museu para abrigar os utensílios e objetos encontrados na escavação.

A Prefeitura de Pilões acredita que a importância histórica desse projeto consiste em preservar a préhistória do homem da região do brejo paraibano, além de mostrar estudos da ocupação indígena que aconteceu naquela região, nos períodos anteriores à colonização. Além disso, este espaço representa referência para a arqueologia nacional. Educação Patrimonial Além de realizar as escavações e estudos arqueológicos dos objetos encontrados no sítio de Pilões, a equipe da Universidade Federal de Pernambuco também iniciou o projeto de Educação Patrimonial. Segundo o professor Marcos

Albuquerque, sempre que eles dão início a uma pesquisa num terreno de algum município, esse trabalho é realizado. O projeto de Educação Patrimonial consta em apresentar o cotidiano de trabalho dos arqueólogos a crianças, adolescentes e adultos da região, para que eles possam se familiarizar com a metodologia usada pelos estudiosos. Essa prática faz com que a população crie consciência do significado dos bens culturais encontrados e possam valorizar os objetos históricos como um símbolo da nossa cultura. Projeto da fachada do Museu de Arqueologia de Pilões. Projeto de Arquitetura do interior do museu. Imagens: Acro Arquitetura.

Após ser firmado um acordo entre o Iphan/PB, a prefeitura, a Chesf e a Energisa, ficou decidido que o prédio do antigo Mercado Municipal, que hoje é ocupado por comerciantes locais de forma desordenada, seria utilizado para a instalação do Museu de Arqueologia de Pilões. Com o intuito de não prejudicar o comércio da região, a prefeitura acomodou parte dos vendedores em outra área da cidade, assim liberando o espaço para a restauração do prédio que abrigará o museu. Alguns quiosques com comércios compatíveis com a cultura, como artesanato, permanecerão no local. O projeto de arquitetura do Museu de Arqueologia de Pilões está em fase final e, logo em seguida, deve ser lançado o edital de licitação pela Chesf que irá possibilitar adequação do Mercado Público a fim de receber a instituição histórica. Para dar transparência a esse projeto, o Iphan/ PB já realizou quatro audências públicas para apresentar a pesquisa arqueológica e todo o projeto de arquitetura do Museu. Nessas audiências, o Instituto abriu espaço para que qualquer cidadão da cidade pudesse integrar o Grupo de Trabalho para planejar a criação e manutenção do Museu. Esse GT vem trabalhando intensamente e já finalisou o plano museológico do Museu, conforme determina o Estatuto dos Museus (Lei nº 11904/2009).

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Relicário da memória

Penha: um bairro guiado pela fé de seu povo Suelen de Andrade Silva (Historiadora. Estagiou no Iphan/PB na área de Educação Patrimonial) e Maria Olga Enrique da Silva (Técnica do Iphan/PB. Atua na área de Educação Patrimonial) Recanto de beleza natural singular. No passado conhecido por Aratu. Caracterizado pela junção do sagrado e do profano, o primeiro representado pela devoção a Nossa Senhora da Penha e o segundo expressado pela cultura popular do seu povo. Sua localização privilegiada, situada no litoral da capital paraibana, nos remete a um olhar preservacionista do lugar e de sua cultura. Essa é a simples descrição do atual bairro da Penha.

Seu encanto e sua história estabelecem um forte laço afetivo com os seus moradores e com quem chega ao local em visita. Assim percebemos no olhar do comendador Santos Tigre, nascido no local em 1899, e que, ao escrever suas crônicas, deixa registrada sua relação afetiva com a região. Descreve como local de mata virgem, cercado por rio de águas cristalinas (Rio do Cabelo), e ocupado por poucas famílias que viviam em casas feitas de

palha e barro, sustentadas pela pesca e agricultura. Povo de grande alegria, que se expressa através das festas populares. Antes viviam na praia e aos poucos vão se espalhando, à medida que a população vai crescendo. A parte de cima da praia foi reconhecida, no ano de 1980, como patrimônio cultural do Estado. Seu tombamento compreende o santuário de Nossa Senhora da Penha, 24 casarios, cemitério, posto de saúde, escola e árvore Oiti (remanescente da mata atlântica). Recentemente grande parte desses bens foi modificada por reformas, demolições e pelo movimento de urbanização. Atualmente, costuma ser alvo de construções irregulares, que agridem o local e vão contra os princípios do seu decreto de tombamento. Outro elemento muito importante nesse conjunto patrimonial é o cruzeiro localizado ao lado da parte superior da escadaria, que servia como referência para os pescadores que saíam do mar após a pesca e que o tinham como identificador para voltar à praia. Também era utilizado por visitantes, que vinham pelo mar para pagar promessas. E não há como falar desse bairro desvinculando-o da sua maior manifestação: a devoção a Nossa Senhora da Penha. De todas as histórias que tentam explicar a origem da devoção, a que se destaca diz respeito ao português Silvio Siqueira. Ele teria realizado promessa a Nossa Senhora da Penha ao se deparar com uma tormenta em alto mar. Em homenagem à santa, constrói uma ermida, trazendo a imagem meses depois. Ao longo dos anos, a ermida construída por Silvio Siqueira sofreu consideráveis modificações, lamentavelmente chegando a descaracterizar suas formas originais. Caso inusitado, que comoveu e ainda comove os moradores do bairro, é o roubo, no ano de 1978, da imagem trazida por Siqueira. Até hoje não se sabe o seu paradeiro ou quem efetuou o roubo. O grande marco da cultura local é a romaria de Nossa Senhora da Penha, que se revela não só como um dos maiores símbolos de devoção do bairro, mas de todo o Estado da Paraíba. Os

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registros da romaria remontam ao final do século XIX. Atualmente a festa se inicia três dias antes da própria celebração da romaria, com o tríduo (três dias de celebração religiosa), minifeira de produtos artesanais e regionais, oficinas socioeducativas e manifestações culturais com grupos locais e regionais. A preparação se inicia no mês de maio e a grande celebração se concretiza no último sábado do mês de novembro. Símbolo de integração entre toda a comunidade, que se movimenta para um bem comum. Os fiéis percorrem cerca de 14km, saindo às 20h da Igreja de Nossa Senhora de Lourdes (no bairro de Jaguaribe) e chegando no Santuário da Penha por volta das 4h da madrugada. Forte manifestação de fé marcada pela presença das mais variadas classes sociais, pessoas de todas as idades, todas juntas, com um mesmo objetivo: homenagear Nossa Senhora da Penha por uma graça alcançada ou fazer pedidos à santa. Por mais que se tente descrever, é difícil narrar a mobilização de tanta gente concentrada em um mesmo lugar e durante todo esse percurso. A celebração envolve a identidade coletiva, abarcando aspectos que tornam o grupo único, com crenças, valores e realizações compartilhadas por seus membros. De modo geral, não podemos deixar de mencionar as personagens principais da história

deste bairro: seus moradores. Entre eles citamos Antonia Francisca da Silva (Dona Tonha), Seu Dedé e Terezinha Maria Freire (Dona Terezinha). Essas pessoas estão envolvidas das mais diversas formas com o bairro e com a devoção a Nossa Senhora da Penha.

Imagem do bairro da Penha nos anos 1980, destacando o casario e o oitizeiro. Foto: Acervo Iphaep. Dona Tereza, moradora da Penha. Foto: Suelen Andrade. Ao lado, Santuário da Penha. Foto: Igor Souza.

observa é a substituição das antigas moradias, antes feita de taipa, agora em alvenaria.

Dona Tonha, 86 anos, moradora da Penha desde a década de 1960, antiga zeladora do santuário, demonstra uma forte relação com todo aquele local. Mesmo que hoje não frequente o santuário como gostaria devido à idade avançada, guarda em suas recordações bons momentos vividos. Seu filho Dedé é capaz de mostrar a antiga estrada percorrida pela romaria, que cortava por dentro do bairro da Penha, onde antigamente era tudo mata fechada, até a década de 1970.

Com esses personagens e suas memórias, percebe-se o quão importante e significativo o bairro da Penha se torna, principalmente para a vida dessas pessoas, que desde sempre viveram nele. Entretanto, os bens guardados pelo bairro fazem parte da identidade do povo paraibano como um todo, principalmente quando nos remetemos à devoção, e que está presente na figura do pescador, da ex-parteira e eterna cirandeira, dos devotos, da zeladora, da dona de casa, dos moradores do bairro da Penha.

Dona Terezinha, 82 anos, é outra personagem desta história. De grande representatividade, tanto por ser moradora antiga do local, quanto por sua experiência de vida, ao realizar o parto de muitos moradores no bairro. Junto com seu falecido marido, realizou importantes eventos culturais na Penha, tais como ciranda e coco de roda, hoje tão esquecidos pelos atuais filhos do bairro. Segundo Dona Terezinha, a comunidade, de uma forma geral, está bastante mudada. A principal mudança que

A Penha ainda guarda muito sua riqueza antepassada, com sua simplicidade. Valiosos aspectos merecem sua preservação, pela imensa devoção à santa, por sua história, por sua cultura ou pelos saberes de seu povo. Tristemente muito foi perdido e não registrado, mas é por meio de um trabalho de memória e história oral, e principalmente de um olhar de valorização pela região, que se deve buscar a preservação desse lugar valioso.

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Cultura em ação

Um museu da comunidade para a comunidade Giovanna Ismael

(Estudante de Comunicação Social / Jornalismo da UFPB - 7° período).

Mas o que é patrimônio imaterial? “O conceito de patrimônio imaterial refere-se aos saberes populares de uma determinada comunidade”, explica Marcela Mucillo, também coordenadora do projeto. Nestes saberes, estão inclusas danças populares, grupos de teatro e outras manifestações culturais dos bairros.

Mestra Inácia da tribo indígena Pele Vermelha. Foto: Isa Paula Morais.

Se o povo constrói sua identidade cultural, seria óbvio que quem escolhe o inventário de um museu local é quem de fato está ativo na comunidade, correto? Sim, segundo o Coletivo Jaraguá. Para a ONG paraibana, apesar disso fazer sentido, não é bem o que ocorre aqui no Estado, onde dificilmente se veem museus nos pequenos bairros. Com este pensamento, o coletivo decidiu construir um acervo cultural fora das quatro paredes, uma ideia que se movesse ao ritmo da comunidade e indo em direção a ela. Foi criado, então, o Museu do Patrimônio Vivo de João Pessoa. A ideia do museu é atuar em conjunto com os habitantes de bairros da capital. A comunidade dita o que é culturalmente relevante para ela e faz o seu próprio inventário. Pablo Honorato, coordenador e um dos fundadores da iniciativa, explicou que o objetivo do museu é a disseminação dos chamados bens culturais imateriais. “Nós sentimos a necessidade de ampliar a ideia tradicional de museu e entendê-lo como uma forma de valorização e divulgação de patrimônios”, disse.

Toda comunidade será o Museu do Patrimônio Vivo, de acordo com Marcela. “O acervo é composto por pessoas, lugares, narrativas, calendários festivos e expressões culturais de um modo geral”, explicou. As manifestações acontecerão nos lugares ativos dos bairros: locais de festas e de trabalho, casa dos mestres e atores culturais, etc. “O Museu Vivo será assim representado por um mapa das expressões culturais da grande João Pessoa, ilustrando uma rede de pessoas, lugares e objetos de grande referência cultural para as localidades envolvidas”, concluiu. O projeto foi pensado em 2010 por Pablo, Marcela e Laetitia Valadares. Tem também uma coordenação pedagógica, assumida na primeira fase por Nara Limeira, e a supervisão técnica de Gabriela Limeira. Após realizar algumas ações em pequenas comunidades, o projeto alcançou proporções maiores e conseguiu, em 2012, o apoio financeiro do Fundo Municipal de Cultura (FMC) e, atualmente, conta com o financiamento do Fundo de Incentivo à Cultura (FIC) para expandir o trabalho para outros bairros de João Pessoa. Em janeiro, o grupo realizou uma série de oficinas de capacitação com bolsa para os jovens da comunidade. Aulas de fotografia, português, informática, direitos culturais, educação patrimonial, elaboração de projetos e economia criativa foram ministradas. Mais do projeto O projeto “Museu do Patrimônio Vivo de João Pessoa” foi vencedor do Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade - 2013, na categoria

Casa do Patrimônio de João Pessoa

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“patrimônio imaterial”. Essa premiação é concedida ao Iphan a pessoas e entidades que se destacam nacionalmente com ações em prol da preservação e valorização do patrimônio cultural brasileiro. O Museu possui um blog (http://www. museudopatrimoniovivo.blogspot.com.br/), mas em breve colocará no ar seu próprio site e catálogo virtual. Uma exposição fotográfica do registro das ações feitas até agora também está sendo organizada. A mostra passará pelos bairros do Roger, Rangel, Novais, Paratibe, Vale do Gramame e Mandacaru. Coletivo Jaraguá A associação foi criada por paraibanos a fim de espalhar a cultura popular e de tradição do Estado, fugindo do pensamento de que a cultura brasileira é uma só por todo território nacional. O grupo realiza pesquisas de campo em comunidades da Paraíba e efetiva algumas ações voltadas para políticas públicas, especificamente as que abordam as culturas populares, em especial, de afrodescendentes e quilombolas, indígenas, colônias de pescadores, trabalhadores rurais e outras manifestações culturais tradicionais. O Jornal Casa do Patrimônio é produzido pela Superintendência do Iphan na Paraíba, por meio da Casa do Patrimônio de João Pessoa, em parceria com o Departamento de Comunicação Social da UFPB. Equipe da Casa do Patrimônio de João Pessoa Átila Tolentino - Iphan/PB Carla Gisele Moraes - Iphan/PB Emanuel Braga - Iphan/PB Igor Souza - Iphan/PB Maria Olga Enrique Silva - Iphan/PB Suelen Andrade - Iphan/PB Superintende do Iphan/PB Kleber Moreira de Souza Coordenadora do Projeto de Extensão Probex/UFPB Jamile Paiva Editor Casa do Patrimônio de João Pessoa Projeto Gráfico e diagramação Daniella Lira Revisão Átila Tolentino


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