novos
do
caminhos velho
Chico
ana clara andrea muner
Produção e Edição: Andrea Muner Textos: Ana Clara Muner Andrea Muner Fotos: Ana Clara Muner Andrea Muner Desenho dos mapas: Andrea Muner Colaboração: Ana Clara Muner
imagem da capa: Homem atravessa a barco o Rio São Francisco durante o nascer do sol. Amparo de São Francisco (SE) - 12/02/2017 Andrea Muner
Este catálogo foi feito para a disciplina AUP 0342, ministrada pelo professor dr. Francisco Inácio Homem de Melo, na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Estado de São Paulo, FAUUSP.
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caminhos velho
Chico
ana clara andrea muner
A exposição fotográfica Novos caminhos do Velho Chico mostra as novas direções e transformações do Rio São Francisco após sua transposição. Depois de percorrerem os três braços de seu leito rumo a jusante, as fotógrafas Ana Clara Muner e Andrea Muner retratam a realidade atual do Velho Chico, que passa por uma de suas maiores secas, e o seu entorno, que muda constantemente, afetando sua fauna, flora e seus moradores, que são sublocados, tendo que se adaptar à uma nova realidade. Passando pelas cidades próximas à sua foz e pelos Eixos Leste e Norte de sua transposição, este catálogo contará com a ilustração e descrição das experiências e relatos, cujas fotógrafas vivenciaram enquanto percorriam a região mais seca do Brasil. Há rumores entre os nativos que daqui há alguns anos o Rio São Francisco vai secar: como ele sobreviverá depois de sua transposição e seis barragens? A exposição Novos Caminhos do Velho Chico traz registros de paisagens, pessoas, caminhos e seus novos rumos.
acima : Barco na beira do Rio São Francisco. Propriá (SE) - 11/02/2017 Ana Clara Muner
à direita: Crianças brincam nas águas do Rio São Franciso. Piaçabuçu (AL) - 14/02/2015 Andrea Muner
à esquerda: Barqueiro faz travessia de Entremontes (AL) para Pão de Açúcar.
Pão de Açúcar (AL) - 09/02/2017 Andrea Muner
abaixo: Meninos brincam no pier do Rio São Francisco.
Piaçabuçu (AL) - 09/02/2015 Andrea Muner
Piaçabuçu- Alagoas Piaçabuçu é a última cidade do Rio São Francisco e primeira cidade ao sul alagoense. A cidade transborda o Rio, e os moradores tomam banho no fim da tarde em suas margens, enquanto as crianças brincam incansavelmente. A relação do Rio, da água e dos ribeirinhos é exuberante. Piaçabuçu tem muita história: suas casinhas mais antigas são do período colonial, assim como Penedo, que é a penúltima cidade alagoense próxima a Foz, e um grande atrativo de turistas devido à sua arquitetura ainda conservada, além das praias ribeirinhas, que ficam lotadas mesmo em plena segunda feira.
à esquerda: Menino brinca com aspersor em pastos irrigados próximos ao Rio São Francisco. Pão de Açúcar (AL) - 10/02/2017 Ana Clara Muner
à direita: Meninos brincam na margem do Rio São Francisco. Propriá (SE) - 11/02/2017 Ana Clara Muner
Percorrendo o Rio São Francisco alguns quilômetros a montante da Foz, a seca terra de cor marrom alaranjado faz com que apenas as árvores de troncos contorcidos cresçam. Lá, é terra do Cangaço e o turismo fomenta-se, agora, por onde Lampião passou e pela própria beleza natural do Rio. Já na Foz do Velho Chico, a paisagem é outra, depois
Dona de casa, senhora pousa para a foto. Propriá (SE) - 11/02/2017 Andrea Muner
de percorrer alguns quilômetros de verde e fresco mangue, chega-se ao encontro do Rio com o mar, onde as poucas árvores são, dessa vez, coqueiros que se destacam no meio das dunas de areia. Neste local, só se chega de barco e os moradores das cidades próximas aproveitam os que chegam cheios de turistas para vender seu artesanato.
Barcos nas margens do Rio São Francisco.
Entremontes (AL) - 09/02/2017 Ana Clara Muner
à esquerda: Moradores de Piaçabuçu vão até a Foz vender artesanato.
Foz do Rio São Francisco (AL) - 14/02/2017 Andrea Muner
à direita: Barqueiro faz travessia no Rio São Francisco de Niterói (SE) para Pão de Açúcar (AL).
Pão de Açúcar (AL) - 10/02/2015 Andrea Muner
Cabrobó - Pernambuco
à esquerda: Mulher representante do povo indígena Truká e sua filha. Cabrobó (PE) - 08/09/2017 Andrea Muner
Cabrobó fica a mais ou menos uma hora de Salgueiro. A estrada de carro está em boas condições e, percorrendo a seca paisagem, pode-se buscar os infinitos Mandacarus e Xique-Xiques entre as árvores sem folhas e de troncos contorcidos. Cabrobó é também o leito do Rio São Francisco. A cidade respira o Rio e seus moradores falam do Velho Chico como um velho amigo, um que nunca os deixou na mão, que fornece a eles e aos animais comida, água, trabalho e lazer. Sua relação é de grande respeito, e foi assim que os índios daquela região foram ensinados a crescer e viver. A Ilha de Assunção, que fica na região de Cabrobó, é terra demarcada do povo indígena Truká. Antes mesmo da primeira barragem ser erguida no Rio, os índios relatam como era a sua dinâmica de colheita, plantio e pesca, que aconteciam em suas margens, conforme a várzea. Depois de Sobradinho, em 1979, a vazão do Rio mudou, pois é completamente monitorada pelo o homem, impossibilitando que os índios possam produzir como faziam.
Pode-se perceber, então, que Cabrobó já passou por transformações diversas, devido às obras de grande porte ao longo do Rio. Hoje, com uma das maiores secas que a região passa, os moradores reclamam que, se antes o Rio batia quase na porta de casa, agora não se consegue nem passar de barquinho a motor sem ter que descer para empurrar. “O Rio está morrendo, como é que se transpõe sangue de um anêmico?” - relata Neguinho, cacique Truká.
Os índios Tumbalalá também concordam com os Truká ao enfatizarem que não são contra a Transposição. Nenhum deles negaria água a quem tem sede. O que eles não concordam é com a maneira em que está sendo administrada, ou como a obra foi excludente em seu período projetual. (Contam que certa vez tentaram participar de uma audiência pública, mas a polícia barrou a ponte de saída da Ilha de Assunção.)
Na captação do Rio São Francisco para o Eixo Norte, as águas estão paradas esperando o término das obras. Cabrobó (PE) - 08/09/2017 Andrea Muner
à esquerda: Mulher abre castanhas de cajú torradas para vender. Salgueiro (PE) - 07/09/2017 Andrea Muner
Menino, indígena Truká, come queixada de coco no porta de casa. Cabrobó (PE) - 08/09/2017 Andrea Muner
Durante o período de obra, fez-se grande propaganda chamando as pessoas para trabalhar. Principalmente aqueles que viviam da agricultura, viram aí uma grande oportunidade. Porém, o custo de vida na cidade se elevou e, quando a obra acabou, essas pessoas ficaram desempregadas. A cidade de Cabrobó também não soube investir o dinheiro que entrou, e nenhum hospital ou escola foi ampliado durante o período de pico. Dentre o verde que cresce às margens do Rio e que se contrasta do marrom alaranjado das cores do Sertão, há um amontoado de pedras realocadas, que rasgam a paisagem, formando o início do canal de captação do Eixo Norte. Ainda que a proporção captada em relação a vazão do Rio seja baixa, o cenário é conflitante e de se abrir a boca, para obra de tal dimensão.
à esquerda: Pôr-do-sol em um dos braços do Rio São Francisco.
Cabrobó (PE) - 08/09/2017 Andrea Muner
à direita: Chegada da água da Transposição ao Rio Paraíba.
Monteiro (PB) - 06/09/2017 Andrea Muner
Monteiro - Paraíba Monteiro tem cerca de 33 mil habitantes. A cidade, que cresceu muito nos últimos anos, está localizada em um dos pontos mais importantes da Transposição: na chegada das águas do São Francisco, através do canal do Eixo Leste, que desaguam no início Rio Paraíba. Como uma das principais receptoras, a região, que sofria com a seca, hoje tem outras perspectivas de crescimento urbano e rural. Antes e durante o período de obra, o número de pessoas que migrou foi alto e, até hoje, ainda há muitos trabalhadores que estão na manutenção da Transposição ou que passaram a trabalhar na construção das novas casas. A especulação imobiliária é grande, e é possível notar tanto condomínios privados quanto do Minha Casa Minha Vida sendo construídos no entorno da cidade. E as obras não são só no setor imobiliário, seguindo uma das condicionantes para que as águas passassem pela cidade, Monteiro, que antes tinha cerca de 60% de saneamento básico, hoje conta com mais de 95%.
Na zona rural também houveram mudanças: muitas famílias que tiveram suas casas removidas para dar espaço para a Transposição passar, foram realocadas para as Vilas Produtivas Rurais (VPRs), onde hoje aprenderam a viver em comunidade. A VPR de Lafayette fica a 4km de Monteiro e, apesar de todas as casas possuírem o mesmo modelo de construção, nenhuma é igual a outra, os moradores já se apropriaram do terreno que receberam e começaram a plantar ou reformar a casa. Mesmo com a seca e ainda na espera do fornecimento de água para irrigação, há bastante verde em cada lote.
à esquerda: Homem pesca no encontro das águas do Rio São Francisco ao Rio Paraíba. Monteiro (PB) - 06/09/2017 Andrea Muner
à direita: Moradora teve sua casa realocada para a Vila Produtiva Rural Lafayette. Monteiro (PB) - 06/09/2017 Andrea Muner
à esquerda: Começo do Rio Paraíba, agora, perene. Monteiro (PB) - 06/09/2017 Andrea Muner
à direita: Trabalhadores arrumam estrada da obra da Transposição do Rio São Francisco. Monteiro (PB) - 08/09/2017 Andrea Muner
Os moradores da VPR Lafayette não são as únicas famílias que estão na espera das águas do São Francisco para agricultura; quando a obra passou, muitos poços artesianos que foram investimento de moradores, secaram. Hoje, o canal da Transposição passa a menos de 100m e a população ainda não tem acesso a essa água. O Ministério da Integração passou a abastecer essas famílias com carros pipas, mas o que as pessoas da região se indagam é que se hoje quem banca financeiramente a água é o Governo Federal; quem o fará no futuro?
à esquerda: Trecho canalizado da Transposição do Rio São Francisco no Eixo Leste, já em funcionamento.
Monteiro (PB) - 06/09/2017 Andrea Muner
à direita: Roupas secam na cerca que divide as casas na Vila Produtiva Rural Lafayette. Monteiro (PB) - 06/09/2017 Andrea Muner
As mudanças são muitas. Hoje, a cidade de Monteiro, que fica em pleno Sertão do Cariri, tem praticamente uma prainha a beira rio, pois o Rio Paraíba, que antes corria só em dias de chuva, agora, corre cerca de 4m³/s de água e está completamente perenizado. De que maneira será, que tanta água assim, afeta a paisagem ao redor? Pessoas que tinham seus vilarejos cortados pelo Rio Paraíba, o atravessavam com a água no máximo até o joelho. Depois que o Rio foi perenizado, elas têm que desviar todo o seu caminho para chegar a menos de 5m de distância.
à esquerda: Caminhões pipa abastecem no Reservatório de Barreiros. Sertânia (PB) - 07/09/2017 Andrea Muner
acima: Sexta estação de bombeamento no Eixo Leste da Transposição. Sertânia (PB) - 06/09/2017 Andrea Muner
Água da Transposição passa pelo Rio Paraíba, agora, perene. Caraúbas (PB) - 05/09/2017 Andrea Muner