2010-MAR-31 Texto Analitico Jandir de Lima_PT

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Assistência Técnica ao Projecto de Apoio ao Diálogos Sectoriais UE-Brasil EuropeAid/126232/C/SER/BR


Para: Ministério do Planejamento Delegação da CE

Consultoria de curto prazo como perito técnico para Simpósio Internacional “Gestão de Políticas Regionais em Perspectiva”

Texto Analítico

JANDIR FERRERA DE LIMA


Gestão de Políticas Regionais em Perspectiva 1. Introdução Esse texto analisa as ideias, proposições e casos apresentados e discutidos durante o Simpósio Internacional “Gestão de Políticas Regionais em Perspectiva”, realizado durante a II Mostra do Desenvolvimento Regional promovida pelo Ministério da Integração Nacional (MIN), realizada em Florianópolis entre os dias 10 a 13 de março de 2010. O Simpósio faz parte dos trabalhos de cooperação técnica entre o Brasil e a União Européia, para suporte e troca de experiências no campo da política regional, em especial na elaboração e na implementação da Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR) brasileira. As ações do Ministério da Integração Nacional (MIN) se inspiraram nas ações da Comissão Européia / Direção Geral de Política Regional – DGRegio, em alguns aspectos conceituais relevantes e essenciais, tais como: a referência territorial a sub-regiões e a definição de indicadores de corte para classificação e atuação nos territórios. O objetivo do Simpósio Internacional “Gestão de Políticas Regionais em Perspectiva” foi fortalecer o diálogo e a cooperação entre o Brasil e a União Européia, na troca de experiências referente à Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR) do Brasil e a Política de Desenvolvimento Regional da Europa. As conferências do Simpósio tiveram como linha de análise a discussão das tendências da política regional territorial brasileira e a experiência da política regional européia. Nesse sentido, o Simpósio foi dividido em três partes: Na primeira parte, a temática foi o desenvolvimento regional como vetor de inclusão e alargamento territorial, as políticas públicas com base territorial, seus avanços e desafios. Na segunda parte, discutiram-se os avanços e desafios das políticas públicas com base territorial e as políticas regionais após o ano de 2010. Na terceira parte a temática foi o papel da infraestrutura no desenvolvimento regional e os arranjos produtivos locais como as experiências concretas de ação no território em escalas distintas. A análise apresentada no texto segue a sequência das temáticas apresentadas no Simpósio. Consequentemente foi feita uma breve conclusão


com recomendações a partir da percepção das ideias, informações, dados e dos conteúdos apresentados nas conferências. 2. Desenvolvimento Regional como Vetor de Inclusão e “Alargamento” Territorial A crise econômica mundial que assola o planeta faz parte do caráter cíclico do capitalismo, mas também de uma transição maior no modo de produção e no modo de vida, iniciada há muitos séculos. Nesse momento, a transição está ligada aos grandes avanços tecnológicos, que em parte melhoraram a vida da sociedade, mas de outro segregou economicamente parcela da população, principalmente a do terceiro mundo. Paralelo aos avanços tecnológicos, a expansão dos mercados, a diversificação de produtos, o fortalecimento do comércio mundial e o ritmo de crescimento da economia mundial, em especial dos países emergentes (Brasil, Rússia, Índia e China), incluíram na sociedade de consumo uma parcela significativa da população antes relegada apenas à subsistência. Assim, o avanço tecnológico e seus desdobramentos, que fortaleceram a globalização da economia, trouxeram de um lado a inclusão das pessoas num padrão de consumo antes restrito apenas aos países desenvolvidos, mas de outro lado excluiu comunidades e trabalhadores. Os excluídos não conseguiram se integrar às exigências do sistema de mercado, ao fortalecimento das relações econômicas internacionais e as mudanças no estilo de vida contemporâneo. O avanço da economia no mundo se choca então com as barreiras culturais e com o padrão de vida desequilibrado das diferentes comunidades, sem contar a desqualificação profissional para atividades produtivas voltadas cada vez mais para o conhecimento. Por isso, o crescimento da riqueza em escala global trouxe também o crescimento das desigualdades regionais. Além das desigualdades socioeconômicas, o progresso econômico vivenciado no último século demonstrou a necessidade de uma mudança profunda na matriz energética, a necessidade de novas formas de intervenção dos governos e na necessidade de garantir a biodiversidade e a diversidade cultural e econômica do planeta com respeito às sociedades locais, para


garantir o desenvolvimento sustentável. Isso obriga a repensar o modelo de globalização e das relações econômicas internacionais para um modelo de otimização de recursos mais inclusivo e menos seletivo. O que exige o fortalecimento do comércio das mercadorias que agregam no local da produção e o maior adensamento das economias locais e regionais. Na questão da mudança da matriz energética, abriu-se um conjunto de opções para os países emergentes e os demais países do terceiro mundo, em especial o Brasil, que tem enorme potencial na sua biomassa para fornecer insumos e criar um mercado mundial para as energias renováveis. Sem contar que a expansão do mercado global e a inserção de novas comunidades na sociedade de consumo também fortaleceram o papel estratégico do Brasil como fornecedor de alimentos e demais commodities internacionais. A Tabela 01 ilustra a situação do Brasil no cenário mundial da produção de alimentos. Tabela 01: Brasil – Ranking Mundial na Produção Alimentos e Participação no Comércio Mundial – 2006. Produtos

Brasil – Ranking Mundial Produção Exportação Açúcar 1º 1º Café 1º 1º Suco de Laranja 1º 1º Álcool 2º 1º Tabaco 2º 1º Complexo Soja 2º 1º Carne Bovina 2º 1º Carne de Frango 2º 1º Milho 3º 3º Carne Suína 3º 3º Fonte: Confederação Nacional da Agricultura do Brasil.

Participação Comércio Mundial 41% 28% 82% 27% 37% 27% 39% 06% 11%

A participação brasileira no comércio mundial de alimentos, exposta na tabela 01, se ampliou e se consolidou em função da mobilidade da fronteira agrícola, da incorporação de tecnologias e técnicas agropecuárias adequadas ao clima tropical. Porém, a manutenção do potencial produtivo brasileiro no setor primário necessita de políticas de Estado capazes de fortalecer a agricultura e o extrativismo vegetal em suas mais diversas escalas, proteger a pequena produção familiar, principalmente aquela oriunda das comunidades tradicionais, tornando-a competitiva, garantindo a coesão territorial, a inserção


das regiões excluídas do dinamismo nacional e mundial, e, o mais importante, a proteção à diversidade e biodiversidade dos territórios que compõem o espaço nacional. Por isso, no contexto das mudanças econômicas globais e a revalorização das regiões como espaços de intervenção, a Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR) tem que ser mais que uma simples política de governo, mas um compromisso do Estado nacional com o desenvolvimento. Uma política de Estado transcende o presente e se insere como um pacto com as gerações futuras. No momento que esse compromisso assume a melhoria dos indicadores sociais, econômicos e ambientais, a política de Estado firma seu caráter sustentável com a preservação dos recursos naturais e das diversidades regionais. Se a PNDR tem um compromisso de curto prazo com a melhoria econômica e social das regiões menos desenvolvidas, ela também tem um caráter prospectivo de longo prazo, pois suas ações não devem gerar desequilíbrios perversos ou impedir o avanço das gerações futuras, mas assegurar as condições a fim de que as comunidades tomem em mãos o seu futuro, para que sejam sujeitos da história e se insiram na dinâmica da economia. Além do exposto, no caso brasileiro, haja vista a extensão territorial do país, a sua diversidade étnica e cultural, a crueldade da exclusão social e a pouca valorização das potencialidades regionais, a PNDR também assume o compromisso com o bem-estar e o fortalecimento das identidades regionais. Por isso, as alternativas de projetos de desenvolvimento econômico proposto às comunidades devem ser inovadoras e refletir o desenvolvimento regional como elemento de inclusão social e econômico em todas as escalas. Nesse aspecto, a experiência da União Européia na incorporação de novos territórios ensina muito ao Brasil, cujo processo de desenvolvimento das últimas décadas incorporou territórios à margem do processo de crescimento econômico nacional fortalecendo uma economia de arquipélagos, como características e dinâmicas econômicas distintas. Na Figura 01, nota-se as especificidades espaciais da produção nacional brasileira a partir da sua tipologia regional. Figura 01: Tipologia Regional da Economia Brasileira - 2005.


Recursos Naturais Agronegócio Baixa Intensidade Agroindústrias

/

Tecnológica

/

Média Intensidade Tecnológica alavancada pela mineração

/

Administração Pública / Serviços – base econômica frágil Área com tipologias

diversidade

de

Alta Intensidade Tecnológica em produções urbanas (Transformação – Serviços)

Fonte: Ministério dos Transportes – PNLT.

Pela tipologia apresentada na Figura 01, observa-se que às Regiões Sudeste e Sul, as mais ricas no contexto brasileiro, são as mais especializadas em atividades produtivas com maior intensidade tecnológica, em relação as outras economias regionais brasileiras. Enquanto as regiões periféricas ao Centro Sul do Brasil continuam com suas economias baseadas de forma significativa no setor primário e nas transferências do setor público. Esse perfil divide o território brasileiro em regiões altamente adensadas em recursos naturais, mas sem transformação expressiva, e, em regiões de alto conteúdo tecnológico, de transformação e com centros consumidores em expansão. Ao comparar a localização das mesorregiões diferenciadas com o perfil das economias regionais, nota-se que as regiões prioritárias na PNDR são aquelas de baixa intensidade tecnológica ou intensivas na exploração dos recursos naturais ou altamente dependentes das transferências do setor público. O perfil dessas economias também se reflete no perfil do mercado consumidor, que não


avança no fortalecimento do mercado interno e necessita de altos investimentos em infraestrutura física e a qualificação da força de trabalho. Para uma política de desenvolvimento regional ser inclusiva, ela não deve se concentrar apenas nas mudanças da estrutura produtiva, mas pensar e criar mecanismos permanentes que gerem emprego e renda aliados à qualificação do capital humano e social. As mudanças na estrutura produtiva exigem

investimentos

em

Pesquisa

e

Desenvolvimento

(P&D),

na

competitividade das comunidades e na sustentabilidade ambiental. Já as mudanças sociais exigem que a presença do Estado, através do planejamento e da intervenção regional, seja capaz de: - Ampliar a universalização da proteção social, garantindo o bem-estar social e o fortalecimento do capital humano. - Ampliar o perfil da economia solidária dentro da economia de mercado. A economia solidária implica em destinar o lucro e os investimentos para as finalidades decididas coletivamente. Nesse caso, os gestores da política regional devem ser capazes de trabalhar em prol dos interesses das comunidades locais fortalecendo a democracia participativa. -Estimular o desenvolvimento “pela base” ou “desde dentro”. A política regional deve intervir junto às regiões, mas cabe a sociedade local tomar em mãos o seu destino e continuar o processo de desenvolvimento. A política de desenvolvimento regional deve ser uma plataforma para as forças políticas regionais dialogarem e estabelecerem prioridades e metas frente à própria política. Isso implica em fortalecer o papel da sociedade local e a sua capacidade de se articular para que a região possa se apresentar de forma organizada frente às iniciativas nacionais. O que exige uma política de desenvolvimento

regional

com

perfil

de

construtora

de

sinergias

e

complementaridades entre os vários projetos de desenvolvimento em diferentes escalas, melhorando a distribuição das riquezas, a manutenção e conservação dos recursos naturais e fortalecendo a convergência das economias regionais com a economia nacional. O exemplo de que isso é possível vem da União Européia. A Política de Desenvolvimento Regional da União Européia demonstra que a distribuição de riquezas mais equitativa e a diminuição das disparidades regionais em grandes espaços continentais é uma meta plausível e capaz de


ser alcançada. Um dos elementos que demonstra essa possibilidade é a diferença no perfil das disparidades regionais em termos de Produto Nacional Bruto (PNB), exposta na Tabela 02. O PNB representa o valor agregado de todos os bens e serviços gerados a partir da mobilização dos fatores de produção pertencentes aos residentes no país, independente da região onde esses fatores estão localizados. Tabela 02: Disparidades Regionais do Brasil e União Européia – Participação % da População e do Produto Nacional Bruto nas Regiões- 2006 Regiões % População % PNB

Mais Ricas 25 40,4

Brasil Mais Ricas 10 3,8

União Européia** Mais Ricas Menos Ricas 25 10 37 3,9

Fonte: European Commission. Notas: * Dados US$ PPS .

Apesar da extensão continental entre Brasil e União Européia serem aproximadas, a economia regional européia apresenta-se bem menos concentrada em termos de participação das regiões no Produto Nacional Bruto que a economia regional brasileira. Para isso, a estratégia da União Européia se baseia na concentração de recursos nas regiões menos ricas e na concentração de esforços na competitividade.

Para a concentração dos

recursos e a definição das regiões a serem priorizadas, os gestores da política regional européia contam com a harmonização das informações e um sistema estatístico eficiente que permite comparações sem distorções. Isso auxilia na regionalização do continente e a transferência de recursos baseada numa estratégia de prioridades em que são elencados os pontos fortes e fracos de cada região e seus multiníveis de governança. O que implica em estabelecer o planejamento em todos os níveis (nacional, regional, local) e a adaptação das ações em função das especificidades regionais. As especificidades da política de desenvolvimento regional na União Européia e no Brasil estão expostas no Quadro 01. Quadro 01: Comparativo da Política de Desenvolvimento Regional no Brasil e na União Européia. Especificidades

Brasil

União Européia


Temporalidade

Curto-prazo (02 fases)

Foco

Dinâmica econômica a partir das especificidades regionais. Atuação diferenciada por região Regiões estagnadas ou de baixo dinamismo Política especializada, otimização dos recursos públicos nas aptidões regionais. Na fase II será a universalização e a descentralização, cooperação federativa. Construção do capital social, Pesquisa e desenvolvimento, formação de novas governanças, qualidade do capital humano, base econômica local gestão e governança em diversificada e estímulo aos todos os níveis, estímulo aos arranjos produtivos locais arranjos produtivos locais. Estrutura de avaliação a ser Construção de indicadores e consolidada de base de dados estatísticos Construção de uma agenda Futuro da integração européia prospectiva e pró ativa, e a manutenção da zona do elaboração de uma estrutura de euro, desenvolvimento rural e avaliação, baixa convergência e gestão urbana transversalização das políticas federais, consolidação como política de Estado, criação de fundo nacional. Lançar as bases do planejamento Diálogo entre os parceiros regional, fortalecimento das independente das suas regiões pobres ou estagnadas, especificidades e culturas, formação do grupo sobre monitoramento dos programas integração transfronteiriça, de intervenção regional, fortalecimento das economias empoderamento da população regionais, recriação da base e das regiões e avanço na institucional macrorregional e coesão territorial e numa criação de mecanismos e identidade continental. programas de apoio às regiões periféricas Capacidade de alocar recursos de forma eficiente, flexibilidade na acessibilidade dos recursos, capacidade de monitoramento e acompanhamento das políticas públicas

Espaço de ação Estratégia de ação

Estratégia de competitividade

Avaliação Desafios

Méritos

Desafios conjuntos

Curto e longo-prazo (em maturação) Coesão territorial, fortalecimento das regiões, capital humano Regiões menos ricas, territorialidade Potencial endógeno, competitividade, democracia participativa e parcerias em diversos níveis, fortalecimento do capital social.

Apesar das diferenças e similaridades da política regional da União Européia e da brasileira, a eficiência da política de desenvolvimento regional Européia está vinculada a condicionalidades, dentre elas: as prioridades ambientais; as condições para investir; as condições de competitividade das empresas (sem obstáculos ao comércio); oportunidades iguais e a livre concorrência entre as regiões. O objetivo dessas condicionalidades é fazer da Europa uma economia mais dinâmica, mais competitiva, com menos


desigualdades regionais, integrada e com foco estratégico. O que implica em fazer com que as populações locais se apropriem da estratégia e tornem suas regiões mais atraentes para investimentos. A atração dos investimentos não é feita baseada apenas em recursos naturais, mas também em capital humano e social, valorizando e respeitando as aptidões dos territórios. Em outras palavras a base da política pública é o território enquanto espaço socialmente construído. 3. Políticas Públicas Com Base Territorial: Avanços e Desafios. Um dos grandes diferenciais entre as ações da União Européia e da Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR) do Brasil está na visão prospectiva do território e o futuro desejado para as regiões focadas em suas ações. Porém, as prioridades nas ações da política regional na União Européia e no Brasil são diferentes em função da natureza dos problemas regionais. Enquanto nos últimos anos a Europa construiu uma estrutura de bem-estar social que valoriza o capital humano e social, o que diminuiu o adensamento e o contingente da pobreza, no Brasil a problemática social é muito mais grave e permeia todas as ações de Estado. Em função da ausência da democracia participativa e dos desequilíbrios macroeconômicos vivenciados a partir de 1964, os problemas sociais brasileiros foram tão agravados que em determinadas regiões à subsistência é a principal ação de manutenção do capital humano, antes mesmo da qualificação profissional. Além disso, a temporalidade dos mandatos políticos e a ausência de políticas de longo prazo fazem com que no Brasil os resultados tenham de ser imediatos, quando políticas de desenvolvimento regional exigem uma temporalidade de ações muito mais longa que o mandato dos políticos. Enquanto a política regional européia tem uma visão estratégica de longo-prazo baseada na vontade dos cidadãos, a PNDR já surgiu com uma ação de curto prazo, ou seja, ela ainda está em construção. Enquanto a política européia foca a coesão territorial, a PNDR preocupa-se com a dinâmica econômica. Por isso, a PNDR está focada nos espaços prioritários definidos num diagnóstico inicial levando em consideração variáveis econômicas geográficas. A ação da PNDR ocorre em regiões estagnadas ou com baixo


dinamismo, cujo nível de crescimento econômico estava bem abaixo de um conjunto de regiões consideradas dinâmicas. Sua estratégia de ação está baseada na otimização de recursos públicos, o fortalecimento da democracia e o reconhecimento das especificidades, condições sociais e realidades cotidianas. A intervenção regional prioriza o potencial endógeno das regiões brasileiras, a integração e articulação do governo em todas as suas esferas e a ação em múltiplas escalas territoriais. Para atender seus objetivos e o foco das suas ações, a PNDR estabeleceu como estratégia de competitividade a construção do capital social, a formação de uma nova governança e o estímulo a uma base econômica local diversificada e fortalecida. Apesar desses objetivos, a busca por resultados econômicos como forma de avanço apresenta-se como a principal implicação das ações da PNDR. Porém, saber ao certo se o método de intervenção regional usado no escopo da PNDR surte resultados econômicos e sociais eficazes se torna difícil, pois os seus gestores necessitam de um sistema de informações sobre o conjunto dos aspectos determinantes da dinâmica territorial, e, se a base econômica dessas regiões, dada as condições atuais tem condições de se inserir na competição em escala nacional e internacional. É certo que o empoderamento, o conteúdo inovador, a democracia participativa, o respeito às identidades regionais, o estímulo à cultura empreendedora, e a consolidação do planejamento e da gestão são elementos que fortalecem a sociedade e têm rebatimentos no progresso em longo prazo e representa um avanço nas proposições do governo brasileiro para as regiões periféricas. Contudo, na estrutura de gestão e aplicação da PNDR não está visível como esses resultados esperados serão ou são alcançados. Tanto é verdade que falta uma agenda pró-ativa frente aos desafios apresentados ao fortalecimento da PNDR, quais sejam: - A desintegração e a descontinuidade das políticas públicas, algo comum no Brasil; a pouca transversalidade e convergência das políticas federais, demonstrada pelas inúmeras ações de intervenção de diferentes ministérios em áreas prioritárias pela PNDR e pela dificuldade em formular projetos integrados e com orçamento conjunto; - O financiamento do desenvolvimento regional, cuja prioridade é criar um fundo específico, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional;


- A superação do corporativismo e dos interesses regionais ou políticas contrárias aos avanços propostos pela política de desenvolvimento regional; a dificuldade em fixar profissionais tanto nas regiões periféricas quanto na gestão da PNDR. Os desafios que integram a implantação e a continuidade da PNDR vão além do avanço econômico e social das regiões priorizadas, pois exigem ações especificas

no

tocante

a

estrutura

de

gestão.

Os

mecanismos

de

acompanhamento e controle dos resultados da intervenção da PNDR, bem como de orientação e gerenciamento dos investimentos e dos seus resultados ainda não são claros. Uma política de investimentos e de fortalecimento de regiões, quando mal orientadas e sem estudos de impacto econômico, ambiental e social pode produzir efeitos adversos aos esperados. Ao invés de estimular o avanço do conjunto das mesorregiões, poderá fortalecer enclaves em detrimentos dos territórios no seu entorno. Portanto, junto com a intervenção das ações da política de desenvolvimento regional, as formas de governança e acompanhamento do processo de desenvolvimento regional devem ser constantes. No caso da União Européia, suas prioridades vão desde a coesão territorial

ao fortalecimento social e regional. Isso exige ações voltadas ao

desenvolvimento sustentável harmonizando o crescimento econômico, a conservação dos recursos naturais e as conquistas sociais da população. No caso das conquistas sociais da população, enquanto no Brasil a democracia participativa é um objetivo paralelo ao fortalecimento da cidadania, a Europa já está bem mais avançada na promoção de serviços de interesse geral, no desenvolvimento das oportunidades e numa estrutura de governança que valoriza a opinião do cidadão e as ações de cooperação. O resultado da política regional européia fica claro nos seus avanços, e os debates em torno do crescimento econômico já incorporaram temáticas tais como: as mudanças climáticas; as mudanças demográficas, em especial seus efeitos sobre a migração; o maior envolvimento dos agentes econômicos locais e regionais para discutir desde o futuro de suas cidades até ações mais concretas de preservação ambiental e de construção de um futuro coletivo; o reforço à cooperação territorial; e, principalmente, a construção de indicadores e um processo de avaliação e acompanhamento dos resultados da política


regional, sua forma de intervenção e o retorno dos seus investimentos para a sociedade. Para chegar a esses avanços, o foco da política regional européia, além do fortalecimento da base econômica das regiões através da inovação e da competitividade, foi também construída sob mudanças de governança. Mais que a mobilização de fundos financeiros, mobilizou-se a capacidade dos agentes econômicos tanto na gestão quanto na coordenação dos fundos. A governança ficou descentralizada envolvendo cada vez mais a sociedade, as autoridades urbanas e experts de diferentes níveis na gestão dos recursos. Essa estrutura de governança influenciou as prioridades da política regional que priorizam o capital humano, em mais empregos com dignidade, inclusão social; pesquisa e inovação, meio ambiente. O grande ganho dessa governança surgiu no método utilizado para implementar a política européia, ou seja, na abordagem de parcerias e o consenso sobre as oportunidades, problemas, ameaças e desafios das regiões. O mérito dessa abordagem é a construção do diálogo entre os parceiros, as consultas públicas junto à população e o monitoramento na implementação dos programas de intervenção regional. 4. Políticas regionais: olhar pós-2010. A criação da PNDR está inserida numa agenda de ações do governo brasileiro com o desenvolvimento regional, cuja articulação iniciou com a redemocratização e a constituição de 1988. Porém, até o final da década de 1990, no Brasil, o que conduziu o debate em torno das políticas públicas foi o desequilíbrio macroeconômico. A prioridade girava em torno do descontrole inflacionário e a diminuição da dependência de capitais estrangeiros. As reformas macroeconômicas, a consolidação da estabilidade dos preços após 1994, a municipalização de uma série de serviços públicos, o fortalecimento da sociedade civil organizada, a liberdade de expressão, o fortalecimento dos movimentos sociais, a descentralização das receitas federais e as disputas estaduais por novos investimentos trouxeram para o cenário nacional a discussão sobre o fortalecimento das economias regionais e da necessidade de uma política de desenvolvimento regional.


Porém, no contexto regional, as especificidades da tipologia das economias regionais, a continuidade dos fluxos migratórios, a desigualdade na oferta de bens e serviços, a competição entre os estados federais, o dinamismo diferenciado dos pólos nacionais fez com que a participação das regiões na riqueza nacional ficasse em diferenciais bem assimétricos. Na Tabela 03 são expostos dados sobre a participação das regiões brasileiras no Produto Interno Bruto nacional. Os dados da Tabela 03 por si só já demonstram a necessidade de se pensar o desenvolvimento econômico regional no Brasil. A partir do início do século XX a economia brasileira iniciou um processo de concentração econômica no Sudeste, que só foi amenizado na década de 1970. No final dos anos 1980 houve nova reconcentração econômica e no final do século XX a economia das Regiões Sul e Sudeste produziam 74,8% de toda a riqueza brasileira. Tabela 03: Participação Percentual (%) das Regiões Brasileiras no Produto Interno Bruto (PIB) – a preços de mercado – 2000, 2005 e 2007. Regiões

Participação percentual no PIB

População %

2000

2005

2007

4,4

5,0

5,0

08

Nordeste

12,4

13,1

13,1

28

Sudeste

58,3

56,5

56,4

42

Sul

16,5

16,6

16,6

15

CentroOeste

8,4

8,9

8,9

07

Brasil

100

100

100

100

Norte

2007

Fonte: IBGE, em parceria com os Órgãos Estaduais de Estatística, Secretarias Estaduais de Governo e Superintendência da Zona Franca de Manaus – SUFRAMA

Entre 2003-2011, o Ministério da Integração Nacional (MIN) estabeleceu como metas:


Reestruturar instrumentos e mecanismos de desenvolvimento regional, elaboração da PNDR e do Ordenamento Territorial para atuar sobre desigualdades e diversidades territoriais;

Redefinir e criar a base institucional macrorregional (Superintendencias de Desenvolvimento);

Criar bases para atuação programática sub-regional;

Emanar critérios de atuação regional para outras políticas de Governo;

Instituir

a

Câmara

de

Políticas

de

Integração

Nacional

e

Desenvolvimento Regional; e Dessas ações, as mais significativas foram a PNDR e a recriação da base institucional macrorregional, capitaneada nas superintendências e nas agências regionais de desenvolvimento, como mecanismo de transferência de recursos e fomento. Mais que agências de fomento, as superintendências e agências regionais têm um papel importante no financiamento de projetos e também para a atuação dos gestores públicos no suporte às regiões. Apesar de sua ação ser limitada, a sua experiência foi salutar para fornecer informações e conhecimento das realidades regionais. Futuramente, essas agências serão um instrumento importante de ordenamento territorial, que foi um objetivo ainda não atingido na agenda do desenvolvimento regional brasileiro. Já os resultados da PNDR foram o estabelecimento de uma territorialização de ação, a criação de mecanismos de financiamento, a reorganização da base institucional, a modernização de instrumentos e mecanismos de gestão. Porém, ainda há poucas informações sobre os resultados práticos das políticas de fomento regional e o impacto das diretrizes da PNDR junto à dinâmica econômica das regiões no empoderamento das comunidades locais. As propostas para a fase II (2011-2015) terão como foco a atuação diferenciada da política regional de acordo com o perfil de cada região, ou seja, expandir a ação da PNDR tratando de forma diferenciada cada região conforme seu perfil de desenvolvimento. Isso implica em criar critérios de avaliação eficazes para determinar quem são os territórios elegíveis e quais são suas


prioridades frente ao futuro desejado pela comunidade. A partir da elegibilidade das regiões e das prioridades poder-se-á então estabelecer os modelos adequados de governança, de subvenção, de financiamento e até mesmo de intervenção junto às regiões. Na fase II são propostas três níveis da governança na PNDR: •

Nível estratégico: Conselho Nacional de Integração de Políticas Regionais e Territoriais (define a estratégia de Estado – seus membros são gestores do Governo e da sociedade);

Nível Tático: Câmara de Gestão de Políticas Regionais, cuja tarefa é apreciar e aprovar o Plano de Trabalho plurianual, as programações anuais e coordenar as ações com base territorial;

Nível Operacional: Comitês Estaduais de Gestão de Políticas Territoriais e Regionais, que gerenciam e executam as Políticas.

Na

questão

da

elegibilidade,

a

PNDR

pós

2011

prevê

três

territorialidades para suas ações: - Na primeira territorialidade estão os territórios de convergência, tanto no padrão de dinamismo quanto no padrão de estagnação ou de baixo crescimento. -Na segunda territorialidade estão os territórios com padrão de competitividade consolidada, ou seja, cujo dinamismo se fortalece ao longo do tempo criando ou garantindo a alta renda. - E, na terceira territorialidade, têm-se os territórios em transição, ou seja, que estão evoluindo de um padrão de baixo dinamismo para alto dinamismo. Diferente da PNDR brasileira, que é uma política nascida num período democrático recente, a política regional européia tem como prioridade nos próximos anos a cooperação e a coesão territorial, o suporte a gestão urbana e o desenvolvimento rural. No caso da cooperação e coesão, o seu foco será de criar oportunidades onde as pessoas vivem, reduzindo o impacto das diferenças e garantindo a acessibilidade das pessoas. Ou seja, o processo de desenvolvimento regional tem de garantir a inovação e a competitividade, mas também criar as oportunidades para a inclusão social. De um lado protege-se o


bem-estar social da população e de outro se reduz os impactos das polarizações das regiões mais ricas sobre as regiões menos favorecidas pela geografia e os investimentos. As perspectivas do desenvolvimento regional na União Européia e no Brasil dependerão da capacidade de alocar recursos, da flexibilidade no acesso aos recursos, da transparência e do acesso à informação e da capacidade de monitoramento e avaliação das políticas públicas. 5. Infraestrutura e desenvolvimento regional Uma das grandes discussões no cenário político brasileiro são as obras de infraestrutura. Diferente da União Européia,

que consolidou uma

infraestrutura de transportes que integrou os países membros, o Brasil consolidou principalmente corredores de exportações, e, consequentemente, de desenvolvimento. Constata-se que a infraestrutura brasileira não foi direcionada para a coesão territorial do país, fato que fortaleceu a polarização regional e na formação de grandes enclaves de desenvolvimento. Por exemplo, ao observar a produção brasileira de alimentos, a sua participação no mercado mundial e compará-la com a espacialidade da economia brasileira, nota-se que uma matriz de transporte eficiente é o vetor de ocupação da fronteira agrícola e da inserção das regiões periféricas nas rotas de comércio. Como o Brasil ainda possui uma fronteira agrícola em movimento, o fortalecimento das economias regionais passa pela expansão dos modais e do estímulo às atividades que possam ser motrizes agregando valor aos recursos naturais. Nesse caso, a infraestrutura física tem um papel importante para criar as condições favoráveis para o desempenho das atividades econômicas e com isso, ampliar a acumulação de capital. Por essa razão, dentre as diretrizes do setor de transportes está a de atender em primeiro lugar as demandas geradas pelo crescimento da economia, o que implica em reduzir os níveis de ineficiência quanto aos custos e periculosidade, estimular a intermodalidade e fortalecer a integração com os países da América do Sul. Os desafios para os investimentos e o planejamento da infraestrutura brasileira são:


- Ampliar a cobertura geográfica da infraestrutura, o que contrasta com sua proposta de integração dos territórios como eixo de ocupação, de desenvolvimento e de presença do Estado nas áreas mais remotas do país; -Fortalecer o desenvolvimento nacional através da interiorização do desenvolvimento econômico e do fortalecimento da rede de cidades, o que é estratégico também na consolidação do espaço brasileiro; - Garantir a competitividade das atividades econômicas, pois a infraestrutura

de

transportes

torna-se

um

indutor

e

catalisador

do

desenvolvimento econômico regional. Para atender a esses desafios, a infraestrutura brasileira deverá ser tratada sobre quatro fundamentos lógicos: O primeiro é estabelecer um novo patamar de investimentos públicos na matriz de transportes, diminuindo a forte dependência de uma única modalidade. Na Figura 02 estão expostas as metas para 2025. Figura 02: Matriz de Transportes no Brasil – Metas Para 2025.

Fonte: Ministério dos Transportes – PNLT.

Pela Figura 02, nota-se que atualmente, 58% do transporte brasileiro se faz ao longo das rodovias. As consequências da forte concentração na malha rodoviária é o passivo ambiental, haja vista as taxas de lançamento de CO2 na atmosfera; os custos financeiros em função da sua capacidade de carga e a qualidade das rodovias; e, as taxas de acidentes mais expressivas entre todas as modalidades de transporte. A meta em 2025 é reduzir a dependência das rodovias para 35%, o que implica em aumentar sensivelmente a participação de outros modais no


escoamento da produção, bens, valores e pessoas. O plano é equilibrar a matriz de transporte entre os modais rodoviários, ferroviários e aquaviários, principalmente com o fortalecimento das hidrovias. O segundo é o resgate do planejamento e a concepção de territorialidade. A redução da ação do Estado brasileiro ao longo da década de 1990 afetou consideravelmente a capacidade de planejamento em transportes, sem contar a falta de recursos financeiros para a manutenção e conservação dos modais. Porém, as mudanças na política econômica e o retorno do papel do Estado em induzir o desenvolvimento, regular a concessão de serviços e patrimônio público exige que a atividade de planejamento seja retomada para garantir investimentos e a redução das disparidades entre as regiões. Para isso, a estrutura de planejamento deverá ser capaz de avaliar o sistema existente, identificar seus gargalos e propor alternativas viáveis ao longo dos próximos anos. Contudo, a atividade de planejamento se perde se não houver o compromisso da manutenção dos investimentos nos próximos orçamentos federais. Cabe ressaltar que a estrutura de planejamento deve estar atrelada a uma visão de desenvolvimento econômico de curto, médio e longo prazo que considere as peculiaridades regionais. E esta, por sua vez, deve ser capaz de considerar o contexto global, sem deixar de estar em sintonia com as grandes políticas de fortalecimento das regiões, como a PNDR. O terceiro é o fortalecimento da capacidade de gestão tanto dos investimentos quanto da rede de transportes. O planejamento dos transportes para o desenvolvimento regional deve ser baseado numa gestão institucional, comprometida com o território, a sustentabilidade ambiental, a segurança nacional e o avanço econômico das regiões. E o quarto é ampliar as parcerias com a iniciativa privada. No Brasil isso foi iniciado através da concessão de rodovias e ferrovias a empresas privadas ou a parceria em grandes projetos de investimento. No caso desses grandes projetos, a preocupação sempre foi à escala nacional, ou seja, os grandes desafios

do

desenvolvimento

telecomunicações

e

transportes.

brasileiro Os

em

termos

grandes

projetos

de nunca

energia, foram

sistematizados ou planejados para atender o desenvolvimento regional em específico. Por isso, há sempre uma disputa entre os estados federados para receber grandes obras de infraestrutura elétrica ou de transportes. Por isso, o


dinamismo das regiões ricas e suas demandas de energia têm uma influência significativa na capacidade de investimento do orçamento federal nas regiões pobres. Cabe ressaltar o aspecto da integração sulamericana nos investimentos previstos para a matriz de transportes no interior do Brasil, ilustrados na Figura 03. Figura 03: Ligações Bioceânicas e de Cabotagem do Brasil com a América do Sul

Fonte: Ministério dos Transportes.

A Figura 03 apresenta a ligação das regiões brasileiras e os países limitrofes ao Brasil via corredor bioceânico, integrando os países do Mercosul e abrindo as possibilidades de escoamento da produção brasileira através do Oceano Pacífico. A proposta do corredor bioceânico fortalece a economia do Centro-Sul do Brasil e consolida a fronteira agrícola nas áreas da Amazônia Ocidental. No entanto, a consolidação dessa infraestrutura ainda dependerá da aceleração e a garantia dos recursos para investimentos, do ritmo de crescimento da


economia brasileira, das relações de comércio e integração com os países da América do Sul, bem como um marco regulatório de uso dessa infraestrutura como corredor de exportações e de mobilidade da população. 6. Arranjos Produtivos Locais: Experiências Concretas de Ação no Território em Escalas Distintas. A entrada do terceiro milênio nos remete a novos desafios e oportunidades, mais ainda a uma avaliação das políticas de desenvolvimento regional implementadas. As condições para o desenvolvimento socioeconômico não são mais as mesmas, a necessidade de restringir os danos ambientais são cada vez mais necessários e a possibilidade de abrir novos mercados está cada vez mais ligada ao compromisso das empresas com o social, o ambiental e a qualidade dos seus produtos. Isso exige junto às empresas um sistema de inovação constante, utilizando tecnologias “limpas” e boas práticas de governança. Porém, em determinadas áreas, o avanço empresarial exige a cooperação e a troca de experiências entre empresas e empresários. Nesses casos é possível aliar a complexidade, os laços culturais, as formas de relacionamento e as especificidades regionais a favor da inovação e do fortalecimento das economias regionais. A região nesse caso passa a ser um “meio inovador”, um espaço de aprendizagem interativa e um espaço de cooperação entre os seus empreendedores. O dinamismo da economia regional passa pelo avanço do local, ou seja, desenvolvimento econômico regional é um processo de reativação da economia, de empoderamento e de fortalecimento da sociedade local, com base no aproveitamento ótimo de seus recursos endógenos. O resultado é crescimento da economia, a criação de empregos e a melhoria da qualidade de vida. Nesse contexto, os Arranjos Produtivos Locais (APLs) surgem como um instrumento e uma estratégia de competitividade das economias locais e regionais. Os APLs são configurações marcadas pela interação entre diferentes agentes ligados a uma mesma atividade econômica num mesmo território. Seu grande diferencial está nas “interações” existentes entre estes agentes, as


quais necessitam de confiança e envolvem contextos culturais e convivência, que vão além das relações contratuais e formais do mercado. Na política regional brasileira, os APLs são um dos espaços prioritários dos programas de desenvolvimento regional (Figura 04). Os APLs apoiados demonstram a diversidade da economia brasileira, pois cobrem sementes agroecológicas, piscicultura, apicultura, bovinocultura, jóias, produção mineral, turismo, etc... Figura 04: Arranjos Produtivos Locais nas Mesorregiões Diferenciadas – 2003/2008.

Fonte: Ministério da Integração Nacional – Secretaria de Programas Regionais.

A formação de APLs exige bem mais que uma simples aptidão regional, porque a estruturação de APLs requer a organização da sociedade local para a formação de capital social, formando um elo institucional de gestão, negociação e de trocas de experiências. Exige também a agregação de valor na cadeia


produtiva, a articulação e a organização da sociedade se tornam um instrumento de competitividade a partir das suas vantagens comparativas. Por outro lado, a formação dos APLs também se torna um instrumento de descentralização das decisões políticas e o fortalecimento da democracia participativa. Mas, para o êxito dos APLs é fundamental o esforço de promoção da eficiência econômica local na busca do desenvolvimento e do aumento da competitividade de uma cadeia produtiva que esteja adequada às condições de mercado. Cada região deve procurar espaços de competitividade de acordo com suas condições e potencialidades, bem como nos setores em que se apresentam maiores capacidades e vantagens locacionais. No caso brasileiro, um dos exemplos de APLs, com suporte das políticas de desenvolvimento setorial do governo brasileiro, tanto do Ministério da Integração Nacional quanto do Ministério da Ciência e da Tecnologia, é a experiência da extração mineral, principalmente de pedras semipreciosas, rochas e cerâmicas, cujas atividades se estendem em grande parte do território nacional (Figura 05). Figura 05: Localização dos Arranjos Produtivos Locais de Base Mineral – 2009.

Cerâmica Vermelha -AP

Gemas e jóias - Pará Cerâmica Vermelha - TO

Opala de Pedro II - PI Calcário Cariri e Cerâmica vermelha – CE

Cerâmica Vermelha - AC

Pegmatitos – RN-PB Quartzitos e Cerâmica -RN Gesso - PE

Gemas e Jóias, Quartzito e Cerâmica – GO Ardósia – MG

Cerâmica vermelha – SE Bege Bahia - BA Gemas e jóias - MG

Quartzito – MG

Rocha ornamental - ES

Pedra Sabão – MG

Cerâmica vermelha – RJ Rocha ornamental e Gemas e Jóias - RJ

Calcário, Cal e Talco - PR

Cerâmica de Revestimento -SP

Gemas e jóias - RS Gemas e jóias - PR

Cerâmica de Revestimento - SC

Fonte: Ministério da Ciência e da Tecnologia – MCT.


As micro e pequenas empresas de mineração representam 73% do número de empresas ativas no Brasil e empregam entre 25% a 40% da força de trabalho ligada a atividade mineral. A geração de empregos nessa atividade é em grande parte de mão-de-obra de baixa qualificação, com dificuldades em se inserir em outros ramos produtivos em função da baixa escolaridade. Porém, apesar de adensadas em mão-de-obra, a extração mineral de pedras semiprecisosas é marcada também por fortes externalidades, tais como: informalidade nas relações de trabalho, falta de sustentabilidade ambiental, baixa produtividade, falta de controle de qualidade, baixa intensidade tecnológica, tanto na extração quanto no tratamento dos minerais. As ações para o fortalecimento dos APLs expostos na Figura 05 se nortearam nas seguintes ações e diretrizes: - Formalização de micro e pequenas empresas, garantindo a proteção legal e a capacitação das empresas para o comércio internacional; - Promoção do desenvolvimento local e regional. Nesse caso, a formalização

contribuiu

para

fortalecer

as

finanças

públicas,

pois

a

regulamentação das empresas gerou impostos e o recolhimento de taxas municipais, sem contar na formalização das relações de trabalho e a cobertura da previdência social nas atividades de garimpagem, além da formação e capacitação de recursos humanos, o que contribuiu para a inclusão social. -Inserção, transferência e disseminação de inovação e desenvolvimento tecnológico e modernização industrial, fortalecidas através das parcerias com o Ministério

da

Ciência

e

Tecnologia,

Universidades

e

instituições

de

financiamento e fomento. A legalização das atividades e os investimentos em capital humano contribuíram para a inclusão das empresas numa rede de cooperação

e

de

suporte

capitaneada

por

diferentes

instituições

governamentais e não governamentais. O que garantiu o acesso a novas tecnologias. O resultado foi à agregação de valor aos recursos minerais pela inovação de processo e produto e a sustentabilidade ambiental da atividade. - Divulgação e intercâmbio técnico-científico. - Promoção do acesso à informação. - Rede de serviço e extensionismo tecnológico, através da formalização de parcerias com Universidades e centros de pesquisa.


Os resultados alcançados entre 2003-2009 propiciaram a melhoria na qualidade dos produtos, o fortalecimento da competitividade das empresas via qualificação dos recursos humanos, a incorporação de inovações tecnológicas e a implantação de novas técnicas de gestão. Talvez os principais ganhos foram as melhorias nas condições de trabalho, a preservação dos recursos naturais, com a implantação de técnicas e tecnologias com menores impactos ambientais e riscos a saúde. Porém, o fortalecimento das micros, pequenas e médias empresas organizadas em APLs, tanto de base mineral quanto de outras atividades, está na definição e na garantia de continuidade de uma política pública sistêmica e integrada dos governos, que respeite as diversidades existentes no País. Outro exemplo de estratégia de desenvolvimento regional e territorial baseada no apoio e fortalecimento de APLs está na região do Veneto (Itália). Nessa região o desenvolvimento econômico é fortemente baseado em atividades urbano-industriais, com a presença significativa de pequenas e médias

empresas,

uma

forte

especialização

industrial

territorial,

a

complementaridade das atividades e uma preocupação significativa com a dimensão socioeconômica. O crescimento econômico gerado pela expansão dos investimentos empresariais foi balizado pela geração de postos de trabalho e o respeito à qualidade de vida da população. A geografia econômica dos APLs italianos está baseada na inovação, principalmente das atividades tradicionais; na formação de redes de cooperação; na transnacionalização e na formação de empresas globais. Ou seja, a dimensão é à base da organização produtiva das empresas em APLs, mas elas não devem permanecer estáveis e imutáveis ao longo do tempo. O seu progresso implica em otimizar o crescimento e ganhar escala, tanto no tamanho quanto no espaço territorial de ação. No caso dos APLs baseados no Veneto, um marco regulatório definido em 2003 consolidou seu avanço, pois disciplinou a organização dos distritos industriais e definiu as diretrizes para as políticas industriais locais de inovação. Dentre os avanços do marco regulatório, o principal foi o estímulo à cooperação e ao diálogo entre as empresas, pois só os projetos que envolvem a maioria das empresas e representam investimentos em pontos estratégicos para fortalecer a competitividade, a inovação, e que são ambientalmente adequados,


podem solicitar subvenções e o suporte dos fundos governamentais. Outro detalhe é que os APLs são reavaliados a cada três anos, em que são revistas as suas diretrizes. Atualmente, há 34 APLs registrados distribuídos em 10 regiões distritais do Veneto, envolvendo 10 mil empresas e gerando um total de 300 mil empregos. Dentre os projetos apresentados aos fundos de desenvolvimento regional pelos APLs locais, a grande maioria foi para investimentos em inovação, laboratórios técnicos, organização e participação de exposições e feiras, fortalecimento de marcas e infraestrutura. A preocupação já transcende o simples processo produtivo, mas se insere na dimensão estética e artística do produto, o que é primordial no processo de internacionalização. O resultado dessa política de desenvolvimento regional baseada em APLs se mostra mais positivo quando se compara a região do Veneto com o restante da Itália. No Veneto, a taxa de desemprego está na faixa de 3,5% da população economicamente ativa, enquanto a taxa da Itália está na faixa de 6,7% e a da União Européia em 7%. Sua economia registra 462.567 negócios, sendo 66.898 ligados à manufatura, o que gera 28,8% do valor adicionado total da região e equivale a 12,8% do valor adicionado da Itália. O setor terciário gera 64,6% do valor adicionado regional e equivale a 8,4% do valor adicionado italiano. A comparação entre a experiência italiana e brasileira demonstra que as políticas locais focadas em APLs devem primar pelo apoio à criatividade e inovação. Por vezes isso não se exprime apenas em incorporar novas tecnologias, mas investir em design e apresentação de produtos. Além disso, o processo de investimento e acompanhamento das empresas organizadas em APLs deve estar focado em dois níveis: O local, com o estímulo à cooperação, o treinamento de recursos humanos, o estabelecimento de marco legal e a criação de linhas de financiamento específicas para APLS. Há também o nível transnacional, que exige planejamento e crescimento de longo prazo. Para isso, a experiência do Veneto demonstra a necessidade em se criar infraestruturas estratégicas (logística, legislação, patentes, formação de capital humano, acesso a financiamento,). 7. Conclusões e recomendações


A Política Nacional de Desenvolvimento Regional brasileira entrará a partir de 2011 na sua segunda fase. Por isso, enquanto ação de governo para resgatar a economia das regiões estagnadas ou de baixo dinamismo e inserilas na dinâmica do mercado nacional e internacional, a PNDR necessita de uma avaliação mais aprofundada dos resultados alcançados nas ações da sua primeira fase e que foram efetivamente executadas, tanto no âmbito das regiões quanto na formulação de legislação. A avaliação dessas ações criará os elementos e argumentos para torná-la uma política de Estado

ainda mais

eficiente. Não se sabe ao certo em qual magnitude os investimentos, as parcerias, a ação dos gestores e o suporte dado pelo Ministério da Integração Nacional (MIN) foram os

responsáveis pela retomada do dinamismo nas regiões de

abrangência da PNDR. Pois no Brasil há ações de diferentes ministérios junto às regiões periféricas, em particular do Ministério do Desenvolvimento Agrário, com o Programa “Territórios da Cidadania”; do Ministério do Desenvolvimento Social, com o “Bolsa Família” e outros programas sociais e de transferência de renda. Talvez essa seja uma das principais lições aprendidas com a Política de Desenvolvimento Regional da União Européia: transparência das informações, a consequência das políticas públicas e a avaliação constante das ações. Principalmente sobre a avaliação da capacidade da intervenção regional nas regiões da Europa capazes de criar sinergias entre os agentes econômicos e sociais e ampliar a competitividade. Apesar do Simpósio Internacional Gestão de Políticas Regionais em Perspectiva discutir a construção da PNDR brasileira, em especial da escolha das regiões prioritárias e diferenciadas, do interesse em ampliar o número de regiões e das áreas de ação, pouco se discutiu e não se apresentou elementos concretos

de avaliação, de

acompanhamento dos investimentos, das

intervenções balizadas pela PNDR junto às regiões e, principalmente, os elementos que nortearão as novas territorialidades e governança na segunda fase da política nacional. As propostas de governança e de territorialidadepar a segunda fase da PNDR deixam alguns questionamentos: Qual o parâmetro de avaliação do perfil


da territorialidade? Será que os parâmetros utilizados na primeira fase da PNDR ainda serão válidos para classificar as mesorregiões diferenciadas quanto ao seu dinamismo? Qual o parâmetro para avaliar as desigualdades intra e interterritoriais? Esses questionamentos demonstram mais uma vez a necessidade de acompanhamento, controle e avaliação do desempenho das regiões e das ações propostas na PNDR. Por isso, os principais desafios para a próxima fase, além de tornar a PNDR uma política de Estado, será a criação de mecanismos e instrumentos eficazes de desenvolvimento regional que consolidem o fortalecimento institucional, a capacitação de gestores do desenvolvimento nas regiões, a capacidade de gestão de empreendimentos e a avaliação dos resultados das políticas públicas. Da mesma forma, o papel das cidades e suas áreas de gravitação ficaram a margem das discussões, quando o fortalecimento das economias regionais passa tanto pela valorização dos espaços rurais quanto dos espaços urbanos. Em regiões periféricas os espaços rurais e urbanos formam um continnuum que não pode ser desprezado e muito menos desconsiderado nas ações da PNDR. Tanto que o Brasil possui grande parte da população em áreas urbanas, em especial nas cidades de médio e grande porte. As populações localizadas nas cidades médias (entre 100 mil e 500 mil habitantes, não-metropolitanas e não capitais) são em boa parte populações de passagem, algumas oriundas ou com destino potencial para as regiões de fronteira agrícola. Essas populações estabelecem vínculos econômicos com as áreas de fronteira agrícola e utilizam as cidades médias do interior como plataformas para a ocupação do território, transformando essas cidades em polarizadoras importantes de uma parcela significativa do hinterland brasileiro. Nesse sentido, desconsiderar a importância das áreas urbanas no dinamismo das regiões do Brasil contemporâneo quando se discute desenvolvimento regional é desconsiderar a estratégia de inserção nos mercados e a criação de atividades complementares e economias de proximidade, o que conta muito na geração de encadeamentos produtivos (linkage effects) nas regiões prioritárias para a PNDR. Ao discutir o impacto da política regional da União Européia e dos transportes na economia regional, os experts da União Européia e do Ministério


dos Transportes do Brasil apresentaram um conjunto de indicadores que podem servir de parâmetro para os responsáveis pela PNDR criarem uma estrutura de avaliação e acompanhamento dos investimentos feitos pelo Ministério da Integração

Nacional

(MIN)

junto

às

regiões.

Essa

estrutura

de

acompanhamento e avaliação fornecerá um sistema de informações sobre os resultados práticos da intervenção regional e sua capacidade de dinamizar a economia regional e fortalecer as comunidades locais. Para uma política de avaliação e acompanhamento eficaz, serve de referência e parâmetro os elementos propostos pela Professora Helena Lastres, na sua apresentação sobre as experiências concretas de ação no território em escalas distintas, quais sejam: •

Associação entre desenvolvimento econômico e social;

Efeito na redução dos desequilíbrios ao invés de reforçá-los;

Reconhecimento e mobilização das potencialidades locais;

Integração com as prioridades do desenvolvimento nacional, regional, estadual e local dentro de uma perspectiva de longo prazo;

Foco na capacidade de adquirir e usar conhecimentos;

Apoio na criação de capacitações produtivas e inovativas e de empregos de qualidade;

Capacidade de promover o desenvolvimento enraizado, inclusivo, coeso e sustentado.

Outro fator importante a salientar é o futuro das regiões após a política de desenvolvimento regional, ou seja, o objetivo do desenvolvimento regional é que as comunidades se articulem e ao longo do tempo criem uma dinâmica própria, tanto nas atividades produtivas quanto na sua capacidade de organização social e no seu empoderamento. As comunidades devem ser capazes de construir o futuro desejado, um porvir de prosperidade. Nesse caso, as comunidades “pegam em mãos” o seu desenvolvimento e constroem o seu futuro. Isso exige clareza na transição das ações previstas na PNDR. Da mesma forma que a política regional chega para induzir o desenvolvimento regional, ela também deve ser clara na forma como se retira do papel de indutor, diminuindo a intervenção regional. Por isso, é importante o


fortalecimento da livre iniciativa, do espírito empreendedor e da cooperação entre os agentes econômicos e sociais, para que eles sejam capazes de construir um progresso econômico com inclusão social. Na PNDR não está claro os mecanismos de transição entre uma ação intervencionista para a construção de comunidades autônomas em seu desenvolvimento. Talvez essa tenha sido uma das mais importantes lições transmitidas pela política regional da União Européia, pela trajetória dos Açores e pelos arranjos produtivos locais (clusters) italianos: a capacidade de fortalecer a organização e a cooperação entre os agentes econômicos e sociais para construir a autonomia do desenvolvimento de suas regiões. A experiência da Itália, nos casos apresentados sobre as regiões da Emiglia-Romagna e do Veneto, demonstra que o processo de desenvolvimento se faz para a sociedade e pela sociedade. Isso implica em assegurar a competitividade dos produtos locais, o fortalecimento da inovação, da democracia participativa, o respeito aos valores culturais e ao meio ambiente e, com tudo isso, fortalecer a identidade cultural. A autonomia que essas regiões italianas e os Açores (Portugal) demonstram é um exemplo de como a política pública pode estimular a economia regional, mas não substituí-la ou subvencioná-la todo o tempo. Portanto, uma política de desenvolvimento regional de longo prazo deve ser balizada pela necessidade, a forma, o momento ideal da intervenção, e também pelos mecanismos para garantir a autonomia das sociedades locais em assegurar por si mesmo o seu futuro.


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