Livro Texto Cerâmica

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Cerâmica Universidade Aberta do Brasil Universidade Federal do Espírito Santo

Artes Visuais

Licenciatura


Maria Regina Rodrigues Graduada em Artes Plásticas pela Universidade Federal de Uberlândia (1981), Especialização em Arte Educação pela ECA/USP (1992), Mestrado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Católica de São Paulo (1988) e Doutorado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Católica de São Paulo (2004). Foi premiada no Concurso Internacional de Cerâmica de L’Alcora, Espanha em 2008 (1º lugar) e 2009 (menção honrosa). Membro da comissão julgadora do 3º Salão Nacional de Cerâmica de Curitiba em 2010. Atualmente é professora adjunta da Universidade Federal do Espírito Santo; Sub-Coordenadora e Revisora de conteúdo do Ensino à Distância do Curso de Artes Visuais da UFES; Pesquisadora pela FAPES (Fundação de Apoio e Pesquisa do Espírito Santo) com o projeto: O espaço de trabalho das Paneleiras: intervenções no processo de criação desde 2009.


UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO Núcleo de Educação Aberta e a Distância

Cerâmica

Maria Regina Rodrigues Colaboradores: Júlio César da Silva, Penha Schirmer, Tatiana Campagnaro e Terezinha Drago

Vitória 2011


UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO Presidenta da República Dilma Rousseff

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Vice-Reitor Prof. Reinaldo Centoducatte

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Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP) (Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil) R696c

Rodrigues, Maria Regina.    Cerâmica / Maria Regina Rodrigues, colaboradores, Júlio César da Silva, Penha Schirmer, Tatiana Campagnaro e Terezinha Drago. - Vitória : UFES, Núcleo de Educação Aberta e a Distância, 2011.    108 p. : il.    Inclui bibliografia.    ISBN: 978-85-64509-02-3    1. Cerâmica. I. Título. CDU: 738

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Sumário Apresentação

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Evolução da cerâmica

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Cerâmica nas artes visuais

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A cerâmica nas artes plásticas no Brasil

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Cerâmica contemporânea brasileira

20

Matéria-prima Como preparar e testar uma argila

29

Preparação da massa cerâmica

30

Pigmentos naturais

32

Espaço de produção

34

Ferramentas

37

Modelagem

4 Cerâmica

26

40

Pote de aperto

42

Rolinho

43

Placa

45

Bloco

48

Torno

51

Acabamento

56

Tempo de secagem

56


O processo de criação na cerâmica

58

Barro: estudo e obra

59

O desenho como modo de construção do pensamento

61

O resíduo como possibilidade de obra

65

Diálogo com outras linguagens

66

A utilização de outros materiais como estudo de processo

68

Fornos e queimas

70

Tipos de queimas

75

Fornos alternativos

79

Relato de experiência: construindo uma identidade na arte popular

86

Cerâmica indígena

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Da metodologia

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A arqueologia como forma de recordar nosso passado

89

Novos processos

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Considerações

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Considerações finais

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Referências

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Lista de imagens

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Cerâmica

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Apresentação O livro Cerâmica é uma breve introdução à argila, suas possibilidades de construção e transformação em objeto cerâmico. Este material pretende ser uma orientação para que o aluno possa ampliar suas pesquisas conceituais nas artes e investigar as principais técnicas cerâmicas a partir desta breve introdução. É importante lembrar que somente a leitura do livro não será suficiente para aprofundar seus conhecimentos. Além da pesquisa, deve-se praticar sem pressa e ter o acaso como parte do processo, pois poderá obter resultados que jamais haveria imaginado. A arte da cerâmica é, em grande medida, uma experiência direta e contínua de descobrimento de novas possibilidade plásticas. O ceramista tem que buscar, explorar, investigar, conhecer o processo, a história e os materiais que são próprios do seu meio. A busca dessa materialidade que descobrimos na cerâmica supõe esforço, dedicação e trabalho físico humano, a tarefa de fazer nascer e florescer as formas, como um processo de vivência. A cerâmica é a expressão de uma relação íntima com os materias e o processo. A primeira unidade, Evolução da cerâmica, apresenta um pequeno panorama de como o homem descobre a argila e como vai buscando possibilidades de transformá-la para melhor se adequar as suas necessidades. Dando continuidade ao estudo, optamos por dar um salto na história, focando a cerâmica contemporânea no século XX. Nesse enfoque, é possível observar que há duas tendências da cerâmica brasileira. A primeira é o fazer permeado por um olhar para as práticas culturais e a segunda é o fazer demarcado por uma centralização dos procedimentos técnicos-construtivos. A unidade dois trata das Matérias-primas, espaço e ferramentas, tendo como foco a argila, sua preparação e manipulação, pois é um material abundante que, em geral, adquire, quando umidecido com a água, maleabilidade, o que permite manusear e modelar a forma que se deseja. Deve-se lembrar que esse é um dos aspectos mais importantes na relação com esse material. Nessa mesma unidade, há uma reflexão sobre como o artista/professor pode estabelecer uma relação com diversos espaços de produção, pois a cerâmica demanda procedimentos, equipamentos, materiais e matérias-primas específicas. Além do espaço de produção, será apresentado também a importância dos utensílios e das ferramentas como extensão da mão.

6 Cerâmica


A terceira unidade, Técnicas de modelagem, aborda os quatro processos básicos de produção manual, considerados os mais importantes para que o aluno entre no mundo da cerâmica. Também traz uma introdução quanto ao uso do torno, apresentando-o passo a passo através de ilustrações que foram realizadas pelas ceramistas Tatiana Campagnaro e Terezinha Drago, do Tacto Atelier de Cerâmica. A quarta unidade trata do Processo de criação, em especial dos artistas brasileiros, com a discussão de como se dá o projeto poético da cerâmica enquanto linguagem e apresentando cinco atitudes da mente criadora ao longo do processo de elaboração e produção das obras, por meio de uma pesquisa feita tanto com os artistas ceramistas brasileiros quanto com alunos do Curso de Artes Visuais presencial da UFES. Na unidade cinco, Fornos e queimas, serão disponibilizados a evolução dos processos de cozimento, assim como a manipulação de alguns fornos, em especial, daqueles de construção alternativa, descritos pela ceramista Penha Schirmer através de suas experiências, tanto do seu próprio fazer como no olhar da construção de um outro ceramista. Para finalizar, a unidade seis trata do Relato de experiência: Construindo uma identidade na arte popular, um texto da experiência desenvolvida por mim em parceria com o Professor Júlio César da Silva (Júlio Tigre) na comunidade Jardim Carapina, tendo como referência a cerâmica indígena, focando o desenho como método para se pensar a cerâmica. Gostaria de agradecer aos artistas e ceramistas que contribuiram para a construção deste trabalho: Júlio Tigre, Penha Schirmer, Tatiana Campagnaro e Tereza Drago, pelos incansáveis encontros e discussões para melhor apresentar, neste livro, a cerâmica e suas possibilidades, e, em especial, à mestranda em Educação e Linguagem: Dianni Pereira de Oliveira, por disponibilizar seu artigo: A arte do fogo na sala de aula, material que estará presente no Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA). Maria Regina Rodrigues

Cerâmica

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8 Unidade 1


Não é propósito narrar nesta unidade toda a história da cerâmica, a nossa intenção é fazer uma breve exposição, de forma sucinta, de uma série de épocas e culturas que nos interessa, abarcando, de certo modo, uma grande parte da arte cerâmica. Podemos observar que, ao longo da história da cerâmica, vamos encontrar técnicas e estilos semelhantes em culturas distintas no espaço e no tempo. É difícil estabelecer o momento exato da descoberta da cerâmica. A relação do homem com o barro ou a argila deu-se, provavelmente, pelo contato direto: andou sobre ele deixando marcas de seus pés, as quais permaneceram na matéria após a sua secagem. A partir dessa

Fig. 1: Pintura rupestre. Caverna de Lascaux.

observação, ele utiliza suas mãos, deixando suas marcas nas paredes úmidas juntamente com pinturas feitas com terras coloridas, como podemos observar nas imagens encontradas na caverna de Lascaux, na França, com pinturas em todo o teto (Fig.1). Suas primeiras produções no barro são em formas de estatuetas, reproduzindo o corpo de mulher, depois passou a representar os animais e é nesse momento que reconhecemos nessa prática o que hoje chamamos de mito e arte. Podemos tomar como confirmação as palavras de Chiti (1986, p. 37): Observando la cueva, se ve que los ceramistas amontonaron primero bastante barro rojo sobre una roca. Luego modelaron los animales, a mano, cada uno de ellos de unos 60 cm de largo, en relieve muy destacado (alto relieve). Ciertos detalles, como las crines y los ojos, se modelaron con una esteca puntiaguda, de hueso o madera, lo cual revela la existencia de utensilios cerámicos, pueba de que ya existía una tradición artesanal con especialistas. La pareja se halla en posición que sugiere la cópula, de manera que las huellas de pies danzantes que se conservan hacen pensar en ritos orgiásticos que se celebrarían en razón de la magia de la fecundidad.

A explicação mais provável dessas marcas é dada pelo historiador Grombrich. Quando se reporta ao uso da arte entre os povos “primitivos”, ele afirma que esses povos permanecem no tempo, preservando seus antigos costumes e a maior parte da produção artística encontra-se vinculada ao poder das imagens. Grombrich (1989, p. 20) defende essa ideia: Pinturas e estátuas [...], são usadas para realizar trabalhos de magia [...]. É possível entender esses estranhos começos se não procuramos penetrar na mente dos povos primitivos e descobrir qual é o gênero de experiências que os fez pensar em imagens como algo poderoso para ser usado e não como algo bonito para contemplar.

Evolução da cerâmica

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Brancante (1981) considera que a maleabilidade, a ductibilidade e a plasticidade, características da argila, associadas ao seu fácil acesso na natureza, fizeram dela o principal veículo e intérprete dos impulsos e pensamentos do homem, levando-o a, facilmente, aprender a incorporar essa matéria nas suas práticas cotidianas. O homem foi, aos poucos, descobrindo outras funções para esse material, de acordo com suas Fig. 2a: Casa de pau a pique.

necessidades. Assim, o barro foi usado também para emplastos como remédios e para conservar alimentos, além do uso na construção das mais diversas formas. Nesse processo, a matéria foi sendo redescoberta para atender ao conforto e à proteção da espécie como até hoje continua sendo utilizada em tijolos, em taipa de pilão e em técnica de pau a pique e num sem-fim de usos do barro modelado (Figs. 2a e 2b). A palavra cerâmica vem do grego – “Keramiké” – derivada da “Keramikós” (vaso de argila), (PILEGGI, 1958, p. 3). Ao falar de cerâmica, estamos nos referindo tanto à modificação ocorrida na matéria

Fig. 2b: Casa em taipa de pilão.

– o barro – quanto a um processo contínuo de sua transformação pela própria natureza e pela ação do homem, num constante fazer, desde a busca do material, as misturas, manipulação e concretização das formas até a transmutação da matéria com o agente fogo, tudo isso num permanente ritual. Após a descoberta do fogo, o homem foi aperfeiçoando pouco a pouco as construções das peças. Chavarria dá seu depoimento: Esta cerâmica, cozida a temperaturas muito baixas, era porosa e muito frágil. Mas os antigos ceramistas encontrariam soluções para resolver estes problemas. Para tornar seus vasos impermeáveis, por exemplo, recorriam ao polimento, alisando e esfregando a superfície das peças com uma pedra lisa ou madeiras duras (2004, p. 9).

Apresentaremos aqui uma síntese da história da cerâmica utilizando como referência o livro A Cerâmica do ceramista Joaquim Chavarria (2004, p.8-25). Entre 4500 e 4000 a.C., na Mesopotâmia, já se produzia cerâmica mais evoluida, com a descoberta do forno e a introFig. 3: Os archeiros de Dario I. Cerca de 500 a.C. Relevo em ladrilhos vidrados.

dução de uma câmara onde as peças de argila se encontravam afastadas da ação direta do fogo. As formas tornaram-se mais complexas e a preparação de argila mais elaborada. Entre 4000 e 3500 a.C., a Suméria, mostrou ser um importante centro de produção cerâmica. Usavam-se tijolos nas construções de edifícios e cidades e, nessa época, surge a roda de oleiro. Outra descoberta importante foi o verniz ou vidrado, entre 2000 e 1000 a.C., sendo utilizado nos tijolos e, mais tarde, nas peças cerâmicas (Fig. 3).

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O Egito também teve sua evolução na cerâmica, desde 5000 a.C., com suas peças cerâmicas de paredes finas, decoradas e polidas. No Reino Antigo (2700-2100 a.C.), as massas tiveram uma preparação cuidadosa para o uso no torno, gerando peças simétricas. Nessa época, também criaram pastas que, quando cozidas no forno, apresentavam uma superfície brilhante, hoje chamadas de pasta egípcia (Fig. 4). Dentre inúmeros povos que trabalharam a cerâmica, podemos destacar os povos gregos, por apresentarem um grande desenvolvimento artístico. Os ceramistas tinham como preocupação a forma e a decoração. Por volta

Fig. 4: Hipopótamo. (2000-1900 a.C.) Pasta egípcia.

do primeiro milénio a.C., começam a utilizar o torno, produzindo peças com melhor acabamento. Cada peça possuía uma função determinada. Pode-se destacar aqui a ânfora, produzida para armazenar e conservar líquidos, por isso tinha uma boca de tamanho médio e duas asas. A decoração era feita inicialmente com desenhos circulares concêntricos utilizando engobes escuros, que alternavam com a cor natural da argila. Posteriormente, começaram a impor um estilo, no qual predominavam os motivos geométricos e as primeiras figurações humanas e animais, ainda estilizadas; por fim, as figuras negras, por volta de 700 a.C., quando receberam influências de culturas orientais, dando lugar aos motivos pintados a negro sobre a superfície vermelha da argila (Fig. 5). Os temas decorativos diversificaram-se, usando representação de figuras de animais, assim como de figuras mitológicas (CHAVARRIA, 2004, p.13). Por volta do século V a.C., surgiu os temas decorativos inspirados na vida domés-

Fig. 5: Ânfora. Séc. VII e pricípio do séc. VI a.C.

tica, ou temas vulgares, dionisíacos. As figuras são definidas de vermelho sobre o fundo negro, sendo os detalhes conseguidos através de linhas muito finas a negro (Fig. 6). A partir do século VII a.C., podemos destacar os Etruscos e os Romanos. A cerâmica dos povos etruscos apresenta um aspecto semelhante ao do metal, por ser muito polida e de coloração cinzenta ou negra-cinzenta, mais tarde sofrerão influência da cerâmica grega, passando a copiar os motivos decorativos (Fig. 7); enquanto os romanos, eram povos que sabiam preparar as massas de excelente qua-

Fig. 6: Kylix. Séc. V e IV a.C.

lidade e conheciam a técnica dos moldes, produzindo grande quantidade de peças com decoração e relevo. O torno foi também outro procedimento muito utilizado para a produção do uso doméstico (CHAVARRIA, 2004, p. 15). No Oriente, devemos destacar a China, a Coreia e o Japão, pelas sofisticadas técnicas de construção dos fornos, de forma gradual, até alcançar temperaturas de 1300º C, possibilitando a queima da pasta e do verniz das porcelanas, o que culminou na descoberta e no aperfeiçoamento dos esmaltes. Destaca-se também a cerâmica chinesa, que teve origem a cerca de 3500 anos

Fig. 7: Lekanis. Séc. V a.C. Cerâmica de estilo grego da penísula Itálica.

a.C., porque além dos usos doméstico e decorativo, também foi utilizada nos ritos Evolução da cerâmica

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funerários. Durante a Dinastia Chang Yi (1523-1028 a.C.), o torno já era conhecido e se usavam dois tipos de pastas, uma vermelha e outra branca. Mais tarde, na Dinastia Chu (1027-256 a.C.), surgem os vidrados de dois tipos: os que contêm chumbo e sódio, que se fundem entre 800 e os 900ºC, e os constituídos por feldspatos e cinza de madeira, fundidos entre 1200 e os 1300ºC. Na dinastia Tang (618906), os vasos apresentavam um corpo redondo que contrasta com a ligeireza do pescoço e decorados com pinturas. Podemos considerar que, ao longo do tempo, a China atingiu um elevado grau de perfeição e simplicidade técnica, com descobertas de vidrados como o azul, o verde e até o vermelho, nesse caso obtido com óxido de cobre com queimas de atmosfera redutora (CHAVARRIA, 2004, 24) (Fig. 8). O encontro das primeiras cerâmicas no Japão deu-se por volta de 2000-900 a.C. Mas pode-se dizer que a influência chinesa foi significativa durante o período Heian (794-898). É importante destacar aqui a importância do budismo zen e o seu culto, pois tiveram forte influência sobre a cerâmica com a cerimônia do chá, tornando-se um verdadeiro ritual, que teve sua origem no período Muromachi (1392-1573) (Fig. 9). Outra cultura que deve ser destacada por suas impressionantes produções de cerâmica são as cerâmicas encontradas nas Américas, desenvolvida pelos povos Mochicas. Uma cultura pré-incaica surgida ao norte do Peru 1000 a.C. Os Mochicas produziram toda sua cerâmica dividida em duas práticas bastante evidentes: a pintura e a escultura, nas quais se destacam por seu realismo e por sua habilidade no desenho.

Fig. 8: Jarrão Globular Tang.

O ceramista Mochica tinha um amplo conhecimento e domínio do uso de pasta fina, assim como o controle de oxidação no processo da queima. Modelava as paredes de suas vasilhas cerimoniais fazendo com que fossem finas, modelando formas esculturais diversas: animais, seres mitológicos e cenas da vida cotidiana. Empregava duas cores, pintando figuras de cor parda avermelhada com um pincel muito fino sobre uma capa de cor marfim.1

Nenhuma outra civilização deixou uma representação tão realista de si mesma e de tudo que a rodeava. Nela, encontramos detalhes de sua vida, fauna e flora, cultivadas nos desertos do Peru, dos quais se mostravam grandes conhecedores. É possível identificar espécies marinhos e terrestres, tamanha a maestria na sua representação. Quase todas as culturas primitivas mantiveram uma relação totêmica (tout) diante dos animais, muito poucas deixaram retratos tão naturalistas e emocionados. A atitude Moche diante dos animais é muito parecida com a dos egípcios, para os quais os animais desempenhavam para além de um papel místico, uma repreFig. 9: Garrafa de saqué. Japão, 1820.

sentação também artística. 1. http://acessa.me/ceramica

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Sem desenvolver a escrita, os mochicas ilustravam brilhantemente seus hábitos e costumes culturais, pintando suas cerâmicas com imagens surpreendentemente realistas. Segundo o arqueólogo americano Christopher Donnan, suas cerâmicas estão entre as mais espetaculares da America pré-hispanica. Eles alcançaram um grau de realismo nas peças que supera de longe os maias, a mais desenvolvida civilização americana (Fig. 10a). Possuíam um estado centralizado e tão poderoso que

Fig. 10a: Cerâmica Mochica.

Fig. 10b: Cerâmica Mochica.

podiam sustentar uma classe de artesãos. O huaco-retrato é o nome do estilo mochica clássico que surgiu no século V na cidade que estava aos pés da Huaca de La Luna. Esse estilo, em sua maioria, sobressaia em vasos, que possuem um gargalo em forma de anel com figuras que mostram imponentes personagens políticos, o cotidiano da população e cenas de sexo tão explicitas que até hoje ruborizam os visitantes mais pudicos dos museus no Peru (Fig. 10b). Foram os primeiros artesãos a empregar moldes na América do Sul, para produzir objetos em grande quantidade. Assim, historicamente, a cerâmica situa-se entre as primeiras práticas humanas; práticas estas, independente da função do objeto, marcadas pela manualidade, até que no século XIX, na Europa Ocidental, o trabalho do artesão foi substituído pela produção industrial. A modernidade fez com que os objetos de uso cotidiano fossem incluídos numa escala industrial de produção, pois, se feitos um a um, tornavam-se inviáveis economicamente. Dessa forma, os objetos passaram a ser simples, fortes, limpos e iguais. A cerâmica está na história do homem, cumprindo duas funções fundamentais: de um lado, como facilitadora de práticas cotidianas; de outro, relacionada

Fig. 11: Cerâmica da Ilha de Marajó. Urna funenária.

com os desdobramentos da magia original (FISCHER, 1983). No primeiro sentido, como prática cotidiana, ela tem mais de uma aplicação que varia em cada local e em cada momento histórico. É através da cerâmica que as culturas foram divulgadas e que os povos se influenciaram mutuamente. Como prática cultural, seus usos se evidenciam ora no cotidiano doméstico, no armazenamento de alimentos, ora como tijolos na arquitetura, definindo usos predominantemente funcionais. Nesse segundo sentido, a dimensão cognitiva desses usos ultrapassa o caráter de utensílio, estando evidenciado o seu caráter mágico – religioso e o estético. Temos, como exemplo, as diferentes manifestações culturais no Brasil, como as urnas funerárias, representadas pela cerâmica na Ilha de Marajó (Fig.11) e os potes em forma de figuras femininas do Vale do Jequitinhonha (Fig. 12).

Fig. 12: Cerâmica do Vale do Jequitinhonha. Potes de Isabel Mendes M. da Cunha, Aracuaí, 1997.

Evolução da cerâmica

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No texto: A origem da arte, Fischer (1983, p. 21) reflete sobre o modo como o homem se apropria da natureza. O homem também sonha com o trabalho mágico que transforma a natureza, sonha com a capacidade de mudar e dar-lhe nova forma por meios mágicos. Trata-se de um equivalente na imaginação, aquilo que o trabalho significa na realidade. O homem é, por princípio, um mágico.

Assim configurada, a cerâmica está sujeita a padrões estéticos transformados pela realidade sociocultural; podemos verificar todo um conjunto de saberes e fazeres que estabelecem um campo de produção da cerâmica como linguagem das artes; esse profuso campo encontra suas bases nos rumores da magia original (FISCHER, 1993), mas não mais cumpre um papel mágico-religioso. Queremos esclarecer que aqui não iremos tratar da evolução da cerâmica ao longo dos séculos, pois seria muito extenso. Aqui, só se pretende oferecer um percurso no desdobramento da cerâmica a partir do século XIX, para posicionar o leitor no rico panorama da cerâmica artística atual, em especial no Brasil.

Cerâmica nas artes visuais Como já dissemos, depois da Revolução Industruial, a cerâmica passa a ser reproduzida em série, perdendo seu valor artístico, até que em 1888 aparece em Londres o movimento Arts&Crafts, com W. Morris e J. Ruskin, tendo como proposta o repensar as artes em favor da peça artesanal, retomando os objetos de uso e deixando de lado a tecnologia e os novos materiais. Com isso, se cultivou o gosto pelo “feito a mão” e a revalorização das artes aplicadas. Nesse mesmo período, as Exposições Universais do final do Século XIX, na Europa, apresentam ao mundo ocidental a cerâmica da China e do Japão, passando a ser a referência mais importantes para a fabricação de cerâmica, tanto pela qualidade estética quanto técnica, expondo o seu valor artístico (FRIGOLA, 2008, p. 10). O ceramista Bernard Leach aventurou-se na investigação de formas novas para expressar uma linguagem mais pessoal, criando a cerâmica de estúdio na Inglaterra. Após viver no Japão, com o objetivo de conhecer os procedimentos cerâmicos, retornou para St. Ives, na Cornualha, nos anos 20, com o objetivo de produzir um utilitário de mesa que mantivesse um alto padrão de forma, esmalte e decoração. Leach vivenciou esta atividade, e sucessivas gerações o seguiram, formando Fig. 13: Bernard Leach. Jarro de grés. Grande. 1946.

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grupos que se fixaram na área rural, para utilização de matérias-primas locais e construção de seus próprios fornos (Fig. 13).


No catálogo Firing Imagination: Cerâmica Britânica, a curadora Janice Tchalenko, destaca a importância de Leach na cerâmica de ateliê. O início do século XX foi marcado pelo crescimento da cerâmica de ateliê, tal como exemplificada pelos trabalhos de Bernard Leach, que unia as filosofias oriental e ocidental e proclamava um “modo de vida” no qual a mente, o coração e as mãos coexistiam em equilíbrio e harmonia. Leach estudou cerâmica no Japão e, seu retorno à Inglaterra, nos anos 20, fundou uma oficina cerâmica em St. Ives, com o objetivo de fabricar peças utilitárias de alta temperatura (2000, p. 7).

Com o século XX, chega também a Art Nouveau, movimento artístico que se estende por toda Europa, adaptando a filosofia das Arts & Grafts, que é a realidade do momento, unindo a industria com a arte para obter um produto útil e belo, assentados nos fundamentos do desenho, permitindo que arte e o ofício ganhem terreno, e o objeto de uso se converta em um produto de luxo, com o objetivo de conceber a cerâmica como arte (FRIGOLA, 2008, p. 10). Com a consolidação da industrialização na França, houve a ampliação dos recursos técnicos, facilitando o acesso aos materiais cerâmicos. Com isso, muitos artistas se aventuraram na cerâmica e na faiança, atraídos pelo uso pictórico dos esmaltes e fascinados pela surpresa da transformação das cores. Mas, no decorrer do processo, a cerâmica foi apresentando dificuldades técnicas e os conhecimentos estéticos não se resolviam por si só, no processo de criação. O problema para os artistas não foi trocar as tintas a óleos pelos óxidos, mas saber como manipular os materiais e realizar os passos necessários para a produção: a preparação do corpo, a pasta cerâmica, a técnica de modelagem, as diferenças de cores e sua preparação e o posterior cozimento do objeto. Nesse caso, muitos artistas que se aventuraram no domínio da cerâmica tiveram que contar com os conselhos e ajuda de ceramistas já conhecidos, como mestres do trabalho com a argila e a faiança. Podemos citar André Mentthey (1871-1929), que já era famoso por uma série de exposições de cerâmica e contribuiu dando suporte ao processo de fabricação e colorações para pintores como Renoir, Odilon Redon, Bonnard, Derain, Denis, Maillol, Matisse, Ronault e tantos outros que participaram da exposição de 1907, na qual Metthey mostrou uma centena de cerâmicas, feitas por seus amigos (DOSCHKA, 1992). O obstáculo que aparentemente existia entre os ceramistas e os artistas foi eliminado, e a prova é que o artista era capaz de dar uma nova vida aos processos artesanais, sem perder o objetivo de fazer uma obra de alta qualidade e passando por um processo criativo. Para muitos, essa integração trouxe grandes benefícios, solucionando as questões técnicas, enquanto, para outros, essa integração ultrapassou os limites técnicos. Evolução da cerâmica

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Os artistas geralmente impunham suas formas aos torneiros e, antes de decorar, eles modificavam totalmente suas peças (FOREST, 1995). Havia também artistas que faziam primeiramente os estudos preliminares para depois trabalhar com a argila, Picasso é um bom exemplo. Após visitar vários ateliês em Vallarius, em 1946, e fazer alguns experimentos na argila, Picasso viu a possibilidade de trabalhar com esse material. Em 1948, o artista instalou-se definitivamente em Vallarius, trazendo inúmeros desenhos. Mas ele não poderia fazê-lo sem a ajuda de George e Suzanne Ramié, do Ateliê Madoura. O artista iniciou suas obras com a colaboração dos ceramistas, mostrando, discutindo, questionando, para, em seguida, trabalhar compulsivamente, integrado com os mestres da cerâmica (Figs. 14a, 14b e 14c). Quando Picasso se volta para a cerâmica, procura uma manipulação consciente das características próprias da matéria. As noções adquiridas pelo uso ou pela tradição podiam servir de base à sua construção estética e às suas reflexões críticas. À medida que se familiarizava com o novo material, aumentava a sua vontade de experimentar novas técnicas, pois o artista tinha facilidade de adaptação aos materiais, o que o levou a entregar-se com vigor ao trabalho, permitindo-lhe ter uma postura de artesão que trabalha com os dedos, sentindo um grande respeito pelas mãos, sempre aptas a traduzir ao mesmo tempo o seu pensamento (Fig. 14d). Uma cooperação semelhante ocorreu entre George e Suzanne Ramié com o trabalho de Chagall. Durante 15 anos, de 1950 em diante, Chagall foi ativo nesse domínio. O artista inicialmente ficou interessado em entender sua palheta de cores e o especial efeito da argila (Fig. 15). O que ele fez na pintura foi igualmente presente nos seus trabalhos cerâmicos. Mas Chagall não estava satisfeito apenas pintando a argila, ele passou, então, a modelar e a trabalhar em sua superfície (Fig. 15b). A experiência que Chagall teve não era apenas na dimensão espacial da arte, mas a sensação primitiva do ato criador elementar.

Fig. 14a: Pablo Picasso. Olla (friso de mujeres), 1950.

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Fig. 14b: Pablo Picasso. Vaso Femme, s/d.

Fig. 14c: Pablo Picasso. Échassier, 1947/48.

Fig. 14d: Pablo Picasso. Hombre sentado, 1952.


Fig. 15: Marc Chagall. Vase La Vision, 1962.

Fig. 16: Raoul Dufy. Vase aux Baigneuses sur Fond Jaune, 1926.

Fig. 17: George Braque. Assiette à La Mandoline, 1945.

Bachelard, no livro “O direito de sonhar”, fala da relação de Chagall com essa matéria: “Marc Chagall rapidamente se torna um mestre dessa pintura satânica que ultrapassa a superfície e se inscreve numa química da profundeza. E sabe conservar vivo na pedra, na terra, na massa, seu vigoroso animalismo” (1986, p. 25). É conveniente mencionar o catalão Llorens Artigas. Após a Primeira Guerra Mundial, esse ceramista mudou-se para Paris, onde trabalhou com Dufy, Miró e Braque (Figs. 16, 17 e 18a). O ceramista Artigas foi um caso singular na cerâmica, pelo fato de participar ativamente no Modernismo e no intercâmbio com os artistas na produção da cerâmica. Essa experiência ampliou-se após trabalhar com Miró, a partir de 1942. O artista buscou parceria com o ceramista, com o propósito de adquirir o domínio de todas as etapas da produção cerâmica, o que resultou, no final da década de 50, em um total de 300 peças. Junto com Artigas, Miró descobriu a magia primitiva do fogo (Figs. 18b e 18c). A cooperação entre o pintor e o artesão foi fantástica: eles ajudavam, auxiliavam e confortavam um ao outro. O diálogo entre Miró e Artigas cresceu intensamente, em especial na grande variedade de trabalhos que eles faziam para espaços públicos, como os grandes murais, em especial o da UNESCO (1958) e o do Aeroporto de Barcelona (1970) (Fig.18d), entre outros.

Fig.18a: Joan Miró. Vase, 1941.

Fig. 18b: Joan Miró. Grober Wasserkrug, 1962.

Fig. 18c: Joan Miró (frente e verso). Frau, 1962.

Evolução da cerâmica

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Fig. 18d: Joan Miró. Painel do aeroporto de Barcelona, 1970.

Quando se refere às experiências realizadas em conjunto com o ceramista, Miró revela sua paixão pela cerâmica e destacava que Artigas desempenhou relevante importância em sua vida, porque lhe possibilitou, por meio do contato com a cerâmica, conhecer e trabalhar outra linguagem, o que, segundo o próprio, lhe propiciou descobrir novos horizontes e, assim, enriquecer sua produção plástica. A Segunda Guerra Mundial obrigou muitos cera-

Fig.19a: Antony Gormley. Field, Instalação, 1991.

mistas europeus a migrarem para o Estados Unidos, favorecendo a influência entre culturas. O vínculo estabelecido entre os Estados Unidos e a Europa permitiu que a cerâmica do século XX tivesse uma mudança, ganhando identidade com liberdade, características da arte contemporânea. Na segunda metade do século XX, se amplia o conceito da escultura, expandindo o campo de atuação, desviando a direção da arte para abrir novos caminhos,

Fig. 19b: Antony Gormley Field, Detalhe da Instalação, 1991.

assim como o campo da instalação. Nesse caso, citaremos o artista Antony Gormley (Figs.19a e 19b), responsável por grandes montagens com elementos cerâmicos, podemos apresentar uma de suas obras intitulada Field, de 1991, uma instalação de terracota. Atualmente, a cerâmica artística expande-se, sendo mais um dos materiais utilizados nas artes plásticas como linguagem, abrindo numerosas rupturas para as várias gerações de artistas e ceramistas continuarem seus experimentos. A argentina Vilma Villaverde é um bom exemplo. A artista realiza peças cerâmicas montadas nos elementos sanitários. Podemos dizer que a artista coloca na galeria um material que, em geral, é usado pelas pessoas num espaço privado (objeto sanitário), criando diferen-

Fig. 20: Vilma Villaverde. Inocencia, 2008. 18 Unidade 1

tes esculturas, na maioria, femininas (Fig. 20).


A cerâmica nas artes plásticas no Brasil Podemos dizer que no Brasil o percurso da cerâmica, como experiência artística, surge de forma extremamente lenta, mantendo-se distante das outras linguagens das artes visuais. Vários foram os artistas brasileiros que trabalharam a cerâmica como suporte para a pintura. Dentre esses, podemos citar: Portinari, Volpi, Djanira, Paulo Rossi, Roberto Burle Marx, Athos Bulcão, Poty. No início, o azulejo passou a ser o material mais empregado, fruto da influência portuguesa, mais precisamente a faiança de revestimento, um material que, aos poucos, foi se revelando como manifestação liberta de valores tradicionais, oriundos da Europa. Alguns artistas transportavam os desenhos para os azulejos como se ele fosse uma tela branca, ignorando seus limites individuais. Aos poucos, o processo foi sendo modificado, levando-se em conta o tamanho e o formato do azulejo. Portinari foi o grande responsável por essa mudança, no início dos anos 40. Nessa época, o artista começa a usar figuras avulsas para criar o fundo da composição, sempre com motivos marinhos, mantendo os tons azuis sobre azulejos brancos, uma tradição portuguesa (Fig. 21). A partir daí, outros artistas passaram a usar o azulejo como módulo, traba-

Fig. 22: Athos Bulcão. Painel de cerâmica, 1998.

lhando-o individualmente, formando composições com figuras avulsas, ampliando a palheta de cores. Esse processo pode ser observado no trabalho de Athos Bulcão, que muito contribuiu para a integração da cerâmica na arquitetura, trabalhando com vários arquitetos, em especial Oscar Niemayer (Fig. 22). Por ser um meio cujo desenvolvimento está intimamente ligado ao domínio do conhecimento técnico, muitos estudiosos passaram a tratar a cerâmica como um procedimento artístico predominantemente técnico, sem uma reflexão sobre a cria-

Fig. 21: Cândido Portinari. Painel de cerâmica, s/d. Igreja de São Francisco, Belo Horizonte.

ção inerente às linguagens das artes. Mas, ao assumir a ideia de que uma obra cerâmica estaria para além da função prática, o ceramista passa a entender que seu trabalho pode concentrar-se na dimensão plástica. Como consequência disso, os excessos de decorativismos dão lugar a uma maior preocupação com o volume, a forma e sua representação aeroespacial. Para alguns artistas ceramistas, portanto, o importante passa a ser não a técnica como fim em si mesma, mas a possibilidade de se obter o objeto a partir da manipulação da matéria, o barro, que, com a contribuição do agente fogo, sofre a transmutação e passa a ser cerâmica. Evolução da cerâmica

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No final da década de 80, galerias e museus começaram a abrir espaço para expor obras artísticas, apresentando a cerâmica como um dos meios de expressão plástica. Podemos citar: Galeria São Paulo, Toki Arte, MAM, Paulo Figueiredo, Mônica Figueira, situadas em São Paulo; Galeria Trindade no Rio de Janeiro; as Salas Corpo e Palácio das Artes, em Belo Horizonte. Ganha-se espaços também na mídia, nas revistas especializadas em arte: Galeria e Guia das Artes. Também nesse período são editados livros específicos dessa linguagem, entre eles, Artistas da cerâmica brasileira, publicado pela Volkswagem do Brasil S.A., em 1985 – fazendo um panorama da arte cerâmica no Brasil desde a cerâmica indígena, passando pelo popular até a cerâmica contemporânea; e Cerâmica Arte da Terra, publicado em 1987 – catálogo dos artistas ceramistas contemporâneos brasileiros e textos sobre cerâmica. Essas reportagens em revistas, e mesmo os livros, possibilitaram a visibilidade da cerâmica, bem como se constituíram como um meio de socialização do processo de criação dos artistas ceramistas. Entretanto, não se concretizaram como iniciativas que, de fato, promovessem uma aproximação com os mecanismos que envolviam a construção da obra; pois, em sua maioria, limitaram-se ao trabalho finalizado ou, em alguns casos, à supervalorização do mito da terra em transformação.

Cerâmica contemporânea brasileira De modo geral, parece-nos ser possível dizer que os trabalhos dos ceramistas brasileiros convergem para duas tendências: fazer permeado por um olhar para as práticas culturais; fazer centrado nos procedimentos técnico-construtivos. O Brasil, sendo uma confluência de culturas, internacionalizou a nova cerâmica com os imigrantes e com a volta de ceramistas brasileiros que estudaram e estagiaram no exterior. Podemos compreender que as diversidades de linguagens que a arte cerâmica apresenta estão em parte ligadas às diferenças culturais, e isso se dá pelos inúmeros surtos colonizadores ou migratórios assimilados pelos brasileiros. No entanto, o nosso fazer cerâmico dialoga para além dessa interface predominantemente cultural, centrando-se, ainda, no aprimoramento e desenvolvimento de experiências de cunho mais técnico-construtivo, ou seja, ligado a uma poética de materiais e procedimentos. O fazer permeado por um olhar para as práticas culturais

Um exemplo centrado nessa tendência é a cerâmica ligada aos conceitos japoneses, principalmente aqueles que têm sua origem no extremo Oriente. Trata-se de uma arte milenar que chegou ao Brasil no início do século XX, com os primeiros imigrantes agricultores, concentrando-se aos redores de São Paulo. É o caso de Shoko 20 Unidade 1


Suzuki, uma ceramista que mantém a tradição desde a construção das peças até a queima no forno a lenha. Aqui, o ceramista tem um alto grau de conhecimento técnico a partir de efeitos práticos no campo da própria matéria, porém, mesmo esse requinte técnico não nos parece estar centrado em inovações e descobertas, mas na consolidação e aprimoramentos estabelecidos na tradição cultural. No catálogo de apresentação da exposição da artista, no Museu da Casa Brasileira, Klintowitz (2003), comenta: “O trabalho de Shoko Suzuki é uma discussão sobre a perfeição da forma, os limites da técnica e o alcance possível da arte como elemento construído da integração e do saber”. Além de Suzuki (Fig. 23), há outros ceramistas seguidores dos mesmos parâmetros, trabalhando de forma mais aberta, como Akinori Nakatani, Katsuko Nakano, Kimi Nii. Já Megumi Yuasa (Fig. 24) trabalha com a matéria de forma mais liberta

Fig. 24: Megumi Yuasa. Escultura cerâmica.

e exploratória, buscando outros materiais para compor suas esculturas cerâmicas, como o ferro, a pedra, os vegetais, etc., aproximando-se da interface que define a segunda tendência aqui apontada. Nas raízes africanas, seguindo o mesmo processo do manuseio do barro, podemos citar Miguel dos Santos, que também transita pelo universo popular do Nordeste, principalmente com as mutações das histórias em cordel. O artista vive em João Pessoa, região cheia de lendas populares, para onde confluem culturas africanas, indígenas e a memória colonial. Ele trabalha com grandes silhuetas que, na grande maioria, sugerem figuras humanas, com expressão facial bem marcada e um corpo que permite muitas ambiguidades. Nessa mesma cerâmica, pode-se observar que, dependendo da angulação, podem-se obter diferentes leituras, ora um homem, ora um animal, ora uma figura majestosa. Trabalha com a pintura e a cerâmica, criando um diálogo permanente entre essas duas linguagens (Fig. 25).

Fig. 25: Miguel dos Santos. Escultura em cerâmica. 1985.

Fig.23: Shoko Suzuki. Cerâmica, 1998.

Evolução da cerâmica

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Ainda dentro dessa categoria, temos ceramistas de influência portuguesa como Antônio Poteiro. O artista iniciou seu trabalho como construtor de potes e aos poucos foi modificando seu percurso, saindo do objeto funcional para esculturas de grandes sofisticação plástica. Pintor primitivo, conserva essas características na obra em cerâmica, construindo figuras místicas do imaginário popular. Suas monumentais esculturas em terracota possuem vários níveis recobertos por figuras em torno de uma estrutura circular, um mundo representado pelo artista com variantes: homens e animais muitas vezes recolhidos na rua, na Bíblia e até mesmo em seus sonhos (Fig. 26). Nessa lista da primeira tendência, podemos incluir Celeida Tostes (Fig. 27). Em suas obras, a argila ganhou uma aparência grosseira, como se tivesse acabado de ser feita. Esse foi o modo que encontrou para apresentar a matéria amorfa em seu Fig. 26: Antônio Poteiro. Criador supremo.

trabalho, provocando um confronto entre visão, tato e o próprio raciocínio. O fazer centrado nos procedimentos técnico-construtivos

Nessa tendência, podemos citar: Lygia Reinach, Norma Grinberg, Célia Cimbalista, Mariana Canepa, Mary Di Iorio, dentre outros. Para esses artistas, a forma, o volume e a organização aeroespacial são de grande importância. Dentre esses artistas citados, podemos apontar Lygia Reinach, que tem como Fig. 27: Celeida Tostes, Vênus.

preocupação o desenvolvimento de obras para ocupar grandes espaços, ora definitivos, ora temporários. A obra Figuras é um índice dessa relação da artista com o espaço da obra. Trata-se de uma instalação com 80 grandes esculturas de barro quei-

Fig. 28a (abaixo): Lygia Reinach. XXI Bienal Internacional de São Paulo, 1991.

mado. Essa obra foi primeiramente apresentada na XXI Bienal de São Paulo, em 1991

Fig. 28b (à direita): Lygia Reinach. Instalação na Estação Ana Rosa.

teve-se a ideia proposta no painel alocado na própria estação, no qual é revelado

22 Unidade 1

(Fig. 28a) e, logo em seguida, foi doada pela artista para ser integrada ao acervo do metrô, instalada no jardim suspenso do primeiro subsolo da estação Ana Rosa. Manque “[...] a artista devolve para dentro da terra o barro por ela trabalhado” (Fig. 28b).


Na verdade, as esculturas representam o universo do homem no espaço do metrô, o homem que vive dentro do seu tempo, um ritmo imposto pelo meio tal como a música [...]. Dentro desta ótica, podemos relacionar cada escultura a uma figura que conserva seu tempo, e simultaneamente, convive dentro de um outro tempo; o da multidão (RODRIGUES,1998, p. 192).

Podemos destacar Norma Grinberg como um outro índice da tendência do fazer centrado nos procedimentos técnico-construtivos. Desde a década de 70, ela vem trabalhando as formas e os volumes, tendo como princípio a modulação, individual ou coletiva da peça. Das múltiplas peças, surgiram várias composições espaciais estruturadas na vertical (Fig. 29a). Dando continuidade aos seus experimentos, as peças foram sofrendo interferências e ganhando novos elementos, como na

Fig. 29a: Norma Grinberg. Estrutura Vertical Móvel.

instalação Humanóides (Fig. 29b) em que, ao longo do trabalho, a artista foi percebendo a necessidade de incorporar elementos arquitetônicos, volumes com dimensões maiores. Suas pesquisas vão além dos volumes, partindo da decomposições das formas, para obter várias outras que se articulam entre si, gerando novas obras. Dessa instalação, surgiram outros projetos, como Arcos, chegando a construir uma grande peça para o jardim da ECA/USP, resultado da Tese de Doutorado da artista (1999). Mary Di Iorio, diferentemente de Grinberg, desde a década de 80, mantém a mesma forma casular. Sua preocupação passou a ser a organização das peças no espaço, procurando trabalhar com peças em grandes dimensões, além de pesquisar

Fig. 29b: Norma Grinberg. Humanóides.

materiais para integrar-se à cerâmica, como ferro, cabo de aço e cimento. Mas sua pesquisa não se limita a grandes áreas abertas, Di Iorio utiliza como desafio a ocupação das galerias com peças de pequeno porte, desde o uso do piso, ou mesmo de caixas de madeira, como delimitação de um espaço dentro de outro: como um baú que guarda algo precioso (Fig. 30).

Fig. 30: Mary Di Iorio. Instalação, 1991.

Evolução da cerâmica

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Continuaremos, então, a discussão sobre essa tendência centrada nos procedimentos técnico-construtivos, pois vale ainda salientar que alguns artistas, como Francisco Brennand, transitam entre essas duas categorias, embora sejam mais evidentes, na sua obra, traços do seu diálogo com a cultura do Nordeste brasileiro, porém, o seu processo de criação destina-se a um espaço equivalente aos procedimentos técnico-construtivos (Fig. 31). Após visitar a produção de cerâmica de Picasso, na Maison de la Pensée Françoise, bem como de Juan Miró, na Galeria Maeght, em Paris, o artista visualizou o enorme potencial artístico da argila, matéria que, até então, ele considerava ligada a uma mera habilidade artesanal. Sob esse impacto, Brennand, originariamente pintor, começou gradualmente a deslocar sua produção para o uso da argila, dos óxidos e do fogo. Em Recife, a partir de 1971, o artista começa a revitalizar um grande espaço, uma antiga fábrica de cerâmica de seu pai, reconstruindo o local, criando uma Oficina-Museu, e, aos poucos, vai povoando-o com templos e enormes criaturas-escultóricas de peles vítreas, algumas colocadas sobre altas colunas, outras nos jardins ou em espelho d’água. Essas duas tendências da cerâmica brasileira nos possibilitam uma outra aproximação investigativa dessa linguagem plástica, vista sob o prisma do processo de criação do artista, apresentado na unidade quatro.

24 Unidade 1


Fig. 31: Francisco Brennand. Jardim de esculturas, s/d.

Evolução da cerâmica

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26 Unidade 2


Durante toda a história, em todas as civilizações, o homem se rendeu aos fascínios de tomar uma porção da argila em suas mãos e moldá-la. Desde os povos primitivos até os mais famosos escultores utilizaram o barro para modelar, a partir de suas necessidades e seus desejos. O barro bruto é um material natural, terroso, de granulação fina, aparentemente inflexível e uniforme. No que consiste essa matéria-prima? O barro possui uma história, uma dignidade de que talvez nenhum outro material possa se vangloriar. É fruto de uma ação milenar da natureza e resulta da decomposição de rochas e da quebra de pedras que se dissolveram na água e novamente se cristalizam em partículas. O solo tem um período de vida de milhões de anos. A nossa vida média é de 70 ou 80 anos. Não podemos perceber o que está acontecendo com o solo, pela mesma razão pela qual não poderíamos ouvir a melodia de um disco tocado à velocidade de uma rotação por séculos. E o solo, por seu lado, nem sequer percebe a nossa existência, pois nós vivemos apenas por um breve instante de sua vida. Para ele, não passamos de clarões na escuridão (FONTES, L.E.F.; FONTES, M.P.F., 1982, p.1).

Por existir uma grande quantidade diferente de rochas, podemos concluir, então, que existem infinitos tipos de terra por toda a superfície da crosta terrestre, que, em contato com a água, formarão diferentes tipos de barro. O solo umidecido pelas águas da chuva vira barro, ou lama, dependendo da quantidade de água. Então, barro seria terra mais água. Cada barro tem uma composição mineral diferente, apresentando, assim, características diferentes. Em geral, as pessoas usam o termo barro sem diferenciá-lo de argila, mas barro é qualquer terra misturada com água, enquanto a argila possui a capacidade de ser modelável, em maior ou menor grau. Tomado pelo homem no seu instante de vida, o barro se torna matéria da produção de instrumentos, mas, para isso, deve-se tornar argila, e argila nada mais é que um barro com minúsculas partículas, que o tornam maleável. A argila é um material abundante e, em geral, adquire, quando umedecida com água, certa plasticidade ou maleabilidade, permitindo tomar as formas que se queira dar. As argilas podem ser encontradas na natureza a céu aberto, em barrancos, na beira de rios ou em camadas subterrâneas. A argila que se mantém no local de origem de sua rocha mãe é chamada de argila primária, geralmente são puras, possuem os grãos grossos e são pouco plásticas. Já as argilas que se deslocaram para longe da rocha mãe, são chamadas de secundárias, possuem grãos mais finos, moídos pela ação das águas que separou os grãos mais grossos que se depositam no Matéria-prima

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solo ficando para trás. Nessa movimentação, diferentes minerais se agrupam, formando infinitas combinações que vão determinar as características de cada argila. A propriedade mais importante da argila é a plasticidade, ou seja, a capacidade de ser modelada sob a ação de uma força e de se manter com a forma que lhe foi dada. A maior ou menor plasticidade de uma argila depende da sua composição, do tamanho e formato de seus grãos, das impurezas e da quantidade de material orgânico existente. O tamanho e formato dos grãos (que são microscópicos 0,002mm de diâmetro), vão definir a capacidade de absorção de água ao redor de cada grão e a tração entre eles. A água funciona como um lubrificante que permite a movimentação entre os grãos, quanto mais regular for o grão mais uniforme é a distribuição da água ao seu redor e maior a facilidade de movimentação das partículas. Na linguagem popular, costuma-se usar as expressões barro gordo para designar argilas mais plásticas e barro magro para aquelas que contêm pouca plasticidade. Quanto mais plástica é uma argila, mais água absorverá, aumentando, assim, de volume. Ao secar, a água evapora, as partículas se aproximam, fazendo com que a peça diminua de tamanho. Assim, a plasticidade é proporcional ao encolhimento da massa, quanto mais plástica, mais encolhe. As peças, depois de secas à temperatura ambiente, perdem a água física, mas ainda conservam certo grau de umidade, o qual é chamado de água química, que só irá evaporar mediante aquecimento a uma temperatura de 100ºC. Assim, a argila continua encolhendo durante todo o processo de aquecimento que a transformará em cerâmica. Aprofundaremos esse assunto na unidade fornos e queimas. Podemos dizer que a argila está constantemente trocando água com o meio onde se encontra. Se colocarmos água em uma argila seca ela absorverá a água e aumentará de tamanho, se a deixarmos ao ar livre ela perderá a água e encolherá novamente. Entender esse processo é fundamental para a ação seguinte, a modelagem. A composição química dos minerais que fazem parte da argila e as matérias orgânicas determinarão a coloração das argilas in natura, podendo variar nas tonalidades brancos, amarelos, vermelhos, marrons, roxos, cinzas e preto. Mas a coloração de uma argila crua não determina sua cor após a queima, que será definida pelos os óxidos minerais (ox. ferro, ox. cromo, ox. cobre, ox. manganês...) presentes na composição da massa que irão sofrer reações químicas, mediante o calor, variando de tonalidade de acordo com a temperatura alcançada. Dessa forma, uma argila preta ao ser queimada pode resultar numa cerâmica branca e uma marrom pode se transformar em uma peça alaranjada (Fig. 32). É muito importante para o ceramista saber como preparar uma argila para modelar ou sua própria massa, mesmo que depois ele faça opção por adquiri-las prontas para modelar. 28 Unidade 2


Fig. 32: testes de retração e coloração da argila.

Como preparar e testar uma argila Se você deseja preparar e testar uma terra argilosa encontrada na natureza, deve retirar uma pequena quantidade para teste. Se esta amostra estiver úmida, deve-se secá-la e triturá-la e, após isso, deve ser colocada de molho na água para que ela se dissolva por completo até obter uma “lama” homogênea. Se restarem pequenos grunhos, o ceramista deve desmanchá-los com as mãos. Coloque a argila líquida sobre uma superfície absorvente, pode ser uma pilha de jornal, uma telha de cerâmica ou uma placa de gesso e deixe-a no local até obter uma consistência em que possa ser amassada sem colar nos dedos. Se a quantidade de água ainda estiver excessiva a argila estará mole e pegajosa, devido à perda de aderência entre as partículas, necessitando perder um pouco mais de sua umidade antes de ser utilizada. Após tirar a argila da superfície, deixe-a em repouso, durante um tempo em ambiente adequado, para melhorar a plasticidade (lugar fresco e protegido do sol e do vento, de preferência acondicionado em sacos plástico para manter a umidade). Para testar a plasticidade, amasse-a e faça um rolinho, curvando-o lentamente até formar um biscoito ou um arco (Fig. 33). Se durante esse processo a argila apresentar rachaduras ou abrir fissuras, é sinal

Fig. 33: Teste de plasticidade.

de pouca plasticidade, o que dificulta o trabalho de modelagem. Podemos, então, misturá-la com outra argila mais plástica ou acrescentar bentonita, argila vulcânica que aumenta a capacidade de absorção de água da massa, podendo ser usada na proporção de até 3% do peso da argila seca. Outra possibilidade será utilizá-la para fazer engobe ou terra sigilata, os quais trataremos com mais detalhes, posteriormente; por enquanto daremos continuidade a preparação da argila, transformando-a em massa cerâmica. Quando a argila apresenta características apropriadas para a modelagem, devemos guardá-la embalada em saco plástico bem fechado, pois ele manterá a umidade Matéria-prima

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da massa. A água evapora e vai de encontro ao plástico, voltando novamente para a argila, matendo-a úmida. Se necessário, podemos envolvê-la com pano molhado, deixando por um tempo até que aumente sua umidade. Podemos, então, dizer, no que se refere à cerâmica, que essa fase de preparação demanda calma, desde a escolha ponderada da argila e dos elementos de liga, até um paciente manejo. Sabemos que existem várias qualidades de argila, portanto, o ceramista precisa conhecer a matéria com a qual se propõe a trabalhar, para compreender como ela age e se suas propriedades atendem às suas necessidades, podendo fazer possíveis adaptações para superar os limites que lhes impôs a matéria.

Preparação da massa cerâmica A plasticidade, maleabilidade e flexibilidade da argila fazem desse material um convite a sua manipulação, despertando as potencialidades criadoras do ser humano. Às vezes, são adicionados à argila outros elementos para se obter um material de maior plasticidade, coesão e melhor cozimento. As argilas muito plásticas, por encolherem bastante, tendem a apresentar rachaduras na secagem e na queima, podendo ser acrescidas de chamote. O Chamote pode ser obtido triturando a cerâmica ou queimando argila em pó, podendo variar de granulometria de acordo com a necessidade. Por já ter sido queimado, não encolhe mais, assim, ao ser adicionado a uma massa, reduz seu índice de retração e aumenta sua resistência. Nas obras de Mary Di Iorio realizadas na década de 80, podemos conferir a preparação da massa cerâmica para dimensões amplas. Na composição da massa, entraram: elementos plásticos (argila para baixa temperatura, adquirida na região de Monte Carmelo; uma matéria-prima de fácil acesso e de boa qualidade, contendo Fig. 34: Mary Di Iorio. Preparação da massa com chamote.

muito óxido de ferro); e o elemento antiplástico (o chamote grosso – argila calcinada). Nesse caso, a massa com chamote promove maior resistência à peça, evitando certas deformações durante o processo de transformação da pasta em cerâmica. A escolha do chamote grosso teve como objetivo deixar a textura aparente (Fig. 34). As experiências de manuseio da argila foram numerosas em cada grupo social. Essa variação é determinada a partir das incorporações de outros elementos à matéria para obtenção de um material

30 Unidade 2


mais apropriado, determinando diversos saberes e fazeres. Pode-se definir uma massa cerâmica como uma mistura de argilas e outras substâncias minerais, as quais são balanceadas, dando origem as mais diversas classificações, para vários fins, numa complexa nomenclatura: terracota, faiança, porcelana, refratários, etc., dependendo da massa cerâmica preparada. Após a preparação da massa, o próximo passo é escolher a consistência que atuará sobre ela, devendo optar entre macia ou mole, dependendo de como vai direcionar o trabalho: para modelagem ou para moldagem. Ao optar pela modelagem, o ideal é a massa firme. O barro é amassado pacientemente, até obter uma massa uniforme, pastosa e macia. O amassamento do barro visa a dar-lhe mais uniformidade, assim como a expulsar possíveis bolhas de ar no seu interior. Durante esse processo, a massa precisa de mãos firmes e experientes para que ela se torne coesa. Nessa ação, a matéria nos revela as nossas forças, sugerindo nosso empenho. De fato, a mão que trabalha imprime à matéria uma dinâmica, pois, nesse momento, há uma intimidade do sujeito com o material, um lento trabalho de amassadura, numa troca de energia. Mas nem sempre encontramos uma massa homogênea para trabalhar, podemos nos deparar com uma matéria um pouco dura, nesse caso, o ideal é amassá-la num pano úmido; e quando estiver mole, com dificuldade no manuseio (grudando na mão), é necessário utilizar materiais que possam contribuir para absorção da água na massa: folhas de jornal ou placas de gesso. Há várias formas de amassar o barro com as mãos, apresentaremos aqui dois deles: usando as duas mãos agarradas na massa num contínuo movimento como massa de pão ou com uma mão enrolando a massa em forma de caracol como fazem os japoneses. Como massa de pão: corte uma parte da argila com as mãos ou usando fio de náilon. Sobre uma superfície lisa e seca (madeira, formica, granito) pressione com as palmas das mãos de cima para baixo e de fora para dentro, rolando ligeiramente para frente, fazendo uma força igual com ambas as mãos. Com os dedos, puxe a massa para traz e repita o procedimento. A argila deve manter a forma cilíndrica, evitando fazer buracos, para não formar novas bolhas (Figs. 35a e 35b). Método oriental: este método consiste em amassar a argila em forma de espiral. Coloque a mão dominante sobre a massa e a mão oposta em sua lateral. Com a mão dominante faça uma leve pressão de cima para baixo e para frente, com a outra mão gire a massa em direção ao seu corpo, formando um cone. Esse método é mais difícil para os principiantes, mas pode ser dominado com um pouco de prática (Figs. 36a e 36b).

Fig. 35a e 35b: Amassando em forma de pão.

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Fig. 36a e 36b: Amassando em forma de cone.

Em algumas situações, mais precisamente as Paneleiras de Goiabeiras do Espírito Santo, o processo sofreu alteração, antes amassado em pequena quantidade nas mãos, de forma lenta pelas mulheres, aos poucos, as misturas das argilas passaram a ser feitas pelos homens com os pés nus, possibilitando a preparação de uma grande quantidade de massa em pouco tempo e de forma homogênea (Fig. 37). Após amassar o barro, levando em conta o estado da argila, em geral amorfa, o trabalho do ceramista consiste em dar forma à matéria, iniciando-se a construção do objeto. Podemos definir três grupos técnicos para a construção de um objeto cerâmico: modelagem, moldagem e torneamento. Estes procedimentos podem ser conjugados, mas algumas técnicas carecem de matérias exatas que respondem às necessidades de seus procedimentos como a moldagem. Fig. 37: Amassando com os pés.

Pigmentos naturais As argilas que não são apropriadas para a modelagem não precisam ser descartadas de imediato, elas podem ser usadas como pigmento natural como terra sigillata ou engobe para pintar uma peça crua. A forma de aplicação é a mesma em ambos os casos. A terra sigillata foi utilizada pelos gregos para decorar os clássicos vasos com figuras-negras e figuras-vermelhas. Trata-se de uma pintura feita com a parte mais fina da argila, obtida através da separação das partículas por um processo de suspensão e decantação, que, aplicado sobre a peça crua, após a queima, apresenta um fino revestimento muito liso e quase impermeável (Figs. 38a e 38b). Fig. 38a: Ânfora com pintura em figura-negra. Fig. 38b: Vaso com pintura em figura-vermelha.

32 Unidade 2

Hoje em dia, podemos improvisar a sua preparação, para tanto, basta colocar a terra em uma garrafa pet com água, na


proporção de um terço de terra e dois terços de água. Essa mistura deve ser agitada e depois deixada em repouso para que os diferentes materiais possam decantar. Depois de aproximadamente dois dias será possível perceber através do plástico as camadas separadas pela espessura dos grãos, ficando os mais pesados por baixo, os mais finos por cima e no topo uma porção de água separada. Com o auxilio de um estilete, faça um furo na garrafa no limite da água com a argila mais fina, de forma que a água escoe sem sair a argila. Depois que a água escoar completamente repita a operação no limite da argila mais fina com a argila mais grossa de forma que a argila mais fina escorra pelo orifício. Esta é a terra sigillata. Engobes são argilas líquidas usadas para pintar a superfície de outra argila crua, resultando em cores opacas após a queima. É uma técnica muito antiga que consiste basicamente em se aplicar uma camada de argila líquida colorida, cobrindo parcial ou totalmente a cor da argila da base.

Fig. 39a: Consistência do engobe.

Os engobes podem ter a cor natural da argila ou serem preparados, acrescentando óxidos minerais ou corantes a uma argila preferencialmente de cor clara, devido à interferência dos óxidos já existentes na argila. A quantidade de óxido que se acrescenta a uma mistura depende da intensidade da cor que se deseja obter e varia de óxido para óxido. Acrescentando óxido de ferro a uma argila clara obteremos tons avermelhados; com o manganês, tons de marrom, o óxido de cobalto resulta em azul e o cromo e o cobre em uma variada gama de verdes. Podemos também combinar mais de um óxido no mesmo engobe para produzir outras tonalidades. É importante ressaltar que o esquema de cores que aprendemos com o disco de Newton não funciona na cerâmica, pois não estamos misturando pigmentos e sim minerais que irão se relacionar através de reações químicas por intermédio do calor durante a queima. São três os processos de aplicação do engobe; com o pincel, por imersão ou por banho, no entanto, o mais indicado para os iniciantes é o pincel. O engobe deve ter uma consistência fluida, como um iogurte de beber (Fig. 39a), e ser plicado em duas

Fig. 39b: Aplicação do engobe com pincel.

ou três camadas com pincel macio, alternado a direção das pinceladas, esperando secar entre as aplicações. Como a argila absorve rapidamente a água do engobe, tenha cuidado para não molhar demais a peça, pois ela poderá aumentar rapidamente de volume e rachar (Fig. 39b). A utilização do engobe é como se fosse um casamento entre duas argilas, a argila líquida do engobe e a argila da base. Para que esse relacionamento dê certo é fundamental que as duas argilas encolham de forma semelhante. Caso uma encolha mais do que a outra, elas podem se desprender na hora da secagem ou da queima, por isso se faz necessário a realização de testes antes da aplicação nos trabalhos.

Fig. 40: Aplicação de engobe com máscara.

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A aplicação do engobe pode ser feita com pincéis macios ou com pistola. Durante a aplicação, pode-se utilizar máscaras feitas de papel: um processo de isolar determinadas áreas com papel e depois aplicar o engobe nas partes desejadas (Fig. 40). Após a aplicação do engobe, pode-se optar pela técnica do Sgrafitto. Essa técnica consiste em raspar o engobe, dessa forma aparecerá, nas linhas, que formam os desenhos, a cor original da peça (Fig. 41).

Espaço de produção Fig. 41: Técnica do Sgrafitto.

A cerâmica demanda procedimentos, equipamentos, materiais e matérias-primas específicos, por ter certos rigores e etapas na produção; com isso, requer um espaço de trabalho determinado. Quando falamos de ateliê, estamos propondo ir além do lugar de produção, procurando pensar como se dá a relação do ceramista com o espaço, desde o momento em que pensa a obra, até a construção dos trabalhos. Dependendo do que se deseja produzir, a montagem do ateliê pode ser simples ou envolver um número maior de equipamentos. Em geral, quando se fala de um ateliê coletivo, o espaço deve ser amplo e arejado, de preferência com uma boa ventilação, janelas que permitam a ventilação e portas largas. Se a ideia inicial for apenas fazer modelagem à mão, é necessário mesas, banquinhos e prateleiras; mas se incluir o uso do torno, a produção cresce, com isso, será preciso um número maior de prateleiras para secagem das peças. O espaço do forno vai depender da escolha do mesmo, mas, em geral, requer um lugar adequado, separado do ambiente de produção, pois emana calor e, às vezes, gases tóxicos, podendo ser prejudicial à saúde dos participantes. A água corrente é fundamental para o trabalho, por isso, o espaço deve conter tanques ou pias com caixa sifonada, para evitar que a argila impregne os encanamentos, podendo entupi-los. No livro “Cerâmica”, editado pelo Senac, as autoras PENIDO; COSTA, propõem uma maneira simples de evitar o problema, caso já tenha a instalação: [...] deixar um balde dentro do tanque, embaixo da torneira. Perto da borda do balde, abre-se um buraco e nele coloca-se um tubo de PVC de cerca de 15 centímetro, para escoar a água, como se fosse uma bica. Todo o material deve ser lavado sobre esse balde. A argila fica depositada no fundo e, periodicamente, é jogada fora (1999, p. 99).

Acreditamos que ao se ter um espaço adequado para o trabalho de artes dentro das escolas, com equipamentos adequados, em especial o forno, seja um estimúlo 34 Unidade 2


para o professor tanto na pesquisa pessoal quanto na introdução dessa linguagem na sala de aula. A cerâmica, uma das primeiras experiências do homem, muito presente no cotidiano, é pouco trabalhada na escola em qualquer faixa etária. Quando perguntamos o porquê de não desenvolverem atividades com argila, os professores, em geral, justificam-se, alegando que não possuem um espaço adequado para desenvolver as atividades artísticas. Com isso, muitos alunos deixam de exercitar atividades ligadas ao tridimensional, sendo o desenho o principal meio de expressão plástica. Mas acreditamos que a mudança deve partir de nós, professores, pois se nós propusermos a transformar o espaço da sala em um ambiente para atuar com o básico, a matéria, permitiremos ampliar tanto as nossas experiências artísticas quanto a dos alunos, ao mesmo tempo que plantaremos a semente da mudança dentro da escola. Nas imagens abaixo, pode-se observar como está organizada a sala de cerâmica do Centro de Artes da UFES, como exemplo de distribuição e organização de um espaço de ateliê de cerâmica (Fig. 42).

Fig. 42: Sala de cerâmica do Centro de Artes da UFES.

É importante esclarecer que alguns equipamentos devem ser instalados definitivamente. Por essa razão, o ambiente deve ser pensado de forma a não interferir na circulação, dos sujeitos, de modo a contemplar também os cuidados com segurança. Os móveis como mesas, prateleiras, e outros materiais de fácil locomoção permitem ser deslocados de lugar, criando um novo ambiente e circulações mais adequados no espaço. Assim concebida a sala de cerâmica poderá se tornar um espaço onde alunos possam vivenciar o ambiente de forma mais prazerosa. Os materiais para se trabalhar com cerâmica, principalmente ferramentas e matérias-primas utilizados na sala de artes, devem estar em lugares visíveis, para criar um diálogo do meio com o grupo no momento da produção e, ao mesmo tempo, passam a contribuir com a organização da sala no final de cada atividade. Matéria-prima

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Além da sala de aula, podemos pensar em espaços alternativos para o desenvolvimento das atividades, como, por exemplo, o pátio, os corredores, enfim, a sala de artes pode estar em outros espaços ditos não convencionais, cabe a nós professores sermos criativos e olharmos para o interior da escola e ver que existem outros ambientes pouco utilizados e que podem ser aproveitados por nós. Podemos concluir que é possível dialogar com diferentes espaços, na concepção da obra, enquanto artistas, montando o próprio ateliê ou adaptando-o em casa, ou, outros vezes, compartilhando o espaço onde atua como professor; uma prática muito comum dos professores das universidades, como foi o caso de Mary Di Iorio que, enquanto atuou como professora, conviveu com dois diferentes espaços de produção (no ateliê/escritório montado em um dos cômodos de seu apartamento e na Universidade, onde atuou como professora – UFU), espaço este que teve como preocupação estruturar de forma ampla para futuras gerações (Fig. 43).

Fig. 43: Espaço da Universidade Federal de Uberlândia (UFU).

Diferentemente de Di Iorio, Tostes foi mais longe, além de atuar como professora na universidade (UFRJ), conquistando um amplo espaço para os alunos, desenvolveu projetos nas comunidades (Fig. 44a), aos poucos, esses espaços também foram incorporados pela artista como possíveis espaços de pesquisa e de produção plástica (Fig. 44b). Este último exemplo nos mostra que a escolha do material não está condicionado ao lugar, mas ao prazer de se trabalhar com a matéria. Ter nosso próprio espaço de experimentações permite-nos vivenciar etapas que podem se tornar proposições em sala de aula, pois acreditamos que esta atitude propicia-nos condições de nos tornarmos cada vez mais sensível ao novo; numa constante atuação como conhecedores daquilo que nos propomos desenvolver, como um permanente pesquisador ou observador da ação do outro, num diálogo constante entre o fazer e a percepção. 36 Unidade 2


Fig. 44a: Comunidade da Mangueira.

Fig. 44b: Construção da obra Gesto Arcaico.

Ferramentas Antes de apresentar o processo de modelagem, devemos apontar a importância das ferramentas durante a construção do objeto, pois, em alguns casos, elas passam a funcionar como uma extensão do corpo, inteirando os efeitos técnicos da mão humana. Tomaremos emprestadas as palavras de Fischer (1983, p. 21-22), para mostrar como a ferramenta é extensão da mão, cujo propósito é a utilização para o trabalho. O homem tornou-se homem através da utilização de ferramentas. Ele se fez, se produziu a si mesmo, fazendo e produzindo ferramentas. A indagação quanto ao que teria existido antes, se o homem ou a ferramenta, é, portanto, puramente acadêmica. Não há ferramenta sem o homem, nem homem sem a ferramenta: os dois passaram a existir simultaneamente e sempre se acharam indissoluvelmente ligados um ao outro. Um organismo vivo com objetivos naturais e, por terem sido utilizados pelo trabalho humano, estes objetivos naturais tornaram-se ferramentas.

No livro “O homem e a matéria”, Leroi-Gourhan (1984, p. 18), admite a incerteza de uma cronologia das ferramentas pré-históricas de acordo com a sua constituição. Segundo ele, “[...] é a matéria que condiciona todas as técnicas”. Devemos lembrar que o homem foi elaborando as ferramentas para dinamizar o seu trabalho, primeiro entre ele e a matéria, como prolongamento da mão, para, em seguida, alterar o poder da própria ferramenta, com a criação de máquinas que agilizam o seu fazer. Matéria-prima

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São muitas as ferramentas usadas pelos ceramistas, mas a escolha deve ser feita de acordo com a experiência e a necessidade. As ferramentas para cerâmica podem ser adquiridas em lojas especializadas ou criadas pelo próprio ceramista de acordo com suas necessidades, podendo ser elaboradas a partir dos modelos encontrados em livros (Fig. 45a). É possível utilizar vários utensílios prontos, como, por exemplo, aqueles encontrados na cozinha: facas, garfos, colheres e rolo de macarrão. Espátulas podem ser feitas com madeiras macias e esculpidas com estilete ou faca. A serrinha de ferro pode ser dividida em duas partes e, com esmeril, fazer duas boas faquinhas.

Fig. 45a: Ferramentas.

Outras ferramentas muito usadas pelos ceramistas são os desbastadores (Fig. 45b), encontrados no mercado em diversas formas, e que podem ser confeccionados com o corpo de uma caneta esferográfica sem carga e um clipe, ou grampo de cabelo, fixado, mediante o aquecimento do plástico e pressão do metal com um alicate, ou com massa durepox.

Fig. 45b: Desbastadores.

Um pedaço de fio de náilon amarrado a duas tampinhas plásticas funciona como cortador. Uma ponta seca pode ser feita com agulha de crochê ou com agulha de bordar. Um cartão de crédito vencido pode ser usado para substituir as placas metálicas, tendo a função de alisar superfícies das peças. Tenha sempre a mão, jornal, pano velho e esponja macia. 38 Unidade 2


Em geral, o ceramista organiza um espaço para guardar as ferramentas, de forma a deixá-las disponíveis para o trabalho: faquinhas, plásticos, jornal, pano bucha, lixa para madeira, rolo de macarrão ou cabo de vassoura, pares de ripas de madeira com espessuras variadas, ponta seca, espátula, fio de náilon, desbastadores, pote de manteiga ou similar, seixo rolado, entre outros materiais que se fizerem necessários. Outro instrumento muito utilizado pelo ceramista é o torno, que surgiu com a invenção da roda. Este uniu ritmo e movimento, tornando ágil a execução das peças e dando aprimoramento à forma. Com esse instrumento, ganha-se tempo, agora determinado não mais pela interação permanentemente física, mas pela velocidade da máquina (Fig. 46). Para Bardi (1980, p. 14), “O momento mais notável da manufatura dar-se-á quando se passará e se dedicará sobre um dos primeiríssimos modos maquinísticos: fazer a peça para, com as mãos, modelá-la de forma homogênea e mais lisa”. Trataremos desse instrumento, com mais detalhes, posteriormente; na apresentação da técnica do torno. Vamos focar nossos estudos nas técnicas de modelagem e torneamento, por acreditar serem úteis para a introdução da cerâmica no ensino-aprendizagem. Fig. 46: Torno elétrico.

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40 Unidade 3


Toda experiência estética supõe o desenvolvimento de técnicas. Em cerâmica, isso é muito importante, pois amplia as nossas possibilidades de expressão, além facilitar a concretização da obra, de acordo com as necessidades do projeto poético em curso. Qualquer falha técnica poderá acarretar em perdas de todo o trabalho proposto antes mesmo de sua finalização. Os processos de modelagem para a realização das peças de cerâmica são relativamente simples, mas é necessário ter experiência para dominar as técnicas, podendo ser adquirido com o trabalho ou pesquisa constante. Em geral, encontramos as técnicas em livros de cerâmica, mostrando passo a passo, porém, com a convivência com a matéria, exercitando as técnicas básicas, podemos observar que há meios de criar novos procedimentos. Estes procedimentos técnicos podem também ser passados de geração para geração, onde o aprendizado se dá com o olhar, observando pessoas mais experientes na construção de suas peças. Um bom exemplo são as Paneleiras de Goiabeiras, no qual as mais jovens têm sua iniciação com o polimento, e, durante esta prática, vão observando a forma de fazer das mais velhas e, aos poucos, começam a modelar pequenas panelas, e, quando se dão conta, estão atuando como paneleiras. É comum ouvir dessas mulheres: “eu aprendi com minha mãe que aprendeu com a mãe dela”. Esta frase está diretamente relacionada com a convivência familiar e o olhar como formas de aprendizado. Outro ponto importante é experimentar a matéria para ver suas potencialidades, o que nos permite atuar sobre o material sem o conhecimento prévio de técnicas, nesse caso, devemos utilizar pequenas quantidades de massa para ter maior domínio sobre ela. As crianças, por exemplo, ao utilizarem pequenas porções de barro, manipulam-nas experimentalmente, construindo de maneira intuitiva bolinhas, rolinhos, placas, tendo as mãos como ferramentas. A modelagem não se resume a uma única técnica. Na verdade, são alguns processos básicos, que, associados, irão proporcionar uma gama infinita de resultados; considerando ainda o fato de a argila poder ser trabalhada em diferentes consistências. As técnicas que vamos descrever, a seguir, de forma simples, são o resultado de anos de experimentações e que acreditamos poder auxiliar nas atividades dos iniciantes.

Modelagem

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Pote de aperto O pote de aperto é um dos métodos mais antigos, que utiliza as mãos como ferramenta para produzir seus utensílios e panelas de barro. É uma técnica que continua sendo usada por alguns artesões, mesmo depois da descoberta do torno. Como exemplo pode-se citar as Paneleiras de Goiabeiras, que mantêm a tradição dos seus antepassados (Fig. 47). Para termos um domínio maior sobre o processo de construção, devemos trabalhar com uma quantidade de matéria-prima que caiba entre as mãos. A maioria das peças realizadas com esta técnica é circular, é muito possível que tenha sido essa a forma mais simples do homem dominar o barro. Apesar de ser um método primitivo, encontramos artistas que utilizam esta técnica para desenvolver seus trabalhos. No livro “Terra, fogo, homem”, Nakano nos demonstra como trabalha com essa técnica:

Fig. 47: Paneleiras de Goiabeiras, 2010.

Descobri também uma maneira própria de trabalhar, em que partindo de um bloco de argila, faço uma perfuração central e vou abrindo a massa em vários sentidos até alcançar uma forma. Conservando a textura que naturalmente vai se formando no exterior, trabalho somente no interior da peça (1989, p. 38).

Este método nada mais é do que o barro apertado e manipulado entre os dedos. Para iniciar, faça uma bola de argila que caiba confortavelmente entre suas mãos. Nesse momento, as mãos trabalham juntas, cada uma desempenha uma função, uma como apoio em forma de concha, a outra como ferramenta. O dedo polegar perfura o centro da bola de argila, deixando uma espessura no fundo, que pode variar de acordo com a quantidade de argila e, consequentemente, o tamanho da peça. Aos poucos, os dedos da mão dominante vão pressionando no interior contra a outra mão que está apoiada na parte externa, girando a peça. Esse movimento irá abrir o diâmetro da forma. O próximo movimento deve puxar a massa do fundo para a borda, aumentando a altura da parede. Este movimento pode ser realizado, várias vezes, até chegar à espessura uniforme. Quanto mais fina a parede, mais delicada ficará a peça. Em cerâmica, temos que trabalhar dentro de uma limitação de tempo, pois a argila em contato com as mãos pode ressecar pela troca de calor do corpo com a peça, resultando em trincas. Para ultrapassar essa limitação, permitindo-nos a realização do projeto, devemos lavar as mãos e secá-la, paralisando a troca de calor e mantendo a umidade da matéria enquanto atuamos. O acabamento fica a critério de cada ceramista, desde texturas até o alisamento da peça, neste último caso, devemos umedecer o dedo no pano molhado e, em 42 Unidade 3


seguida, passarmos na peça, até que o brilho da água desapareça. Nesse momento, devemos tomar cuidado com o excesso de água, pois a peça pode absorvê-la, perdendo a forma. A partir da descrição desse procedimento, propomos uma reflexão sobre o fazer como experiência estética, como um encontro com a matéria, tendo como objetivo o nascimento da obra (Figs. 48a, 48b e 48c).

Figs. 48a, 48b e 48c: Utilização do dedo como pote de aperto.

Rolinho Apresentaremos a seguir uma técnica milenar utilizada por muitos artesões para fazer suas vasilhas de barro, chamada de rolinho ou cordões, que consiste na sobreposição de rolinhos ligados uns aos outros com argila líquida e completando com repuxamento, para cima e/ou para baixo, como uma costura, acompanhando a forma desejada. Esta técnica é muito utilizada pelas mulheres do Vale do Jequitinhonha para a fabricação da cerâmica, denominada por elas de processo de acordelado. O acordelado tem influência indígena brasileiras, e hoje essas mulheres utilizam esta técnica para a construção de peças utilitárias, como potes, utensílios domésticos e esculturas de grande porte, construindo-as já ocas (Fig. 49). Dalglish apresenta o procedimento: “... consiste na sobreposição de cordões de argila espiral, unidos um ao outro com o auxílio dos dedos, e alisados com um sabugo de milho ou pedaço de cuia para dar o acabamento final” (2006, p. 38).

Fig. 49: Vale do Jequitinhonha.

Esta técnica foi bastante difundida, e ainda hoje encontramos com frequência ceramistas que se utilizam deste procedimento para construir suas peças. Podemos aqui apresentar a artista plástica Nakano, que escolheu a cerâmica como meio de expressão, utilizando os processos técnicos adquiridos pela pesquisa e contato com outros ceramistas: Modelagem

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Na maioria dos meus trabalhos, utilizo a técnica das cobrinhas, a mais antiga e rudimentar, sem a intervenção de ferramentas, utilizando apenas as mãos. Esse processo milenar, utilizado em todas as cerâmicas primitivas desde a pré-história é ainda a mais conhecida. É a mais trabalhosa e demorada, pois são rolinhos que vão se superpondo de acordo com a forma a ser dada, “costurados” (emendados e alisados), na sua parte interna e externa. Mas é essa a técnica que, segundo minha experiência, oferece as mais amplas possibilidades e a que mais coloca o homem em interação com a argila (1989, p. 37-38).

Materiais:

Argila; 1 base de madeira para apoiar a peça (pode usar o torno manual); 1 tecido; 1 faquinha; Vasilhame para água; Sacos plásticos; Jornais; Vidro, contendo barbotina da argila a ser utilizada; Instrumentos para texturas. Fig. 50: Preparando a base com rolinho.

Apresentaremos em partes cada etapa do processo:

Pegue uma pequena quantidade de argila e sobre uma superfície lisa pressionea levemente, rolando-a para frente e para traz, usando as palmas das mãos até as pontas dos dedos. Deslize também as mão lateralmente do centro do rolinho para as extremidades. A pressão exercida sobre a argila deve ser constante e homogênea em ambas as mãos, caso contrário o rolinho tende a ficar achatado. Se isso acontecer, basta bater levemente na parte mais larga para que ele volte ao formato desejado (Fig. 50). A base da peça pode ser feita usando um rolinho em forma de espiral, para se Fig. 51: Fazendo o rolinho.

obter uma superfície lisa, basta unir os rolinhos, usando uma faquinha ou uma esteca de madeira. A base também pode ser feita com a técnica da placa (que veremos a seguir) (Fig. 51). A espessura dos rolinhos e da base dependerá do tamanho da peça. Quanto maior e mais alta for a peça maior a espessura da base e dos rolinhos (Fig. 52). Com a base da peça definida, poderemos começar a subir a parede. Com a ponta de uma faca, faça pequenas ranhuras no contorno da base e do rolinho que será usado. Com um pincel, passe barbotina2 sobre as ranhuras e coloque o rolinho

Fig. 52: Construção da base para colocação do rolinho.

sobre a base, exercendo uma pequena, mas constante, pressão (Figs. 53a, 53b e 53c). 2. Barbotina é uma argila líquida utilizada como cola, que serve para unir duas ou mais partes de argilas ainda molhadas. Para prepará-la, basta diluir um pouco de argila em água (como se fosse

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Fig. 53a: Barbotina na peça.

Fig. 53b: Fixando o rolinho na peça.

Fig. 53c: Costurando o rolinho na peça.

Cole as pontas do rolinho com barbotina e com o auxilio da faquinha costure3 unindo as extremidades. Para subir a parede, basta colocar um rolinho sobre o outro, usando barbotina entre eles. Repita a operação até obter o tamanho desejado. Se os rolinhos forem colocados gradativamente um sobre os outros, a peça crescerá, mantendo o mesmo formato. Se pretende realizar peças grandes, deve-se aumentar a espessura do rolinho e subi-la aos poucos, deixando a parte inferior ganhar resistência para não desmoronar da parte que será construída. Para modificar a forma, basta mover o rolinho um pouco para fora, (abrindo a forma) ou para dentro (fechando a parede). Ao costurar os rolinhos, trabalhe com ambas as mãos, uma costurando com a faquinha e a outra dando suporte no lado oposto da peça para que ela não

Fig. 54: Acabamento da peça.

se deforme (Fig. 54). Pode-se alisar toda a superfície interna e externa ou deixar uma ou até mesmo ambas com o rolinho aparente, essa é uma escolha individual. O rolinho pode ser utilizado também para fazer relevos na superfície da peça ainda úmida, colocado na vertical, inclinado ou em espiral (Fig. 55).

Placa Outra possibilidade é se trabalhar com o barro esticado de espessuras uniformes, dando o nome de placa. Com está técnica, o ceramista pode construir formas das mais

Fig. 55: Posibilidades de montagens.

diversas, desde as formas quadrangulares, cilíndricas, planares, ou mesmo formas orgânicas, resultando em peças com espessuras uniforme e com um bom acabamento.

iogurte). É mais fácil deixar a argila secar e acrescentar um pouco de água até obter uma consistência pastosa. Caso não dê para esperar a argila secar pegue um pouco de argila mesmo que esteja molhada e acrescente um pouco de água e, com a ajuda de um pincel, dilua-a até que tenha a consistência desejada. 3. A expressão “costurar”, na cerâmica, significa utilizar a face da faca para puxar pequenas quantidades de argila de uma parte unindo-a à outra parte. É comum aos iniciantes usarem o corte da faca, riscando a argila ao invés de deslocá-la. Modelagem

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Materiais:

Argila; 2 pares de ripas de madeira (pode adquirir pares de diferentes espessuras); Faquinha; Vidro contendo barbotina da argila a ser utilizada; Pincel de cerda dura; Rolo de macarrão; Pano; Jornais; Sacos plásticos; Lixa de madeira nº 100; Esponja macia; Vasilha para colocar água. Procedimentos técnicos:

Esta técnica consiste em abrir uma placa de argila e, em seguida, cortá-la, dobrála, enrolá-la e colá-la como se fosse uma folha de papel, guardadas as devidas proporções da espessura. É sempre bom ter um projeto para nos guiar. Os protótipos de papel são muito úteis nessa técnica, dessa maneira, você saberá o tamanho da placa e poderá dimensionar também sua espessura (Fig. 56). Sobre uma superfície plana estique um pano, ou jornal ou ainda um plástico (de acordo com a consistência da argila) e, em seguida, coloque a argila previamente amassada e aplane um pouco com a mão. Se lhe for possível, use um par de ripas de madeira como guias para determinar a espessura da placa (se a peça for Fig. 56: Fernanda de Abreu Passos. Projeto feito de papel. 2010/2.

pequena, use ripas mais finas; se for grande, use ripas mais espessas), coloque entre elas a argila e com um rolo de macarrão (ou cabo de vassoura) abra a massa, começando pelo meio da placa e vá nivelando-a aos poucos. Pode-se controlar a forma da placa girando-a, mas sempre obedecendo à direção das ripas para manter a sua espessura, fazendo-a crescer, assim, de acordo com suas necessidades. É importante que você solte, de vez em quando, a argila do material de apoio (suporte) para facilitar a expansão da mesma (Figs. 57a e 57b). Para constatar a existência de bolhas de ar na massa, deve-se, para tanto, passar sobre ela uma espátula umedecida. Caso se verifique um pequeno volume constatando a existência das bolhas, para eliminá-las basta usar uma ponta seca ou mesmo a ponta de uma faca, abrindo-as e, em seguida, alise novamente o local, observando se a bolha desapareceu; caso contrário, repita a operação. É importante alisar as duas faces da placa; para isso, utilize uma base de madeira forrada

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de jornal sobre o lado já alisado e introduza uma das mãos sob a placa, fazendo uma alavanca e girando a mesma sobre a madeira. Com a placa aberta e livre de bolhas, podemos começar a executar a peça. A etapa seguinte é o corte da placa, a partir do modelo determinado. Ao cortá-la, deve-se molhar a faca com água para a ferramenta não grudar na massa. Se a parte a ser cortada for reta, pode-se utilizar uma régua para facilitar o trabalho (Fig. 58).

Fig. 57a e 57b: Abrindo a placa.

Fig. 58: Partes.

Recorte todas as partes que compõe a peça, a base, e/ou a (as) paredes da mesma, de acordo com seu projeto. Não se esqueça da espessura da placa, esta deve ser calculada antes do corte (Fig. 59).

Fig. 59: Guias para espessuras de placas.

Apoie a base da peça sobre uma madeira, ou azulejo, revestido de jornal (isso facilitará mover a peça), faça ranhuras nas partes que serão coladas e pincele barbotina. Coloque a parede sobre a base com movimentos leves para evitar que amasse a placa e a pressione ligeiramente. Em alguns casos, deve-se usar um rolinho na junção interna das placas para reforçar a união das mesmas, costurando interna e externamente. Repita a operação com todas as partes a serem coladas (Figs. 60a, 60b, 60c, 60d e 60e). Modelagem

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Figs. 60a e 60b: Preparação das partes. Fig. 60c: União das partes com rolinho. Figs. 60d e 60e: Finalização da peça.

Ao término da construção, a peça deve ser submetida a uma secagem cuidadosa, à sombra, com uma cobertura plástica para que seque lentamente. Este processo deve ser acompanhado, pois, dependendo da extensão da peça, a mesma pode sofrer alterações como empeno ou rachadura. Após a secagem, pode-se melhorar o acabamento da peça, utilizando, para isso, uma lixa de madeira nº 100 e, em seguida, tirar-lhe o pó com pincel ou esponja. A placa pode ser usada sobre diferentes superfícies como molde, até que a massa fique firme ou dura. Como exemplo podemos citar: pratos, cumbucas, cascas de árvores, etc. É importante pensar na sua retração durante a secagem para que esse molde não impeça o seu encolhimento. Nem todos os objetos servem como molde.

Bloco Com a técnica do bloco, você poderá criar escultura das mais diversas, como anatomia humana, animal, forma abstrata, etc. Os alunos iniciantes na cerâmica, muitas vezes, já manipularam a argila como experimentos de modelagem. É importante lembrar aqui que existem modos diferentes de se trabalhar com a argila, isso vai depender do objetivo do artista, ele pode utilizar como fim a escultura, sendo a modelagem um meio para outros materiais. Outra possibilidade é a escultura cerâmica, na qual a ação sobre a matéria será outra. A forma deve estar vazia, portanto, as peças devem ser ocadas e conter uma abertura para a passagem do ar contido no interior; caso contrário, a peça pode estourar durante a queima. Materiais:

Argila; Torno de mesa; 1 Base de madeira para apoiar a peça; Estecas ou desbastadores; Espátulas; 48 Unidade 3


Faquinha; 1 Saco plástico; Fio de náilon; Etapas de construção:

Pegue uma quantidade de argila, amasse-a bem para eliminar a bolhas de ar (como já foi descrito nas páginas 31 e 32). Com os dedos, comece a pressionar a argila, dando-lhe o formato que desejar. Umedeça os dedos ou a ferramenta que estiver utilizando, mas nunca deixe que se forme lama na superfície da peça. A água serve como lubrificante, mas se usada em demasia pode amolecer a peça, dificultando a modelagem ou causando-lhe rachaduras. Algumas peças para serem modeladas, por vezes, necessitam de uma estrutura interna (em madeira, metal, isopor etc), essa deverá ser retirada do interior da peça antes que ela seque, pois poderão causar trincas durante a secagem ou durante a queima. Em alguns casos, pode ser usada uma estrutura de jornal; essa deverá permitir que a peça encolha, nesse caso, não há a necessidade de retirá-la, pois a mesma se transformará em cinza durante a queima. Para se evitarem rachaduras durante a secagem deve-se ter alguns cuidados durante a modelagem para que as partes mais finas, e consequentemente as que perdem mais rapidamente a umidade, não sequem antes do restante da peça, evitando rachaduras. Deve-se então usar pano umedecido ou plástico para protegê-las enquanto modelamos as demais partes, sem que essas venham a secar. Ao término da modelagem, a peça deverá ser ocada, ou seja, ter toda a argila do seu interior retirada. Cada peça irá necessitar de uma forma de ocagem diferente, por isso é importante se estudar cada caso previamente. Em alguns casos, pode-se ocar a peça pela base, essa é a forma mais simples, basta virar a peça cuidadosamente de cabeça para baixo, ou apóia-la lateralmente sobre uma superfície macia, retirando a argila do seu interior com um desbatador4. Existem formas que nos obrigam a seccionar parte da peça para que seja feita a ocagem de forma homogênea por toda a sua extensão. A secção de uma peça deve ser feita com a argila firme para não deformá-la, mas não tão dura para que possa ser cortada e colada. Usando um fio de náilon, corte a peça em uma ou mais partes. Estude bem antes de cortar para que você possa ocar toda extensão da peça com o mínimo de secções possíveis (Figs. 61a e 61b). Com o auxilio de um desbastador, retire aos poucos a argila do interior de cada parte da peça, mantendo uma das mãos na parte externa trabalhada para se 4. Ferramenta constituída por um cabo de madeira ou plástico com um aro de ferro utilizado para retirar o excesso de argila do interior ou exterior das peças.

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ter noção do quanto está sendo retirado, evitando, assim, que se fure a peça. Se por acaso a peça for perfurada, passe barbotina no local e coloque a argila novamente, faça uma pressão com os dedos e, se for preciso, costure-a com a faquinha. Enquanto uma parte está sendo ocada o restante da peça deve estar protegida com um pano úmido ou mesmo um plástico para que não seque demasiadamente. A parede da peça deverá ter espessura uniforme ao longo de toda a peça, de acordo com o seu tamanho. Nas peças pequenas, as paredes deverão ser mais finas e em peças maiores as paredes deverão ser grossas (Figs. 62 e 63). Após a retirada do excesso da argila do interior de cada parte, devemos remontar a peça, colando as partes que foram seccionadas cada uma em seu devido lugar. O processo de colagem é semelhante ao das outras técnicas; faça ranhuras nas partes que irão se tocar, passe a barbotina e pressione levemente, costure com cautela para não deformar a peça. Se na emenda surgir uma depressão, coloque um rolinho

Fig. 61a: Cortando a peça com o fio de náilon.

Fig. 63: Peça ocada, paredes uniformes.

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Fig. 61b: Peça cortada.

Fig. 64: Juntando as partes.

Fig. 62: Ocando a peça.

Fig. 65: Costurando a junção.

Fig. 66: Peça pronta.


para que a peça volte a ter o aspecto inicial. Vá colando cada parte com cuidado, achando o ponto exato de encaixe, pressionando sem amassar e costurando muito bem para que não se solte durante a secagem ou na queima (Figs. 64, 65 e 66). Se a base da peça for fechada, lembre-se de que no interior da peça se formou uma enorme bolha de ar e que precisará de um orifício para sair durante a secagem e a queima, logo, devemos fazer um pequeno furo na base ou onde achar mais conveniente.

Torno As peças de cerâmica foram feitas completamente à mão por séculos, até que por volta de 3000 a.C. o progresso das civilizações gerou a necessidade de se fabricar um grande número de recipientes para o armazenamento de líquidos e alimentos, propiciando, então, o surgimento e a evolução da roda de oleiro, uma das primeiras ferramentas mecânicas desenvolvidas pelo homem. Hoje, já existem diferentes tipos de torno, que variam de acordo com o mecanismo impulsionador da roda e a posição do oleiro no momento do trabalho. Os tornos mais antigos e mais simples são acionados a mão, onde o impulso é dado através de um bastão que se encaixa em um orifício na roda, fazendo-a girar (Fig. 67). Temos também o torno movido com um dos pés, que consiste em uma mesa circular diretamente conectada por um eixo a uma roda, que o ceramista move diretamente com o pé (Fig. 68). O torno elétrico é a versão mais moderna da antiga roda de oleiro, trata-se de um motor movido à eletricidade que faz girar o disco no qual a argila é torneada (Fig. 69).

Fig. 67: Torno de mão.

Fig. 68: Torno a pedal.

Fig. 69: Torno elétrico.

Por seu movimento circular, rotação, o torno é uma ferramenta que possibilita a construção apenas de peças circulares, que podem ser alteradas pelo ceramista depois de prontas, recortando-as, amassando-as ou colando novas partes. Modelagem

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Não há uma única maneira de se trabalhar com o torno, cada ceramista desenvolve a sua própria forma de tornear, adaptando as posições das mãos, mas seguindo um principio lógico, tudo gira em torno de um eixo central. Alguns tornos giram para os dois lados, o mais indicado é que os destros usem o torno no sentido antihorário e os canhotos no sentido horário. Vamos descrever aqui os procedimentos para a utilização de um torno que gira no sentido anti-horário, assim, os canhotos devem inverter as indicações das mãos. A melhor forma de aprender a tornear, além de se praticar, é observar as pessoas que já tenham um avançado domínio da técnica, para isso, temos sites de vários ceramistas que apresentam sua experiência. Vamos traçar algumas diretrizes básicas das etapas a serem seguidas, pois somente a prática levará ao domínio da técnica. É importante ressaltar que as etapas são sequenciais e pré-requisito para a etapa seguinte. São elas: colar a argila na base do torno, centralizar a massa, furar e em seguida abrir a massa, subir a parede e, por fim, dar a forma da peça, retirando-a em seguida do torno. Todo processo encontra-se registrado em um vídeo para compreensão sequencial em movimento, das etapa apresentadas aqui. Materiais:

Argila; Torno; Banco; 1 Vasilha com água; 1 Esponja macia; 1 Ponta seca; 1 Fio de náilon; 1 Espátula de metal ou de madeira (pode substituí-la por um cartão de banco vencido). Etapas de torneamento:

Para começar a tornear, prepare uma bola de argila, bem amassada. O ideal para o iniciante é que ela esteja macia e a quantidade caiba confortavelmente entre suas mãos, à medida que for ganhando prática pode ir aumentando ou diminuindo a quantidade de argila. Com o torno desligado, bata com ambas as mãos na bola de argila com força o mais próximo possível do centro do torno. Ligue o motor e acelere para girar o disco. Ainda com as mãos secas, use o dedo indicador da mão direita para pressionar levemente a base da argila, colando-a no disco do torno, impedindo que a água deslize para entre a argila e o disco. 52 Unidade 3


Molhe as mãos. A partir de agora todos os movimentos devem ser realizados com as mãos molhadas, pois a água servirá de lubrificante, impedindo que a argila cole em suas mãos. Vamos fazer agora varias vezes a repetição de uma sequência de movimentos, que tem como objetivo centralizar a argila e organizar suas partículas. Esse movimento consiste em pressionar a massa, descendo-a contra a base e, em seguida, subí-la, formando um cone. Para isso, pressione a mão direita sobre a massa, fazendo um movimento vertical, empurrando a massa de cima para baixo, simultaneamente. Com a mão esquerda, empurre para o centro, fazendo um movimento horizontal para frente. A força de cima para baixo deve ser maior que a força para frente permitindo assim que a argila desça (Fig. 70a, 70b e 70c). Para subir, deslize a mão direita para o lado oposto ao da mão esquerda e pressione uma contra a outra (usando as palmas das mãos), fazendo um movimento com ambas as palmas de baixo para cima, puxando a argila e formando um cone. Repita essa operação no mínimo três vezes, ou até conseguir centralizar a argila de forma que, ao apoiar as mãos levemente sobre ela, esta não se movimente (Fig. 71). Nunca deixe as mãos secarem, diminua a pressão das mãos, depois, desloqueas lentamente e mergulhe-as na água todas as vezes que sentir que elas ressecam. Todos os movimentos deverão ser suaves, tanto ao colocar como ao retirar as mãos da massa. Use a espoja para enxugar o disco todas as vezes que molhar as mãos. Com a argila centralizada, vamos agora furar a peça no centro. Uma das formas de se furar é apoiar os polegares sobre a massa, deixando as mãos abraçarem levemente a peça. Lentamente, vá pressionando os polegares para baixo, abrindo um orifício central, até deixar uma espessura suficiente para o fundo da peça. Outra forma de furar a peça é com a mão esquerda em volta da argila: formando um “C” apoie a mão direita sobre a mão esquerda, descasando o dedo médio sobre a massa até encontrar o centro. Pressione levemente o dedo para baixo, perfurando o centro da argila. Desça até deixar uma espessura que irá ser o fundo da peça (Figs. 72a e 72b). Para abrir, mantenha a posição das mãos e puxe-as em direção ao seu corpo, até atingir o diâmetro desejado. A ponta do dedo indicador deve fazer um movimento paralelo ao disco, sem levantar ou afundar. Com o auxilio da esponja, enxugue o interior da argila para que ela não amoleça (Fig. 73). O próximo passo é levantar as paredes da peça. Para isso, as mãos trabalham em cooperação: a mão esquerda posiciona-se na parte interna da peça, utilizando o dedo médio ou o indicador para puxar a massa de forma ascendente, enquanto a mão direita se posiciona na parte externa, acompanhando a esquerda, gerando um movimento ascendente da base da peça para o alto. Os dedos devem estar sempre alinhados. Para facilitar esse processo, tente tocar uma mão na outra com os Modelagem

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polegares para que a pressão exercida se torne constante e o movimento de subida tenha uma velocidade também constante. Procure travar os braços no corpo ou nas pernas para evitar que as mãos se desloquem para frente, acompanhando o movimento da roda (Figs. 74a, 74b e 74c). Para dar forma à peça, deve-se trabalhar alternando-se a pressão dos dedos. Se o objetivo é abrir a peça, o dedo interno empurra levemente a parede da mesma e o externo o acompanha. Para fechá-la, fazemos o inverso: o dedo externo que está localizado no lado de fora empurra a peça e o dedo localizado no lado interno diminui a pressão. Os dedos também podem se deslocar ligeiramente para cima e para baixo, levando em conta que o dedo que está abaixo empurra a peça, forçando a massa para o lado oposto. Nesse momento, o uso de espátulas pode ser conveniente, para auxiliar na forma. A velocidade de rotação do disco pode ir diminuindo a cada etapa, chegando ao fim, bem lentamente, para facilitar a modelagem da forma e o acabamento da borda (Fig. 75). Se em alguma das etapas anteriores for encontrada uma bolha de ar, pare a rotação do torno, fure a bolha com uma ponta seca e pressione a massa levemente com a ponta do dedo e volte a tornear. Antes de desligar o torno, use a espátula para raspar a junção entre a base da peça e a do disco, melhorando o acabamento. Seque a peça com a esponja e desligue o torno (Fig. 76). Segure cada ponta do náilon e o apoie no disco, esticandoo, em seguida, deslize-o sob o prato para a retirada da peça pronta. Com as mãos secas pegue delicadamente a peça pela base, levantando-a e apoiando-a sobre uma base com jornal já preparado para recebe-la (Fig 77).

Fig. 70a, 70b e 70c: Centralizando a argila, subindo.

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Fig. 71a, 71b e 71c: Centralizando a argila, descendo.

Fig. 72b: Furando o centro da argila.

Fig. 74a: Subindo a parede da peça.

Fig. 74b: Subindo a parede da peça. Fig. 75: Definição da forma.

Fig. 76c: Acabamento da peça no torno.

Fig. 72a: Furando o centro.

Fig. 73: Abrindo o diâmetro interno da peça.

Figs. 76a e 76b: Acabamento da peça no torno.

Fig. 77a e 77b: Retirando a peça do torno.

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Acabamento Independente das técnicas usadas, os trabalhos realizados com argila podem ser trabalhados com texturas das mais diversas. O acabamento não precisa ser necessariamente uma superfície lisa, explore os materiais que estiver a sua volta, a argila é um excelente corpo para imprimirmos objetos como rendas, sementes, cascas, folhas, palitos, cabo de pincel e tudo mais que estiver ao seu alcance. Uma simples textura pode contribuir para valorizar e personalizar uma obra. Existe também a possibilidade de polir a superfície de uma peça, fechando os poros para ganhar um leve brilho após a queima, como fazem as ceramistas do Vale do Jequitinhonha e as paneleiras de Goiabeiras. Para isso, podemos usar um seixo rolado, colher de metal ou mesmo plástico, polindo a peça quando esta se encontra em ponto de couro5. Ao se friccionar a ferramenta sobre a superfície da peça, esta adquire certo brilho, tornado-se impermeável, pois as partículas da argila se juntam de maneira a vedar os poros, impedindo, assim, a passagem de líquidos. Outra maneira de dar acabamento a uma peça já seca é lixar a sua superfície, nesse caso, use lixa para madeira, as mais finas deixam as peças mais lisas; as mais grossas deixam as peças um pouco mais ásperas.

Tempo de secagem A modelagem pode ser realizada em alguns segundos ou levar dias para ser concluída. Por isso é importante o ceramista compreender que trabalha com o fator tempo e que precisa respeitá-lo, acompanhando todas as fases do processo cerâmico. Acelerar, retardar ou pular uma etapa é uma questão delicada que poderá comprometer o trabalho. Vale lembrar que para mantermos uma peça úmida devemos envolvê-la em uma embalagem plástica da mesma forma como acondicionamos a argila. Se a peça inacabada estiver um pouco seca, dificultando a modelagem, coloque sobre ela um pano umedecido e mantenha-a em um plástico, para que esta absorva parte da água contida no pano e volte a ser maleável (tenha cuidado para não exagerar com a água). Dessa forma, é possível trabalhar uma peça por vários dias ou até por meses. É importante lembrar que o plástico para embalagem de peças que ainda não foram terminadas e das massas cerâmicas (argilas) devem ser de boa qualidade e 5. Momento em que a argila está firme demais para se modelada, mas ainda contém umidade. Uma forma de saber se a argila está em ponto de couro é friccinar levente o dorso da unha sobre a peça, se produzir brilho é porque está em ponto de couro, se arranhar é porque já passou. O ponto de couro é o momento ideal para se dar o polimento nas peças.

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não podem ter furos. As sacolas de supermercado contêm na sua composição uma certa quantidade de papel, logo, são porosas e deixam a umidade passar, não sendo recomendadas para embalagem de peças e argilas, porém, são úteis para proteger peças que necessitam secar lentamente. A secagem é um momento delicado e não deve ser acelerado, expondo as peças ao sol, nem a correntes fortes de ar. Reforçando o que já foi dito anteriormente, o ideal é que as peças sequem lentamente à sombra; e se tiverem partes com espessuras variadas recomenda-se cobri-las levemente com plástico para que as partes mais finas não seguem muito mais rápido que as demais, evitando-se, assim, rachaduras. Apresentamos aqui as diferentes possibilidades de trabalhar com a argila ou massa cerâmica. É importante testar e ver com que técnicas você mais se identificou ou qual delas melhor se adaptará ao projeto desejado. Nesse momento, o diálogo com pessoas experientes pode contribuir para este próximo passo. Não existe uma regra, muitas vezes, o projeto necessita de associações para facilitar a sua execução, uma técnica pode ser associada à outra ou até mesmo a outras. Podemos começar um determinado objeto com a técnica do pote de aperto e continuar com rolinho e/ou terminar com a placa. Podemos começar com a placa e terminar com rolinhos, ou mesmos começar com o bloco e terminar com rolinho, até mesmo peças feitas no torno podem se associar às demais técnicas.

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A partir de observações, pesquisas e contatos com alguns ceramistas, verificamos que há diferentes atitudes dentro do processo de criação nessa linguagem, pois cada artista escolhe um método de trabalho: alguns fazem opção por trabalhar diretamente com a matéria, sem um desenho prévio; enquanto para outros o desenho é o meio de construir seu pensamento plástico; há também aqueles que estão sempre atentos a outras possibilidades, como os restos, ou outros materiais para pensar um novo trabalho. Considerando essas observações, podemos apresentar cinco atitudes ou movimentos da mente criadora ao longo do percurso de elaboração e produção das obras: o barro: estudo e obra, que evidencia decisões tomadas durante o manuseio direto da matéria e obra; o resíduo como possibilidade de obra, que busca compreender como restos de um fazer podem tornar-se uma nova possibilidade de construção ou um novo elemento da obra; o desenho como modo de construção do pensamento, que engloba fazeres que são antecedidos por projetos que norteiam a construção da obra; o quarto movimento que é determinado pelas interações de diferentes sujeitos ou linguagens, definindo um diálogo com outros: sujeitos e linguagens; e o quinto leva em conta a utilização de outros materiais como estudo de processo. Apontamos essas cinco atitudes, mas isso não descarta outros processos que, no momento, não foram identificados. Destacamos, também, que um mesmo artista, ao longo do processo de uma obra, ou de um conjunto, pode manifestar interações desses movimentos, pois o fazer da mente criadora é híbrido e, por que não dizer, mestiço? Ou ainda podemos tomar as palavras de Bastide (apud PINHEIRO, 2004, p. 18): Seria necessário, em lugar de conceitos rígidos, descobrir noções de certo modo líquidas, capazes de descrever fenômenos de fusão, de ebulição, de interpenetração; noções que se modelariam conforme uma realidade viva, em perpétua transformação.

Barro: estudo e obra Para alguns artistas que trabalham com o barro, esse material pode ser mais que a matéria-prima escolhida para construir suas obras. Pode fazer parte do processo de criação e mesmo suprimir os desenhos preparatórios. A partir da construção de cada obra, o artista, ao se deparar com questões, vai tentando resolvê-las ao longo do processo; ou ele pode exercitar-se utilizando a própria matéria, fazendo pequenas maquetes, o que lhe permite observar a forma, o volume, a cor e a textura ou novas possibilidades. O processo de criação na cerâmica

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Aqui, podemos destacar, ainda, duas atitudes com a matéria: na primeira, a utilização da argila se dá em um processo contínuo, isto é, o artista parte da própria matéria até chegar à obra, num diálogo íntimo com o barro. Ele parte do seu conhecimento e das experiências plásticas já realizadas e, ao introduzir o novo, ele conta com o imprevisível; mas, aos poucos, vai buscando soluções para as questões que vão aparecendo. Nesse caso, o conhecimento técnico é muito importante, pois, em geral, o volume vai surgindo das mãos experientes de cada artista. Podemos aqui destacar Antônio Poteiro, Adel Souki, Shoko Suzuki e Máximo Soalheiro. No caso de Antônio Poteiro, a sua profissão de fazer potes lhe proporcionou a internalização de certos princípios básicos na construção do objeto artístico. Nesse processo de trabalho, aprendeu a dominar os materiais e a transformá-los. Isso envolve o conhecimento que o artista precisa ter para dele servir-se. Em geral, os conhecimentos desses artistas foram adquiridos de maneira vivencial. Tanto o manuseio do barro como o contato constante com as técnicas de construção das peças foram importantes e decisivos para a construção de seus trabalhos plásticos. Resende (1996), ao introduzir o catálogo de Souki, fala do processo dessa artista: Tudo tem início no corpo-a-corpo do toque de mão sobre o barro inerte quando mutuamente a imprimem, dando forma à matéria bruta e informe. Dessa intimidade de gestos nascem idéias, revelam-se sonhos e descortinam-se possibilidades.

Já na segunda atitude com a matéria, podemos dizer que, em geral, são experiências ou estudos em que a matéria é vivenciada ou manipulada para determinado fim, mas, durante o processo, o artista pode perceber novas possibilidades plásticas. Para essa situação, vamos apresentar experiências de Mariana Canepa, Celeida Tostes e Katsuko Nakano. Nas obras de Canepa realizadas em 2000, podemos notar que a artista trabalhou grandes esculturas, utilizando finas camadas de argila de diferentes colorações, fruto de uma pesquisa realizada para trabalhos menores. A Figura 78 permite-nos observar como a artista foi além das misturas das argilas, pois se nota no objeto uma relação imagética com a própria matéria: solo, veios, troncos petrifiFig. 78: Mariana Canepa. Objeto, 2000.

cados. Numa entrevista para a revista Neuva Cerámica (2001, p. 28), Canepa fala de seus experimentos: Los trabajos pequeños me sirven como laboratorio para comezar a planificar las piezas mayores. Fue precisamente haciendo piezas de bisuteria que fui investigando mezclas de arcillas y las posibilidades técnicas de cada pasta, rasgo distintivo de mi trabajo hoy en dia.

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Celeida Tostes também tinha necessidade de experimentar o material, ou construir maquetes, antes mesmo de executar as peças de grande porte. A artista estava sempre atenta aos procedimentos, permitindo novos caminhos. Por exemplo, durante a construção do protótipo da obra Muro, desenvolveu os estudos das massas, utilizando pequenas placas com marcas, lembrando selos. Dessa experiência surgiu a obra: Selos (Fig. 79). A artista comenta: “Podemos ter uma intuição ou projeto inicial, mas durante a realização dele vamos chegando a outras questões que nos direcionam e promovem o aparecimento de novas estruturas que não havíamos imaginado antes” (TOSTES, apud PINTO, 1992, p. 140). Podemos pensar aqui na importância e no papel do acaso no projeto poético de Tostes. Katsuko Nakano, em seu livro: Terra, fogo, homem, relata como desenvolve seus trabalhos num constante diálogo com a matéria:

Fig. 79: Celeida Tostes. Série: Selos, s/d.

Meus trabalhos não partem de projetos definidos anteriormente. Tenho o barro, uma técnica e às vezes uma idéia do tipo de coisa que quero fazer. Ela vai se definindo através do fazer durante o processo. Ou seja, vou fazer um trabalho com placas. Abro a massa, vejo-a, vou traçando, cortando, emendando, até que surja ou não surja alguma coisa. Da tensão entre as possibilidades e as limitações vamos descobrindo pequenas técnicas auxiliares: como colar, como secar, como fazer para não deformar... Assim, para mim, a forma é quase que um pretexto para o fazer. Utilizei as diversas técnicas de modelagem, como diversos modos de me expressar através do barro. A minha expectativa é que dentro dessa diversidade haja algo que os una: minha própria expressão (1989, 99-101).

O desenho como modo de construção do pensamento Podemos considerar que, entre os artistas, no caso de alguns ceramistas, o processo de criação é acompanhado pelo registro de sua reflexão, o que pode ser feito em diários, folhas avulsas ou cadernos, contendo desenhos e/ou anotações etc. Esses materiais servem de base para seu processo criador. São registros do modo como apreendem o mundo e fazem suas seleções, o que, de alguma forma, pode ser coletado e levado para sua criação. Em geral, esse é o procedimento de artistas plásticos que iniciaram sua formação no desenho e que, ao escolherem a cerâmica como um meio de expressão, tomaram o desenho como um grande aliado no processo O processo de criação na cerâmica

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plástico. São indiciais dessa atitude, no cenário internacional: Picasso, Miró, Chagall, dentre outros. Ao se interessarem pela cerâmica, passam a fazer estudos preliminares, uma atitude muito comum dos escultores e pintores (Figs. 80a, 80b, 80c e 80d).

Fig. 80a: Pablo Picasso. Quatro estudos de cerâmica.

Fig. 80b: Pablo Picasso. Cerâmica, 1947/8.

No Brasil, foco do nosso interesse, podemos apontar: Francisco Brennand, Norma Grinberg, Hélio Siqueira e Mary Di Iorio, dentre outros. Para esses artistas, o desenho funciona como uma ferramenta para seus estudos, desde a forma, passando pela textura, o volume, a cor e muitas vezes a estrutura de montagem. Mas a forma de trabalhar o desenho depende de artista para artista. Podemos citar Hélio Siqueira (2000) que usa o desenho para duas situações na cerâmica, ora para pensar as obras, ora para organizálas no espaço. O artista trabalha com um mesmo material, o nanquim preto, para as duas situações, porém, dá-lhes um o tratamento diferenciado. Nos estudos das obras, ele trabalha a forma com refiFig. 80c (acima): Miró. Desenhos preparatórios.

namento, dando tratamento de luz e sombra por meio das hachuras (Fig. 81a). Já nos estudos das instalações, os desenhos aparecem soltos, na forma de esboços rápidos e precisos. Na verdade, os esboços que o artista faz são anotações, pensando a relação dos objetos no espaço e entre eles, independente do espaço da galeria (Fig. 81b). O desenho é a maneira que o artista encontrou para o registro de suas idéias e funciona também como um arquivo pessoal mantido em álbuns e cadernos guardados em gavetas. Siqueira fala da importância do desenho na sua produção plástica:

Fig. 80d (abaixo): Miró. Personagem. Cerâmica, 1945. 62 Unidade 4

Encontro nele a âncora de sustentação para a livre criação nas artes plásticas […]. Se, no início da carreira, ele aparecia como forma autônoma, hoje ele aparece nas peças que são criadas


migrando ora para a cerâmica, ora para a pintura. Reconheço que o desenho é a forma de anotação rigorosa do instante e é através dele que registro minhas idéias, seja em inúmeros cadernos organizados, seja nas paredes/espaços que encontro ao alcance da mão (SIQUEIRA, 2000, p. 34-35).

Fig. 81a: Hélio Siqueira. Estudos para cerâmica. Nanquim sobre papel, 1996.

Fig. 81b: Hélio Siqueira. Estudos para instalação. Nanquim sobre papel, 1996.

Alguns artistas consideram esses estudos iniciais como parte indispensável do processo de criação, sendo condição sem a qual não seria possível uma aproximação da ideia com sua materialização como imagem geradora. Brennand, em entrevista6 realizada com o artista em 2003, revela-nos as diferentes atitudes da pintura com relação à escultura: “Na pintura eu preciso ver, eu sou como São Tomé, eu quero botar o dedo na chaga, eu preciso ver o modelo. Na escultura, eu dispenso o modelo, eu imagino só, e desenho”. De acordo com Brennand, um escultor pode improvisar, mas, no caso dele, não, tudo começa do desenho, por considerar-se um pintor. Nessa mesma entrevista, o artista comenta: “Para chegar a uma escultura, eu tenho certamente uma quantidade grande de desenhos daquilo que pretendo fazer, você não esgota o assunto”. Após selecionar os desenhos para suas esculturas, o artista encaminha para o ateliê de cerâmica para serem construídos por artesões que, com suas experiências na arte de modelar, reproduzem fielmente o desenho do artista, desde a forma até a cor, enquanto o artista monitora a construção de cada peça. Com o passar do tempo, de acordo com sua necessidade, o artista vai substituindo os materiais de desenho. Nos desenhos mais antigos, o artista trabalhou com lápis preto ou monocromáticos como sanguínea ou azul (Fig. 82a e 82b); mas, ultimamente, o artista vem desenvolvendo seus estudos com lápis de cor e lápis aquarelado e também utiliza bastões de cores aquareladas (Fig. 82c). O artista justifica: “Quando quero fazer um desenho para cerâmica, eu já quero imaginar também a cor, então, em geral, eu já quero trabalhar com elementos coloridos”. 6. Esta entrevista foi feita por Maria Regina Rodrigues no ateliê do artista para o estudo de doutorado, 2004. O processo de criação na cerâmica

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Fig. 82a: Francisco Brennand. Desenhos preparatório. Lápis sobre papel, s/d.

Fig. 82b: Francisco Brennand. Desenhos preparatórios. Sanguínea sobre papel, 1981.

Mary Di Iorio é outra artista que se enquadra nessa categoria. Seu desenho foi sofrendo alterações nas anotações. Segundo ela, antes da década de 80, o desenho parecia ser um exercício mental desconectado de um projeto determinado: enquanto a artista pensava, ia fazendo garatujas. No momento em que estava atribulada com suas atividades acadêmicas: aulas, trabalho administrativo, além do trabalho plástico, sentia necessidade de registrar suas ideias, utilizando o desenho para pensar a forma, a textura, a cor (Fig. 83a), e, até mesmo, a estrutura de montagem de suas obras no espaço (Fig. 83b): “Foi aí, então, em termos de sentido de perda de pensamento que eu comecei a desenhar para não perder” (Entrevista realizada em 2002 para o desenvolvimento da Tese de Doutorado). Assim, podemos observar que o desenho se presta para cada artista de forma diferente, ora para pensar a forma, ora para definir Fig. 82c: Francisco Brennand. Pã. Lápis aquarelado sobre papel, 2001.

os passos para a construção da obra, até a cor e sua instalação no espaço. Na verdade, o desenho vai além de um delimitador de formas. Dependendo da necessidade do artista, ele é um meio de comunicação para ele mesmo ou para outros que irão executar suas obras.

Fig. 83b: Mary Di Iorio. Desenho preparatório. Caneta Hidrocor preta s/ papel.

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Fig. 83a: Mary Di Iorio. Desenho preparatório. Caneta Hidrocor colorida.


O resíduo como possibilidade de obra Pode-se dizer que, quando o artista está em seu ateliê trabalhando, sua atenção está voltada para a forma que quer alcançar, esquecendo muitas vezes de olhar à sua volta, ou de perceber os resíduos que geralmente são descartados durante a produção da obra. Mas, aqui, podemos pontuar a possibilidade de o resíduo fazer parte do trabalho plástico do artista. É importante observar que, em geral, o artista só percebe esses resíduos quando está numa situação de observador, como podemos notar no depoimento de Norma Grinberg (1999, p. 37): O resíduo, como uma possibilidade de ação, surgiu num workshop, ao trabalhar com participantes. O tempo reduzido para se dedicar à própria atividade e a necessidade de orientar e estar atenta ao grupo levaram a um olhar e a uma percepção distintas […]. Aí, até o resíduo ganhou uma função. Já não era mais resto, mas a matéria-prima para um trabalho.

A partir daí, a artista passa a observar também os resíduos do seu ateliê, e, com eles, elaborar novos projetos, como podemos observar na Figura 84. O mesmo ocorreu na UFES, em 1999, quando trabalhávamos com os alunos, orientando na técnica do torno. Como os alunos ainda não tinham domínio da técnica, as peças ficavam com as bordas inrregulares. Nesse caso, passamos a interferir na construção da peça, retirando um anel de argila, cortando do topo da peça, com a ponta seca, enquanto o torno rodava, para manter a peça o mais uniforme possível. Durante algum tempo, observamos aqueles anéis secando ao lado dos trabalhos dos alunos. Vimos ali um material expressivo de exce-

Fig. 84: Norma Grinberg. Instáveis, 2004.

lente qualidade plástica. Os anéis foram se multiplicando e, mais tarde, vimos a possibilidade de, com eles, construímos uma obra, passando de resíduos para inúmeras peças de cores e tamanhos variados. Para concluir a obra, montamos um grande varal com centenas de peças penduradas, intitulado Em torno de… (Fig. 85). Nas duas situações, podemos observar que os artistas, em determinado momento, exploram os resíduos encontrados, mas também dialogam com o imprevisível, o acaso. Quando ocorrem, os acasos nos revelam a existência, por assim dizer, de analogias ocultas entre fenômenos. Sua descoberta pode nos surpreender num primeiro instante, mas ela assume

Fig. 85: Regina Rodrigues. Em torno de... Cerâmica e aço inox, 2000.

O processo de criação na cerâmica

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imediatamente a forma de uma nova lógica, de um novo modo de entender as coisas. Assim os acasos iluminam espaços vivenciais que se abrem à nossa mente e, à medida em que os ocupamos, o mundo vai se ampliando para nós (OSTROWER, 1990, p. 7).

É nesse processo que o artista percebe a possibilidade de atuar, quando propõe desenvolver uma obra a partir do material que lhe chama a atenção. O fato de o artista estar como observador do processo do outro, ou melhor, atento para o que pode acontecer ao seu redor, faz com que ele reflita sobre o seu próprio processo, permitindo-lhe, muitas vezes, variar ou tomar outros percursos, temporários ou não, o que o faz, evitar a rotina e a mecanicidade, colocando-o em situação propícia para novas tentativas que originam descobertas inesperadas.

Diálogo com outras linguagens Vamos apresentar aqui alguns artistas que, além da cerâmica, trabalham com outra linguagem plástica. Que maravilha época a nossa, quando os maiores pintores gostam de se tornar ceramistas e oleiros! Ei-los, pois, que põem a cozer as cores. Com o fogo fazem luz. Aprendem química com os olhos; querem que a matéria reaja para o prazer de ver. Adivinham o esmalte quando a matéria ainda está mole, quando está ainda um pouco descorada, fracamente brilhante (BACHELARD, 1986, p. 24).

Há artistas que buscam dialogar com outras linguagens, intercambiando experiências. Nessa situação, podemos citar vários deles, como Antônio Poteiro, Miguel dos Santos, Carlos Farjardo e Júlio Tigre. No caso de Antônio Poteiro, após anos dedicando-se somente à escultura em barro, na décade de 70 ele é incentivado por Siron Franco, em Goiânia, a iniciar-se na pintura – uma linguagem que Poteiro trabalha até hoje paralelamente à cerâmica. É importante observar que, na pintura, Poterio não apresenta o mesmo desembaraço que tem no manejo do barro, mas usa seus conhecimentos da cerâmica para atuar na pintura; por exemplo, às vezes, pinta usando pincéis Fig. 86a: Antônio Poteiro. Cristo e os homens. 66 Unidade 4

Fig. 86b: Antônio Poteiro. Subida da fé.

com as duas mãos, uma atitude que vem


da atividade de tornear; trabalha por camadas, tinta sobre tinta e com ornamentos, o mesmo ocorre na modelagem, utilizando camadas, formando figuras frontais em relevo e ornamentadas (Figs. 86a e 86b). Júlio Tigre, um artista mineiro radicado em Vitória, ES, procura conhecer os materiais para desenvolver seu projeto plástico. Dentre a infinidade de experimentações, podemos citar o trabalho da escrita que, durante algum tempo, foi seu objeto de pesquisa. O gesto era seu principal foco, para isso trabalhou com diferentes materiais como o lápis sobre a parede, a serigrafia sobre o tecido (Fig. 87a), a terra (como pigmento) sobre a madeira. Quando utilizou a cera de lacre (Fig. 87b) para uma grafia de anotações suspensas em páginas a serem vistas de frente e de costas; olhando por trás da forma inversa como foram executadas, elas passaram a ser autônomas; a referência da escrita tornou-se cada vez mais diluída. Com isso, o artista escolheu a cerâmica como um material para encontrar a resistência não apresentada na cera (Fig. 87c). Nesse caso, a cerâmica é mais um meio de expressão plástica para o artista. Na entrevista realizada com o artista, em 2004, para a tese de doutorado da autora deste, Tigre fala de como se relaciona com os materiais: “Não há limites no que diz respeito ao uso de materiais específicos, mas uma proliferação de matérias tantas quantas caiam no ar da graça de estarem ali para se ver e experimentar […]”. Podemos concluir que, em geral, o artista busca suporte técnico com o ceramista para desenvolver suas experiências, podendo, muitas vezes, ser um desafio para aqueles que estão condicionados ao fazer técnico, podendo, nesse momento, abrir seus horizontes.

Fig. 87b: Júlio Tigre. Souvenir. Cera de lacre, 1996.

Fig. 87a: Júlio Tigre. Sem título. Serigrafia sobre o lenço, 1996.

Fig. 87c: Júlio Tigre. Sem título, Cerâmica, 1997.

O processo de criação na cerâmica

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A utilização de outros materiais como estudo de processo Esta é mais uma possibilidade de trabalhar o projeto poético para a construção das obras em cerâmica, sem necessariamente utilizar o desenho ou mesmo a argila como estudo. Ao se pesquisar as possibilidades poéticas dos artistas apresentados, fica claro a importância do desenho no processo ou mesmo uma vivência com a matéria, a ponto de subverter as técnicas. Porém, quando atuamos no ensino como orientador e pesquisador, observamos as dificuldades apresentadas pelos alunos em sala de aula quando se veem diante de uma proposta de projeto poético, pois sabemos que mesmo fazendo várias disciplinas de desenho, nem todos os alunos tem domínio, a ponto de elaborar suas ideias de objetos tridimensionais no plano e, muito menos, o domínio do barro para desenvolver um protótipo. A partir dessas observações, deixamos em aberto a apresentação de seus projetos, e a possibilidade de usarem suas experiências, desde o rascunho, passando por fotos, até a utilização de outros materiais disponíveis no seu cotidiano (papel, plástico, papelão, espuma, etc.). Essa abertura possibilitou um diálogo na sala de aula de forma positiva e menos traumática na apresentação de suas ideias. Apresentaremos, aqui, alguns estudos de alunos do período de 2010/02 da disciplina Cerâmica, do Curso de Artes Visuais presencial da UFES. Dentre uma infinidade de estudos propostos em sala de aula, selecionamos estudos nos quais os alunos escolheram materiais não convencionais para pensar a obra. Nos estudos da aluna Bruna Santos Silva, foram escolhidos espumas de embalagem (Figs. 88a, 88b e 88c); e nos do aluno Eliomar Louzada, papéis de revista, montando o trabalho em papel e, mais tarde, utilizando-o como molde da construção da peça (Figs. 89a, 89b e 89c).

Fig. 88a: Bruna Santos Silva. Estudo com espuma branca.

68 Unidade 4

Fig. 88b: Bruna Santos Silva. Estudo com espuma branca.

Fig. 88c: Bruna Santos Silva. Estudo com espuma preta.


Fig. 89a: Eliomar Louzada Estudo com papel de revista.

Fig. 89b: Eliomar Louzada Estudo com papel de revista.

Fig. 89c: Eliomar Louzada Utilização do molde para a construção da peça.

Nessa unidade, apresentamos aqui cinco métodos de trabalho, os quais chamamos de cinco atitudes ou movimentos da mente criadora. Vale ressaltar, que não são regras e podem ocorrer muitas vezes de forma simultânea, pois, considerando o processo de criação como fenômeno comunicativo e, como tal, possuidor de uma interface cultural, pode-se pensar no contraste da interação do ceramista com o tempo e espaço histórico e socialmente construído. Isso parece ser suficiente para pensarmos que seu processo de criação é constantemente contaminado por ruídos da criação de outros. Também cabe ver que o desenvolvimento de uma pessoa jamais se dá de modo linear. O processo é dinâmico e ocorre em múltiplos níveis, que interagem e se influenciam reciprocamente. Por isso, destacamos algumas atitudes ou movimento da mente criadora ao longo do percurso de elaboração e produção das obras, pois seria praticamente impossível perceber e analisar toda diversidade do fazer originado dessa aproximação com a cerâmica.

O processo de criação na cerâmica

69


70 Unidade 5


Nas unidades anteriores, o barro foi o elemento principal na ação do homem como possibilidade de manipulação da matéria argila e das técnicas básicas de modelagem para a construção de objetos. Para definirmos um objeto como cerâmica é necessário que o fogo atue como agente; é ele que realiza o rito de passagem, como catalisador do esforço aplicado na obra, dando-lhe uma resistência. Não só o elemento fogo, vem cooperar para a constituição de uma matéria que já reuniu os sonhos elementares da terra e da água, mas também, com o fogo, é o tempo que vem individualizar fortemente a matéria [...]. O cozimento é assim um grande devir material, um devir que vai da polidez ao dourado, da massa à crosta. Tem um começo e um fim como um gesto humano (BACHELARD, 1991, p. 69).

É esse domínio do fogo que define a história da cerâmica, permitindo ao homem fazer vasilhas duras e resistentes, sem que se desintegrem na água. Existem várias teorias sobre como essa relação teria se desenvolvido, até que o homem fosse capaz de tornar o barro duro como pedra e não mais sujeito a desfazer-se. Segundo Pillegi (1958), não se pode determinar quando começou a ser empregado o método do fogo para o endurecimento da louça de barro, mas presume-se que isso tenha acontecido acidentalmente. Chavarria (2004, p. 56) fala do aprendizado do homem com o fogo: “O homem, depois de aprender a dominar o fogo, que utilizava para cozer os alimentos e como fonte de calor, terá certamente observado que os recipientes de argila seca que havia modelado endureciam quando se encontravam perto das chamas”. Essa capacidade do fogo de transformar materiais da natureza determinou procedimentos e tecnologias que possibilitaram ao homem certo domínio sobre as forças da natureza. De acordo com Bardi (1989, p. 8): “As artes do fogo, que reduzem às mais variadas coisas, os minerais que as entranhas da terra oferecem (metais, barro, areia e quantos outros ingredientes que, direta ou indiretamente, servem para moldá-los), são as artes primeiras e fundamentais”. Como já foi dito, o papel principal da queima é exercido pelo fogo, mas cabe ao homem dar o equilíbrio a esse procedimento. Dentro da necessidade de manter o fogo sobre a matéria, o homem foi experimentando vários tipos de queima, a princípio, com as fogueiras a céu aberto, um sistema utilizado até hoje por alguns ceramistas populares como as Paneleiras de Goiabeiras (Fig. 90), ES, e, de acordo com a necessidade, o homem procurou meios de concentrá-lo, criando, então, fornos de formas e tipos variados, os quais passaram a ter compartimentos de maiores ou menores dimensões, com capacidade para reter calor em diferentes temperaturas, Fornos e queimas

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dependendo de suas necessidades, chegando até 1300ºC, além de definir o tipo de atmosfera – redutora e/ou oxidante, obtendo-se resultados diferentes para cada escolha. A queima de cerâmica sofreu diferentes alterações ao longo do tempo. Apresentaremos aqui alguns fornos primitivos e atuais, e também os fornos alternativos, experimentais, desenvolvidos por Fig. 90: Foto da Fogueira a céu aberto das Paneleiras de Goiabeiras, ES.

ceramistas de ateliê e suas variadas temperaturas. Uma das particularidades aprendidas com o universo da cerâmica da qual devemos sempre nos lembrar é a espera. A argila tem seu tempo de secagem, a hora certa em que está pronta para ser submetida ao fogo. Esse tempo deve ser respeitado, não importando se o artista tem ou não pressa em finalizar a peça. Outro ponto importante, que já foi abordado na Unidade 2, está relacionado à preparação da massa, devemos cuidar para que seja bem amassada, permitindo, assim, a retirada completa das bolhas de ar, pois durante o processo de queima a argila diminui de tamanho com o calor, o ar se expande com o aumento da temperatura, formando duas forças opostas, argila para dentro e o ar para fora. Caso esses cuidados não sejam observados com cautela, principalmente porque o espaço que o ar ocupava diminuiu, o ar romperá a parede da peça para sair provocando uma rachadura, a quebra de uma parte da peça ou ainda uma explosão, capaz de destruir por completo o objeto modelado, podendo até danificar outros objetos que estejam próximos. Para quem deseja envolver-se com a cerâmica, conhecer o processo de queima é fundamental, pois é através do cozimento que a argila adquire dureza e se torna irreversível. Para isso, é necessário entender como se dá a transformação da argila em cerâmica para que possamos controlar a queima. Durante o processo de queima, a peça é submetida a uma série de transformações físicas e químicas. Vamos aqui apresentar as principais etapas de transformação da matéria, de acordo com cada temperatura. A 1ª etapa da queima é chamada de esquente. Nela a velocidade de aquecimento deve ser lenta, não ultrapassando 100ºC na primeira hora, pois as peças secas à temperatura ambiente ainda contêm certa umidade, que só será eliminada com o aquecimento. Se a temperatura subir rapidamente as peças podem estourar devido a expansão da água em evaporação. De 100ºC a 350ºC ocorrerão reações que eliminarão a água química que faz parte da molécula de argila (2 moléculas de sílica + 1 de alumina e 2 de água). A velocidade de queima não deve ser superior a 100°C/hora, pois as peças ainda correm risco de explodir.

72 Unidade 5


Ao atingir 573°C ocorre uma reação química chamada inversão da sílica, processo irreversível de mudança na estrutura cristalina. Nesse momento, a argila passa a se chamar cerâmica, pois não se dilui mais com a água. A maior parte das peças que saem rachadas do forno muito provavelmente trincaram nessa temperatura, mesmo quando a rachadura só aparece depois de uma segunda queima. A partir dos 600 graus, a velocidade de subida da temperatura pode aumentar para 150ºC/hora, mas deve se levar em conta o carregamento e a estrutura do forno. Também deve se observar as características das peças que estão sendo queimadas. A temperatura final depende do resultado que se pretende alcançar e das particularidades de cada massa. É interessante se fazer um patamar, mantendo a temperatura final de 30 a 50 minutos, para que o calor se distribua uniformemente no interior do forno, atingindo assim todas as peças. É muito importante ter conhecimento prévio da massa que utilizaremos na hora da queima para se evitar imprevistos, pois cada massa tem um ponto de maturação, também chamado de sinterização, momento em que atinge sua maior dureza, e o ponto de fusão, momento em que o corpo cerâmico começa a se fundir, tornandose liquido, podendo danificar o forno e as outras peças. O resfriamento também é uma etapa bastante importante da finalização da queima. Deve-se proceder de forma lenta e natural para que não ocorram danos, pois se a peça for resfriada muito rapidamente e se a massa não foi preparada para este tipo de processo, pode provocar trincas na peça, em decorrência do choque térmico. No final do cozimento, constata-se uma diminuição da peça, um encolhimento de mais ou menos 10% em seu volume. Podem-se realizar várias queimas numa única peça, isso vai depender do objetivo que se queira alcançar. A primeira, quando a argila se transforma em cerâmica, é chamada de biscoito, podendo atingir uma temperatura de 800 a 980ºC, deixando a peça porosa para receber uma camada de esmalte e retornar novamente ao forno para sua vitrificação. Em cada tipo de forno, principalmente os fornos elétricos, encontramos um medidor de temperatura denominado pirômetro, por meio do qual se pode observar e ao mesmo tempo controlar cada etapa da queima apresentada acima. Esse controlador trata-se de um instrumento para medir a temperatura no interior do forno, para que o ceramista possa observar cada mudança ocorrida no mesmo. Atualmente, são usuais os pirômetros eletrônicos com sistema de leitura digital. Além do pirômetro, o ceramista pode contar com outra ferramenta, o cone pirométrico (Fig. 91).

Fig. 91: Pirômetro eletrônico.7

7. Também denominado processador de temperatura com programa digital para controlar o tempo de aquecimento e o grau de temperatura. Pode também manter fixo determinado valor térmico (patamar).

Fornos e queimas

73


Cones Seger

A utilização de cones pirométricos permite conhe-

Cones Orton

Temperatura ºC

Temperatura ºC

Temperatura ºF

022

600

600

1112

021

650

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1137

020

670

635

1175

019

690

683

1261

dúvidas do ceramista quanto à exatidão da tempera-

cer com exatidão não apenas a temperatura do forno, como também a relação temperatura-tempo. Tratase de um medidor descartável que serve para tirar as

018

710

717

1323

tura, ou para forno que não possuem medidor; nesse

017

730

747

1377

caso, ele deve ser colocado no interior do mesmo, de

016

750

792

1458

015a

790

804

1479

modo que se possa ver através da vigia (orifício) e

014a

815

838

1540

013a

835

852

1566

Os cones pirométricos têm uma forma triangu-

012a

855

884

1623

lar (piramidal) e apresenta a numeração sobre uma

011a

880

894

1641

de suas faces, seguindo uma tabela, de acordo com

010a

900

894

1641

09a

920

923

1693

o fabricante: Cones Seger (Europa) ou Cones Orton

08a

940

955

1751

07a

960

984

1803

cones, com indicações do número de referência e equi-

06a

980

999

1830

valências de temperaturas em graus centígrados (Fig.

05a

1000

1046

1915

92). É importante lembrar que os ceramistas popula-

04a

1020

1060

1940

03a

1040

1101

2014

res não usam esses instrumentos para medir a tem-

02a

1060

1120

2048

01a

1080

1137

2079

1a

1100

1154

2109

Os cones são fabricados

2a

1120

1162

2124

com materiais cerâmicos, cal-

3a

1140

1168

2134

4a

1160

1186

2167

culados para se dobrarem a

5a

1180

1196

2185

6a

1200

1222

2232

tura/tempo. Enquanto a ex-

7

1230

1240

2264

tremidade superior do cone

8

1250

1263

2305

não tocar a base não se atin-

9

1280

1280

2336

10

1300

1305

2381

gi a temperatura, se tocar na

11

1320

1315

2399

12

1350

1326

2419

peratura desejada e se o cone

13

1380

1346

2455

passou da curvatura é por-

14

1410

1366

2491

que ultrapassou a tempera-

15

1435

1431

2608

observar quando se curva.

(América). Apresentaremos aqui as duas tabelas de

peratura; em geral, observam o tempo de queima e coloração da chama.

uma determinada tempera-

base, é porque atingiu a tem-

Fig. 93: Cones pirométricos9.

tura indicada8.

Fig. 92: Tabela de cones Seger e Orton.

8. Os cones pirométricos são feitos de uma mistura de materiais cerâmicos, dobrando-se ao alcançar uma temperatura determinada. 9. É conveniente usar três cones de números correlativos.

74 Unidade 5


Tipos de queimas Apresentaremos aqui de maneira sucinta alguns tipos de queima, mas é importante lembrar as pessoas que se interessam em construir o seu próprio forno, a importância da pesquisa. É fundamental, pois, hoje, encontramos vasta referência sobre o assunto, possibilitando aos interessados aprofundar-se, para que possam construir um forno com qualidade e segurança, além de compreenderem como o fogo atuará no interior do mesmo para, assim, controlar sua ação. De acordo com as palavras de Nakano (1989, p. 107): “A Terra é bastante sensível ao Fogo e ao Ar. O primeiro encontro da Terra com o Fogo dentro do forno requer cuidados especiais. A ação violenta do Fogo faz a peça explodir.” Fogueira: esse sistema de queima é um dos mais antigos e é feito a céu aberto, geralmente durante o dia. O combustível utilizado é a lenha e a duração da queima é curta. As Paneleiras de Goiabeiras organizam suas peças sempre com a abertura voltada para baixo sobre uma cama de madeira e as cobrem com pedaços de lenha de várias espessuras. O fogo é colocado aos poucos, pois o controle do processo se detém na coloração que o objeto adquire diretamente em contato com o fogo, indicando o momento de ser retirado (Fig. 94).

Fig. 94: Paneleiras de Goiabeiras, ES, 2005. Fogueira a céu aberto.

Para esta queima, faz-se necessário a utilização de uma massa produzida especificamente para queima rápida, evitando-se, assim, possíveis rachaduras. Nesse caso, o ideal é empregarmos uma massa que contenha uma mistura de minerais (areia, quartzo ou chamote (cerâmica triturada ou argila calcinada). Uma das argilas que as Paneleiras de Goiabeiras retiram do Bairro Joana D’ Arc já contém quartzo, mineral que substitui o chamote, misturada a outras duas argilas, formam uma massa ideal para a queima na fogueira (Fig. 95).

Fig. 95: Massa argilosa utilizada pelas Paneleiras.

Forno de barranco: são fornos feitos nas encostas de terra elevada; no centro possuem uma cova para a colocação das peças, num dos lados, sofrem um corte, verticalmente formando um barranco, onde é realizado um buraco na parte inferior para alimentar o fogo que vai ao encontro da cova, onde se introduzirão as peças. Este tipo de queima é mais eficaz que a da fogueira, pois as paredes da cova Fornos e queimas

75


conservam melhor o calor, alcançando temperaturas mais elevadas. Não há um controle total da queima, pelo fato de se tratar de uma construção ao ar livre. No Brasil, podemos encontrar algumas mulheres que procuram manter a tradição de fazer utilitários, usando o processo tradicional dos seus antepassados, o forno de barranco, a exemplo das artesãs de Apiaí interior de São Paulo, e das mulheres do Vale Jequitinhonha, MG. Essas tradições sofreram pequenas alterações, como Fig. 96: Forno de barranco. Vale do Jequitinhonha.

a fornalha, que passa a receber tijolos para manter sua estrutura, como é o caso de alguns fornos do Vale do Jequitinhonha (Fig. 96). Forno circulares feitos de barro: apesar do sistema de queima em barranco ter durado por muito tempo, os oleiros observaram que a temperatura atingida não era suficiente para dar uma boa resistência à peça, e, aos poucos, foram aperfeiçoando o sistema. Iniciaram a construção com uma parede de barro e abertura na parte inferior – a fornalha, na qual se pode alimentar o fogo. São fornos de construção simples e de tamanho médio, com uma grande abertura na parte superior para a deposição das peças, que são cobertas com cacos de cerâmica para impedir a fuga do calor do interior

Fig. 97a: Forno da artesã Deuzani, 2010.

do forno. Diferentemente do anterior, este forno pode ser construído em lugares com cobertura. Hoje é muito comum encontramos este tipo de forno nos quintais das mulheres do Vale do Jequitinhonha – MG (Fig. 97a) ou nos espaços de produção dos artesões do Alto do Moura – PE (Fig. 97b). Forno a lenha: mais tarde, construíram os fornos de tijolos, mantendo a fornalha para o combustível: um forno alto com um teto permanente, no qual se fixou uma chaminé para a saída de gases quentes, criando-se, dessa forma, espaço para a circulação do ar, que entra pela fornalha e empurra o fogo para cima, por entre as peças. Assim, mesmo utilizando a lenha como combustível, pode-se

Fig. 97b: Forno de ceramistas do Alto do Moura, Caruaru, PE.

conseguir um aumento significativo da temperatura com uma maior retenção de calor no interior do forno. Hoje, esses fornos para queima de baixa temperatura (até 1000ºC), são denominados de Forno Garrafão. Uma construção de tijolos maciço, no qual o controle de temperatura é feito pelo tempo de queima e a alimentação constante do fogo. O combustível pode variar, podendo ser lenha, serragem ou aproveitamentos de tábuas de materiais de construção. O artista mineiro Hélio

76 Unidade 5


Siqueira, quando escolheu a modelagem para se expressar, optou por este modelo de forno (Figs. 98a e 98b).

Fig. 98a: Hélio Siqueira. Forno de garrafão.

Fig. 98b: detalhe

Dentre vários tipos de fornos construídos em diversos lugares, tanto no Extremo Oriente como na Europa, podemos destacar aqui os fornos japoneses chamados Noborigama. São fornos com câmaras independentes, mas interligadas, de modo que o calor da primeira passa para a segunda e assim sucessivamente, até o fim da queima (CHAVARRIA, 2004, p. 60). Esses fornos eram construídos com um mínimo de três a um máximo de vinte câmaras (Figs. 99a e 99b). A construção dos fornos foi sendo aperfeiçoada até alcançar temperaturas de 1300ºC, possibilitando a queima das peças, dos esmaltes e das porcelanas. Hoje encontramos no Brasil alguns ateliês que resolveram adotar este tipo de forno para a produção de

Fig. 99a: Forno noborigama

cerâmica, como um grupo de ceramistas em Cunha, SP. Com o surgimento da energia elétrica e consequentemente da industrialização, a cerâmica ganha novos fornos. Os elétricos e os a gás são compactos, de fácil transporte e aquisição de combustível, além de facilitarem a manutenção do calor. A indústria beneficiouse dessa evolução tecnológica, construindo grandes fornos contínuos, possibilitando fazer a queima de biscoito e de esmalte de uma única vez, chamada de monoqueima, economizando combustível e, consequentemente, diminuindo o tempo de construção, fazendo com que se possa adquirir produtos cerâmicos a baixo custo, beneficiando um maior número de consumidor. Fornos elétricos: a construção do forno passa a ser feita de estrutura metálica, revestida no interior por tijolos refratários com uma porta frontal, além de um equipamento de aquecimento, com-

Fig. 99b: Imagem do esboço de um forno noborigama.

posto por seções de resistências elétricas independentes, porém, Fornos e queimas

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interligadas, gerando calor por radiação, que se transmite em todo o interior do forno e, subsequentemente, às peças, por condução e radiação. Possui um pirômetro eletrônico com sistema de regulação automática com temperatura. Hoje, além dos fornos retangulares (Fig. 100), encontramos fornos circulares com portas superiores (Fig. 101). Neles, os tijolos refratários ganharam leveza, facilitando o transporte. Possui um processador de temperatura com gramatura digital para controlar o tempo de aquecimento e o grau de temperatura. Podemos dizer que é um forno de fácil aquisição no mercado, nesse caso, deve-se escolher a temperatura de queima e o tamanho do forno, adequando-os ao trabalho e ao espaço disponível. Fig. 100: Forno elétrico retangular.

Ao adquirirmos um forno desse tipo, devemos verificar primeiro se a energia elétrica de que dispomos é suficiente. Segundo Chavarria (2004, p. 66): “Actualmente, muitos destes fornos funcionam com a energia doméstica, mas em todo caso, quando se deseja ultrapassar certos limites, deverá fazer-se uma instalação extra, geralmente trifásica, o que pode encarecer muito o processo”. Fornos a gás: é um forno que tem como combustível o gás butano que pode ser canalizado ou engarrafado. Muitos ceramistas escolhem esse tipo de forno pelo menor custo desse combustível, bem como pela facilidade de sua instalação, manutenção e resultados obtidos. O inconveniente desse forno reside na obrigação constante de observação durante a queima, para torná-la segura, principalmente quando se trabalha com botijas de gás, essas devem estar no exterior, separadas do forno e protegidas por paredes. Esses fornos podem ser construídos com estruturas metálicas, que envolvem tijolos refratários ou revestimento de fibra isolante,

Fig. 101: Forno elétrico redondo.

materiais que seguram o calor no interior do forno, proporcionando um menor consumo de combustível e uma maior eficiência na queima. Esse forno é de fácil construção, desde que se disponha dos elementos necessários como a distribuição dos bicos de gás que deverão estar instalados nas laterais logo acima da base do forno, tomando-se o devido cuidado com a sua colocação para que a chama não toque diretamente nas peças. Além da escolha dos bicos de gás, é importante que tenha uma válvula para regular a entrada de gás no forno.

78 Unidade 5


Através desse sistema, podemos produzir atmosferas oxidantes ou redutoras com um simples ajuste na entrada de ar e de gás, sem que haja necessariamente alterações na estrutura do forno. Muitos ceramistas constroem esses tipos de fornos, utilizando vasilhames de latão descartáveis, revestidoos com manta refrataria para fazer a queima de raku (queima redutora) (Fig. 102). Fig. 102: Forno de raku.

Fornos alternativos A seguir, apresentaremos dois diferentes fornos alternativos, que podem substituir os fornos convencionais, porém, em alguns casos, eles servirão para uma única queima, como, o primeiro, por exemplo, o forno de papel, que já foi testado por vários ceramistas e aqui apresentaremos em imagens o resultado de uma queima realizada na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), em novembro de 2006; o segundo forno, construído a partir de um cupinzeiro sob a coordenação da ceramista Zandra Coelho, durante o Congresso de Cerâmica (CONTAF) na Universidade Federal em São João Del Rey, no período de 20 a 22 de Outubro de 2010. Ao escolhermos um forno para construir, deveremos dar total atenção às etapas de construção, além de separar previamente os materiais necessários para sua montagem. Forno de Papel

Antes de construir este forno é preciso escolher um lugar adequado, como um sítio ou um grande pátio de escola, e a queima deve ocorrer fora do horário das atividades escolares, pois haverá muita fumaça, podendo intoxicar as pessoas. O forno de papel proporciona uma queima a lenha, no qual se usa papel com barro para construir suas paredes e será aproveitado uma única vez, pois, no final, o fogo consome o próprio forno, mas isto não é motivo de desânimo, pois poderemos alcançar bons resultados. Sugerimos que o trabalho de construção seja feito em equipe, pois é uma tarefa árdua. Para a queima nesse tipo de forno o ideal é usar uma massa resistente, como a argila das paneleiras ou acrescentar de 20 a 30% de areia ou chamote, para evitar que as peças sofram rachaduras. Essa queima pode ser usada também apenas para dar efeito às peças já queimadas, tendo como objetivo fazer com que as peças ganhem novas colorações, utilizando materiais como sais ou sulfatos. Nesse caso, não precisa se preocupar com o tipo de massa, pois a peça já sofreu uma queima, não tendo risco de danificação. Fornos e queimas

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Materiais: 50 tijolos maciços ou refratários; 2 pacotes de carvão vegetal; Gravetos; Lenha ou madeira de material de construção; Tela de passarinho (aproximadamente 3 metros); 1 rolo de barbante; 2 sacos de argila seca (pode ser de material de construção que em geral é branca); 1 saco de caulim (opcional); Folhas de jornais ou catálogos telefônicos (as folha de catálogo são mais resistentes do que o jornal); 1 bacia grande para preparar a massa; 1 lata (tipo achocolatado ou leite em pó); Sugestão: Trabalho em equipe. Enquanto um grupo organiza a estrutura do forno, o outro pode preparar a barbotina e os papéis. Escolha do local: a área deve ser ampla e descoberta, para a montagem do forno, de preferência terreno plano ou pavimentado, não muito úmido, longe de árvores, vegetação seca e construções. Barbotina: Misturar o barro em pó (material de construção) com água, preparando uma massa numa densidade de iogurte. Pode incluir nesta mistura 1/3 de caulim, pois ele contribui para manter a temperatura de queima. Estrutura do forno: o primeiro passo é a montagem da base quadrangular de tijolos deitados, que vai funcionar como suporte do forno, esta base vai depender do tamanho do forno que se vai construir e consequentemente da quantidade de peças que se tem para queimar (Fig. 103). Sobre esta base, devemos montar uma segunda, porém, com os tijolos de lado, formando quatro canais interligados, como mostra a foto (Fig. 104). Se o forno for maior, devemos aumentar o número de tijolos para a construção dos canais. Com a base montada, devemos colocar carvão nos espaços vazios, formando um círculo. Em seguida, distribuir pequenos gravetos sobre o carvão, para facilitar a manutenção do fogo até o aquecimento do carvão e, depois, da lenha. Após este procedimento, vamos construir a terceira base (Fig. 105), utilizando tijolos deitados ou cacos de telha como suporte para colocar as peças (Fig. 106), nas quais as mesmas serão organizadas, partindo do centro para as laterais: primeiro 80 Unidade 5


as maiores e mais resistentes que servirão como suporte para as menores. Podemos colocar as peças pequenas dentro das maiores, com bastante atenção na arrumação para que durante o processo de retração – encolhimento – das mesmas, elas não se quebrem ou colem (Fig. 107).

Fig. 103: Base 1.

Fig. 104: Base 2.

Fig. 105: Base 3.

Fig. 106: Base completa.

Fig. 107: Arrumação das peças na base.

Para uma queima com efeitos, poderemos jogar sal de cozinha ou sulfatos (cobre, níquel, ferro) sobre as peças, ou pincelar o sulfato dissolvido em água morna para obter uma coloração mais uniforme. Depois da arrumação das peças, o próximo passo é colocarmos os gravetos e pequenas madeiras em todos os espaços disponíveis ao redor e entre as peças, construindo uma espécie de tenda em volta desta base com madeira de diversos tamanhos e espessuras, em forma de cone (Fig. 108). Sempre no sentido de dentro para fora, das menores para as maiores; quanto mais madeira se colocar mais tempo se levará para a queima, já que, assim, a temperatura se eleva. Em seguida, amarre bem as madeiras com barbante para a estrutura ficar firme. Enrole uma tela de metal (tela de viveiro de pássaros), com firmeza, por toda extensão e comprimento das madeiras, para Fornos e queimas

81


dar estrutura à parede (Fig. 109). Em seguida, corte a parte que sobrou da tela e una as pontas com arame. Encaixe a lata sem fundo no topo do cone, para servir como chaminé do forno durante a queima. Parede do forno: nesse momento, todos devem trabalhar juntos como num mutirão, pois é um Fig. 108: Colocação de madeira em forma de cone.

Fig. 109: Colocação da tela.

processo cansativo e demorado; quanto mais camadas forem colocadas melhor, pois elas servem para segurar o calor no interior do forno. Mergulhem uma das faces das folhas de papel na barbotina (podem ser folhas de jornal, revista ou de catálogo telefônico) (Fig. 110), e, em seguida, coloquem a folha úmida sobre a tela, revestindo-a, alternando a posição do papel a cada etapa – ora vertical, ora horizontal – para se ter uma noção do número

Fig. 110: Barbotina para banho.

Fig. 111: Arrumação da parede.

de camadas, aproximadamente dez (Fig. 111). Em seguida, finalizem a construção do forno, cobrindo-o uniformemente com a massa. Queima: após a construção da parede do forno, atear fogo com cautela e vagarosamente, em uma abertura de cada vez. Acender primeiro a boca que está na direção do vento, soprando o fogo para o interior do forno e, em seguida, para as outras aberturas (Fig. 112). A partir desse momento, se houver crianças por perto, as mesmas devem acompanhar o processo a distância, sendo supervisionadas por um adulto.

Fig. 112: Ateando fogo.

Fig. 113: Fase final: autodestruição do forno.

A queima vai se desenrolar até que toda a madeira tenha se tornado cinzas e consequen-

temente o forno se autodestruirá. A duração da queima vai depender da quantidade de madeira empregada e do tamanho do forno (Fig. 113). É importante acompanhar todo o processo, evitando que o fogo se apague antes do término da queima. Devemos aguardar o resfriamento total para a retirada das peças do meio das cinzas. Aconselhamos aguardar até o dia seguinte, para se evitarem queimaduras. As peças devem ser lavadas para se realizar a análise dos resultados. 82 Unidade 5


Forno de cupinzeiro

Este forno é muito interessante, pois aproveita a casa do cupim, que eles constroem com as fezes deles, com terra e saliva, como estrutura externa do forno. Sua limitação está no fato de só encontramos cupinzeiros no campo, podendo ser uma limitação para aqueles que vivem na cidade e não têm acesso a esse material. O primeiro passo é encontrar um cupinzeiro de tamanho grande. (O tamanho da câmara interna vai depender do tamanho total do cupinzeiro). Durante a manipulação do cupinzeiro, deve-se ter cuidado, pois Cobras costumam construir seus ninhos no interior dessa estrutura. Se a queima for onde o cupinzeiro foi localizado, limpe a área ao redor, de forma a ter espaço suficiente para trabalhar. Se for realizar em outro local, cave ao redor do cupinzeiro até encontrar o limite de profundidade. Em seguida, faça uma alavanca e o retire inteiro, transportando-o para o local onde será realizada a queima. Materiais: 1 grelha de metal tipo de churrasqueira; 1 placa refratária; 1 serrote; Objetos pontiagudos como chave de fenda, faca, colher; 3 pacotes de carvão, Lenha; 1 balde para transportar o miolo retirado do cupinzeiro; 4 tijolos;

Fig. 114: Materiais.

Montagem do forno: Corte um terço superior do cupinzeiro com a ajuda de um serrote, como uma tampa, o suficiente para você colocar as peças dentro da câmara (Fig. 115). Retire a parte cortada e reserve, tomando cuidado para não deixá-la cair e quebrar-se, pois essa será a tampa do seu forno. O próximo passo é limpar o interior do cupinzeiro com a ajuda de um balde e de algumas ferramentas (Fig. 116). Comece a escavar a parte interna do cupinzeiro, até soltar a parte escura que fica presa junto das paredes do mesmo (Fig. 117). Faça esta operação cuidadosamente, para não danificar a parte dura, feita com as fezes, a saliva do cupim e a terra (Fig. 118). A parte interna é mais macia, onde o cupim habita. Com um facão ou faca grande acerte as arestas. Na parte inferior do cupinzeiro, abra uma cavidade para, por esta abertura, inserir o carvão, criando, assim, uma fornalha. Coloque uma grelha no fundo e apoie em seus lados quatro calços de tijolos refratários para sustentar a placa refratária, que será o suporte para arrumar as peças para a queima. É importante ter uma Fornos e queimas

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altura de aproximadamente 20cm, para que haja um distanciamento entre as peças e o combustível, possibilitando que se tenha oxigênio suficiente durante a queima, mantendo a circulação de ar dentro da câmara. A chaminé será feita na lateral superior e deverá ser proporcional ao tamanho do cupinzeiro (Figs. 119, 120 e 121).

Fig. 116: Escavando a parte interna do cupinzeiro.

Fig. 115: Cortando a tampa.

Fig. 117: Detalhe do miolo que foi retirado do interior do cupinzeiro.

Fig. 118: Com um facão ou faca grande acerte as arestas.

Fig. 119: Forno de cupinzeiro.

Fig. 120: Detalhe da fornalha.

Fig. 121: Chaminé.

84 Unidade 5


As peças podem ser colocadas apoiadas umas sobre as outras, aproveitando ao máximo o espaço interno do forno. Para a queima, coloque carvão e a lenha sobre a grelha e as acenda lentamente, fazendo um aquecimento no forno. Aos poucos, vá aumentando a intensidade do fogo. Esta é uma queima de baixa temperatura, caso queira uma temperatura acima dos 1000ºC, deve-se alimentar o fogo por mais tempo para que a temperatura suba a essa escala. Depois que a temperatura desejada for alcançada, pare de alimentar o fogo com lenha e espere o forno esfriar.

Fornos e queimas

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86 Unidade 6


Neste capitulo, apresentaremos uma experiência, que envolve cerâmica indígena, arte popular, processos criativos e a comunidade de Jardim Carapina na Serra, desenvolvidos no período de 2009/2010 com os professores Júlio Tigre, orientando o desenho, e Regina Rodrigues, a cerâmica. Utilizando o espaço da Associação de moradores de Jardim Carapina como local de discussão e produção plástica, em encontro semanal com dois grupos distintos, um no período da tarde e o outro no da noite. As pessoas que se mostraram interessados pelo curso, eram, geralmente, aposentadas, jovens desempregados ou pessoas que queriam ter uma segunda fonte de renda. Por se tratar de um curso longo, algumas pessoas desistiram, pois esperavam por atividades a curto prazo com retorno rápido. Apesar dessas dificuldades, a proposta acabou por consolidar um grupo de 15 membros, que através da arte popular, integraram-se a um projeto comum na busca por uma realização não somente financeira mas também de crescimento cultural. Quando nos referimos à arte popular no Brasil, consideramos, entre outras coisas, os núcleos de criação, gerados a partir de células produtoras, que, com sua produção, acabam estimulando a adesão e a formação de outros produtores de regiões já exaustivamente mapeadas em nosso país. Dentro deste amplo território, é inegavelmente extensa a produção de cerâmicas populares, e, em alguns casos, tornaram-se inclusive peças únicas, alcançando um valor substancial no mercado. Em cada núcleo de cerâmica popular do Brasil, ressaltamos a marcante identidade alcançada dentro de uma história local, mais tarde transformada numa tradição regional, que identifica cada um desses núcleos. As características que efetivam esta afirmação estão na matéria-prima, na técnica empregada pelos grupos e na forma ligada a uma vivência particular, nas quais a incidência de determinados padrões estéticos foram se consolidando, às vezes dentro de um autodidatismo gerado por uma prática funcional, como, por exemplo, a produção de utensílios para uso doméstico. Dentre inúmeras localizações como produtores de cerâmicas populares brasileiras podemos destacar o Vale do Jequitinhonha. Os pequenos lugares como Araçuaí, Santana do Araçuaí e Itinga tornaram-se conhecidas nacional e internacionalmente pela produção de artesanato local. As bonecas produzidas pela artesã Dona Isabel Mendes da Cunha já ganharam notoriedade pelo mundo, em exposições e aquisições por parte de museus e galerias.

Relato de experiência

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Cerâmica indígena A cerâmica indígena foi tema do projeto desenvolvido na comunidade Jardim Carapina, pelo inusitado encontro de um sítio arqueológico pelo IPHAN, próximo à comunidade, e também pela adoção de uma estratégia: buscar em torno do lugar de implantação um motivo gerador para iniciá-lo. A descoberta dos Sambaquis no manguezal próximo à região de Carapina nos permitiu entrar em contato com a história de uma ocupação anterior à atual, por grupos indígenas que estiveram por todo o litoral do Estado. Geralmente, o material cerâmico encontrado nas prospecções são de raízes indígenas, pertencentes a três linhagens, a saber: Una, Aratu e Tupi-guarani. A tradição Una teve sua dispersão localizada na Região Sudeste nos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo e os vestígios cerâmicos encontrados apresentam características alisadas e acordeladas com queima geralmente incompleta. Somente em alguns poucos encontram-se indícios de engobe branco. Contemporânea a tradição Tupiguarani, a Aratu apresenta em sua produção cerâmica uma variedade de qualidades plásticas, com corrugados e roletados, em algumas encontram-se incidência da cor preta grafite, provavelmente realizada com o uso de carvão da combustão de madeiras. A tradição Tupi-guarani encontra-se do sul ao norte do litoral brasileiro, sua cerâmica apresenta variadas técnicas decorativas: corrugada, angulada, escovada, entalhada ponteada serrungulada, incisa, acanalada, estampada, digitada, digitungulada, marcada com corda, estampada com rede, marcada com tecido, nodulada, pinçada e roletada10. Apresenta também pintura com diferentes motivos: em linhas finas, faixas largas em vermelho e/ou castanho sob branco ou creme, desenho com padrões geométricos, linhas paralelas, zigue-zagues, quadriculados, círculos, retângulos, cruzes concêntricas, gregas, linhas brancas ou pretas sob fundo vermelho11. Essas observações, a partir do material coletado, nos permitiu encontrar uma série de técnicas, as quais desenvolvemos com o grupo, à medida que o curso avançava. Ao produzir as imagens a partir do material coletado pelo IPHAN no Estado, pretendíamos obter um registro desta diversidade de procedimentos realizados por esses povos, com o intuito de traçarmos um caminho dentro da prática com a cerâmica que produziríamos no futuro. Compreendendo as limitações com as quais nos depararíamos no inicio desse processo, optamos por usar este material muito mais como motivação e até inspiração, buscando uma adequação aos meios tantos técnicos quanto teóricos possíveis com o grupo. 10. Termos utilizados por arqueólogos. 11. OLIVEIRA, A. Oliveira. Os grupos pré-historicos ceramistas no Nordeste, p. 204. In Índios do Nordeste. Temas e problemas – III/ Org. Luiz Sávio de Almeida. Marcos Galindo – Maceió: EDUFAL, 2002- 274p. ISBN 85-7177.092-1. 88 Unidade 6


Da metodologia Buscar uma metodologia adequada para uma aproximação com esses diversos conhecimentos diante das carências do grupo apresentado acima foi nosso desafio. O método foi se construindo, à medida que avançávamos na complexidade da obtenção da forma. De antemão, já observamos a grande incidência de práticas tridimensionais nas artes populares. Quando falamos dessas práticas tridimensionais temos que incluir aí toda atuação do sujeito no espaço, desde seu nascimento. Estamos nos referindo à relação que vamos estabelecendo com o mundo na sobrevivência, adaptando-nos ou adaptando o entorno para habitá-lo. Somos tridimensionais em essência, com isto, somos mais aptos a lidar com ela do que com outros meios, como o desenho por exemplo. Essas práticas estão intrinsecamente ligadas ao cotidiano das pessoas, em sua maioria leigas, isto é, não frequentaram cursos ou escolas e, algumas, nem mesmo travaram contato com objetos artísticos. Seus processos criativos surgiram numa relação direta com essas experiências no dia a dia, numa necessidade de se expressar. São práticas ligadas à vida diária: o uso das duas mãos para a construção da forma já trás a simetria tão cara à produção de determinadas peças. Encontramos esse gesto, de certa forma, no inconsciente do futuro praticante de modelagem. Com isto, entendemos que uma prática, partindo da experiência tridimensional para o desenho, e depois retornando às três dimensões numa relação projetiva, viabilizaria uma abordagem mais acessível do desenho como um meio de pensar a forma e, depois, também como meio para produção de imagens.

A arqueologia como forma de recordar nosso passado. Inicialmente, foi apresentado aos participantes do projeto, parte dos fragmentos fotografados no IPHAN, reforçando a importância de termos no nosso estado um arquivo que resgate nossa história local sempre como conhecimento cultural, já que a maioria das pessoas da comunidade na qual o projeto era desenvolvido vieram de outros lugares do país, sem um referencial ligado aos aspectos históricos singulares ao local. Em contrapartida, a ocupação da área foi lenta e gradual, perfazendo uma história a ser resgatada pelo grupo, na relação com o lugar. O resgate de uma cultura como a indígena, acabou demonstrando a forma como eles agregavam nas suas manufaturas as coisas do lugar, animais, vegetais, paisagem e crenças. Este aspecto acabou por revelar um caminho rico de possibilidades para o grupo, que foi sendo desvelado à medida que cada um dos membros iam trazendo para os encontros aspectos que identificavam o bairro. Relato de experiência

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A arqueologia demonstrou a importância da cerâmica para o resgate da memória dos povos indígenas e a maneira de como viviam, adaptando-se às dificuldades, demonstrando que encontrar os gestos que identificassem cada grupo estudado convergia numa tradição especifica que vai identificá-los. Essa lição permitiu-nos abordar o tema cultural, excluindo modelos estereotipados, fórmulas externas às experiências do grupo, em geral, modelos vindos de fora, mas, a busca de uma nova forma, de um modelo, só vai sendo adquirido com o tempo e com a prática, tornando-se uma marca de identidade de um novo grupo de ceramistas. Formas e grafismos

Apresentaremos, a seguir, fotografias de fragmentos cerâmicos coletado no local próximo à comunidade, além de outros sítios arqueológicos do estado do Espírito Santo, arquivados e catalogados pelo IPHAM, que focam as diferentes técnicas, tanto de modelagem quando de desenho utilizados nas superfícies dos fragmentos. É importante dizer que as terminologias apresentadas aqui são, em geral, usadas pelos arqueólogos (Figs. 122, 123, 124, 125 e 126). Pintura:

Fig. 122: Pequeno fragmento proto-tupi com linhas pretas sobre fundo branco, executados com engobe.

Fig. 123: Motivos com linhas curvas.

Fig. 125: Grafismos elaborados no interior da peça.

90 Unidade 6

Fig. 124: Detalhe de tratamento dado a bordo da peça.

Fig. 126: Detalhe no interior da peça.


A técnica do engobe empregada nessas amostras foi uma das escolhidas para ser explorada na prática pelo grupo, levando-se em conta a rica variedade de cores argilosas, encontradas no litoral do Espírito Santo. Texturas e relevos:

Fig. 127: Textura obtida com o uso de uma corda de fibra vegetal, pressionada sobre a peça ainda úmida.

Fig. 128: Fragmentos com acabamento na parte superior da peça, realizado, provavelmente, com o uso de uma haste de bambu ou madeira.

Pequeno exemplo de decoração com o ponteado:

Fig. 129: Outra forma de textura, tirando partido de uma superfície rugosa.

Fig. 130: Amostras de motivos geométricos em baixo-relevo.

Uma grande variedade de procedimentos foi observado; em separado ou conjugado, criando uma rica gama de possibilidades. Isto ficou claro nas observações que em nenhum momento objetivou realizar cópias das peças numa mera reprodução técnica de imitação ou mesmo produzir algo parecido ao artesanato indígena existente. A todo instante, buscávamos refletir sobre a natureza das peças, e o que representavam no âmbito da experiência individual de um povo, isto é, deixando transparecer que aquelas formas e superfícies eram o fruto de uma experiência especifica Relato de experiência

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de um sujeito com o seu entorno. Deveríamos, de igual maneira, buscar em nossas experiências domésticas e cotidianas os motivos e o gestos que norteariam a motivação para a produção, dentro daquelas técnicas que foram pacientemente reveladas, à medida que a oficina avançava.

Novos processos Paralelo às técnicas de modelagem, nossa estratégica foi relacionar o desenho ao gesto tridimensional, para, então, criar formas a partir dos recortes. Essa prática já apresentava a simetria proporcionada pela dobra, o que facilitou a compreensão da forma na maneira mais simples de obtê-la (Figs. 131a e 131b). Demonstrar que o desenho é fruto de uma analogia com a experiência triFig. 131a: Projeto utilizando dobradura e linhas em forma de textura.

dimensional foi nosso desafio. As dificuldades diante da folha branca do papel, para alguém que há muito já não desenhava, foram vencidas a partir da quebra do impasse inicial, por meio de um exercício em que a folha (plano) é dobrada e cortada para se obter a forma. Numa segunda etapa, essa forma obtida é repassada a uma outra folha por frotagem12 e, finalmente, contornada, obtendo-se, assim, o desenho na sua forma mais convencional. Esse procedimento tangencia a tridimensão e a bidimensão ao mesmo tempo, proporcionando ao aluno pensar a peça no espaço virtual do seu projeto, ampliando sua capacidade de projetar, o que culmina na criação de novas formas. O primeiro tema a ser explorado pelo grupo, usando a técnica do pote aperto

Fig. 131b: Detalhe.

surgiu de um olhar do entorno, assim, como fora explanado sobre a cerâmica indígena: buscar o motivo próximo numa referência direta ao modo de vida local. Surgiram os galos e as galinhas, animais criados para subsistência da família nos quintais existentes na região. Para o exercício do desenho, usamos como referência, imagens de fotografia encontradas em revistas; materiais que serviram para orientá-los na organização esquemática da forma estudada, como o círculo e a elipse (Fig. 132). A forma oval deu origem ao corpo da ave, praticada exaustivamente no dese-

Fig. 132: Imagem como referência.

nho e na modelagem, empregando a técnica do rolinho. Desde o início, foi dada uma atenção especial ao grafismo como forma de se produzir contraste nas superfícies e de se criar volume. Essa lição surgiu dos fragmentos de cerâmica indígena. As linhas proporcionaram o entendimento da forma como uma alusão à topologia de cada objeto modelado (Figs. 133a, 133b e 133c). 12. A palavra “Frotagem” (de frotter, que significa “esfregar”) é de origem francesa e por ser um recurso gráfico bem espontâneo, nos proporciona criar belos e inusitados efeitos plásticos. A técnica foi usada pela primeira vez pelo pintor, desenhista, escultor e escritor alemão Max Ernest (1891 – 1976), um dos fundadores do movimento “Dadá” e, posteriormente, um dos grandes nomes do Surrealismo. Consiste em colocar uma folha de papel sobre uma superfície áspera e esfregá-la, pressionando-a com um bastão de cera até a textura aparecer

92 Unidade 6


Fig. 133a: Construção da forma.

Fig. 133b: Construção de texturas.

Fig. 134: Incisões e engobe no pote a partir do desenho anterior.

Fig. 135a: Estudo do objeto tridimensional na cartolina.

Fig. 133c: Construção de texturas.

As imagens produzidas foram repassadas à superfície da peça, perfurando a folha de papel de seda, na qual se encontrava o desenho, marcando, ponto a ponto, os contornos na argila ainda úmida (Fig. 134). Esse método é parecido ao empregado pelos muralistas

Fig. 135b: Estudo do objeto tridimensional na cartolina.

na ampliação de suas imagens e no transporte dessas para a parede. Os grandes potes construídos com a técnica do rolinho recebem os desenhos. As linhas foram produzidas por incisão e o engobe na cor branca ressaltou detalhes da imagem. Outras formas mais complexas foram também executadas com o mesmo material empregado no desenho: o papel. Esses exercícios partiram de um estudo das formas geométricas básicas conhecidas: o cilindro e o cone, formas passíveis de serem também realizadas, a partir de laminas de argila modeladas em placas, ampliando as possibilidades criativas, pois partiam do projeto para a argila e, subsequentemente, para a produção da peça cerâmica (Figs. 135a, 135b e 135c). Os estudos tiveram grande importância para os aprendizes entenderem como estruturar a forma e, a partir desse entendimento, criarem as peças desejadas (Figs. 136a, 136b, 137 e 138).

Fig. 135c: Estudo do objeto tridimensional na cartolina.

Relato de experiência

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Fig. 136a e 136b: Construcão da peça em argilas a partir do estudo de papel.

Fig. 137: Peça queimada à 1150ºC.

Outros temas Os temas não ficaram restritos apenas à vida cotidiana. Após diálogo com o grupo, descobrimos que a comunidade de Jardim Carapina surgiu em uma área de manguezais, os moradores mais antigos exploravam essas áreas em contato com a fauna e a flora do lugar. Depois dos aterramentos dessas áreas, esse contato tornou-se cada vez mais restrito até desaparecer quase que completamente. O resgate dessa experiência foi aparecendo na produção do grupo. A partir do interesse de retraFig. 138: Construcão de peças em bloco, utilizando o mesmo tema.

tar o mangue, outras formas foram também projetadas para abrigar os desenho e os recortes, como foi o caso dos pratos e terrinas construídos a partir da técnica da placa (Figs. 139a, 139b, 139c, 140a e 140b).

Fig. 139a, 139b e 139c: Pratos com o tema marinho.

Os desenhos ganharam novas cores com engobes e o método por incisão proporcionou um diálogo entre a textura (grafismo) e a cor. Os desenhos realizados buscavam aspecto naturalista; a síntese dessas imagens ainda se apresentaram no seu começo. No entanto, à medida que se repetiam iam ganhando estilização, uma maneira de se trabalhar, reduzindo-se a linhas básicas do tema. 94 Unidade 6


Fig. 140a e 140b: Pratos com tema ”peixe”.

Considerações Falar de tradições populares é buscar a procedência de tal manifestação. Algumas vieram de tempos e lugares longínquos, como povos do período da colonização, outras possuem raízes mais profundas e já se perdem na história pelo apagamento de seus indícios, como acontece com algumas tradições indígenas em nosso país. Mas há sempre um começo, uma procedência que é responsável pela força e pela propriedade de tal manifestação. Este começo pode estar relacionado ao desejo de alguém, que vai, aos poucos, aglutinar a atenção pela curiosidade e excelência de sua produção. Operar uma iniciativa que pensa um futuro como uma tradição é apostar alto, porém, somente a continuidade destas práticas vão realmente produzir a originalidade e a identidade, pois será preciso um tempo para que aqueles que começaram esta iniciativa assumam as formas e as imagens que produziram como sendo suas e, a partir dai, agregando novas iniciativas, produzirão realmente um gesto já distante dos vícios e maneirismos que comparecem sempre no começo de uma prática, gerando, então, algo para além do objeto: uma identidade. A prática com cerâmica revelou-se um meio também de resgatar em cada participante um gesto ancestral. Lidar com a argila em grupo num mesmo ambiente, proporcionou esse resgate tanto anterior quanto presente nos relacionamento entre os participantes. Trabalhar a massa disforme, matéria de origens e mitos, potencializando nas pessoas o sentimento de criação, que transcende a prática como uma simples manufatura de objetos, inconscientemente o gesto de amassar, modelar e depois impor a forma, a rigidez do fogo nos dá uma ideia de maturação de uma forma, mas também, das relações estabelecidas entre os membros do grupo que se movem em torno de uma ideia comum.

Relato de experiência

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Considerações Finais O uso do barro pelo homem é um processo milenar e o emprego do fogo o transformou em cerâmica, o que permitiu as civilizações diversas travarem contato com esta linguagem, difundindo suas técnicas. Suas culturas construíram suas histórias, assim como suas formas e objetos. A linguagem que vai surgir daí vem imantada por este saber tão antigo e seu emprego na arte contemporânea resgata este elo entre cultura e natureza. Essas experiências com o barro, a partir do ato de criação, propõem ao observador uma nova percepção, um resgate dos sentidos, como uma forma de ensinamento do olhar, conduzindo-o para uma vivência com a matéria primordial dos ceramistas; o barro: um encontro prazeroso com a matéria primeira do homem. Cada unidade apresentada teve como objetivo envolver àqueles que se interessam por cerâmica e por suas possibilidades plásticas, que estimulam o olhar para uma aproximação com os procedimentos técnicos da modelagem e da queima. Em seguida, trazemos um relato de experiência como meio de apresentar uma metodologia que inclui o fazer e a reflexão. Por fim, resta-nos afirmar que o trabalho aqui apresentado, dada a carência de pesquisas que tomam a cerâmica como objeto de estudo dentro da produção estética e cultural contemporânea, pode contribuir para preencher parte dessa lacuna, permitindo aos iniciantes compreender a grande transformação pela qual passou a cerâmica dentro das artes plásticas. Talvez mais do que em outros setores da criação artística, a vivência e a curiosidade são visivelmente as chaves para trabalhar com esse material. O conhecimento das técnicas aliado às experiências anteriores permitem ao artista repensar, de maneira coerente e lúdica, a cerâmica contemporânea.

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Lista de imagens Unidade 1: Evolução da cerâmica Fig. 1: http://photography.nationalgeographic.com/photography/wallpaper/lascauxcave-walls-photography.html Acesso em 03/03/11. Fig. 2a: http://travel.webshots.com/photo/1218109570056954577IIYmzX Acesso em 04/03/11. Fig. 2b: http://casa.abril.com.br/planeta/casas/planeta_185367.shtml Acesso em 04/03/11. Figs. 3 e 4: CHAVARRIA, Joaquim. A cerâmica. Lisboa: Estampa, 2004, p. 10. Fig. 5: CHAVARRIA, Joaquim. A cerâmica. Lisboa: Estampa, 2004, p. 12. Fig. 6: CHAVARRIA, Joaquim. A cerâmica. Lisboa: Estampa, 2004, p. 14. Fig. 7: CHAVARRIA, Joaquim. A cerâmica. Lisboa: Estampa, 2004, p. 15. Fig. 8: CHAVARRIA, Joaquim. A cerâmica. Lisboa: Estampa, 2004, p. 20. Fig. 9: CHAVARRIA, Joaquim. A cerâmica. Lisboa: Estampa, 2004, p. 24. Figs. 10a e 10b: Aquarelas Júlio Tigre. Fig. 11: http://www.precolombino.cl/mods/coleccion/pieza.php?id=695 Acesso em 03/03/11. Fig. 12: DALGLISH, Lalada. Noivas da seca: cerâmica popular do Vale do Jequitinhonha. São Paulo: Ed. UNESP: Imprensa Oficial, 2006, p. 175. Fig. 13: HOGBEN, Carol. L’Art de Bernard Leach. Franca, Fribourg: Office du Livre. 1979, p. 82. Fig. 14a: BARAÑANO, Kosme. Picasso: El diálogo con la cerámica. Espanha: Fundación Bancaja, 1998, p. 128. Fig. 14b: DOSCHKA, Roland. Terra sculptura, terra pictura. Hertogenbosch e Netherlands: Museu Het Kruithuis, 1992, p. 201. Fig. 14c: FOREST, Dominique. Vallarius céramiques de peintres et sculpteurs. Vallarius: Musée de Cerámique et d’ Artmoderne de Vallarius, 1995, p. 40. Fig. 14d: BARAÑANO, Kosme. Picasso: El diálogo con la cerámica. Espanha: Fundación Bancaja, 1998, p. 138. Fig. 15: FOREST, Dominique. Vallarius céramiques de peintres et sculpteurs. Vallarius: Musée de Cerámique et d’ Artmoderne de Vallarius, 1995, p. 53. Fig. 16: DOSCHKA, Roland. Terra sculptura, terra pictura. Hertogenbosch e Netherlands: Museu Het Kruithuis, 1992, p. 130. Fig. 17: DOSCHKA, Roland. Terra sculptura, terra pictura. Hertogenbosch e Netherlands: Museu Het Kruithuis, 1992, p. 51. 102 Cerâmica


Fig. 18a: DOSCHKA, Roland. Terra sculptura, terra pictura. Hertogenbosch e Netherlands: Museu Het Kruithuis, 1992, p. 139. Fig. 18b: PIERRE, José; CORREDOR-MATHEOS, José. Miró & Artigas keramik. Paris: Maeght, 1974, p. 155. Fig. 18c: PIERRE, José; CORREDOR-MATHEOS, José. Miró & Artigas keramik. Paris: Maeght, 1974, p. 147. Fig. 18d: PIERRE, José; CORREDOR-MATHEOS, José. Miró & Artigas keramik. Paris: Maeght, 1974, p. 186. Figs. 19a e 19b: http://www.panoramio.com/photo/5256232 http://starlightsecrets.wordpress.com/2010/09/06/08-aep-block-test-2/ Acesso em 03/03/11. Fig. 20: Foto cedida por Vilma Villaverde. Fig. 21: VOLKWAGEN DO BRASIL S.A. Artistas da cerâmica brasileira. São Paulo: Raizes, 1985, p. 218. Fig. 22: FUNDAÇÃO ATHOS BULCÃO. Calendário Atlhos Bulcão: integração da arte e arquitetura. Brasília: Galeria Athos Bulcão. 1999, s/p. Fig. 23: VOLKWAGEN DO BRASIL S.A. Artistas da cerâmica brasileira. São Paulo: Raizes, 1985, p. 121. Fig. 24: VOLKWAGEN DO BRASIL S.A. Artistas da cerâmica brasileira. São Paulo: Raizes, 1985, p. 176. Fig. 25: VOLKWAGEN DO BRASIL S.A. Artistas da cerâmica brasileira. São Paulo: Raizes, 1985, p. 159. Fig. 26: http://www.vitorbraga.com.br/leilao2010/setembro/000.htm Acesso em 03/03/11. Fig. 27: FUNDAÇÃO CULTURAL BANCO DO BRASIL. M.L.Costa. Arte do fogo do sal e da paixão: Celeida Tostes. Rio de Janeiro, abril/jun. 2003, p. 46. Fig. 28a: LYGIA REINACH. Lygia reinach: esculturas em cerâmica. São Paulo, 1999, p. s/p. Fig. 28b: http://paulinotarraf.wordpress.com/2008/10/26/ligya-reinach-esculturasmetro-paraiso-_-fotos/ Acesso em 03/03/11. Fig. 29a: http://picasaweb.google.com/norma.grinberg/FotosRelatorio#55474948 62625400242 Acesso em 03/03/11. Fig. 29b: http://www.normagrinberg.com.br/ Acesso em 03/03/11. Fig. 30: DI IORIO, Mary. Mary Di Iorio. Uberlândia: Gráfica da UFU, 1991, p. 36. Fig. 31: Foto Maria Regina Rodrigues.

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Unidade 2: Matéria-prima Figs. 32 e 33: Fotos Diego Lopez Werneck Crispim e Arthur Perin Motta. Fig. 34: DI IORIO, Mary. Cerâmica. Uberlândia; UFU, 1991, p. 20. Figs. 35a e 35b: CHAVARRIA, Joaquim. A cerâmica. Lisboa: Estampa, 2004, p.106. Figs. 36a e 36b: CHAVARRIA, Joaquim. A cerâmica. Lisboa: Estampa, 2004, p.108. Fig. 37: Foto Bruna Santos Silva. Fig. 38a: http://stuckattheairport.com/2009/10/23/ancient-greek-pots-found-atsfo-airport/ Fig. 38b: http://www.beazley.ox.ac.uk/pottery/painters/keypieces/redfigure/niobid.htm Figs. 39a, 39b, 40 e 41: Fotos Diego Lopez Werneck Crispim e Arthur Perin Motta. Fig. 42: Foto Diego Lopez Werneck Crispim e Arthur Perin Motta. Fig. 43: Foto Maria Regina Rodrigues. Fig. 44a: TOSTES, Celeida. Memorial de livre-docência: Celeida Tostes. Rio de Janeiro: gráfica UFRJ, 1992. s/p. Fig. 44b: Foto do acervo de Celeida Tostes. Fig. 45a: CHAVARRIA, Joaquim. A cerâmica. Lisboa: Estampa, 2004, p.42. Fig. 45b: Foto Diego Lopez Werneck Crispim e Arthur Perin Motta. Fig. 46: CHAVARRIA, Joaquim. A cerâmica. Lisboa: Estampa, 2004, p.106.

Unidade 3: Modelagem Fig. 47: Foto Bruna Santos Silva. Figs. 48a, 48b, 48c: Fotos Diego Lopez Werneck Crispim e Arthur Perin Motta. Fig. 49: DALGLISH, Lalada. Noivas da seca: cerâmica popular do Vale do Jequitinhonha. São Paulo: Ed. UNESP: Imprensa Oficial, 2006, p 38. Figs. 50, 51, 52, 53 a, 53 b, 53c, 54 e 55: Fotos Diego Lopez Werneck Crispim e Arthur Perin Motta Fig. 56: Foto Fernanda de Abreu Passos. Figs. 57, 58, 59, 60, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 70, 71a, 71b, 72, 73a, 73b, 73c, 74a, 74b, 75, 76a, 76b, 76c, 77a e 77b: Fotos Diego Lopez Werneck Crispim e Arthur Perin Motta.

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Unidade 4: O processo de criação na cerâmica Fig. 78: Foto Regina Rodrigues. Fig. 79: COSTA, Marcus de L. Arte do fogo do sal e da paixão: Celeida Tostes. Rio de Janeiro: FCBB, 2003, p. 39. Fig. 80a: FOREST, Dominique. Vallarius céramiques de peintres et sculpteurs. Vallarius: Musée de Cerámique et d’ Artmoderne de Vallarius, 1995, p. 44. Fig. 80b: FOREST, Dominique. Vallarius céramiques de peintres et sculpteurs. Vallarius: Musée de Cerámique et d’ Artmoderne de Vallarius, 1995, p.45. Fig. 80c: MUSÉE OLYMPIQUE. Miró: Matière et couleur. Lausanne: Musée Olympique, 1994, p. 24. Fig. 80c: MUSÉE OLYMPIQUE. Miró: Matière et couleur. Lausanne: Musée Olympique, 1994, p. 24. Fig. 81a: SIQUEIRA, Hélio. Hélio Siqueira: depoimentos. Belo Horizonte: Circuito atelier, 2000, p. 60. Fig. 81b: SIQUEIRA, Hélio. Hélio Siqueira: depoimentos. Belo Horizonte: Circuito atelier, 2000, p. 59. Fig. 82a: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Brennand. F. Monteiro. Rio de Janeiro: spala, [19 --], p. 55. Fig. 82a: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Brennand. F. Monteiro. Rio de Janeiro: spala, [19--], p. 54. Fig. 82c: FUNDAÇÃO JÚLIO RESENDE. J. Resende. Brennand: no acerto com o mundo. Portugal, out/dez. p. s.p. Figs. 83a e 83b: Desenhos cedidos por Mary Di Iorio. Fig. 84: Foto cedida por Norma Grinberg. Fig. 85: Foto cedida por Regina Rodrigues. Fig. 86a: http://www.vitorbraga.com.br/leilao2010/setembro/000.htm Acesso em 03/03/11. Fig. 86b: http://www.vitorbraga.com.br/leilao2010/setembro/000.htm Acesso em 03/03/11. Figs. 87a, 87b e 87c: Fotos cedidas por Júlio Tigre. Figs. 88a, 88b, 88c, 89a, 89b e 89c: Fotos Bruna Santos Silva.

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Unidade 5: Fornos e queimas Fig. 90: Foto Penha Schirmer. Figs. 91, 92 e 93: CHAVARRIA, Joaquim. A Cerâmica. Editorial Estampa, Ltda, Lisboa, 2004, p.70/71. Figs. 94 e 95: Fotos Penha Schirmer. Fig. 96: DALGLISH, Lalada. Noivas da seca: cerâmica popular do Vale do Jequitinhonha. São Paulo: Ed. UNESP: Imprensa Oficial, 2006, p. 53. Fig. 97a: Foto Penha Schirmer. Fig. 97b: Foto Maria Regina Rodrigues. Figs. 98a e 98b: Fotos cedidas por Hélio Siqueira. Fig. 99a: http://www.flickr.com/photos/7455207@N05/3246497097/ Acesso em 03/03/11 Fig. 99b: UFSJ, CHAGAS Luciana. Disponível em: http://historia-da-ceramica.blogspot.com/2009/02/fornos-para-ceramica.html Acesso em: 1º de fev. 2011. Fig. 100: ROS I FRIGOLA, Maria Dolors. Cerámica artística. 2. ed. Barcelona: Parramón, 2008, p. 40. Fig. 101: Foto: Diego Lopez Werneck Crispim e Arthur Perin Motta. Fig. 102: ROS I FRIGOLA, Maria Dolors. Cerámica artística. 2. ed. Barcelona: Parramón, 2008, p. 105. Figs. 103, 104, 105, 106, 107, 108, 109, 110 e 111: Fotos Aline Valadares. Figs. 112 e 113: Fotos Fernanda Rodrigues. Figs. 114, 115, 116, 117, 118, 119, 120 e 121: Fotos Penha Schirmer.

Unidade 6: Relato de experiência: construindo uma identidade na arte popular Figs. 122, 123.124,125,126, 127,128,129 e 130: Fotos Júlio Tigre. Figs. 131a e 131b: Fotos Júlio Tigre. Fig. 132: http://inventandoinventarios.blogspot.com/ Figs. 133a, 133b, 133c, 134, 135a, 135b, 135c, 136a, 136b, 137, 138, 139a, 139b, 139c, 140a e 140b: Fotos Júlio Tigre.

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Colaboradores Júlio César da Silva (Júlio Tigre)

Graduado em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Espírito Santo (1999). Doutorando no Programa: Lenguages y Poéticas en el Arte Contemporaneo na Universidad de Granada, Espanha desde 2007. Atualmente é Professor substituto do curso presencial dos curso Artes Visuais da UFES, e tutor a distância (EAD), na mesma instituição. Possui experiência na área de artes com ênfase em Escultura, instalação, vídeo instalação e pintura.

Tatiana Campagnaro

Graduada em artes plásticas pela Universidade Federal do Espírito Santo (1996). Atualmente é professora da Sociedade Cultural Monteiro Lobato Cems. Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Cerâmica. Sócia proprietária do TACTO atelier de cerâmica desde 2001.

Terezinha Drago

Graduada em Educação Artística pela Universidade Federal do Espírito Santo (1996). Especialização em Artes na Educação, Instituto Superior de Educação e Cultura Ulysses Boyd, Vitória, ES (2009). Atualmente é sócia proprietária do TACTO Atelier de Cerâmica desde 2001; professora efetiva de Educação Artística da Prefeitura Municipal de Vitória desde 2008.

Maria da Penha Schirmer Ribeiro (Penha Schirmer)

Graduada em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Espírito Santo, 2008. Bolsista de Iniciação Científica – PIBIC/ UFES, 2005/2006. Atuou como monitora em Cerâmica II na UFES (2005 a 2007). Participou do Congresso Nacional de Técnicas para as artes do fogo – UFSJ, em 2010; e em São Bernardo do Campo SP 2003/2004. Fez curso de Vidrados em alta temperatura no Ateliê Eliana Penido, RJ, 2007.


9 788564 509023

www.neaad.ufes.br (27) 4009 2208


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