Faça Valer a Pena - "Causos" de Liderança

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Catalogação na publicação por XXXXXXXXXXXX - XXXXXXXX XXXX Fioravanti, Silvana. Faça Valer a Pena : ‘Causos’ de Liderança / Silvana Fioravanti – Joinville : S.Fioravanti, 2016. XX p. ; 21 cm ISBN: XXXXXXXXXXXXX 1. Administração de empresas. 2. Administração de pessoal. 3. Criatividade na administração. 4. Recursos humanos. I. Título. CDD XXX.XXX CDU XXX.XXX.X


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Agradeço a tantas pessoas anônimas que, ao me contarem suas histórias, me deram ideias para os capítulos desse livro. Agradeço aos líderes que tive ao longo de minha carreira, que muito influenciaram a profissional e líder que sou hoje. Agradeço aos professores, facilitadores, palestrantes, terapeutas, coaches que contribuíram com o meu desenvolvimento. Agradeço aos meus parceiros de trabalho, que tanto acreditam em mim e me ajudam a progredir. Agradeço à minha família, que me deu coragem e estímulo a ir adiante com esse projeto. Agradeço a meu filho, que me faz ser uma pessoa melhor a cada dia e que me estimula a pensar grande.


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Dedico esse livro às pessoas que mais me motivaram a ler e a escrever em minha vida. Pessoas que sempre acreditaram em meu potencial. Muito obrigada aos meus Pais queridos que, com certeza, me ajudaram a escrever esse livro.


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SumáriO Capítulo 1 - A química líder / liderado ................................ 17 Capítulo 2 – Líderes podem fazer mal ............................... 21 Capítulo 3 – Como é importante estar próximo .......... 25 Capítulo 4 – O líder também erra ......................................... 29 Capítulo 5 – Só se colhe o que se planta ........................... 33 Capítulo 6 – Inversão de papéis – Que maravilha! ....... 37 Capítulo 7 – E o timing? .............................................................. 41 Capítulo 8 – Atravessando o caminho ............................... 45 Capítulo 9 – A preferida ............................................................. 51 Capítulo 10 – Cadê a autoridade? .......................................... 55 Capítulo 11 – Caos na Liderança ............................................. 59 Capítulo 12 – Não sei porque fui demitido! ....................... 65 Capítulo 13 – A centralização .................................................. 69 Capítulo 14 – A importância do relacionamento ........... 73 Capítulo 15 – Deixa estar ............................................................ 77 Capítulo 16 – O ponto da polenta ........................................... 81 Capítulo 17 – Para quem vão os benefícios? ................... 85 Capítulo 18 – Como confiar na equipe ............................... 89


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Prefácio Silvana, ou Sili, como sempre costumávamos chamá-la, desde que iniciou sua vida profissional, sempre demonstrou pró-atividade e muita dedicação em tudo que acreditava. Tive a oportunidade de acompanhar toda sua trajetória, desde que iniciou e assumiu cargos de muita responsabilidade em seu primeiro ambiente corporativo, até os momentos que resolveu empreender. Empreendeu e deixou o seu legado. Durante este período, Silvana viveu, talvez, o maior momento de procuras e dúvidas. Participou de processos de mudança de modelo mental, fez cursos, especializações e tudo que tornaria possível para abrir-se um novo horizonte para seu real propósito de vida, pessoal e profissional. Hoje, realizada e trilhando seu caminho a passos largos, Silvana, uma verdadeira líder educadora, vive seu dia-a-dia com prazer e satisfação de poder contribuir, assim como o fez com todos os colaboradores que com ela trabalharam, de maneira mais ampla com o mundo corporativo. E, para certificar-se que esta contribuição atravessará qualquer fronteira, Silvana nos brinda com o compartilhamento de sua experiência, através de seu primeiro livro “Faça valer a pena”. Leitura gostosa e informal que causa, em nós líderes, boas reflexões.

Boa leitura! Ronny Janssens


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INTRodUçÃO Tive poucos líderes ao longo de minha vida profissional, pois já aos 27 anos abri meu próprio negócio e passei a ser líder de mim mesma – tarefa nada fácil. Comecei a trabalhar aos 17 anos. Dava aulas de inglês em uma escola da região. Minha líder na época era uma senhora que de tão boa e tão atenta em nós mais parecia uma mãe. Ela queria saber como a gente estava, o que nos afligia como pessoas mesmo. E além disso, ensinava o trabalho com muito amor. Eu tinha certeza que, além de minha líder, ela se importava comigo e gostava de mim. Tanto isso tudo era verdade, que teve um dia das Mães que eu pedi permissão para minha mãe para dar flores a ela. Seu nome, que não preciso poupar até por que é uma honra falar dela e tenho a autorização de seus filhos, era Dona Vera – Vera Janssens, mãe dos meus grandes amigos Ronny e Tânia. Eu colocava o pé na escola e a Dona Vera me perguntava: “O que você tem hoje Silvana? Não está bem?” E ela sempre acertava. Quando eu recebi meu primeiro salário eu agradeci e ela disse: “Nunca agradeça por um salário, você fez a sua parte para merecê-lo”. Uma primeira lição de auto valorização. Nós conversávamos muito sobre tudo o que se pode imaginar – sobre São Paulo (cidade onde nasci e onde ela morou por muito tempo), sobre meus namoradinhos da época, sobre a situação do Brasil, sobre as dificuldades dos alunos, o método de ensino da escola, enfim, não havia limites. Ela me ensinou que o líder pode ter um relacionamento muito próximo com seus liderados,


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sem perder a autoridade, pois por mais que nós conversássemos sobre tudo, ela impunha seu respeito de forma muito natural e eu sempre a respeitei muitíssimo, como pessoa e como líder. Acredito que o respeito se conquista sendo uma boa pessoa com os outros, e isso exacerba o âmbito do trabalho somente, pois não se pode ser uma pessoa boa no trabalho e não na vida pessoal. Dona Vera era um exemplo. Uma senhora que nunca perdia a cabeça, tinha resposta para tudo, estava sempre sorrindo e pronta para dar “abraços” (físicos ou não). Ela dava feedback constantemente, seja positivo ou de correção. Era aquele tipo de feedback do bem, voltado para a melhoria ou o reconhecimento. Nós sempre sabíamos se ela estava ou não feliz e satisfeita com nosso trabalho. Dona Vera nos ensinava muito. Me lembro que após minha primeira aula, na época para gerentes de uma grande empresa – e lembrem-se que eu tinha 17 anos, ao sair da sala ela me perguntou: “Como foi Silvana? Você está vermelha.” Eu lhe disse: “Ai Dona Vera, acho que fiz algo errado. Eu contei aos alunos que era minha primeira aula e que estava super nervosa (sempre fui a super sincera!)”. E ela disse: “Qual o problema?”. Ufa!!!! Uma tonelada de peso saía de minhas costas. Mais uma lição, ser compreensiva com os liderados. Dona Vera deixou uma lição de carinho, amor ao próximo, exemplo de pessoa. Depois de alguns anos, ela foi substituída por seu filho, Ronny. De início olhávamos para ele com desconfiança, pois queríamos a mãezona. Mas, aos poucos, ele foi nos conquistando e mostrando que sua liderança seguia a da mãe. Ronny e eu somos excelentes amigos até hoje. Ele nos ensinava muito, e tem muita responsabilidade pela facilitadora que sou hoje. Ele não se envolvia tanto conosco quanto a Dona Vera, mas nunca nos deixava na mão. Ele me ensinou uma grande lição: mesmo quando o líder não está fazendo nada, ele está fazendo algo. Deixe-me explicar: um dia eu entro na sala dele e ele está quieto, parado, olhando para o nada. Aquilo me intrigou e eu perguntei o que ele estava fazendo. Sua resposta: “Pensando”. E daí me explicou quão importante é o líder pensar no que acontece ao seu redor, como melhorar as coisas, o que está bom, o que não está tão bom. Enfim, grande lição – sair do


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piloto automático e refletir. Cada líder tem seu jeito. E todos deixam marcas no liderado. Eu agradeço a cada líder que tive, pois eles ajudaram a formar a profissional que sou hoje. O poder de influência de um líder é muito forte e pode criar ou destruir pessoas. Eu tive muita sorte com meus líderes, pois todos contribuíram positivamente. No entanto, sabemos de histórias muito diferentes que fazem com que profissionais sintam-se desmotivados, rebaixados, complexados e por aí vai a lista de sentimentos ruins. O bom líder é uma pessoa melhor. E ele é melhor por que ele tira o melhor de sua equipe, ele motiva, ele alegra, ele deixa que as pessoas usem seus potenciais, que criem, que contribuam com suas ideias e, com tudo isso, suas vidas ficam mais felizes. Tudo influência do líder. Nesse livro de contos de liderança, irei compartilhar histórias que vivi, que ouvi, que presenciei, que soube. Utilizarei nomes e situações falsas para proteger a privacidade das pessoas envolvidas. E são tantas histórias...... Uma boa leitura e, sejamos todos líderes que valem a pena!


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A QuímicA Líder/LideradO Capítulo 1

Catia tinha 21 anos e foi trabalhar em uma grande empresa da região, uma empresa que iniciava seus passos como multinacional. Era uma fabricante de azulejos reconhecida em todo o Brasil. Catia trabalhava muito e ria muito com sua colega Luciana. As duas não paravam de conversar, mas não paravam de trabalhar tão pouco. Luciana era uma moça ambiciosa, estudiosa e que sabia o que queria. Ela queria ser uma executiva, o que conseguiu depois de alguns anos. Catia era recém-casada e tudo o que queria era ir para casa às 17:30, horário que o expediente acabava, para esperar por seu marido, que ela tanto amava. Várias oportunidades foram oferecidas à Catia, pois ela era muito inteligente e sabia trabalhar. No entanto, ela recusou uma a uma, pois via que aquela vida corporativa não lhe pertencia. Catia não gostava daquela hierarquia e buscava mais liberdade. Porém, em uma grande empresa onde se bate cartão na entrada e na saída, onde a hierarquia é respeitada ao máximo, não há muita liberdade. Catia resistia, pois o salário e benefícios eram bons e era um ótimo aprendizado estar em uma grande empresa. Seu primeiro líder foi Romeu, de cerca de 50 anos. Um homem calmo, ponderado e que deixava a equipe muito à vontade para fazer o trabalho da maneira que quisessem. Ele passava as tarefas e dava instruções básicas. O resto era com a equipe. Catia tinha um grande respeito por esse líder. Ele sempre tinha as respostas corretas, orientava, cobrava, mas não ficava controlando coisas pequenas. Ele confiava nela. Ele era o tipo do líder exemplo, chegava no horário, trabalhava, resolvia coisas, era inteligente, gentil. Uma pessoa que impunha respeito de uma forma educada, mas não se envolvia com a equipe. Para aquela


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época, tempo em que “manda quem pode e obedece quem tem juízo”, ele era um líder invejado por muitos na companhia e Catia ficava feliz com isso. Fazia seu trabalho direitinho e sabia que Romeu ficaria satisfeito. No entanto, Romeu teve um problema de saúde e foi substituído por Marcelo, que veio do interior do Estado do Rio Grande do Sul. Marcelo era bem humorado, bem apessoado e entendia muito de seu trabalho. Todos da equipe o adoravam. Ele era divertido, sempre pegava no pé de Catia, pois ela enrubescia sempre que alguém olhasse muito direto para ela. A equipe gostava muito de Marcelo e a equipe gostou muito do clima leve que logo se formou na equipe. Marcelo deixava bem claro que gostava de todos da equipe, mas...... os resultados tinham que ser alcançados. Ou seja, ao mesmo tempo que ele se envolvia com a equipe, brincava, conversava, ele era bastante exigente. Um dia, Catia teve uma discussão com uma colega da equipe. Na verdade foi um bate boca feio mesmo. Ela não sabia como agir e resolveu contar para Marcelo, pois temia que a colega fosse contar do jeito dela e aumentasse tudo. Foi uma situação superinteressante. O Marcelo só ficou olhando para Catia, sem falar nada e ela ia contando tudo. Catia esperava que, ao final, ele lhe dissesse o que fazer, ou que a apoiasse ou dissesse que ela estava errada. Ou seja, esperava alguma opinião. Ao invés disso, ele disse: “Catia, acho que vocês já são bem grandinhas para resolver isso, né?” Imaginem como ficou a Catia. Ela chegou a se sentir ridícula de levar um assunto tão mesquinho ao líder. Mais uma grande lição da liderança do Marcelo, separe o pessoal do profissional, principalmente perante seu líder. Não importa se ele é brincalhão, próximo e se vocês tem um bom relacionamento, você está lá para trabalhar e dar resultado. E é isso que ele quer e não há nada de errado nisso. Depois de um tempo Catia mudou de área, ainda dentro da mesma empresa, e seu líder foi o Pedro. Pedro lhe deu excelentes condições de trabalho. Ela tinha um computador só para ela, o que naquela época era um grande benefício. Também compartilhava uma sala só com mais uma pessoa, com isso tendo mais condições de concentração no seu trabalho. Pedro era um líder bastante diferente dos demais. Ele era fechado e distante e ninguém conseguia desenvolver um relacionamento com ele. A relação era


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só profissional mesmo, líder e liderado. Aquela coisa de passar a tarefa, entregar e pronto. Pedro era homem de poucas palavras, chegava até a ser rude. Pedro não saía de sua sala para falar com os liderados. Quem quisesse falar com ele, tinha que ir à sala dele, pedir para a secretária anunciar e, só então, e caso Pedro quisesse e pudesse, as pessoas tinham acesso a ele. Catia tremia só de pensar que tinha que falar com ele. E Catia ficava mesmo trêmula e vermelha, pois ele exercia uma autoridade sobre ela que não era saudável, era o tipo da autoridade do cargo e não aquela conquistada, como era a autoridade de Romeu e Marcelo. E esse foi um outro enorme aprendizado – os líderes são diferentes e os liderados se adaptam melhor a alguns e não tão bem a outros. E Catia não se adaptava de maneira alguma a Pedro, mas ele era o chefe. Apesar de Pedro valorizar o trabalho da Catia, como de fato valorizava, ela não se sentia à vontade. Acredito que isso se deu por uma característica dela de ter a necessidade de se relacionar, conversar, receber feedback, ter liberdade. Depois de alguns meses Catia pediu para sair da empresa, fato que Pedro aceitou com muito respeito, inclusive terceirizando o serviço que ela fazia com ela mesma, pois ela já tinha o plano de abrir sua própria empresa. Ou seja, talvez, se não fosse o Pedro, Catia não teria se tornado uma empreendedora. Novamente, vejam a influência que um líder pode chegar a ter na vida de uma pessoa!

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Líderes pOdem fazer mAl Capítulo 2

Cristiano trabalhava na administração de uma clínica odontológica. Ele cuidava de toda a administração para que os sócios pudessem se preocupar em atender clientes. Nas últimas semanas Cristiano sentia-se cansado, sem motivação para ir ao trabalho, que ele adorava, estava com frequentes resfriados e totalmente sem energia. Ele se questionava o que estava acontecendo com ele, já que sempre fora extremamente saudável, praticava esportes regularmente, tinha uma alimentação saudável. No entanto, na clínica as coisas não iam bem. O clima entre os sócios estava muito ruim e isso era visível a todos. E Cristiano, como homem de confiança dos sócios, ficava no meio do fogo cruzado. Além de um sócio falar mal do outro para Cristiano, eles não gostavam quando Cristiano resolvia algo com um sócio só, sem falar com o outro, o que sempre havia sido extremamente normal até então. A autonomia que Cristiano tinha agora havia acabado e ele tinha que pedir a palavra final para tudo, até mesmo para coisas pequenas. E quando ia pedir a autorização para algo pequeno, ainda levava uma bronca do tipo: “Por que você vem perguntar isso? Algo tão pequeno.” Mas se não perguntasse, levaria outra bronca do tipo: “Como você resolveu aquilo sem falar comigo?”. Ou seja, Cristiano não sabia mais como trabalhar e sentia-se extremamente agoniado com aquela situação. Ao mesmo tempo, não tinha abertura para se colocar diante dos dois sócios e perguntar como deveria trabalhar, o que seria o mais sensato a fazer. Mas se o fizesse, tinha medo de ser demitido e Cristiano precisava daquele emprego.


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Enfim, assim foram se passando semanas, e cada vez Cristiano mais desmotivado, com menos energia e com mais resfriados e dores no corpo. É isso o que um líder pode causar em sua equipe, deixá-la doente. Portanto, se na sua equipe tem muita gente doente, reflita o que está de fato acontecendo. Os desequilíbrios emocionais são os maiores causadores de doenças que geram atestados. Preste atenção!


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COmo é importAnte estar prÓximo Capítulo 3

Adriana era uma batalhadora. Mulher separada, 31 anos, uma empreendedora nata. Adriana era mãe de Luis Felipe, o amor de sua vida. Ela dividia sua dedicação entre o trabalho e seu filho. Adriana tinha uma escola de música, que era sua paixão. A escola começou pequena e, quando Luis Felipe tinha 3 anos, estava no auge. Foi então que se separou de seu marido e passou a tocar tudo sozinha. A escola tinha uns 300 alunos e ela liderava uma equipe de 20 pessoas. Sua vida se fundia entre o pessoal e o profissional. Não havia uma separação nítida e ela gostava disso. Sua equipe era sua família, amigos, diversão. Era bastante comum algumas pessoas da equipe se unirem nos finais de semana para se divertir sem nem lembrar da escola. Adriana se jogava de cabeça em tudo o que fazia e a equipe sentia isso, o que os motivava muito e fazia com que todos a admirassem. Ela se dedicava à escola e à equipe como ninguém. Dona de um caráter extremamente honesto e correto, ela nunca teve grandes problemas com seus liderados, pois as cartas sempre eram abertas e tudo era combinado previamente. Conduta simples e extremamente benéfica em um ambiente de trabalho – transparência!!!!! As pessoas precisam estar seguras para fazerem um bom trabalho e a maneira melhor e mais rápida de se alcançar isso é sendo transparente. E Adriana era muito transparente. Tão transparente que não deixava nada passar. Ela estava sempre pronta para ajudar as pessoas e dar um feedback assim que necessário. Há muitos líderes cheio de melindres para dar feedback, mas Adriana não era assim. Ela via algo que não estava de acordo com suas instruções ou com os valores da escola, ia imediatamente falar com a pessoa. Sempre com


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gentileza e a sós, mas ela ia direto ao ponto tentar entender o porquê daquele ato não correto e o que poderiam fazer para que aquilo não ocorresse novamente. E assim as coisas iam se resolvendo e a cultura da empresa ia se formando. Teve uma vez, que uma professora, a Monique, foi à escola de minissaia, mini não, microssaia. A Adriana não teve dúvida, chamou-a a sua sala e perguntou: “Monique, não tenho nada a ver com a maneira que você se veste nos finais de semana ou em momentos que não está trabalhando, mas você pensa que está vestida corretamente para trabalhar?”. Monique ficou sem jeito e disse que estava na escola, mas que não iria dar aulas naquele dia. Mesmo assim Adriana lhe falou que, sempre que ela estivesse na escola, dando ou não aulas, ela deveria se vestir apropriadamente, pois os alunos circulam pela escola e a veriam com aquela microssaia e que, dentro da escola, Monique era sempre professora, independente do horário que lá estivesse. Monique concordou, pediu desculpas e nunca mais voltou com microssaias. Veja que a postura da Adriana foi firme, baseada em algo extremamente importante, a reputação e imagem da escola perante os alunos. Ela foi bastante direta com Monique, mas ao mesmo tempo, não foi rude nem grosseira. Tanto que Monique entendeu e concordou. Mas Adriana não era só aquela líder que busca as melhorias. Ela também reconhecia os bons feitos de sua equipe. Tinha um professor, o Luiz, que era adorado por todos na escola, pelos alunos e equipe. Luiz estava sempre de bom humor e pronto para aprender algo. Ele se dedicava aos alunos e isso era perceptível a todos. Em várias ocasiões, Adriana recebeu elogios dos próprios alunos para o Luiz. Ela nunca guardava os elogios para si. Sempre ia ao Luiz e lhe contava o elogio que recebeu, o que o fazia se sentir muito bem e mais motivado ainda para continuar em sua caminhada. Havia um outro professor na escola, o Alexandre, que era ótimo. Alexandre sabia tudo de música e era muito educado e gentil. De tão gentil que era, era pouco exigente com os alunos. No entendimento da Adriana, os professores precisavam dosar gentileza e exigência. Se fossem muito gentis, não provocariam resultados positivos no


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desenvolvimento dos alunos. Se fossem muito exigentes, os alunos iriam se assustar e poderiam desistir. Existia uma fórmula mágica que combinava gentileza e exigência. Bem, Alexandre tinha gentileza de sobra, mas pouca exigência. E foi aí que Adriana, como boa líder educadora que sempre foi, trabalhou. Ela conversava muito com Alexandre sobre seus alunos, lhe perguntava como ele estava corrigindo os alunos, se cobrava treino, o que mais poderia fazer para que seus alunos se desenvolvessem. Enfim, fazia Alexandre pensar em seus atos e, aos poucos, foi fazendo com que ele desenvolvesse um pouco mais a exigência em relação ao desempenho dos alunos. Foi um trabalho de meses, e Adriana não desistiu de Alexandre, pois sabia de seu potencial. É isso que bons líderes fazem, acreditam no potencial de seus liderados e os ajudam a se desenvolver. Em pouco tempo Alexandre tornou-se o melhor professor da escola em termos de resultados e também em popularidade, pois os alunos o adoravam. Ele era o professor legal e que se importava tanto com o desenvolvimento dos alunos, que exigia um pouco mais. Quem não gosta de pessoas que se importam conosco? Adriana conhecia tanto sua equipe que sabia como lidar com cada um. E essa é uma grande característica do líder. O líder sempre terá em sua equipe aquela pessoa mais sensível, que precisa de agrados e de fala mansa, vai ter o cabeça dura, que precisa ser conquistado, vai ter o desmotivado, que precisa de energia extra. E cabe ao líder entender como cada um quer ser tradado, pois só assim ele conseguirá bons resultados no trabalho, além de um ambiente de trabalho extremamente amigável e produtivo. E assim Adriana ia tocando sua escola, acompanhando sua equipe de perto, fazendo um ajuste aqui, outro acolá, mas sempre por perto e dando indicações claras do que estava bom e do que precisava melhorar.

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O líder tAmbém erra Capítulo 4

Carlos era um senhor de 70 anos, de um coração maior que ele, e olha que ele já era meio grandinho. Ele havia vindo da Alemanha, onde participou da segunda guerra mundial. Como todo militar, tinha suas regras bem estabelecidas e gostava de uma vida bem correta, cheia de rotinas, paradigmas, certos e errados. Ele possuía uma pequena pousada na praia de Bombas, em Santa Catarina, onde dividia os trabalhos com Amanda, uma jovem dedicada e trabalhadora. Amanda cuidava de tudo e Carlos só supervisionava e pagava as contas. Carlos era viúvo, seus filhos moravam em Porto Alegre, e a pousada era sua vida. Ele não era o tipo de pessoa que trabalha manualmente no conserto de coisas, no jardim, na limpeza. Afinal, já era aposentado e a pousada era seu hobby. Ele não tinha problemas ou restrições financeiras, mas levava uma vida boa, sem luxos. Carlos gostava de ler e olhar o mar. No entanto, sempre sabia o que estava acontecendo na pousada e dava muito suporte à Amanda, no sentido de gestão mesmo. Amanda era excelente trabalhadora, mas não era boa com números. E isso Carlos gostava. Amanda era ótima com os hóspedes e com as camareiras e garçons. Todos gostavam muito dela e tinham certo “respeito” pelo Sr. Carlos, quase medo mesmo. Carlos era de pouco sorriso com aqueles que ele não conhecia, mas quando as pessoas o conheciam um pouco melhor, entendiam que ele era um doce de pessoa. Carlos gostava muito de Amanda, era quase como uma filha. E a recíproca era verdadeira. Uma relação muito boa, que rompia os limites da relação líder liderado.


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No entanto, um dia de janeiro, com a pousada lotada, Amanda cometeu um erro grave. Ela fez a mesma reserva para dois casais e quando o segundo casal chegou, a pousada estava lotada. Não era comum Amanda errar. Aliás, ela prestava muita atenção em tudo para não errar. E como já dissemos, era caprichosa e dedicada ao trabalho. Aquele erro foi algo fora do comum mesmo. O tipo de erro que, infelizmente, às vezes acontece. O Sr. Carlos foi chamado à recepção e estavam lá Amanda e o casal. Amanda não sabia o que fazer e foi aí que o Sr. Carlos perdeu a cabeça, na frente dos hóspedes. Ele falou, ou melhor, berrou: “Amanda, sua cabeça de vento! Como isso foi acontecer? Você é muito desatenta!” Amanda teve vontade de chorar, mas não chorou, o choro virou raiva do Sr. Carlos. Ela assumiria o erro sem problemas. O que não admitia era ter sido chamada a atenção daquela maneira na frente dos hóspedes. Até os hóspedes ficaram sem jeito. O Sr. Carlos esqueceu completamente das suas próprias regras de respeito para com o próximo ao chamar a atenção da Amanda na frente de outros e, ainda por cima, berrando. Não se faz isso com ninguém, em situação alguma. O líder deve sempre estar controlado emocionalmente, pois erros irão acontecer e para resolvê-los é muito melhor estar com a cabeça fria. No entanto, Amanda levantou a cabeça e perguntou para os hóspedes se eles se incomodariam em ficar em seu próprio quarto, que era um quarto de casal, não tão bom quanto o que eles haviam reservado, mas eles poderiam ficar com o quarto como cortesia, pagando apenas pelo café da manhã. Amanda teve essa iniciativa por sua própria conta e risco e o Sr. Carlos ficou quieto, só olhando, admirando a iniciativa de sua colaboradora. Ele já se dava conta de que tinha sido muito grosseiro com aquela que sempre estava ao seu lado com tanta dedicação. Amanda pediu um tempo para o casal e lhes indicou o banheiro da piscina para eles se trocarem e aproveitarem a piscina ou, até mesmo a praia, enquanto seu quarto ficasse pronto. A situação foi resolvida e quem passou por desequilibrado, foi o Sr. Carlos. Amanda foi então resolver a situação, tirou suas coisas do seu quarto, chamou as camareiras para deixarem o quarto bem lindo. Levou suas coisas para


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o quarto da camareira principal. Ela colocaria um colchão no chão e dormiria com a camareira principal, que ficava no hotel em época de alta estação. Enfim, tudo resolvido com o casal. Mas o Sr. Carlos estava se sentindo muito mal, estava arrependido pelo que havia feito. Ele ia a todo instante perto de Amanda e lhe perguntava se estava tudo bem, se ela precisava de algo. Era a maneira dele de pedir desculpas. Pedir desculpas não é algo fácil, é assumir que errou e que está arrependido. Imaginem então um ex-militar pedir desculpas para uma moça, que poderia ser sua filha. É passar por cima do ego, algo bastante difícil. Mas o Sr. Carlos estava quase fazendo isso. Amanda fingia que não o via. Ela estava muito machucada. Ao mesmo tempo, ela sabia que o Sr. Carlos era um homem do bem, que nunca era rude daquela maneira. Na verdade, ele era um gentleman. Até que, aos poucos, as coisas entre os dois foram melhorando e chegou o dia do Sr. Carlos pedir desculpas a Amanda. Amanda chorou e lhe disse que havia se sentido desrespeitada e ofendida, pois não merecia tamanha bronca descabida. O Sr. Carlos concordou, pediu desculpas e reconheceu que Amanda sempre havia sido uma ótima colaboradora e que não tinha porque ele fazer aquele escândalo. E Amanda compreendeu que líderes também erram. Bem, o relacionamento dos dois não só voltou a ser o que era como ficou ainda melhor, pois sempre após um problema bem resolvido, as coisas melhoram. Mas isso só se deu devido à humildade do Sr. Carlos de pedir desculpas. Infelizmente, nem sempre líderes percebem que são rudes com seus liderados e, nesses casos, a “ferida” fica aberta e o liderado sofre, pois ninguém gosta de ouvir grosseria sem merecer. Em muitos outros casos, o líder percebe sim que foi rude, e nada faz, o que, ao meu ver, é ainda pior.

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Só se cOlhe O QUe se plAnta Capítulo 5

Heloísa era gerente de recursos humanos em uma multinacional que fabricava cintos de segurança na cidade de São Paulo. A empresa tinha 400 funcionários e Heloísa trabalhava lá há 3 anos. Ela tinha a missão de ganhar o título de melhores empresas para trabalhar conferido pela revista Você S/A. Essa meta era muito ousada, já que envolvia toda a empresa. Ela tinha um ano para preparar a empresa para essa premiação. Heloísa era do tipo focada, missão dada significava missão cumprida. Ela era séria, autoritária, extremamente ansiosa e de poucos sorrisos. Obviamente, tudo isso vinha junto a uma grande dose de centralização, pois ela pensava que só ela sabia fazer as coisas bem feitas. Era um verdadeiro trator para trabalhar e o processo de busca pela premiação não poderia estar em melhores mãos. Heloísa tinha que preparar todos da empresa para passar pela auditoria que lhes conferiria o prêmio. Ou seja, um trabalho hercúleo e ela tinha consciência de sua responsabilidade. Tanto que até, por vezes, se achava superior aos seus colegas. Os colaboradores da empresa, em geral, tinham uma imagem dela de mandona e antipática. Ela até queria mudar essa imagem, mas não fazia muito esforço para tal. Estava mesmo preocupada com sua missão, e só. A visão que Heloísa tinha das outras pessoas da empresa era de que eles eram sim importantes, pois iriam afetar o resultado da auditora, ou seja, ela precisava deles. Mas o sentimento parava aí, na necessidade. Afeto ou algo parecido não existiam. Com seu extremo foco e centralização, e por achar que fazia as coisas melhor do que os outros, Heloísa foi se afogando em tanto trabalho. Delegar era algo que ela não sabia fazer. Até tinha uma equipe de 5 pessoas mas delegava


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muito pouco. Suas colaboradoras saíam no horário e Heloísa ficava fazendo horas e mais horas extras. Até alguns sábados ela teve que trabalhar. Esse é um grande erro e, infelizmente, bastante comum na liderança – pensar que só o líder sabe fazer algo e não delegar. Não só o líder se assoberba de trabalho, mas a equipe não se desenvolve nunca, não se sente parte do todo, não se sente desafiada e a motivação e produtividade caem. Enfim, grande armadilha! Heloísa não tinha tempo para conversar com os colegas, para tomar um cafezinho, era extremamente impaciente em reuniões, pois não sabia ouvir e já ia falando e atropelando as discussões. Ela sempre pensava que sua ideia era a melhor. Afinal, ela conhecia a empresa toda melhor do que ninguém, pois tinha que conversar e auxiliar todos da empresa na tarefa de motivar as equipes e para que se sentissem satisfeitas. Além disso tudo, Heloísa tinha uma grande dose de resistência ao diferente e impaciência. E o pior de tudo era que Heloísa não se dava conta do que estava acontecendo ao seu redor. Além dela estar se afastando de todos na empresa, sua saúde começava a ser impactada. Ela não dormia bem, estava sem fazer exercícios porque “não tinha tempo”, se alimentava mal. Ela nunca estava “inteira” em algum lugar, nem mesmo em casa com sua família. Ela era casada e tinha um casal de filhos, um menino de 6 anos e uma menina de 4. Mas assim ela foi levando até conseguir a dita premiação – motivo de grande orgulho para a empresa. Em uma sexta-feira, os auditores da revista Você S/A vieram à empresa anunciar o resultado. Foi elaborada uma grande reunião no auditório, com o Presidente da empresa e todos os gerentes. Heloísa estava sentada ao lado do Presidente. Os auditores começaram então a explicar como era o processo de premiação e, ao final, entregaram o prêmio para o Presidente. Este ficou extremamente feliz, agradeceu a todos em seu discurso, pois a premiação só havia sido recebida devido ao esforço de todos e enfatizou a importância do trabalho de Heloísa para a obtenção do prêmio, que sem ela eles não teriam conseguido, e assim por diante. De princípio, Heloísa ficou satisfeita com as palavras do Presidente, se sentiu


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importante e primordial para a conquista. Ela também recebeu alguns “parabéns” de colegas e foi para casa com a sensação de missão cumprida. Contou ao seu marido tudo o que havia ocorrido e então começou a chorar copiosamente. Ele não entendeu nada. E foi aí que ela lhe disse que esperava que seus colegas de trabalho celebrassem a vitória com ela, que eles a abraçassem, que mostrassem o quanto ela era importante para todos, e assim por diante. Ele a olhou bem nos olhos, ao mesmo tempo que fazia carinho em seu cabelo, e lhe disse: “Helô, como foi o processo? Você deu carinho a eles e fez com que eles se sentissem parte do todo? Você fez o quê para querer receber essa alegria de volta? Pois eu te conheço e sei que quando você tem algo a fazer, você faz. E isso é fantástico. Porém, você não olha para os lados.” Heloísa não teve argumentos, pois naquele exato momento, teve um dos maiores aprendizados de sua vida. Seu marido, com tanto carinho, lhe disse a verdade mais nua e crua que ela poderia ouvir. Ela concordou com ele e ficou ali, em seu abraço, chorando e pensando que dependia dela ser diferente a partir de segunda-feira. Nós não podemos esperar algo que não oferecemos. Essa frase pode ser clichê, mas é a mais pura realidade. Não espere amor se você não dá, não espere compreensão se você não compreende, não espere alegria se você não é alegre. Todos nós só colheremos o que plantarmos e, obviamente, não seria diferente na liderança. Cada líder tem a equipe que merece e a equipe tem a cara do líder. Se há algo que você não gosta ou não aprova em sua equipe, analise-se primeiro para só então tomar alguma atitude. Deve haver algo que você deveria ter feito ou não deveria ter feito.

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InversãO de pApéis – Que mAravilhA! Capítulo 6

Francisco era presidente da fabricante de cosméticos AltaEstima, líder em vendas no Brasil. Estava na empresa há 23 anos e conhecia todos e tudo. Ele começou na empresa como auxiliar administrativo, depois se formou em logística e foi galgando seu espaço. Fez pós-graduação em administração, estudava muito, falava inglês e espanhol, participava de congressos e seminários nacionais e internacionais. Era uma pessoa altamente preparada. Além de conhecimentos técnicos, Francisco nunca deixara de lado seu desenvolvimento pessoal. Ele investia em cursos comportamentais, de liderança, Coaching, pois sabia que um bom líder, além de conhecimentos técnicos, precisa entender de gente e de como lidar com gente. Francisco adorava seu trabalho e sua equipe. A empresa tinha 2.000 funcionários e em sua diretoria, que eram aqueles que se reportavam diretamente a ele, havia 8 diretores. Cinco diretores homens e três mulheres. Ele queria mais mulheres em sua diretoria, pois acreditava que o equilíbrio homem mulher é o que funciona. No entanto, nem todas as mulheres estavam preparadas para a rotina da diretoria. Os diretores de Francisco trabalhavam muito, eram muito dedicados e viviam a empresa. Eles eram bem recompensados para isso e se sentiam satisfeitos. Trabalhar com Francisco era fácil. Ele era exigente, portanto o trabalho tinha que ser bem feito e os resultados tinham que ser entregues. Ao mesmo tempo, Francisco era compreensivo e amigo, aberto às ideias de seus diretores e exigia o mesmo comportamento dos diretores para com seus gerentes e assim por diante. Ou seja, era uma empresa aberta e inovadora, pois esse é o clima da inovação – abertura. Dificilmente Francisco tomava alguma decisão importante sem consultar sua diretoria.


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Era o ano de 2015 e a empresa estava em crise, assim como todo o país. Francisco estava decidido, tinha que cortar gastos, teria que fazer algumas demissões e fechar a unidade do sul do país. Havia passado dias e noites pensando o que fazer e chegara a essa alternativa. O que motivara essa decisão? Em épocas assim ou você se retrai ou acelera e ele havia escolhido a primeira opção, pois além de ser mais fácil e de curto prazo, os resultados viriam mais rapidamente. Foi então que convocou sua diretoria para colocar o assunto em discussão: a crise e o que fazer. No entanto, ele já tinha a solução. Deixou a diretoria discutir um pouco e disse: “Eis o que vamos fazer: demitir 5% de nossos colaboradores e fechar a unidade do sul do país.” Todos ficaram perplexos, pois Francisco nunca tomava decisões tão drásticas sozinho, tão pouco era do tipo de pessoa de optar pelo caminho mais fácil, que é o que aquela decisão lhes parecia. Francisco lançou a ideia e pôde ver a feição de seus diretores. Era uma feição de decepção, decepção no líder, de desânimo. Foi como se alguém houvesse “desligado a luz”. Francisco então ficou sem saber o que fazer, pois havia pensado em tudo e aquela era a melhor decisão a se tomar e agora via na cara de sua diretoria que eles não aprovavam. Como o clima na diretoria era de muita abertura, um diretor depois do outro colocou suas opiniões. E elas eram do tipo: “Francisco, esse é o caminho mais fácil, mas veja o impacto a médio e curto prazo.”; “Não podemos demitir os colaboradores que estiveram lutando conosco durante toda essa crise, essa decisão nem combina com nossa empresa, com nossos valores.”; “Deve haver outra saída mais criativa”; “Por que fechar a unidade do Sul? Ela se paga e garante nossa presença no sul do País, inclusive contribuindo para nosso marketing como um todo.” E assim por diante a reunião foi indo, até que em um dado momento, uma diretora falou: “Francisco, estamos com você sempre e essa sua decisão é baseada no medo da crise, nós não podemos ter medo da crise e sim temos que lutar contra ela, mas não nos retraindo. Estamos juntos nessa, mas não aceitamos essa sua sugestão. Mil perdões, sei que você é o Presidente da empresa, mas não posso aceitar essa sugestão.” As palavras dela foram tão fortes que Francisco entendeu que estava sendo


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acuado pelo medo e que, a médio prazo, iria se arrepender. Afinal, um profissional de seu gabarito, com uma diretoria de tão alto nível, teria que encontrar outra solução do que a guiada pelo medo. Francisco concordou com todos e com a diretora, agradeceu o fato de todos terem se mostrado tão “juntos” a ele e rapidamente mudou a estratégia da reunião. Agora era uma reunião de brainstorming para colher ideias para sair da crise, ideias criativas e inovadoras, que seriam boas não somente no curto prazo, mas principalmente no médio e longo prazo. Às vezes, os papéis se invertem e o líder vira liderado. E isso só ocorre em um ambiente amigável e transparente. O líder que cultiva esse tipo de ambiente só pode colher frutos bons, como comprometimento e engajamento.

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E O timing? Capítulo 7

Hélio tinha 39 anos e liderava a equipe de pesquisa e desenvolvimento de uma fabricante de corantes e aromatizantes. Ele era casado, pai de duas filhas e extremamente religioso. Sua vida inteira tinha sido na mesma cidade onde nascera, Joanópolis, no interior do Estado de São Paulo. Hélio era formado pela faculdade local em farmácia, mas após muito estudo e muita dedicação à empresa de corantes, havia galgado a posição de coordenador de pesquisa e desenvolvimento. Hélio acordava cedo todos os dias, levava seu cão para passear, tomava banho, tomava café e ia trabalhar. Sua esposa cuidava das filhas e as levava à escola. Hélio almoçava na empresa para não perder tempo e às 17:30, no final do expediente, ia para a casa ficar com sua família. Aos finais de semana a família ia à igreja, visitava os avós maternos e paternos e saía para tomar sorvete ou comer uma pizza. Na empresa, Hélio liderava 4 rapazes e 2 moças, todos jovens entre 20 e 30 anos, estudiosos, alguns de Joanópolis e outros de cidades vizinhas, que haviam vindo para a cidade em busca de oportunidade. Hélio era um líder bastante justo, nunca beneficiando um em detrimento de outro. As coisas tinham que ser corretas para Hélio. Ele tinha traços bastante conservadores e, portanto, era um pouco centralizador. As decisões da área tinham sempre que passar por ele que, como primeira reação, sempre questionava muito. Hélio era um tanto resistente ao novo e a sair da zona de conforto. Sempre pensava no que poderia dar errado quando lhe era apresentada uma nova ideia. E então pedia um tempo para pensar naquela sugestão, nova ideia ou inovação. E esse era o problema, tudo tinha que passar pela aprovação de Hélio e tudo


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demorava muito. A equipe ficava tamborilando os dedos esperando a resposta. Às vezes, iam lá e cobravam um retorno e ouviam: “Ainda estou ponderando o impacto de sua ideia.” Hélio não tinha ideia de quão lento era em suas decisões, pois não era cobrado de maior rapidez. A empresa como um todo era bastante conservadora e produzia os mesmos corantes e aromatizantes há muitos anos, com pouquíssimas alterações. Sua equipe, no entanto, urgia por maior rapidez, mas ao mesmo tempo, nada podiam fazer. Quem era novo na empresa se revoltava e ficava ansioso, bravo, mas com o passar do tempo, todos iam se acostumando àquele ritmo e resistência ao novo, e nem mais criavam muito. Ficavam lá, pois ao final do mês, seu salário estaria garantido. O líder que demora demais para tomar decisões gera um clima de pasmaceira que vai contagiando toda a equipe e, aos poucos, as outras áreas da empresa, pois eles também são indiretamente afetados. Vira um departamento fantasma, lento, sem brilho.


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AtravessAndO O cAminho Capítulo 8

Sérgio tinha 47 anos e era o diretor geral de uma empresa de porte médio, fabricante de tecidos para exportação. A empresa tinha 150 funcionários e estava no mercado há 15 anos. Exportava tecidos para os Estados Unidos, Europa e África. Sérgio nasceu no interior do estado de Santa Catarina, em uma família humilde, que plantava e criava animais para sobreviver. De vez em quando, vendiam algumas batatas, mandioca, frutas para ganhar um dinheirinho extra. Ele cresceu até seus 13 anos ajudando o Pai, juntamente com seu irmão mais velho, trabalhando na roça. A família de Sérgio tinha valores bem definidos e muito fortes: trabalhar duro para a sobrevivência, a família estar sempre junta e um cuidar do outro. E assim iam vivendo felizes. Não havia espaço para preocupações menos concretas como estudar, ler, lazer. E Sérgio, quando criança, sentia falta disso. Aos 13 anos, tendo estudado somente a educação básica na escolinha local, ele conversava com o pai enquanto cuidavam da lavoura de batatas. “Pai, eu gostaria de estudar.”, disse Sérgio. Quando seu pai ouviu isso, quase caiu para trás. Como assim? Ele pensou. Não havia escola por perto e, além do mais, que ideia mais absurda. Em sua família a vida sempre havia sido daquele jeito. Porque agora o Sérgio ia querer inventar moda? Bem, o assunto virou pauta das refeições pelas duas semanas seguintes. O pai achava uma loucura, a mãe era submissa e concordava com o pai, mas o irmão mais velho compreendia e apoiava Sérgio, para sua sorte. O irmão mais velho, na época com 18 anos, era mais pacato do que o caçula e estava satisfeito com aquela vida. Tinha alguns amigos no vilarejo, uma menina com quem saía de vez em quando e assim ia levando a vida. Mas ele entendia que o irmão


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era diferente. Sérgio tinha uma inquietação que era só dele. Começaram então a verificar as possibilidades e o Pai de Sérgio encontrou uma solução. Na cidade grande mais próxima, Rio Negrinho, havia uma escola onde Sérgio poderia estudar pelas manhãs e trabalhar a tarde para pagar sua pensão e alimentação. O Pai propôs isso a Sérgio e ele de pronto aceitou e saiu saltitando e cantando “eu vou estudar!”. Então, aos 13 anos, Sérgio se mudou sozinho para Rio Negrinho e começou sua vida quase de adulto. Estudava pelas manhãs na 5ª série, trabalhava em uma loja de material de construção a tarde separando produtos e à noite ia para a pensão estudar para as provas. Ele estava feliz. A partir daí, a vida de Sérgio foi sempre assim, de muita batalha. Mas ele se formou em administração, fez pós-graduação em gestão de processos, e agora administrava essa empresa que era sua maior realização. Como sempre teve que ser muito focado e obstinado, Sérgio esqueceu que tinha que desenvolver suas habilidades interpessoais, que precisava conversar com as pessoas, ouví-las. Ele era do tipo “eu é que mando, tem que ser feito vamos fazer”. E era assim em casa também. Ele casou-se com Camila e tiveram duas filhas, a Tábata e a Samanta. No meio de três mulheres, era ele quem ditava as regras. Eles não se apegavam a futilidades e não gastavam com besteiras, tudo tinha que fazer sentido e ter uma razão. Na empresa Sérgio tinha 3 gerentes, um comercial/exportação, um administrativo/financeiro e um de produção. No entanto, Sérgio sabia de tudo o que acontecia em cada área, até os mínimos detalhes. Às vezes, sabia mais que os próprios gerentes. Sérgio chegava à empresa às 7 da manhã e só saía por volta das 19. Ou seja, mesmo tendo 3 gerentes capacitados e experientes em suas funções, ele tinha que saber de tudo, estar no controle. Sérgio ficava muito bravo quando os gerentes resolviam algo sem sua aprovação. Tudo tinha que passar por ele. Ele não se dava conta, mas além de ter que trabalhar tantas longas horas, esse seu comportamento de desconfiança gerava desmotivação em seus gerentes, que se sentiam incapazes e sem autonomia. Era claro para os subordinados dos gerentes que eles não manda-


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vam nada, pois para tudo tinham que pedir a bênção de Sérgio. Um belo dia, Sérgio estava tomando um café na copa, no meio da manhã, quando um subordinado do gerente de produção entrou também para tomar café. Eles começaram a conversar e o funcionário estava muito nervoso. Sérgio notou e perguntou o porquê daquele nervosismo. Foi aí que o funcionário desabou a história toda. Ele disse que havia discutido com um colega por que o colega chegava atrasado e por isso o trabalho dos dois ficava sempre acumulado e, por conta disso, ganhavam broncas e mais broncas do gerente e que isso não estava certo, pois ele era um funcionário exemplar e estava sofrendo as consequências do trabalho ruim do colega e que, naquele dia, havia finalmente discutido com o colega e falado tudo para ele. Sérgio não hesitou e mandou chamar os dois em sua sala. Colocou-os frente a frente para conversar e deixou bem claro que jamais queria que uma discussão como aquela se repetisse por duas razões: a primeira é que a empresa não é local para discussões e a segunda é por que ou o funcionário iria começar a chegar no horário e cumprir suas funções, ou iria para a rua. Sérgio fez tudo isso sem chamar o gerente de produção, que ficou sabendo o que aconteceu por um terceiro funcionário que havia visto os outros dois “subindo” para a sala do Sérgio, e o avisou. O gerente de produção sentiu-se traído, deixado de lado, humilhado. Sentiu que sua autoridade havia sido retirada e foi direto à sala de Sérgio. Chegando lá lhe perguntou o que havia acontecido com os seus dois funcionários e Sérgio falou: “Você tem que cuidar melhor da sua equipe! Se não sou eu, você iria ter um problema muito maior. Hoje eles discutiram de boca, mas sabe lá se isso não poderia virar uma briga física. Acho que você não está fazendo um bom trabalho, pois não está conseguindo controlar sua equipe.” O gerente sabia que Sérgio iria falar algo assim, pois era sempre assim. Aquela não era a única vez. Sérgio achava que os gerentes tinham que ter chicotes para “tocar” suas equipes. Ele não compreendia que os gerentes acompanhavam, mas de outra maneira, sem dar broncas e fazer ameaças. O gerente de produção se sentia extremamente desmotivado, sua vontade era a de pedir demissão. Mas não podia, tinha esposa e filha que dependiam


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dele. O que ele fez? Nada. Respirou, engoliu em seco e continuou tocando sua rotina sem a mínima vontade de trabalhar naquela empresa. Mas, era o que estava acostumado e o que sabia fazer e foi assim, levando. O Sérgio não se dava conta que com aquelas atitudes baseadas em ameaça, não só desmotivava sua equipe, pois eles não podiam usar suas competências e trabalhar do jeito que queriam, mas a empresa perdia, e muito. Pois em uma empresa onde a liderança não é motivada e sim desconfiada, o resultado é afetado diretamente, e não para o bem, mas para o mal.


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A preferida Capítulo 9

Tereza morava em um sítio no interior de São Paulo, onde cultivava verduras orgânicas. Ela optara por essa vida quando, aos 45 anos, descobriu um problema no coração e associou-o ao stress da vida na capital paulista. Vendeu tudo e foi para o interior. Era separada e já com duas filhas encaminhadas na vida, resolveu vender o apartamento e comprar um sítio. Vivia só e tinha 5 funcionários que a ajudavam com o cultivo dos orgânicos. Tereza havia tido uma carreira em instituições bancárias, onde aprendera de tudo. Foi desde caixa até gerente de agência. Ela tinha muita responsabilidade e conhecia tudo sobre bancos. Ela também era do tipo de pessoa que sabe de tudo o que ocorre em sua agência, estava sempre “com o radar ligado”. Gostava de tudo ao seu jeito e cobrava isso de seus colaboradores nos vários bancos que trabalhara. Mas agora as coisas estavam mais calmas. Acordava por volta das 7.30, tomava seu café com muita calma, se atualizando das notícias pela TV e internet e então ia para seus orgânicos. Lá chegando, conversava com um, checava alguma coisa aqui, outra ali, ia dando ordens, sanando dúvidas, fazia alguns telefonemas para seus clientes para combinar as entregas, preços e prazos e assim iam passando seus dias. Havia uma colaboradora, a Rosa, que estava com Tereza há 3 anos. Rosa tinha 20 anos e adorava Tereza. Tereza também adorava Rosa, as duas se davam muito bem e se compreendiam muito bem. O problema é que Rosa não gostava muito de trabalhar, era um tanto preguiçosa e Tereza notava. Por vezes Tereza fazia vista grossa e por outras cobrava um pouco o seu trabalho, mas nem tanto assim. O problema é que os outros 4 funcionários viam aquilo


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e se sentiam injustiçados. Afinal, eles trabalhavam arduamente e Tereza os cobrava muito, mas a “protegidinha” sempre tinha alguns benefícios. Sabendo disso, Rosa usufruía da relação que tinha com Tereza. Rosa chegava atrasada, constantemente tinha algum problema familiar e não vinha trabalhar, demorava no almoço. Enfim, adorava cabular trabalho. E Tereza não sabia o que fazer, pois adorava Rosa e não queria estragar aquela relação. Tereza havia conversado com Rosa algumas vezes, pedindo-lhe para não abusar. Rosa se desculpava, dizia que iria melhorar e recebia aquela conversa com muito apreço. As coisas melhoravam por uma semana, mas depois voltavam ao que era. Rosa tinha um poder sobre Tereza, que nem a própria Tereza compreendia. Rosa morava com seus pais perto do sítio de Tereza, tinha mais dois irmãos mais novos. Seu pai trabalhava em uma lavoura de laranja e sua mãe era dona de casa. Era uma família simples e nada lhes faltava. Ela queria mesmo saber era do namorado Tiago, seu vizinho, com quem passava horas e horas depois do trabalho e aos finais de semana. Tereza sabia que Rosa abusava, mas ao mesmo tempo, não dava bola para isso, pois gostava dela e os trabalhos como um todo no sítio estavam indo bem, estava tendo bons resultados com seus orgânicos. O sentimento de injustiça e de favoritismo de Tereza por Rosa só aumentava nos outros quatro funcionários. Eles já nem conversavam direito com Rosa, o que ela nem se importava. Eles precisavam daquele emprego, mas estavam ficando cansados daquela situação. Conversavam entre si, reclamavam uns para os outros e isso, aos poucos, estava afetando a produtividade. Tereza havia notado que a produtividade dos orgânicos caíra e chamou os cinco colaboradores para uma conversa para tentar entender o que estava acontecendo. Ela lhes perguntou o que estava acontecendo e eles ficaram calados, pois não poderiam falar para ela que o que os estava incomodando era a Rosa. Rosa fazia cara de que aquele assunto “nem era com ela”. Tereza pediu mais empenho de todos, enfatizou as metas, prazos, etc e se deu por satisfeita com a reunião. Até que um dia, quando Rosa faltou ao trabalho, Ademar, que era o funcionário com mais tempo no sítio, tomou coragem e foi falar com Tereza. Ele


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lhe disse que o que estava acontecendo era exatamente aquilo: “Rosa falta e a gente tem que trabalhar dobrado, pois o serviço não espera. E isso acontece quase todas as semanas. Nós não aguentamos mais. E parece que a senhora não vê isso. Para nós é uma injustiça o que está acontecendo.” Bastou aquela conversa curta para que Tereza entendesse perfeitamente o que estava ocorrendo e colocasse as mãos na consciência, pois ela já sabia dessa situação. E foi então que teria que tomar uma decisão: ficar ou não com Rosa. O que perderia demitindo-a? Em termos de resultado, não muito. Em termos emocionais, perderia sua protegida, a menina que cuidava e que gostava tanto. O que perderia mantendo-a ali? Provavelmente, aos poucos, os outros quatro pediriam a demissão e isso afetaria o resultado de seu negócio. Além de tudo isso, havia o fato de que Tereza gostava de todos os seus funcionários e lhes devia respeito, pois graças a eles, seu negócio prosperava. E ainda havia mais um pensamento a ser feito: será que Rosa poderia mudar? Essa era a esperança de Tereza. Mas, ao mesmo tempo, Tereza lembrou de quantas conversas nesse sentido elas haviam tido e do pouco resultado. Foi uma decisão difícil a ser tomada, mas Tereza resolveu demitir Rosa. Fez isso com o coração em pedaços, lhe remunerou com todos os direitos e lhe disse que aprendesse com aquilo, pois em outro emprego, talvez o líder não teria tido tanta paciência. Também deixou claro que queria muito continuar a amizade e que não havia nada de pessoal naquela demissão. Rosa ficou até feliz, pois com o dinheiro da rescisão iria comprar uma moto, o que queria há muito tempo. Os outros quatro funcionários ficaram satisfeitos e entenderam que podiam contar com Tereza, que ela estava ao lado daqueles que trabalham e dão duro. É engodo dizer que o líder não tem seus ou suas preferidos/as, mas o que o líder não pode perder de vista é o foco em resultados e a justiça. O importante é focar nos resultados e importar-se com a equipe, mas nunca ao ponto de proteger uns em detrimento de outros.

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CAdê a AUTOridade? Capítulo 10

Luiz tinha somente um funcionário em sua sapataria. A sapataria era um negócio de família e já estava na terceira geração. Era aquele tipo de negócio que passa de pai para filho e que a vizinhança inteira conhece e é fiel ao negócio. Luiz nunca necessitara de mais um ajudante, mas agora, os negócios tinham aumentado e Luiz resolvera contratar Mário. Mário era do signo de escorpião, de personalidade forte. Não desistia facilmente de suas opiniões, chegando até a ser um pouco cabeça dura em alguns momentos. Não importava com quem estava falando, pois se tinha uma opinião, defendia-a até o final. Às vezes até com os clientes ele discordava. Eles reclamavam de algum serviço e Mário dizia que estava bem feito e os clientes saíam de cara feia. Luiz não gostava desse temperamento de Mário, mas ao mesmo tempo, ele era ótimo sapateiro. Costurava solas e arrumava saltos como ninguém. No entanto, precisava de ajuste no relacionamento com os clientes. Luiz, por sua vez, era do tipo acomodado. Não que não quisesse trabalhar, pois trabalhava bastante, mas do tipo pacato, que estava satisfeito com a sapataria pois conseguia pagar as contas de sua família em dia, tomar sua cervejinha ao final do expediente e, às vezes, ir para a praia no final de semana com sua esposa e o filho. Gostava de sua vidinha. Luiz odiava desentendimentos, sorria muito, era simpático com todos, tanto no trabalho como em casa com a família e amigos. Ele preferia ser feliz a ter razão e lutava por sua felicidade e paz de espírito. Mário continuava sendo pouco simpático com os clientes e os clientes reclamavam para Luiz, pois estavam acostumados com o Luiz, com seu pai e com seu avô, que eram todos extremamente simpáticos. Mas Luiz não sabia como


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conversar com Mário sobre aquilo. Ele rodeava, rodeava e nunca conseguia ir direto ao ponto. Ele chegava a perder o sono pensando em como iria abordar o assunto com Mário. Conversava muito com a esposa que lhe dizia para falar com o Mário e pronto. Ela era bastante direta. Mas para Luiz, ter aquela conversa seria um grande feito. Ele tinha medo da reação do Mário, não queria de maneira alguma machucá-lo, achava que iria perdê-lo, que não iria conseguir conversar. E Mário continuava com suas caras fechadas e poucos sorrisos com os clientes. A sapataria era reconhecida por duas características principais: pela qualidade dos serviços e simpatia no atendimento; premissas importantíssimas para que continuasse progredindo e ser repassada ao filho de Luiz. Luiz não podia deixar que um funcionário estragasse uma das duas principais características de seu negócio. O líder nunca deve abrir mão do que é importante para seu negócio, nem que isso lhe traga problemas e trabalho extra. O foco da liderança tem que sempre estar no negócio e em seu resultado. A equipe está lá para auxiliar a chegar ao resultado e não para atrapalhar. É claro que os resultados podem e devem ser alcançados através de um bom trabalho em equipe, bom relacionamento e respeito. Mas é aí que muitos líderes se perdem e ficam muito emocionais, dando muita atenção às pessoas e pouca atenção aos resultados. O equilíbrio é o que vale. O que não se pode deixar acontecer é que os resultados sejam afetados em prol de liderados que não se encaixam no perfil da empresa ou, até mesmo, não estão com vontade de trabalhar. Liderar é decidir. Não há pior característica em um líder do que aquela de não resolver e protelar decisões que impactam no negócio. Luiz ficou uma semana remoendo as reclamações dos clientes e o comportamento de Mário até que, em uma sexta-feira pela manhã chamou Mário e o despediu. Disse-lhe simplesmente que “não dava mais”. Mário não entendeu nada, xingou Luiz e se sentiu desorientado. Afinal, nunca havia recebido um feedback de correção para saber que algo não estava bem. Ficou se perguntando por que Luiz havia o demitido. Mário não se dava conta que era um


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pouco rude com os clientes, ele sempre fora daquele jeito e nunca Luiz havia lhe dito para mudar. Como ele poderia saber? Por isso não estava entendendo a demissão. Ele era um ótimo sapateiro, costurava solas e consertava saltos como ninguém, e agora havia sido demitido de uma hora para outra. Luiz levou mais umas duas semanas para se recuperar e entendeu que havia sido um péssimo líder, pois deveria ter alertado Mário que não estava contente com seu comportamento e lhe dado uma chance. Só não o fez por falta de atitude e coragem. Não é à toa que Mário não entendeu sua demissão. Luiz entendeu a importância de falar ao liderado o que está achando de seu trabalho, só assim ele poderia um dia ter um funcionário que trabalhasse do jeito que a sapataria exigia – com qualidade E simpatia. Foi então que Luiz resolveu chamar Mário para esclarecer o “porquê” da demissão. Quando Mário entendeu que o problema era sua pouca simpatia, já era tarde demais e, com seu gênio explosivo, falou poucas e boas para o Luiz e lhe disse que nunca mais o procurasse. A conversa não foi fácil para Luiz mas ele se sentiu aliviado de, pelo menos, ter esclarecido a situação. Infelizmente, há muitos líderes sem coragem de conversar abertamente com os liderados e os prejuízos são altíssimos, seja no âmbito do resultado do negócio, seja no âmbito do respeito ao liderado. Os liderados precisam saber como estão indo. É uma condição sine qua non para a motivação e para o desenvolvimento. Como irão melhorar se ninguém lhes diz nada? E, por outro lado, como irão continuar a fazer o que fazem, se ninguém lhes diz que o trabalho está bom?

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CAos nA LiderAnça Capítulo 11

A fabricante de material escolar, Ocram Materiais Escolares, que tinha tido muito sucesso nas décadas de 80, 90 e no início dos anos 2000, estava enfrentando uma situação um tanto complicada. Seus sócios haviam brigado, pois um havia gastado, pessoalmente, muito mais do que deveria, enquanto o outro não acompanhava a gestão da empresa e, quando se deu conta, a empresa estava em uma situação financeira bastante delicada. Foi então que, aquele que nunca controlara nada, tomou o controle da empresa e expulsou o sócio gastador. Seu nome era Gabriel. Gabriel mandou o outro sócio embora e assumiu a empresa. No entanto, ele não entendia do mercado de material escolar, tão pouco de gestão e liderança, pois Gabriel era sócio investidor. Mas conforme seu próprio juízo, estava fazendo a coisa certa. Não podia era deixar a Ocram ir por água abaixo. Gabriel inclusive teve de mudar de cidade para administrar a empresa, pois morava em uma casa em frente à praia no litoral paulista e agora teve que ir morar em Campinas para administrar a empresa. Gabriel era o tipo bon vivant, separado duas vezes, 2 filhos em cada casamento. O que ele gostava era de passar seus finais de semana em sua casa na praia, ocasião na qual convidava muitos amigos, bebiam muito, dançavam, praticavam esportes náuticos. Enfim, uma vida repleta de prazeres e lazer. No entanto, agora tinha que enfrentar essa responsabilidade para que “sua fonte não secasse”, como ele mesmo dizia. O outro sócio havia desviado bastante dinheiro da empresa e agora Gabriel tinha que salvá-la. Gabriel tinha o hábito de convidar seus amigos de confiança para trabalhar na empresa. Uma prática que pode ser boa, mas só confiança não garante resultados. Então vamos ver algumas das figuras que trabalhavam na empresa.


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Cecília era líder da contabilidade. Ela foi contratada quando Gabriel assumiu a empresa. Era um cargo importantíssimo, pois fornecia dados extremamente relevantes para o processo da recuperação da empresa. Cecília era amiga de Gabriel e sempre estava em suas festas na praia aos finais de semana. Como estava desempregada há mais de seis meses, Gabriel resolveu dar-lhe essa oportunidade. Cecília era uma mulher bonita, de 26 anos e solteira. Era morena de olhos verdes e cabelos compridos. Tinha um corpo perfeito e sabia bem disso. Conquistadora, adorava provocar os homens com gestos, falas e roupas, ou melhor, poucas roupas. Por vezes, ela esquecia de seu cargo e vestia-se como se estivesse indo às festas de Gabriel. Aliás, por muitas vezes. Ela usava vestidos coladíssimos ao corpo, mas tão colados que se podia ver o lacinho da calcinha. Suas costas estavam frequentemente à mostra, os decotes eram generosos e o comprimento da saia era sempre muito curto. Os homens babavam e comentavam dela, da roupa, do corpão. E, com isso, ninguém a levava a sério apesar dela fazer um belo trabalho na empresa. O líder tem de cuidar de sua aparência, de suas roupas, sapatos, de suas unhas, cabelos, barba. Não estamos aqui falando de usar roupas caras ou extremamente formais, mas simplesmente de estar adequado ao ambiente. Todos na empresa estão o tempo todo, de olho no líder, em suas roupas, suas atitudes e comportamentos. Ser líder é ser exemplo. Havia também o Sr. Heiltor, consultor financeiro, que morava em São Paulo e passava 3 dias por semana na empresa. O Sr. Heitor tinha 66 anos e era homem de extrema confiança de Gabriel. Gabriel dizia que sair daquela situação estava nas mãos do Sr. Heitor. No entanto, o Sr. Heitor já havia trabalhado em duas outras empresas que haviam falido. Ninguém entendia muito bem isso, mas respeitavam. Afinal, não havia o que fazer a não ser aceitar o Sr. Heitor. O Sr. Heitor era uma pessoa caricata. Ele sempre vestia calças sociais cinza claro, camisa polo para fora da calça e sapatênis. Esse era o figurino dele. Ele era baixinho e barrigudo, um pouco calvo no cocuruto da cabeça e um bigode bem farto. Andava como um velhinho, balançando para o lado onde a perna pisava, ia de lá para cá, da direita para a esquerda e para a direita e assim ia.


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A mesa do Sr. Heitor era no meio de uma sala grande com várias outras pessoas e, frequentemente, ele chegava ao escritório, pegava o lixeiro debaixo de sua mesa e o colocava entre suas pernas. Depois disso, pegava o cortador de unhas que estava sempre em sua primeira gaveta e “cleck, cleck, cleck” cortava as unhas sem qualquer cerimônia. As pessoas se entreolhavam e davam risadinhas, mas já estavam acostumadas com aquilo. Houve um episódio com o Sr. Heitor. Após uma festa de confraternização de final de ano, ele chegou para trabalhar no dia seguinte, totalmente embriagado. Não conseguia sentar direito, ficava trocando as pernas e cochilando o dia todo. A festa tinha sido em um buffet chiquérrimo de Campinas e tinha acabado por volta de meia noite e meia. Mas não para o Sr. Heitor. Ele e seu subordinado emendaram a noite em um prostíbulo, o que ele fez questão de contar a todos no dia seguinte, e saíram de lá às 5 da manhã, com tempo somente de ir para o hotel, tomar um banho, um café forte e ir trabalhar. Ele ainda se gabava do fato de estar ali, “trabalhando”. Um dia, o Sr. Heitor machucou o pé e foi trabalhar de pantufas. Como se não bastasse o ridículo daquilo, quando Gabriel chegou à empresa, levou um banquinho especial para que o Sr. Heitor colocasse o pé em cima. Ou seja, o Sr. Heitor era respeitado demasiadamente para o que fazia. Até porque ninguém o via trabalhar e resolver coisas sérias mesmo. A relação dele com Gabriel era muito estranha. Gabriel o paparicava e dizia: “O Sr. Heitor é uma figura mesmo”. E aceitava tudo de estranho e de não profissional que ele fazia. Havia também o gerente financeiro, Mateus, também amigo de longa data de Gabriel. Mateus tinha 24 anos e esse era o segundo emprego de sua vida. Formado em administração pela Faculdade Getúlio Vargas de São Paulo e fluente em inglês, tinha alto conceito de si mesmo, ou melhor, “se achava”. Era do tipo que precisava de espaço extra para seu ego. Frequentemente ele tinha que contatar uma empresa de fomento em São Paulo e falava diretamente com o diretor. Mas não tinha a menor postura para fazê-lo. Ligava e dizia: “E aí tio Paulo, tem dinheiro aí para nós?” O deboche era tanto que quem estava próximo a ele ficava boquiaberto e envergonhado.


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Mateus era arrogante com todos. Sua secretária, a Marta, era a que mais sofria, pois ele nunca pedia nada a ela e sim ordenava e, muitas vezes, aos berros. Ele queria sempre tudo com muita pressa, pois não sabia esperar, mal falava bom dia para as pessoas e usava dos benefícios da empresa em causa própria como, por exemplo, o motorista da empresa que levava seus ternos para a lavanderia. Todos odiavam Mateus, pois sabiam que ele só estava naquele cargo, recebendo um salário generoso, por que era amigo de Gabriel, pois competência ele não tinha. Esse “modelo de gestão” de Gabriel, de trazer Mateus, Sr. Heitor e Cecília para cargos importantes na empresa não era aprovado pelos colaboradores. Na realidade, os colaboradores sentiam-se muito mal perante aquela injustiça de pessoas despreparadas, ganhando bons salários e não entregando resultados para a empresa. Alguns colaboradores da empresa tinham vergonha de dizer que trabalhavam naquela empresa, mas não pediam a demissão, pois precisavam do emprego. Eles viam tudo o que acontecia e compreendiam toda a injustiça e bagunça que estava a empresa. Poucos acreditavam na recuperação da empresa, mas estavam lá enquanto recebiam seus salários. A posição de liderança requer muita responsabilidade e sensatez. O líder é uma pessoa comum como qualquer outra no sentido que brinca, erra, é humano. No entanto, a postura de um líder tem que ser muito bem cuidada. O líder é um exemplo e quando a equipe tem maus exemplos, é o início de uma crise muito maior que pode se instalar na empresa. Uma crise de não identidade com a empresa, uma crise de improdutividade, desmotivação e vergonha. E isso tudo só leva a um caminho, o caminho de poucos resultados significativos, além de fazer muito mal às pessoas que algum dia acreditavam no propósito da empresa.


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Não sei pOrQUe fui demitidO! Capítulo 12

Artur trabalhava no gate (portão) de um terminal portuário. Era responsável por deixar entrar e sair os caminhões, tarefa essa que não é tão fácil, pois há muitos procedimentos envolvidos, já que se trata de cargas entrando e saindo e da necessidade de muita segurança em todos os movimentos. Artur tinha pouco contato com seu líder pois ele ficava em sua sala e Artur ficava no gate. Às vezes tinham alguma reunião para passar tarefas ou novidades, mas isso era tudo. O líder de Artur nunca o chamava para conversar, para perguntar como estava indo o trabalho, e coisas desse tipo. Artur, por sua vez, fazia sua parte. Era sempre pontual, seguia as regras e procedimentos, tentava ser gentil com todos e achava que estava indo bem no seu trabalho. No entanto, nunca alguém lhe dissera se seu trabalho estava satisfatório ou não. Ele vivia com aquela dúvida, mas como também ninguém havia lhe dado bronca, presumia que tudo estava bem. Um belo dia seu líder lhe chamou. Artur estranhou, mas prontamente foi à sala do líder, que estava atrás de sua mesa o esperando. Chegando lá o líder disse: “Artur, tenho que lhe dizer algo nada agradável. Você é um bom funcionário, mas teremos que te desligar. Por favor, passe em nosso departamento de RH, pois os papéis já estão todos prontos”. Artur não soube o que falar e ficou mudo, pois foi pego totalmente de surpresa. Ele foi ao RH, assinou o que tinha que assinar e foi para a casa sem saber o porquê de sua demissão. Imaginem a cabeça do Artur que, mesmo fazendo tudo de maneira correta, de repente é demitido sem saber a razão. Todos nós, seres humanos, precisamos de confirmação ou correção de nossos atos. A confirmação de que o seu trabalho está sendo bem feito é muito importante, assim como a correção, pois é a correção que mostra que seu líder


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se importa com você e que seu trabalho é importante para a empresa. Não saber se você está agradando ou não é muito pior do que receber uma crítica, um feedback de correção. Lembre-se disso quando estiver conversando com seus liderados. Informe-os se eles estão ou não satisfazendo suas exigências, deixe claro o que espera deles e sua opinião sobre o trabalho deles. Você também gosta de feedback, imagine então seus liderados.


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A centralizAção Capítulo 13

Olívia era proprietária de uma clínica de depilação. Ela era depiladora desde os seus 15 anos e agora estava com 28 e há 8 anos com a clínica. Sua formação acadêmica havia parado na formatura do ensino médio. De resto, dedicara seu tempo livre a cursos voltados a depilação, no que ela era muito boa. Ela havia optado pelo trabalho ao estudo e estudava aquilo que lhe era necessário e faria diferença direta na qualidade de seu serviço – a depilação. Como todos os empreendedores, ela era uma boa técnica que, em algum momento, resolveu abrir seu próprio negócio. No entanto, gestão e liderança não faziam parte de seu repertório. Além disso, Olívia era tão boa na depilação, que achava que ninguém era tão bom quanto ela. Frequentemente ela assumia clientes de suas colaboradoras, pois “sabia” que só ela faria um trabalho bom naquela cliente difícil. Não que ela ficasse com a parte que cabia à colaboradora, ela fazia isso somente para ter certeza do trabalho bem feito mesmo. No entanto, o que ela não percebia é que esse comportamento era uma armadilha imensa para a centralização. Em termos de gestão Olívia sobrevivia, pois havia pedido auxílio a alguns amigos e feito alguns cursos básicos sobre gestão. O negócio dela não era tão grande assim e ela, centralizando tudo, tocava-o muito bem. Olívia tinha 6 funcionárias, uma ficava na recepção e as demais eram depiladoras. Tudo ficava sob os olhos de Olívia, ela tinha que dar a última palavra para tudo e decidia tudo. Afinal, não é esse o papel do líder? Será? Aproximava-se o final de ano e Olívia teria que dar férias para a equipe. Estava sem saber o que fazer, pois todas queriam férias nessa época, o que era impossível. Pelo menos alguém na recepção e mais uma depiladora tinham


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que ficar de plantão. Foi então que Olívia puxou o relatório de quantos dias de férias cada uma tinha e, levando em conta aspectos pessoais, do tipo uma é casada, a outra tem filhos, a outra é solteira, a outra tem família longe, ela fez a escala de férias. Deu bastante trabalho, mas após 3 horas de dedicação, a escala estava pronta e Olívia estava satisfeita com o que fizera, ela tinha certeza que as meninas iam gostar. Olívia convocou uma reunião para falar sobre o assunto ao final do expediente da primeira sexta-feira de dezembro. Aí já começou a insatisfação, pois ninguém gosta de ficar depois do horário em uma sexta-feira, além do fato de já ser dezembro e delas não terem tido tempo de programar nada para as férias por não saberem como as coisas iriam ficar. Mas Olívia não podia usar de outro horário e pensou que sexta-feira seria ótimo, pois então todas iriam para casa e poderiam comunicar às suas famílias o que havia ficado decidido. Na dita sexta-feira todas ficaram, um tanto a contragosto, mas era o que precisava ser feito. Foi então que Olívia comunicou como ficariam as férias. A reação da equipe foi das piores, só faltou elas xingarem a chefe. Elas disseram que Olívia “não deveria ter feito aquilo”, que “não pensou nelas e só na clínica de depilação”, que “deveria ter perguntado se alguém tinha algum plano”, que “aquilo era um desrespeito” e por aí afora. A reunião terminou, cada uma tendo que engolir seu período de férias e Olívia foi para a casa sem entender bem o que havia acontecido. No entanto, estava satisfeita, pois a clínica funcionaria muito bem no período de férias. Agora vejam a história do Marcos, com uma malharia de 150 funcionários. Ele tinha quinze mil reais para a festa do final do ano. Ele convocou o líder da fábrica e lhe disse: “Manuel, converse com sua equipe para ver o que eles querem fazer neste final de ano, um churrasco, um almoço, jantar, um passeio enfim, o que eles quiserem. Temos quinze mil para gastar e esse festejo tem que ser em um sábado pois, infelizmente, não podemos parar um dia de semana. Veja com eles e depois me diga o que ficou resolvido que a gente divide as tarefas e organiza a festa.” Manuel foi conversar com sua equipe e, após várias trocas de ideias eles


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chegaram à conclusão que não queriam festa, queriam mesmo era o vestiário que estavam pedindo há bastante tempo e que, por alguma razão que eles desconheciam, não saía do projeto. Eles sabiam que com aquele dinheiro daria para fazer um vestiário e estavam dispostos a passar o final de ano sem festa. Manuel foi conversar com Marcos que, prontamente, aceitou a ideia e começou a dar andamento ao projeto do vestiário. E naquele ano a empresa não teve festa de encerramento. Vejam a diferença de conduta entre a Olívia e o Marcos. Marcos deu as diretrizes, o valor e o dia da semana, e deixou que seus colaboradores decidissem. Já Olívia não fez nada disso, ela decidiu por toda a equipe, sem nem mesmo consultá-las. Qual equipe é mais motivada a ir trabalhar? Qual equipe aprecia mais o líder? Qual equipe é mais comprometida e produtiva? São pequenos atos que os líderes fazem que direcionam a equipe para a motivação e engajamento ou para a total desmotivação e aquele sentimento de “não estou nem aí” com a empresa. Obviamente, algumas decisões são estratégicas e devem ser tomadas pelos líderes. Mas não se enganem, a maioria delas pode e deve ser compartilhada com a equipe. Ser líder não quer dizer ter que ter a resposta e a decisão para tudo, e sim saber usar seus recursos, nesse caso os colaboradores, para chegar à melhor resposta e decisão.

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A impOrtÂncia do relAciOnamentO Capítulo 14

Cauê coordenava a equipe financeira de uma fábrica de sorvetes e tinha 8 liderados. A empresa se localizava no interior do Paraná e vendia para todo o Brasil, seja para grandes redes como para pequenas sorveterias. Ou seja, a equipe financeira tinha bastante trabalho. Cauê havia se formado em administração e tinha pós-graduação em gestão financeira. Sempre amou números, era do tipo objetivo, direto em suas comunicações e focado no trabalho e nos resultados. Com ele não havia muito espaço para conversinhas e sentimentos. E era isso que esperava de sua equipe. E ele pensava que estava tudo muito bem, pois a equipe financeira sempre apresentou excelentes resultados e nunca algum liderado reclamara. Até em sua vida pessoal Cauê era bastante “direto” e “seco”, como dizia sua esposa. Ele era casado há 3 anos e ainda não tinham filhos. A esposa lhe dizia que ele tinha que ser mais conversador, se interessar mais pelas pessoas, por sua família e por ela mesmo. Cauê dizia que se interessava muito por ela e por todos, mas que aquele era o seu jeito. Foi então que a empresa ofereceu aos líderes um programa de desenvolvimento interpessoal que só trabalhava relações e nada de técnico. De início Cauê estranhou e ficou meio desconfiado, mas era obrigado a participar. No entanto, quando Cauê assumia algo, ele o fazia bem até o fim e queria saber mais. Foi assim que, mais ou menos no meio do programa, Cauê resolveu fazer uma pesquisa com seus 8 liderados para saber o que estava bom e o que precisava melhorar em seu departamento. Buscou na internet uma pesquisa de satisfação, adaptou-a um pouco à sua realidade e a aplicou com sua equipe.


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Quando tabulou os resultados se surpreendeu. Várias pessoas diziam que ele era frio e que sentiam a necessidade de tê-lo mais próximo, mais amigo. Exatamente o que sua esposa lhe dizia. Como aquele comentário vinha de 5 pessoas, de um total de 8, ele achou por bem ter uma conversa bem aberta com a equipe, até porque ele não sabia quem tinha respondido o que e, por mais que cognitivamente entendesse o que estava escrito, não sabia exatamente o que a equipe esperava dele. Chamou a equipe, agradeceu por terem respondido a pesquisa e falou: “eu notei que vocês me acham distante, pouco amigo, até um pouco frio. Agradeço a sinceridade de vocês, mas gostaria de entender um pouco mais. Sei que é difícil para vocês falarem aqui abertamente, mas estou pedindo ajuda de vocês, pois se eu preciso mudar, eu o farei de bom grado, mas confesso que não sei nem como começar. Preciso demais da transparência de vocês.” Eles foram então explicando para Cauê as situações nas quais eles esperavam mais proximidade, mais calor humano, mais interesse pelas “pessoas” que eles eram e não somente pelos “funcionários”. Cauê ouviu tudo calado e agradeceu muito. Sua cabeça não parava de trabalhar e pensar o quanto poderia ter sido diferente com a equipe, mais amigo de todos. Cauê gostava muito de seus colaboradores, mas não sabia transmitir esse sentimento e isso agora estava muito claro. Foi para casa e conversou por horas sobre aquilo com a esposa. Ela também lhe colocou alguns exemplos da vida pessoal. Foram momentos difíceis para Cauê, mas de muito desenvolvimento. E, como Cauê era extremamente decidido, ele decidiu mudar, pois sabia que aquele novo comportamento estava ao seu alcance e traria muitos benefícios para ele e para os que estavam à sua volta, seja na vida profissional como pessoal. No dia seguinte ele entrou no departamento dizendo bom dia e sorrindo, sempre que alguém ia tomar um café ele ia também e perguntava sobre a vida pessoal - começou inclusive a contar algumas coisas de sua vida. Enfim, investiu no relacionamento com a equipe e a equipe estava maravilhada com aquela mudança. Ao mesmo tempo, Cauê estava gostando de estar mais próximo da equipe. E nada disso estava afetando o trabalho. Bem pelo contrário,


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todos trabalhavam até mais e com bom humor, conversando, de uma maneira leve. O departamento estava feliz e todos da empresa começavam a notar. Mas o mais impressionante de tudo foi que Márcia melhorou muito o seu desempenho. Antes da pesquisa e da conversa, Cauê estava decidido a demiti-la, pois ela era desmotivada, fazia seu trabalho com um ritmo muito lento, por vezes cometia erros e aquilo tudo já estava cansando Cauê, que já havia lhe dado vários feedbacks. Depois da mudança de Cauê, Márcia mudou junto. Ela se tornou uma pessoa sorridente, dedicada, focada, prestava muita atenção para não errar em nada. Enfim, uma pequena mudança no comportamento do líder era tudo o que Márcia queria. Ela queria atenção e se sentir uma pessoa importante dentro do departamento e não só uma funcionária qualquer. E o relacionamento com Cauê lhe mostrou que ela era importante sim. Todas as pessoas desse mundo querem atenção, independente de cargo, situação financeira ou geográfica. Não poderia ser diferente dentro de uma empresa onde as pessoas passam o dia juntas. Portanto, é tarefa do líder também se relacionar bem com a equipe para que eles sintam que o líder se importa com eles como pessoas. Caso contrário, a desmotivação e o não comprometimento vêm com força total, e isso nenhum líder quer. Além do fato de ser muito mais gostoso trabalhar em um ambiente onde todos se dão bem.

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DeixA estar Capítulo 15

Débora era uma mulher de 49 anos e possuía uma casa de festas há 15 anos. A casa de festas nunca teve grande sucesso em termos de movimento e faturamento alto, mas sempre teve uma excelente reputação, pois Débora cuidava de todos os detalhes, tudo tinha que ser perfeito, de qualidade e lindo. Débora era o tipo de pessoa que gostava do belo e do bom, e esse gosto era ainda mais evidente em sua casa de festas. Nada podia ser mais ou menos, tinha que ser de ótima qualidade e muito bonito. Débora preocupava-se muito mais com esses detalhes do que com o faturamento de seu negócio. Até por que ela não tinha que se preocupar com a saúde financeira da casa de festas, já que tinha muitos investimentos que garantiam uma vida de conforto e uma aposentadoria ainda melhor a ela e às suas próximas duas ou três gerações. A casa de festas era o sonho de Débora e lá ela devotava toda a sua atenção. Débora era divorciada, tinha uma filha morando nos Estados Unidos e nem animais de estimação tinha, portanto, sua vida era a casa de festas. Atendia todo o tipo de festas, desde festas de crianças até casamentos maravilhosos, pois seu espaço podia ser transformado e adaptado facilmente. Débora adorava as pessoas e acreditava nelas, às vezes até demais. Ela chegava a ser ingênua em alguns casos, pois não enxergava coisas ruins nas pessoas, nos fornecedores, nos clientes e esses, quando podiam, tiravam um pouco de vantagem. Não muita, pois Débora era tão boa que eles não tinham coragem, mas um pouquinho de vantagem eles acabavam levando até por que Débora era muito generosa e concedia descontos e cortesias além da conta. A equipe fixa era composta de 5 pessoas. Fernanda era a recepcionista e


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telefonista, Júnior o faz tudo que carregava cadeiras, mesas, etc de um lado para o outro, Cris fazia o comercial e era o braço direito de Débora, Carolina supervisionava as festas e as instalações e Beth cuidava da limpeza. A parte administrativa e financeira era a própria Débora que fazia, pois achava que ninguém poderia ter acesso às suas finanças. Além dessas pessoas, havia mais 20 free lancers que eram chamados conforme os eventos aconteciam. Débora adorava sua equipe e estava sempre dando presentinhos, investindo em cursos e compreendendo os problemas pessoais de cada um e suas limitações. Tinha um coração maior que seu corpo e, por isso, tolerava quase tudo de todos e acreditava que as pessoas iriam se desenvolver e que todos eram pessoas muito boas. Cris estava com Débora desde o início da casa de festas. Aprendeu tudo com Débora e tinha total confiança da líder. Cris não era uma pessoa ambiciosa, ela gostava daquela zona de conforto que havia adquirido com Débora. Ela trabalhava de segunda a sexta, horário comercial, fazia umas 3 visitas por semana, mais alguns telefonemas e orçamentos e a vida seguia bem assim. Como seu relacionamento com Débora era bastante próximo, ela não escutava muito a líder e, por vezes, não fazia o que lhe era solicitado. Há tempos Débora estava lhe pedindo um relatório de suas visitas e telefonemas e aquele relatório nunca aparecia. Até por que Débora cobrava raramente. E assim, ela não sabia como estava sendo executado o trabalho comercial de sua casa de festas. Além disso, Débora tinha pedido que Cris fizesse um planejamento comercial para a casa de festas, o que também nunca foi feito, até por que Débora, novamente, não cobrava. Débora dava alguns feedbacks para Cris que seu trabalho poderia ser melhor, mas como era muito boa e gostava muito da Cris, não ia direito ao ponto e não era firme. Cris ouvia, fazia que sim com a cabeça, mas nada mudava. E, de tempos em tempos, elas tinham essa conversa novamente e nada mudava novamente. Débora era adepta ao “deixa estar”. Aquela situação incomodava Débora, mas ela acreditava que, um dia, Cris iria melhorar e se conscientizar que precisava dar mais dedicação à casa de


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festas. Como já disse, Débora acreditava demais no desenvolvimento das pessoas. Não passava pela cabeça de Débora que Cris precisava de um feedback bastante firme, do tipo “ou muda, ou sai”. Essa atitude era muito difícil para Débora. Ela preferia deixar as coisas como estavam, inclusive afetando o resultado de seu faturamento. É muito importante que líderes acreditem que sua equipe possa se desenvolver. No entanto, há um limite. E o limite é definido com o quanto determinado comportamento afeta o resultado e por quanto tempo. É necessário que haja uma luz no fim do túnel e que essa luz não esteja muito longe. Caso contrário, é como “dar murros em ponta de faca”. Ou seja, o líder acha que está sendo bonzinho, mas ao mesmo tempo, está sendo extremamente inconsequente com o seu negócio, que está sofrendo devido a algum profissional inadequado.

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O pOnto da pOlentA Capítulo 16

Isaías trabalhava em uma fábrica de copos plásticos. Ele era encarregado da produção e seu gerente era o Sr. Ronaldo. Isaías estava na empresa há 7 anos, sempre com outro gerente, o Sr. Eduardo, com quem se dava muito bem. No entanto, o Sr. Eduardo se aposentou e foi substituído pelo Sr. Ronaldo. Sr. Ronaldo parecia simpático, conversava pouco, perguntava bastante sobre o trabalho de Isaías e parecia que estava tudo indo bem, a contento. A política da empresa era de lean manufacturing, ou seja, nenhum desperdício e todos eram extremamente focados em produtividade. O Sr. Ronaldo era expert em produtividade e queria mostrar trabalho para a diretoria. Logo que assumiu a produção, tratou de verificar os números, os índices de produtividade, queria saber o que cada funcionário fazia e como fazia. Isaías estava sufocado de tantas perguntas e tantos relatórios que tinha que preparar para o Sr. Ronaldo, pois nunca tivera que fazer isso. Era controle para tudo, ele mal tinha tempo de descer à fábrica e verificar como andava a produção de tanta papelada que tinha que preparar. Mas era assim que o novo líder queria, então era assim que ele tinha que fazer. A fábrica começava o expediente às 7:30, mas o Sr. Ronaldo sempre chegava 7:15 e ficava esperando os funcionários, só de olho no relógio para ver quem chegava no horário e quem atrasava. Conduta essa que repetia no encerramento do expediente, às 17:30. Ele também controlava o horário de almoço e as eventuais paradinhas dos funcionários. Quando alguém da fábrica parava e ele via, pois de sua sala tinha um vidro gigante que dava para ver toda a produção, ele chamava Isaías e dizia: “Isaías, vá agora mesmo falar com aquele funcionário. Ele está parado há uns 3 minutos.” E os dias passavam assim, entre controles de pessoal e planilhas e mais planilhas.


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Isaías sempre chegava à empresa entre 7:20 e 7:25 e costumava ir embora por volta das 18/18:30, dependendo do que tinha para fazer. Ele estava sempre pronto para ajudar alguém da produção que precisava dele e não poupava esforços para entregar um trabalho bem feito e para que todos na produção ficassem satisfeitos com seu trabalho e com o ambiente onde trabalhavam. Porém, o Sr. Ronaldo estava mudando tudo aquilo. Aquele excesso de controle começava a incomodar o pessoal de chão de fábrica e, consequentemente, o Isaías. Isaías conduzia sua equipe na base da conversa, da compreensão, de um puxãozinho de orelha aqui, outro acolá, mas tudo de uma maneira bem natural e agradável. E agora tudo estava diferente e a postura de Isaías tinha mudado, o que já era perceptível pela equipe. Isaías já não ficava tanto na fábrica e, quando ficava, era para chamar a atenção por que alguém parou ou por que jogou o refugo no lugar errado, ou porque produziu muito refugo ou o cafezinho fora muito longo. Isaías também não estava contente com aquilo, mas fazia o seu melhor para satisfazer o Sr. Ronaldo e continuar com um bom clima com o pessoal do chão de fábrica. Era incrível como o número de atestados da equipe havia aumentado. Isaías se perguntava o porquê daquilo e acabou encontrando a resposta: ninguém gosta de ser controlado o tempo todo e viver sob pressão. Para alguns, isso vira doença, para outros, total desmotivação. Seja em um ou outro caso, eles iam ao médico e quando o médico perguntava se queriam atestado, a resposta era sempre sim. Que triste, pensava Isaías. E continuava sem saber o que fazer, pois sabia o que causava tudo aquilo, mas tinha que satisfazer seu gerente. Isaías estava entre a cruz e a espada. Um belo dia, Isaías se atrasou, chegou à empresa às 8:00 porque sua mulher tinha tido crise de enxaqueca a noite toda e ele ficou cuidando dela e, quando finalmente pegou no sono, perdeu a hora e acordou 7:30. Isso nunca acontecia, mas naquele dia, infelizmente, aconteceu. Quando chegou à sala do Sr. Ronaldo, esse já olhava para o relógio e perguntou, já com cara de quem não tinha gostado: “O que aconteceu?”. Isaías explicou a verdade e se desculpou. Foi aí que o Sr. Ronaldo explodiu e bateu à mesa: “Como um encarregado se atrasa simplesmente porque perdeu a


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hora por que a mulherzinha ficou tendo chiliques à noite??? Você tem que ser exemplo. É esse exemplo que você quer ser para seus funcionários?”. Mas ele não falou essa frase, ele berrou. Berrou tanto que as pessoas nas salas vizinhas puderam ouvir. Isaías engoliu em seco e, cabisbaixo, voltou para seu posto de trabalho e continuou o seu dia. Quando chegou em casa à noite, contou para a esposa o que havia acontecido e como estava se sentindo. Ela ficou muito triste por Isaías, mas ao mesmo tempo, eles precisavam daquele emprego, era o sustento deles. Ela não trabalhava devido às crises de enxaqueca e eles não tinham qualquer outra renda, tão pouco reservas financeiras. E assim foi a vida de Isaías dia após dia, acordando com vontade de ficar na cama, ia trabalhar, mas já não era o mesmo, estava sempre cabisbaixo. Periodicamente recebia uma bronca enorme do Sr. Ronaldo que não sabia nem da onde vinha, mas aguentava tudo pois precisava sustentar a si e à sua mulher doente. Ele próprio começou a ter viroses e gripes mais frequentes e usava de atestados para ficar em casa. Começava a entender perfeitamente como seus funcionários se sentiam, mas não tinha mais forças para ir contra o Sr. Ronaldo que, estava amparado pela diretoria. Era adaptar-se ou pedir para sair e, como não podia sair, o melhor que fazia era adaptar-se. Essa é uma situação muito triste que se encontra em muitas empresas e os líderes nem se dão conta do mal que estão fazendo às suas equipes. O controle é necessário, mas tem que se encontrar o ponto da polenta em termos de controle. Nem demais, nem de menos. De menos, as coisas não funcionam e os resultados não são alcançados, demais gera tudo isso que gerou no Isaías e em sua equipe. O ideal é o “dourado caminho do meio”.

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ParA QUem vãO os benefíciOs? Capítulo 17

Paulo era dono de uma chocolateria em Gramado. Sua fábrica tinha 15 anos e era muitíssimo bem conceituada na cidade. A fama do chocolate quente atravessava fronteiras e Paulo muito se orgulhava disso. Paulo nasceu em Porto Alegre e aos 25, após formar-se em administração, mudou-se para Gramado em busca de uma nova vida e já com a ideia de abrir a chocolateria. Lá conheceu Rosana, com quem se casou e o casal teve dois filhos, o Pedro e o Vítor, de 6 e 4 anos, respectivamente. Os negócios iam muito bem e Paulo tinha uma vida pra lá de confortável. Pelas manhãs ia para a academia, voltava para casa, tomava seu café, seguido de um banho. Então entrava em sua BMW e ia trabalhar. Chegava na chocolateria por volta de 9:30 e lá ficava até a hora do almoço, quando buscava os filhos na escola e ia para casa. À tarde, por volta das 14:30 ou 15:00 chegava no trabalho e ficava até umas 19:00. Sua rotina era bastante leve e, financeiramente, não tinha problemas. Passava férias com a família em Orlando sempre que podia, morava em um bairro de classe alta em Gramado e frequentava um círculo de amigos bastante poderosos também. A chocolateria tinha 14 funcionários, todos com suas funções muito bem definidas. Os salários que recebiam em recompensa a seu trabalho era sempre o piso mínimo da categoria, o que lhes incomodava um pouco. No entanto, uma vez por ano recebiam a participação dos resultados, que era uma alegria apesar de também acharem que uma porção maior poderia ser distribuída já que eles se esforçavam muito, principalmente nas altas temporadas. Paulo não era do tipo generoso. Achava que pagava a bem e que estava tudo certo. Quando algum funcionário ia pedir aumento, Paulo respondia que ele deveria se


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orgulhar em trabalhar em uma das mais conceituadas chocolaterias de Gramado e, com esse papo, encerrava o assunto e o aumento não saía. Além disso, as condições de trabalho para o pessoal da cozinha não eram nada boas. Havia uma panela especial para esquentar o chocolate quente, que estava quebrada há meses e Paulo não mandava consertar. Tinha também a iluminação, que era fraquíssima. Os garçons não tinham onde sentar quando tinham uma folguinha e isso os obrigava a ficar de pé o dia todo. O trabalho era feito, mas a equipe não era motivada nem alegre. No entanto, como o negócio era muito bem estruturado há anos, e se situava em um local excelente em Gramado, os resultados não eram afetados. Isso também dava a Paulo mais razão para não precisar dar aumentos, pois a chocolateria ia bem. Se alguém quisesse sair, outra pessoa viria. Todos adorariam trabalhar na chocolateria de Paulo, conforme seus próprios pensamentos. Paulo decidira ampliar a chocolateria e não queria ir aos bancos para tal. Então teve uma ideia: naquele ano diminuiria a porção do resultado distribuída aos funcionários e, com isso, conseguiria adiantar bastante a ampliação. Paulo sempre distribuía 10% do resultado total do ano e, naquele ano, simplesmente informou a seus funcionários que, devido à ampliação que teria que ser feita, a porção a ser distribuída seria de 5%. A equipe, já desmotivada, revoltou-se. No entanto, Paulo era sempre muito habilidoso em suas falas e era muito difícil argumentar com ele. Todos viam que, ao mesmo tempo que ele dirigia uma BMW e tinha um estilo de vida caríssimo, não retribuía quase nada à equipe que estava sempre lá, trabalhando pelo crescimento da chocolateria. Aos poucos, o turnover de pessoal começou a aumentar, pois todos procuravam algo melhor ou, no mínimo, algum trabalho que os valorizasse. Nenhum ser humano gosta de injustiça e os colaboradores estão sempre atentos a o que o líder faz, como se comporta, como divide seus resultados. Eles são pessoas, como qualquer outra, com inteligência para perceber o que acontece ao seu redor e com necessidade de valorização e justiça. A situação é mais ou menos assim: os bolsos do líder estão cheios. Mas a que custo? Ao custo do suor de sua equipe. E o que a equipe ganha com isso?


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Desvalorização. Tem algo nessa história que não está certo. Há líderes que olham demais para si para, só depois, olharem um pouco, e muito pouco, para a equipe. Eles podem até prosperar financeiramente, mas nunca terão um negócio próspero em termos de motivação da equipe e de um bom clima para se trabalhar.

i n sig h t s !


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COmo cOnfiAr na eQUipe Capítulo 18

Josué era gerente geral da principal agência bancária de Rio Preto e liderava 70 funcionários. Era uma agência grande e Josué estava no banco há 15 anos, tendo iniciado como caixa e subido aos poucos, até chegar ao cargo de gerente geral da agência. Ele era uma pessoa bastante calma, simpática, conversava com todos, mas seu foco era mesmo o resultado da agência, como todo bom gerente de banco. Josué tinha uma assessora que estava com ele desde que assumira aquele cargo, há 6 anos. No entanto, ela teve que pedir demissão, pois seu marido ficou doente e ela precisava cuidar dele. Josué compreendeu totalmente, mas ficou triste por perder sua tão boa assessora. O trabalho entre eles fluía perfeitamente, Josué nem precisava falar e Julia já sabia o que ele queria e como queria. Josué confiava plenamente em Julia. Bastava lhe dizer uma vez o que fazer e ele podia ficar tranquilo que missão dada era missão cumprida com Julia. Agora então estava com uma nova assessora, a Fernanda. Fernanda já havia trabalhado em outros bancos como assessora de gerência e presumia-se, portanto, que ela conhecia o trabalho. No primeiro dia de trabalho, Josué conversou com Fernanda por uns quinze minutos e lhe disse: “vamos nos ajustando, não tenho como te passar como é o trabalho pois é muita coisa. Vamos deixando as coisas acontecerem e vamos nos ajustando”. Fernanda achou Josué bastante aberto e acessível, e concordou com o líder, apesar da pressa da primeira conversa. E assim foram indo as coisas. Um belo dia, Josué pediu que Fernanda preparasse um relatório para ele apresentar para a diretoria. Como seu dia estava muito corrido, ele não con-


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feriu o relatório. Simplesmente o recebeu de Fernanda e projetou direto na reunião de diretoria. Quando os dados estavam projetados na tela, Josué ficou branco. O que era aquilo? O relatório estava cheio de erros. Até erros de cálculo tinha. Ele não sabia da onde Fernanda havia tirado aqueles números e ficou muito nervoso e bravo. Mas naquele momento não havia o que fazer, pediu desculpas aos diretores, explicou um pouco com suas próprias palavras o que estava acontecendo na agência e como estava o resultado e ficou de encaminhar o relatório por email. Quando chegou à sua sala, chamou Fernanda imediatamente e lhe disse: “Fernanda, você não fazia relatórios nas outras agências?”. “Sim”, respondeu ela. Ele lhe perguntou se ela havia conferido o relatório, de onde tinha tirado os números, se havia pedido ajuda a alguém e assim por diante. Deixou claro para ela que nunca mais entregasse algum trabalho para ele sem conferir e consultar os colegas mais experientes para ver se era aquilo que Josué estava pedindo. Fernanda se sentiu muito mal com aquela conversa. Apesar de saber que errou, pois não conferiu e poderia ter pedido ajuda aos mais experientes, Josué foi muito severo e também não havia explicado exatamente como queria o relatório, tão pouco tinha dado uma olhada antes da reunião com a diretoria. Josué, por sua vez, analisou a situação. Ele compreendeu que não havia passado as instruções completas para Fernanda, não a havia preparado para fazer aquele relatório, não havia lhe dito quem poderia procurar em caso de dúvida e, o pior, não havia dado sequer uma olhada antes da reunião com a diretoria. Ou seja, ele como líder, havia errado. Havia errado em confiar uma tarefa de tal importância para uma colaboradora nova que, apesar de ter experiência no cargo, não estava acostumada com o jeito de trabalhar de Josué. Como ele pôde confiar nela assim de uma hora para outra? Como ele pôde pedir algo sem tê-la preparado ou instruído corretamente? Lembrou que Julia jamais cometeria esse erro. Mas Julia estava com ele há anos e os dois foram se adaptando um ao outro e ao novo cargo juntos, já que


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assumiram, respectivamente, a gerência e a assessoria ao mesmo tempo. Eles foram aprendendo juntos. E agora ele queria que Fernanda, chegada há um mês, soubesse de tudo. A confiança não se constrói de uma hora para a outra, ela leva tempo a ser conquistada. Muitos líderes não confiam em suas equipes, mas também por que não dão liberdade para que seus colaboradores mostrem se sabem ou não fazer algo. Líderes precisam de paciência e precisam, aos poucos, dar tarefas que desafiem seus liderados. Só dessa forma o líder irá conhecer o potencial de sua equipe. Tudo aos poucos, hoje uma tarefa fácil, amanhã uma um pouco mais difícil e assim por diante. Até que o líder saiba até onde seu liderado pode ir com o potencial que tem. E aí sim, o líder pode confiar e simplesmente delegar. O processo de delegação nada mais é do que preparar, delegar e confiar, acompanhar e cobrar resultados. Sempre dando feedback positivo e de correção e sempre aumentando, aos poucos, o grau de dificuldade das tarefas.


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ConclUsãO A liderança é a arte de influenciar pessoas em direção a uma meta, um objetivo. Não é tarefa fácil, mas ela pode tornar-se extremamente complicada dependendo de como o líder a encara. A liderança não precisa ser pesada. Aliás, o que todos querem é ter um ambiente de trabalho tranquilo, amigável, onde se trabalhe sim, mas onde se possa conversar de vez em quando, compartilhar ideias sem medo e colocar suas competências a serviço de algo maior. E é aí que entra um dos entraves – o “algo maior”. Qual é o propósito de seu negócio? Para que a empresa ou o seu departamento existe? Isso tem que estar muito claro para o líder para que ele possa deixar claro para sua equipe. E não importa se estamos falando de um departamento de 3 pessoas, uma empresa de 20 colaboradores ou 2000. Pois mesmo a maior das empresas é dividida em células menores. E para que cada uma dessas células existe? Essa é a resposta que tem que estar clara para toda a equipe. Além disso, nós, seres humanos, precisamos ser ouvidos. É uma necessidade básica, talvez tão importante quanto respirar. Vejo muitos líderes criando uma distância tão grande entre ele e o liderado que o liderado jamais terá coragem de dar uma ideia, uma opinião para o líder. Ora, o liderado foi escolhido pelo líder para alguma função que deve ser importante, pois caso contrário, o líder não o escolheria. Também deve ser uma pessoa do agrado do líder, pois caso contrário, o líder também não o escolheria. Então por que não ouvir essa pessoa tão importante? Por que achar que só as próprias ideias são as melhores? Por que tratar o liderado como uma máquina que não tem vontades


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e ideias? As respostas para essas perguntas não são fáceis, elas envolvem a importância dada ao cargo, ao poder, ao ego, insegurança, medo, e por aí vai a lista dos porquês. No entanto, como se sente o liderado que não pode se expressar? Como ficará a motivação desse colaborador? Ele pode até adoecer por não poder colaborar tanto quanto poderia. E aí os líderes dizem: “Ué!!! Por que ele não veio falar comigo? Minha porta está sempre aberta.” Sim, a porta está, mas os ouvidos e a atenção não estão disponíveis. Essa abertura tem de começar com o líder, pois a própria hierarquia já coloca uma barreira, barreira essa que só o líder pode quebrar. O líder precisa gostar de sua equipe, pois é ela que irá garantir seus resultados. Se o líder não gostar da equipe, tenha certeza que os resultados não serão bons. E os resultados de uma empresa são responsabilidade de seus líderes. Liderar pessoas pode ser um fardo e pode ser uma alegria, pois o bom líder, aquele que ouve, que considera, que compreende a equipe, que motiva, que ensina, que orienta consegue transformar pessoas. Ter em suas mãos o poder de transformar pessoas é extremamente forte e de muita responsabilidade. No entanto, esse poder pode e deve ser usado para o bem, para deixar pessoas mais felizes, sendo ouvidas, usando suas capacidades e se desenvolvendo. E não para deixá-las doentes e infelizes, pois em sã consciência, ninguém quer causar isso aos outros. Vamos então levar a liderança com leveza, com naturalidade e com o coração aberto para a equipe, só assim seremos líderes que valem a pena...


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Textos: Silvana Fioravanti Capa e Projeto gráfico: Renz Santos | Agência


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QUal O poder dA liderançA? O que um líder pode causar em sua equipe e em sua empresa? Como fazer com que a liderança valha a pena e contribua positivamente para a vida de todos que a rodeiam? São perguntas como essas que são respondidas nos 18 “causos” narrados nesse livro, todos envolvendo algum acontecimento com liderança. Em um país onde a maioria das pessoas pede demissão do “chefe” e não da empresa, vale a pena ler sobre esse tema tão importante. Pois ninguém é perfeito, mas todos estamos nesse mundo para evoluir. Se você conseguir se enxergar em um “causo” que seja, com certeza irá evoluir um pouquinho e deixar essa escritora muito feliz. Divirta-se!


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