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Quarteira tem nova pista de BMX

PISTA DE BMX EM QUARTEIRA QUER ATRAIR EVENTOS INTERNACIONAIS

Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina Câmara Municipal de Loulé inaugurou, no dia 7 de julho, a Pista de BMX de Quarteira, um investimento que vem fortalecer o papel desta modalidade num concelho marcado pelo ecletismo desportivo. As condições de excelência da nova infraestrutura poderão mesmo atrair treinos e estágios de atletas estrangeiros, assim como eventos internacionais.

Em conjunto com Portimão, que viu recentemente remodelada a sua Pista de BMX situada no Parque da Juventude, Quarteira poderá passar a ser o destino para muitos atletas do centro da Europa. “O Algarve tem duas

pistas de topo, o que é importante para trazer atletas internacionais para treinar e estagiar. Os franceses, holandeses e alemães estão todos a ir para o sul de Espanha (Alicante) e nós estamos a tentar criar aqui um núcleo para trazer esses atletas

para cá”, explicou Dário Piedade, presidente do Clube «Asas da Cidade»

BMX Team, que marcou presença na inauguração do equipamento.

Por sua vez, Vítor Aleixo, presidente da Câmara de Loulé, relembrou o compromisso de Loulé com o desporto, que teve o reconhecimento com a chancela de «Cidade Europeia do Desporto» em 2015. “Temos um

movimento desportivo massificado e somos um concelho democrático do ponto de vista do acesso a quem quer praticar desporto, em quase todas as modalidades. O BMX fica a ser mais uma delas porque as condições existentes agora são

excecionais”, evidenciou o edil. Para já, está prevista a realização em Quarteira do campeonato regional, taças regionais e a possibilidade da pista receber a final da Taça de Portugal, nos dias 3 e 4 de outubro. Caso a situação pandémica o permita, até ao final do ano, no inverno, o clube de Quarteira pretende realizar uma prova internacional e convidar atletas estrangeiros para conhecerem esta infraestrutura.

Quarteira é, desde há várias décadas, uma terra com forte tradição no BMX, que teve a sua génese nos idos anos 90, com a criação do então Radical Juventude de Quarteira. Entretanto, o clube foi reestruturado em 2007, passando a formar muitos talentos, contando já com diversos campeões nacionais em todas as categorias, vice-

campeões do mundo e campeões da Europa. Atualmente tem o maior número de atletas de BMX a nível nacional, uma média de 55 por ano, conforme revelou Dário Piedade. “No entanto, desde

2015 que a pista existente, localizada junto ao Estádio Municipal de Quarteira, não satisfazia os atletas e praticantes de BMX, uma vez que, devido às suas dimensões que não reúnem todas as condições de segurança para os praticantes, deixou de poder

receber algumas provas”, explicou o

dirigente. Já esta nova pista, marcada pela inovação, vai ao encontro das atuais exigências das entidades oficiais da modalidade. De facto, o traçado radical e competitivo que se prolonga por 420 metros foi certificado pela Federação Portuguesa de Ciclismo, podendo assim acolher provas de âmbito nacional e internacional de BMX nas diversas categorias.

Localizado ao lado de dois bairros sociais – a Abelheira e a Amendoeira –o equipamento agora inaugurado será também um fator de inclusão social para os jovens que aí vivem. O «Asas da Cidade» tem vindo a realizar um importante trabalho ao nível da ação social, disponibilizando bicicletas a todas as crianças e jovens que queiram iniciar-se no BMX e integrar a formação do clube. “Era uma coisa que

encheria o nosso coração de alegria, até porque o desporto é importante para a boa formação

dos jovens”, disse o presidente Vítor Aleixo relativamente a esta aproximação dos moradores dos bairros à modalidade .

A ARTE TÊXTIL COM PREOCUPAÇÕES AMBIENTAIS DE VANESSA BARRAGÃO

Texto: Daniel Pina| Fotografia: Diogo Sousa, Ruben Guerreiro e Studio Vanessa Barragão

or estes dias é possível assistir, na Ponte Medieval de Paderne, à impactante obra «Algarvensis» de Vanessa Barragão, concebida especialmente para o GeoPalcos a convite do Município de Albufeira. Sobre a velha ponte por onde os antigos passavam com produtos para comercializar ou com flores para as festas sazonais, encontramos agora, até 12 de setembro, uma instalação artística têxtil feita a partir de lã natural de ovelha algarvia, lãs recicladas provenientes da indústria têxtil a Norte, resina e outros materiais, cujo processo, para além da lavagem e cardagem da lã, levou também a artista a optar por técnicas de feltragem, manipulação têxtil e crochê.

Este poderá ser, para alguns algarvios, o primeiro contato com o trabalho de Vanessa Barragão, mas a verdade é que a paixão desta jovem de Albufeira pelas artes vem desde pequena e o seu trajeto profissional cedo começou a traçar-se. “Na escola

ia sempre para a parte do desenho, das artes, porque também cresci numa família cheia de artistas. O meu avô e o meu pai trabalham muito bem a madeira, a minha mãe pintava, as minhas avós estavam sempre de volta do crochê. Isso despertou-me o

gosto pela manualidade, mas o meu sonho inicial era ser designer de

moda”, conta Vanessa Barragão, à conversa, logo pela manhã, no seu atelier nos Olhos de Água.

Na universidade tirou o curso de Design de Moda e seguiu-se um mestrado, fase em que percebeu que aquilo que realmente a fascinava era a componente têxtil e não propriamente desenhar as roupas no papel. Começou a fazer tapeçarias e a primeira venda ainda a motivou mais para seguir este caminho, mas não se livrou das naturais preocupações dos pais relativamente ao seu futuro, pois sabiam bem que as artes não garantem um rendimento regular.

“Claro que conversamos sobre isso e preferiam que tirasse primeiro o curso de Arquitetura e só depois Design de Moda, mas as pessoas devem focar-se naquilo que gostam. Também é verdade que nem toda a gente consegue descobrir cedo qual é a sua verdadeira paixão, mas eu tive

essa sorte”, admite, sorridente, acrescentando que ir para o turismo nunca lhe passou pela cabeça.

Fosse nas roupas para as Barbies quando era criança ou nas suas próprias roupas, quando era mais crescida, Vanessa Barragão evidenciava um talento natural para o têxtil e sabia que tinha que partir para Lisboa para fazer a sua formação. Depois de 10 anos na capital, regressou ao Algarve,

mas a vontade de explorar mais a vertente têxtil levou-a a partir novamente, desta feita para o Porto, onde foi designer têxtil durante quatro anos numa fábrica. “A moda está

massificada, há imensas marcas e designers, e percebi que ninguém me ia comprar uma peça de roupa por mil euros, porque não sou uma «Prada». No entanto, se pedir mil euros por uma peça de arte têxtil, a resposta, se calhar, já é diferente. Felizmente as coisas correram bem e estou a fazer realmente aquilo

que gosto”.

Não se pense, todavia, que este ramo é fácil, até porque a maior parte das pessoas olha para os têxtis como simples peças de decoração que são bem mais baratas numa loja do IKEA ou Conforama.

“Em Portugal não existe, de facto, tanta sensibilidade para a parte artística e cultural como noutros países, porque estas peças podem ser decorativas, mas são peças únicas e que podem constituir, inclusive, um investimento a longo prazo. Quem comprou a minha primeira peça, se hoje a quiser vender, vai fazê-lo por muito mais dinheiro. Também reconheço que, nos primeiros anos, o que fazia eram peças de decoração, mas depois compreendi que estava a conceber peças de arte que têm uma mensagem por trás e que resultam de um processo bastante peculiar e artístico que

consome bastante tempo”, distingue

a entrevistada, acrescentando que as técnicas artesanais que emprega não diferem muito daquelas que as suas avós utilizavam quando ainda era uma simples menina. “Uso várias técnicas têxtis,

sobretudo a Esmirna e o Crochê, e tudo sem maquetes ou desenhos. São peças que, algumas, demoram meses a serem produzidas e, se ficar agarrada a um esboço, não tenho liberdade criativa. Um dia acordo assim, outro acordo assado, tudo me influencia, mas tento não desmanchar nada, porque cada parte da peça também simboliza

uma etapa do processo”, descreve.

E como é que transmitimos uma mensagem através de uma peça de

arte têxtil, questionamos, ao que Vanessa Barragão responde ser através das cores e das formas. “Tento focar-me nos

ecossistemas que se estão a degradar, especialmente os recifes de coral, que nem toda a gente tem oportunidade de ver ao vivo. Não fazemos ideia do que a poluição que causamos em terra faz ao que está escondido dentro do mar. Os corais são um pilar importantíssimo na vida marinha e, quando desaparecerem, o mesmo acontece com os peixes pequenos que fazem deles o seu habitat. E depois os peixes grandes deixam de ter alimento e cria-se um problema gigante e um desequilíbrio enorme no

planeta”, avisa a albufeirense. “A

maior parte dos materiais que uso são reciclados e tenho as minhas mãos, não preciso comprar uma máquina de 50 mil euros para concretizar uma ideia que tenho na cabeça. Este culto da manualidade deve estar presente das pessoas, elas devem sentir que são capazes de fazer coisas com as

suas próprias mãos”, defende

REGRESSAR ÀS ORIGENS NO MOMENTO CERTO

O êxito crescente de Vanessa Barragão leva a que já não consiga fazer tudo sozinha, daí perguntarmos se é fácil, nos tempos que correm, encontrar pessoas que partilhem da sua ideologia e que tenham conhecimentos para trabalhar o têxtil. “A mão-de-obra

especializa-se aqui no atelier, basta terem aptidão para a manualidade, para agarrarem na agulha, terem esse gosto. Neste momento somos seis, incluindo uma rapariga que veio da Estónia para fazer um

estágio comigo”, conta, destacando a importância dos mais jovens aderirem a estes costumes e práticas antigas. “Se

não forem passados para as próximas gerações, vão acabar por

desaparecer”, justifica.

Depois de uma década em Lisboa e quatro anos no Porto, Vanessa Barragão regressou, pelos vistos definitivamente, a Albufeira, mas a mudança não tem diminuído os pedidos e encomendas, assegura. “Posso estar em qualquer

parte do mundo, mas precisava de mais tempo para mim, de me reconcentrar no meu «eu». Também necessitava de um atelier maior e com muita luz natural, por causa das cores, e, acima de tudo, queria trabalhar com a minha família. Voltei em janeiro de 2020 e, de repente, apareceu o covid-19, o que tornou a minha decisão de regressar às origens ainda mais

benéfica”, reconhece, salientando ainda que, no «seu» Algarve, acaba por estar mais concentrada no trabalho. “No Porto estava no

Bonfim, uma zona bastante artística, com muitos ateliers e a Escola de Artes, e sinto um

pouco a falta desse ambiente cultural mais fervilhante. Mas ganhei mais ao vir para o Algarve do

que se tivesse ficado no Porto”,

garante, com um sorriso.

Trabalho não falta, sem dúvida, a Vanessa Barragão, e assim se desvaneceram as preocupações dos pais em relação ao seu ganha-pão, mas a entrevistada admite que, se calhar, continua a ser uma perfeita anónima para o cidadão comum. “Na área têxtil sou

conhecida porque crio algo diferente e, neste último ano, tenho tentado divulgar mais o meu trabalho aqui no Algarve. Não para ser famosa, mas para sensibilizar os outros para as questões

ambientais”, indica. Quanto à concorrência, claro que existem outros artistas têxtis, mas todos são diferentes uns dos outros.

“Obviamente que não sinto que o IKEA possa ser meu concorrente, nem sequer quero entrar nesse estilo de peças. O meu processo é lento e atento, artesanal, sentimental e preocupado, produzo peças de arte e não objetos de decoração, que se compram e, passado uns anos, se

substituem por outro”, distingue

Vanessa.

Por tudo isto, os clientes da albufeirense são bastante diversificados, desde galerias que representam o seu trabalho em várias feiras de arte, aos particulares, hotéis e restaurantes. E o prazo de entrega de encomendas, neste momento, é de

abril de 2022, “mas as pessoas

esperam, porque sabem que vão ter

uma peça especial e única”. “Tive

uma cliente dos Estados Unidos que me disse que gostava imenso do meu trabalho e que ia começar a guardar dinheiro para me comprar uma peça. Passado um ano e tal enviou-me um email a informar-me que já tinha o dinheiro e que queria fazer a encomenda. Eu já nem praticava esses preços, mas fiz um jeito porque achei a atitude super

querida”, conta. “E há pessoas que

também já compram as minhas peças como uma forma de investimento, porque duram para a vida. Claro que exigem alguns cuidados porque são fibras naturais, maioritariamente lã, que tem tendência para adquirir traças se o ambiente não estiver limpo. No que toca à matéria-prima, tenho acordo com algumas fábricas do Porto que me dão os seus desperdícios, o que também influencia os tons e cores que uso nas peças. Mas isso até torna o processo criativo mais

interessante”, refere.

Na hora h surgiu, entretanto, o desafio para criar uma instalação têxtil na Ponte Medieval de Paderne, confessa Vanessa Barragão, com mais um dos seus largos sorrisos. “Sentia uma grande

vontade de levar o meu trabalho para o exterior, mas ainda não tinha testado o suficiente para dar esse passo. E o meu objetivo era, precisamente, decorar pontes, porque acredito que faço parte de uma «geração ponte», de passagem de conhecimentos do

passado para o futuro”, explica.

“Carregamos o dever de transmitir as tradições antigas para os mais novos e, quando a Câmara Municipal de Albufeira me fez o convite, aceitei de imediato. Tivemos que adaptar os materiais, por causa da chuva, vento e sol, e foi preciso aplicar uma resina para as cores não descolorarem, o que já não bate certo com a parte da reciclagem de que tanto falo. Mas sinto que aquilo que faço aqui no atelier vai compensar essa vertente menos

ecológica”, entende a artista, revelando que vai passar a focar-se mais nas instalações ao ar livre, a par do seu trabalho tradicional. “Estando

no Algarve tenho mais qualidade de vida, saio do atelier e posso ir a pé para casa. Sinto-me muito melhor a nível pessoal desde que voltei às minhas origens, as encomendas de clientes particulares continuam bastante boas, tenho novos desafios pela frente e vou começar agora a fazer uma peça para o restaurante de um novo prédio do

Dubai. Está tudo a correr bem”,

termina Vanessa .

JÚLIO ANTÃO REGRESSA A ALBUFEIRA COM «TERRA»

Texto: Daniel Pina Fotografia: Daniel Pina Fotomontagem: Júlio Antão

úlio Antão dá a conhecer em Albufeira, sua terra natal, uma exposição de abordagem multidisciplinar, intitulada «Terra», que estará patente, na Galeria de Arte Pintor Samora Barros, até dia 28 de julho. Com curadoria de Maria Trindade, esta mostra consta de escultura, assemblage, instalação, fotomontagem e pintura e apresenta ‘um

cenário perturbador sobre a vida trágica do nosso planeta, que tão depressa desconcerta o estado emocional do espetador, como de seguida abre uma fresta de

esperança para a humanidade’.

‘Júlio Antão traz-nos um projeto específico para o tempo de pandemia e esta amplia o pessimismo que atravessa a sua obra. A sua narrativa visual levanos em longa viagem, desde os tempos mais remotos, passando pela atualidade, até à visão

profética de um futuro sombrio’,

descreve Maria Trindade.

Para além de pintura e da escultura, Júlio Antão explora outras vertentes da arte, como cerâmica, fotografia, design de equipamentos, interiores e publicidade, e o seu regresso a Albufeira resulta de um convite feito por João Reis, responsável por esta galeria situada no centro histórico da capital do turismo, na sequência de um prémio conquistado, em junho de 2020, no concurso «Cores e Formas»

organizado pela Câmara Municipal de Albufeira. “A preocupação ambiental

e a sensibilização para que o mundo seja um pouco melhor é algo que me acompanha desde sempre. As esculturas «Vida e Luz» e «Mutante» já existiam, tudo o resto foi concebido e produzido nestes

últimos seis meses”, indica o artista

de pandemia não é fácil, mas garantindo que também nunca produziu nenhuma peça com um propósito comercial. “Se assim o

fizesse, estava logo a limitar a minha criatividade. Também não quis representar aqui pessoas de máscara e toda essa atmosfera que rodeia a covid-19, mas sim os problemas que existem na

própria Terra e de uma forma que desse algum prazer estético ao

observador”.

Ora, se é verdade que as preocupações ambientais estão na ordem do dia há largos anos, quando Júlio Antão deu os primeiros passos nas artes plásticas isso não sucedia, motivo pelo qual as suas obras não eram devidamente apreciadas. “Quando fui para a

fotografia baseava-me muito na biodiversidade, especialmente na animal. Depois, passei a tentar transmitir essa minha preocupação através do acrílico,

da escultura e das fotomontagens. Agora, como o tema é atual, as minhas exposições são mais

visitadas”, comenta o entrevistado, adiantando ainda que não gosta de estar circunscrito a um único estilo artístico.

“Comecei, aos 17 anos, na pintura a óleo, seguiu-se a escultura, depois a fotografia. Mais recentemente, com os conhecimentos que tenho adquirido ao longo dos anos, aventuro-me nas instalações e, sobretudo, na fotomontagem, porque me permite expor

internacionalmente e ficar com a

matriz”, explica.

Prova disso é que, ao mesmo tempo que tem uma exposição individual em Albufeira, participa igualmente numa exposição coletiva na Coreia do Sul e noutra no Perú e, em agosto, vai inaugurar uma outra no Brasil. Mas isto não quer dizer que esta seja a última paragem, simplesmente a mais recente, na sua caminhada artística. “O meu

percurso tem sido bastante semelhante nesse aspeto, ou seja, quando sinto que estou a atingir a perfeição num estilo, saio da minha zona de conforto e vou à procura de outros desafios. Gosto de ser diversificado, de descobrir novas

técnicas, de nunca estar parado”,

fundador e atual presidente da PAS –Peace and Art Society (Portugal), membro honorário da Gogyoshi Art Project International (Holanda), presidente honorário no Art Committee of International Culture & Arts Federation (Coreia do Sul) e membro honorário da Nigde Fine Arts Association (Turquia).

Um percurso riquíssimo e amplamente reconhecido alémfronteiras, mas que não tem tido igual destaque na sua terra, reconhece, com um encolher de ombros. Do mesmo modo, estar envolvido em tantas associações retirou-lhe tempo para criar, pela vontade de ajudar outros artistas. “Senti bastante

dificuldades no início da minha carreira, por isso, dá-me um certo

prazer auxiliar na promoção de novos talentos. Entretanto, este estado pandémico permitiu-me ter tempo e espaço para criar a maior parte das peças que aqui estão. No que toca ao público, antes da pandemia, notava-se um grande interesse pela cultura, nem que fosse nas inaugurações e nos eventos sociais ligados à arte. Com as restrições impostas para combater a pandemia, verifico que as pessoas que vão às galerias o fazem efetivamente pela arte e, como as salas estão menos congestionadas, até conseguem apreciar as obras com outra

amplitude”, observa Júlio Antão.

«Terra» tem sido disso reflexo, muito concorrida na inauguração, mas também nos dias que se seguiram e as críticas têm sido elogiosas. Mas será que o ser humano, que agora voltou a dar primazia aos valores imateriais, ao ambiente, ao sentimento de comunidade, continuará a ser assim depois desta batalha ter sido vencida? “O ser humano,

infelizmente, tem memória curta. Quando está numa situação difícil existe um forte espírito de união, mas, quando os problemas são ultrapassados, voltamos a ser o que éramos, ou ainda piores. Desde o início da humanidade que tem sido assim. Quando éramos nómadas, vivíamos em comunidades e fluíamos pela natureza, somente com preocupações alimentícias e de convívio. Nos tempos modernos impera o consumismo e o individualismo, o ter um carro melhor que o vizinho ou colega de trabalho, o que me preocupa

bastante”, responde Júlio Antão, antevendo que, assim que a covid-19 ficar para trás, prosseguirá o declínio humano.

Uma apreensão e pessimismo que não desaparecem quando lhe perguntamos se é fácil viver apenas da arte, nomeadamente quando não se cria com fins comerciais em mente. “Se assim

fosse, estava na rua a fazer imagens de barcos de pesca e de amendoeiras em flor para os turistas comprarem. Obviamente que tenho peças que se vendem, as instalações são mais complicadas, mas tenho outros recursos que me permitem sobreviver, de maneira que não preciso pintar ou esculpir para me

alimentar”, afirma. “Voltei a

Albufeira para tentar iniciar um novo ciclo, porque, há 10 anos, quando fundei a Peace and Art Society, praticamente fiquei por Faro. Quanto ao reconhecimento,

não há dúvida de que ele é maior

em termos internacionais”.

E porque as dificuldades são as mesmas há muito tempo, que futuro vê Júlio Antão para a nova geração de artistas que está agora a sair das universidades e a tentar iniciar uma carreira? “Quem está

ligado às artes clássicas terá mais problemas do que aqueles que se dedicaram às novas artes visuais. O digital continua a crescer imenso e tem muitas opções para se explorar em termos criativos e que são

monetariamente rentáveis”,

comenta o entrevistado, cujos próximos meses serão dedicados, quase exclusivamente, à sua nova «Terra». “Trabalhei seis meses para

esta exposição e vou tentar que, depois de Albufeira, ela vá para outros espaços culturais do Algarve. Certo é que, em setembro ou outubro, irá para Cascais. O momento, agora, é de parar alguns meses, meditar, e

depois criar outra exposição”,

conclui Júlio Antão .

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