2 minute read
Como Assustar ?
from O Inquietante
Por Dante Martins
Uma análise dos elementos principais nos quadrinhos de Junji Ito
Advertisement
Oterror, como todos os gêneros midiáticos, possui diversos gêneros subsidiários. Uma história de horror pode ser: slasher, sobrenatural, gótico, survival, creature feature, entre muitas outras. Muitas histórias de terror se enquadram em múltiplas destas categorias. E muitos criadores possuem proximidade com certos subgêneros, produzindo a maior parte das suas obras dentro deles. Isto inclui Junji Ito, que em seus mangás costuma explorar o terror psicológico.
O terror psicológico é um tipo de horror que envolve o tormento psicológico dos personagens, geralmente ele é mais focado no interior dos protagonistas e no distresse emocional e mental no qual eles se encontram. Ito costuma expressar a loucura e a “perda da humanidade” frequentemente em suas histórias através dos olhos de seus personagens, porém não só a isso se resume o fator psicológico nas suas histórias. O mangaká gosta de trabalhar em cima de algumas temáticas associadas com o terror deste gênero.
Uma delas é o campo do inquietante, aquilo que fica em um meio termo entre o familiar e o desconhecido e que não se encaixa exatamente em nenhuma das duas categorias. No ensaio “O Inquietante”, de 1919, Freud explora o sentido deste termo (“Unheimlich” em alemão), ele “(...) seria tudo o que deveria permanecer secreto, oculto, mas apareceu.” (2010, p. 338)
Jentsch pôs em relevo, como caso privilegiado, a “dúvida de que um ser aparentemente animado esteja de fato vivo ou, inversamente, de que um objeto inanimado talvez esteja vivo”, nisso invocando a impressão deixada por figuras de cera, autômatos e bonecos engenhosamente fabricados. (FREUD, 2010, p. 340)
O medo causado por esta incerteza nos faz receosos de objetos e/ou seres vivos que a invoquem. Com isto em mente, entendemos melhor o horror em diversas obras de Junji Ito.
O melhor exemplo do uso do inquietante é “Marionette Mansion”, uma história em que o jovem Haruhiko vai visitar seu irmão, Yukihiko, que não vê há muito tempo. Descobrindo que Yukihiko, sua esposa e seu filho possuem empregados para manipulá-los através de fios como se fossem marionetes (fig. 1).
O desenvolver do enredo revela a existência de uma marionete que tomou vida e controla todos na casa, ao descobrir isto, Haruhiko a destrói e quebra a maldição. A marionete é o exemplo literal do medo do objeto inanimado potencialmente vivo. Entretanto, a reviravolta do desfecho da história apresenta também o exemplo inverso: Ao ir soltar seu irmão, cunhada e sobrinho dos cordões que os suspendem, Haruhiko se depara com marionetes (fig. 2). No último quadro, o protagonista expressa uma dúvida: “Meu irmão e sua família se transformaram em marionetes. Eles se tornaram marionetes de verdade porque foram controlados por dois anos ou eram marionetes desde o começo? Eu não sei.” (JUNJI, 2017, p. 238, tradução nossa).
A esta indagação de Haruhiko cimenta o horror, não só relacionado ao medo de ver algo conhecido se tornar desconhecido, mas também, terror da percepção de que, talvez, o não familiar sempre existiu disfarçado pelo familiar.
Referências
JUNJI, Ito. Shiver: Junji Ito Selected Stories. San Francisco: VIZ Media, 2017. FREUD, Sigmund. Obras Completas: História de uma Neurose Infantil (“O Homem dos Lobos”), Além do Princípio do Prazer e Outros Textos (1917-1920). São Paulo: Companhia Das Letras, 2010. v. 14. ISBN 978-85-359-1613-3.