Chronos: Fragmentos do Tempo

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RYSA WALKER

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Time’s Divide Copyright © 2015 Rysa Walker Todos os direitos reservados. Published in the United States by Amazon Publishing, 2015 This edition was possible under a license arrangement originating with Amazon Publishing, www.apub.com. Publicado nos Estados Unidos por Amazon Publishing, 2015 Publicado no Brasil mediante acordo com Amazon Publishing, www.apub.com. Tradução para a língua portuguesa © Fernanda Lizardo, 2020 Os personagens e as situações desta obra são reais apenas no universo da ficção; não se referem a pessoas e fatos concretos, e não emitem opinião sobre eles.

Diretor Editorial Christiano Menezes Diretor Comercial Chico de Assis Gerente Comercial Giselle Leitão Editores Bruno Dorigatti Raquel Moritz Editores Assistentes Lielson Zeni Nilsen Silva Capa e Projeto Gráfico Retina 78 Designers Assistentes Aline Martins / Sem Serifa Arthur Moraes Finalização Sandro Tagliamento Revisão Ana Kronemberger Isadora Torres Jéssica Reinaldo Rayssa Galvão Impressão e acabamento Gráfica Geográfica

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (cip) Andreia de Almeida CRB-8/7889 Walker, Rysa Chronos : fragmentos do tempo / Rysa Walker ; tradução de Fernanda Lizardo. — Rio de Janeiro : DarkSide Books, 2020. 464 p. : il. (Trilogia Chronos ; 3) ISBN: 978-85-9454-165-9 Título original: The Chronos Files: Time’s Divide 1. Ficção norte-americana 2. Viagens no tempo – Ficção 3. Literatura fantástica I. Título II. Lizardo, Fernanda 19-0528

CDD 813.6 Índices para catálogo sistemático: 1. Ficção norte-americana

[2020] Todos os direitos desta edição reservados à DarkSide® Entretenimento LTDA. Rua Alcântara Machado, 36, sala 601, Centro 20081-010 — Rio de Janeiro — RJ — Brasil www.darksidebooks.com


Tradução Fernanda Lizardo



Este livro ĂŠ dedicado a Pete minha Constante em qualquer linha do tempo.



RY S A WA L K E R fragmentos

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do tempo

Bethesda, Maryland 8 de setembro, 21h37 Julia Morrell Waters não é uma mulher muito paciente. Menos de cinco minutos depois de eu abrir o bilhete de boas-vindas à Resistência, um suposto entregador de pizza bate à porta de Katherine. Na parte de dentro da tampa, há uma mensagem escrita no mesmo tipo de papel do bilhete de boas-vindas: Max vai trazer você para cá. Vá para o quintal e escale a cerca. Encontre com ele na rua de cima. Venha sozinha. jmw. A caixa não tem nenhuma pizza — Connor fez questão de verificar antes de me entregá-la —, mas há um letreiro da Pizzaria Valencia no carro parado em frente à casa, então parece que a Resistência fez o dever de casa direitinho. Sem dúvidas não é a primeira vez que um entregador de pizza aparece aqui nesta casa uma hora dessas. Só que o sujeito que tocou a campainha — Max, se não me engano — parece mais um jogador de futebol americano do que um entregador de pizza. “Ela não vai sozinha”, avisa Connor. Max fica tão surpreso que seus olhos parecem prestes a saltar das órbitas. Ele empurra a caixa para Connor, tira uma caneta do bolso e rabisca tô chateado!!! nas costas do bilhete, que entrega para mim. Depois disso, Max aponta para a cozinha e para a porta do pátio, como se o assunto já estivesse resolvido. Só que não está. Pego a caneta e escrevo uma resposta: Mesmo assim eu não vou sozinha. Trey olha para Katherine, ainda no sofá, depois para Connor. Ambos assentem, então ele bate no peito e aponta para mim. 9


Max dá dois passos em minha direção, uma atitude bem ameaçadora, e, considerando sua expressão, tenho certeza de que teria me agarrado e me carregado por cima do ombro se Connor e Trey não tivessem avançado para cima dele logo em seguida. Penso que talvez seria melhor se não tivessem feito isso. Max precisa aprender a se comportar, e uma surra dada por uma garota com metade do seu tamanho seria um bom ensinamento. E ele obviamente não está raciocinando. As instruções de Julia são para que eu saia pelos fundos. Se alguém estiver vigiando a casa, vai achar muito suspeito se o entregador de pizza arrastar uma pessoa até o banco do carona, ainda mais se a pessoa em questão estiver se debatendo e esperneando durante todo o trajeto. Daphne consegue compreender bem o que está acontecendo. Ela late de novo, então começa a rosnar baixinho, correndo para o meu lado assim que Katherine solta a coleira. Max balança a cabeça como se estivéssemos sendo totalmente irracionais e enfia a mão no bolso, procurando alguma coisa. Daphne rosna outra vez. “Segura esse seu cachorro, viu? Preciso ligar para o restaurante, para ver o que aconteceu com o seu pedido.” Eu me abaixo, envolvendo Daphne com um braço. Ela relaxa um pouco, mas mantém os olhinhos fixos no tal entregador. Esperamos. Depois de uma eternidade, ele diz ao telefone: “Estão dizendo que pediram duas. Não pode ser só uma.” Max escuta a pessoa do outro lado, então dá uma boa olhada para nós quatro — quer dizer, cinco, contando Daphne — e responde: “Não, acho que não vai rolar… Tudo bem… Sim”. Ele guarda o celular no bolso. “São mesmo duas. Eu já volto com a outra pizza.” “Claro. Sem problemas”, responde Connor. “Mas vamos ganhar um brinde, né? Já que o pedido veio trocado?” Max revira os olhos. “Vou ver com meu chefe.” Ele me encara por um longo tempo, olha outra vez para a porta da cozinha e vai embora. Trey e eu decidimos seguir as instruções do bilhete e saímos de fininho pela porta dos fundos. Depois de escalar a cerca do quintal, passamos escondidos pelos arbustos de cipreste do vizinho e encontramos o carro da Pizzaria Valencia esperando junto à calçada. Max voltou a falar ao celular, mas nos vigia pela janela aberta do motorista. O carro é uma lata-velha vermelha. Acho que já foi um táxi, porque possui uma divisão de metal entre os bancos da frente e o de trás. 10


Depois que nos acomodamos, Max se vira para trás, nos encarando pela abertura. “Muito bem, é o seguinte: você pode ir junto, mas vai ter que esperar no carro quando ela entrar. Questões de segurança.” “Não.” Trey abre a porta do carro, e nos preparamos para sair. “Esperem, esperem”, pede Max, erguendo a mão. “Só um minuto.” Por fim, chegamos a um acordo. Max confisca minha mochila e nossos celulares, e decide que Trey pode entrar no prédio, mas não pode me acompanhar no escritório, durante minha conversa com a srta. Waters. Não gosto muito de ficar sem minhas coisas, e menos ainda de ficar desacompanhada, mas, enquanto tiver a chave chronos, posso pedir ajuda caso acabe me metendo em encrenca. O carro tem janelas tão escuras que mal dá para ver a paisagem lá fora. Trey comenta que não acha legal vidros tão escuros assim, e Max apenas solta um grunhido em resposta. Tenho certeza de que cruzamos a interestadual já faz um tempinho, mas saber disso não me ajuda a discernir onde estamos. Uma viagem de vinte minutos tanto pode significar que já estamos em Washington, na Virgínia do Norte, quanto que ainda estamos rodando pelas ruas de Maryland. Paramos o carro diante de uma fileira de casas bem comuns e vamos andando por uma calçada qualquer em direção a uma porta mais comum ainda — e sem números para indicar qual é a casa. Pela sala de estar, fica claro que mora gente aqui. A mesinha de centro está cheia de papéis e envelopes, com um manual de computador e vários romances policiais. Trey se acomoda no sofá com um livro da Janet Evanovich, 1 e Max aponta para um pequeno escritório nos fundos, onde eu vou encontrar a chefe da Resistência, um grupo infiltrado entre os ciristas que talvez possa melhorar nossas chances contra o desastre global que meu avô está planejando.

∞ “Olha, sem querer ofender”, começo, já de cara desejando não ter falado isso. Pela minha experiência, essa frase quase sempre precede 1

Janet Evanovich (1943): escritora norte-americana. Um de seus personagens mais famosos é Stephanie Plum, uma assistente de compras de uma loja de departamentos de Trenton, Nova Jersey, que perde o emprego e se transforma numa caçadora de recompensas. Os livros da referida série alcançaram grande sucesso e figuraram no topo de diversas listas de mais vendidos. [Nota da Tradutora, daqui em diante nt]

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algum comentário que vai deixar a outra pessoa ofendida. “Mas é que não conheço você. Isto aqui pode ser uma armadilha do Saul. Então não tem a menor chance de eu lhe entregar minhas chaves ou qualquer outra coisa até estar convencida de que isto aqui não é armação.” Julia Morrell Waters inclina a cabeça um pouco para trás e me encara. Seu rosto lembra muito o da mãe. Apesar de Julia ter a pele mais escura e ser meio cheinha, as duas têm os mesmos olhos azuis intensos, e o sorriso — apesar de eu ter visto apenas um breve vislumbre, quando ela me agradeceu por ter ajudado a salvar seus pais — também é idêntico. Considerando que a mulher diante de mim é uns bons quarenta anos mais velha do que a Delia que vi pela última vez, lá na Georgia, dá para saber que Julia já foi tão estonteante quanto a mãe. Porém, o tom de voz e a postura são cem por cento herdados de Abel Waters, pelo menos o que vi nessa nossa conversa até agora. Porque acabei de questionar suas ordens — de novo —, direta e explicitamente. E, desta vez, bem na cara dela. Não é minha intenção parecer do contra, só estou exausta e não consigo entender por que este nosso encontro não poderia ter sido realizado amanhã de manhã. Faz menos de três horas que vi Abel, Delia e Kiernan saindo do porão de Martha e se enfiando no banco de trás do carro de Simon, em 1938, na Georgia, todos ainda com as chaves chronos que eu pretendia resgatar. Umas poucas horas de sono não parecem uma grande exigência antes de eu ser obrigada a entrar numa discussão aos berros com a filha deles. E, apesar de me sentir meio mal por gritar com uma senhora distinta, essa Julia não está sendo nem um pouco racional. “Você sabe que poderíamos simplesmente pegar o que queremos, certo?”, rebate ela. “Ainda mais caso eu estivesse trabalhando com o Irmão Cyr…” “Saul”, corrijo entredentes. Julia já se referiu a ele como Irmão Cyrus umas cinco vezes nos últimos quinze minutos, e isso está começando a me dar nos nervos. “O nome dele é Saul Rand. Esse Irmão Cyrus não existe.” Julia fecha os olhos e suspira. “Sim. Mas é preciso aprender a medir bem as palavras quando se está infiltrado tentando acabar com uma organização tão grande e paranoica quanto a Igreja Cirista Internacional. É bom cultivar o hábito de chamar o maníaco no comando pelo único nome que vai lhe manter com vida. E o pessoal da Igreja 1 2


faz esse tipo de coisa, sabe. Eles matam pessoas, ainda mais as que possuem coisas que eles desejam e que se recusam a entregá-las. Não são do tipo que pedem com gentileza.” Bem, não dá para dizer que Julia estava pedindo com gentileza. Aquilo estava mais para uma ordem oficial de entregar tudo à Resistência. As chaves que coletamos, todas as informações que possuímos, a amostra de Six Bridges. Tudo. “Tudo bem”, respondo. “Pode chamar aquele doido como achar melhor. E, sim, não tenho dúvidas de que você poderia muito bem fazer como o pessoal de Saul e foçar a barra, tomando qualquer coisa que quisesse. Mas saiba que a gente com certeza resistiria. E, se qualquer um de nós acabasse machucado, não haveria a menor chance de eu trabalhar ao seu lado.” Enquanto falo, fico atenta à reação dela, já que isso tudo é meio que um blefe meu. Talvez essa Resistência tenha seu próprio exército de viajantes do tempo, assim como Saul. E talvez só o que eles precisem para impedir o Abate sejam as chaves e as informações que coletamos até agora. Mas algo nos olhos de Julia me diz que estou errada. E, considerando o comportamento de todos da Resistência que já encontramos, acho que eles não teriam hesitado em usar a violência, se tivessem essa opção. Se não precisassem tanto de mim, eles podiam ter simplesmente invadido nossa casa e tomado o que quisessem. E acho que a única coisa que tenho a oferecer é minha habilidade com a chave chronos. Enquanto eu falo, Julia não para de tamborilar os dedos indicador e médio no tampo da mesa, num ritmo rápido e constante, porém sem fazer barulho. Ela parece esperar que eu continue, então acrescento: “A menos que você já tenha tudo sob controle, não é? Kiernan…” Julia faz uma careta quando digo o nome dele, mas não me interrompe. “Kiernan”, repito, “tinha certeza de que as chaves dos ciristas são as mesmas da época de seus pais, do futuro. As chaves dos historiadores que não estavam no campo naquele dia. Ainda estamos trabalhando com essa hipótese?” Ela assente, ainda tamborilando os dedos. Vejo um rolo de fita no tampo da mesa, e tenho que me segurar para não colar as mãos dela nos braços da poltrona. Acabo me resignando a simplesmente encarar os dedos dela até que Julia enfim para com aquilo, então pergunto: “Então você precisa da minha ajuda para recuperar essas chaves?”. “Isso… facilitaria tudo”, admite Julia, a contragosto. 13


“Está bem, então. Se quer minha ajuda, vai ter que aceitar minhas condições.” “E que condições são essas?” Ainda não tive tempo de pensar direito no que quero dela, então prefiro dar uma resposta meio vaga. “Primeiro de tudo: eu decido quem vai ficar no meu time. Quero trabalhar com gente que conheço, gente em quem eu confio.” “Já cuidamos disso. Li sobre um tal de Harvey Tilson na sua ficha, e sobre a menina Singleton.” “Que ficha? Onde você conseguiu essas informações?” “Com meus pais. Principalmente minha mãe. Fui falar com ela logo que soube que precisaríamos da sua ajuda para acabar com essa história toda.” Lembro daquela noite na casa de Martha, a primeira vez que Abel sugeriu que precisávamos de aliados. Não me lembro de mencionar Tilson, mas não é impossível. Agora… Charlayne? Por que eu falaria dela? “Não sei muito bem o que essa garota Singleton pode fazer pelo time”, começa Julia, quase como se estivesse lendo meus pensamentos, “mas o tal Tilson e o outro jovem têm se revelado bons aliados.” Ah, agora faz sentido. Esse jovem deve ser Kiernan, e ele sabia de Tilson e de Charlayne. “Então… quem mais?”, pergunta Julia. “Quem mais temos que recrutar para você se sentir a salvo e acolhida?” O tom dela me irrita um pouco, mas deixo passar. “Katherine, Connor e Trey. Meus pais…” “Por quê? Sua mãe nem sabe dessa história toda.” “É verdade, ela não sabe. Mas quero mudar isso.” “Não, Kate”, retruca Julia, recostando-se na cadeira. “Eu compreendo e admiro sua preocupação com a segurança de sua mãe, mas existem alguns detalhes muito complicados em relação à segurança de Prudence e Deborah. Sua mãe está a salvo, e manter segredo sobre essa história toda é essencial para o plano que desenvolvemos dar certo. Não podemos permitir que você desvie do cronograma para tratar de um assunto pessoal desse tipo, é muito arriscado.” Balanço a cabeça com firmeza. “Não. Minha mãe precisa saber sobre o que está acontecendo, e sou eu quem tenho que contar a ela. Não que eu não confie na sua equipe de segurança.” Esta parte não é bem verdade, já que não sei nem se confio na Resistência. “A questão 1 4


é que não vou conseguir me concentrar em mais nada até ver minha mãe em casa. Vou viajar amanhã de manhã. Katherine já concordou…” “A opinião de Katherine não conta aqui!” Julia respira fundo antes de continuar, numa voz ainda firme, mas um pouco menos ríspida: “Pelo que me contaram, ela está doente demais para tomar qualquer decisão racional. E, para ser sincera, não sei se decisões racionais são o forte dela, considerando o relacionamento de Katherine com o Irmão Cyrus. E mesmo desconsiderando isso, não vai ser nenhuma surpresa se ela botar o bem-estar da filha à frente da causa”. Isso pode não ser nenhuma surpresa para a Julia, mas, para mim, foi. Assim que Connor contou que eles tinham informações sobre o suposto local onde minha mãe e Prudence estariam na quinta-feira, comecei a mapear os pontos estáveis em Londres, pronta para viajar assim que possível. Foi Katherine quem me convenceu a esperar, alegando que eu precisava descansar antes, para chegar lá tranquila e preparada para o que teria que enfrentar. Apesar disso, ela me ajudou a encontrar o ponto estável mais próximo do hotel onde minha mãe estaria hospedada e a calcular o melhor momento para o salto. Estávamos começando a discutir os detalhes do plano quando Max apareceu à porta. Sei que Katherine está doente e que isso torna suas decisões um pouco arriscadas, e não tenho problemas em assumir que até senti um pouco dessa reserva que Julia expressou quando soube do relacionamento de Katherine com Saul. Mas me incomoda muito ouvir essa mulher desconhecida falando tão mal de Katherine — e ainda por cima com tanta casualidade. “O que nos leva à minha segunda condição”, continuo. “Você não vai decidir quais opiniões devem ou não ser levadas em conta. Katherine sacrificou quase toda a vida tentando consertar o desastre que Saul criou.” “Eu também sacrifiquei muito.” “Olha, pode até ser”, reconheço. “Mas Katherine tem uma vantagem quando se trata de tomar decisões que envolvem minha vida. Ela me conhece. Katherine sabe que não vou conseguir me concentrar no que você precisa que eu faça enquanto estiver preocupada com minha mãe. É por isso que vou para casa descansar assim que terminarmos aqui. Dormi muito pouco nos últimos dias. E, quando acordar, vou para Londres. Minha mãe e Prudence…” “Sim, sim”, interrompe Julia, acenando com a mão. “Já sei. Elas estarão no hotel Marriott depois de amanhã. Ficarão em quartos 15


adjacentes no quarto andar. Como eu disse, estamos monitorando todos os passos e até a comunicação particular dessas duas. Posso inclusive dizer que elas vão passar três dias lá e que…” “Por que estamos discutindo isso?”, questiono, numa voz cada vez mais alta. “Por que isso é um problema? Eu posso simplesmente usar a chave. Se não tivermos muito tempo, posso voltar exatamente para este horário assim que tiver certeza de que minha mãe está segura. Posso aparecer aqui neste exato minuto, já que você insiste tanto.” “O problema não é esse, Kate. Estamos preocupados com a possibilidade de, quando estiver em Londres, você dizer ou fazer algo que possa dar alguma pista para o pessoal de Cyrus. Eles também estão vigiando Prudence. Eles têm até um homem acompanhando sua mãe pelas viagens, para ficar de olho e reportar tudo a Simon e a Cyrus. Ela…” Julia baixa os olhos, remexendo na papelada em cima da mesa. “Bem, digamos que Prudence já não é mais o tipo de pessoa que consegue perceber quando está sendo manipulada.” Abro a boca para perguntar quem é esse espião, mas aí me lembro. “Kiernan? Não pode ser. Ele não está do lado de Saul, e muito menos de Prudence. Pelo menos sobre alguém acompanhando minha mãe você está certa. Só que Kiernan está do nosso lado. Ele está pegando informações com ela. E com Saul.” Julia abre um sorriso condescendente. “Meu pai avisou que você talvez fosse dizer algo do tipo. Mas você está enganada. Admito que no começo ficamos na dúvida sobre qual facção ele estava ajudando, mas já faz um tempo que sabemos que Kiernan está do lado de Cyrus. E está ao lado dele desde sempre, Kate.” Sinto a boca muito seca de repente, e fica difícil de respirar. É como se um gigante apertasse meus pulmões. Passo um bom tempo sem conseguir esboçar nenhuma reação, até que acabo retrucando, numa voz esganiçada: “Não acredito em você”. “Sinto muito, mas é verdade. A facção de Prudence está praticamente acabada. Quase todos os aliados dela entraram para a Resistência ou voltaram para o principal grupo da Cirista Internacional — aliás, alguns nunca tinham saído da Igreja. Permaneceram leais ao Irm…” Julia solta um suspiro impaciente, antes de se corrigir: “Permaneceram leais a Saul… esse tempo todo. E tenho certeza de que Kiernan Dunne é um desses”. “Você está enganada. Eu conheço Kiernan. Sei a quem ele é leal.” 16


Julia Morrell Waters abre um sorrisinho. “As coisas mudam, Kate. E esta deve ser a única regra imutável do universo: tudo muda.”

∞ Volto para o carro de Max vinte minutos depois, e me sento ao lado de Trey na viagem de volta à casa de Katherine. Levo um tablet criptografado e com senha, e me alertaram para só mexer nele quando estiver sob um campo da chronos — o que não é bem um problema, já que nunca estou fora de um campo da chronos. Marquei mais uma reunião com Julia na manhã de sexta-feira, num lugar que Max programou na minha chave. Julia me assegurou de que o tablet traz mais informações sobre o que está acontecendo, e que isso será mais do que o suficiente para me manter ocupada até sexta. Ela também me assegurou — um monte de vezes, aliás — que minha mãe vai ficar bem e que seria uma péssima ideia ir a Londres atrás dela. E, antes de ir embora, prometi que esperaria mais um tempo para entrar em contato com ela. Claro que a promessa era completa e absolutamente falsa. Meu único objetivo agora é juntar o máximo possível de informações a respeito de Julia, para depois cair fora. Não acredito nem um pouco no que ela contou sobre Kiernan, o que me faz questionar tudo que ouvi nessa reunião. Não tenho como falar muito na frente desse tal de Max, então, quando Trey pergunta sobre o encontro, solto uma resposta meio resmungada e sem convicção e recosto minha cabeça em seu ombro, me acomodando para a viagem de volta a Bethesda. Parece que acabei cochilando, mas, quando Trey sacode meu braço de leve, para chamar minha atenção, a sensação é de que apenas alguns segundos se passaram. Max para o carro no mesmo local onde entramos. Descemos, e já estamos a meio caminho da cerca-viva dos fundos do quintal quando ele baixa o vidro, clamando: “Ei, Kate. Você esqueceu isto aqui no banco de trás”. É um livro. Parece um diário da chronos. “Desculpe, mas não é meu. Deve ser de outra pessoa”, respondo. “Tenho certeza de que é seu.” Ele me encara com aqueles olhos escuros, então vira o rosto para trás, para uma van azul-escura estacionada 17


bem perto do meio-fio. “Toma”, insiste, empurrando o livro para mim. “Pode pegar isso logo?” Obedeço, e ele vai embora. “O que aconteceu?”, pergunta Trey. “Não tenho certeza.” Olho para a van, que em geral fica estacionada em frente à casa de Katherine. Kiernan disse que contratou essa van para vigiar a casa, para poder enviar informações falsas a Prudence sobre nossas atividades. Isso se ele estava mesmo falando a verdade. A voz que ouço é de Julia. Odeio que ela tenha plantado essa sementinha de dúvida na minha cabeça. Bem, para ser sincera, o que Julia disse só alimentou uma semente que já estava plantada. Trago essa dúvida comigo desde que vi Prudence conversando com Kiernan, e ainda por cima na casa dele. E a dúvida só aumentou quando ele mentiu sobre a presença de Simon na Georgia. Mas Kiernan já me explicou a história toda. E eu acreditei. E quero muito — muito mesmo — continuar acreditando. Dou uma última olhada para a van e saio andando com Trey. Pulamos a cerca de volta para o quintal de Katherine, e Daphne, nosso sistema de segurança infalível, soa o alarme. Encontramos Katherine e Connor na cozinha. Basta uma olhada para o rosto exausto de Katherine para saber que não foi uma boa ideia ela ter me esperado acordada. Como eu queria que Connor tivesse botado umas gotinhas de sonífero no chá dela. Katherine parece exausta. Duvido que tenha dormido muito mais do que eu nos últimos dias, mas, considerando que sou cinco décadas mais jovem e não tenho uma doença terminal, consigo lidar um pouco melhor com a exaustão. Vou tentando calcular o quanto posso dizer no caminho para a sala de estar. Tenho certeza de que estamos sendo monitorados — se não pelo pessoal de Julia, então pelo de Prudence. Ou de Saul. Ou para quem diabos Kiernan esteja trabalhando. Connor começa as perguntas antes de eu conseguir definir o que vou dizer, então passo o indicador estendido diante do pescoço, indicando o perigo iminente, e dou uma olhada na sala antes encará-lo. Ele ergue as sobrancelhas, assente de leve e desaba no sofá. Opto pela mesma mentira que contei a Julia. Não há nada que eles possam fazer para me ajudar se eu me meter em problemas, e muito menos para me impedir de ir a Londres, então… 18


“Resolvi esperar mais um pouco para ir à Londres. É muito arriscado ir agora. Julia me assegurou de que minha mãe vai ficar bem.” Trey e Connor parecem surpresos — o que era de se esperar, considerando como eu estava inf lexível quanto a isso antes do encontro com Julia. Katherine nem mesmo pisca, só me encara com a cabeça meio inclinada. Ela pousa os olhos no tablet de Julia e no diário que Max insistiu que eu pegasse, ambos no meu colo, então olha outra vez para o meu rosto. “E você tem certeza de que eles podem manter sua mãe em segurança?” “Acho que sim. Estão monitorando os movimentos dela. E não só pelos métodos tradicionais, mas também com ajuda da chave. Minha mãe e Prudence chegam a Londres depois de amanhã, e Julia disse que vão passar todo o fim de semana lá e que depois vão para uma casa de campo de Prudence na costa da Itália. Então ainda temos tempo.” Katherine pensa um pouco antes de assentir. “É, pode ser.” Ela se levanta, esfregando os olhos. “Vamos encerrar por aqui. Você precisa descansar, Kate. Todos nós precisamos.” “Então é melhor cancelar o… opa!” Connor para no meio da frase, olhando para o chão — para seu dedo mindinho, sendo esmagado pelo pé de Katherine. “Hum. Cancelar… a… festa de boas-vindas.” Não sei bem do que ele está falando, mas não posso perguntar, com todos os ciristas do mundo escutando. Bem, de qualquer forma, acho que Katherine sabe que estou mentindo. Eu me levanto e puxo o braço de Trey. “Vamos. Vou acompanhar você até a porta. Acho que uma noite de sono também lhe cairia bem… E seu pai e Estella já devem estar preocupados.” À porta, ele se inclina para um beijo de boa-noite. “Obrigada”, digo. “Pelo beijo? O prazer é meu.” “Não. Por ficar ao meu lado. Por ter ido comigo.” Ele me encara, meio incomodado. “Kate, tem certeza de que quer cancelar a viagem? Você parecia tão segura e…” “Tenho”, respondo, encostando o dedo nos lábios dele. “As coisas mudam.”

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O FIM DE UMA EMOCIONANTE JORNADA SE APROXIMA E CADA SEGUNDO É VALIOSO. A Trilogia Chronos chega ao fim de maneira arrebatadora. Depois de muitas descobertas, alterações na linha do tempo e traições, é hora de colocar um ponto final na conspiração que ameaça reescrever a história e condenar milhões de pessoas inocentes a um destino cruel. E Kate é a única capaz de fazer isso. O inimigo está mais forte do que nunca, e cada salto para o passado ou futuro pode desencadear uma nova linha do tempo e colocar o plano da Resistência em perigo.

Quando as linhas entre o que é verdade ou mentira se atenuam, Kate começa a questionar a lealdade de quem está ao seu lado, e precisa tomar atitudes drásticas que podem colocar a sua própria vida em perigo. Neste terceiro e último volume, o leitor embarca em uma trama elaborada, cheia de reviravoltas e pistas, onde cada segundo que passa pode ser fatal. Na luta contra o relógio, nos tornamos fragmentos reais do nosso tempo. Nossos sentimentos abrirão novas portas e, neste último salto temporal, ganharemos a parceria da eternidade.


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