Os Maias - O capítulo X, As corridas de Cavalos

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Os Maias Capítulo X: “As corridas de cavalos”

Trabalho elaborado por: Miguel Amorim Nº19 Pedro Cardoso Nº13 Tiago Ribeiro Nº20

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Índice: ● Resumo do capítulo: ○ O que se antecede; ○ Breve resumo; ○ O que o sucede;

● Personagens intervenientes no capítulo; ● Descrição do Hipódromo; ● As corridas; ● Objetivo e funcionalidade do episódio ● Questões sociais retratadas: ○ Desejo de imitar o estrangeiro; ○ Mentalidade provinciana; ○ Visão caricatural da sociedade feminina;

● Atualidade da intenção crítica do episódio: ○ Estado do nosso ensino; ○ Adultério; ○ O que é nacional não é bom.

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Breve resumo do capítulo O que se antecede Durante o capítulo IX, Carlos entra pela primeira vez em casa dos Castro Gomes, a pedido de Dâmaso para ver Rosa, a filha de Maria Eduarda que se sentiu mal. Também é neste capítulo que Ega vai ao baile dos Cohen e é expulso de lá, pois Cohen descobre o romance de Ega com a sua mulher. Ega fica furioso e quer desafiar Cohen para um duelo, mas Carlos e Craft chamam-no à razão. O capítulo acaba com Ega a partir de Lisboa e a ir para a casa da mãe em Celorico. Carlos é convidado pela Condessa Gouvarinho para jantar e é nessa altura que Carlos e a Condessa se beijam dando começo a uma relação adúltera.

Resumo do Capítulo O capítulo X começa com o final de um encontro entre Carlos com a senhora condessa e dá a entender que Carlos já começa a ficar farto dela. “Mas Carlos vinha de lá enervado, amolecido, sentido já na alma os primeiros bocejos da saciedade. Havia três semanas apenas que aqueles braços perfumados de verbena se tinham atirado ao seu pescoço e agora pelo passeio de São Pedro de Alcântara, sob o ligeiro chuvisco que batia as folhagens da alameda, ele ia pensando como se poderia desembaraçar da sua tenacidade, do seu ardor, do seu peso…” Carlos ao descer a Rua de S.Roque encontrou o marquês que lhe contou sobre as corridas de cavalos que se iriam realizar no domingo seguinte, Carlos vê este evento como uma oportunidade para encontrar Maria Eduarda. Quando Carlos chega ao Ramalhete revela a Dâmaso que pretendia levar os Castro Gomes a visitar a casa de Craft nos Olivais, para se aproximar de Maria Eduarda. Chega o dia da corrida, um domingo quente e de céu azul. No evento, encontrava-se “a gente do Grêmio, das secretarias e da Casa Havaneza". Carlos, o visconde de Darque, o Taveira e Craft foram ver as mulheres. Carlos pensava também em encontrar Dâmaso para lhe perguntar a razão de ele não ter trazido os Castro Gomes aos Olivais como combinado. De repente, irrompeu “uma desordem”. Um dos 4


cavaleiros magoou o juiz das corridas, acusando-o de “compadrice e ladroeira”, o que agitou o hipódromo e obrigou algumas pessoas a fugir do recinto. O marquês criticou o país, afirmando que “coisas civilizadas de lá de fora necessitam primeiro de gente educada”. Carlos viu a Gouvarinho, que lhe disse que tinha de ir para o Porto no dia seguinte a pedido do seu pai que tinha saudades dela. Como o conde não ia, queria que Carlos a acompanhasse e explicou-lhe o plano de passarem uma noite num hotel em Santarém, contudo Carlos não gostou da ideia e recusou. O evento estava a ser um fiasco, a maior parte das pessoas não tinha nenhum interesse pelas corridas. Taveira propõe que façam apostas para animar o evento. A Carlos tinha saído “Vladimiro”, uma “pileca”, no sorteio da aposta e estava decidido apostar tudo nele. A maior parte das pessoas apostam no “Minhoto”. Apesar de não ser o favorito, “Vladimiro” venceu a corrida e Carlos ganhou 12 libras. A ministra da Baviera lembrou a Carlos o provérbio “Sorte ao jogo, azar no amor”. Mais tarde, Carlos encontra Dâmaso que lhe disse que Castro Gomes tinha partido para o Brasil e tinha arrendado uma casa, no prédio de Cruges, para a mulher permanecer nos três meses de ausência. Carlos ficou feliz com a possibilidade de poder encontrar-se com Maria. A condessa Gouvarinho voltou a falar-lhe na ida a Santarém, mas Carlos respondeu que considerava o plano insensato. Contudo, confirmou o encontro. Quando as corridas terminaram, Carlos descia o Chiado e passou pelo prédio de Cruges com vontade de ver Maria, mas o maestro não se encontrava em casa, então regressou ao Ramalhete. Ao chegar a casa recebe um bilhete da senhora Castro Gomes, que lhe pedia para visitar um familiar doente. Assim o capítulo acaba com Carlos a radiar de felicidade, ansioso para o seu encontro com Maria Eduarda.

O que se sucede Carlos visita a Sra. Castro Gomes, e descobre que o seu verdadeiro nome é Maria Eduarda. A governanta (Miss Sara) era quem estava doente (tinha uma bronquite). Carlos observa-a, passa-lhe a receita e avisa Maria Eduarda que esta terá de observar Miss Sara diariamente.

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Nessa mesma noite, Carlos ia ter com a condessa de Gouvarinho para uma fantástica noite em Santarém, porém, Carlos começava a repudiá-la e a odiá-la e estava decidido a acabar a sua relação. O Conde de Gouvarinho decide à última da hora, ir com a mulher para o Porto, o que convém a Carlos, assim como a morte de um tio de Dâmaso em Penafiel deixando os seus “entraves” fora de Lisboa. Nas semanas que se seguem, Carlos vai-se familiarizando com Maria Eduarda graças à doença que Miss Sara possuía. Dâmaso acaba por voltar e vai visitar Maria Eduarda. Ao chegar lá, ele vê Carlos com a cadela de Maria (Niniche) ao colo, que lhe rosna e ladra, deixando-o assim cheio de ciúmes.

Personagens do Capítulo X Carlos da Maia Carlos da Maia era alto, de pele branca e olhos negros irresistíveis. Era um homem culto e bem formado, diletantista e cosmopolita, mostrando-se aborrecido no início do capítulo, mas ao decorrer dele começa a ficar entusiasmado.

Condessa de Gouvarinho Mulher do conde de Gouvarinho, era uma mulher atraente, sedutora e impetuosa. Envolve-se com Carlos da Maia e vive essa relação com intensidade e paixão, fazendo várias exigências ao seu amante Carlos (tal como a de ir a Santarém com ela passar uma noite num hotel). Carlos cansa-se dela e acaba a relação, deixandoa inconsolável.

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Craft Homem de origem inglesa com poderio monetário, é amigo de Carlos e Ega. Trabalhava como colecionador de antiguidades e tal como Carlos conseguia observar criticamente tudo o que o rodeava. Ele defende a arte e é um homem de hábitos rígidos.

Dâmaso Salcede Dâmaso é “um rapaz baixote, gordo, frisado como um noivo de província, de camélia ao peito, plastrão azul-celeste”. Representa, no romance, o novo-riquismo e o provincianismo, ideia vincada pela expressão “chique a valer” que utiliza frequentemente. Considera-se alvo da admiração das mulheres e tem como modelo Carlos da Maia, que tenta imitar. Ao longo do seu romance, sobressai a sua vaidade, presunção, mesquinhez e a cobardia. Cultiva a íntegra e é pouco polido nos gestos e na linguagem, o que contrasta com a imagem civilizada que quer ostentar.

D. Maria da Cunha Era uma mulher encantadora de beleza estonteante, podemos também acrescentar ao seu cardápio de qualidades o facto de ser uma mulher muito culta e com níveis de etiqueta altíssima. Fazia parte da alta sociedade e não perdia um evento social da época.

Tomás de Alencar Alencar é um poeta romântico que representa um tipo de literatura e de arte ultrapassado numa época dominada pelo Realismo. É um “homem alto, com face encaveirada, olhos encovados e românticos bigodes.”. Tal como Maria da Cunha, é uma presença assídua nos eventos sociais lisboetas. Alencar representa um “patriota

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à antiga”. No final do romance, é visto por Ega como o “único português genuíno” numa “Lisboa postiça”.

Maria Eduarda Neste capítulo, Maria Eduarda, para Carlos, continua a ser uma mulher misteriosa. Apenas a conhece por Sra. Castro Gomes. Contudo, pelo trocar de olhares, Carlos acha-a uma mulher extremamente bela, com lindos cabelos de ouro. Maria Eduarda tem uma presença distinta e ficamos a saber por Dâmaso que tem um bom gosto literário, mostrando-se uma mulher de cultura.

Outras personagens Clifford: dono da “Mist”, égua que depois acaba por não correr. O “grande sportsman de Córdova.

Taveira: conhecido da família Maia, frequentador do Ramalhete. Queria animar as corridas e estava disposto a apostar três mil reis na "Mist". Visconde de Darque: “...um gentleman loiro” dono do “Rabino” e do “Vladimiro”. O único criador de cavalos português na Corrida. Um homem muito culto na área dos cavalos, um “dicionário”. Viscondessa de Alvim: mulher “nédia e branca”, conhecida dos Maias. Joaninha Vilar: amiga da Viscondessa de Alvim. Uma mulher “cheia” e de “olhos pestanudos”. Ministra da Baviera, Baronesa de Craben: “enorme, empavoada, com uma face maciça de matrona romana, a pele cheia de manchas de cor de tomate, a estalar dentro de um vestido de gorgorão azul com riscas brancas...”

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Comissário D. Pedro Vargas: primo do Marquês. Embebeda-se e causa confusão. Steinbroken: Embaixador da Finlândia que aposta no “Minhoto” e perde.

Descrição do Hipódromo O Hipódromo está situado numa colina e é um local com condições bastante precárias entre as quais: a tribuna real forrada de um baetão vermelho de mesa de repartição; as tribunas públicas com o feitio de traves mal pregadas, mal pintadas e com fendas; o recinto da tribuna fechado por um revestimento de madeira. As pessoas que estavam presentes no hipódromo eram bastante desorganizadas e não sabiam ocupar os seus próprios lugares «... havia uma fila de senhoras quase todas de escuro encostadas ao rebordo, outras espalhadas pelos primeiros degraus; e o resto das bancadas permanecia deserto e desconsolado...».

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As Corridas 1.ª corrida: a do 1.º Prémio dos “Produtos”

Na primeira corrida para além de não existirem apostas, também não existia interesse nenhum pela mesma, tendo em conta que todos os homens fumavam e contemplavam as mulheres de costas voltadas para a pista. Esta corrida termina sem se saber quem a ganhou e onde se passam momentos de tensão devido a vários insultos e pancadaria por causa de uma burla.

2.ª corrida: a do Grande Prémio Nacional

Nesta corrida estão inscritos quatro cavalos em que o favorito é “Rabino”, mas pelo entretenimento Carlos decide apostar em “Vladimiro”, enquanto todos os outros apostam contra ele a fim se aproveitarem daquela “fantasia de homem rico”. Contra todas as probabilidades o cavalo em que Carlos apostou, conseguiu ganhar a corrida o que lhe permite vencer a poule e isso provoca a irritação dos restantes, que perderam.

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3.ª corrida: a do Prémio de El-Rei

Esta é uma corrida onde nada de muito emocionante acontece, apenas um cavalo solitário atravessa a meta, sem se apressar, num galope pacato, e só muito tempo depois chega um outro cavalo, este encontrava-se já bastante cansado e fraco. O segundo cavalo demorou tanto a aparecer que o jóquei do cavalo vencedor se encontrava a conversar com os amigos, encostado à corda da pista.

4.ª corrida: a do Prémio da Consolação

Na última corrida o interesse havia desaparecido e voltava a reinar a indiferença em relação às corridas. No fim da corrida, à saída do Hipódromo, Vargas, que se encontrava bastante bêbado, acaba por esmurrar um criado de bufete.

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Objetivo e Funcionalidade do Episódio Neste episódio, o autor critica e caricatura uma sociedade que apoia a organização das corridas devido ao seu desejo de imitar o que de melhor há no estrangeiro. Porém, como em Portugal não havia a tradição nem o hábito de realização de tais eventos, em vez de um grande acontecimento social, assistimos a um grande fiasco, a mais uma manifestação do gosto pela aparência e pelo postiço, em detrimento daquilo que seja autêntica e genuinamente português.

Questões sociais retratadas A sociedade burguesa lisboeta queria igualar Lisboa às demais capitais europeias, por isso optaram pelas corridas de cavalos em vez das corridas de touros (touradas), algo característico de Lisboa. O hipódromo (recinto onde se realizam as corridas de cavalos) mais parecia um arraial, as pessoas não sabiam como se comportar, as senhoras traziam vestidos de ir à missa, o buffet era horrível, e no final da primeira corrida houve até uma cena de pancadaria. A sociedade lisboeta encontrava-se atrasada em relação aos outros países e faltavalhe carácter. Era uma cidade sem originalidade, convencida de que apenas o que era de fora era chique, sem orgulho nacional, com necessidade de copiar o estrangeiro. As pessoas tinham uma mentalidade provinciana, mostravam-se totalmente desinteressadas pelas corridas e as mulheres estavam vestidas de uma forma exagerada. Este evento serviu de palco para a ostentação da classe burguesa. No entanto, apesar de as pessoas quererem mostrar toda a sua majestosidade, tiveram comportamentos inadequados. Assim este episódio ridiculariza a sociedade lisboeta da época.

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Desejo de imitar o estrangeiro A sociedade da época achava-se chique e achava que só o que vinha do estrangeiro é que era bom o que levava a quererem imitar países como Inglaterra e França. Mas Afonso da Maia reprova constantemente o querer imitar o estrangeiro, pois é um verdadeiro patriota. No lugar das corridas de cavalos, ele achava que se devia fazer uma tourada, dizendo “o verdadeiro patriotismo, talvez (…) seria, em lugar de corridas, fazer uma boa tourada.” Na minha opinião, nas páginas 319 e 320, a discussão entre Afonso e Dâmaso é um ótimo exemplo deste desejo de querer imitar o estrangeiro, pois a mentalidade de que o nacional não é chique é bem aqui retratada. Dâmaso aqui representa essa sociedade que desvaloriza as tradições portuguesas, que na tentativa de elevar o seu país copia o estrangeiro. No entanto, nada do que encontramos no Hipódromo tem o requinte, a elevação ou o espírito civilizado das corridas europeias. A preparação e a decoração do espaço são feitas sem cuidado e sem elegância “dos dois lados da tribuna real forrada de um baetão vermelho, de mesa de repartição, erguiam-se duas tribunas públicas, com o feitio de traves mal pregadas, como palanques de arraial”. O ridículo do evento emerge também do facto de os participantes recorrerem a estrangeirismos do campo lexical das corridas de cavalos (“jockey”, “High Life”, “gentleman”, etc.) para se sentiram chiques e cosmopolitas.

"- O verdadeiro patriotismo, talvez - disse ele - seria, em lugar de corridas, fazer uma boa tourada. Dâmaso levou as mãos à cabeça. Uma tourada! Então o Sr. Afonso da Maia preferia touros a corridas de cavalos? O Sr. Afonso da Maia, um inglês!..." (...) "Dâmaso no entanto jurava a Afonso compenetradamente que gostava também muito de touros. Ah, lá nessas coisas de patriotismo ninguém lhe levava a palma... Mas as corridas tinham outro chique! Aqueles Bois de Boulogne, num dia de Grand-Prix, hem!... Era de embatucar!" - PÁG 319/320 // "Aceitou um copo de Champagne, e teve muito prazer em conhecer o Sr. Clifford...

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- E que me diz você a esta sensaboria?- exclamou ele logo, voltando-se para Carlos. Enquanto a si estava contente, pulava... Aquela corrida insípida, sem cavalos, sem jóqueis, com meia dúzia de pessoas a bocejar em roda, dava-lhe a certeza que eram talvez as últimas; e que o Jockey Club rebentava... E ainda bem! Via-se a gente livre dum divertimento que não estava nos hábitos do país. Corridas era para se apostar. Tinha-se apostado? Não? Então histórias!... Em Inglaterra e em França, sim! Aí eram um jogo como a roleta ou como o monte... Até havia banqueiros, que eram os bookmakers... Então já viam! (...) E a cada frase, sacudia os ombros, furiosamente. Depois, de um trago, esvaziou o seu copo de champanhe, repetiu que tinha muito prazer em conhecer o Sr. Clifford, rodou sobre os tacões, saiu, bufando, entalando mais debaixo do braço o chicote que tremia na ponta como ávido de vergastar alguém. Craft sorria, batia no ombro de Clifford. - Veja você! Cá nós, velhos portugueses, não gostamos de novidades, e de sports... Somos pelo toiro..." - PÁG 334/335

Mentalidade provinciana Toda a alta sociedade, incluindo o rei, revelou atitudes provincianas. Não só pelo seu mau gosto na decoração do hipódromo, na pobre seleção da música e na organização do evento, mas também pelos seus comportamentos e a pela sua apresentação. Ao contrário de um ambiente festivo e elegante, simultaneamente descontraído e casual, característico das corridas de cavalos, as pessoas foram vestidas de forma exagerada e mostravam-se entediadas, totalmente desinteressados pelas corridas. Ainda assim apesar de tentarem manter uma boa imagem, o espírito português - sem educação, arruaceiro, cobiçoso - vem à superfície, quando há desacordo e a situação evolui para o insulto e para a pancadaria, porque há dúvidas sobre o resultado de uma corrida. Um cenário que deveria ostentar a exuberância e o colorido de um acontecimento mundano, como as corridas de cavalos, demonstra uma imagem provinciana indesmentível.

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“No recinto em declive, entre a tribuna e a pista, havia só homens, a gente do Grémio, das secretarias e da Casa Havanesa; a maior parte à vontade, com jaquetões claros, e de chapéu-coco; outros mais em estilo, de sobrecasaca e binóculo a tiracolo, pareciam embaraçados e quase arrependidos do seu chique. Falava-se baixo, com passos lentos pela relva, entre leves fumaraças de cigarro. Aqui e além um cavalheiro, parado, de mãos atrás das costas, pasmava languidamente para as senhoras. Ao lado de Carlos dois brasileiros queixavam-se de preço dos bilhetes achando aquilo tudo uma tremenda sem sabedoria ou como diziam uma "sensaboria de rachar.” PÁG 325/327

Visão Caricatural da Sociedade Feminina As mulheres estavam todas na tribuna, todas elas vestidas de forma inapropriada. Com vestidos de missa, sérios, algumas delas com chapéus emplumados que se começavam a usar. O comportamento da assistência feminina “que nada fazia de útil” e a sua vida são no seu todo caricaturados. O traje escolhido não era o mais correto face à ocasião, daí até alguns dos cavalheiros se sentiam embaraçados no seu chique. As senhoras vestidas com a roupa da moda não se adequavam ao evento, muito menos à restante toilette. Assim, o ambiente que devia ser requintado, mas, ao mesmo tempo, ligeiro como compete a um evento desportivo, era deturpado, pela falta de gosto pelo ridículo da situação que se queria requintada sem o ser. É também criticada a falta de à-vontade das senhoras da tribuna que não falavam umas com as outras e que, para não desobedecer às regras de etiqueta, permaneciam no seu posto, mas constrangidas. A exceção é D. Maria da Cunha que abandona a tribuna e se vai sentar perto dos homens. É, resumidamente, uma contradição flagrante entre o ser e o parecer. Tanto o espaço físico como o espaço social eram postiços.

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“- Vamos nós ver as mulheres, disse Carlos. Seguiram devagar ao comprido da tribuna. Debruçadas no rebordo, numa fila muda, olhando vagamente, como duma janela em dia de procissão, estavam ali todas as senhoras que vêm no High-life dos jornais, as dos camarotes de S. Carlos, as das terças-feiras dos Gouvarinhos. A maior parte tinha vestidos sérios de missa. Aqui e além um desses grandes chapéus emplumados à Gainsborough, que então se começavam a usar, carregava duma sombra maior o tom trigueiro duma carinha miúda. E na luz franca da tarde, no grande ar da colina descoberta, as peles apareciam murchas, gastas, moles, com um baço de pó de arroz.” - PÁG 328

Atualidade da intenção crítica do episódio Estado do nosso ensino Há uma crítica ao ensino em Portugal quando Craft comenta com o Marquês que o ensino no nosso país devia ser como lá fora: gratuito e obrigatório. No entanto, ele está a referir-se ao ensino naquela época. Hoje em dia, o ensino português tem, a nosso ver, qualidade. Desde há alguns anos que se tornou obrigatório a escolaridade até aos 18 anos e, recentemente, também se tornou gratuito, visto que o governo oferece os manuais escolares. Além disso, Portugal tem não só um ensino obrigatório e gratuito, mas também de excelência, visto que uma formação em Portugal é reconhecida em todo o mundo e o nosso país tem universidades de renome internacional, produzindo excelentes profissionais em áreas como a engenharia, as ciências, a medicina, etc. Resta à sociedade portuguesa criar oportunidades de trabalho que permitam aos excelentes profissionais que saem das universidades ficarem no país. Isto, sim, é uma crítica a apontar.

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“Nós não temos os jogos de destreza das outras nações - exclamava ele, bracejando pela sala e esquecido dos seus males. - Não temos o cricket, nem o foot-ball, nem o running, como os Ingleses; não temos a ginástica como ela se faz em França; não temos o serviço militar obrigatório que é o que torna o alemão sólido... Não temos nada capaz de dar a um rapaz um bocado de fibra. Temos só a tourada... Tirem a tourada, e não ficam senão badamecos derreados da espinha, a melarem-se pelo Chiado! Pois você não acha, Craft? Craft, do canto do sofá, onde Carlos se fora sentar e lhe falava baixo, respondeu, convencido: - O que, o touro? Está claro! o touro devia ser neste país como o ensino é lá fora: gratuito e obrigatório.” PÁG. 319/320

Adultério A Gouvarinho representa aqui o adultério. Durante todo este capítulo, sempre que esta personagem entra em ação, ela tem o objetivo de estar perto de Carlos e querer falar com ele, tentando-o convencer do seu plano de ir passar uma noite a um hotel em Santarém. Podemos aplicar esta realidade ao presente, visto que a traição ainda é algo bastante comum na sociedade atual. No entanto, apesar de ser algo comum, o adultério não é visto de uma forma tão escandalosa como antigamente o era. Isto acontece, na nossa perspetiva, pois os casamentos combinados já não são algo que aconteça em Portugal e a existência de relações maritais mais livres (ou seja, aquelas pessoas que apenas se juntam) e de divórcio levam a que as situações de adultério ou traição sejam resolvidas de uma forma menos vergonhosa do que andar à bengalada, na mulher ou no marido, dependendo dos casos, e no fim ficarem ambos felizes outra vez e irem passar umas férias à França para esquecer o que aconteceu.

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O que é nacional não é bom Ainda nos dias de hoje, muita gente partilha a opinião de que o que é bom tem de vir de fora, sem dar valor às inúmeras qualidades daquilo que acontece no nosso país, deixando escapar diversos talentos e oportunidades de nos afirmarmos. Ao longo dos anos temos vindo a melhorar bastante nesse sentido. É óbvio que ainda dependemos e inspiramo-nos noutros países de maior influência, mas não ficamos propriamente muito atrás. Apesar de sabermos que nem tudo o que é nacional tem qualidade, é importante destacar, a nossa produção de excelência em certas áreas como o desporto, onde recentemente conseguimos vencer três medalhas de ouro em diferentes modalidades (triplo salto masculino e feminino ; lançamento do peso) no Europeu de Atletismo e como é óbvio também temos o melhor jogador do mundo Cristiano Ronaldo;a ciência (Elvira Fortunato que foi premiada pela Comissão Europeia com o Prémio Impacto Horizonte 2020 pelas suas inovações científicas); a fabricação de produtos têxteis e a produção de calçado (produzimos material têxtil usado na NASA); sem esquecer a nossa literatura com as grandes obras que nos pertencem, como Os Lusíadas, Os Maias, A Mensagem, e as obras do nosso prémio Nobel da Literatura que tanto nos orgulha.

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FIM ES Ermesinde

2021

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