4 minute read
ROMPENDO BARREIRAS
Modernizar o condomínio e, ao mesmo tempo, promover acessibilidade, coloca a edificação em conformidade com a lei, valoriza o patrimônio e traz bem-estar e segurança a moradores e visitantes
Por Isabel Ribeiro
Advertisement
REFORMA ou retrofit dão novos ares para que condomínios antigos se mantenham valorizados frente aos novos empreendimentos, e dão oportunidade às inserções de acessibilidade. Até mesmo porque não se consegue aprovação de projeto de obra se não houver comprovação de acessibilidade no acesso da edificação e das áreas comuns.
Especialista em acessibilidade e docente do tema no Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia (IBAPE-SP), a arquiteta Vanessa Pacola Francisco exemplifica: “Vamos supor que eu queira reformar a churrasqueira, com acréscimo de área, para criar um espaço gourmet. Quando eu der entrada do novo projeto na Prefeitura, terei de atender também os requisitos de acessibilidade”.
A profissional comenta que já escutou frases como: ‘Poxa, no meu condomínio não tem cadeirante!”, ao que faz uma reflexão: “E quanto aos familiares e amigos que visitam os moradores, ninguém tem algum tipo de deficiência? Ou no próprio condomínio, não há pessoas com dificuldade de locomoção, ou que transporta o bebê no carrinho? Essa visão precisa mudar. É muito generoso poder olhar para o próximo e compreender que ele tem de vivenciar o condomínio da mesma forma que os demais”.
Vanessa Pacola
A arquiteta acrescenta que acessibilidade é tornar o uso de um espaço acessível a um maior número de pessoas. “As pessoas esquecem que vão envelhecer, os passos vão ficar mais lentos; que poderão precisar de muletas por conta de alguma fratura etc. São fatos que precisam ser pontuados pelos síndicos nas assembleias”, enfatiza.
Vanessa constata ainda que poucos se lembram que deficiências podem ser conjuntas. “Não basta colocar barras de apoio no banheiro, mas não trocar a torneira por um modelo acionado por alavanca. O cadeirante pode ter algum problema nos membros superiores, então a adaptação tem de ser completa”. Ela acrescenta que as especificações das condições de acessibilidade se encontram na NBR 9050 da ABNT, podendo ser baixada gratuitamente na internet.
Frente Remodelada
Há alguns anos o Edifício Líria, de 1977, começou a passar por um programa de modernização. A primeira modificação no condomínio de uma torre situado na região da Avenida Paulista foi a renovação da entrada e portaria. “O condomínio ganhou em segurança, acessibilidade, identidade e beleza. A acessibilidade através de rampas, corrimões e largura suficiente
Atendendo, entre outros clientes, a condomínios há duas décadas, Eduardo reforça que edificações edilícias precisam passar por adaptações para atenderem a Lei 13.146/2015 – Lei Brasileira da Inclusão (LBI), e reitera que a recusa pode ser considerada discriminatória. “No momento em que o síndico se recusa em adaptar uma edificação para garantir igualdade de oportunidade está incorrendo num crime”.
O arquiteto salienta que o cumprimento da legislação é fiscalizado pela prefeitura e Ministério Público, e que a fiscalização ocorre por denuncia ou diligência. “Independentemente de haver ou não fiscalização, isso não diminui a responsabilidade do síndico fazer o que é certo para que todos tenham igualdade de oportunidade, autonomia e segurança, como colocar uma plataforma ou rampa, ou um sanitário acessível, um piso correto ou corrimãos nas escadas, por exemplo”.
O projeto de modernização do Líria (imagem que abre esta reportagem) ficou a cargo do arquiteto Eduardo Ronchetti de Castro, também responsável pelo “antes e depois” publicado nesta reportagem, sobre transformação no acesso ao Edifício Marco, em Copacabana, Rio de Janeiro, com instalação de plataforma elevatória e adequação da escada conforme normatização. Especialista no segmento, ele é educador e autor dos livros “Acessibilidade Arquitetônica” e “Acessibilidade – 14 Profissionais e 1 Propósito”.
Eduardo cita que adaptar oito itens principais já torna o condomínio inclusivo. São eles: calçada, cuja obrigatoriedade de reforma não é da prefeitura; entrada; balcão de atendimento; sanitários; sinalização visual e tátil; rota acessível interligando ambientes; vagas de garagem e elevadores com condições de acessibilidade.
Acesso Liberado
pecificamente para acessibilidade, que custou R$ 40.920. Pela comodidade de uso também no inverno ou em dias chuvosos, a piscina coberta foi a escolhida para receber em seu interior a superfície de polipropileno acompanhada de corrimãos bilaterais. “A rampa é antiderrapante e o declive tem no máximo 8,33%, conforme preconiza a NBR 9050”, detalha o síndico. “É um investimento que atende à legislação, mas que também promove melhor qualidade de vida, uma vez que permite que pessoas que se locomovem com cadeira de rodas, com andador ou idosos consigam desfrutar da piscina”.
No Quality House Lapa, na zona oeste, construído há 13 anos, havia acessibilidade nos acessos aos espaços das áreas comuns, como parquinho, churrasqueira e piscinas. Entretanto, um morador cadeirante e outro com mobilidade reduzida não conseguiam tomar banho de piscina e levaram a questão ao síndico profissional Demilson Bellezi Guilhem, egresso da engenharia civil. “Contratamos uma arquiteta, estudamos soluções, mas a estrutura das piscinas não permitia intervenções”, relata.
A alternativa foi investir em uma rampa idealizada e comercializada es-
Deficiente física, Mariana Guidoni lamenta falta de acessibilidade em prédios antigos
“SÍNDICOS DEVERIAM FAZER UM EXERCÍCIO DE EMPATIA”
Mariana Guidoni é advogada condominialista em São Paulo e deficiente física – por causa de uma luxação no quadril, manca de uma perna. Transita em vários condomínios, comemora que os mais jovens têm acessibilidade, mas lamenta que em muitas construções antigas o acesso ainda se dê por escadas. “Não me traz grandes prejuízos porque subo degraus, mas eu penso na dificuldade dos outros, sei como é complicado, usei cadeira de rodas durante um ano de pós-cirúrgico”, comenta.
A advogada fala que “síndicos deveriam fazer um exercício de empatia”, e sugere: “Vale alugar uma cadeira de rodas por um dia, ou colocar uma venda nos olhos, e tentar acessar o condomínio e utilizar as áreas comuns. Essa experiência vai revelar muito do que necessita ser feito em termos de acessibilidade”. Ela também aconselha o gestor a conhecer sua comunidade e zelar por ela. “Se tiver um deficiente auditivo, o faça saber que haverá um tradutor de libras na assembleia; se houver uma criança deficiente, ao contratar uma recreação de férias, por exemplo, certifique-se de que ela será incluída nas atividades. A oportunidade tem de ser a mesma para todos”.