revolucao farroupilha

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A Cartilha Farroupilha


Vinte Proposições Preambulares

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A Cartilha Farroupilha

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Vinte Proposições Preambulares

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

C822c Coronel, Luiz, 1938A cartilha farroupilha / Luiz Coronel ; Danúbio Gonçalves. – Porto Alegre: Mecenas Editora, 2014. 136 p. 1. Literatura brasileira – poesia. 2. Literatura sul-rio-grandense – poesia. 3. Revolução Farroupilha. I. Gonçalves, Danúbio. II. Título. CDU: 821.134.3(816.5)-1 CDD: B869.1 65

Bibliotecária responsável: Grazieli de Andrade Pozo CRB10/1552 Índice para catálogo sistemático: 1. Poesias : Literatura brasileira 2. Poesias : Literatura sul-rio-grandense 3. Revolução Farroupilha : História : Rio Grande do Sul

Editora: Mecenas Editora Sistematização/Organização: Nádia Franck Revisão: Daniela Damaris Neu Concepção gráfica: TAB Marketing Editorial Cordenação: Simone Pontes Projeto gráfico e diagramação: Carlos Denisieski Ilustração: Danúbio Gonçalves Tiragem: 2.600 exemplares Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida, arquivada ou transmitida de nenhuma forma ou por nenhum meio sem permissão e por escrito da editora, do autor e de seus representantes legais.


4ª edição revisada | Porto Alegre | 2014 Mecenas Editora | TAB Marketing Editorial



A Marcelo Zaffari, em reconhecimento ao seu fĂŠrtil e profundo amor pelo Rio Grande.



Sumário

Vinte Porposições Preambulares

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Vinte e Cinco Cantos Iniciais

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Trinta e Cinco Coplas Republicanas

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Hino do Rio Grande e Seis Poemas para um Recital

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Por que Revolução Farroupilha

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Vinte Proposições Preambulares

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Vinte Proposições Preambulares


Vinte Proposições Preambulares

N ão escancaro o passa apenas lhe bat o à por Qualquer voz que me já sat isfaz e confort a Quero, ent ão, espairec O passado não quer rep Ele se bast a em silênc caut eloso desamparo.

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ado, rt a. e responda a. cer. paros. cio,

A Cartilha Farroupilha

*Luiz Coronel

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Vinte Proposições Preambulares

Pouco sabe a mãe sobre o filho que guarda em suas entranhas, e tudo desconhece o autor sobre o destino do livro que escreve. “A Cartilha Farroupilha” despe-se de altas proposições literárias para ser, antes de tudo, um livro didático, e, se os fados propiciarem, munido de eventuais encantos. O livro não pretende nem poderia abarcar a totalidade de fatos, batalhas e, principalmente, personagens que integram o ciclo histórico de 1835-1845. O crescente interesse nas Celebrações da Semana Farroupilha exige consciência dos fatos históricos, caso contrário, seríamos tomados, apenas, por um “amor febril”, tão pleno de entusiasmo quanto vazio de conteúdo. Há um indubitável mérito a ser creditado ao MTG (Movimento Tradicionalista Gaúcho), pois sua atuação, no que tange à preservação da identidade gaúcha, é fundamental. Ontem, hoje e como sempre, o centralismo político-econômico, que marca momentos essenciais de nossa trajetória, contraria o desenvolvimento e a expressão das culturas regionais. Não estamos ante o texto de um historiador, e sim de um poeta coloquial. É visível, num correr de olhos, a inexistência de um mergulho em documentos históricos. Existe, por certo, uma contemplação e um depoimento peculiar em sua sinceridade. As circunstâncias não poderiam ser mais oportunas para o lançamento deste livro, em 2008 posto que ocorreu, simultaneamente, à inauguração do “Mural Farroupilha” – obra do Mestre Danúbio Gonçalves, localizado na praça cujo nome presta louvor à epopeia dos Farrapos. Honra-me a condição de Curador desse monumento. Em sua forma literária, “A Cartilha Farroupilha” acolhe a redondilha

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– versos de sete sílabas. São as coplas, de influência Ibérica, sabidamente afeitas ao canto ou ao recital. As estrofes se alternam, ora meramente descritivas de fatos, ora meditativas. Na Poética Complementar, a poesia encontra pouso e repouso. O livro abriga e aceita certa linguagem trivial, típica daqueles tempos de outrora. O plano ilustrativo na edição inaugural contou com encarte do “Mural Farroupilha” e ilustrações complementares de Danúbio Gonçalves. O projeto gráfico é da TAB Marketing Editorial, tendo, na sensibilidade de Simone M.Pontes, régua e compasso. Acreditamos que o trabalho, em suas especificidades, seja único no gênero. Bem sabemos vasto o acervo de poemas de vários autores alusivos à Revolução Farroupilha. Porém, em se tratando de linguagem poética, que venha das causas do conflito até a pacificação, é provável que nenhum outro versejador tenha se proposto a tão empolgante e exaustivo desafio. Almejamos que esta Cartilha tenha real valor para as escolas, onde, salvo raras exceções, sabe-se precário o estudo e consequente conhecimento de nossa história. Aliás, o próprio nome Cartilha já lhe estabelece destinação. Não esperem os integrantes de nossos Centros de Tradições Gaúchas que aqui se encontre aquele soberbo ímpeto da poesia épica do Pajador Jayme Caetano Braun, a quem rendemos permanente tributo. Se, ao autor, são conferidos créditos em mais relevantes planos, que se pense a Cartilha como fértil material disponível à composição musical, com pretensões ao libreto, encenações teatrais, organização de jograis e outras expressões cênicas.

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Vinte Proposições Preambulares

O livro, em sua cavalgada, segue a trilha de “Farrapos”, obra-guia e imprescindível de Walter Spalding, a quem são devidas as mais altas deferências. Muito contribuíram também os livros “Revolução Farroupilha – Cronologia do Decênio Heroico”, de Antonio Augusto Fagundes; “Os Farrapos”, de Carlos Urbim; e as sempre citadas “Memórias de Garibaldi”. Além dessas obras, “Homens Ilustres do Rio Grande do Sul”, de Aquiles Porto Alegre; e o documentário de Apolinário Porto Alegre, o “Cancioneiro da Revolução de 1835”, cujos versos foram colhidos e republicados em sua grafia original, constante na edição da Companhia União de Seguros Gerais, de 1981, de onde também consideramos a grafia do nome Antônio de Sousa Netto.” A constante presença de nomes próprios nas estrofes é um dos múltiplos fatores que conspiram contra o acerto límpido, rígido e sonoro das sílabas que compõem as redondilhas. Também, algumas citações tiveram de ser redimensionadas em função das exigências das estruturas frasais. As “rimas tonais”, expressão consagrada por João Cabral de Melo Netto, são utilizadas com reincidente frequência. É bom lembrar que Piratini, cidade relicário e primeira capital da República Rio-Grandense, foi palco da infância do poeta. E que em Bagé, sua cidade natal, ocorreram alguns dos mais importantes momentos da Revolução Farroupilha, com seu vasto e definitivo elenco de referências humanas. “A Cartilha Farroupilha” organiza-se numa sequência de capítulos estruturados, na sucessão de Cantos Iniciais, Coplas Republicanas, com a correspondente Glosa Documental, acrescida de uma

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A Cartilha Farroupilha

Poética Complementar. Como fechamento do livro, em adendo, o Hino Rio-Grandense e Poemas Específicos para um Recital. Complementa os capítulos o depoimento do artista plástico Danúbio Gonçalves sobre o Mural por ele concebido e realizado. Indagados se estamos diante de uma exaltação, não saberíamos responder. Eleger o passado como paraíso perdido é um equívoco imperdoável. Defrontamo-nos com homens, fatos, sonhos e vilanias, comuns a todos os tempos. Mesmo os historiadores, os mais agudos e dissecantes em suas análises e pesquisas, não poderão ocultar que respirávamos, naqueles idos tempos, ideias ostensivamente alvissareiras, senão revolucionárias. O que nos trava o voo é pensar que aqueles anseios de Federação, tão generosos e prementes, sigam vagando na pauta dos mais justos projetos, sem que nunca tenhamos tido o júbilo de alcançá-los, embora, de todas as maneiras, ainda integrem nossas aspirações políticas. Aos patrocinadores desta edição, o reconhecimento e a certeza de que estamos indo além do caráter instantâneo dos eventos. Estamos semeando em terra boa, pois os livros “são pássaros de cem asas”, voam ao longo das estações e fazem ninho nas melhores mentes. Após um rígido inverno, com as brisas da primavera, “A Cartilha Farroupilha” deixa de ser uma expectativa e tomba, em suas mãos, com a leveza das florações e os ventos inquietantes que a estação propicia.

Luiz Coronel

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Vinte e Cinco Cantos Iniciais

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Vinte e Cinco CantosIniciais

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Vinte e Cinco Cantos Iniciais

O Lenço Por mais que o tempo avance, o presente monta o passado. E galopa, campo afora, com seu Lenço Colorado. É lenço de seda, aberto, com duas pontas nas costas. Rubro símbolo de guerras, feito de sonho e revoltas.

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Homens e Fatos Mas onde estão os heróis? Pergunta o vento que passa. Estão na alma do povo, são nomes de ruas e praças. No ramo dos episódios, há mel e fel sob os favos. O tempo sepulta o ignóbil, mas guarda a estampa dos bravos.

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Vinte e Cinco Cantos Iniciais

Três Traços A identidade gaúcha resguarda, em seu semblante, a Tragédia das Missões, Farrapos e Imigrantes. Nas Missões, o amor à terra. A bravura dos segundos. Imigrantes cruzaram mares e plantaram um novo mundo.

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A Cartilha Farroupilha

Das Causas e Concausas Na pescagem dos porquês, não sejamos tão servis. Os mais lógicos conceitos esquecem dados sutis. “Rebelião de Estancieiros”, assim chamá-la, desdenha. Nada acontece em vão, faz-se o fogo se houver lenha.

No repartir mordomias, podeis conferir a lista: ia o mel aos Cortesãos, ouro só aos Monarquistas.

Vão por conta do Império, Requisições e Rapinas. Tributos que não retornam, Convocações repentinas.

Querem os Reducionistas a razão que tudo abarque. Salgam a verdade dos fatos, convertendo tudo em charque.

Contra Rosas e Oribe, contra Aguirre e Solano, pra bandeira dessas guerras, o Gaúcho teceu panos.

E quem não sabe que o tempo tem atalho e desatino? E que nesse abrir de rotas os sonhos são peregrinos?.

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Vinte e Cinco Cantos Iniciais

O Ideário Sopram, de França e América, fortes ventos liberais, devastando privilégios de Nobres e Clericais. Eram brados de República, conchavos de Abolição, aspirações Constituintes, anseios de Federação. Em recônditos recantos, acampamentos de Tropa, transitam cultas ideias propagadas da Europa.

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A Cartilha Farroupilha

Os Desagravos O Continente de São Pedro quer revide aos desagravos! São Maçons e Anarquistas, Fazendeiros e Soldados. “A Estalagem Imperial”, “A República do Boi” são afrontas que provocam desforra sem mais depois.

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Trinta e Cinco Coplas Republicanas

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Trinta e Cinco Coplas Republicanas

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Trinta e Cinco Coplas Republicanas

A gora det enham as mu seu alt o voo abst rat o, pois t emos a t ropa dos v sob o comando dos fat os. E os fat os, como sabemos, rasgam sua fant asia ao cruzar mat os cerrados, arame farpado dos dias. Peço vênia às t est emun escusas ab init io eu peço se acaso eu me comport o qual relat or de um proce Talvez, em sendo mascat e o leit or melhor ent enda: abrindo um “baú de espa faço ent rega de encomend 30


A Cartilha Farroupilha

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[PĂłrtico Deferencial] *Mario Quintana.

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Trinta e Cinco Coplas Republicanas

Copla Republicana I ou Discórdia e Aconselhamentos – 1835

“Contra a pátria tais perversos Tentaram mil maravilhas, Mas tudo desaparece ‘o grito dos farroupilhas.”

Cancioneiro da Revolução de 1835 [Apolinário Porto Alegre]

[Poética Introdutória]

Política Imperial Aos desmandos Imperiais um Farrapo não se humilha. Quando o sonho abre clareiras, o Rio Grande segue a trilha. Em Trinta e Cinco é empossada a Assembleia Legislativa. No trivial, tudo se pode. No essencial, tudo se priva.

Há conchavos e sigilos entre ponchos e batinas. A frágil luz dos candeeiros mesmo oculta se ilumina. Quando se unem ideias a interesses concretos, rompem-se todas as trancas. Os caminhos são abertos.

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[Copla] Tenhamos em mãos uma foto de cor sépia, se viável. Vejamos como estão postos cada um dos personagens. Por vezes, não somos nós que por ato, vontade plena, escolhemos nosso papel no enquadramento de cena.

Despóticos autocratas enchiam a noite de sustos. Eram Imperiais ferrenhos, punindo inocentes e justos.

No que tange ao desempenho – gracioso, sutil ou rude –, a índole e o caráter moldam gestos e atitudes.

Perseguem Bento Gonçalves, julgam Manoel Ribeiro. O facho da Revolução acende seu claro braseiro.

Eis a face da opressão, que a todos aflige e alarma: Provincial Fernandes Braga, Barreto Pinto nas Armas.

Dois nomes representam o Poder Imperial na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul: o Presidente da Província, Dr. Antonio Rodrigues Fernandes Braga, e o Comandante das Armas, Marechal Sebastião Barreto Pereira Pinto.

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Trinta e Cinco Coplas Republicanas

Copla Republicana II ou A Tomada de Porto Alegre – 1835

“Dia vinte de Setembro, Dia grato e soberano, Será de eterna memória A todo o republicano.

[...]

O herói Bento Gonçalves Que d’de Setembro, Bateu palmas e venceu.”

Cancioneiro da Revolução de 1835

[Poética Introdutória]

Regentes Bem sabemos, são Regentes de orquestra que não se afina. Tanto faz que se titule Regência Una ou Trina. Envolvem o Rei imberbe com suas leis e decretos. E rabiscam à vontade, ditando o que é torto ou certo. Primeira Vitória pode se chamar combate? Quem quiser logo responda. Vinte tolos Imperiais e alguns Farrapos em ronda. Cai do cavalo o Visconde. Fere Prosódia uma lança.* Bento está a caminho, os Farroupilhas avançam.

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José Gomes Jardim A José Gomes Jardim, que se faça reverências. Farrapo do início ao fim,* prestando fiel tenência. A Fazenda Pedras Brancas, bem às margens do Guaíba, fez-se Quartel General à empreitada destemida.

*Em 1843, quando Bento Gonçalves abdicou do posto de Governante Supremo da República Rio-Grandense, entregou a Presidência a Gomes Jardim. *Prosódia: Um combativo articulista, defensor da causa Imperial, será a primeira vítima do conflito.


A Cartilha Farroupilha

[Copla] Certos dias não são dias na torre dos calendários. Badalam mitos e boatos nos mais altos campanários. Não sabiam aqueles homens que sua marcha, campo afora, deixaria pés e botas gravados no chão da história.

Cabo Rocha é Sentinela na Ponte do Chico Azenha.** Na noite do dia vinte, entre os arbustos se embrenha.

Na Fazenda Pedras Brancas, Insurgentes se preparam: Gomes Jardim, Onofre Pires, Tito Livio Zambeccari.

De repente, o Camamu, com Imperial imprudência, toca fogo e ao contra-ataque foge sem mais resistência.

Planejam tomar a cidade com minuciosa perícia, movidos pela esperança de libertar a Província.

No dia vinte de setembro, moldaram-se assim os fatos que o Visconde leva ao Braga em transbordantes relatos.

Dezenove de setembro no roteiro se prescreve, que se poste em alto morro* Onofre com seus rebeldes.

O Braga forra a mula e a Rio Grande se retira. As cornetas soam límpidas, Porto Alegre é Farroupilha.

Um dia após, Cabo Rocha participa do confronto. Quem é esse Camamu? Um Visconde afoito e tonto?

Em mensagem ao Regente, Bento ostenta o galardão: “A ter de viver sem honra, morra-se de espada na mão!”

*O alto morro refere-se à localidade onde, em nossos dias, encontramos os principais cemitérios da Capital gaúcha. **Denominavam-se de Azenha os moinhos instalados à beira do Arroio Dilúvio. Chico da Azenha operava seu moinho nas proximidades das atuais Avenidas Azenha, Ipiranga e João Pessoa.

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Trinta e Cinco Coplas Republicanas

Copla Republicana III ou Torpes Ressentimentos – 1836

“Se os galegos perturbarem Nossa paz e felicidade, A pau, a ferro e a foguetes Irão ter à eternidade.”

Cancioneiro da Revolução de 1835

[Poética Introdutória]

O Enfrentamento Vilas, campos e cidades aderem ao chamamento. Estavam, a postos, as hostes dispostas ao enfrentamento.

A Presidência da Província

O heroísmo e a vilania levados na correnteza. Que olhos atentos separam a ganância da grandeza?

Ser atento aos Farroupilhas e aos ditames do Império é tentar fazer a liga de incompatíveis minérios

As palavras são afiadas em turvo discernimento. É a sentença das espadas a razão dos armamentos.

Quer se pense Antonio Braga ou Araújo Ribeiro, lembram dois equilibristas num precário picadeiro. A liturgia dos cargos confere lucros e galas. Frágil reino de poltronas, cerimônias pelas salas.

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A Cartilha Farroupilha

[Copla] Estranha a reação dos homens tendo a taça da vitória... Quem detém os seus impulsos face à embriaguez da glória? Otimista, Bento exalta “o patriotismo satisfeito”. O extremismo inocula venenos dentro do peito. Querem deportações, os radicais antilusos. Que força conteria agora maledicências e abusos? Deve Araújo Ribeiro tomar posse na Província. Há entraves e adiamentos por desmandos e estultices.

A política tem lâminas do mais cruento corte. Aliam-se Manoel e Araújo* em São José do Norte. E vencem o Mando Farrapo na falsa paz que se forja. Araújo reacende o estopim da discórdia.

*José de Araújo Ribeiro é nomeado Presidente da Província pelo Governo Central. Exaltados Farroupilhas protelam aposse. O Coronel Bento Manoel Ribeiro, rebelde Farrapo nas primeiras horas, como fará em outras circunstâncias, “vira a casaca”. Alia-se ao novo Presidente, unindo forças aos Legalistas Imperiais.

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Hino do Rio Grande e Seis Poemas para um Recital

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A Cartilha Farroupilha

Hino do Rio Grande e Seis Poemas para um Recital

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Hino do Rio Grande e Seis Poemas para um Recital

Como a aurora precursora do farol da divindade, foi o V int e de Set embro o precursor da liberdade.

Most remos valor, const â nest a ímpia e injust a gu Sirvam nossas façanhas de modelo a t oda a t erra.

Mas não bast a pra ser liv ser fort e, aguerrido e bravo; povo que não t em virt ud acaba por ser escravo. 40


A Cartilha Farroupilha

o

ância, uerra.

[Hino do Rio Grande do Sul] * Letra: Francisco Pinto da Fontoura Música: Joaquim José de Mendanha

vre o; de

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Hino do Rio Grande e Seis Poemas para um Recital

Coração Farroupilha

Ninguém doma a esperança, liberdade não se encilha. Galopa livre em meu peito um Coração Farroupilha. Olha, a Tropa de Lanceiros pela noite adentro avança. Sob a luz clara da lua, cada estrela é uma lança. Pelos mares da campanha, pelas ondas da coxilha, juntas de bois puxam barcos da Esquadra Farroupilha. Pois ao Bento não se prende, não se prende a ventania, nas Fortalezas do Rio, nem nos Fortes da Bahia. No pendão verde-amarelo, o carmim também cintila! Tremula no azul do Pampa a Bandeira Farroupilha.

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A Cartilha Farroupilha

Bento Gonçalves da Silva

Tinha estatura mediana, suíças e porte esbelto. Sabia o olhar incisivo distinguir errado e certo.

“Seus exemplos e virtudes sejam o nosso modelo. Os que se chamam heróis venham honrar-se de vê-lo.”

Cancioneiro da Revolução de 1835

O pai, Joaquim, cogitara pastor de almas o filho. Em vez de rezas e bênçãos, manifestos e gatilhos.

Dona Caetana Garcia, morena de olhos verdes, foi o amor de sua vida, água pura de sua sede.

Porém, para salvar vidas, abdica das vitórias. Ser humano, mesmo em guerra, não empana sua glória.*

Pós dez anos de combates, o “Bambaquerê” se condói.** Sabia-se pobre, enfermo, quem na luta fez-se herói!

Foi tropeiro e voluntário por esse arisco mundéu. Com as Tropas de Artigas, sitiou Montevidéu.

*Por três vezes, Bento Gonçalves abdicou da vitória por perceber o sacrifício de vidas que os combates significariam. **Na Maçonaria, Bento Gonçalves respondia pelo codinome “Sucre”. Entre populares e Tropa, não era incomum que a ele se referissem como o “Bambaquerê”. Nasceu na Vila de Triunfo e faleceu na Freguesia das Pedras Brancas em 1847.

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Hino do Rio Grande e Seis Poemas para um Recital

Antônio de Sousa Netto

Contemplo o rosto de Netto entre vultos na galeria. Por persianas entreabertas, o passado dá bom-dia. Há os que sentem, ante o tempo, pesadelos, calafrios. A vinte passos do herói, repousam meu pai, meus tios.

De seu branco mausoléu, despido de todo regalo, nas noites de tempestade, ouve-se um tropel de cavalos.

Do mar que teve em seu berço, trouxe o ímpeto incessante. A paisagem livre do Pampa ganhou sua alma e semblante.

No branco mármore inscreve-se: Antônio de Sousa Netto. Deita-se o sol a seus pés, e tem estrelas por teto.

Galanteador e pé-de-valsa, radical em sua coerência. Se voa o chapéu d’um gaúcho, o vento lhe faz reverências.

Ao pronunciar o seu nome, confira mesuras ao guapo. Finda a Guerra, no exílio, hasteio o Pendão Farrapo!

Cavalga com seu corcel, ostenta arreios de prata. As faíscas das ferraduras são pirilampos na mata.

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A Cartilha Farroupilha

Garibaldi: Herói, Marujo e Gaudério

O passo manso dos bois avança em onda perfeita. Marujo virou tropeiro, o barco se fez carreta. Canga de boi é leme para o marujo gaudério. Guerreiro dos sete mares, o Pampa não tem mistérios.

Quem visse um barco nos campos diria que se alucina. O coração é estaleiro de sonhos que não terminam.

Em vez de velas, bandeiras pelos mares das coxilhas. Sopram ventos de liberdade sobre a Esquadra Farroupilha.

O caminho da esperança vence a bruma e a garoa. Na maresia dos mares, vê-se um gringo pela proa.

A tropa perambulante pelo Pampa a navegar. Nas aguadas se reflete esse herói de campo e mar.

Viaja a Tropa de Farrapos por campo e mar sem cansaço. Se os sonhos navegam ao vento, peleia-se até pelo espaço.

O braço do domador é bem forte para os remos, pois navegar, navegamos, segundo os sonhos que temos.

Que venham os Federais com seus Generais e Alcaides! Pois aqui se rompe o cerco com as Tropas de Garibaldi.

Marujo ele sempre foi. Marujo de ruiva estampa. Seu destino é singrar pelos verdes mares do Pampa.

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Por que Revolução Farroupilha


Por que Revolução Farroupilha

Cinco dias hospitalizado, em repouso pós-cirúrgico, prótese no joelho direito, em retiro, dedico-me à literatura. O ponto de partida: o livro “Revolução Farroupilha”, que recebi do amigo Antonio Augusto Fagundes, pesquisador renomado, tradicionalista apaixonado, estudioso constante sobre a Vivência Pampeana e sua história. Nessa obra literária, mostra como era o Rio Grande no começo do século XIX, opinando sobre as causas da Revolução Farroupilha. “Revolução Farroupilha” representa uma valiosa contribuição informativa ao restrito conhecimento que, antes, tinha eu sobre esse ciclo histórico, exemplar para nosso Estado e para o Brasil. Tal informação soma-se à do deputado e historiador Raul Carrion, autor de várias obras editadas – algumas incisivas sobre fatos escamoteados, or que Revolução Farroupilha? mas verídicos, também, sobre essa valorosa odisseia revolucionária. Seus estudos estão baseados em documentos, cartas, que evidenciam e justificam os combates. Dei-me conta, a seguir, da quase inexistência dessa temática épica entre nossos artistas plásticos. Apenas eram conhecidas, anteriormente, aquarelas de gaúchos com cara de gringo..., omitindo a participação da negritude na Revolução (tão numerosa de escravos trabalhadores nas charqueadas e campeiradas!). O mesmo acontece com outro pintor, político eleito, Guido Mondin, em sua coletânea de pinturas acadêmicas, de precária expressividade. Ressaltamos, positivamente, o nosso muralista Clébio Sória e

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A Cartilha Farroupilha

o excelente ilustrador João Mottini. Ambos são competentes desenhistas e profundos conhecedores da morfologia equina e dos costumes campeiros. Vale ressaltar que foram antecedidos pelo escultor Antonio Caringi, autor de vários monumentos e do iconográfico “Laçador”, e por Vasco Prado, com seus cavalos e a dramática série do “Negrinho do Pastoreio”. Atualmente, outro destacado escultor da cavalaria, Caé Braga, defendeu em entrevista a recuperação da Memória Histórica Gaúcha. Braga destacou a importância fundamental do cavalo crioulo primitivo nos combates farrapos. Nas palavras de João Cabral de Melo Netto: “Não se pode chegar ao nacional sem ser regional”. Logicamente, essa afirmativa é repudiada pelo preconceituoso modismo contemporâneo... Nem se flagrando, ainda, de que a arte regional, há séculos, distinguiu-se por sua qualidade estética peculiar, autóctone, gerando, com sua primitividade, LIÇÃO inigualada pela cultura civilizada, em obras raramente alcançadas pela estética moderna. Confira na Antiguidade Egípcia Faraônica, na Japonesa, na Chinesa, na Inca, na Asteca, na Africana, na da Polinésia, na da Oceania esse gigantesco patrimônio artístico que supera, nitidamente, certos movimentos de uma limitada vanguarda em crise, fadada ao beco sem saída. Assumindo posicionamento humanista e estético, nunca divorciado da coletividade e ancestralidade familiar, sendo trineto de Bento

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Por que Revolução Farroupilha

Gonçalves, aderi ao resgate pessoal dessa temática por meio de um painel medindo 93,20m2, pintado sobre 550 lajotas em porcelanato, com tinta azul queimada a 8000 e intitulado “Memorial da Epopeia Rio-Grandense, Missioneira e Farroupilha”. O painel foi concebido em cinco módulos sequentes, a partir da resistência Missioneira e Guarani, que enfrentava o despótico ultimato Ibérico em conluio com o Império Lusitano. Acrescentam-se à cena Sepé Tiarajú, Giuseppe Garibaldi, “Lanceiros Negros”, Bento Gonçalves Da Silva e heroicos insurrectos farroupilhas, que proclamam a República Rio-Grandense, posteriormente abafada com o armistício acomodado ao Governo Imperial... Adotei, nesse Mural, o parentesco com a tradição Bizantina existente nos belíssimos mosaicos da Catedral de São Marcos em Veneza e de certos afrescos italianos, como também com o muralismo mexicano (Diego Rivera, principalmente). Valendo- -me da mensagem escrita, títulos e frases, no propósito de facilitar a comunicação com o público menos esclarecido, aproximo o Mural à narração da história em quadrinhos. Contrariando as metáforas sofisticadas e impopulares... Com acessibilidade à multidão transeunte! O Projeto previsto e adaptado ao platô circular da obra em reforma da Estação Trensurb, localizada na Praça Revolução Farroupilha, em frente ao Mercado Público Municipal, terá iluminação noturna.

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A Cartilha Farroupilha

Aprovado pelo Prefeito José Fogaça, pela Secretaria Municipal de Cultura, pela diretoria do Trensurb e patrocinado pela Companhia Zaffari, tem a curadoria de Luiz Coronel. Essa é uma obra pública monumental, gratificante e somatória à trajetória cultural, didática e artística nesta capital, onde tive acolhimento como Cidadão de Porto Alegre. Aqui construí minha residência e meu ateliê, há cerca de meio século, no Bairro Petrópolis, e gerei a maior parte de minha produção gráfica, pictórica, mosaística, duas filhas e neta e netos. Tenho retornado constantemente a Bagé, onde fundamos o Clube de Gravura, junto com Glenio Bianchetti, Glauco Rodrigues e outros artistas plásticos. Reuníamo-nos em ateliê coletivo, com adesão assídua e apoio de Pedro Wayne, Tarcísio Taborda, Mario Lopes, Ernesto Costa e Ernesto Wayne, para debater e questionar o rumo da cultura contemporânea universal e regional. Na época, a criação artística estava direcionada ao abstracionismo, conveniente à manipulação de Nelson Rockefeller na primeira Bienal Paulista, assustado com o exemplo dos muralistas revolucionários mexicanos. Essa postura era discutida pelos jovens, denominados “Novos de Bagé”, em uma atitude um tanto atrevida e “surreal”, se tivermos em conta que atuávamos em pleno ambiente ruralista da indústria saladeira das charqueadas do Rio Grande do Sul. Danúbio Gonçalves | Setembro de 2008

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[Sobre a Obra Regional de Luiz Coronel]

Seus versos são gemas que formam constelações.” – Jayme Caetano Braun –

Erico Verissimo e Luiz Coronel, a mesma coragem inovadora. Com Luiz Coronel alcançamos a abertura universal do lirismo.” – Barbosa Lessa –

Com Luiz Coronel vê-se, ouve-se, canta-se um Rio Grande do Sul que não parou.” – Paixão Côrtes –

Difícil dizer o que mais me fascina, se a beleza das imagens ou a perfeita cadência do texto.” – Moacyr Scliar –

Luiz Coronel trouxe uma nova temática campeira. Ele enriqueceu a poética gauchesca com talento e ternura. Sua poesia tem figuras surpreendentes.” – Antonio Augusto Fagundes –


[Fortuna Crítica de Danúbio Gonçalves]

É preciso destacar algumas coisas, como, por exemplo, esta série admirável de Danúbio Gonçalves, toda ela inspirada nas diferentes operações do matadouro. É um verdadeiro ensaio, é de uma intensidade extraordinária.” – Diego Rivera –

Os desenhos, as gravuras e pinturas que, hoje, Danúbio expõem, de tal modo ao que gostaria de fazer, se tanto tivesse engenho e arte, que me sinto quase inibido ao dizer todo o bem que penso deles...” – Erico Verissimo –

A gravura de Danúbio Gonçalves é uma das mais requintadas do país. Solitário e discreto, a presença de Danúbio é definitiva na evolução da gravura brasileira.” – Jacob Klintowitz –

Está aí, uma boa imagem para definir o Danúbio: um homem de 80 anos guiando a mão do menino. Os dois debruçados sobre o papel, a tela, o bloco, fazendo cada um sua arte – que no fim é a mesma. Vez que outra eles olham em volta, para ver se há algum instrumento que ainda não usaram.” – Luis Fernando Verissimo –

Danúbio tem uma longa trajetória que vem desde o Clube de Gravura de Porto Alegre e Bagé, que incluía nomes como Carlos Scliar, Vasco Prado, Glênio Bianchetti e Glauco Rodrigues. Danúbio nos ajuda a reconquistar o que chamo de cidadania estética.” – Affonso Romano de Sant’Anna –


Nós somos cativos de nossos mitos. Fiéis aos nossos símbolos. Súditos à nossa lenda. E nos agrada ser assim. – Luiz Coronel e Danúbio Gonçalves –


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